Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
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| Nº Convencional: | JTRC | ||
| Relator: | PAULA MARIA ROBERTO | ||
| Descritores: | SANÇÃO DISCIPLINAR SUSPENSÃO COM PERDA DE RETRIBUIÇÃO IMPUGNAÇÃO JUDICIAL VIOLAÇÃO DO DEVER DE SIGILO BANCÁRIO PROPORCIONALIDADE DA SANÇÃO | ||
| Data do Acordão: | 10/24/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Tribunal Recurso: | JUÍZO DO TRABALHO DE VISEU DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE VISEU | ||
| Texto Integral: | N | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | CONFIRMADA | ||
| Legislação Nacional: | ARTIGOS 128.º, N.ºS 1, AL.ªS A), C) E E), E 2, 328.º, N.º 3, DO CÓDIGO DO TRABALHO E 78.º DO DLEI N.º 298/92, DE 31-12 | ||
| Sumário: | I – O trabalhador que efetua consultas na conta à ordem de um cliente, com base no pedido efetuado por um terceiro não autorizado, questiona um seu colega e, após, transmite àquele terceiro que o pedido de empréstimo do cliente “estava aprovado”, viola o segredo bancário pois a ele estão sujeitas, além do mais, as respetivas operações bancárias, conforme resulta do disposto no n.º 1 do artigo 78.º do DL n.º 298/92, de 31/12 e do n.º 2 do artigo 4.º do Código de Conduta.
II – Conforme vem sendo entendimento jurisprudencial, quando o trabalhador tenha impugnado judicialmente a sanção disciplinar que lhe foi aplicada pelo empregador, ao tribunal compete apenas confirmar ou revogar a sanção, não podendo substituir-se àquele na determinação desta, posto que o exercício do poder disciplinar é uma prerrogativa do empregador. (Sumário elaborado pela Relatora) | ||
| Decisão Texto Integral: | Acordam[1] na Secção Social (6ª Secção) do Tribunal da Relação de Coimbra:
I – Relatório
AA, residente em ..., ...
intentou a presente ação declarativa de processo comum contra
Banco 1..., SA, com sede no ...
alegando, em síntese, que a Ré lhe aplicou uma sanção disciplinar de suspensão do trabalho com perda de retribuição pelo período de 5 dias, por alegada violação do segredo profissional e da proteção de dados, no entanto, o Autor não prestou qualquer informação relativa a qualquer dado do processo, limitou-se a dizer que o empréstimo “estava aprovado”; não praticou uma infração disciplinar e não violou nenhum dever, impondo-se a anulação ou revogação da decisão disciplinar. Termina, pedindo que: “Nestes termos e nos melhores de Direito e sempre com o mui douto suprimento de V.ª Ex.ª, deverá ser julgada procedente a presente acção, por provada e, consequentemente, anulada ou revogada a sanção disciplinar de suspensão de trabalho por cinco (5) dias com perda de retribuição aplicada ao Autor e ser o Réu condenado a: - Restituir ao Autor o respectivo montante indevidamente descontado a título de sanção disciplinar, acrescido dos juros legais desde a data da indevida retenção da retribuição e até integral pagamento; - Pagar ao Autor a quantia de € 5.001,00, a título de indemnização, acrescida de juros legais desde a citação até integral pagamento. Para tanto, deve a Ré ser citada para fazer juntar o processo disciplinar e responder, querendo, no prazo e sob cominações legais, seguindo-se os ulteriores termos até final.” * A Ré veio contestar alegando, em síntese, que: Do comportamento adotado pelo A. resultam violações culposas de elementares deveres jus laborais que configura infrações disciplinares graves pois acedeu aos registos informáticos do Banco e fez uso desses dados – estado de aprovação de crédito – para fins totalmente distintos a qualquer propósito no âmbito profissional e posterior divulgação a um terceiro, sem autorização do titular dos dados, o que causou no cliente em questão uma situação de grande desconforto e desconfiança no Banco; o A. violou os normativos internos constantes do Código de conduta e os deveres de respeitar e tratar as pessoas que se relacionam com a empresa, com urbanidade e respeito, de realizar o trabalho com zelo e diligência, de cumprir as ordens e instruções do empregador e o dever de promover ou executar os atos tendentes à melhoria da produtividade da empresa; o procedimento disciplinar foi lícito e regular, não persecutório e a sanção aplicada proporcional, pelo que, a sanção de suspensão de 5 dias não é abusiva. Termina dizendo que deve: “I. Ser declarado o erro na forma de processo, nula a citação e o Réu absolvido da instância; II. Caso assim não se entenda, sempre deverá ser declarado o erro na forma de processo com as consequências previstas no artigo 193.