Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1709/12.1TBMGR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MARIA DOMINGAS SIMÕES
Descritores: ÓNUS DE IMPUGNAÇÃO
CONFISSÃO
CONDUÇÃO DE VEÍCULO EM ESTADO DE EMBRIAGUEZ
DIREITO DE REGRESSO
SEGURADORA
Data do Acordão: 11/11/2014
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: MARINHA GRANDE - 1º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 490º Nº2 DP CPC, AL.C) DO Nº1 DO ART.27 DO DL 291/2007, 21/8 E ART.9.º DO CC
Sumário: I. À omissão do dever de impugnar que nasce para o réu com a citação associa a lei um efeito cominatório importante, considerando-se admitidos por acordo os factos que não forem impugnados, com excepção daqueles para cuja prova seja exigido documento escrito e daqueloutros sobre os quais não é admissível confissão (cf. art.º 490.º, n.º 2 do CPC em vigor ao tempo).

II. A assim designada prova por admissão, também denominada confissão ficta, significa que fica definitivamente adquirida para o processo a realidade do facto, não sendo permitido ao réu vir negar em momento posterior os factos sobre os quais se manteve silencioso, o que é também corolário do princípio da concentração de toda a defesa na contestação e efeito preclusivo que lhe está associado.

III. A interpretação mais consentânea com a letra da al. c) do n.º 1 do art.º 27.º do DL 291/2007 -ponto de partida do intérprete e seu limite na busca e reconstituição do pensamento legislativo, de harmonia com as regras estabelecidas no art.º 9.º do Código Civil- é aquela que defende que, circulando o condutor com uma taxa de alcoolemia superior à legalmente admitida e tendo dado causa ao acidente, tanto basta para que à seguradora assista o direito de regresso.

IV. Tal entendimento adequa-se ainda ao elemento interpretativo “circunstâncias em que a lei foi elaborada e condições específicas do tempo em que é aplicada” porquanto, num país como o nosso, com elevadíssimos níveis de sinistralidade, frequentemente associada à etilização dos condutores, é de crer ter sido vontade do legislador privilegiar o poder dissuasor da solução assim consagrada.

V. Mesmo para quem perfilhe o entendimento de que é exigível a prova da existência do nexo causal entre a etilização do condutor e o acidente a que deu causa -ónus da seguradora que pretende exercer o direito de regresso- nada impede que tal prova seja feita com recurso a presunções judiciárias, partindo das circunstâncias do caso.

Decisão Texto Integral:
I. Relatório
A... SA, NIF (...), com sede na Rua (...), Porto, instaurou acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra B... , residente na Rua (...), Marinha Grande, pedindo a condenação deste no pagamento da quantia de € 937.318,39 (novecentos e trinta e sete mil, trezentos e dezoito euros e trinta e nove cêntimos), acrescida dos juros de mora contados da citação e até integral pagamento.
Em fundamento alegou, em síntese, ter ocorrido um acidente de viação no dia 07.03.2009 na Estrada da Mata Nacional, S. Pedro de Moel, no qual foi interveniente o veículo com a matrícula (...)SN, na altura conduzido pelo réu. Tal acidente deveu-se a culpa do demandado, que conduzia, não só sob o efeito de substâncias psicotrópicas, como também com uma taxa de alcoolemia de 1,49 g/l, do que resultou a perda de controlo da viatura e consequente despiste, tendo entrado na berma e colidido com dois eucaliptos.
Mais alegou que na ocasião seguia como passageiro no referido veículo C..., o qual sofreu lesões das quais resultaram gravíssimas sequelas, danos que a autora, na qualidade de seguradora para a qual havia sido transferida a responsabilidade civil emergente dos acidentes de viação em que a viatura SN fosse interveniente, tem vindo a suportar, no que despendeu já o montante de € 937 318,30. Dado que o réu conduzia sob influência do álcool e também de substâncias psicotrópicas, assiste à demandante o direito de regresso que aqui pretende exercer.
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Regularmente citado, o réu contestou, peça na qual, defendendo-se por excepção, invocou a sua ilegitimidade para a causa e a prescrição (erroneamente qualificada como caducidade) do direito que a autora pretende fazer valer, por terem decorrido mais de 3 anos sobre a data do acidente.
Em sede de impugnação, negou corresponder à verdade a versão do acidente apresentada pela autora, alegando ter sido obrigado a guinar o veículo para a berma por lhe ter surgido um veículo que circulava em contramão, não havendo outra forma de evitar a colisão frontal. E foi a execução desta manobra de recurso que o fez perder o controle do veículo, vindo a embater no eucalipto ali existente, sem que nenhuma culpa lhe possa ser assacada.
Mais negou que conduzisse sob a influência do álcool ou de substâncias psicotrópicas ou que a sua condução tivesse sido afectada, condicionada ou perturbada por tal estado, antes tendo o acidente ficado a dever-se à conduta culposa de terceiro, conforme descreveu.
Por último impugnou, por desconhecimento, os pagamentos invocados pela autora, concluindo pela improcedência do pedido formulado.
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A autora replicou, pugnando pela improcedência da aludida excepção peremptória.
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Foi proferido despacho saneador, no qual foi afirmada a legitimidade das partes e julgada improcedente a excepção peremptória da prescrição, prosseguindo os autos com a selecção dos factos assentes e organização da base instrutória. Reclamou o réu daquela primeira peça, com fundamento na circunstância de ter impugnado o modo como ocorreu o acidente (cf. fls. 249), reclamação que veio a ser indeferida nos termos do despacho proferido a fls. 289.
Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, no termo da qual foi proferida sentença que, na parcial procedência do pedido, condenou o réu a pagar à autora a quantia de € 936.378,69 (novecentos e trinta e seis mil, trezentos e setenta e oito euros e sessenta e nove cêntimos) acrescida de juros de mora contados da citação, à taxa de 4%, até efectivo e integral pagamento.
Inconformado com o decidido, apelou o réu e, tendo apresentado alegações, indiferente ao comando do n.º 1 do art.º 639.º, rematou-as com 91 conclusões, das quais se extraem, por relevantes, as seguintes:
i. A decisão de indeferir a reclamação apresentada contra a selecção dos factos assentes não se mostra nem correcta, nem legal, uma vez que o réu, na contestação apresentada, negou os artigos 1.º a 5.º da petição inicial, nomeadamente quanto à data, local, dinâmica do acidente, autoria, facto ilícito, relação entre facto e danos, etc., tal como impugnou os documentos que acompanhavam aquela peça processual;
ii. A matéria alegada nos art.ºs 6.º, 8.º e 20.º da contestação não serve -nem o sentido pretendido pelo recorrente era esse- para aferir que era este quem conduzia a viatura, seguindo o C... no banco traseiro;
iii. O Tribunal interpretou extensivamente a matéria alegada pelas partes, sendo certo que não era aquele o sentido nem o significado que se pretendia;
iv. A matéria constante da al. C), por validamente impugnada, deveria ter sido objecto de instrução, requerendo-se que seja levada à base instrutória;
v. A Mm.ª juiz “a quo” não fundamentou a sua decisão, nem de facto, nem de direito, o que acarreta a nulidade do despacho recorrido, que se mostra ainda violador do disposto nos art.ºs 13.º, 20.º, 202.º, 204.º e 205.º da CRP;
vi. O Tribunal errou na apreciação da prova produzida, tendo dado erradamente como provada a matéria vertida nos pontos 2), 4), 5), 6), 7), 8) e 9) da sentença;
vii. No que diz respeito aos factos constantes dos pontos 2), 4), 5), 6) e 7) da factualidade provada – ou seja, no que à dinâmica do acidente diz respeito – a prova que foi sendo realizada no decurso do processo, nomeadamente os documentos juntos e o confronto desses mesmos documentos com as testemunhas, impunham decisão diversa daquela que veio a ser proferida;
viii. Dos depoimentos prestados pelas testemunhas F... e G..., nas passagens que identifica, resultou que o primeiro, guarda da GNR participante, não presenciou o acidente, não assumindo a participação ou o seu depoimento valor probatório para que, com base neles, se dêem como assentes os pontos de facto impugnados;
ix. A Mm.ª juiz “a quo”, apesar de “referir” que aproveitou o teor do auto para a prova dos factos supra referidos, não revelou em que sentido o aproveitou, de que forma completou e/ou complementou a sua análise com os depoimentos das testemunhas, sendo que o único sentido interpretativo que se pode retirar do documento em análise é o de que o participante não falou com ninguém (nem com o recorrente) para elaborar o auto nos termos em que o fez;
x. Conjugando as declarações do participante com o auto de participação elaborado por si, dúvidas não existem que o participante nada sabia sobre o acidente, da dinâmica do “despiste” (palavra do participante), dos intervenientes, etc.;
xi. Não poderia a Meritíssima Juiz “a quo” ter entendido que o documento em análise, conjugado com o depoimento que acima se transcreveu era bastante para provar os factos ora impugnados – no que à dinâmica e autoria do acidente diz respeito;
xii. Por ausência de prova testemunhal ninguém sabe como sucedeu o acidente, o sentido a que seguia da viatura, a que velocidade do mesmo, etc.;
xiii. Os dados recolhidos não são suficientes para se fazer um juízo de “prognose póstuma”;
xiv. A Meritíssima Juiz “a quo” fez uma errada interpretação da prova, interpretando “extensivamente” o que não se disse e o que não se conhece, sem ter fundamentos ou factos para tal.
