Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | CARLOS QUERIDO | ||
Descritores: | PROPRIEDADE JUSTIFICAÇÃO NOTARIAL IMPUGNAÇÃO ÓNUS DA PROVA DESPACHO DE APERFEIÇOAMENTO | ||
Data do Acordão: | 05/03/2011 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | POMBAL | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Legislação Nacional: | ARTS.342, 343 CC, 4, 28, 193 E 508 CPC | ||
Sumário: | 1. Pedindo a autora a declaração judicial do seu direito de compropriedade sobre coisa comum, verifica-se a necessidade de litisconsórcio necessário passivo, na medida em que a ausência de qualquer dos consortes inviabiliza a produção do “efeito útil normal” da decisão a proferir, nos termos do n.º 2 do artigo 28.º do CPC. 2. Revela-se pacífico o entendimento de que acção de impugnação de escritura de justificação notarial tem natureza de simples apreciação negativa (art. 4.º, n.º 2, a. a), do CPC), por visar apenas a declaração da inexistência do direito arrogado na escritura. 3. Daí decorre que sobre os réus (justificantes) recai o ónus de alegação e prova dos factos constitutivos integradores da aquisição do direito de propriedade, de que se arrogaram na escritura de justificação (art. 343.º, n.º 1, do CC). 4. Confrontada com a escritura de justificação notarial, a autora podia validamente seguir um dos dois caminhos: i) optar por se limitar a pedir a declaração de inexistência do direito dos réus (justificantes), configurando a acção como de simples apreciação negativa e transferindo para os réus o ónus de alegação e prova do direito justificado; ii) ou pedir, pela positiva, a declaração do seu direito, passando a assumir todos os ónus de alegação e prova dos respectivos pressupostos. 5. Optando a autora por requerer ao tribunal a declaração positiva - condenação dos réus (justificantes) no reconhecimento do seu direito de propriedade sobre o bem imóvel objecto da escritura de justificação -, a acção não assume a natureza de simples apreciação negativa (art. 4.º, n.º 1 a) do CPC), deixando de recair sobre os réus o ónus de alegação e prova do direito que invocam (art. 343/1 CC), o qual, nos termos gerais passa a recair sobre a autora (art. 342/1 CC). 6. Formulada a pretensão nos termos referidos, os réus podem limitar-se à impugnação dos factos alegados pela autora. 7. No entanto, um vez judicialmente declarado o direito de propriedade da autora, o mesmo será incompatível com a declaração constante da escritura de justificação, obstando assim validamente à eficácia desta. 8. O poder atribuído ao juiz pelo art.508 nº3 do CPC não é um poder vinculado, pelo que a omissão do despacho de aperfeiçoamento não configura qualquer nulidade processual. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra I. Relatório Invocando a qualidade de representante da “herança jacente” de M (…), veio G (…) intentar a presente acção, sob a forma de processo sumário, contra E (…) e mulher D (…), pedindo: i) que se declare “que o prédio identificado no art. 1º da p.i. é propriedade, na proporção de uma quarta parte, da herança jacente aberta por óbito de M (…)”; ii) que sejam “os réus condenados a restituírem à herança os prédios identificados no art. 1º da p.i.” (sic) e a absterem-se da prática de qualquer acto que impeça ou diminua a utilização por parte da autora de tal prédio de que ela é comproprietária; iii) que não seja passada certidão da escritura de justificação de 19 de Fevereiro, nos termos do art. 101º do CNotariado; iv) que sejam os réus condenados a título de indemnização por danos morais, na quantia de € 2.000,00, bem como a pagarem a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença, por danos patrimoniais. Como fundamento da sua pretensão, alegou a autora em síntese: a) que a herança que representa é comproprietária do prédio identificado no artigo 1.