º do Código de processo Civil; III. Ser a presente ação jugada totalmente improcedente e não provada, devendo o Réu ser absolvido de todos os pedidos do Autor, mantendo-se válida a sanção disciplinar conservatória, com todas as consequências legais daí decorrentes; IV. Mais deve o Autor ser condenado em custas e procuradoria condigna. Fazendo assim a costumada justiça.” *
Teve lugar a audiência de partes e na qual não foi obtido acordo. * Foi, depois, proferido despacho (fls. 212) com o seguinte dispositivo: “Assim sendo, julgo amnistiadas as infrações disciplinares em causa nos presentes autos e, em consequência julgar extinto o procedimento disciplinar, ficando sem efeito a sanção disciplinar aplicada no âmbito do mesmo, devendo a ré devolver ao autor as quantias que reteve na sequência do mesmo. *** Face à decisão que julga amnistiadas as infrações disciplinares em causa, julgo extintos os presentes autos, bem como prejudicada a apreciação das demais questões suscitadas nos mesmos, incluindo o pedido de condenação em danos não patrimoniais.” * Por acórdão deste tribunal foi revogada esta decisão e ordenado o prosseguimento dos autos. * Foi, então, proferido o despacho saneador de fls. 286 e dispensada a enunciação dos temas da prova. * Realizou-se a audiência de discussão e julgamento conforme consta da respetiva ata. * De seguida foi proferida a sentença de fls. 296 e segs. com o seguinte dispositivo: “Por tudo o exposto, julga-se a presente ação improcedente por não provada e, em consequência, absolvo o réu Banco 1..., S.A. dos pedidos formulados pelo autor AA.” * O Autor, notificado desta decisão, veio interpor o presente recurso que concluiu da forma seguinte: (…). * O Banco Réu apresentou resposta concluindo que: (…). * O Exm.º Procurador-Geral Adjunto emitiu o douto parecer de fls. 328 e segs. no sentido de que “deve ser concedido provimento parcial ao recurso, substituindo-se a sentença recorrida por outra que revogue a sanção aplicada ao recorrente, substituindo-se tal sanção por outra mais leve, das previstas nas alíneas b), c) e d) do artigo 328.º do CT, confirmando-se, no mais, a sentença.” * O Banco Réu veio responder a este parecer concluindo pela manutenção na íntegra da decisão do tribunal a quo. * Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir. * II – Questões a decidir Como é sabido, a apreciação e a decisão dos recursos são delimitadas pelas conclusões da alegação do recorrente (artigo 639.º, n.º 1, do CPC), salvo as que são de conhecimento oficioso. Assim sendo, cumpre conhecer as seguintes questões: 1ª – Nulidade da sentença recorrida. 2ª – Se o Autor não violou o dever de sigilo bancário. 3ª – Se a sanção aplicada ao Autor é desproporcional. * III – Fundamentação a-) Factos Provados e não provados constantes da sentença recorrida: 1- O autor foi admitido ao serviço do réu Banco 1..., S.A., com antiguidade reportada a 1 de setembro de 1992, encontrando-se vinculado por contrato de trabalho por tempo indeterminado e sendo internamente identificado com o n º ...96.6 (artigo 5º e 22º ambos da petição inicial e parte dos artigos 28º e 38º ambos da contestação). 2- O autor detém a categoria profissional de Gerente de Estabelecimento, desempenhando as funções de Gestor Cliente Sénior na sucursal A... (...95 – DEN) (artigo 6º da petição inicial e parte do artigo 28º e 39º ambos da contestação). 3- Encontra-se filiado no Sindicato dos Bancários do Centro, sendo o sócio n º ...24 (artigo 7º da petição inicial e parte do artigo 28º da contestação). 4- O réu, por sua vez, é uma instituição financeira de crédito que adota a forma de sociedade anónima e exerce a atividade bancária (artigo 8º da petição inicial e parte do artigo 28º da contestação). 5- Tendo o réu outorgado o “Acordo Colectivo entre o Banco 1... S.A. e outros e a Federação do Setor Financeiro – FEBASE”, publicado no BTE n º 6 de 15/02/2017 (ACT) que se aplica à relação laboral entre a ré e os trabalhadores ao seu serviço filiados no Sindicato dos Bancários do Centro (artigo 9º da petição inicial e parte do artigo 28º da contestação). 