xv. Quanto aos factos que têm a ver com a ingestão de produtos estupefacientes e álcool por parte do recorrente, e a sua influência na alegada condução do veículo -factos 8. e 9.- também foram erroneamente interpretados pela Meritíssima Juiz “a quo”;
xvi. A prova obtida pelo depoimento de testemunha H...(médico com formação em medicina legal, que realiza perícias e peritagens para a Autora, e daí aufere rendimentos) não é, nem de perto nem de longe, suficiente para se chegar à conclusão que supra se transcreveu;
xvii. A Meritíssima Juiz “a quo” apenas se aproveitou do que foi dito para um sentido, apenas para fundamentar o que de melhor lhe aprouvesse, “deixando de fora” outros factos depostos pela referida testemunha;
xviii. Do depoimento da testemunha supra referido, apenas se pode retirar o que se pode ler do teste toxicológico: que foi realizado foi às 11:45 horas, e nessa hora os valores terão sido os que constam das tabelas;
xix. Não se pode retirar que à hora do acidente o recorrente era portador de uma taxa de alcoolemia superior a 1,49 g/l;
xx.  Por ser possível: o recorrente ter ingerido bebidas alcoólicas após o acidente e antes da realização do teste, ou ter ingerido bebidas antes do acidente e continuar a ingeri-las após; a colheita de sangue ter sido mal feita; o recorrente ter problemas cardiovasculares que não possibilitem a perda de álcool circulante nos termos normais, etc.;
xxi. O recorrente impugnou, por não corresponder à verdade, o exame toxicológico junto aos autos e não foi através do depoimento do Dr. G... que o relatório “venceu” a impugnação de que foi alvo;
xxii. O Tribunal errou quando decidiu pela existência de um nexo de causalidade entre a condução sob influência do álcool e o acidente;
xxiii. Para a procedência do direito de regresso contra o alegado condutor por ter alegadamente agido sob influência do álcool, exige-se, pois, a alegação e prova pela autora do nexo de causalidade adequada entre o estado de etilizado e o acidente de que resultaram os danos, segundo a melhor interpretação do artigo 27.º, n.º 1, alínea c) do DL nº 291/2007, de 21/8;
xxiv. Não tendo sido o aqui Réu o condutor mas, se numa mera hipótese académica assim o fosse, nenhum facto alegado permite afirmar, em concreto, a interferência da alcoolemia no processo do sinistro;
xxv. A acrescer a este facto há a registar que está dado como provado que o estado da via é “em betuminoso, em mau estado de conservação e com uma largura de 5,60 m” – vide nº 3 dos factos provados;
xxv. Provado também ficou, independentemente do sentido a que circulava a viatura, que o local é uma curva seguida de contracurva;
xxvi. A Meritíssima Juiz “a quo” em toda a sentença nunca referiu esses factores, ou seja, “esqueceu-se” de referir os elementos externos à condução, devendo o Tribunal de recurso debruçar-se sobre a hipótese de se saber se havia a possibilidade de ocorrer o acidente nos mesmos moldes;
xxvii. No entender do recorrente, a Meritíssima Juiz do Tribunal “a quo” não avaliou correctamente a factualidade dada como provada, e os indícios do local, apenas se agarrou ao álcool existente ao “alegado” condutor, sem ter colocado a hipótese de, retirando a presença do álcool das variáveis presentes no processo, haver acidente na mesma, não formulando a este respeito um juízo de probabilidade ou de razoabilidade;
xxviii. O Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça para uniformização de jurisprudência nº 6/2002, de 28 de Maio de 2002, fixou a exigência para a procedência do direito de regresso contra o condutor por ter agido sob influência do álcool o ónus da prova pela seguradora do nexo de causalidade adequada entre a condução sob o efeito do álcool e o acidente;
xxix. Apesar das alterações jurídicas efectuadas com o Dec-Lei 291/2007, o Acórdão uniformizador tem aplicação directa, pois, mais do que se referir a uma determinação legal em específico, o mesmo se debruça sobre o conceito de nexo de causalidade entre uma “perturbação etílica” e os restantes requisitos no artigo 483º do Código Civil, ou seja: voluntariedade de…; facto ilícito; actuação culposa ou negligente; dano; causalidade entre facto ilícito com o dano;
xxx. No caso em apreço, não se verificam todos os requisitos supra mencionados que permitam à autora exercer o direito de regresso contra o recorrente;
xxxi. A sentença recorrida não se encontra fundamentada nem de facto, nem de direito, nem apreciou a totalidade das questões, violando o disposto nas als. b), c) e d) do artigo 615º do Código do Processo Civil, e sendo assim nula;
xxxii. A decisão recorrida violou ainda o disposto nos artigos 13.º, 20.º, 202.º, 204.º, 205.º, todos da C.R.P. e ainda o disposto nos artigos 16.º, 17.º, nº 1, 18.º, n.º 1, 45.º, n.º 3, 325.º e 498.º, n.º 3 do Código Civil, artigos 152.º, 154.º, 411.º, 615.º, alíneas b), c) e d) do Código do Processo Civil e o art.º 6.º da CEDH, devendo ser revogada.
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A recorrida contra alegou, defendendo naturalmente a manutenção do julgado.
A Mm.ª Juíza julgou improcedente a arguição das nulidades.
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Assente que pelo teor das conclusões se define e delimita o objecto do recurso, são questões a decidir:
i. da errónea consideração como assente do facto especificado em C) e da nulidade do despacho que indeferiu a reclamação apresentada pelo réu/recorrente;
ii. da nulidade da sentença apelada por violação do disposto no art.º 615.º, n.º 1, nas suas als. a), c) e d);
iii. do erro de julgamento quanto aos pontos de facto discriminados na sentença apelada sob os n.ºs 2, 4, 5, 6, 7, 8 e 9;
iv. do erro de julgamento no que concerne à verificação do indispensável nexo causal entre na taxa de alcoolemia e a ocorrência do acidente e quanto à interpretação e aplicação das regras jurídicas contidas nos art.ºs 16.º, 17.º, nº 1, 18.º, n.º 1, 45.º, n.º 3, 325.º e 498.º, n.º 3 do Código Civil, artigos 152.º, 154.º, 411.º, 615.º, alíneas b), c) e d) do Código do Processo Civil e art.º 6.º da CEDH, importando ainda indagar se a sentença recorrida violou o preceituado nos art.ºs 13.º, 20.º, 202.º, 204.º e 205.º, estes da Constituição da República Portuguesa.
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i. da errónea consideração como assente do facto especificado em C) e da nulidade do despacho que indeferiu a reclamação apresentada pelo réu/recorrente
Tendo impugnado no recurso ora interposto o despacho que indeferiu a reclamação apresentada à selecção da matéria de facto considerada assente, como impunha o n.º 3 do art.º 511.º do CPC em vigor ao tempo em que esta peça foi elaborada (solução idêntica foi acolhida no n.º 3 do art.º 596.º do CPC agora em vigor), cabe indagar do acerto do referido despacho e, previamente, apreciar se o mesmo padece ou não das imputadas nulidades.
Alega o apelante que o despacho proferido padece do vício da nulidade por falta de fundamentação, por não terem sido indicadas pela Mm.ª juíza “a quo” as razões de facto e de direito que determinaram o indeferimento da reclamação apresentada. Acresce que o mesmo despacho, segundo o recorrente, seria ainda violador do disposto nos art.ºs 13.º, 20.º, 202.º, 204.º e 205.º da CRP.
No que concerne à nulidade decorrente da falta de fundamentação, o art.º 154.º do CPC impõe ao juiz que fundamente as decisões proferidas sobre qualquer dúvida suscitada no processo ou qualquer pedido controvertido (vide n.º 1). Em consonância com tal dever de fundamentação, as sentenças e os despachos são nulos quando não especifiquem os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (vide al. b) do art.º 615.º e extensão operada pelo n.º 3 do art.º 613.º do mesmo diploma legal).
O dever de fundamentação das decisões corresponde a uma exigência constitucional (cf. art.º 205.º, n.º 1 da CRP) e, sendo um instrumento legitimador da própria decisão -quanto mais persuasivo for o seu discurso, mais facilmente será convencido o seu destinatário e acatado o seu conteúdo-, constitui ainda garantia da efectividade do direito ao recurso.
Ora, no caso vertente, basta a mera leitura do despacho impugnado para concluir pela sem razão do apelante, tendo a Mm.ª juiz explicitado de forma clara e suficiente por que motivo o facto em causa havia ingressado no elenco dos assentes, ou seja, por não ter sido cumprido em relação ao mesmo o ónus da impugnação, assim tendo dado cumprimento ao aludido dever de fundamentação.
No que respeita ao mérito do despacho, é evidente o seu acerto, o que desde já se antecipa, revelando mesmo o apelante grande ousadia ao repristinar a questão em sede do presente recurso. Vejamos:
Citado o réu, conforme resultava dos art.ºs 486.º, 487.º e 488.º do CPC em vigor ao tempo, podia este contestar no prazo de 30 dias, defendendo-se por excepção e/ou por impugnação. Esta impugnação dos factos podia (e pode ainda) ser directa, o que ocorre quando o réu nega frontalmente os factos alegados pelo autor, afirmando que não se verificaram, ou indirecta, nesta última modalidade se incluindo os casos em que: a) o réu, confessando ou admitindo parte dos factos alegados pelo autor como causa de pedir, invoca outros cuja existência é incompatível com os demais descritos no âmbito da mesma causa de pedir; b) o réu alega factos instrumentais probatórios incompatíveis com aqueles que suportam a causa de pedir; c) os factos que integram a causa de pedir estão em oposição com o conjunto dos factos alegados pelo réu em sua defesa; d) o réu nega um dos factos alegados pelo autor do qual dependem os restantes[1].
