Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
52/21.0GBGVA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: LUÍS TEIXEIRA
Descritores: LICENÇA DE CONDUÇÃO DE VELOCÍPEDE COM MOTOR
TROCA POR CARTA DE CONDUÇÃO DE CICLOMOTOR
Data do Acordão: 01/26/2022
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DA GUARDA - JUÍZO DE COMPETÊNCIA GENÉRICA DE GOUVEIA
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ART.º 47.º DO REGULAMENTO DA HABILITAÇÃO LEGAL PARA CONDUZIR, APROVADO PELO DECRETO-LEI N.º 209/98, DE 15 DE JULHO, PRORROGADO PELO ARTIGO 4.º DO DECRETO-LEI N.º 315/99 DE 11 DE AGOSTO, ATÉ AO DIA 30 DE JUNHO DE 2000; ART.º 3º, N.ºS 1 E 2, DO DL N.º 2/98, E ATUAL ART.º 123º, Nº 3, ALÍNEA B), DO CÓDIGO DA ESTRADA
Sumário: I – O titular de licença de condução de velocípedes com motor emitida pela Câmara Municipal podia proceder à sua troca por carta de condução de ciclomotores no prazo previsto pelo artigo 47.º do Regulamento da Habilitação Legal para Conduzir, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 209/98, de 15 de Julho, prorrogado pelo artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 315/99 de 11 de Agosto, até ao dia 30 de Junho de 2000.

II – A não troca da licença de velocípede com motor pela carta de condução de ciclomotor - categoria de veículo designada de AM - no prazo legalmente fixado, não atribui àquela licença de velocípede com motor a natureza de título de condução caducado designadamente por falta de revalidação, mas sim de inexistência de título para conduzir tal categoria de veículo.

III – Pelo que a condução por um agente, de um veículo ligeiro de passageiros ou misto para a qual é exigível carta de condução da categoria B, é punida como crime de condução sem habilitação legal, previsto pelo art. 3º, n.ºs 1 e 2, do DL n.º 2/98, e não como contraordenação prevista no atual artigo 123º, nº 3, alínea b), do Código da Estrada.

Decisão Texto Integral:




I

1. Nos autos de processo sumário supra identificados, foi o arguido PM, …condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punido pelo artigo 3.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 02/98, de 03 de Janeiro, na pena 8 (oito) meses de prisão efetiva, pena a que foi descontado um dia no seu cumprimento.

2. Desta sentença recorre o arguido alegando essencialmente e em síntese, o seguinte: (…).


III

1. Na sentença recorrida dão-se como provados os seguintes factos:

Factos Provados

Com relevo para a decisão a proferir resultam provados os seguintes factos:

1. No dia 6 de Maio de 2021, pelas 11h10, o arguido conduziu o veículo ligeiro de mercadorias com matrícula …, na Avenida …, sem para tal estar legalmente habilitado.

2. A Avenida …, era e é uma via pública aberta ao trânsito, o que o arguido bem sabia.

3. Bem sabia o arguido que a condução do referido veículo, sem ser titular de carta de condução ou de qualquer outro documento que o habilitasse à condução desse tipo de veículos, lhe estava vedada por lei e, apesar disso, quis conduzi-lo.

4. O arguido agiu de forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida criminalmente.

Mais se provou que:

(…)

           


IV

Cumpre decidir:

1ª Questão: a carta de condução de ciclomotor de que o arguido é atualmente portador e seus efeitos jurídicos sobre a decisão de condenação.

1. Na conclusão nº 16 vem o arguido dizer:

“Mal, ou bem, por erro ou não (do que o aqui recorrente discorda), o que é certo, é que à data, formalmente, o aqui recorrente é para todos os efeitos portador de uma carta de condução de ciclomotor e, existindo futuramente toda e/ou qualquer proposta de revogação de tal acto administrativo, de tal por certo nas instâncias próprias tal merecerá o seu contraditório/oposição”.

2. Tendo por base a matéria provada nos factos 9 a 13, supra reproduzidos, o tribunal recorrido apreciou esta questão, nos seguintes termos:

“O arguido encontrava-se acusado da prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punido pelo artigo 3.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 02/98, de 03 de Janeiro, ambos do Código Penal.

