Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
690/05.8GAACB-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: LUÍS COIMBRA
Descritores: SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA
CONDIÇÃO
NÃO-CUMPRIMENTO
AUDIÇÃO DO ARGUIDO
NOTIFICAÇÃO DO ARGUIDO
NULIDADE INSANÁVEL
Data do Acordão: 09/25/2013
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DE ALCOBAÇA (3.º JUÍZO)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 50.º, 51.º, 52.º E 53.º DO CP; ARTIGO 495.º, N.º 2, E 119.º, ALÍNEA C), DO CPP
Sumário: I - Sob pena de nulidade insanável, prevista no artigo 119.º, alínea c), do CPP, a decisão de revogação da suspensão da execução da pena pressupõe, genericamente, a prévia audição presencial do condenado e do seu defensor, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 495.º do mesmo diploma legal.

II - Só assim não será se a referida audição for inviabilizada por motivo imputável ao condenado (a título de exemplo, quando este se retira, sem justificação, da morada indicada no TIR), caso em que ainda é possível o exercício do contraditório, na sua expressão mínima, pelo defensor do arguido.

Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na 5ª Secção, Criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra

I. RELATÓRIO
1. No âmbito dos autos de Processo Comum (Colectivo) nº 690/05.8GAACB - que originaram o presente recurso em separado - e que correm termos pelo 3º Juízo do Tribunal Judicial de Alcobaça, por despacho de datado de 11.03.2011, foi determinada a revogação da suspensão da execução da pena de prisão ali aplicada ao arguido A… e determinado o cumprimento efectivo da pena de 4 anos e 3 meses de prisão em que foi condenado.
2. Inconformado, o arguido interpôs recurso, extraindo-se da respectiva motivação as seguintes (transcritas) conclusões:
“1° Por decisão transitada em julgado, foi o recorrente condenado no presente processo, na prática de um crime de incêndio p. e p. pelo art°272 n°1 do Código Penal na pena de 4 anos e 3 meses de prisão, cuja execução foi declarada suspensa pelo mesmo período sujeita ao regime de prova.
2° Por decisão transitada em julgado, foi o recorrente condenado no presente processo, na prática de um crime de incêndio p. e p. pelo art°272 n°1 do Código Penal na pena de 4 anos e 3 meses de prisão, cuja execução foi declarada suspensa pelo mesmo período sujeita ao regime de prova. [1]
3° Em 16/12/2010, o Ministério Público promoveu a suspensão da execução da pena[2], por o arguido não ter cumprido o regime de prova a que tinha condicionado.
4° Na sequência deste parecer, foi proferido despacho de suspensão da pena de prisão[3], com que o arguido não se conforma
5° O recorrente não esteve presente no dia da leitura da sentença, pelo que não conhecia o teor do acórdão
6º - É certo que esteve representado por advogado, e que face à jurisprudência maioritária o representou para tal efeito.
7° O arguido teve de mudar amiudadas vezes de morada por força das ameaças que sofreu e que o fez temer pela vida.
8° Isso explicaria se para tanto tivesse oportunidade, isto tendo em vista os TIR prestados.
9° Desconhece o arguido se a sua defensora foi notificada da promoção do M°P°
10° Mas, admitindo sem conceder e vistos o autos, não verificou qualquer notificação com indicação de dia e hora, para explicar o que se havia passado.
11º Ora, nos termos do disposto no art° 495 n°2 do CPP, a decisão ora “ sub-judicata” para efeitos do disposto no art°56 do CP, devia ter sido precedida da notificada ao arguido para a sua audição, com indicação de dia e hora.
12° Facto que nunca aconteceu.
13° E admitindo as dificuldades do arguido para tal efeito, o mesmo já não aconteceria, se tivesse para tal efeito a sua defensora oficiosa.
14° Não se tendo procedido à audição do arguido não houve demonstração de culpa.
15° Acresce que, o art° 495 n°2 do CPP exige a audição do arguido precisamente porque o que está aqui em causa é uma decisão que afecta particularmente a sua posição, o que exige que lhe seja plenamente assegurado o exercício de todos os direitos inseridos no direito constitucional de defesa, maxime os seus direitos de audiência e ao contraditório plasmados no art.° 32 n°2 n°5 do C.R.P. (vide Acórdão TRE, de 22.2.2005 in CJ XXX, 1, 267 e acórdão do TRL de 1.3.2005 in CJ XXX, 2, 123 de 22.2.2005)
16° Ora, assim sendo e nos termos do art° 119 alínea c) do CPP, o supra descrito consubstancia nulidade insanável, o que se vem arguir, e que pode ser oficiosamente declarada em qualquer fase do procedimento.
17° Por outro lado e perante o atrás descrito, não se pode falar que o arguido tenha cometido qualquer violação grosseira ou repetida dos deveres ou regras de conduta impostos ou do plano individual de readaptação social.
18° Quanto ao plano de readaptação social, o arguido desconhecia e desconhece qual é pelo que não pode ter violado o plano de readaptação social.
19° Quanto às regras de condutas impostas, nunca tal lhe foi directa ou indirectamente comunicado, nem por outro lado, a sentença indicava quanto teria de se apresentar para dar cumprimento ao plano individual de readaptação.
20º Não se pode falar de violação grosseira (CJ XXII, tomo I, 166) onde se lê: “ A violação grosseira dos deveres ou regras de conduta impostos, de que se fala na alínea a) do n°1 do art°56 do CP, há-de constituir uma indesculpável actuação, em que o comum dos cidadãos não incorra e que não mereça ser tolerado
21º Deverá assim a decisão em apreciação, ser substituída por outra em que se ordene a audição do arguido para se defender face à posição assumida pelo M°P°
ERJ
Normas violadas:
495 n°2 CPP
56º n°1 a) do CP
35 n°2 e 5 da Constituição da República Portuguesa”
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3. O Ministério Público, junto da 1ª instância, respondeu ao recurso, pugnando que o mesmo seja julgado improcedente e que seja integralmente mantido o despacho recorrido.