À omissão deste dever de impugnar que nasce para o réu com a citação associa a lei um efeito cominatório importante, considerando-se admitidos por acordo os factos que não forem impugnados, com excepção daqueles para cuja prova seja exigido documento escrito e daqueloutros sobre os quais não é admissível confissão (cf. art.º 490.º, n.º 2 do CPC em vigor ao tempo, a que sucedeu o n.º 2 do art.º 574.º do NCPC). A assim designada prova por admissão, também denominada confissão ficta[2], significa que fica definitivamente adquirida para o processo a realidade do facto, não sendo permitido ao réu vir negar em momento posterior os factos sobre os quais se manteve silencioso, o que é também corolário do princípio da concentração de toda a defesa na contestação e efeito preclusivo que lhe está associado.[3] Parece aqui oportuno referir que o já citado n.º 2 do art.º 574.º veio de algum modo atenuar a rigidez desta solução, permitindo que a força probatória decorrente da admissão cesse com a produção de prova posterior infirmatória, circunscrevendo no entanto tal regime de excepção aos factos meramente instrumentais.
A par da dita “ficta confessio” -designação do efeito probatório extraído do silêncio da parte sobre a realidade de um facto alegado pela parte contrária- a lei prevê ainda como meio de prova, estruturalmente distinto daquele, ainda que semelhante quanto aos seus efeitos, a confissão.
A confissão, tal como a define o art.º 352.º do Código Civil, é o reconhecimento da realidade de um facto desfavorável ao declarante e que favorece a parte contrária. Trata-se portanto da admissão pelo declarante “dum facto constitutivo dum seu dever ou sujeição, extintivo ou impeditivo dum seu direito, modificativo duma situação jurídica em sentido contrário ao seu interesse, ou, ao invés, da negação da realidade dum facto que lhe é favorável”, encontrando o seu fundamento na máxima da experiência segundo a qual ninguém mente em sentido contrário ao seu interesse[4].
A confissão, conforme resulta do disposto no art.º 355.º do Código Civil, pode ser judicial -a produzida em processo que corra perante Tribunal ou juízo arbitral- ou extrajudicial, quando é produzida fora de um processo. A confissão judicial, única que aqui releva, pode ser feita espontaneamente nos articulados pela parte ou pelo seu advogado, sem que este careça de poderes especiais para o efeito, podendo ainda ser provocada em depoimento de parte ou em acto de prestação de esclarecimentos ou informações perante o juiz. Tal é o regime que decorre do art.º 356.º.
Finalmente, o art.º 358.º atribui força probatória plena à confissão judicial escrita ou reduzida a escrito.
De posse destes elementos debrucemo-nos sobre o caso em apreço.
Aquando da selecção dos factos assentes e organização da base instrutória, deu a Mm.ª juíza por assente, passando a constar da al. C) dos factos assentes, que “No circunstancialismo de tempo e lugar referidos em B) [tendo esta al. o seguinte teor: No dia 07-03-2009, pelas 07h 45m, na Estrada da Mata Nacional T. 261 S. Pedro de Moel, concelho e comarca de Marinha Grande, ocorreu um acidente em que foi interveniente o veículo automóvel ligeiro de passageiros com a matrícula (...)SN] o veículo era conduzido por B..., tinha como ocupante no banco traseiro C... e circulava no sentido Fonte da Felícia – S.Pedro de Moel”.
Os factos em causa provinham do alegado pela autora nos art.ºs 1.º, 2,º, 3.º, 4.º e 18.º, com o seguinte conteúdo:
 “1. Tal como resulta do auto de ocorrência que se junta e dá aqui integralmente por reproduzido, no passado dia 7 de Março de 2009, pelas 7h45mn, na Estrada da Mata Nacional T. 261 S. Pedro de Moel, concelho e comarca da marinha Grande, ocorreu um acidente de viação.
2. Foi interveniente no acidente o veículo de matrícula (...)SN.
3. Veículo (...)SN que à data era conduzido pelo réu.
4. O veículo SN circulava à data no sentido Fonte da Felícia - S. Pedro de Moel.
(…) 18- No veículo SN era à data transportado como ocupante do banco de trás C...”.
Sendo os transcritos os termos da alegação, contrapôs o réu na contestação:
“1.º- Não é verdade o que se diz na p.i. apresentada pela autora.
2.ª- Não é verdade que no dia 07 de Março de 2009, pelas 7h45mn, na Estrada da Mata Nacional T 261, S. Pedro de Moel, concelho e comarca da Marinha Grande, ocorreu um acidente de viação, da forma descrita na p.i.
(…) 5.º Não é verdade que o réu foi o único e exclusivo culpado do acidente.
6.º- Na verdade, o réu foi obrigado a guinar o seu veículo para a berma, em virtude de lhe ter aparecido um veículo a circular em contramão.
(…) 8.º- Sucede que, ao tentar desviar-se de outro veículo, o Réu perdeu o controlo do seu veículo, entrando em despiste e embatendo no eucalipto que ali se encontrava
9.º- Pelo que se impugna a matéria alegada nos art.ºs 1.º a 17.º”.
Face aos termos da alegação do réu, nomeadamente à luz dos factos por nós destacados, não há dúvida que se encontra plenamente demonstrado por via da confissão judicial espontânea efectuada no articulado em referência, que era aquele o condutor da viatura SN aquando do despiste e subsequente embate no eucalipto (cfr. art.ºs 352.º, 355.º, 356.º, 357.º, n.º 1 e 358.º, todos do Código Civil). Com efeito, a de todo infundamentada alegação de que o Tribunal fez uma “interpretação extensiva” dos termos da alegação, interpretando-a num sentido que não era o pretendido, impõe que se coloque fundadamente a seguinte questão: sendo a declaração[5] efectuada de uma clareza meridiana, com que outro sentido poderia valer? Não o diz o apelante, evidenciando a dificuldade que representa sustentar o insustentável. Deste modo, valendo a declaração com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, consoante dispõe o art.º 236.º do Código Civil, impõe-se sancionar a decisão apelada quando considerou assente por confissão o facto do réu ser o condutor da viatura SN aquando do acidente dos autos.
Ademais, não pode deixar de se assinalar, a censurável tentativa levada a cabo pelo réu de “dar o dito por não dito” aquando da reclamação apresentada contra a selecção dos factos assentes e novamente agora em sede da apelação, é conduta processual que, atendendo ao dever de verdade e lisura que impende sobre as partes, se situa nos limites da boa fé, ou quiçá mesmo para além da fronteira traçada pelo art.º 542.º do CPC.
No que se reporta ao facto do C... seguir na ocasião como ocupante no banco traseiro da viatura, tendo sido alegado no art.º 18.º da petição inicial, sobre ele omitiu o réu pronúncia (cfr. art.ºs 9.º e 11.º da contestação), donde ter o mesmo de se considerar admitido por acordo das partes nos termos precedentemente explanados. E outro tanto pode afirmar-se em relação ao sentido de marcha da viatura, facto também não impugnado, por não servir tal desiderato a fórmula genérica adoptada no transcrito art.º 9.º. Com efeito, surgindo este artigo na sequência dos que o precederam e nos quais o réu alegou factos probatórios divergentes dos alegados pela autora como causa de pedir -impugnação motivada ou “per positionem”- esta genérica negação dos artigos da petição dedicados à dinâmica do acidente terá de se interpretar como respeitando aos aspectos divergentes, do que resulta ter sido correctamente considerado assente por acordo o facto do veículo circular no sentido Fonte da Felícia - S. Pedro de Moel.
Derradeiramente, dá o apelante como violados pelo despacho impugnado os artigos 13.º, 20.º, 202.º, 204.º e 205.º da CRP.
No que respeita ao dever de fundamentação, consagrado no art.º 205.º, já se disse quanto foi tido por pertinente, reiterando-se aqui ter-lhe sido dado cumprimento pela Mm.ª juíza a quo.
No que concerne à violação dos demais preceitos, ocupando-se o art.º 13.º do princípio da igualdade, o art.º 20.º do acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva, o art.º 202.º definindo a função jurisdicional e o art.º 204.º consagrando a proibição da aplicação de normativos que infrinjam normas constitucionais ou princípios constitucionalmente consagrados, não esclarece o apelante porque e em que medida foram tais preceitos e princípios violados pela decisão impugnada, assim impossibilitando a apreciação desta imputada -mas não concretizada- desconformidade à Constituição.
Atento o exposto, mantém-se o despacho impugnado.
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ii. da nulidade da sentença
À semelhança do que se verificou em relação ao despacho que vem de se manter, imputa o recorrente à sentença recorrida o vício extremo da nulidade, por violação do disposto nas als. b), c) e d) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC. Todavia, a despeito da invocação da al. c), atinente à contradição entre os fundamentos e a decisão, nada alega a este respeito, acusando apenas a falta de fundamentação (de facto e de direito) da decisão e ainda a omissão de pronúncia quanto a questões que haviam sido submetidas à cognição do Tribunal, isentando-se todavia de identificar quais as questões cuja apreciação foi omitida.