6- O autor trabalha por conta, disciplina e direção do réu há mais de trinta e um anos (artigo 10º da petição inicial e parte do artigo 28º da contestação). 7- Por deliberação de 28 de abril de 2022 o Sr. Administrador Executivo do pelouro instaurou procedimento disciplinar ao autor pelos factos que a entidade patronal entendeu constituírem infração disciplinar e que constam da nota de culpa de 18 de maio de 2022, a qual incorpora o processo disciplinar (parte do artigo 11º da petição inicial e parte do artigo 28º da contestação). 8- O autor respondeu à nota de culpa pugnando pela absolvição e arquivamento do processo disciplinar (parte do artigo 12º da petição inicial). 9- Produzidas as diligências probatórias requeridas e oficiosamente determinadas, foi proferida decisão final em 29 de agosto de 2022 ao autor tendo por base a deliberação dos dois administradores executivos do réu, que deliberaram em 19 e 26 de agosto de 2022 sancionar o autor nos termos do disposto na al. e) do n º1 do artigo 328º do CT, com cinco dias de suspensão da prestação do trabalho com perda de retribuição, tendo por base a factualidade descrita no relatório final do Instrutor (parte do artigo 13º e 14º ambos da petição inicial). 10- O autor não tem antecedentes disciplinares (artigo 23º da petição inicial e parte do artigo 28º e 70º ambos da contestação). 11- No âmbito da categoria profissional do autor cabem-lhe, entre outras, as seguintes funções: aplicar os conhecimentos técnicos associados no âmbito da sua função (numa área de negócio, suporte ou planeamento e controlo), necessitando da orientação e do acompanhamento de profissionais com maior experiência para a resolução de problemas mais complexos; planear e organizar as suas atividades com autonomia; conhecer bem o negócio e o mercado que contextualizam a organização (artigo 40º da contestação). 12- O réu, para além de dar formação contínua aos seus colaboradores para melhorar o desempenho e aperfeiçoamento das funções por estes desempenhadas, disponibiliza-lhes, incluindo ao autor, as regras e procedimentos em vigor no Banco para que estes possam desempenhar cabal e adequadamente as suas funções (parte do artigo 41º da contestação). 13- Enquanto colaborador do réu, o autor tem conhecimento e acesso ao Código de Conduta GR0021 (artigos 42º e 43º ambos da contestação). 14- No dia 8 de abril de 2022 chegou ao conhecimento do membro da Comissão Executiva do réu com o Pelouro da área do autor a apresentação de uma reclamação de um cliente que alegava a quebra de sigilo bancário por parte do réu, tendo sido levadas a cabo diligências que apontavam para que o autor da factualidade descrita na reclamação tivesse sido o autor (parte do artigo 47º da contestação). 15- Face ao aludido em 14), no dia 28 de abril de 2022, pelo Vice-Presidente da Comissão Executiva, Dr. BB, foi mandado instaurar procedimento disciplinar nos termos aludidos em 7) (artigo 48º da contestação). 16- O Sr. CC, à data da instauração do processo disciplinar, era casado, tinha 35 anos e era cliente do réu, desde 2013 (artigo 49º da contestação). 17- Na mesma data o cliente aludido em 16) era titular da conta DDA com o n º ...60, a qual estava domiciliada no Centro Prestige Oeste (1735-DRC) (artigo 50º da contestação). 18- O cliente tinha como gestora de conta a colaboradora DD (artigo 51º da contestação). 19- O autor não tinha qualquer relacionamento pessoal, nem profissional com o referido cliente (artigo 52º da contestação). 20- No dia 31 de janeiro de 2022, o cliente aludido em 16) solicitou um crédito habitação (SWOC ...46), no montante de € 200.000 (duzentos mil euros) (artigo 53º da contestação). 21- O empréstimo aludido em 20) tinha como propósito a aquisição de uma habitação permanente, sita na Rua ..., ... (artigo 54º da contestação). 22- Conforme consta da caderneta predial do imóvel aludido em 21), à data da reclamação era proprietária do imóvel uma ex-cliente do Banco (sucursal ... Negócios), B..., Lda., cujos sócios são EE e FF (artigo 46º da petição inicial e artigo 55º da contestação). 