Dispõe o citado artigo 3.º, n.º 2, que, quem conduzir motociclo ou automóvel na via pública ou equiparada sem para tal estar habilitado nos termos do Código da Estrada é punido com prisão até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias.

Mais resulta do disposto no artigo 121.º, n.º 1 do Código da Estrada que só pode conduzir um veículo a motor na via pública quem estiver legalmente habilitado para o efeito, sendo que o título que legalmente habilita a conduzir automóveis ligeiros é a carta de condução (cfr. n.º 4 do artigo 121.º e artigo 123.º, ambos do Código da Estrada).

Neste tipo legal de crime o bem jurídico tutelado é a segurança rodoviária que, atendendo à experiência comum e à razão de ser das coisas, se presume comprometida quando não estão reunidas as condições indispensáveis para o exercício da condução, como sejam a certificação das aptidões para a condução, atestadas por uma entidade independente, cuja não verificação cria um perigo abstracto para um número indeterminado de bens jurídicos como a vida, integridade física ou o património.

São elementos objectivos do referido preceito legal a condução de veículo com motor; que essa condução ocorra em via pública ou equiparada (legalmente previstas no artigo 1.º do Código da Estrada) e que o condutor não esteja habilitado com documento válido para conduzir tal veículo.

Como elemento subjectivo exige-se o dolo do agente, enquanto conhecimento que este tem que não é titular de um documento válido e legalmente exigido para a condução de um automóvel ligeiro e que conduzindo incorre em responsabilidade criminal.

Aqui chegados, vejamos, com particular atenção, a questão de o arguido ser portador de licença para condução de velocípedes e se tal circunstância lhe possibilita a condução de veículos a motor, sem que a sua conduta seja criminalmente punida, conforme propugnado pelo mesmo.

Ou seja, importa indagar se a licença de condução de velocípedes com motor emitida pela Câmara Municipal de ... constitui título bastante para permitir a condução de um veículo automóvel e, no caso de resposta negativa, se quem conduz um veículo automóvel nessas circunstâncias pode cometer um crime de condução sem habilitação legal ou, antes, uma contra-ordenação.

Na redacção vigente em 30 de Abril de 1986, ou seja, na data em que o arguido obteve a licença de condução de velocípedes (com motor), o artigo 38.º do Código da Estrada definia velocípedes como sendo “os veículos de duas ou mais rodas accionadas pelo esforço do próprio condutor por meio de pedais ou dispositivos análogos”, e velocípedes com motor, como os veículos com pedais ou dispositivos análogos que permitam ao condutor accionar o veículo a uma velocidade razoável, suficiente para o seu emprego normal, sem o recurso ao motor, cuja cilindrada não exceda 50 cm3, com velocidade máxima limitada a 50 km/h. Por sua vez os ciclomotores eram definidos por exclusão, como os veículos de duas ou mais rodas com motor de cilindrada não superior a 50 cm3 que não fossem de considerados como velocípedes.

Na redacção posterior do Decreto-Lei n.º 114/94, de 3 de Maio, o Código da Estrada abandonou a designação de velocípede com motor como categoria autónoma de veículo, mantendo, contudo, a categoria de ciclomotor, definido no artigo 115.º como o veículo de duas rodas dotado de motor com cilindrada não superior a 50 cm3, cuja velocidade não exceda em patamar e por construção, 45 km por hora. Para a designação de velocípede, o Código reservou apenas a previsão do veículo com duas ou mais rodas em linha accionado pelo esforço do próprio condutor por meio de pedais ou dispositivos análogos. O Código da Estrada previa a existência de uma licença de condução de ciclomotores e motociclos de cilindrada não superior a 50 cm3, reservando diploma próprio, a definição das provas a que devam ser submetidos os candidatos a titulares de licença de condução ou à sua revalidação, bem como o conteúdo, as características e o prazo de validade desses títulos (artigo 132.º).

Nos termos do artigo 47.º do Regulamento da Habilitação Legal para Conduzir, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 209/98, de 15 de Julho, durante o prazo de um ano, a contar da entrada em vigor do diploma, os titulares de licença de condução de velocípedes com motor estavam habilitados a conduzir ciclomotores e podiam requerer a troca da licença de velocípedes com motor por licença de condução de ciclomotor, na Câmara Municipal da sua área de residência.

