Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
316/2000.C2
Nº Convencional: JTRC
Relator: MARIA INÊS MOURA
Descritores: EXPROPRIAÇÃO
INDEMNIZAÇÃO
SERVIDÃO NON AEDIFICANDI
ACÓRDÃO ARBITRAL
CASO JULGADO
Data do Acordão: 01/22/2013
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TOMAR 1º J
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTS.8, 23, 24, 25, 26 C EX., 684 CPC
Sumário: 1. Não obstante a qualificação do solo como apto para construção, se à data da DUP não se podia construir na parcela expropriada, o valor da mesma deve ser desvalorizado por esse facto, atribuindo-se-lhe 20% do valor do solo apto para construção, com aplicação do artº 25 nº 5 do C.E.

2. O acórdão arbitral constitui uma verdadeira decisão judicial proveniente de um tribunal arbitral necessário, aplicando-se por isso ao recurso que incide sobre o mesmo o regime dos recursos estabelecido no Código do Processo Civil, com as necessárias adaptações.

3. Se a decisão arbitral contem decisões distintas, é licito ao Recorrente restringir o recurso a qualquer delas, especificando no requerimento a decisão de que recorre ou aquela com a qual se conforma, ficando vedado ao tribunal o conhecimento da decisão na parte não impugnada, nos termos do artº 684 nº 2 e nº 4 do C.P.C.

4. A decisão do tribunal não pode ser mais desfavorável aos Recorrentes Expropriados do que a decisão arbitral por ele impugnada, e da qual a Expropriante não recorreu, atento o princípio da proibição da “reformatio in pejus” que decorre do artº 684 nº 4 do C.P.C.

5. O caso julgado verifica-se apenas quanto à decisão relativa à quantia indemnizatória globalmente atribuída, com a qual a Expropriante se conformou, não recorrendo da mesma.

Decisão Texto Integral: Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra

I. Relatório

Nos presentes autos de expropriação por utilidade pública, em que é expropriante E.P.- Estradas de Portugal, S.A. e Expropriado J (…) e M (…) e, por despacho do Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas de 22.12.98, publicado no DR nº 42, II Série de 19/02/99, por delegação do Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, constante do despacho nº 487/97 de 05.05, publicado no DR nº 113, II Série de 16.05.97, foi declarada a utilidade pública com carácter de urgência das expropriações das parcelas de terreno, necessárias à execução do IC 3 – variante de Tomar, abrangendo a parcela nº 293.

Como não se chegou a acordo para a fixação amigável do montante indemnizatório, realizou-se vistoria “ad perpetuam rei memoriam”, cujo relatório abordou a identificação e descrição da parcela a expropriar, o tipo de solo e a existência de benfeitorias e infra-estruturas urbanísticas, conforme teor de fls. 14 a 15.

Houve lugar à posse administrativa da parcela/terreno em causa, pela entidade expropriante, conforme fls. 16 e 17.

Posteriormente realizou-se a arbitragem, verificando-se haver unanimidade dos senhores árbitros na atribuição da indemnização, conforme consta do relatório de fls. 25 a 28, dos autos tendo sido atribuído à parcela em causa o montante de 8.446.556$00/42.131,24 €.

Os expropriados inconformados com o mencionado acórdão vieram interpor recurso alegando em síntese que a área expropriada não se mostra correctamente apurada dado que a área que a conduta da EPAL ocupa na parcela expropriada tem de ser contabilizada e a cargo da ICOR, pelo que a área correcta de expropriação é de pelo menos 6.722 m2 e não de 5.745 m2; também não concordam com a avaliação de 20% dada ao terreno em causa, bem como o valor atribuído ao m2 e ainda à desvalorização da parcela em questão, pedindo que lhes seja atribuído o valor global de 355.140.09 €.

Na sua resposta, a expropriante vem assumir que efectivamente a área expropriada é superior àquela que consta relativamente à declaração de utilidade pública (DUC) e também que se deve manter na integra o valor do laudo arbitral, até ele em si mesmo já beneficia a parcela em questão.

Foi efectuado, pela expropriante, o depósito da quantia mencionada no acórdão dos árbitros no valor de 8.446.556$00/42.131,24 €, da qual já foi paga aos expropriados a quantia de 39.591,85 €.

Procedeu-se à realização de uma primeira diligência de avaliação/peritagem sendo que foram apresentados dois relatórios periciais, um subscrito pelo Sr. Perito (…), o qual menciona uma área a expropriar de 7.566 m2, atribuindo uma indemnização total de 58.080.701$60/289.705,32 € (fls. 159); um outro relatório pericial subscrito pelos restantes quatro peritos (166 e ss.), onde apresentam uma área de 5.475 m2, pelo que atribuem um valor total de 33.871,92 €.

Na sequência de um levantamento topográfico levado a cabo a pedido dos expropriados, conforme fls. 207, apurou-se que na verdade a área total expropriada pela autora é de 6.993 m2, pelo que a fls. 243 esta requer a ampliação do objecto da expropriação para a área adicional de 1.248 m2 e que tal seja comunicado à Conservatória.

Foi admitida a ampliação do objecto da expropriação com a área de 1.248 m2 a destacar do prédio rústico denominado de “Quinta do Vale”, descrito na CRP Tomar sob a ficha nº 1532/040494, freguesia da Madalena, acrescendo assim à parcela anterior de 5.745 m2, o que totaliza os ditos 6.993 m2 e como tal comunicado à Conservatória.

