Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
334/10.6JAPRT-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ALICE SANTOS
Descritores: PENA SUSPENSA
PRESCRIÇÃO
Data do Acordão: 05/26/2021
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: VISEU (JUÍZO CENTRAL CRIMINAL DE VISEU – J4)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ART.º 122.º/1/D DO CP
Sumário: As penas de prisão suspensas não têm um prazo de prescrição autónomo do da pena originária, não lhes sendo aplicável o disposto no art.º 122º/1-d) do CP.
Decisão Texto Integral:

           

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra


                                                                                                                                                                                                                                                     
O arguido, JM, não se conformando com o despacho proferido a 21/10/2020 que defende que o prazo de prescrição aplicável á pena de prisão suspensa na sua execução em que o arguido foi condenado era o prazo previsto no artº 122º nº 1 al c), portanto de 10 anos, que deve ser contado desde a data do trânsito em julgado da decisão condenatória, nos termos do nº 2 deste dispositivo legal (e não já o prazo de quatro anos que se mostra previsto no artº 122º, nº 1 al d) do CP como é defendido pelo arguido), tendo sido declarado que a pena única de prisão de três anos, suspensa na execução por igual período, não se mostra prescrita, assim se indeferindo o requerido, vem dele interpor recurso para este tribunal, sendo que na respectiva motivação formulou as seguintes conclusões:
1ª) O presente recurso vem interposto do despacho do Mm.o Juiz do tribunal a quo de 21.10.2020 que desatendeu o pedido de declaração de extinção, em razão da sua prescrição, da pena suspensa cominada ao arguido.
2ª) Como o problema da almejada extinção é ditado pela determinação da prescrição da pena suspensa é que a sua resolução há de buscar-se nas normas jurídicas dos arts.122º e ss. do CP, que integram precisamente o Capítulo II, relativo à “prescrição das penas e das medidas de segurança”.
3ª) No caso destes autos, à pena (principal) de 3 anos de prisão seguiu-se a suspensão da sua execução por idêntico período.
4ª) Ora, a suspensão da execução da pena de prisão, regulada nos arts.50º e ss. do CP, e 492º e ss. do CPP, não representa um simples incidente, ou mesmo só uma modalidade da execução da pena, constituindo antes uma verdadeira “pena de substituição”, autónoma e independente em relação à pena (principal) substituída.
5º) E sendo uma pena autónoma (também ela sujeita a um prazo de prescrição, pois, salvo as aplicadas por crimes de genocídio, contra a humanidade e de guerra, não existem penas imprescritíveis), a previsão normativa que reclama a sua regulação é a contida na al. d) do no 1 do art.122º do CP, integrando, portanto, os “casos restantes” aí referidos, por prévia exclusão dos mencionados nas alíneas precedentes, pelo que a pena de suspensão da execução da pena de prisão prescreverá ao fim de 4 anos, contados desde o trânsito em julgado da decisão condenatória, sem prejuízo, como é óbvio, das causas de suspensão e de interrupção contempladas nos arts.125º e 126º do CP.
6a) De resto, ainda que se desconsiderasse a suspensão da pena como uma “pena” (não sua verdadeira acepção) autónoma e independente, sempre caberia lançar-se mão do mesmíssimo prazo de 4 anos, por aplicação analógica in bonam partem do citado dispositivo legal, solução esta que se afigura perfeitamente admissível, porquanto mais favorável aos interesses do arguido e por também ser esta a via mais conveniente para dar expressão ao princípio geral da prescritibilidade das penas, vital em qualquer Estado Democrático de Direito que se preze.