4. Depois de admitido a subir imediatamente, em separado e com efeito suspensivo, foi determinada a remessa dos autos a esta Relação, devidamente instruído e acompanhado de despacho (tabelar) de sustentação.
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5. Subidos os autos (certidão) a este Tribunal da Relação, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto, a fls. 327 a 329, sufragando a posição evidenciada pelo Ministério Público de 1ª instância, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso e confirmação do despacho recorrido.
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6. No âmbito do art.º 417.º, n.º 2 do Código Penal, o arguido não respondeu.
7. Foram colhidos os vistos legais e realizou-se a conferência.

II. FUNDAMENTAÇÃO
Constitui jurisprudência corrente dos tribunais superiores que o âmbito do recurso se afere e se delimita pelas conclusões formuladas na motivação apresentada (arts 403º e 412º, nº 1, in fine, do Código de Processo Penal), sem prejuízo das que importe conhecer, oficiosamente por obstativas da apreciação do seu mérito.

No caso vertente e vistas as conclusões do recurso, as questões suscitadas são essencialmente as seguintes:
A - Se foi violado o princípio do contraditório:
1) pelo facto do arguido não ter sido ouvido presencialmente, na sequência do que decorre do artigo 495º nº 2 do Código de Processo Penal;
2) pelo facto de não ter sido notificada a defensora do arguido para se pronunciar quanto à promovida revogação da suspensão da execução da pena.
B - Se estão ou não verificados os pressupostos que determinaram a revogação da suspensão da execução da pena, e nessa medida, se será de manter ou revogar a decisão recorrida.