Dispunha, então, o artigo 47.º (Troca de licença de velocípede com motor) que:

“1 - Durante o prazo de um ano a contar da entrada em vigor do presente diploma, os titulares de licença de condução de velocípedes com motor estão habilitados a conduzir ciclomotores.

2 - Durante o prazo referido no número anterior, podem os titulares de licença de condução de velocípedes com motor requerer, na câmara municipal da área da sua residência, a troca daquele título por licença de condução de ciclomotor.

3 - O requerimento a que se refere o número anterior deve ser instruído com fotocópia do bilhete de identidade do requerente e o correspondente atestado médico.

4 - Os serviços competentes das câmaras municipais que procedam à troca de títulos a que se refere o n.º 2 devem ficar com a licença de condução de velocípede com motor de que o requerente era titular e arquivá-la no respectivo processo.”.

Por força do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 315/99, de 11 de Agosto, esse prazo foi ainda prorrogado até ao dia 30 de Junho de 2000.

Cumpre, assim, salientar que o arguido foi titular de uma licença de condução e esteve habilitado a conduzir o referido veículo entre 30 de Abril de 1986 e 30 de Junho de 2000.

Pelo que, nesta última data, porque, entretanto, nunca procedeu à devida “troca” nos serviços competentes da Câmara Municipal, nem efectuou as provas necessárias de habilitação de acordo com o novo regime, o arguido ficou sem licença para conduzir os veículos motorizados designados como ciclomotores.

A situação em apreço, não apresenta qualquer similitude com as hipóteses de “caducidade” de títulos de conduzir, designadamente por falta de revalidação, nem se vislumbra previsão de contra-ordenação rodoviária, nomeadamente nas disposições dos artigos 121.º, 124.º e 130.º do (actual) Código da Estrada.

Como se escreveu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23-10-2008 para uma situação idêntica, o arguido deixou de ter título que lhe permitisse conduzir ciclomotores a partir de 30 de Junho de 2000, não porque o título tivesse caducado, mas porque deixou de vigorar o preceito que permitia a condução de um ciclomotor pelo titular de licença de condução de velocípede com motor, ou seja, que habilitava o titular desta licença a conduzir um ciclomotor. E, por isso, praticou actos integradores do crime do art. 3º nº 1 do Decreto-Lei n.º 2/98, por que veio a ser condenado” (proc. n.º 08P2821Rel. Cons. Arménio Sottomayor, in www.dgsi.pt).

Assim, e conforme impressivamente sintetiza o Acórdão da Relação de Guimarães de 25 de Maio de 2015 (disponível em www.dgsi.pt): “Comete o crime de condução sem habilitação legal do artº 3º nº1, do D.L .nº 2/98, de 3 de Janeiro, o arguido detentor da antiga licença de condução de velocípede com motor emitida pela Câmara Municipal, não por caducidade desse título, mas porque deixou de estar em vigor o preceito que o habilitava a conduzir um ciclomotor” – no mesmo sentido, vide, ainda, o Acórdão da Relação de Guimarães de 17 de Dezembro de 2018, o Acórdão da Relação do Porto de 8 de Novembro de 2006 e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23 de Outubro de 2008, todos disponíveis em www.dgsi.pt.

3. Segundo o factualismo dado por provado e conforme análise da questão pela decisão recorrida, o arguido esteve efetivamente habilitado a conduzir ciclomotores entre 30 de Abril de 1986 e 30 de Junho de 2000, de acordo com a definição desta categoria de veículo na  redacção do Decreto-Lei n.º 114/94, de 3 de Maio (Código da Estrada), que  abandonou a designação de velocípede com motor como categoria autónoma de veículo, mantendo contudo a categoria de ciclomotor, definido no artigo 115.º como o veículo de duas rodas dotado de motor com cilindrada não superior a 50 cm3, cuja velocidade não exceda em patamar e por construção, 45 km por hora.