7a) Ora, in casu, o acórdão que aplicou ao arguido a pena suspensa transitou em julgado em 06.11.2012 – Cf. a acta da sessão de 16.10.2012 da audiência de discussão e julgamento, e respectivo acórdão, a declaração de depósito de 16.10.2012 de fls., e os arts.411o, no 1, al. b) do CPP, na redacção anterior à Lei no 20/2013, de 21/02 – cuja entrada em vigor ocorreu apenas em 24.03.2013 –, e 628º do CPC, ex vi do art.4º do CPP.
8ª) Assim, o período de execução da mesma decorreu entre 06.11.2012 e 06.11.2015, e entre 17.03.2017 e 17.09.2018 (em virtude da prorrogação da suspensão por mais 1 ano e 6 meses determinada pelo despacho de 17.03.2017 de fls.), o que significa que durante tais períodos se interrompeu a prescrição da pena suspensa, nos termos do art.126o, no 1, al. a) do CP, reiniciando-se novo prazo prescricional de 4 anos no términus de cada um deles (isto é, em 06.11.2015 e, novamente, em 17.09.2018), de acordo com o disposto no nº 2 do mesmo art.126º do CP, donde, não fora a existência do instituto da prescrição absoluta do art.126o, no 3 do CP, a pena suspensa só prescreveria em 17.09.2022.
9ª) Simplesmente, aquele art.126º, nº 3 do CP, que regula o instituto da prescrição absoluta, estabelece que a prescrição da pena tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal da prescrição acrescido de metade (ou seja, 4 anos + 2 anos).
10ª) Portanto, o instituto da prescrição absoluta ressalva apenas o “tempo de suspensão” da pena, desconsiderando o “tempo de interrupção” da mesma.
11ª) Assim, por não se verificar qualquer das situações elencadas no art.125ª, no 1 do CP (que trata das causas de suspensão da prescrição), na contagem do prazo prescricional da pena suspensa aqui em consideração não importa ressalvar qualquer “tempo de suspensão”.
12ª) De modo que, efectuados os cálculos com base nas disposições legais atrás citadas, é manifesto que a pena suspensa por que o arguido vem condenado há muito que se encontra prescrita, tendo a prescrição ocorrido em 06.11.2018, data em que se atingiu os 6 anos (prazo normal de prescrição acrescido de metade: 4 anos + 2 anos), contados desde o trânsito em julgado do acórdão condenatório – 06.11.2012 –, e que marcam o limite (inultrapassável) prevenido no art.126º, nº 3 do CP.
13ª) A prescrição opera ope legis, no exacto momento em que se completou o respectivo prazo, não carecendo de ser validada, mas apenas determinada (mesmo oficiosamente) logo que seja detectada, o que pode acontecer em qualquer momento do processo e em qualquer grau de jurisdição.
14ª) O despacho recorrido, assim não entendendo, violou e/ou interpretou incorrectamente, entre outras, as disposições dos arts.122ª, nº 1, al. d), 125º, a contrario, e 126º, nos 1, 2 e 3 do CP, bem como os arts.50º e ss. do CP, e 492º e ss. do CPP, em claro desfavorecimento do arguido, o que urge rectificar.
Nestes termos e conforme o direito, deve dar-se provimento ao recurso, revogando-se o despacho recorrido, substituindo-o por outro que considere prescrita a pena de suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido, pelo decurso do respectivo prazo normal acrescido de metade, nos termos do art.126º, no 3 do CP, decidindo-se, em consequência, pela extinção da sua responsabilidade criminal, no que se refere à execução da pena suspensa, com as devidas implicações processuais, designadamente a extinção da pena (substituída) de prisão, assim se cumprindo a Lei e se fazendo Justiça!