A -1) Por forma a podermos tomar posição desde já em relação à primeira questão, importa fazer, ainda que de forma sintética, uma resenha da evolução/tramitação dos autos a que se reporta a presente certidão, desde o acórdão condenatório até à notificação do despacho recorrido. Ora constata-se que:
1. Por acórdão transitado em julgado no dia 9 de Setembro de 2009, o arguido foi condenado pela prática, em autoria material, de 1 (um) crime de incêndio, p. e p. pelo artigo 272°, n° 1, al. a), do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses e acompanhada de regime de prova.
2. O arguido não esteve presente na leitura do referido acórdão nem ao mesmo foi possível entregar cópia.
3. Por ofício datado de 16/12/2009, o Tribunal recorrido solicitou à DGRS-Equipa Porto Penal 4, a elaboração de Plano de Reinserção Social, nos termos e para efeitos do artigo 53º do Código Penal.
4. Por ofício datado de 03/03/2010 a DGRS-Equipa Porto Penal 4 veio informar não ter sido possível a realização do solicitado Plano de Reinserção Social, pelos seguintes fundamentos:
- após o envio de uma convocatória o arguido não compareceu;
- após ter sido enviada nova convocatória em carta registada com A/R a mesma foi devolvida com a indicação de não reclamada;
- após deslocação à morada constante dos autos, não foi possível averiguar se o arguido ainda ali residia.
5. Nessa sequência, e dando guarida ao promovido pelo Ministério Público, solicitou-se à PSP da Nazaré e à GNR de Valado dos Frades a notificação do arguido para comparecer na DGRS-Delegação de Alcobaça a fim de ser elaborado relatório social para regime de prova.
6. A PSP da Nazaré informando que o arguido ali não residia, enviou o expediente para a GNR da Maia por ter informações que o mesmo estaria a fazer apresentações na GNR da Maia (fls. 159 destes autos de recurso em separado). Nessa sequência, a GNR da Maia, veio informar que o arguido já ali não reside há cerca de um ano e que o apartamento onde vivia se encontra devoluto (cfr. fls. 167 destes autos de recurso);
7. A GNR de Valado dos Frades informou não ter sido possível notificar o arguido e desconhecer o seu paradeiro (fls. 161 destes autos de recurso em separado).
8. Na sequência da vista que então lhe foi aberta, em 16/12/2010, o Ministério Público (a fls. 177 e 178 destes autos de recurso) expressa a seguinte posição (transcrição):
“Por douto Acórdão de fls. 488 a 513, proferido no dia 9 de Julho de 2009, transitado em julgado, foi o arguido A… condenado pela prática de 1 (um) crime de incêndio, p. e p. pelo artigo 272°, nº 1, al., a), do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de prisão.
Mais resulta do douto Acórdão proferido nos presentes autos que, nos termos do artigo 50°, Código Penal, que a pena de prisão imposta ao arguido foi suspensa na sua execução, pelo período de 4 (quatro) anos 3 (três) meses, suspensão essa acompanhada de regime de prova, nos termos do disposto no artigo 53°, do mesmo Compêndio penal.
Mais resulta dos Autos que, desde a data do trânsito em julgado do douto Acórdão (9/908/2009) até à presente data, não foi possível proceder-se à elaboração do plano de readaptação social do arguido, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 53° e 54°, ambos do Código Penal e 494°, n° 3 do Código de Processo Penal, em virtude de o mesmo se ter ausentado para parte incerta, não obstante as diligências efectuadas com vista à sua notificação pessoal para comparecer na D.G.R.S.
Não obstante se ter ausentado para parte incerta o arguido não veio comunicar aos presentes Autos nova morada, apesar de continuar sujeito às obrigações decorrentes da prestação de termo de identidade e residência: -- Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça nº 6/2010, D.R. n° 99, Série I de 2010-05-21.
Nos termos do referido artigo 50°, nºs, 1 e 2, do Código Penal, é pressuposto material da aplicação do instituto da suspensão da execução da pena de prisão um prognóstico favorável pelo Tribunal, relativamente ao comportamento do condenado, tendo em atenção a sua personalidade e as circunstâncias do facto, no sentido de que a simples censura do facto e a ameaça da pena bastarão para o afastar da criminalidade, satisfazendo, simultaneamente as exigências de prevenção geral, ínsitas na finalidade da punição.
O arguido alheou-se completamente dos significados decorrentes da condenação de que foi alvo, ausentando-se para parte incerta, impossibilitando que fosse elaborado o plano de readaptação social do arguido, condição essa de que dependia a suspensão da pena de prisão em que foi condenado.
Assim, compulsados os autos, constatamos que os requisitos e as exigências de prevenção especial (maxime, de socialização), de prevenção geral que estiveram na base da suspensão da execução da pena se alteraram, pelo que se verificam motivos para a revogação da mesma, tendo em conta o disposto no artigo 56°, do Código Penal.
Face ao exposto, em conformidade com o estatuído no artigo 56°, nº 1, al, a), do Código Penal -- por impossibilidade na sua execução ---, promove o Ministério Público se revogue a suspensão da execução da pena de prisão em que o arguido A… foi condenado e se determine que os mesmo cumpra, a pena 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de prisão, em que foi condenado nos presentes autos.”
9. Desta promoção, em 14/01/2011, foi enviada cópia à (então) ilustre defensora oficiosa do arguido que nada disse.
10. É então proferido o despacho recorrido (constante de fls. 181 destes autos de recurso em separado, e que constará a fls. 606 dos autos principais) que tem o seguinte teor (transcrição):
“O arguido A… foi condenado, nos presentes autos, pela prática de 1 crime de incêndio, p. e p. pelo artigo 272°, n° 1, al. a), do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de prisão.
A pena de prisão imposta ao arguido foi suspensa na sua execução, pelo período de 4 (quatro) anos 3 (três) meses, suspensão essa acompanhada de regime de prova,
Desde a data do trânsito em julgado do Acórdão condenatório (9/908/2009) até à presente data, não foi possível proceder-se à elaboração do plano de readaptação social do arguido, em virtude de o mesmo se ter ausentado para parte incerta, não obstante as diligências efectuadas com vista à sua notificação pessoal para comparecer na D.G.R.S.
Não obstante se ter ausentado para parte incerta o arguido não veio comunicar aos presentes Autos nova morada, apesar de continuar sujeito às obrigações decorrentes da prestação de termo de identidade e residência.
O Ministério Público promove a revogação da suspensão da execução da pena.
Cumpre apreciar:
Nos termos do disposto no art. 56°, n.º 1, alínea a) do Código Penal, a suspensão da execução da pena de prisão é revogada sempre que, no seu decurso, o condenado infringir grosseira ou repetidamente os deveres ou regras de conduta impostos ou o plano individual de readaptação social.
Como refere Paulo Pinto de Albuquerque no Comentário do Código Penal (Univ. Cat. Ed., 2008, pág. 201). A infracção grosseira não tem que ser dolosa, sendo bastante a infracção que resulte de uma atitude particularmente censurável de descuido ou leviandade. ( ... ) A colocação intencional do condenado em situação de incapacidade de cumprir as condições da suspensão constitui violação grosseira dessas condições.
Como bem alega o Digno Magistrado do MP, o arguido alheou-se completamente dos significados decorrentes da condenação de que foi alvo, ausentando-se para parte incerta, impossibilitando que fosse elaborado o plano de readaptação social, condição essa de que dependia a suspensão da pena de prisão em que foi condenado.
Face ao exposto, em conformidade com o estatuído no artigo 56°, nº 1, al. a), do Código Penal, revogo a suspensão da execução da pena de prisão em que o arguido A… foi condenado e determino que o mesmo cumpra, a pena 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de prisão, em que foi condenado nos presentes autos.
Após trânsito, emita os competentes mandatos de captura e oportunamente abra vista.
Notifique
D.N”
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11. Deste despacho, ora recorrido, foi o arguido pessoalmente notificado no dia 18.07.2012, no cumprimento de carta rogatória enviada pelo tribunal a quo para Court D´Apell de Riom, França, residindo nessa altura em: Appartement 63, 879 Avenue Emile Hugues 06140, Vence, France.