º da petição; que o referido prédio foi propriedade plena de (…) e mulher (…), tendo sido por óbito desta, ocorrido em 6/10/1960, adjudicado na forma seguinte: 1/6 a (…) casado com (…), 2/6 a (…), casado com (…) e 1/2 a (…), casada com (…); que (…) vendeu a sua parte (1/2) aos seus dois irmãos – G (…) (autora) e (…), em partes iguais, ou seja, 1/4 do referido prédio a cada um; que por sua vez (…) vendeu a sua parte (1/4 do prédio referido) ao réu E (…); que em 12.06.1991 faleceu o marido da autora – M (…), deixando como únicos herdeiros, para além da esposa (autora), os filhos (…); que os réus fizeram escritura de justificação notarial na qual declararam ter adquirido por usucapião um prédio rústico, omisso na matriz; que os réus apenas possuem uma quarta parte do prédio identificado no art. 1º da p.i., inscrito na matriz sob o nº X..., nunca tendo possuído qualquer prédio rústico em propriedade plena; que, consultado o processo administrativo que deu origem à inscrição do prédio omisso nº ..., se constata que o levantamento topográfico junto corresponde à quarta parte que os réus adquiriram a (…) e mulher; que os factos consignados na escritura de justificação não correspondem à verdade, tanto mais que os réus nunca ocuparam à área que consta da escritura de justificação. Finalmente, refere a autora que da ofensa ao direito de compropriedade resultaram danos patrimoniais e não patrimoniais que merecem a tutela do direito, porque a actuação dos réus lhe provocou a angústia, mau estar, nervosismo, insónias e incómodos, requerendo que a título de danos morais sejam os réus condenados a pagarem-lhe o montante de €2.000,00, bem como despesas judiciais e extrajudiciais que não consegue quantificar, mas que liquidará em execução de sentença. Citados, os réus vieram impugnar os factos invocados pela autora, confirmando, todavia, a celebração da escritura de justificação. A autora veio apresentar resposta à contestação referindo que os réus invocam factos que constituem matéria de excepção e requerendo a sua condenação como litigantes de má fé. Foi proferida sentença, na qual, depois de se considerar processualmente inadmissível o articulado resposta apresentado pela autora, com excepção da parte em que é requerida a condenação dos réus como litigantes de má fé, se decidiu: «[…] Nestes termos, face à assinalada existência de contradição do pedido e da causa de pedir também no que toca a este segmento a petição é inepta. Por outro lado, no que toca aos pedidos de indemnização deduzidos, uma vez que os mesmos eram dependência dos pedidos principais supra assinalados, é patente que o respectivo conhecimento fica prejudicado, atenta a ineptidão da p.i. no que toca às pretensões deduzidas pela autora a título principal. Aliás, o mesmo se diga no que diz respeito ao pedido de condenação dos réus como litigantes de má fé. Efectivamente, face à decisão proferida considerando a p.i. inepta, evidente se torna que fica prejudicado o conhecimento do pedido de condenação dos réus como litigantes de má fé, tanto mais que uma eventual má interpretação do que foi alegado pela autora apenas a esta última poderá ser imputada. Decisão: Pelo exposto, de acordo com os preceitos normativos citados, declara-se a nulidade de todo o processado e, em consequência, absolvem-se os réus da instância (cfr. arts. 288º, al. b), 493º, 1 e 2, 494º, al. e)??? e 495º do CPCivil).» 1- O Tribunal “a quo” considerou que a petição inicial é inepta, pelo seguinte: […][1]. 2- Ora, a douta sentença, que absolveu os RR. da instância, salvo o devido respeito, que é muito, deriva fundamentalmente de: - uma contradição insanável na fundamentação da sentença; - de um erro na aplicação do direito e na determinação do direito aplicável; - da nulidade da sentença, por omissão de actos que deviam ter sido praticados e que influíam na decisão da causa, designadamente omissão do convite ao aperfeiçoamento da p.i., que gera nulidade prevista no art. 201º, n.