Como é bom de ver, se o recorrente imputa à sentença diversas nulidades, mas não as concretiza, situando-as e identificando-as tendo por referência os concretos fundamentos dela constantes, fica este Tribunal de recurso impedido de as apreciar, por não lhe caber escrutinar a decisão tendo em vista a identificação de eventuais vícios de que padeça, já que as nulidades taxativamente elencadas no art.º 615.º não são de conhecimento oficioso. Por assim ser, é inconsequente a mera invocação da al. c) do n.º 1 do art.º 615.º -nela se prevendo como causa de nulidade da sentença a oposição entre os fundamentos e a decisão- se não se aponta a contradição em que o julgador incorreu. Do mesmo passo, se não se identifica, dentre as questões suscitadas, qual ou quais não foi(ram) objecto da decisão, não cabe a este Tribunal tentar adivinhar a que é que o apelante pretende referir-se.
Quanto à nulidade decorrente da falta de fundamentação, já se disse (supra i.) que o dever de fundamentação da decisão corresponde a uma exigência constitucional. Todavia, conforme sem dissêndio vem sendo entendido -entendimento que mantém plena actualidade face à redacção da al. b) do art.º 615.º agora em vigor, uma vez que reproduziu, sem alterações, a disposição cessante, antes contida na al. b) do n.º 1 do art.º 668.º do CPC- só a absoluta, que não a deficiente ou pouco persuasiva fundamentação, recai na previsão legal. Assim, para que se verifique o vício da falta de fundamentação, exige a lei que tenham sido de todo omitidas as razões (de facto e/ou de direito) que conduziram à prolação daquela concreta decisão (v., por todos, aresto do STJ de 15/12/2011, processo n.º 2/09.9 TTLMG.P1S1 e desta mesma Relação de 17/4/2012, processo n.º 1483/09.9 TBTMR, ambos disponíveis em www.dgsi.pt).
Revertendo ao caso dos autos, da mera leitura da sentença proferida se conclui que a mesma não padece do imputado vício, uma vez que a Mm.ª juíza “a quo”elencou com clareza e precisão os factos por si julgados assentes com relevância para a questão a decidir, tendo justificado a sua convicção, e explicitou, de modo igualmente claro e proficiente as razões de direito pelas quais julgou assistir à autora seguradora o direito de regresso que por via da presente acção pretendeu exercitar. Daí que a decisão proferida não padeça do vício da falta de fundamentação, que pressupõe, como se disse, a sua absoluta ausência.
Improcede, pelo exposto, também este fundamento recursivo.
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iii. do erro de julgamento quanto à matéria de facto
O apelante impugnou a decisão proferida sobre a matéria de facto, pretendendo ter existido erro na consideração como assentes dos factos vertidos nos pontos 2., 4., 5., 6., 7., 8. e 9., dada a insuficiência da prova produzida e relevada pela Mm.ª juíza para sustentar um juízo positivo.
Estão em causa os seguintes factos:
“2. No circunstancialismo de tempo e lugar referidos em 1., o veículo era conduzido por B..., tinha como ocupante no banco traseiro C... e circulava no sentido Fonte da Felícia – S. Pedro de Moel (al. C).
4. Atento o sentido de marcha do veículo, a via descreve uma primeira curva que se desenha para a esquerda, seguida de uma outra curva que se desenha para a direita (al. D).
5. Ao descrever a primeira curva para a esquerda o Réu saiu da via de rodagem em que até então circulava e entrou na berma direita atento o seu sentido de marcha (resposta ao art.º 1.º).
6. O veículo automóvel ligeiro de passageiros com a matrícula (...)SN embateu com a lateral direita num eucalipto sito na berma direita, atento o seu sentido de marcha (al. E).
7. Após o que percorreu pela dita berma direita uma distância de 11,20m, indo colidir de frente num outro eucalipto que ali se situa, ficando o veículo imobilizado ocupando com a frente a berma direita atento o seu sentido de marcha e a traseira atravessada em diagonal ocupando a hemi-faixa de rodagem direita atento o seu sentido de marcha (al. F).
8. Efectuado o rastreio ao réu a substâncias psicotrópicas, veio este teste a revelar a presença de resíduos de cocaína, e efectuado exame à existência de álcool, veio este a determinar que o Réu era, na altura do acidente, portador de uma taxa de alcoolemia superior a 1,49g/l (resposta positiva aos art.ºs 2.º e 3.º).
9. Os factos referidos em 8. afectavam a coordenação das funções de sensação, percepção e motoras do réu ao nível do córtex cerebral, do campo visual, do equilíbrio, diminuindo os tempos de reacção e impedindo a percepção de distâncias (resposta positiva aos art.ºs 4.º e 5.º)”.
Apreciemos então os fundamentos da impugnação que pelo apelante foi endereçada à decisão proferida.
No que respeita ao facto constante do ponto 2. já se disse (supra i.) que o mesmo resultou plenamente demonstrado pela confissão judicial do réu no que respeita à identidade do condutor do veículo SN aquando do acidente e assente por acordo das partes quanto ao mais ali referido, pelo que se remete para a fundamentação então expendida em confirmação do despacho que indeferiu a reclamação oportunamente apresentada contra a selecção dos factos assentes.
Quanto aos factos descritos nos pontos 4., 6. e 7., provêm da alegação da autora nos artigos 5.º, 8.º, 9.º e 10.º da petição inicial, tendo ingressado no elenco dos factos assentes sem que o réu dessa inclusão haja oportunamente reclamado. Tais factos, tal como então foi correctamente considerado, encontram-se plenamente provados pela confissão do réu constante do articulado da contestação, especificamente nos seus art.ºs 4.º e 8.º, nos quais alegou não corresponder à verdade que o acidente, “nomeadamente a perda do controlo e saída do veículo SN da via e entrada na berma com a correspondente colisão nos dois eucaliptos se ficou a dever ao facto de conduzir, não só sob o efeito de substâncias psicotrópicas, como pelo facto de conduzir com uma taxa de alcoolemia de 1,49 gr/l” e “que ao tentar desviar-se do outro veículo, perdeu o controlo do seu veículo, entrando em despiste e embatendo no eucalipto que ali se encontrava”. Ou seja, não impugnando os factos de ter perdido o controlo do veículo que, em consequência, entrou na berma, embatendo num eucalipto que ali se encontrava e, de seguida num segundo, o réu alegou outros, tendentes a afastar a sua culpa, mais refutando a invocada existência de um nexo causal entre a taxa de alcoolemia e as substâncias psicotrópicas encontradas no seu organismo e o acidente.
Face à descrita posição processual assumida pelo réu, e valendo aqui quanto se deixou dito a propósito do valor probatório da confissão judicial, bem andou a Mm.ª juíza que procedeu à selecção dos factos assentes em neles incluir os agora descritos na sentença sob os n.ºs 4., 6. e 7., os quais não foram objecto de instrução nem tinham que o ser, por há muito se terem como demonstrados. Não assiste assim razão ao réu quando impugna a decisão proferida sobre a matéria de facto no que a estes concretos pontos diz respeito.
No que concerne aos impugnados factos vertidos nos pontos 5., 7. e 9., e para o que aqui releva, fundamentou a Mm.ª juíza “a quo” a sua convicção do seguinte modo:
“Os factos acima descritos resultam da análise conjugada dos seguintes meios de prova:
A) Depoimentos que se me afiguraram sérios e isentos das testemunhas:
- F..., guarda da GNR que exerceu funções no posto territorial de S. Pedro de Moel de Abril de 2007 a Maio de 2009, tendo no exercício de tais funções tomado conta da ocorrência do acidente e elaborado o auto de participação que faz fls. 19 a 22;
- D..., pai de C..., quer quanto às consequências que as sequelas do acidente implicaram na vida do filho, estado em que o mesmo se encontra e quantias recebidas da autora, como também quanto aos vestígios existentes no local do acidente, por ser bombeiro socorrista e, nessa qualidade, sem saber sequer que o seu filho era um dos sinistrados, acorreu ao mesmo onde prestou auxílio ao réu;
(…)
- H... médico, perito médico-legal, o qual, em confronto com os resultados clínicos de fls. 157, nos explicou os mesmos, designadamente o estado de alcoolemia à hora do acidente, por referência à hora da colheita que consta do referido documento, bem como consequências físicas e psíquicas resultantes de tal grau de alcoolemia;
B) Teor dos seguintes documentos:
- Participação do acidente a fls. 19 a 22;
(…)
- Relatório do serviço de toxicologia forense do Instituto de Medicina Legal a fls. 157.
Passando à análise crítica dos meios de prova acima descritos (…) quanto aos factos relacionados com a forma como ocorreu o acidente, mormente a conduta do réu, facto 5. e correspondentes factos não provados constantes das alíneas c) e d) [os quais contemplavam a versão do apelante quanto ao surgimento de um veículo circulando em contramão que o teria obrigado a guinar para a berma na realização de manobra de recurso, daí resultando a perda de controlo da viatura que conduzia], resultou dos depoimentos das testemunhas F... e D..., bem como do teor do croquis de fls. 21, cujo teor foi confirmado pelo primeiro. Destes depoimentos e deste documento não resulta a intervenção de qualquer outro veículo para além do veículo SN, sendo certo que a testemunha F... referiu que, aquando da elaboração da participação, nada foi referido também a esse respeito, e que se o tivesse sido constaria da mesma participação.