23- Por email datado de 1 de março de 2022, enviado para GG, Diretor de Sucursal no Centro Prestige Oeste, o cliente aludido em 16) reclamou ter sofrido “sérios prejuízos” em virtude de uma alegada quebra de sigilo bancário (parte do artigo 56º da contestação). 24- No email aludido em 23) referiu que no dia 28 de fevereiro de 2022 teve conhecimento que terá sido transmitido o “estado de aprovação do crédito habitação”, assim como o “montante pedido” ao vendedor do imóvel (artigo 57º da contestação). 25- Mais faz referência que, quer o cliente aludido em 16), quer a sua mulher, HH, também cliente do réu, desconhecem “se mais alguma informação nossa foi divulgada, como por exemplo dinheiro a prazo ou à ordem” (artigo 58º da contestação). 26- No dia 3 de março de 2022 o cliente aludido em 16) apresentou reclamação através do livro de reclamações eletrónico (artigo 59º da contestação). 27- Da reclamação aludida em 26) consta “Venho por este meio expor uma situação de violação gravíssima do sigilo bancário e do Regulamento Geral de Proteção de Dados (RGDP), que tomei conhecimento ontem relativamente à divulgação dos dados bancários relativos ao crédito bancário que temos em aprovação junto do banco Banco 1.... Sendo o banco entidade a responsável pelos dados, cabe-me reportar que tomei conhecimento no dia 28/02/2022 que o banco passou os seguintes dados ao vendedor do imóvel (empreiteiro) que pretendemos adquirir: - Estado de aprovação do crédito habitação; - Montante pedido. Esta violação teve sérios prejuízos para a nossa boa relação com o vendedor do imóvel/empreiteiro, colocou em causa o negócio e a boa fé das partes, dado que divulgou dados que nos pertenciam – a nós só a nós – e que deixam a descoberto a nossa privacidade. Não sabemos se mais alguma informação nossa foi divulgada, como por exemplo dinheiro a prazo ou à ordem que temos no banco (…) Considero inadmissível que estes dados tenham sido partilhados sem autorização e conhecimento do cliente, a um terceiro que nada tem a ver com a nossa relação com o Banco 1...” (artigo 60º da contestação). 28- No dia 9 de março de 2022 foi enviado um e-mail ao cliente pelo Centro de Atenção ao Cliente, com o conhecimento ao Banco de Portugal, a informar que “o caso foi endereçado para a área competente para análise e resolução” (artigo 61º da contestação). 29- Decorrente das reclamações apresentadas pelo cliente, foi efetuada uma análise pela DAU, de onde resultou a identificação de várias consultas no sistema ao perfil do reclamante, bem como da respetiva conta à ordem, efetuadas no dia 10 de fevereiro de 2022 pelo autor (parte do artigo 62º da petição inicial e artigo 62º da contestação). 30- As consultas aludidas em 29) tiveram por base o pedido efetuado por EE ao autor que se apresentou de forma pessoal na agência Banco 1... onde trabalha o autor a solicitar a informação que pretendia obter sobre o estado do empréstimo do cliente aludido em 16) (parte do artigo 67º da petição inicial). 31- Mostrando-se frustrado o que pretendia saber o autor relativamente ao empréstimo do cliente aludido em 16), designadamente se o mesmo estava finalizado e concretizado, tendo por base as consultas aludidas em 29), com vista a prestar a informação solicitada a EE, o autor questionou o seu colega II, que o informou que o processo estava finalizado e que “estava aprovado” (restante parte do artigo 62º, 63º e 64º todos da petição inicial). 32- O autor após as diligências por si levadas a cabo, através de consultas e junto do colega, nos termos aludidos em 31), transmitiu a EE, dias depois, que o pedido de empréstimo do cliente aludido em 16) “estava aprovado”, tendo com tal comportamento prestado informações de um cliente de um Banco a um terceiro não autorizado (artigo 49º e parte do artigo 67º ambos da petição inicial e parte dos artigos 63º, 64º, 65º todos da contestação). 33- No dia 14 de março de 2022 decorrente da queixa apresentada pelo cliente aludido em 16) junto do Banco de Portugal à qual veio a ser atribuída a ref.ª ...49, o réu foi notificado pelo Banco de Portugal para prestar os seguintes esclarecimentos “quais os dados/informações do Reclamante ao vendedor do imóvel; o motivo subjacente desses dados/informações” (artigo 67º da contestação). 