Todavia, a partir desta data de 30 de Junho de 2000, o arguido ficou sem habilitação legal para conduzir ciclomotores uma vez que não procedeu à troca da licença de velocípede com motor emitida pela Câmara Municipal de ... (v. facto provado nº 10, segundo o qual, Em 30 de Abril de 1986 foi, pela Câmara Municipal de ..., emitida a licença de condução de velocípedes ao arguido), ao abrigo do artigo 47.º do Regulamento da Habilitação Legal para Conduzir, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 209/98, de 15 de Julho e prorrogação do prazo pelo artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 315/99, de 11 de Agosto, até ao dia 30 de Junho de 2000.

            Tendo os factos destes autos ocorrido dia 6 de Maio de 2021, significa que, nesta concreta data, o arguido não era titular nem de licença para conduzir velocípedes com motor (designação legal que simplesmente já não existe), nem de carta de ciclomotores.

            Como decorre dos factos provados (v. factos nºs 9 a 13), o processo encetado pelo arguido para obtenção junto do IMT a carta de condução de ciclomotor, iniciou-se em 11 de Maio de 2021, com a emissão da certidão pela Secretaria da Câmara Municipal de ... – v. facto provado nº 9 – tendo em 14 de Maio de 2021, requerido junto do IMT – Delegação Distrital de Viseu -, a troca de licença de condução por carta de condução - v. facto provado nº 11.

            Sem prejuízo de o IMT ter emitido formalmente a referida carta de ciclomotor ao arguido, conforme resulta dos factos provados nºs 12 a 13, esta emissão está substancialmente viciada, de onde resulta que o arguido PM, não possui habilitação para a condução de ciclomotores.

            A pretensão do arguido é no sentido de que, enquanto este ato administrativo do IMT não for revogado, como é intenção do IMT – v. facto provado nº 13, parte final PM, não possui habilitação para a condução de ciclomotores, pelo que será proposta a revogação do acto administrativo, que com base em erro, emitiu o título em cima referenciado – formalmente é titular de carta de condução de ciclomotor, do qual devem ser retiradas consequências no sentido de não ser punido criminalmente nos termos em que o foi. Nomeadamente, aplicar-lhe o regime legal de condução com um título (carta) caducado.

            Sobre estes dois aspetos, entende-se dizer o seguinte:

            - Não tendo o arguido procedido à troca da licença de velocípede com motor pela carta de condução de ciclomotor no prazo legal em que podia e deveria tê-lo feito, não se está perante um título de condução caducado mas sim pela inexistência de título ou carta de condução para conduzir ciclomotores, pois que, por um lado, a licença de condução de velocípedes simplesmente deixou de existir legalmente e, por outro, não se pode falar, à data dos factos, em 6 de maio de 2021, de caducidade da carta de condução de ciclomotores do arguido porque este, naquele exato momento não era titular, como nunca foi (até aquele momento), titular dessa carta.

            Como resulta do factualismo provado, “Por email datado de 02.07.2021, o IMT informou que “pelo menos entre 13.01.2020 e 14.05.2021 o condutor não era titular de licença de condução válida ou guia de substituição de carta de condução”.

            Pelo que, se acompanha sobre a questão, a jurisprudência referenciada na decisão recorrida, a saber:

            - Ac. do STJ de 23.10.2008, proc. nº 08P2821:

            “VI - O recorrente, como titular da licença de condução de veículo com motor emitida pela Câmara Municipal de P…, foi detentor de título que lhe permitiu conduzir ciclomotores até 30-06-2000, data a partir da qual deixou de vigorar o preceito que permitia a condução de um ciclomotor pelo titular de licença de condução de velocípede com motor”.

            - Ac. TRG de 25.5.2015, proc. nº 542/12.5GEGMR.G1:

            “Impõe-se por isso notar que o arguido foi titular de uma licença de condução e esteve habilitado a conduzir o referido veículo entre 4 de Dezembro de 1986 e 30 de Junho de 2000.  Nesta última data, porque entretanto nunca procedeu à devida “troca” nos serviços competentes da Câmara Municipal, nem efectuou as provas necessárias de habilitação de acordo com o novo regime, o arguido ficou sem licença para conduzir os veículos motorizados designados como ciclomotores.