º 1 do CPC, nulidade esta que ora se invoca para os devidos e legais efeitos; - da fundamentação da douta sentença resulta a violação dos princípios jurídicos: Princípio da igualdade das partes; Princípio da adequação formal e Principio da Cooperação, consagrados respectivamente nos art. 3º - A, art. 265º- A e art. 266 todos do CPC; e - da fundamentação da douta sentença resulta a violação dos Princípios constitucionais do direito de defesa e o Princípio da igualdade, consagrados respectivamente nos art. 20º e 13 da Constituição da República Portuguesa, inconstitucionalidade que ora se invoca para os devidos e legais efeitos. 3- O Tribunal “a quo”, optou por proferir SENTENÇA, logo no despacho saneador, julgar a p.i. inepta, declarar a nulidade de todo o processado e, em consequência, absolveu os réus da instância (cfr. arts. 288º, al.b), 493º, 1 e 2, 494, al. e) ??? e 495º do CPCivil), sem ter convidado a A. a suprir as deficiências do pedido e da causa de pedir, ao assim proceder comete a nulidade prevista no art. 201º, n.º 1 do CPC, nulidade esta que se invoca para os devidos e legais efeitos, bem como viola o princípio da adequação formal, consagrado no art. 265º- A do CPC e o Princípio da cooperação consagrado no art. 266º do CPC, violações essas que aqui se invocam para os devidos e legais efeitos e que gera nulidade da sentença. 4- O tribunal “a quo”entendeu que a A. deduziu o seu pedido de “modo deficiente e obscuro”in página 8, in fine da douta sentença, e por esse facto julgou a p.i. inepta, declarando a nulidade de todo o processo e, em consequência absolveu os réus da instância, sem ter convidado a A. a suprir essas deficiências e imprecisões. Ao assim proceder o tribunal “a quo” cometeu a nulidade prevista no art. 201º, n.º 1 do CPC, nulidade esta que ora se invoca para todos os devidos e legais efeitos. Neste sentido vai a jurisprudência, a saber: AC. RP de 06/05/2010- processo n.º 81/07.6TBARC.P1 – 3ª secção, in www.trp.pt/jurisprudência/cível; Acs. Da RP de 16.06.98, 03.05.01 e 24.05.01, da RC de 19.05.05 e RL de 06.11.03 todos em www.dgsi.pt; Acs do STJ de 16.12.58 e de 10.04.86, BMJ 82º - 406 e 356º- 285, respectivamente. 5- Assistiria razão, ao meritíssimo juiz que proferiu a douta sentença, se efectivamente não existisse pedido, ou não existisse causa de pedir, mas no caso ora sub Júdice e como bem resulta da sentença, acima transcrita nos números 1 e 2 que aqui se reproduz nessa parte para os devidos e legais efeitos, que o pedido da A. é “deficiente e obscuro” existe pedido e existe causa de pedir, logo o Tribunal “a quo” não podia julgar a p.i. inepta, sem primeiro ter convidado a A. a suprir as deficiências e as obscuridades. 6- O que não veio a acontecer, razão pela qual se vem sindicar a decisão pela qual a acção foi julgada totalmente improcedente, tendo o Tribunal “a quo” declarado a nulidade de todo o processado, absolvendo os réus da instância. 7- Ora, salvo o devido respeito, não andou bem o Tribunal “a quo”, na medida em que devia ter convidado a A. a suprir as deficiências e obscuridades do pedido e da causa de pedir, em vez de ter julgado a p.i. inepta, declarando a nulidade de todo o processado e consequentemente absolvido os RR. da instância, razão pela qual deverá o Tribunal “ad quem”, proferir um acórdão que anule a decisão ora sindicada, por ter cometido a nulidade prevista no art. 201º, n.º 1 do CPC e simultaneamente ordene o convite ao aperfeiçoamento da p.i., pela A. afim de suprir as deficiências do pedido e da causa de pedir. 8- Por outro lado no caso ora sub Júdice existe uma contradição insanável na fundamentação da sentença, contradição esta que ora se invoca para os devidos e legais efeitos, na medida em que o Tribunal “a quo ”considerou na douta sentença e passa-se a citar: “Ora, os réus, na contestação, muito provavelmente atento o modo deficiente e obscuro como a autora deduziu o seu pedido, não cumpriram o ónus de alegar factos conducentes à aquisição por usucapião, pelo que também nunca lograriam fazer prova daquilo que consta da escritura de justificação.” 