34- Já depois da apresentação de reclamação por parte do cliente aludido em 16) foi outorgada escritura de compra e venda entre os clientes do réu e a Sociedade do qual EE é sócio, tendo sido concedido empréstimo pelo réu (artigo 69º da contestação). 35- O autor não é membro de nenhuma estrutura representativa de colaboradores (artigo 71º da contestação). 36- O autor enquanto Gestor Cliente Sénior do réu, acedeu aos registos informáticos do Banco, do qual constam informações pessoais de clientes e referentes às contas, nomeadamente, sobre o estado de aprovação do crédito e o respetivo montante, sem que tal lhe tivesse sido solicitado pelo próprio cliente do réu, ou alguém por si autorizado (artigo 75º da contestação). 37- Tendo feito uso dos dados – estado de aprovação do crédito – para fins totalmente distintos a qualquer propósito no âmbito profissional (artigo 76º da contestação). 38- A conduta do autor aludida em 29) e 34) e posterior divulgação a um terceiro, sem autorização do titular dos dados causou no cliente aludido em 16) uma situação de desconforto e desconfiança no réu (parte do artigo 77º da contestação). 39- Não tendo o Sr. EE demonstrado ser representante do cliente aludido em 16), não podia o autor ter prestado informação de qualquer tipo sobre um cliente do Banco, designadamente o estado de aprovação da operação bancária (artigo 83º da contestação). 40- O comportamento levado a cabo pelo autor transmitiu uma imagem de insegurança quanto às informações dos clientes (parte do artigo 108º da contestação). 41- O autor sempre se mostrou disponível para atender às necessidades e exigências de serviço da ré, dando horas do seu descanso e, em prejuízo da sua família, a favor dos interesses do réu e em cumprimento das exigências impostas pelo serviço, em favor dos clientes da ré, o que é reconhecido por parte dos clientes e dos superiores hierárquicos do autor (parte dos artigos 30º, 31º, 32º e 37º todos da petição inicial). 42- O autor é um profissional sério e diligente no exercício da sua profissão zela pelos interesses comerciais do Banco 1... e procura atingir os objetivos que lhe são propostos (parte do artigo 38º da petição inicial). 43- O autor com a instauração do processo disciplinar sentiu-se angustiado e triste, por considerar que estava a ser posta em causa a sua dignidade, brio e competência profissionais, tendo chegado a ter perturbações do sono (parte dos artigos 77º, 88º e 89º todos da petição inicial). Factos não provados: Não se provaram os demais factos alegados nos articulados, designadamente, a matéria vertida nos artigos 33º (restante matéria que não foi dada como provada), 44º, 47º, 48º, 49º (restante matéria que não foi dada como provada), 54º, 57º, 58º, 66º, 67º (restante matéria que não foi dada como provada), 77º (restante matéria que não foi dada como provada), 88º (restante matéria que não foi dada como provada) e 89º (restante matéria que não foi dada como provada), todos da petição inicial e o artigo 68º da contestação. * * b) - Discussão Apreciando as questões suscitadas pelo Autor recorrente: 1ª questão Nulidade da sentença Alega o recorrente que a sentença não vem suficientemente fundamentada como exige o artigo 615.º, n.º 1, do CPC. Vejamos: Conforme resulta do artigo 615.º do CPC a sentença é nula quando: <<(…) b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justifiquem a decisão: (…);>>. Na verdade, cabe ao juiz especificar os fundamentos de facto e de direito da decisão, existindo nulidade quando falte em absoluto tal indicação. No entanto, já não se verifica a mesma no caso de mera deficiência de fundamentação. Ora, lidas as alegações do recorrente, facilmente se conclui que as mesmas não consubstanciam a nulidade supra elencada. Na verdade, ao contrário do alegado pelo recorrente, da sentença recorrida constam os fundamentos de facto e de direito que a sustentam. Aliás, como já ficou dito, só existe a nulidade em apreciação quando falte em absoluto tal indicação, o que não ocorre no caso presente. É o próprio recorrente que alega que a sentença não vem suficientemente fundamentada. Assim sendo, inexiste a invocada nulidade por falta de fundamentação. Improcedem, assim, as conclusões do recorrente.