Procedeu-se à realização de uma nova avaliação/peritagem atendendo à nova área acabada de mencionar, constando o laudo dos senhores peritos de fls. 289 e ss., que por unanimidade atribuem à parcela nº 293 expropriada, o valor global de 36.026,40€, sendo de 33.566,40€ relativo ao terreno da parcela e de 2.460,00€ de desvalorização do pavilhão.

Seguiu-se diligência de inquirição de testemunhas.

A EP veio apresentar as respectivas alegações, concordando no essencial com as conclusões dos Srs. Peritos relativamente às questões levantadas e pugnando pela manutenção do valor atribuído no laudo pericial.

Os expropriados vêm dizer que o valor do m2 deve ser fixado em 24€ e quanto ao prejuízo no acesso aos pavilhões deve este ser computado em 136.421,23€, pelo que pedem como justa indemnização o valor de 304.253,23€.

Foi proferida sentença que julgou improcedente o recurso, fixando em € 36.030,00 o montante da indemnização devida.

Não se conformando com esta decisão os expropriados interpuseram recurso para este tribunal, tendo sido proferido acórdão de 28/04/2010 anulando a decisão da 1ª instância, com vista à ampliação da matéria de facto.

Foi efectuada nova perícia, com o fim dos peritos se pronunciarem sobre as novas questões, tendo sido dispensada a audição das testemunhas arroladas.

Foi proferida sentença que novamente julgou improcedente o recurso, e fixou o montante da indemnização em € 36.030,00.

Mais uma vez vêm os expropriados interpor recurso de tal decisão, por não se conformarem com a mesma, formulando as seguintes conclusões:

a) O valor da parcela expropriada, com a área de 6.993 m2, o valor do m2 de área bruta de € 200,00, o índice de implantação de 0,49 e um índice fundiário de 20% é de € 137.062,80.

b) A desvalorização sofrida nas acessibilidades aos pavilhões deve ser fixada em € 131.625,00.

c) O valor do poço deverá ser fixado em € 1.341,95 uma vez que a decisão da MMª Juiz “a quo” viola o disposto no artº 683 nº 4 do C.P.C.

d) Subsidiariamente, para o caso de não proceder o pedido supra deduzido na alínea a), deve declarar-se que o valor fixado pelo acórdão arbitral de €42.131,84 elevado proporcionalmente para €51.283,51 não pode ser reduzido, uma vez que a expropriada dele não recorreu e com ele se conformou expressamente.

e) A sentença recorrida violou o disposto no artº 25 nº 5 e 8º do DL 438/91 de 9/11 e 683 nº 4 do C.P.C.

A Expropriante veio apresentar contra-alegações pedindo a improcedência do recurso e manutenção da decisão recorrida, apresentando as seguintes conclusões:

1. O recurso de que ora se contra alega vem interposto da douta sentença que condenou a expropriante no pagamento do montante de €36.030,00 a título de justa indemnização a atribuir à parcela expropriada.

2. Relativamente à força jurídica do acórdão arbitral, fica comprovado que embora a expropriante não tivesse dele recorrido, veio em sede de alegações aderir e peticionado que a justa indemnização se fixasse no montante indemnizatório apurado pelos peritos.

3. Ora, se às partes é lícito ampliar o pedido até às alegações, o contrário não lhe pode ser negado, pelo que lícito será também diminuir o pedido.

4. Certo é que a indagação da qualificação jurídica dos factos está reservada ao Juiz que não está vinculado pela apreciação que dos mesmos é feita na decisão arbitral.

5. Verifica-se pois que não existe qualquer violação do disposto no artº 684 nº 4 do C.P.C.

6. Relativamente à aplicação do disposto no artº 25º do código de Expropriações /91 sempre se dirá que conforme é determinado pela Douta sentença, à data da DUP não era já possível a construção face à definição das zonas non edificandi impostas pelo Regulamento do Plano Director Municipal tomar que integra o IC3 na rede nacional fundamental.

7. O artº 12 daquele Regulamento do PDM de Tomar prevê as condicionantes e servidões impostas por essas infraestruturas.

8. Logo, à data da Declaração de Utilidade Pública o Plano Diretor Municipal estava em vigor, sendo que este perante o disposto no artº 11º da Lei nº 49/98 de 11 de Agosto vincula quer as entidades públicas, quer os particulares.

9. À data da DUP, embora o solo fosse classificado como apto para construção, aquela estaria ali impedida.

10.  Um solo onde não é possível edificar, não pode ser avaliado nesse sentido, pelo que a sua avaliação obedeceu ao disposto no artº 25 do CE/91.

11.  Avaliar a parcela como apta para construção, leva necessariamente ao incumprimento do princípio da igualdade, uma vez que, quando comparada com outro proprietário não expropriado, a quem está vedada a construção na zona non edificandi, facilmente nos deparamos com tratamento desigual, numa situação igual.

12. O ónus criado por essa servidão é pois da responsabilidade camarária, desconhecendo a EP se esta já compensou os proprietários, aqui expropriados, pela oneração do espaço, como por exemplo, através da concessão de índices de construção maiores, ou mesmo indemnizando-os.