Quanto à matéria relacionada com as substâncias e taxa de álcool de que o réu era portador na altura do acidente, resulta a mesma do documento do serviço de toxicologia forense do Instituto de Medicina Legal a fls. 157, o qual nos foi explicado pela testemunha H..., designadamente no que se refere à existência de resíduos de cocaína e ao facto de, tendo sido a colheita de sangue feita às 11 horas, implicar que à hora a que se deu o acidente, recorrendo a cálculos matemáticos, mormente à fórmula de Lorenz[6], necessariamente tal grau de alcoolemia atingiria valores superiores.
A mesma testemunha H... fundamenta o facto 9., uma vez que nos explicou as consequências físicas e psíquicas que acarreta o grau de alcoolemia de que o réu era portador, o que, em face da sua razão de ciência, nos ofereceram segurança e credibilidade (…)”.
Argumenta o apelante que os indicados meios de prova são insuficientes para sustentar a decisão proferida, já que, por um lado, ninguém presenciou o acidente e, quanto ao dado como provado grau de alcoolemia, porque não é seguro que ele se verificasse na ocasião do acidente, dada a possibilidade de explicações alternativas que enuncia.
Pois bem, a este propósito cabe relembrar que vigoram no nosso sistema processual civil os princípios da imediação, oralidade e concentração e, em estreita ligação com estes, o da livre apreciação da prova, significando que o julgador deve decidir segundo a sua íntima convicção, formada no confronto dos diversos meios de prova e de acordo com as máximas da experiência que forem aplicáveis[7]. De notar ainda que ao nível do funcionamento deste último princípio, não se exige ao juiz que atinja um grau de absoluta certeza, que o conhecimento humano raramente atinge, bastando-se a lei com a formulação de um juízo de suficiente probabilidade ou verosimilhança sobre a realidade do facto alegado, que o recurso às presunções judiciárias por natureza implica.[8]
Aplicando quanto vem de se dizer ao caso que nos ocupa, afigura-se que o julgamento efectuado pela Mm.ª juíza “a quo” sobre a realidade dos factos em discussão encontra apoio na prova produzida, sendo de sancionar as inferências dela extraídas. Explicitando:
Não se questiona que não foram apresentadas testemunhas oculares do acidente. Todavia, estando assente que a testemunha F..., soldado da GNR, se deslocou ao local e percepcionou quanto fez constar do croquis elaborado, tal como confirmou em audiência, estamos perante elementos objectivos que, conjugados com outros meios de prova e recurso às regras da experiência convocáveis, permitem concluir que, com grande probabilidade, o réu “Ao descrever a primeira curva para a esquerda saiu da via de rodagem em que até então circulava e entrou na berma direita atento o seu sentido de marcha”.
Com efeito, assente o sentido de marcha em que a viatura SN circulava e a configuração da via no local onde ocorreu o acidente -curva à esquerda e contracurva- detectados sinais de embate da viatura num primeiro eucalipto situado na berma direita atento o mesmo sentido e, depois, num segundo, afastado daquele 11,20 mt, junto ao qual o veículo se quedou imobilizado -factos objectivos directamente percepcionados pela testemunha F...quando se deslocou ao local e que fez constar do croquis- é meramente consequente a conclusão de que, ao descrever aquela primeira curva, o veículo saiu da via e entrou na berma direita.
Os referidos elementos foram igualmente mencionados pela testemunha D..., pai do sinistrado C..., que acorreu ao local no desempenho da sua função de bombeiro voluntário, desconhecendo que seu filho era interveniente no mesmo acidente, facto de que apenas tomou conhecimento já no hospital.
Acresce que, se atentarmos nos registos fotográficos de fls. 158 a 163, evidentes são as marcas na lateral direita do veículo -em toda a lateral direita- revelando o embate no primeiro eucalipto e o sentido em que a viatura se movimentava, e o segundo choque, frontal, mas incidindo mais sobre a metade direita, na segunda árvore junto da qual se imobilizou. Se a todos estes indícios objectivos juntarmos o relato da testemunha D...que, não obstante se tratar do pai do sinistrado C..., prestou depoimento consistente e convincente, não denunciando qualquer azedume em relação ao aqui réu, atinge-se com segurança a conclusão que este perdeu o controle do veículo na primeira curva, embatendo no primeiro eucalipto, após o que percorreu os cerca de 11 mt que o separavam do segundo, no qual veio a embater frontalmente, aqui se imobilizando, tal como foi considerado provado. E que tudo isto ocorreu sem a intervenção de qualquer veículo terceiro denunciou-o o próprio réu à mencionada testemunha quando revelou preocupação pelo estado do companheiro -desconhecendo que o identificado D... era o progenitor deste, tal como a testemunha desconhecia então que seu filho era o companheiro a que aquele se referia-, declarando sentir-se responsável por causa da velocidade a que seguia e silenciando qualquer referência a um veículo terceiro, como seguramente teria feito caso tal correspondesse à verdade.
Em suma, face aos elementos probatórios referidos e ponderados pela Mm.ª juíza “a quo” é indubitavelmente de confirmar o julgamento feito sobre o facto impugnado constante da sentença sob o n.º 5.
Quanto aos pontos 8. e 9., está em causa, como ponto de partida, o exame toxicológico efectuado ao réu pelas 11:00 h do dia em que ocorreu o acidente, cujo relatório se encontra certificado a fls. 157 dos presentes autos. É certo que o réu impugnou o documento em causa mas, não tendo invocado a sua falsidade, a impugnação reporta-se apenas ao respectivo conteúdo, sendo certo que agora, em sede de recurso, não questionando o resultado da análise efectuada, apenas põe em causa que a TAS acusada, ou superior, se verificasse à data do acidente, conforme foi dado como provado.
Não tendo sido questionado nos autos o valor extraprocessual da perícia (cf. art.º 421.º do CPC, reproduzindo sem alteração relevante[9] o seu predecessor art.º 522.º), a verdade é que, mesmo no domínio da prova pericial, vigora o princípio da livre apreciação (cfr. art.º 389.º, este pertencendo ao Código Civil). Daqui não se segue, porém, que o juiz possa, de forma arbitrária, recusar, sem mais, o resultado da perícia. Com efeito, “(…) convém não esquecer o peculiar objecto a prova pericial: a percepção ou averiguação de factos que reclamem conhecimentos especiais que o julgador comprovadamente não domina (art.º 388 do Código Civil).
(…) Deste modo, se os dados de facto pressupostos estão sujeitos à livre apreciação do juiz – já o juízo científico que encerra o parecer pericial, só deve ser susceptível de uma crítica material e igualmente científica. Deste entendimento das coisas deriva uma conclusão expressiva: sempre que entenda afastar-se do juízo científico, o tribunal deve motivar com particular cuidado a divergência, indicando as razões pelas quais decidiu contra essa prova ou, pelo menos, expondo os argumentos que o levaram a julgá-la inconclusiva (art.º 653 nº 2 e 659 nº 2, in fine, do CPC). Dever que deve ser cumprido com particular escrúpulo no tocante a juízos científicos dotados de especial densidade técnica ou obtidos por procedimentos cuja fiabilidade científica seja universalmente reconhecida”[10].
Sendo este o entendimento que cremos correcto e se perfilha, igualmente correcta e justificada a decisão da Mm.ª juíza ao acolher o conteúdo da perícia, que nenhum elemento probatório infirmou.
Quanto ao mais que no aludido ponto 8. se refere, e ainda no também impugnado ponto 9., a convicção da Mm.ª juíza “a quo” estribou-se no depoimento da testemunha H.... A despeito de estarmos perante prova testemunhal, aqui vigorando igualmente o princípio da liberdade plena na sua apreciação (cfr. art.º 396.º do Código Civil), trata-se de testemunho qualificado, atendendo à formação profissional do seu autor, médico com formação específica em medicina legal. E tais conhecimentos reforçaram naturalmente o valor probatório dos esclarecimentos que, com exemplar clareza prestou, bastando ouvir para compreender. Resultou assim evidente que, apresentando o réu a apurada taxa de 1,49 gr/lt às 11:00 horas, aquando da ocorrência do acidente, cerca de 3 h antes, a taxa teria que ser necessariamente superior, uma vez que o etanol é expelido através da respiração, existindo fórmulas com validade cientificamente comprovada, tal como a de Arbenz -utilizada pela testemunha nos cálculos efectuados em plena audiência- que permitem o seu apuramento. É claro que, conforme igualmente esclareceu, a velocidade de eliminação do etanol e, consequentemente, os cálculos realizados, poderão ser -e são- influenciados por factores associados à condição do portador, mas o que não sucede seguramente é a taxa de alcoolemia ser inferior àquela que se apurou no exame.
Por outro lado, podendo ser colocadas diversas hipóteses, conforme o apelante fez em sede de recurso -pode o réu ter ingerido bebidas alcoólicas após o acidente e antes da realização do teste; poder ter ingerido bebidas antes do acidente e continuar a ingeri-las após; pode a colheita de sangue ter sido incorrectamente levada a cabo; pode ter problemas cardiovasculares que não possibilitem a perda de álcool circulante nos termos normais- não é menos certo que nada disso se apurou ou sequer foi oportunamente alegado. Acresce que, conforme se referiu já, não é exigível que a convicção do julgador equivalha a uma certeza absoluta, bastando-se a lei com a formulação de um juízo de probabilidade ou verosimilhança que valide os factos em discussão. Deste modo, não se tendo indiciado a verificação de qualquer circunstância capaz de interferir na sequência lógica daqueles que se conhecem, válida a inferência extraída pela Mm.ª juíza “a quo” no sentido de, aquando do acidente, o réu ser portador de uma tas que seria seguramente superior aos 1,49 gr/l que apresentava 3 horas depois.