Feita esta resenha do evoluir dos autos, constatamos que efectivamente o tribunal recorrido não procedeu à audição do arguido em conformidade com o estabelecido no artigo 495º nº 2 do Código de Processo Penal (diploma a que se reportam as demais disposições citadas sem menção de origem).
Dispõem os nºs 1 e 2 do artigo 496º (que tem como epígrafe “Falta de cumprimento das condições de suspensão”:
1 – Quaisquer autoridades e serviços aos quais seja pedido apoio ao condenado no cumprimento dos deveres, regras de conduta ou outras obrigações impostos comunicam ao tribunal a falta de cumprimento, por aquele, desses deveres, regras de conduta ou obrigações, para efeitos do disposto no n.º 3 do artigo 51.º, no n.º 3 do artigo 52.º e nos artigos 55.º e 56.º do Código Penal.
2 - O tribunal decide por despacho, depois de recolhida a prova, obtido parecer do Ministério Público e ouvido o condenado na presença do técnico que apoia e fiscaliza o cumprimento das condições da suspensão.

O princípio do contraditório tem tutela constitucional expressa no art. 32º, nº 5 da Constituição da República Portuguesa).
O artigo 61º do Código de Processo Penal, que trata dos direitos e deveres do arguido, distingue nas suas alíneas a) e b), respectivamente, o direito de presença – “estar presente aos actos processuais que directamente lhe disserem respeito” – e o direito de audiência – ser ouvido pelo juiz sempre que ele deva tomar qualquer decisão que pessoalmente o afecte.
Decorre do art. 113º, nº 9 do Código de Processo Penal que todas as notificações que visem o arguido devem ser notificadas ao seu advogado ou defensor oficioso (cfr. Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do CPP, 4ª edição, pag 304), independentemente de o terem de ser, em alguns casos, também ao arguido (AFJ nº 6/2010, D.R., Iª Série, pags. 1747-1759: “nos termos do nº 9 do art. 113º do CPP, a decisão de revogação da suspensão da execução da pena de prisão deve ser notificada tanto ao defensor como ao condenado” - ponto I da fixação de jurisprudência).
O T.I.R. é um meio processual de limitação de liberdade pessoal, que serve a eficácia do procedimento (art. 191º, nº 1 do CPP), do qual resultam deveres de identificação, de indicação de residência, de não mudança de residência sem comunicação, de comparência, de manutenção à disposição da autoridade (art. 333º do CPP). Mas do art. 214º, nº1, al. e) do Código de Processo Penal (na redacção vigente à data do despacho recorrido) resultava que o T.I.R., como qualquer medida de coacção, se extinguia “com o trânsito em julgado da sentença condenatória”. Actualmente, e por força das alterações introduzidas pela Lei nº 20/2013, de 21 de Fevereiro, da aliena e) decorre do nº 1 do artigo 214º decorre que o “termo de identidade e residência só se extinguirá com a extinção da pena.”
O art. 61º, al. f) do Código de Processo Penal confere ao arguido o direito de ser assistido por defensor em todos os actos processuais em que participar, impondo o art. 64º a obrigatoriedade de assistência em determinadas situações.
Por último, o art. 119º, al. c) do Código de Processo Penal comina com nulidade insanável “a ausência do arguido e do seu defensor, nos casos em que a lei exigir a respectiva comparência”
São estes os preceitos legais convocáveis para a decisão desta parte do recurso.
Deles resulta que o despacho de revogação da suspensão da execução da pena é, por imperativo legal explícito, obrigatoriamente precedida de audição do arguido – o tribunal decide, obtido parecer do Ministério Público e ouvido o condenado.
Esta audição é, hoje (como também de modo praticamente unânime considerado pela jurisprudência (cfr. entre muitos outros os Acs desta Relação de 01/07/2009 e de 18/05/2010, in www.dgsi.pt) necessariamente presencial, uma vez que o condenado tem de ser ouvido na presença do técnico, outra interpretação não sendo possível desde 2007, data em que foi aditado à versão anterior (pela Lei nº 48/2007 de 29/08) o segmento “na presença do técnico que apoia e fiscaliza o cumprimento das condições da suspensão”.
A obrigatoriedade de audição, manifestação exponencial do princípio do contraditório, visa fazer preceder a decisão judicial sobre a alteração de pena de substituição (maxime, a sua revogação) da audição presencial do sujeito processual nela mais directa e pessoalmente interessado – o arguido.
O legislador é, mais uma vez, claro no enunciado de normas que evidenciam a importância da decisão sobre a pena. Cumpre assegurar à pena a consideração que merece, no processo (prático) de decisão do caso.
Também no AFJ nº 6/2010, o STJ considerou que o despacho de revogação da suspensão da pena é complementar da sentença; que tem como efeito directo a privação de liberdade do condenado; que as consequências se aproximam das da sentença que condena em pena de prisão; que na fase da execução da pena se atenua a presunção de certeza de um acompanhamento/relacionamento próximo entre o defensor e o condenado; que as razões que teleologicamente conduziram à solução legislativa de impor a notificação da sentença ao defensor e ao arguido justificam que este regime de notificação seja estendido à notificação do despacho de revogação da suspensão da execução da pena.
E embora naquele AFJ se trate já da questão da notificação de decisão de revogação de pena suspensa e, aqui, estamos a analisar a omissão procedimental prévia à decisão da revogação dessa suspensão, consideramos que as razões que acabámos de eleger se elegem para o caso sub judice, tratando-se sempre e só de decisão que ordena a privação de liberdade, o cumprimento de prisão.
Assim, decorre do art. 495º, nº 2 do Código de Processo Penal que o juiz, antes de proferir despacho a revogar a suspensão da execução pena de prisão deve ouvir presencialmente o arguido. Está em causa a alteração/revogação da pena de substituição, com a probabilidade séria de ser ordenado o cumprimento da pena de prisão.
Trata-se, no fundo, de procurar manter o mesmo patamar de contraditório para lá daquele que é conatural ao julgamento.
Na prática, o pensamento será este: a possibilidade de pena (de determinação da pena) pressupõe uma audiência de discussão e julgamento; não há processo determinativo e aplicativo de pena fora do julgamento; a decisão de alteração/revogação da pena de substituição é ainda decisão sobre a pena; no limite, está em causa a conversão de pena de substituição em prisão.
Assim, uma decisão de revogação da suspensão da execução da pena, pressupõe a prévia audição presencial do arguido; e a ausência do arguido ou do seu defensor nos casos em que a lei exigir a respectiva comparência constitui nulidade insanável.