13. Relativamente à desvalorização das acessibilidades e a indemnização do poço, sempre se dirá que esta indemnização decorre da avaliação técnica levada a cabo pelos peritos unanimemente, não tendo no decurso dos presentes autos o expropriado logrado fazer prova de que a desvalorização atribuída ficou aquém da que resultou da expropriação.

14.  Os peritos, porque possuem conhecimentos técnicos elementares à avaliação das parcelas, têm eles próprios um papel fundamental na avaliação do solo, devendo o tribunal apenas se abster de dar seguimento a essa avaliação quando fique demonstrado que a mesma enferma de qualquer uma obscuridade, omissão ou ilegalidade, o que não é o caso.

II. Questões a decidir

Tendo em conta o objecto do recurso delimitado pelos recorrentes nas suas conclusões (artº 684 nº 3 e 685 A nº 1 a 3 do C.P.C.), salvo questões de conhecimento oficioso- artº 660 nº 2 in fine.

- da classificação do solo da parcela expropriada como apto para construção com o valor de € 200,00/m2 da área bruta, o índice de implantação de 0,49 e índice fundiário de 20%;

- da desvalorização da propriedade dos Recorrentes, pela dificuldade das acessibilidades aos pavilhões;

- da atribuição de um valor indemnizatório autónomo ao poço existente, já previsto na decisão arbitral, nos termos do artº 684 nº 4 do C.P.C.;

- subsidiariamente, da indevida redução do montante indemnizatório atribuído pelo tribunal arbitral, pelo facto da expropriante dele não ter interposto recurso, em violação do artº 684 nº 4 do C.P.C.

III. Fundamentação de facto

Tendo em conta o disposto no artº 713 nº 2 e 659 nº 3 do C.P.C. considera-se a matéria de facto que consta da decisão da 1ª instância e que não foi impugnada, aditando-se um outro facto, a que se atribui o nº 18, por ter interesse para a decisão da causa e que resulta do relatório pericial junto aos autos e é aceite pelas partes:

1- Por despacho do Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas de 22.12.98, publicado no DR nº 42, II Série de 19/02/99, por delegação do Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, constante do despacho nº 487/97 de 05.05, publicado no DR nº 113, II Série de 16.05.97, foi declarada a utilidade pública com carácter de urgência das expropriações das parcelas de terreno necessárias à execução do IC 3 – variante de Tomar, abrangendo a parcela nº 293;

2- A citada parcela no seu aspecto topográfico, o terreno apresenta-se totalmente plano e com configuração rectangular, tendo a área de 6.993 m2, a destacar do prédio rústico sito na freguesia de Madalena e denominado de “Quinta do Vale”, concelho de Tomar, inscrito na matriz sob o artigo 6 Secção AB e descrito na Conservatória do Registo Predial de Tomar, sob a ficha nº 1532/040494 e que confronta de norte com Domínio Público e o próprio, a sul com Domínio Público e o próprio, a nascente com Domínio Público e a poente com o próprio;

3- São titulares da parcela expropriada, J (…) e M (…) com inscrição a seu favor pela cota G-1 Ap. 09/200379, segundo a ficha nº 1532/040494 da CRP Tomar, freguesia da Madalena;

4- O solo que integra o prédio rústico de onde foi destacada a parcela nº 293, apresenta-se com textura franco-argiloso, dispondo de água, luz, rede e via pública pavimentada;

5- Na parcela existia um poço com 8 metros de profundidade e 2,10 metros de diâmetro;

6- A parcela expropriada é logradouro de pavilhões industriais do expropriado e localiza-se em espaço de indústria proposta;

7- O que resulta da planta de ordenamento do Plano Director Municipal de Tomar, aprovado pela assembleia municipal em 27.05.1994, ratificada em 21.07.1994, conforme resolução do Conselho de Ministros nº 100/94, publicada no DR nº 223 da Iª Série B de 08.10.1994;

8- O espaço classificado como de indústria proposta desenvolve-se para sul da estrada camarária, numa profundidade de cerca de cento e setenta metros, o que excede ligeiramente a profundidade da parcela expropriada;

9- Em todo o terreno de onde foi destacada a área expropriada existem instalados dois pavilhões industriais que já laboram há mais de 20 anos, dedicando-se à indústria de fabricação de radiadores, cuja produção se destinava quer ao mercado nacional, quer ao mercado internacional;

10- Nos pavilhões trabalham cerca de 38 funcionários;

11- Quanto às acessibilidades aos pavilhões antes da expropriação da parcela em causa, os camiões articulados não tinham qualquer tipo de problema e faziam-no nomeadamente pela parte da frente;

12- Após a expropriação, os camiões dado o seu grande porte, têm muita dificuldade em encostar quer da parte da frente, quer de lado, roçando por cima do lancil e os camionistas precisam de fazer muitas manobras para encostar os carros;

13- Neste momento os camiões possuem cerca de 5 metros para fazerem manobras onde antes possuíam cerca de 10 a 15 metros, sendo necessário um empilhador para ir buscar a mercadoria e colocar nos camiões.

14- Verifica-se que, há uma área de cerca de 80,00 m2, relativamente à zona “non aedificandi” da EM (estrada municipal), na zona que confina com a parcela ora expropriada.

15- Apurou-se ainda que a parcela expropriada tem a menos de 50,00 m da estrada municipal a área de 2.684,00 m2.

16- 6. A parcela expropriada tem, para além de 50,00 m da estrada municipal, a área de 4.309,00 € m2.