O recurso foi admitido para subir imediatamente, em separado, com efeito devolutivo.

Respondeu o Digno Procurador Adjunto, manifestando-se pela improcedência do recurso, defendendo a manutenção da decisão recorrida.

Nesta instância o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no qual se manifesta no sentido da improcedência do recurso.

Respondeu o arguido pugnando pela procedência do recurso.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

            É este o despacho recorrido:

           

O arguido JM veio (cfr. referência 4310781 de 30.09.2020) arguir a prescrição da pena de prisão suspensa em que foi condenado nos presentes autos, defendendo que a suspensão da pena privativa da liberdade é uma pena de substituição autónoma (relativamente à pena principal), pelo que o prazo de prescrição aplicável é o previsto na al. d) do n.º 1 do art. 122.º do CP (de quatro anos), que assim já se mostra decorrido, tudo com os fundamentos que aqui damos por integralmente reproduzidos.

A Digna Procuradora da República (cfr. referência 86782301), com os doutos fundamentos que melhor decorrem da sua promoção, e que aqui damos por integralmente reproduzidos, veio opor-se à pretensão do arguido.


Cumpre apreciar.

No Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 18 de fevereiro de 2018, proferido no autos 125/97.8IDSTB-AS1, disponível in www.dgsi.pt (muito atentamente citado pela Digna Procuradora da República) é afirmado no seu sumário o seguinte:” I – O prazo de prescrição da pena principal só começa a correr com o trânsito em julgado da decisão de revogação da suspensão da execução da pena (n.º 2 do art. 122.º do CP). II - Não é defensável a posição que, em abstracto, defende a aplicação do disposto na la. d) do art. 122.º do CP (prazo de 4 anos) à pena de substituição (pena de suspensão da execução da pena de prisão). Meter no mesmo caldeirão, da citada al. d), todas as penas de suspensão da execução da pena de prisão, que podem oscilar entre o prazo de 1 e 5 anos (art. 50.º, n.º 5, do CP – prazos de suspensão) e que, também, podem substituir penas de prisão até 5 anos (n.º 1 do art. 50.º), é algo que pode contender, além do mais, com o próprio princípio da culpa. Na al. d) cabem todas as penas de prisão (inferiores a 2 anos, suspensas ou não na sua execução, e penas de multa) não abrangidas nas als. anteriores. III - A partir do momento em que a pena de substituição (suspensão da execução da pena de prisão) é revogada, através de decisão transitada, estamos perante uma pena de prisão a enquadrar, consoante a sua moldura, numa das als. do art. 122.º, n.º 1, do CP. IV - Durante o prazo da pena de suspensão (pode ir de 1 a 5 anos), o decurso da prescrição fica suspenso. Só começa a correr com o trânsito da decisão que aplicar a pena (n.º 2 do art. 122.º do CP). O ponto fulcral a atender é o do momento do trânsito em julgado do despacho que revoga a suspensão da execução da pena de prisão.” Na fundamentação do Acórdão citado do mais alto Tribunal nacional, num raciocínio aplicável ao nosso caso por argumento de maioria de razão, pode ler-se o seguinte: “O prazo de prescrição da pena afere-se pela pena originária inicialmente aplicada na decisão condenatória (sublinhado nosso) e não pela pena resultante de eventual e posterior aplicação de medidas de clemência, nomeadamente os perdões constantes das leis de amnistia (Acs. RL de 30/4/1984, BMJ 344, pág. 457; Ac. RE de 17/5/1994, CJ, XIX, T. III, pág. 292; Ac. RP de 21/11/2012, Proc. 83/95.3TBPFR-E.P1, Rel. Eduarda Lobo; Ac. STJ de 30/9/1992, BMJ 419, pág. 493; Ac. STJ de 27/9/1995, BMJ 449, pág. 84; Ac. STJ de 17/5/2000, CJ, XX, T. II, pág. 197; Ac. STJ de 1/6/2006, Proc. 06P2055, Rel. Pereira Madeira).”

Este Acórdão prolatado pelo nosso mais alto tribunal (e cuja doutrina teve seguimento por exemplo no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 21 de fevereiro de 2019, proferido no processo 387/07.4PEAMD.L1-9, disponível in www.dgsi.pt onde no seu sumário se pode ler que “As penas de prisão suspensas não têm um prazo de prescrição autónomo do da pena originária, não lhes sendo aplicável o disposto no art.º 122º/1-d) do CP.”) traduz a visão que mais coerente se revela no nosso sistema jurídico, pois que, não obstante o enquadramento doutrinário e jurisprudencial que define o instituto da suspensão da pena como uma verdadeira pena de substituição (e cuja discussão, por desnecessária, nos dispensamos aqui de reproduzir), seria pouco compreensível que uma pena de prisão efectiva de três anos tenha um prazo de prescrição distinto da mesma pena de prisão suspensa na sua execução.

O arguido foi condenado nos presentes autos, em 16/10/12, numa pena única de três anos de prisão, pela prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada, previsto e punido pelo art. 145.º, n.os 1, al. a) e 2, por referência aos arts. 143.º, n.º 1 e 132.º, n.º 2, al. h), todos do Código Penal e de um crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelo art. 86.º, n.º 1, al. c) da Lei n.º 5/06, de 23/05, na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 17/09, de 6 de maio, com referência aos arts. 2.º, n.º1, al. f), 3.º, n.º 4, al. a) e 6.º, todos deste diploma legal; a pena única de prisão de três anos foi suspensa na sua execução por igual período, e sujeita à condição do arguido proceder ao pagamento da indemnização de 4500 euros devida ao lesado Amâncio Teixeira da Costa, à razão de 1500 euros por ano, acrescida de eventuais juros vencidos sobre esta quantia – cfr. fls. 237 a 262. Atendendo à pena de prisão aplicada ao arguido nos presentes autos o prazo de prescrição é o previsto no art. 122.º, n.º 1, al. c) do Código Penal, portanto, de 10 anos, que deve ser contado desde a data do trânsito em julgado da decisão condenatória, nos termos do n.º 2 deste dispositivo legal (e não já o prazo de quatro anos que se mostra previsto no artigo 122.º n.º 1 al. d) do CP como é defendido pelo arguido).