E quanto às repercussões que tal taxa de alcoolemia necessariamente teria ao nível físico, neurológico e psíquico do seu portador foi igualmente relevante e esclarecedor o testemunho que se aprecia. De notar, a este respeito que, conforme esclareceu, uma TAS de 1,49 gr/l corresponde já a uma intoxicação etílica grave, posto que a partir de 1,50 gr/l se entra numa situação de pré-coma, sendo de destacar as alterações produzidas ao nível da consciência e afectação dos sentidos, com prejuízo da percepção espácio-temporal e lentificação dos tempos de reacção a situações de emergência. Aliás, que o álcool afecta a condução é um facto comummente conhecidos, havendo naturalmente razões válidas para que o exercício da actividade de conduzir esteja legalmente interditada ao portador de uma TAS superior a 0,5 gr/lt (vide art.º 81.º do CE), entrando-se mesmo no domínio do ilícito criminal quando tal taxa ultrapasse 1,2 gr/l (cf. art.º 292.º, n.º 1 do CP).
Atento o que se deixou dito, e secundando-se o juízo sobre os factos impugnados formulado pela Mm.ª juíza “a quo”, por adequado à prova produzida e consentâneo com as regras da experiência que o caso convoca, mantém-se inalterada a decisão a este propósito proferida.
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II. Fundamentação
De facto
Imodificada a decisão proferida sobre a matéria de facto, são os seguintes os factos a considerar:
1. No dia 07-03-2009, pelas 07h45mn, na Estrada da Mata Nacional T 261 S. Pedro de Moel, concelho e comarca da marinha Grande, ocorreu um acidente em que foi interveniente o veículo automóvel ligeiro de passageiros com a matrícula (...)SN.
2. No circunstancialismo de tempo e lugar referidos em 1., o veículo era conduzido por B..., tinha como ocupante no banco traseiro C... e circulava no sentido Fonte da Felícia – S. Pedro de Moel.
3. No local o pavimento da via é em betuminoso, em mau estado de conservação e com uma largura de 5.60m.
4. Atento o sentido de marcha do veículo, a via descreve uma primeira curva que se desenha para a esquerda seguida de uma outra curva que se desenha para a direita.
5. Ao descrever a primeira curva para a esquerda o Réu saiu da faixa de rodagem em que até então circulava e entrou na berma direita, atento o seu sentido de marcha.
6. O veículo automóvel ligeiro de passageiros com a matrícula (...)SN embateu com a lateral direita num eucalipto sito na berma direita, atento o seu sentido de marcha.
7. Após o que percorreu pela dita berma direita uma distância de 11,20m, indo colidir de frente num outro eucalipto que ali se situa, ficando o veículo imobilizado ocupando com a frente a berma direita atento o seu sentido de marcha e a traseira atravessada em diagonal ocupando a hemi-faixa de rodagem direita atento o seu sentido de marcha.
8. Efectuado o rastreio ao réu a substâncias psicotrópicas, veio este teste a revelar a presença de resíduos de cocaína; efectuado exame à existência de álcool, veio este a determinar que o Réu era, na altura do acidente, portador de uma taxa de alcoolemia superior a 1,49g/l.
9. Os factos referidos em 8. afectavam a coordenação das funções de sensação, percepção e motoras do réu ao nível do córtex cerebral, do campo visual, do equilíbrio, diminuindo os tempos de reacção e impedindo a percepção de distâncias.
10. Na sequência do acidente o C... foi transportado para o Hospital de S.to André, em Leiria, apresentando traumatismo cranioencefálico com EG 4, hematúria macroscópica e feridas que haviam sido suturadas, bem como múltiplos focos de contusão e edema cerebral, encontrando-se em coma, com suporte ventilatório.
11. A partir de 05.06.2009, C... foi internado no Centro Hospitalar N. Sra. da Conceição, sito na Batalha e, posteriormente, em 06.07.2009 deu entrada no Centro de Medicina Reabilitação da Região Centro - Rovisco Pais.
12. Em consequência das lesões referidas em 10. C... está totalmente acamado, não anda, não fala, não come nem bebe sozinho, faz todas as necessidades fisiológicas numa fralda, não tem qualquer controlo sobre a sua pessoa e necessita de um terceiro 24 horas por dia a tratar dele.
13. O espaço habitacional em que C... passou a viver teve que ser adaptado ao seu estado, com eliminação de barreiras arquitectónicas que impedissem a circulação de eventual cadeira de rodas ou de cama articulada, sem desníveis, e com necessidade de todas as portas da habitação serem alargadas e as instalações sanitárias adequadas.
14. C..., mercê das sequelas decorrentes do acidente, tem necessidade de cuidados hospitalares, médicos e de medicamentos, dos quais irá necessitar até ao fim da sua vida.
15. C... nasceu em 26-06-1984 e é filho de D... e de E....
16. A autora é uma companhia seguradora que, no âmbito da sua actividade, segurou através da apólice n.º0045.10.420678, o veículo automóvel com a matrícula (...)SN, da marca Mercedes-Benz, modelo Classe C 220CDI.
17. I... foi nomeada curadora especial a C....
18. C..., representado pelos seus pais D... e E..., intentou contra a A..., S.A. procedimento cautelar de arbitramento de reparação provisora, que correu termos sob o n.º 1006/09.0TBMGR junto do 1º Juízo do Tribunal Judicial da Marinha Grande, sendo a aqui autora condenada a pagar, com efeitos a partir de 3 de Agosto de 2009, a renda mensal de setecentos e cinquenta euros até ao dia 8 de cada mês, a título de reparação provisória, até ao trânsito em julgado da sentença que for proferida nos autos da acção principal a instaurar.
19. No âmbito dos autos de acção ordinária que correram os seus termos junto do 2º Juízo do Tribunal Judicial da Marinha Grande sob o n.º1569/09.0TBMGR, I..., agindo como curadora especial de C..., acordou com a A..., S.A.: a autora, relativamente à ré A..., reduz o pedido formulado nos autos à quantia de 775.00,00€; com o recebimento da quantia atrás mencionada a autora dá plena e total quitação a todos os danos, patrimoniais e não patrimoniais, presentes e futuros, decorrentes do acidente em apreço nos autos, no que concerne à A....
20. Em consequência dos factos referidos em 12, 14 e 16 a autora pagou:
a) em 08.de Abril de 2009 à Turiscar – 939,60€;
b) em 27 de Julho 2009, aos progenitores do C... em cumprimento da sentença de arbitramento, a quantia de 1.500,00€;
c) em 15 de Outubro de 2009, a I... – 1.500,00€;
d) em 07 de Dezembro de 2009, a I... – 750,00€;
e) em 07 de Janeiro de 2010, a I... – 750,00€;
f) em 08 de Fevereiro de 2010, a I... – 750,00€;
g) em 08 de Março de 2010, a I... – 750,00€;
h) em 07 de Abril de 2010, a I... – 750,00€;
i) em 07 de Maio de 2010, a I... – 750,00€;
j) em 07 de Junho de 2010, a I... – 750,00€;
l) em 07 de Julho de 2010, a I... – 750,00€;
m) em 09 de Agosto de 2010, a I... – 750,00€;
n) em 07 de Setembro de 2010, a I... – 750,00€;
o) em 07 de Outubro de 2010, a I... – 750,00€;
p) em 08 de Novembro de 2010, a I... – 750,00€;
q) em 17 de Dezembro de 2010, a I... – 750,00€;
r) em 07 de Janeiro de 2011, a I... – 750,00€;
s) em 07 de Fevereiro de 2011, a I... – 750,00€;
t) em 07 de Março de 2011, a I... – 750,00€;
u) em 07 de Abril de 2011, a I... – 750,00€;
v) em 09 de Maio de 2011, a I... – 750,00€;
x) em 23 de Julho de 2009, ao Centro de Medicina e Reabilitação da Região Centro Rovisco Pais – 31,00€;
z) em 28 de Junho de 2010, a I... – 25.000,00€;
aa) em 14 de Setembro de 2010, à Irmandade da Santa Casa da Misericórdia Batalha – 1.646, 73€;
ab) em 07 de Abril de 2011, a I... – 775.000,00€;
ac) em 02 de Maio de 2011, a I... – 10.544,10€;
ad) em 16 de Junho de 2011, ao Centro Hospitalar de Coimbra EPE – 23.220,10€;
ae) em 17 de Junho de 2011, à Irmandade da Santa Casa da Misericórdia da Batalha – 9.230,36€;
af) em 22 de Junho de 2011, ao Centro de Medicina de Reabilitação da Região Centro Rovisco Pais – 75.206,50€;
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De Direito
iv. do erro de julgamento quanto à verificação do nexo causal entre a TAS e a ocorrência do acidente
Tal como referido na sentença apelada, por via da presente acção pretende a autora exercer o direito de regresso que lhe é conferido pelo art.º 27.º n.º 1, al. c) do DL 291/2007 e assim obter a condenação do réu no pagamento das quantias que despendeu ao abrigo do contrato de seguro titulado pela apólice nº 0045.10.420678, nos termos do qual assumiu a responsabilidade civil decorrente de acidentes de viação em que interviesse o veículo de matrícula (...)SN.
Assente nos autos que o acidente se deu no dia 7 de Março de 2009, resulta indiscutida a aplicação ao caso do mencionado diploma, então já em vigor (cf. art.º 95.º ).