            Esta situação não apresenta qualquer similitude com as hipóteses de “caducidade” de títulos de conduzir, designadamente por falta de revalidação, nem se vislumbra previsão de contra-ordenação rodoviária, nomeadamente nas disposições dos artigos 121.º, 124.º e 130.º do (actual) Código da Estrada”.

            - Ac. TRG de 17.12.2018, proc. nº 158/18.2GACBT.G1

            “I) As antigas licenças de condução de velocípedes com motor emitidas pelas Câmaras Municipais que não tenham sido trocadas por licença de condução de ciclomotor até 30-06-2000 junto dos serviços competentes da Câmara Municipal, deixaram de constituir título bastante para habilitar à condução de ciclomotores.

            II) Assim, a conduta de quem conduz um ciclomotor nessas circunstâncias integra o crime de condução sem habilitação legal, previsto pelo art. 3º, n.º 1, do DL n.º 2/98, e não a contraordenação prevista no art. 130º, n.ºs 1, al. a), e 7, do Código da Estrada”.

            Quanto à titularidade pelo arguido da atual carta de condução de ciclomotores:

             Sem prejuízo de o arguido ter adquirido um título formal de carta de condução de ciclomotores após a data dos factos e resultar dos autos a sua não validade substancial, a verdade é que o ato administrativo e, por inerência ou consequência, a emissão desse título, ainda não foi revogado.

            Todavia, tal facto de não revogação desse ato pela entidade competente (IMT), não é impeditiva deste tribunal apreciar a “validade substantiva” desse título, com vista à qualificação jurídica do ato praticado pelo arguido e respetiva punição ou sanção, uma vez que os factos provados sobre a matéria o permitem, não tendo tais factos dados como provados sido impugnados pelo recorrente arguido.

            E do factualismo provado resulta inequívoco que a licença de condução de velocípede com motor pelo arguido, foi emitida pela Câmara Municipal de ... com data de 30 de abril de 1986.

            Mais resulta provado que o arguido não procedeu à troca da licença de velocípede com motor emitida pela Câmara Municipal de ... até ao dia 30 de Junho de 2000 conforme o deveria ter feito ao abrigo do artigo 47.º do Regulamento da Habilitação Legal para Conduzir, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 209/98, de 15 de Julho e respetiva prorrogação do prazo pelo artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 315/99, de 11 de Agosto.

            Motivo por que, a partir desta data de 30 de Junho de 2000, o arguido ficou sem habilitação legal para conduzir ciclomotores.

            A data da emissão da licença de velocípede com motor e a data até à qual poderia/deveria ser trocada por carta de condução de ciclomotores são incontroversas e incontornáveis.

            Mais se sabe, que a emissão a favor do arguido da atual carta de condução de ciclomotor n.º VS-261183, de 15.05.2021, com data de habilitação para a categoria AM a 30.04.1986, tem subjacente pressupostos viciados e errados, expressos não sé e já pelo IMT como afere este Tribunal dos elementos juntos aos autos.

            Atribuir qualquer validade substantiva a esta carta de condução para, por esta via, afastar a prática do crime pelo arguido, seria reconhecer validade a um título cujos factos provados e respetiva aplicação da legislação legal impõem e exigem uma decisão diferente, que é nada mais a de considerar, juridicamente, a não existência de título de condução legal válido, quer para conduzir o veículo que o arguido conduziu quer titular, nessa data, de carta de condução de ciclomotores legalmente válida.

            Pelo que, por todos estes considerandos, entende-se não afastada a prática do crime por que o arguido foi condenado bem como a condenação da sua conduta a título de mera contraordenação, nomeadamente ao abrigo do atual artigo 123º, nº 3, alínea b), do Código da Estrada.

(…).

                       


V

Decisão

Por todo o exposto, decide-se julgar improcedente o recurso do recorrente arguido PM, mantendo-se a decisão recorrida.
Custas a cargo do recorrente com a taxa de Justiça que se fixa em 4 (quatro) UCs.

Coimbra, 26 de Janeiro de 2022

Texto processado em computador e integralmente revisto e assinado eletronicamente pelos signatários

Luís Teixeira (relator)

Vasques Osório (adjunto)