9- Todavia, e salvo o devido respeito que é muito, a meritíssima juiz de direito percebeu bem a acção – impugnação de uma escritura de justificação. Assim, se o Tribunal “ a quo ” percebeu a causa de pedir e o pedido, isto é percebeu o âmbito da acção, não pode dizer que os RR. “muito provavelmente” não perceberam e por isso é que “não cumpriram o ónus de alegar factos conducentes à aquisição por usucapião, pelo que nunca lograriam fazer prova daquilo que consta da escritura de justificação. Assim, face ao supra exposto, dúvidas na restam de que efectivamente existe na fundamentação da sentença, ora sub Júdice , uma contradição insanável, contradição esta que ora se invoca para os devidos e legais efeitos. 10- Pois, os RR. na contestação têm de deduzir toda a sua defesa e em momento algum eles (RR.) alegam que a p.i. é inepta, por ser ininteligível, obscura, deficiente, que os impeça de compreender o alcance e âmbito da acção - Princípio da preclusão das partes, que tem acolhimento no art. 489º, n.º 1 do CPC. 11- Pelo contrário, resulta dos autos elementos, documentos elaborados pelos RR. e juntos com a p.i. pela A., que não foram impugnados pelos RR, que nos levam a concluir sem qualquer dúvida que os RR. compreenderam a p.i. e interpretaram convenientemente a p.i., e só não invocaram factos de onde resulte que são donos do artigo rústico 12.302 e que o adquiriram por usucapião, porque efectivamente como resulta dos documentos juntos com a p.i., designadamente escritura de compra e venda de uma quarta parte a (…) e mulher do artigo matricial X... e do registo na Conservatória do registo Predial de ..., desta mesma aquisição, Cfr. Doc. 1, 2, 3, da p.i., cujo conteúdo aqui se reproduz para os devidos e legais efeitos, documentos estes, que não foram impugnados pelos RR. e que se devem considerar como assentes, o prédio que compraram a (…) foi ¼ do Art. X..., pelo que têm titulo aquisitivo . compra e venda e não o adquiriram pela usucapião. 12- Relativamente ao extracto da escritura de Justificação, é um documento da sua autoria, pelo que não podiam ignorar, por ser um facto de conhecimento pessoal. Assim, os RR, e salvo o devido respeito, não alegaram ou invocaram a sua qualidade de donos exclusivos do prédio em causa, nem alegaram os factos conducentes à aquisição por usucapião do art. 12.302, porque estavam vedados por lei, porque era um facto do seu conhecimento pessoal e que não podiam ignorar - Art. 490, n.º 3 do CPC e conforme resulta dos Doc 1, 2, 3, conjugado com o doc. 5 e 6, 7, todos junto com a p.i e da certidão emitida pela Câmara Municipal de ... do processo de obras n.º 144/2006, junta aos autos em 28 de Agosto de 2010, documentos estes que aqui se reproduzem para os devidos e legais efeitos, e que não foram impugnados pelos RR. pelo que os factos constantes neste documentos devem se considerar por assentes, só assim se fará a costumada justiça. 13- Assim, resulta de forma inequívoca que os RR. interpretaram convenientemente a p.i., e por essa razão não invocaram a ineptidão da mesma. 14- Assim, face ao supra exposto, o tribunal “a quo” não podia ter aplicado o art. 193, n.º 1 e 2 do CPC, e julgando a p.i. inepta, declarando a nulidade de todo o processo e consequentemente ter absolvido os RR. da instância, antes pelo contrário devia ter aplicado o art. 193, nº 3 do CPC, na medida em que os RR. interpretaram convenientemente a p.i. e só não alegaram os factos que lhe competiam, por estarem impedidos por força da lei e dos princípios da boa Fé consagrados e aplicáveis no nosso sistema jurídico português. 15- Assim, e porque os RR. não cumpriram o ónus de alegarem factos constitutivos do direito de propriedade do prédio objecto da escritura de justificação e bem como não alegaram circunstâncias de facto que determinassem o inicio da posse e que caracterizassem a posse geradora da usucapião do prédio objecto da escritura de usucapião – art. 12.302, que nos presentes autos se impugna, de acordo com a regras do ónus da prova e repartição desse mesmo ónus da prova, devem ser os RR. condenados […][2]. 