Em face do exposto, em face da data do trânsito em julgado da decisão condenatória proferida nos presentes autos, declara-se que a pena única de prisão de três anos, suspensa na execução por igual período, não se mostra prescrita, assim se indeferindo a pretensão do arguido.


Notifique.

                                                           ***

 

Decidindo:

O arguido JM foi julgado e condenado por acórdão datado de 16.10.2012 pela prática, em concurso real, de:

- um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo artigo 145º n.º 1 al. a) e 2, por referência aos artigos 143º n.º 1 e 132º n.º 2 al. h), todos do Código Penal, na pena de 1 ano e 10 meses de prisão;

- um crime de detenção de arma proibida p. e p. pelo artº 86º nº 1 al c) da lei nº 5/2006, de 23 de Fevereiro, na redacção da lei nº 17/2009, de 6 de maio, com referência aos arts 2º nº 1 al f), 3º nº 4 al a) e 6º do mesmo diploma, na pena de 2 anos de prisão;

Em cúmulo foi o arguido condenado na pena única de 3 (três) anos de prisão.

A referida decisão condenatória transitou em julgado no dia 06/11/2012.

Posteriormente, por despacho datado de 15.03.2017, foi determinado a prorrogação do período de suspensão da execução da pena aplicada ao arguido JM pelo período de 1 (um) ano e 6 (seis) meses, nos termos do disposto no artigo 55º alínea d) do Código Penal.

Entretanto, por requerimento dado entrada na data de 30.09.2020, veio o arguido recorrente invocar a prescrição da pena de prisão suspensa em que foi condenado nestes autos, que considera tratar-se de uma pena de substituição autónoma, por estar decorrido o prazo de prescrição previsto na al. d) do n.º 1 do art. 122.º do CP, de 4 (quatro) anos.

A questão tem sido muito debatida e o Supremo Tribunal já se pronunciou em alguns acórdãos nomeadamente no Ac135/04.0IDAVR-C.S1 de 6/04/2016 e no Ac citado no despacho recorrido Ac nº 125/97.8IDSTB-AS1 de 28/2/2018 e que seguiremos.

“... A pena de suspensão da execução da pena de prisão é uma pena de substituição, sendo estas actualmente configuradas como verdadeiras penas autónomas (Figueiredo Dias (Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Ed. Notícias, 1993, pág. 329).

A pena de suspensão da execução da pena de prisão, como pena de substituição, pode terminar pelo seu cumprimento após o decurso do prazo (art. 57.º do CP) ou pode terminar por força da sua revogação (art. 56.º do CP). Uma pena só é de substituição enquanto subsiste, enquanto substitui. A partir do momento em que é revogada (é a hipótese a considerar nestes autos), estamos perante uma pena de prisão pura e simples, isto é, perante a pena substituída. Não se nos apresenta defensável a posição que, em abstracto, defende a aplicação do disposto na alínea d) do art. 122.º do CP (prazo de 4 anos) à pena de substituição (pena de suspensão da execução da pena de prisão) Meter no mesmo caldeirão, da cit. alínea d), todas as penas de suspensão da execução da pena de prisão, que podem oscilar entre o prazo de 1 e 5 anos (art. 50.º, n.º 5 do CP--prazos de suspensão) e que, também, podem substituir penas de prisão até 5 anos (n.° 1 do cit. art. 50.º), é algo que pode contender, além do mais, com o próprio princípio da culpa.

Na referida alínea d) cabem todas as penas de prisão (inferiores a dois anos, suspensas ou não na sua execução, e penas de multa) não abrangidas nas alíneas anteriores.

Com a revogação ressurge, reaviva, a pena de prisão substituída, que é a pena originária. E é a esta (pena de prisão/pena originária) que deve atender-se, como vimos atrás, para efeitos de prescrição. Sendo de atender à pena principal, o regime é o da pena principal e não o da pena de substituição, que foi revogada.