No caso em apreço, o tribunal recorrido, previamente à prolação da decisão recorrida, e na sequência da informação veiculada pela DGRS de que o arguido não tinha comparecido à entrevista nem foi possível proceder à sua notificação para a realização da entrevista necessária à elaboração do Plano de Reinserção Social, diligenciou pela localização do arguido quer junto dos OPC´s das últimas moradas conhecidas do arguido, quer através das bases de dados disponíveis.
Porém, até ao despacho recorrido nenhuma informação tinha sido conseguida tendente à obtenção da sua concreta morada.
Ora, do art. 495º, nº2 do Código de Processo Penal, decorre que o direito de audiência concorre com o direito de presença, ou seja, a garantia de contraditório implica a audição presencial do arguido.
Todavia, desta garantia de contraditório na modalidade de “direito de presença” não decorre a inviabilização de decisão “ad eternum” motivada pela falta do arguido, ou seja, na impossibilidade de o fazer comparecer perante o juiz – pois que, no limite, colocaria a decisão judicial na disponibilidade deste, ou pelo menos, a possibilidade de poder retardar intoleravelmente o processo.
É que a inviabilização da audição presencial – por comportamento imputável ao próprio arguido que depois de ter sido alvo de uma condenação vem a retirar-se da morada que havia indicado nos autos e não fornece qualquer outra – não pode contagiar nem comprometer o exercício do contraditório na vertente de direito de audiência.
Ou seja, exigindo a lei que o contraditório se exerça, no caso, na sua expressão máxima de audição presencial, frustrada esta por motivo não imputável ao tribunal, será ainda possível garantir o contraditório na sua expressão mínima – audição no processo através de defensor (“o defensor exerce no processo os direitos que a lei reconhece ao arguido” – art. 63º, nº1 do Código de Processo Penal).
Ora, não tendo sido possível a sua audição pessoal, por motivo imputável ao próprio arguido, não se pode dizer que ao decidir pela revogação da suspensão da execução da pena de prisão o tribunal tivesse cometido a nulidade por falta do cumprimento do disposto no artigo 495º nº 2 do Código de Processo Penal, conjugada com o artigo 119º c) do Código de Processo Penal.
Não tendo sido possível, por circunstâncias apenas imputáveis ao próprio arguido (que deixou de residir em qualquer das moradas até então conhecidas nos autos), assegurar o contraditório máximo (consiste na audição presencial), não vislumbramos que nessa perspectiva tivesse sido cometida aquela concreta nulidade. O contrário é que seria destituído de sentido porque proporcionaria a um arguido incontactável (e sabendo que tem “contas a prestar” na sequência de uma condenação) um prémio em manter essa incontactibilidade e assim entorpecer a acção da justiça. Nessa altura, e apesar das diligências efectuadas pelo tribunal a quo, nenhuma informação acerca do seu concreto paradeiro tinha sido conseguida.
Daí que, mostrando-se inviável a possibilidade de audição presencial do arguido (como se constata dos autos por se desconhecer o seu paradeiro, desconhecimento esse que podemos considerar implicitamente reconhecido pela sua própria defensora oficiosa que nada disse quando foi notificada da promoção do Ministério Público no sentido da revogação da suspensão da execução da pena) consideramos que essa não audição presencial não acarreta a pretendida nulidade decorrente da inobservância do artigo 495º nº 2 do Código de Processo Penal.
Por isso, falece a primeira parte da primeira pretensão do recorrente nos termos em que vinha propugnada.