17- Na sequência do provado em 9, supra, e face à construção já existente no terreno de onde saiu a parcela ora expropriada, o índice de construção máximo, quer na parcela expropriada, quer nas partes sobrantes, não pode exceder por arredondamento, 49 %.

18. Os dois pavilhões aí existentes têm, respectivamente, a dimensão de 65 x 20,5m e 55 x 25,5m.

IV. Razões de Direito

- da classificação do solo da parcela expropriada como apto para construção com o valor de € 200,00/m2 da área bruta, o índice de implantação de 0,49 e índice fundiário de 20%.

Uma primeira consideração importa fazer e refere-se à lei aplicável. É que, uma vez que o início da relação jurídica da expropriação se reporta à data da declaração de utilidade pública, que no caso em presença foi concedida por despacho do Secretário de Estado das Obras Públicas de 22/12/1998, é aplicável aos presentes autos o regime do anterior Código das Expropriações aprovado pelo DL 438/91 de 9/11, diploma que se fará referência.

Na realização da expropriação, a justa indemnização aparece como contrapartida daquela, conforme prevê desde logo o artº 1º do Código das Expropriações, estabelecendo os artº 22 e 23 deste código o modo como a mesma deve ser fixada.

            Dentro do quadro estabelecido no artº 22 e considerando os critérios que devem presidir à fixação da justa indemnização, verifica-se que o prejuízo do expropriado deve medir-se pelo valor real e corrente dos bens, e não pelas despesas que haja de suportar para obter a substituição da coisa expropriada por outra equivalente. A justa indemnização há-de repor no património do expropriado o valor dos bens de que ele ficará privado. Esse valor corresponderá ao preço que um comprador prudente, em condições normais de mercado, pagaria pela coisa, para a continuar a aplicar ao fim a que estava destinado.

            Para encontrar o valor real e corrente do bem expropriado, há-de atender-se ao seu valor actual, aferido pelo seu rendimento real e efectivo, e não pelo valor irreal, hipotético e futuro. Esse valor corresponderá ao valor de mercado, atribuindo-se ao expropriado o valor efectivo do bem, à semelhança do fenómeno da “sub-rogação pelo correspondente em dinheiro”- vd. neste sentido, Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, in. CJ 1998, tomo IV, pág. 217ss.

Para efeitos do cálculo da indemnização, logo a primeira questão que se põe é a da classificação dos solos, conforme previsto no artº 24 nº 1 do C. Expropriações, que classifica o solo em apto para a construção ou para outro fins, especificando o nº 2 deste artigo os elementos a considerar para a classificação do solo apto para construção. Estes requisitos não são cumulativos, bastando que se verifique um deles para que a parcela assim possa ser classificada, sendo que é por exclusão de partes que se determina qual é o solo para outros fins, de acordo com o nº 4 deste artigo.

Finalmente há que considerar o disposto nos artº 25 e 26 do C.E. que respectivamente estabelecem os critérios para o cálculo do valor do solo apto para construção e apto para outros fins.

Na decisão sob recurso foi considerado que a parcela expropriada se insere na categoria de “solo apto para construção”, com o valor de €200,00 da construção por metro quadrado de área bruta, índice fundiário de 20% e área de implantação de 49%.

Não contestam as partes a classificação do solo como apto para construção, por aplicação dos critérios definidos no artº 24 do C.E.; também o valor das construções merece uma unanimidade de opinião, ao ser determinado o valor de € 200,00 por metro quadrado de área bruta e o valor do solo apto para construção industrial em € 24,00/m2.

A divergência da Recorrente coloca-se, ao nível da avaliação da parcela expropriada, essencialmente em dois pontos:

- de ter sido considerado apenas o valor de 20% do valor do solo destinado à construção industrial, pelo facto de não ser possível construir  na parcela em causa, não obstante a sua classificação como solo apto para construção;

- de ter sido considerado o índice fundiário de 49% e não de 60%.

Os Recorrentes invocam a inconstitucionalidade, decretada com força obrigatória geral, do artº 8º nº 2 do C.E. que se refere à exclusão de indemnização no caso de constituição de servidão imposta por lei. E referem que à data da DUP não existia qualquer servidão non edificandi, pelo que não há que aplicar o artº 25 nº 5 do C.E.

Vejamos.

A área da parcela expropriada localizava-se em zona de servidão non edificandi, de acordo com o estabelecido no DL 13/94 de 15 de Janeiro, sendo que na mesma não era possível fazer qualquer construção à data da DUP. Tal diploma legal, já plenamente em vigor à data da DUP que é de 16/07/97, estabelece o regime das servidões non edificandi de protecção às estradas a construir ou reconstruir, aplicando-se a todas as estradas constantes do Plano Rodoviário Nacional. Tal servidão que onerava a parcela expropriada, já havia sido constituída pelo diploma legal em questão, não resultando directamente da expropriação, mas daquele diploma legal e do PDM de Maio de 1994, sendo que a desvalorização dos terrenos por ela abrangidos é transversal. Tem assim de considerar-se que a parcela de terreno em questão já estava afectada no seu valor por força daquela servidão non edificandi, não derivando a mesma do acto expropriativo.

Assim, não se desconhecendo a questão da inconstitucionalidade do artº 8º nº 2 do C.E., decretada com força obrigatória geral, constata-se que, tal norma não se aplica ao caso concreto, na medida em que a servidão non edificandi que onerava a parcela expropriada, não resulta directamente do acto expropriativo, mas daquele diploma legal anterior.