16- O sentido em que o Tribunal “a quo” interpretou o silêncio do RR. é ilegal e inconstitucional, pois tal entendimento não tem acolhimento no nosso ordenamento jurídico, ao assim proceder o tribunal “a quo ”violou as disposições legais relativas á repartição do ónus da prova – Art. 343, 344 do Código civil, bem como viola o princípio constitucional da igualdade e da defesa, consagrados respectivamente no art. 13 e 20 da Constituição da república Portuguesa, inconstitucionalidade essa que ora se invoca para os devidos e legais efeitos. 17- No âmbito dos presentes autos, acresce ainda dizer o seguinte: Assim percebe-se e colhe-se da sentença: “Ora, é certo que se o fim visado pela autora com a presente acção fosse a impugnação da escritura de justificação – caso em que estaríamos perante uma acção de simples apreciação negativa – bastar-lhe-ia alegar que os réus não eram donos do dito prédio e que o não haviam adquirido por usucapião”. Não houvesse impedimento e naturalmente a autora o teria feito nesse molde e, porque não podia socorrer-se deste procedimento usual, alegou que o prédio com o registo matricial N.º Z..., que sustenta o processo da usucapião, não existe fisicamente. Também alegou que os réus eram donos, por escritura da compra/venda e registo matricial, do art. X..., e que o levantamento topográfico junto com o processo administrativo de obtenção do prédio omisso m.º 12.302 coincide com a ¼ que os RR. têm no art. X..., Há excepção da área. Pelo que não adquiriram o prédio (espaço físico) por usucapião. 18- A sentença é sustentada pelo preceituado no n.º 116º do C R Predial, conjugado com o disposto no n.º 1 e 2 do art. 89 do C Notariado que, se bem se entende, permite ao “adquirente que não disponha de documento para prova do seu direito…”, obtê-lo. Ora, a autora alegou que os réus eram e são detentores de documento para prova do seu direito, (escritura de compra/venda e registo predial) DOc. 1, 2 e 3 juntos com a p.i. e cujo conteúdo aqui se reproduz para os devidos e legais efeitos. Assim, a entender-se como se entende, o preceituado no art. 116.º do CR Predial e o estabelecido no n.º 1 e n.º 2 do art. 89º do C. Notariado, não devem operar em prejuízo da autora e, salvo melhor opinião, aos réus não assistia o direito de deles fazer uso, ou seja: o tribunal não teve em consideração que os réus fizeram uso ilegal da excepção (usucapião) para modificar unilateralmente a situação jurídica do prédio de que são comproprietários. Ou seja, os RR. indevidamente utilizaram a escritura de usucapião, quando deviam ter feito uso da Acção especial de divisão de coisa comum prevista no artigo 1052 do CPC. […] 19- A douta sentença explana, ainda o seguinte: “Assim, o facto comprovado pelo registo da escritura de justificação é impugnável, nos termos gerais do artigo 8.º, n.º 1, do Código do Registo Predial, pelo que deve ser pedido o cancelamento do registo com a impugnação do facto justificado”. Naturalmente que a autora o teria feito nos moldes descritos mas os réus não chegaram a fazer o registo, resultando um facto não comprovado pelo registo da escritura de justificação que impossibilita a autora de pedir o cancelamento desse com a impugnação do facto justificado. A autora requereu a impugnação das declarações constantes da escritura de justificação, pela via da afirmação e também requereu que não seja passada certidão da escritura de justificação, não podia pedir o cancelamento do registo, porque esse não se mostra efectuado pelos RR. 20- “Ora, os réus, na contestação, muito provavelmente atento o modo deficiente e obscuro como a autora deduziu o seu pedido, não cumpriram o ónus de alegar factos conducentes à aquisição por usucapião…” a) Os réus são parte interessada conhecedora factual da situação real e pretendem ter a posse plena do seu prédio, ou seja, os réus, na qualidade de comproprietários, sabiam que não tinham a posse plena, porque há mais de 20 anos eram detentores, não só da escritura de compra/venda a AM... de ¼ do prédio com o registo matricial n.º X..., mas também do respectivo registo na conservatória respectiva. Também sabiam que o levantamento topográfico apresentado na escritura de justificação era parte desse prédio n.