A- 2) Na segunda parte da sua primeira pretensão, invoca ainda o recorrente que foi violado o princípio do contraditório pelo facto de não ter sido notificada a sua então defensora oficiosa para se pronunciar quanto à promovida revogação da suspensão da execução da pena.
Também aqui inexiste razão ao recorrente.
Com efeito, compulsados os elementos constantes da certidão instrutiva do presente recurso e como já tivemos oportunidade de mencionar aquando da resenha do evoluir dos autos, constata-se que previamente à prolação do despacho recorrido, a defensora oficiosa do arguido foi notificada, por carta registada, da promoção do Ministério Público no sentido da revogação da suspensão da execução da pena. E a mesma nada disse na sequência dessa mesma notificação.
Por isso, apesar de não exercido por quem de direito (neste caso pela defensora do arguido que não se manifestou em relação à pretendida revogação da suspensão da execução da pena), consideramos que o tribunal a quo cumpriu cabalmente o princípio do contraditório (também na sua versão mínima, ou processual, dado não ter sido possível na versão máxima ou presencial do arguido), antes de proferir o despacho posto em crise neste recurso.
Assim, e sem necessidade de aprofundadas considerações, falece também a segunda parte da primeira pretensão do recorrente.

B – Passemos agora a analisar a segunda questão que consiste em saber se estão ou não verificados os pressupostos que determinaram a revogação da suspensão da execução da pena, e nessa medida, se será de manter ou revogar a decisão recorrida.
Na motivação do seu recurso, alega o arguido que se tinha ausentado por ter sido vítima de ameaças e sentir que a sua vida e a dos seus em perigo. Mais alega que não teve possibilidade de comparecer na DGRS pois não teve conhecimento de tal obrigação. E manifesta vontade de explicar essas vicissitudes logo que seja ouvido, depois de também invocar que “ninguém atira ao ar a possibilidade de não ter de cumprir 4 anos e 3 meses de ânimo leve”.
Em busca da solução para esta questão a decidir, e atrás enunciada, importa fazer uma muito breve referência acerca dos contornos jurídicos do regime da pena que ao recorrente foi aplicada e das vicissitudes que a mesma pode sofrer durante a sua execução, maxime a revogação que aqui nos interessa em especial.
É entendimento generalizado que a suspensão da execução da pena de prisão “não representa um simples incidente, ou mesmo só uma modificação, da execução da pena, mas uma pena autónoma e portanto, na sua acepção mais estrita e exigente, uma pena de substituição” (cfr. Fig. Dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, pág. 339), com conteúdo político-criminal e campo de aplicação próprios. Esta pena constitui uma das opções, vinculativa para o julgador quando se verifiquem os necessários pressupostos, que permite evitar a aplicação de uma pena de prisão, efectiva, sendo certo que esta constitui, no nosso ordenamento jurídico-penal, a ultima ratio, reservada para os casos extremos em que a nenhuma das penas alternativas ou de substituição aplicáveis se reconheça aptidão para realizar as finalidades da punição. Finalidades estas que vêm indicadas no nº 1 do art. 40º, em concreto a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, e que são “exclusivamente preventivas, de prevenção especial e de prevenção geral, não finalidades de compensação da culpa” (cfr. autor e obra atrás citada, pag 331).
A finalidade essencial visada pelo instituto da suspensão é a ressocialização do agente, na vertente da prevenção da reincidência, sendo que os pressupostos e expectativas de êxito são aferidas, no momento da decisão, em função dos indicadores enumerados no nº 1 do art. 50º do Código Penal. É, pois, sobre estes que há-de assentar o prognóstico relativo ao comportamento futuro do agente e que, sendo favorável, imporá o decretamento da suspensão, a menos que a ela se oponham irrenunciáveis exigências de defesa do ordenamento jurídico.
Vejamos agora o que estabelecem os arts 56º e 55º do Código Penal
Diz-nos o artigo 56º que tem como epígrafe Revogação da suspensão”
 “1. A suspensão da execução da pena de prisão é revogada sempre que, no seu decurso, o condenado:
a)Infringir grosseira e repetidamente os deveres ou regras de conduta impostos ou o plano individual de reabilitação social; ou
b) Cometer crime pelo qual venha a ser condenado, e revelar que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas.
2....”
E diz-se no art. 55º:
“Se durante o período da suspensão, o condenado, culposamente, deixar de cumprir qualquer dos deveres ou regras de conduta impostos, ou não corresponder ao plano de readaptação, pode o tribunal:
a) Fazer uma solene advertência;
b) Exigir garantias de cumprimento das obrigações que condicionam a suspensão;
c) Impor novos deveres ou regras de conduta, ou introduzir exigências acrescidas no plano de readaptação;
d)Prorrogar o período da suspensão até metade do prazo inicialmente fixado, mas não por menos de um ano nem por forma a exceder o prazo máximo de suspensão previsto no n.º 5 do artigo 50º”.