Verifica-se ainda, por outro lado, que a área correspondente à parcela expropriada afectada consistia no logradouro dos pavilhões industriais, sendo área destinada às manobras dos veículos; a expropriação incidiu sobre o logradouro do prédio parcialmente expropriado, pelo que, nem alterou em nada o uso que vinha sendo dado ao prédio.

Nesta medida, o valor da parcela expropriada, que é o que está aqui em consideração, deve levar em linha de conta que na mesma não se podia construir à data da DUP, daí ponderar-se que, neste aspecto, não há que censurar a decisão sob recurso, quando aplica a desvalorização resultante desse facto, atribuindo-lhe 20% do valor do solo apto para construção, com aplicação do artº 25 nº 5 do C.E.

Considera-se por isso que a desvalorização atribuída pelos Srs. Peritos no seu relatório, que resulta da aplicação do artº 25 nº 5 do C.E. e que veio a ser acolhida na sentença proferida, no sentido de atribuir uma desvalorização pelo facto de à data da DUP não ser possível construir na parcela expropriada, tem toda a razão de ser, não havendo censura a fazer à decisão sob recurso, neste aspecto.

Quanto ao índice de implantação ou de construção industrial , constata-se que o valor que é estabelecido pelo PDM, aprovado em Maio de 1994, para o local é o de 60%; ora estando já ocupada 11% da área com os pavilhões edificados, a parte sobrante do prédio é de 49%.

Alegam os Recorrentes que ainda era possível construir respeitando o índice de implantação de 0,49 o que não está minimamente demonstrado, nem resulta das premissas anteriores.

Em face do que fica exposto, considera-se que a decisão recorrida não merece censura ao fixar em € 33.566,40 o valor da parcela expropriada, para efeitos de indemnização.

- da desvalorização da propriedade dos Recorrentes, pela dificuldade das acessibilidades aos pavilhões.

Resulta dos factos apurados uma dificuldade acrescida da circulação e realização de manobras dos camiões que, em face da parcela expropriada, ficam com um espaço diminuído para o efeito.

Põe-se a questão da quantificação dos prejuízos dos Recorrentes devido a esta situação.

São os seguintes os factos que ficaram apurados com interesse para esta questão: quanto às acessibilidades aos pavilhões antes da expropriação da parcela em causa, os camiões articulados não tinham qualquer tipo de problema e faziam-no nomeadamente pela parte da frente; após a expropriação, os camiões dado o seu grande porte, têm muita dificuldade em encostar quer da parte da frente, quer de lado, roçando por cima do lancil e os camionistas precisam de fazer muitas manobras para encostar os carros; neste momento os camiões possuem cerca de 5 metros para fazerem manobras onde antes possuíam cerca de 10 a 15 metros, sendo necessário um empilhador para ir buscar a mercadoria e colocar nos camiões. Está ainda provado que, no terreno de onde foi destacada a parcela expropriada funcionam dois pavilhões industriais, que laboram há mais de 20 anos, dedicando-se à indústria de fabricação de radiadores.

Na 1ª perícia efectuada é certo que o Sr. Perito (…), vem a atribuir uma desvalorização do valor dos pavilhões em 25% devido a esta situação. Refere no seu relatório (a fls. 158) a este respeito, tão só o seguinte: “Uma vez que com a expropriação da parcela não vai permitir os veículos de marcha atrás, o que possibilitaria a carga e descarga de volumes pesados (caso de moldes), pois junto à porta chega um pórtico para o efeito, não permitindo ainda a dupla circulação com a facilidade desejada, calculamos um prejuízo de 25%.” De referir, no entanto, que a formação deste Sr. Perito é Engº Técnico Agrário e que o mesmo, mais tarde, veio alterar a sua avaliação quanto a este aspecto.

Na verdade, no laudo conjunto apresentado pelos Srs. Peritos, após rectificação da área da parcela expropriada, que aquele Perito também subscreve, estes vêm por unanimidade, quantificar tal prejuízo numa desvalorização ligeira de 1% do pavilhão, o que veio a ter acolhimento na sentença proferida pelo tribunal “a quo”. Aquele Sr. Perito veio assim a alterar a sua avaliação neste aspecto, integrando uma opinião unânime e conjunta de todos os peritos.

Pode, na verdade, considerar-se que tal dificuldade acrescida, de acesso dos camiões aos pavilhões, levam a um pequeno rebate no valor dos mesmos, conforme referem os Srs. Peritos, com conhecimentos técnicos para o efeito; já não pode, contudo, concluir-se como pretendem os Recorrentes, que tal se irá traduzir num maior custo e consequente prejuízo, para o exercício da actividade da empresa, o que não ficou minimamente demonstrado.

Quanto à quantificação do rebate do valor dos pavilhões faz-se fé na avaliação efectuada pelos Srs. Peritos, que atentos os seus conhecimentos técnicos melhor estão preparados para apreciar a desvalorização dos pavilhões ali existentes e que por unanimidade a consideram ligeira, ponderando os mesmos desvalorizados em apenas 1%.

É certo que a referida avaliação dos peritos, constituindo uma verdadeira prova pericial, o seu resultado está sujeito à livre apreciação do tribunal, de acordo com o disposto no artº 389º do C.Civil.