º X... e tem área, que pretendem fazer sua, superior à correspondente à fracção de ¼ do art. X..., que adquiriram por escritura pública a (…) e mulher (…). Igualmente sabiam que, fisicamente, não existe o terreno do prédio com o registo matricial com o n.º Z..., que sustenta a escritura da usucapião que está na origem dos presentes autos. Pela escritura de justificação, mais de ¼ do prédio com o registo matricial n.º X... perde-se a seu favor (deles réus) e ainda continuam donos de ¼ da área sobrante desse prédio n.º X.... É pois natural que se remetessem ao silêncio, tanto mais que sabiam que as alegações poderiam ser usadas contra si, noutro processo. Abuso de confiança. b)- O incumprimento do ónus de alegar factos conducentes à aquisição por usucapião não pode ser justificado com meros pressupostos e a decisão de atendê-lo carece de suporte de facto e de direito, tanto mais que os réus não justificaram o seu silêncio e deviam tê-lo feito, pois na contestação os RR. têm de invocar toda a defesa. Art. 489 do CPC. 21- Por outro lado, sempre se dirá que a douta sentença consignou na sua fundamentação o seguinte “Assim, não pode deixar de se concluir que considerando esta acção como de impugnação da escritura de justificação a autora omitiu o pedido adequado a fazer valer tal pretensão”. Contudo a autora estava impedida de fazer o pedido nos moldes da fórmula padrão, pelo que o formulou da maneira possível e que reproduzisse a realidade fáctica. 22- “Por outro lado, tal nulidade não pode ser considerada sanada, na medida em que da contestação apresentada se conclui que os réus não interpretaram convenientemente a petição inicial,…”. Assim, conclui-se que os réus não interpretaram convenientemente a petição inicial e mais uma vez se decide, da mesma forma, que não é responsabilidade sua (deles réus) mas sim da autora, que poderia ter sido convidada a clarificar eventuais dúvidas ou formular pedido de modo menos “deficiente e obscuro”. No entanto, é necessário perceber a petição inicial para perceber que os réus não a perceberam. 23- O Tribunal “a quo ” considerou que “face à decisão proferida considerando a p.i. inepta, evidente se torna que fica prejudicado o conhecimento do pedido de condenação dos réus como litigantes de má fé, tanto mais que uma eventual má interpretação do que foi alegado pela autora apenas a esta última poderá ser imputada.” 24- A douta decisão do Tribunal “a quo”, andou mal quando considera que não pode pronunciar-se sobre o pedido de condenação como litigante de má fé, pois resulta dos autos prova documental […] Nestes termos e nos melhores de Direito e Doutamente supridos, deverá o presente recurso merecer provimento, conforme conclusões supra e a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que: a) Anule a decisão recorrida por ter cometido a nulidade prevista no art. 201º, n.º 1 do CPC e simultaneamente ordene ao tribunal recorrido o convite ao aperfeiçoamento da p.i., pela A. afim de suprir as deficiências do pedido e da causa de pedir. Ou b) Anule a decisão recorrida por violação das regras de repartição do ónus da prova – art. 343 e 344 do Código civil, e por aplicação do art. 193, n.º 3 do CPC e em consequência serem os RR. condenados […][3] c) condenar-se o RR. como litigantes de má fé […] 1. Se, porém, a lei ou o negócio exigir a intervenção dos vários interessados na relação controvertida, a falta de qualquer deles é motivo de ilegitimidade. 2. É igualmente necessária a intervenção de todos os interessados quando, pela própria natureza da relação jurídica, ela seja necessária para que a decisão a obter produza o seu efeito útil normal. A decisão produz o seu efeito útil normal sempre que, não vinculando embora os restantes interessados, possa regular definitivamente a situação concreta das partes relativamente ao pedido formulado. «3.º Uma quarta parte indivisa do prédio identificado no artigo 1 da p.i. é propriedade de M (…), e consequentemente, de G (…), com quem se encontrava casado sob o regime da Comunhão Geral de Bens. 4.