De tais preceitos legais decorre que o incumprimento culposo determina a aplicação do regime do art. 55º do Código Penal  e só o incumprimento grosseiro ou repetido das condições de suspensão ou a prática de crime pelo qual o condenado venha a ser condenado revelar que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas, conduzem à aplicação do art. 56º do Código Penal (neste sentido, cfr. o Acórdão do TRL de 06.06.2006, in www.dgsi.pt).
As causas determinativas da revogação desta pena de substituição, que admite quatro modalidades (simples, subordinada ao cumprimento de deveres, com imposição de regras de conduta ou acompanhada de regime de prova), estabelecidas no nº 1 do art. 56º do Código Penal, reportam-se, pois, a anomalias graves, imputáveis ao condenado, que se venham a registar no decurso do período da suspensão, sendo uma delas, a única que no presente caso nos interessa, a infracção grosseira ou repetida dos deveres ou regras de conduta impostos ou o plano de reinserção social, e sendo a outra o cometimento de novo crime.
Nas palavras de Paulo Pinto de Albuquerque, a infracção grosseira “não tem de ser dolosa, sendo bastante a infracção que resulta de uma atitude particularmente censurável de descuido ou leviandade (…) A colocação intencional do condenado em situação de incapacidade de cumprir as condições da suspensão constitui violação grosseira dessas condições” enquanto que a infracção repetida “é aquela que resulta de uma atitude de descuido e leviandade prolongada no tempo, isto é, que não se esgota num acto isolado da vida do condenado, mas revela uma postura de menosprezo pelas limitações resultantes da sentença condenatória” (in «Comentário do Código Penal», Universidade Católica Editora – 2008, págs 201 e 202).
E ainda segundo a mesmo autor “O critério material para decidir sobre a revogação da suspensão é exclusivamente preventivo, isto é, o tribunal deve ponderar se as finalidades preventivas que sustentaram a decisão de suspensão ainda podem ser alcançadas com a manutenção da mesma ou estão irremediavelmente prejudicadas em virtude da conduta posterior do condenado. Com efeito, a condição prevista na parte final da al.ª b) do n.º 1 (”e revelar que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas”) refere-se a ambas as causas de revogação da suspensão previstas nas duas alíneas” (in Comentário do Código Penal, pág. 202).
Já Victor de Sá Pereira e Alexandre Lafayette (no «Código Penal – Anotado e Comentado», Quid Juris - 2008, pág. 189), sublinham que «grosseira quer dizer grave, rude, ordinária, vil, baixa, reles».
E adiantam que «a repetição do infringente, persistindo em não cumprir ou em não corresponder vale, só por si, uma forma de grosseria e daí a equivalência analógica que a lei estabelece».
De salientar ainda, que “as causas de revogação não devem ser entendidas com um critério formalista, mas antes como demonstrativas das falhas do condenado no decurso do período da suspensão. O réu deve ter demonstrado com o seu comportamento que não se cumpriram as expectativas que motivaram a concessão da suspensão da pena” e que a revogação “só deverá ter lugar como ultima ratio, isto é, quando estiverem esgotadas ou se revelarem de todo ineficazes as providências que este preceito [o actual art. 55º] contém”(cfr. Leal Henriques e Simas Santos, in Código Penal Anotado, 1º vol., 1995, pág. 481).
Decorre também do Acórdão desta Relação de Coimbra, de 13.03.1085 que “A apreciação sobre a falta de cumprimento dos deveres impostos na sentença como condicionantes da suspensão da pena deve ser cuidadosa e criteriosa de modo que apenas uma falta grosseira ou a condenação por crime doloso em pena de prisão determina a revogação da pena” (in CJ Ano X, tomo II, pag 72).
Impõe-se, por isso, uma especial exigência na indagação e apreciação de todos os factos e circunstancialismos susceptíveis de relevar na aferição da possibilidade de manutenção ou não do juízo de prognose favorável relativo ao comportamento que o arguido condenado irá de futuro adoptar.

Tecidas estas considerações doutrinárias e jurisprudências, e voltando ao caso dos autos, será que a não comparência do arguido na DGRS para a entrevista destinada à elaboração do Plano de Readaptação Social (plano esse básico para a estruturação do regime de prova) constitui fundamento para a revogação da suspensão da execução da penal?
Numa perspectiva objectiva e formalista podíamos ser levados a entender que sim e, nessa medida, a dar razão ao despacho recorrido.
Com efeito, não há dúvidas que o recorrente não cumpriu pelo menos uma das condições que lhe foram impostas com a suspensão da execução da pena, a de se sujeitar ao acompanhamento por parte da DGRS, ausentando-se das moradas até então conhecidas nos autos, sem disso dar conta no processo, e inviabilizando, dessa forma, o controle do cumprimento das demais condições que viessem a ser decididas implementar em tal Plano.
Também não é menos certo que o tribunal recorrido desenvolveu várias diligências que no caso se impunham no sentido de averiguar o seu paradeiro a fim de notificá-lo pessoalmente para se apresentar na DGRS. Nessa medida, nenhuma censura merece a decisão recorrida ao concluir que, face aos elementos que até então havia sido possível coligir, se estava perante um incumprimento grosseiro dos deveres, justificativo da revogação da suspensão.