Nos termos do convocado preceito, satisfeita a indemnização, a empresa de seguros tem direito de regresso, para o que aqui importa, “contra o condutor, quando este tenha dado causa ao acidente e conduzir com uma taxa de alcoolemia superior à legalmente admitida, ou acusar consumo de estupefacientes ou outras drogas ou produtos tóxicos” (cfr. al. c) do n.º 1 do convocado art.º 27.º).
Conforme a Mm.ª juíza “a quo” deu conta na decisão recorrida, tendo a pretérita al. c) do art.º 19.º do DL 522/85, de 31/12 (a que historicamente sucedeu a al. c) do n.º 1 do art.º 27.º agora em vigor), dado origem a desencontradas interpretações doutrinárias e jurisprudenciais, veio o STJ a fixar jurisprudência no sentido de que “a alínea c) do artigo 19.º do Decreto-Lei n.º 522/85, de 31 de Dezembro, exige para a procedência do direito de regresso contra o condutor por ter agido sob influência do álcool o ónus da prova pela seguradora do nexo de causalidade adequada entre a condução sob o efeito do álcool e o acidente”.
Sendo este o estado de coisas aquando da entrada em vigor do DL 291/2007, iniciada a vigência deste diploma e notada a diferente redacção da correspondente al. c) do n.º 1 do art.º 27.º, reacendeu-se de pronto a antiga discussão, dando origem a duas correntes jurisprudenciais distintas, uma defendendo a continuidade da solução consagrada no acórdão uniformizador, a segunda defendendo ter o legislador querido, de caso pensado, com ela romper, sendo agora factos constitutivos do direito de regresso da seguradora, tão somente: “a) ser o condutor o culpado pela eclosão do acidente (tenha dado causa ao acidente); e b) estar etilizado em medida superior ao legalmente permitido (conduzir com uma taxa de alcoolemia superior à legalmente admitida)”[11].
Ora, tendo para nós que a interpretação mais consentânea com a letra do preceito -ponto de partida do intérprete e seu limite na busca e reconstituição do pensamento legislativo, de harmonia com as regras estabelecidas no art.º 9.º do Código Civil- é aquela que defende que, circulando o condutor com uma taxa de alcoolemia superior à legalmente admitida e tendo dado causa ao acidente, tanto basta para que à seguradora assista o direito de regresso[12], e também porque, num país como o nosso, com elevadíssimos níveis de sinistralidade, frequentemente associada à etilização dos condutores, é de crer ter sido vontade do legislador privilegiar o poder dissuasor da solução assim consagrada (cf. n.º 1 do referido art.º 9.º, na sua parte final), a verdade é que, no caso vertente, a Mm.ª juíza “a quo” perfilhou a tese mais restritiva -logo, mais favorável ao réu- formulando a exigência da prova do nexo causal entre o estado de alcoolemia e o acidente. E tendo dado como demonstrado o -assim entendido como necessário- nexo causal, condenou o agora apelante a reembolsar a autora/apelada.
Assim vistas as coisas, logo se intui que a divergência do apelante com a sentença recorrida não se coloca ao nível da interpretação jurídica da predita al. c) do n.º 1 do art.º 27.º, centrando-se antes na dada como demonstrada existência do nexo causal, colocando-se portanto, ainda aqui, ao nível dos factos.
No que respeita às concretas circunstâncias em que ocorreu o acidente, encontra-se provado que, atento o sentido de marcha da viatura SN, na ocasião conduzida pelo réu, a via descreve uma curva para a esquerda seguida de uma outra curva para a direita. Mais se apurou que, ao descrever aquela primeira curva, o réu saiu da faixa de rodagem e entrou na berma direita, vindo a embater com a lateral direita do veículo num eucalipto sito na referida berma, após o que percorreu uma distância de 11,20 metros, colidindo de frente num outro eucalipto, ficando depois imobilizado com a frente na berma direita e a traseira atravessada em diagonal, ocupando a hemi-faixa de rodagem direita atento o sentido de marcha em que seguia.
Face a tal circunstancialismo, e sabendo-se ser o réu portador, na ocasião, de taxa superior a 1,49 gr/lt, que afectava a coordenação das funções de sensação, percepção e motoras ao nível do córtex cerebral, do campo visual, do equilíbrio, diminuindo os tempos de reacção e impedindo a percepção de distâncias, é de concluir, não só que deu causa ao acidente, como aquele seu estado teve influência na eclosão do mesmo, segundo presunção judiciária que ao julgador não está vedado recorrer. E foi precisamente esta inferência que a Mm.ª juiz licitamente extraiu daqueles factos conhecidos, estabelecendo o nexo causal, em sentido naturalístico, entre a taxa de alcoolemia de que o réu era portador e o evento danoso.
Conforme vem sendo entendido, ao que cremos sem dissêndio, no apuramento do nexo causal é válida a prova por presunção judicial, a partir das circunstâncias concretas provadas, designadamente da taxa de alcoolemia. Na verdade, “Se é certo que a mera prova da taxa de alcoolemia é insuficiente para se considerar provado o nexo de causalidade, isso não implica que, em termos de apreciação crítica dos factos relevantes, o juiz esteja impedido de os relacionar e de, reportando-se aos factos em apreço, pela forma como ocorreu determinado acidente e em face da inexistência de outra explicação razoável, conclua por aquele nexo. Trata-se afinal de inferir factos desconhecidos a partir de factos conhecidos (artigo 349º CC). O nexo de causalidade entre o álcool e o acidente afere-se da conjugação de diversos elementos, designadamente a prova testemunhal produzida, a própria dinâmica do acidente, o grau de alcoolemia registado, com os elementos científicos irrefutáveis, as regras da experiência, as normas legais aplicáveis e a teleologia do legislador subjacente às normas”[13].
Assente, pois, que nada impedia o recurso a presunções judiciais para estabelecer o referido nexo de causalidade entre a comprovada condução sob a influência do álcool e o acidente de viação causado com culpa pelo réu, a verdade é que, tal como se concluiu na sentença apelada, atendendo à factualidade apurada, nada mais justifica razoavelmente a perda de controlo do veículo por parte do réu, com o consequente despiste e sucessivos embates nos eucaliptos situados na berma direita da via por onde circulava.
Queixa-se o recorrente pelo facto da Mm.ª juiz não ter ponderado a possibilidade do acidente ter ocorrido ainda que não se encontrasse etilizado, atendendo aos apurados configuração e estado da via. Ora, não se desprezando tais elementos, a verdade é que a estreiteza da via e o mau estado do pavimento são circunstâncias a impor maior precaução ao condutor prudente, não sendo susceptíveis de, por si, justificarem o despiste, ao invés do que ocorre com a referida etilização do condutor, que dele constitui causa explicativa razoável e bastante. Acresce que nada impõe ou justifica que o juiz pondere atribuir o acidente a uma qualquer causa desconhecida, sem quaisquer indícios da sua existência, postergando a presença de uma elevada taxa de alcoolemia, facto com aptidão para justificar o evento[14].
Atento o exposto, e porque a matéria de facto apurada valida e suporta a conclusão de que, no caso concreto, a taxa de alcoolemia foi causa concreta daquele acidente e que o mesmo foi causado com culpa pelo réu apelante, fosse qual fosse o entendimento tido por correcto a propósito dos pressupostos do direito de regresso pela autora e sempre haveriam de se ter por verificados.
Improcedem assim as conclusões i. a xxx.
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Derradeiramente, dá o apelante como violadas as disposições contidas nos art.ºs 16.º, 17.º, nº 1, 18.º, n.º 1, 45.º, n.º 3, 325.º e 498.º, n.º 3 do Código Civil, artigos 152.º, 154.º, 411.º, 615.º, alíneas b), c) e d) do Código do Processo Civil, art.º 6.º da CEDH e, por último, os art.ºs 13.º, 20.º, 202.º, 204.º e 205.º, estes da Constituição da República Portuguesa.
A propósito desta imputação, impõe-se chamar a atenção para o óbvio: só se verifica violação de determinado normativo se o mesmo foi indevidamente aplicado ou omitida a sua aplicação, quando devida. E nenhuma destas hipóteses se verifica no caso vertente, tendo-se o recorrente limitado a invocar a violação de disposições legais dispersas, sem qualquer preocupação de rigor, tratando-se de normativos em tudo estranhos à matéria em discussão (casos dos art.ºs 16.º, 17.º, 18.º e 45.º, n.º 3 do CC, que são normas de conflitos), aqui chamando inclusivamente à colação o art.º 325.º e o n.º 3 do art.º 498.º do mesmo CC, que se reportam à prescrição, questão que, por não ter sido versada no recurso, se mostra decidida com trânsito em julgado.
Quanto aos preceitos pertencentes ao CPC, sendo de todo impertinente a invocação dos art.ºs 152.º e 411.º, nada há, a este propósito, que referir. No que se reporta aos art.ºs 154.º, este consagrado ao dever de fundamentação das decisões, e 615.º, que se ocupa das causas de nulidade da sentença, trata-se de questão já apreciada, remetendo-se para quanto então se expendeu.
No concernente à assacada violação do art.º 6.º da CEDH, consagrando o direito a um processo equitativo, não se vê, nem o apelante o diz, em que é que não foi observado, antes resultando dos autos que teve oportunidade de se defender da pretensão deduzida pela autora, de oferecer e produzir os meios de prova tidos por pertinentes, exercendo agora o seu direito ao recurso perante tribunais independentes, em tudo se mostrando assegurado o referido direito.