Conforme se escreve no Ac. STJ de 6/4/2016, Proc. 135/04.0IDAVR-C.S1, Rel. Santos Cabral «I - A partir do momento em que a suspensão da execução da pena de prisão foi revogada, e atempadamente, a pena que o arguido passou a ter que cumprir é a pena de prisão em que foi condenado. II - A partir do trânsito em julgado do despacho que operou essa revogação, a prescrição da pena a atender é a prescrição da pena de prisão pois que é a única em relação à qual se pode colocar, nessa altura, a questão da respectiva execução e não perante a pena cominada na primitiva sentença condenatória, de suspensão de execução da pena de prisão, a qual se encontra revogada.».

A partir do momento em que a pena de substituição (suspensão da execução da pena de prisão) é revogada, através de decisão transitada, estamos perante uma pena de prisão a enquadrar, consoante a sua moldura, numa das alíneas do art. 122.º, n.º 1 do CP.

E a revogação implica o cumprimento da pena de prisão fixada na sentença (art. 56.º, n.º 2 CP) sem qualquer desconto.

Durante o prazo da pena de suspensão (pode ir de 1 a 5 anos), o decurso da prescrição fica suspenso. Só começa a correr com o trânsito da decisão que aplicar a pena (n.º 2 do art. 122.º do CP).

O ponto fulcral a atender é o do momento do trânsito em julgado do despacho que revoga a suspensão da execução da pena de prisão.

Podem existir complicações processuais, que façam com que o despacho revogatório não ocorra no período correcto.

Na verdade, não faltam casos em que o mesmo é exarado vários anos depois de esgotado o prazo da suspensão, ou em que o trânsito em julgado do despacho revogatório, embora tal despacho tenha ocorrido em tempo, como no caso dos presentes autos, só transita já bastante depois do decurso do prazo normal da suspensão”.

No caso dos autos, dado que a pena de prisão, inicialmente suspensa na sua execução, é de 3 anos, o prazo de prescrição é de 10 anos (art. 122.º, n.° 1, alínea c) do CP)”.

Para além de subscrevermos inteiramente este entendimento, parece-nos que o entendimento contrário levaria a soluções inaceitáveis, do ponto de vista da unidade do sistema jurídico e tendo em conta que se presume que o legislador consagrou as soluções mais adequadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (art.º 9º do CC).

Basta pensar no caso de uma pena de cinco anos de prisão (o prazo de prescrição desta pena é de 15 anos – art.º 122º/1-b) do CP), cuja execução foi suspensa por igual período.

Se se entender que aplica à pena suspensa o prazo de prescrição previsto no art.º 122º/1-d) do CP (quatro anos), isso levará a que, na prática, o prazo de prescrição da pena principal seja de nove anos, caso a suspensão não seja revogada nos quatros anos seguintes ao decurso do prazo da suspensão. Ora, não foi certamente isso que quis o legislador e não é isso que resulta de uma interpretação sistemática da lei, tendo em conta a sua letra. Assim sendo e atendendo à pena de prisão aplicada ao arguido o prazo de prescrição é o previsto no art. 122.º, n.º 1, al. c) do Código Penal, portanto, de 10 anos, que deve ser contado desde a data do trânsito em julgado da decisão condenatória, nos termos do n.º 2 deste dispositivo legal e assim, o prazo de prescrição da pena em causa ainda não ocorreu  e apenas irá ocorrer na data de 06.11.2022, sem que se mostre excedido o prazo máximo a que se alude no n.º 3 do artigo 126 do Código Penal.

Assim, a decisão recorrida ao considerar que a pena única de prisão de três anos, suspensa na execução por igual período, não se mostra prescrita, e indeferindo a pretensão do arguido, não violou ou fez interpretação incorreta das disposições dos arts.122º, nº 1, al. d), 125º, a contrario, e 126º, nºs 1, 2 e 3 do CP, bem como os arts.50º e ss. do CP, e 492º e ss. do CPP:


Pelo exposto, acordam os juízes do Tribunal da Relação de Coimbra em negar provimento ao recurso, mantendo-se o douto despacho recorrido.

Custas pelo recorrente fixando-se em quatro U.C.s a taxa de justiça.

Coimbra, 26 de maio de 2021

Alice Santos (relatora)

Belmiro Andrade (adjunto)