No entanto, tendo em conta que nesta matéria não nos devemos pautar por critérios de estrita legalidade formal e que o que importa, de facto, determinar é se ainda é possível a ressocialização do agente, não podemos também ignorar, mesmo assim o que resulta dos autos e também as informações que entretanto o arguido, com o presente recurso, veio dar aos autos.
É certo que a falta do arguido à leitura do acórdão condenatório (onde qualquer dúvida que tivesse lhe poderia ser esclarecida pela presidente do colectivo) apenas ao mesmo é imputável.
Todavia, para além da parte dispositiva do referido acórdão ser demasiado telegráfica e sintética quando, na parte direccionada ao arguido, fora a questão respeitante às custas, apenas consta “Nestes termos, a tudo atendendo, os juízes que compõem o presente Tribunal Colectivo decidem condenar o arguido A… (…), na pena de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de prisão, cuja execução se suspende, nos termos do art. 50.º do Código Penal pelo período de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses, suspensão esta que, nos termos do art. 53º do Código Penal é acompanhada de regime de prova”, importa, de sobremaneira, referir que dos autos não resulta minimamente demonstrado que o arguido tivesse sido efectivamente notificado para comparecer na DGRS, apesar de tal notificação ter sido tentada, como vimos, mas sem êxito, através de OPC’s. E nem dos elementos que instruem o presente recurso decorre que ao mesmo tivesse sido enviada carta simples com PD (para a morada do TIR) a notificá-lo para comparecer na DGRS.
Para além disso, como atrás deixámos enunciado, na motivação do seu recurso, alega o arguido que se tinha ausentado por ter sido vítima de ameaças e sentir a sua vida e a dos seus em perigo. Mais alega que não teve possibilidade de comparecer na DGRS pois não teve conhecimento de tal obrigação. E manifesta vontade de explicar essas vicissitudes logo que seja ouvido, depois de também invocar que “ninguém atira ao ar a possibilidade de não ter de cumprir 4 anos e 3 meses de ânimo leve”.
Ora, se bem que a conduta processual do recorrente não seja isenta de reparos, merecendo forte censura o facto de não ter comparecido à leitura de sentença e de não ter vindo aos autos, atempadamente, informar da sua nova morada (agora no estrangeiro) para efeitos de posteriores notificações (ainda por cima no seu próprio interesse) – ainda que eventualmente por ignorância ou deficiente compreensão que a outros não são imputáveis - e, dessa forma, ter inviabilizado o acompanhamento por parte do DGRS, a verdade é que o recorrente parece trazer aos autos elementos que apontam no sentido de pretender efectivamente beneficiar da suspensão da execução da pena de prisão. Em face desses novos elementos, de conhecimento superveniente - e a vir a confirmar-se o que deles se infere - não se mostrarão esgotadas as possibilidades da socialização do recorrente em liberdade e, nessa medida, não se apresentará como irremediavelmente frustrado o juízo de prognose positiva que esteve na base da suspensão aquando do acórdão condenatório.
Entendemos, assim, que se justifica uma derradeira tentativa no sentido de evitar o cumprimento da pena de prisão, sendo que para isso o arguido terá que dar o seu melhor, cooperando com o tribunal, por forma a não deixar descurar as expectativas que lhe foram feitas para merecer o cumprimento de uma pena em liberdade.
Nessa medida, consideramos que se deve lançar mão do disposto nas als. a) e d) do art. 55º do C. Penal, fazendo-lhe uma solene advertência e prorrogando o período de suspensão pelo tempo ainda restante de modo a não exceder o prazo máximo de suspensão previsto no nº 5 do artigo 50º do Código Penal, de forma a permitir indagar, após audição do mesmo, se, efectivamente, ao recorrente ocorreram efectivamente as vicissitudes que alega na motivação de recurso (que o mesmo terá possibilidade de explicar nesta nova concedida possibilidade de ser ouvido) e, pelo menos a partir de agora, também de se sujeitar ao acompanhamento da DGRS no âmbito do regime de prova condicionante da suspensão.
Será, pois, assim que o recorrente poderá gozar de uma derradeira oportunidade decorrente da sua própria aventada expressão: ”ninguém atira ao ar a possibilidade de não ter de cumprir 4 anos e 3 meses de ânimo leve.
                                                   *
III. DECISÃO
Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes desta Relação em, concedendo provimento ao recurso, revogar o despacho recorrido o qual deve ser substituído por outro que, após ouvir o recorrente e de lhe fazer uma solene advertência, decida em conformidade.
Sem custas.
                                                   *

 (Luís Coimbra - Relator)

 (Isabel Silva)

[1] Certamente por lapso que esta segunda conclusão se traduz na repetição da primeira.
[2] Certamente pretendia mencionar “promoveu a revogação da suspensão da execução da pena”
[3] Certamente pretendia mencionar “foi “proferido despacho de revogação da suspensão da execução da pena de prisão”