º Uma quarta parte do prédio identificado no artigo 1 da p.i. veio à posse, de M (…) e mulher G (…) em 10/01/1979, por compra à irmã da ora A(…) – (…), 5.º M (…) e mulher G (…), por si durante mais de 20, 30 anos estão na posse do prédio mencionado no art. 1 desta p.i., defendendo e conservando a propriedade, semeando-os, cultivando-os, plantando e conservando a vinha, colhendo as uvas, vindimando, plantando e cortando os pinheiros, extraindo resina, roçando mato, retirando todos os rendimentos inerentes à sua natureza, pagaram contribuições e impostos e avivaram estremas. 6.º E tudo ocorreu à vista de todos, dia a dia e ano a ano sempre sem intervalo algum e repetidamente, sem oposição fosse de quem fosse, sem violência desde o inicio e sempre depois, convictos de que com tais actos não lesavam direitos ou interesses de outrem e agindo como se proprietários fossem, ou seja convictos de que exerciam um direito de propriedade pleno e exclusivo sobre o prédio.» Na verdade, a autora alega factos – se bem que de forma insuficiente, na medida em que nada alega de onde resulte a aquisição por usucapião da compropriedade do citado prédio em relação aos restantes comproprietários, incluindo os réus – tendentes a demonstrar a aquisição por usucapião e depois termina requerendo que se declare que a herança, que diz representar, é proprietária de uma quarta parte do prédio descrito no art. 1º da p.i. e devendo os réus ser condenados a restituírem à herança o dito prédio. «Na hipótese dos autos os réus, através da realização de escritura de justificação, invocaram a sua qualidade de donos exclusivos do prédio em causa, justificando essa aquisição por usucapião e expondo os factos que a ela teriam levado. Contudo, a autora, apesar da alegação dos factos constantes da p.i. parecer que pretendia impugnar as declarações constantes de tal escritura – se bem que o faz pela via da afirmação que tal prédio lhe pertence a ela e a outros, incluindo os réus, em compropriedade, e referindo que, por isso, não pode pertencer uma determinada parte aos réus como decorreria do teor do escritura de justificação – visando que a mesma fique sem qualquer efeito, ou seja, que pretendia atingir o direito invocado na escritura de justificação notarial, não chega a efectuar tal pedido limitando-se a requerer, no que toca a tal questão, que não seja passada certidão da escritura de justificação. […] Isto é, na hipótese dos autos, se fosse esse, a final, o pedido deduzido pela autora depois de impugnar o conteúdo da escritura de justificação impenderia sobre os réus o ónus da prova dos factos constitutivos do seu direito de propriedade, sob pena de a acção proceder. Ora, os réus, na contestação, muito provavelmente atento o modo deficiente e obscuro como a autora deduziu o seu pedido, não cumpriram o ónus de alegar factos conducentes à aquisição por usucapião, pelo que também nunca lograriam fazer prova daquilo que consta da escritura de justificação. Assim, não pode deixar de se concluir que considerando esta acção como de impugnação da escritura de justificação a autora omitiu o pedido adequado a fazer valer tal pretensão. Por outro lado, tal nulidade não pode ser considerada sanada, na medida em que da contestação apresentada se conclui que os réus não interpretaram convenientemente a petição inicial, designadamente no que toca a uma eventual declaração de ineficácia da escritura de justificação notarial realizada. […]» «[…] O poder que é atribuído ao juiz pelo disposto no art. 508.º, n.º 3, do CPC, ao contrário do atribuído pelo n.º 2 do mesmo artigo, não constitui um poder vinculado, mas simples faculdade, não se encontrando por isso o juiz obrigado a determinar se proceda ao convite referido nesse dispositivo. […] Logo, o juiz não tinha que convidar os réus a indicar outros factos em complemento dos indicados na contestação para suprir a insuficiente alegação fáctica relativa à aquisição, por via de usucapião, do direito de propriedade sobre o prédio em causa. […]»
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