            No processo em causa, o laudo dos peritos, ainda que possa ser, naturalmente, apreciado de uma forma crítica pelo tribunal é determinante para a fixação da indemnização, pelos conhecimentos técnicos que nele são expressos por pessoas habilitadas para o efeito. No caso em presença, todos os Srs. Peritos são unânimes na desvalorização que apresentam que está fundamentada e encontra eco também no teor das respostas aos quesitos que são apresentados por ambas as partes.

            Considera-se por isso que é de manter a decisão sob recurso quando fixa em 1% a percentagem de desvalorização dos pavilhões pelas limitações às condições de circulação dos veículos impostas pela desanexação da parcela expropriada.

Parece-nos sim que já têm razão os Recorrentes quando referem que foi considerada apenas a desvalorização de um pavilhão, quando existem dois pavilhões, sendo que um deles não foi tido em conta.

Para efeitos de atribuição da indemnização da desvalorização pela dificuldade das acessibilidades foi considerado o pavilhão com a área de 1.230 m2 e com o valor de € 200,00/m2 (valor adoptado para o custo de construção industrial por metro quadrado de área bruta) que é assim avaliado em € 246.000.00. Foi, no entanto, omitido o segundo pavilhão existente.

Ora, é forçoso concluir que a desvalorização se verificará da mesma forma para ambos os pavilhões onde é exercida a actividade industrial. Assim, importa indemnizar os Recorrentes também pela desvalorização deste segundo pavilhão, com recurso aos mesmos critérios observados pelos Srs. Peritos.

Este segundo pavilhão tem a área de 1.402,50m2 (55 x 25,5) e ponderando o mesmo valor de construção de € 200,00/m2 de área bruta, o mesmo terá o valor de € 280.500,00 pelo que a sua desvalorização de 1% é quantificada em € 2.805,00.

Assim, aplicando a desvalorização de 1% a cada um dos pavilhões, a indemnização a atribuir a este título aos Recorrentes é a de € 5.265,00 (€ 2.460,00 + € 2.805,00).

Concede-se, nesta parte, parcial provimento ao recurso, fixando-se o valor da indemnização por desvalorização das acessibilidades na quantia de € 5.265,00 (cinco mil duzentos e sessenta e cinco euros).

- da atribuição de um valor indemnizatório autónomo ao poço existente, já previsto na decisão arbitral, nos termos do artº 684 nº 4 do C.P.C.

Vejamos então, em concreto, a questão do poço existente no terreno, ao qual a decisão arbitral atribuiu o valor de € 1.341,95 o que foi expressamente aceite pela Expropriada quando recorreu da decisão.

A sentença sob recurso não atribuiu qualquer valor indemnizatório ao poço por considerar que tal não se justifica pelo facto do solo ser considerado apto para construção, acolhendo a decisão unânime dos peritos a este respeito.

Invoca a Recorrente a contradição desta decisão com o facto da parcela de terreno ter sido desvalorizada por nela não poder construir-se, bem como a violação do artº 683 nº 4 do C.P.C.

Vejamos se assim é, começando por esta última questão.

O artº 684 do C.P.C., com a epígrafe: “Delimitação subjectiva e objectiva do recurso”, dispõe no seu nº 4, que: “os efeitos do julgado, na parte não recorrida, não podem ser prejudicados pela decisão do recurso nem pela anulação do processo.” O nº 3, por seu turno, permite ao Recorrente, nas suas conclusões, restringir expressa ou tacitamente o objecto do recurso.

A primeira questão que se põe é a da aplicabilidade da norma invocada, ao regime do recurso interposto do acórdão arbitral, o que passa pela qualificação da natureza deste.

Tem vindo a ser entendido na jurisprudência, de forma praticamente pacífica e unânime, que a decisão arbitral constitui uma verdadeira decisão judicial proveniente de um tribunal arbitral necessário, aplicando-se por isso ao recurso que incide sobre a mesma o regime dos recursos estabelecido no Código do Processo Civil, com as necessárias adaptações, vd. neste sentido, Salvador da Costa, in. Código das Expropriações e Estatuto dos Peritos Avaliadores, pág. 301. Concordamos na íntegra com esta posição e com as razões que a fundamentam e bem expressas, designadamente, no Acórdão deste Tribunal de 02/10/2012, in. www.dgsi.pt e às quais se adere na íntegra, dispensando-nos de as reproduzir aqui.

Do acórdão arbitral cabe sempre recurso para o tribunal do lugar da situação dos bens ou da sua maior extensão

Do acórdão arbitral, prévio a este processo, apenas os Expropriados vieram interpor recurso, dando início aos presentes autos; a Expropriante não recorreu de tal decisão, conformando-se, nessa altura, com a mesma, nos vários e em cada um dos pontos por ela abordados e decididos, entre os quais o valor indemnizatório fixado, a título de benfeitorias, para o poço existente na parcela expropriada.

Na sequência de tal posição das partes a questão que se põe é a de saber se o tribunal “a quo”, na sentença proferida, podia ter conhecido novamente da questão relativa à indemnização pelo poço, não impugnada anteriormente, e sobre a qual não incidiu o recurso, sendo certo que o fez agora em sentido desfavorável aos Expropriados (julgou agora que a benfeitoria em questão não é indemnizável) ao contrário da decisão arbitral.