Quanto às invocadas desconformidades à Lei Fundamental:
No que se reporta à invocação do princípio da igualdade, consagrado no art.º 13.º na CRP, não se vê -nem o recorrente o diz- em que dimensão terá resultado violado pela decisão recorrida, afigurando-se completamente destituída de sentido tal imputação de inconstitucionalidade.
Epigrafado de “acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva”, proclama o art.º 20.º que “a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça a ser denegada por insuficiência de meios económicos” (cf. n.º 1). Emanação deste princípio é a garantia de um processo equitativo, que se concretiza na igualação das partes, seja em termos de garantia do contraditório, seja dos meios de defesa colocados à disposição de cada uma.
No artigo 20.º da Constituição está assim consagrado "o direito a uma solução jurídica dos conflitos, a que se deve chegar em prazo razoável e com observância de garantias de imparcialidade e independência, possibilitando-se, designadamente, um correcto funcionamento das regras do contraditório, em termos de cada uma das partes poder deduzir as suas razões (de facto e de direito), oferecer as suas provas, controlar as provas do adversário e discretear sobre o valor e resultado de umas e outras" (cf., entre outros, Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 540/97, acessível no site do itij www.dgsi.pt).
No caso em apreço, verifica-se ter sido dado pleno cumprimento ao contraditório, tendo-se o requerido pronunciado sobre a pretensão deduzida pela autora e cada um dos requerimentos apresentados, incluindo os meios de prova por esta oferecidos, tendo-lhe sido dada a oportunidade, de que se prevaleceu, de indicar e produzir os meios de prova tidos por pertinentes. É certo que a decisão a final proferida não lhe foi favorável mas daí não se segue que tenha ocorrido a violação do aludido princípio constitucional, aqui integralmente observado.
Dá o apelante ainda como violada a norma contida no n.º 2 do art.º 202.º, que assim dispõe: “Na administração da justiça incumbe aos tribunais assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, reprimir a violação da legalidade democrática e dirimir os conflitos de interesses públicos e privados”.
Não nos diz o recorrente em que medida e porque é que tal preceito teria resultado inobservado, sendo certo, porém, que do compulso dos autos ressalta ter sido dirimido o conflito de interesses que opunha as partes. Não foi reconhecida razão ao apelante, é um facto, mas o litígio foi dirimido, assim resultando observado também este preceito constitucional.
No que concerne à violação do art.º 204.º, segundo o qual “Nos feitos submetidos a julgamento não podem os tribunais aplicar normas que infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consignados”, por mais abrangente que seja a sua formulação, tal não isenta o alegante, como é óbvio, de indicar a norma de cuja aplicação decorreria a violação de disposição constitucional ou princípio na constituição consagrado. Tal ónus não o cumpriu o recorrente, o que nos dispensa de quaisquer considerandos suplementares.
Por último, e quanto à violação do art.º 205.º, que consagra o dever de fundamentação das decisões judiciais, já se disse quanto foi tido por pertinente, não se verificando violação do apontado preceito constitucional.
Sintetizando, não violou a decisão recorrida qualquer preceito da CRP ou princípio constitucionalmente consagrado, improcedendo as derradeiras conclusões.
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III Decisão
Em face a todo o exposto, acordam os juízes da 1.ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra em julgar improcedente o recurso, confirmando a sentença apelada.
Custas a cargo do apelante.
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Maria Domingas Simões (Relator)
Nunes Ribeiro
Helder Almeida



[1] Sobre as modalidades que a impugnação dita indirecta pode revestir o Prof. Lebre de Freitas, “A acção declarativa comum à luz do Código Revisto”, 2.ª ed., Coimbra editora, págs 97/98. 
[2] Sobre as diferenças entre o regime da admissão e a confissão, enquanto declaração expressa de reconhecimento da realidade dum facto desfavorável ao declarante e que favorece a parte contrária, autor e ob. cit., pág. 85, nota 9.
[3] Isto sem prejuízo da possibilidade excepcional, que vem sendo reconhecida, do réu, tendo tido conhecimento superveniente, “da inocorrência dum facto constitutivo do direito do autor, por este alegado na petição”, poder vir alegar tal situação, contrária à admitida, em sede de articulado superveniente - neste sentido, ainda o Prof. Lebre de Freitas, ob. cit., nota 36 na pág. 95 e novamente nota 57, na pág. 101, e aresto desta Relação de Coimbra de 2/7/2013, no processo n.º 387/12.2 TBTNV.C1, acessível em www.dgsi.pt.
[4] Vide Lebre de Freitas, ob cit., págs. 239-240.
[5] Conquanto declaração de ciência, porque contentora de informação sobre a realidade, não deixam de ser aplicáveis à declaração confessória as regras de interpretação plasmadas nos art.ºs 236 e seguintes do Código Civil.
[6] Trata-se da fórmula de Arbenz, aqui por lapso identificado como Larenz.
[7] Lebre de Freitas, “Introdução ao Processo Civil – conceito e princípios gerais”, 2.ª edição, Reimpressão, págs. 173-174. Sobre o tema, v. ainda desenvolvido acórdão do STJ de 6/7/2011, proferido no processo 3612/07.6 TBLRA.C2.S1, acessível em www.dgsi.pt.
[8] Autor e ob. cit. na nota anterior, pág. 175.
[9] Tendo-se o legislador limitado a substituir a anterior expressão “arbitramento” por “perícia” no n.º 1 do preceito.
[10] Do acórdão desta Relação de Coimbra de 22/4/2012, proferido no processo 4587/07.6 TBVIS.C1, acessível em www.dgsi.pt. Em sentido parcialmente divergente, admitindo a rejeição da prova pericial pelo juiz independentemente de sobre ela fazer incidir uma crítica material da mesma natureza, concluindo que “os dados de facto que servem de base ao parecer estão sujeitos ao princípio da livre apreciação da prova, e o juízo científico ou parecer, propriamente dito, também, não requerendo uma crítica material e científica”, sem prejuízo de alertar para a circunstância de liberdade de apreciação não significar arbitrariedade na apreciação, o ac. do STJ antes citado.
[11] Ao nível do STJ, exigindo a prova, pela seguradora, do nexo causal entre a etilização do condutor e o acidente os arestos de 7/6/2011, processo n.º 380/08.0YXLSB.C1.S1, de que se destaca o seguinte ponto do sumário “(…) recai efectivamente sobre a seguradora o ónus da prova quanto aos factos constitutivos do direito de regresso que exercita, demonstrando que o grau de alcoolemia do condutor funcionou como causa real, efectiva e adequada ao desencadear do acidente”, e de 6/7/2011, processo n.º 129/08.7 TBPTL.G1.S1; em sentido contrário, acórdãos de 28/11/2013, processo n.º 995/10.6 TVPRT.P1.S1, e de 9/10/2014, processo n.º 582/11.1 TBSTB.E1.S1.
Ao nível dos Tribunais da Relação, nesta Relação de Coimbra é dominante a tese de que não carece a seguradora de fazer prova do nexo causal -cf. arestos de 1/7/2014, processo 139/12.0T2ALB.C1; 18/2/2014, processo 2452/12.7 TBLRA.C1; 22/1/2013, processo n.º 1278/11.0 T2AVR.C1; de 8/5/2012, processo 665/10.5TVVNO.C1; de 29/5/2012, processo 273/10.6 T2AVR.C1; de 8/5/2012, processo n.º 2739/08.3TBVIS.C2V. Inversamente, detecta-se na Relação do Porto a tendência inversa, defendendo a necessidade da seguradora fazer prova do nexo causal os arestos de 16/5/2013, processo 7382/11.7 TBMAI.P1; 15/1/2013, processo 995/10.6 TVPRT.P1; 19/1/2012, processo 774/10.0 TBEP.P1, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
[12] Solução adoptada no acórdão desta Relação de 18/2/2014, processo n.º 2452/12.7 TBLRA.C1 já citado, no qual a ora relatora interveio como adjunta.

[13] Do sumário do acórdão do STJ de 7/6/2011, processo n.º 380/08.0 já referenciado. No mesmo sentido, acórdão do STJ de 7/7/2010, processo n.º 2273/03.8 TBFLG.C1.S1 e o aresto desta Relação de Coimbra de 8/5/2012, processo n.º 2739/08.3 TBVIS.C2, assim sumariado “I – A taxa de alcoolemia de 1,05 g/l não induz, só por si, o nexo de causalidade entre a condução sob efeito do álcool e o acidente de viação; II – Todavia, de acordo com a prova produzida e as regras da experiência comum, o excesso de velocidade e a diminuição da resposta sensitiva e o aumento do tempo de reacção e redução da acuidade visual e visão periférica do condutor, determinantes do atropelamento da vítima, permitem concluir por tal nexo de causalidade; III – Embora a relação entre o álcool e as capacidades de reacção na condução variem em função da respectiva taxa e de pessoa para pessoa e mesmo nesta, conforme as circunstâncias, uma TAS de 1,05 g/l constitui uma base bastante para, em conjugação como o modo como ocorreu o acidente, a prova produzida e as presunções judiciais, estabelecer o nexo causal entre a condução sob efeito do álcool e o acidente.
[14] V. acórdão desta mesma Relação de 9/10/2012, proferido no processo 198/11.2 TBSPS, versando sobre caso com semelhanças, também acessível em www.dgsi.pt.