O artº 684 nº 2 do C.P.C. dispõe que se a parte dispositiva da sentença contiver decisões distintas, é licito ao Recorrente restringir o recurso a qualquer delas, uma vez que especifique no requerimento a decisão de que recorre. Na falta de especificação, o recurso abrange tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao Recorrente.

Esta norma prevê a hipótese da decisão conter partes distintas, correspondendo cada uma delas às questões que são submetidas à apreciação do tribunal, conforme dispõe o artº 660 nº 2 do C.P.C. (o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuando aquelas cuja apreciação seja prejudicada pela solução dada a outra).

O Recorrente pode assim restringir o objecto do recurso, o que para o Tribunal superior é definido nas conclusões das alegações apresentadas, de acordo com o artº 684 nº 3 do C.P.C.

Na sequência destas normas, estabelece o nº 4 do mesmo artigo, que os efeitos do julgado se estendem à parte não recorrida da decisão que não pode ser prejudicada com a decisão do recurso ou a anulação do processo.

A decisão arbitral apreciou a questão da indemnização devida pelo poço, considerando-o benfeitoria indemnizável e atribuindo por ele aos Expropriados a quantia de € 1.341,95; a decisão sobre esta questão, delimitada e em concreto, não veio a merecer recurso por parte dos Expropriados, que no recurso por si interposto para o tribunal ressalvam expressamente que aceitam aquele valor indemnizatório, indo ao encontro do direito que lhes confere o artº 684 nº 2 do C.P.C., restringindo o objecto do recurso à apreciação de outras questões; também com ele se conformou a Expropriante, na medida em que não interpôs recurso daquela decisão.

Assim, considera-se que o tribunal “a quo” não devia ter-se pronunciado sobre tal questão, antes devia ter a mesma por assente, em observância do artº 684 nº 2 e nº 4 do C.P.C. por os efeitos do julgado se estenderem à parte do acórdão arbitral que decidiu a indemnização a atribuir ao poço o que expressamente foi aceite pelos Expropriados, que delimitaram o objecto do recurso ao tribunal, restringindo-o nessa parte, nos termos do artº 684 nº 2 do C.P.C.

Nestes termos, nesta parte, revoga-se a decisão recorrida, atribuindo-se aos Expropriados o valor de € 1.341,95 a título de indemnização pelo poço existente na parcela expropriada, que foi atribuído pelo acórdão arbitral.

- subsidiariamente, da indevida redução do montante indemnizatório atribuído pelo tribunal arbitral, pelo facto da expropriante dele não ter interposto recurso, em violação do artº 684 nº 4 do C.P.C.

Alegam as Recorrentes que deve considerar-se o valor fixado pelo Acórdão Arbitral de € 42.131,24 elevado proporcionalmente para € 51.283,51 em face do aumento da área expropriada verificada e que não pode ser reduzido pelo facto da Expropriada dele não ter recorrido, tendo-se conformado com tal decisão.

Impõe-se a decisão desta questão, posta pelos Recorrentes a título subsidiário, na medida em que a indemnização total atribuída nestes autos é, não obstante a procedência em parte das questões expostas que elevam o valor indemnizatório fixado pelo tribunal “a quo”, inferior àquela que foi atribuída no acórdão arbitral, do qual os Expropriados vieram a recorrer.

A indemnização contabilizada no processo ascende à quantia de €40.173,35 (€ 33.566,40 do valor da parcela expropriada + € 5.265,00 da desvalorização dos pavilhões pela mais difícil acessibilidade + € 1.341,95 do poço enquanto benfeitoria) enquanto que a indemnização atribuída pelo acórdão arbitral foi a de € 42.131,24 e portanto superior.

Será que os Recorrentes podem ficar prejudicados pelo facto de terem interposto recurso daquele acórdão arbitral, sendo agora fixado um valor indemnizatório inferior, quando a Expropriante não recorreu do mesmo ? 

Importa antes de mais referir, conforme já anteriormente se disse, que o acórdão arbitral tem a natureza de uma verdadeira decisão judicial, aplicando-se por isso, ao recurso interposto da mesma, o regime dos recursos estabelecido no Código do Processo Civil, com as necessárias adaptações. 

Nos termos do artº 682 nº 1 do C.P.C.: “se ambas as partes ficarem vencidas, cada uma delas terá de recorrer se quiser obter reforma de decisão na parte que lhe seja desfavorável.” Por seu turno, o artº 684º nº 4 dispõe que “os efeitos do caso julgado, na parte não recorrida, não podem ser prejudicados pela decisão do recurso nem pela anulação do processo”.
No caso em presença só os Expropriados interpuseram recurso do acórdão arbitral, o que significa que a Expropriante se conformou com o montante indemnizatório fixado, na totalidade das várias parcelas em que este se desdobra.

Esta norma vem excluir a “reformatio in pejus”, na medida em que o julgamento do recurso não pode agravar a posição do recorrente, tornando-a pior do que se ele não tivesse recorrido- vd. neste sentido, Prof. Alberto dos Reis, in. Código do Processo Civil anotado, Vol. V, pág. 311.

Assim sendo, a parte decisória não recorrida torna-se estável, não podendo a posição dos Recorrentes ser agravada, devido ao recurso por si interposto, adquirindo a força e autoridade de caso julgado, atenta a proibição constante do princípio da «reformatio in pejus»

Os Expropriados, no recurso que interpõem da decisão arbitral para o tribunal requerem que seja fixado um montante indemnizatório superior ao definido pelos árbitros, esse valor limite tem sempre que ser observado, sob pena dos mesmos serem prejudicados e uma vez que a Expropriante não recorreu. A sentença sob recurso tinha assim como limite o valor atribuído pelos árbitros, por um lado, e por outro, o pedido de indemnização pugnado pelos Recorrentes e deveria apenas ter averiguado se aquele montante indemnizatório já fixado podia ser superior (atento o facto da Expropriante não ter recorrido).

Em conclusão, a decisão do tribunal não pode ser mais desfavorável ao Recorrente do que a decisão arbitral por ele impugnada, atento o princípio da proibição da “reformatio in pejus” que decorre do artº 684 nº 4 do C.P.C., pelo que é o valor indemnizatório fixado na decisão arbitral que os Recorrentes têm direito a haver da expropriante.

Referem ainda os Recorrentes que tal valor, estabelecido no acórdão arbitral deve ser aumentado na proporção do aumento da área da parcela expropriada determinada já no âmbito destes autos.

Não têm, contudo, razão.

É certo que o acórdão arbitral apenas teve em conta a área de 5.745 m2 e que, mais tarde, no decurso deste processo, esta veio a ser ampliada para 6.993 m2. Contudo, tal pretensão dos Recorrentes não tem qualquer suporte legal. É que o valor indemnizatório fixado pelo tribunal teve já em conta a parcela expropriada com a área devidamente corrigida, tendo considerado um valor de indemnização adequado um pouco inferior àquele que foi determinado na decisão arbitral.

Contudo, há que considerar também que a decisão arbitral em processo de expropriação por utilidade pública faz caso julgado apenas no que respeita ao valor da indemnização fixada e já não quanto às qualificações feitas pelos árbitros, vd. neste sentido, entre outros, Acórdão deste Tribunal de 08/03/2006 e Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 30/10/2012, ambos in. www.dgsi.pt

O referido princípio da proibição da “reformatio in pejus” tem apenas em vista que o Recorrente não venha a ficar prejudicado pelo facto de ter recorrido da decisão e isso não acontece se lhe for atribuído o valor do acórdão arbitral. O caso julgado verifica-se, conforme já se disse, apenas quanto à decisão relativa à quantia indemnizatória atribuída- é que foi esta quantia indemnizatória global, com a qual a Expropriante se conformou, não recorrendo da decisão, que fez caso julgado.

Ora, os Recorrentes não ficam prejudicados com a decisão do tribunal, na medida em que não seja diminuído o valor primeiramente atribuído. É apenas nesta medida que se impõe o princípio mencionado, que se formou o caso julgado, e por isso não há fundamento para elevar proporcionalmente o valor atribuído pela decisão arbitral, uma vez que o tribunal judicial na sua decisão ponderou toda a área da parcela expropriada, atribuindo-lhe, ainda assim, um valor inferir ao atribuído pelos árbitros. É a este valor “tout court” que os Recorrentes têm direito, por efeitos do julgado.

Assim sendo, conclui-se que os Recorrentes não podem ver agora agravada a decisão arbitral, por via do recurso que interpuseram, considerando-se os efeitos do julgado da decisão quanto à indemnização fixada e da qual a Expropriante não recorreu, razão pela qual se revoga a decisão recorrida que se substitui por outra que atribui aos Recorrentes a quantia indemnizatória fixada no acórdão arbitral.  

V. Sumário:

1. Não obstante a qualificação do solo como apto para construção, se à data da DUP não se podia construir na parcela expropriada, o valor da mesma deve ser desvalorizado por esse facto, atribuindo-se-lhe 20% do valor do solo apto para construção, com aplicação do artº 25 nº 5 do C.E.

2. O acórdão arbitral constitui uma verdadeira decisão judicial proveniente de um tribunal arbitral necessário, aplicando-se por isso ao recurso que incide sobre o mesmo o regime dos recursos estabelecido no Código do Processo Civil, com as necessárias adaptações.

3. Se a decisão arbitral contem decisões distintas, é licito ao Recorrente restringir o recurso a qualquer delas, especificando no requerimento a decisão de que recorre ou aquela com a qual se conforma, ficando vedado ao tribunal o conhecimento da decisão na parte não impugnada, nos termos do artº 684 nº 2 e nº 4 do C.P.C.

4. A decisão do tribunal não pode ser mais desfavorável aos Recorrentes Expropriados do que a decisão arbitral por ele impugnada, e da qual a Expropriante não recorreu, atento o princípio da proibição da “reformatio in pejus” que decorre do artº 684 nº 4 do C.P.C.

5. O caso julgado verifica-se apenas quanto à decisão relativa à quantia indemnizatória globalmente atribuída, com a qual a Expropriante se conformou, não recorrendo da mesma.

VI. Decisão:

Em face do exposto, julga-se o presente recurso parcialmente procedente, revogando-se a decisão recorrida que se substitui por outra que atribui aos Recorrentes a quantia indemnizatória fixada no acórdão arbitral. 

Custas do recurso pelos Recorrentes e Recorrida, na proporção do decaimento.

Notifique.

                                                           *

                                  

           

                                               Maria Inês Moura (relatora)

                                                Luís Cravo (1º adjunto)

                                               Maria José Guerra (2ºadjunto)