2ª questão Se o Autor não violou o dever de sigilo bancário. Alega o recorrente que a sentença enferma de erro de julgamento por se verificar uma representação errónea de elementos materiais; os factos descritos nos pontos 31 e 32 não constituem informação proibida no âmbito do sigilo bancário. Por outro lado, consta da sentença recorrida, a este propósito, o seguinte: “Ora, considerando a factualidade provada resulta que, o autor incumpriu o dever de urbanidade e probidade, no que toca à forma como forma como tratou as informações do cliente do Banco (128º, n º1 al.a) e n º2 do CT). Também violou o dever de executar as suas funções com zelo e diligência, pois, agindo com os comportamentos descritos na factualidade pôs em causa a imagem comercial e o prestigio do empregador, violando os procedimentos obrigatórios instituídos pelo réu, os quais eram do perfeito conhecimento do autor, pelo que, violou assim o disposto no artigo 128º, n º1 al. c) e n º2 do CT. Acresce que, atentas as funções do autor de responsabilidade, cabia-lhe não só cumprir tais procedimentos, tendo desconsiderado assim as regras instituídas pelo empregador, pelo que, violou o dever de cumprir ordens e instruções do empregador, previstas no artigo 128º, n º1 al. e) do CT. Acresce que, o facto de o autor ter adotado os comportamentos descritos na factualidade provada, diremos que, com os mesmos, violou o dever de promover os atos tendentes à melhoria de produtividade, previsto no artigo 128º, n º1 al. h) e n º2 do CT. Com a factualidade descrita o autor violou os deveres previstos nas alíneas a), c), e) e h) do artigo 128º do Código do Trabalho. Estabelece o artigo 78º, do DL 298/92 de 31/12, com as respetivas alterações que, “1- Os membros dos órgãos de administração ou fiscalização das instituições de crédito, os seus colaboradores, mandatários, comissários e outras pessoas que lhes prestem serviços a título permanente ou ocasional não podem revelar ou utilizar informações sobre factos ou elementos respeitantes à vida da instituição ou às relações desta com os seus clientes cujo conhecimento lhes advenha exclusivamente do exercício das suas funções ou da prestação dos seus serviços. 2 - Estão, designadamente, sujeitos a segredo os nomes dos clientes, as contas de depósito e seus movimentos e outras operações bancárias. (…)”. E, o artigo 4º do Código de Conduta GR0021 que “1- As pessoas abrangidas por este Código estão obrigadas a manter estrita confidencialidade e a não revelar a terceiros, sob qualquer forma, quaisquer assuntos, informações, dados pessoais, documentos, dados ou procedimentos de que tomem conhecimento no desempenho das suas funções, relativos ao grupo, à sua atividade, organização e estrutura, aos seus colaboradores, clientes ou potenciais clientes, fornecedores ou potenciais fornecedores e colaboradores destes. 2- Estão, designadamente, sujeitos a segredo os nomes dos clientes, as contas de depósito e seus movimentos, bem como quaisquer outras operações bancárias. 3- As pessoas abrangidas por este Código obrigam-se a manter estritamente confidenciais, durante e após o termo do respetivo contrato, os dados pessoais de terceiros a que tenham acesso no âmbito das suas funções. 4- As informações sobre factos ou elementos abrangidos pelo dever de segredo só podem ser revelados mediante autorização escrita do interessado, ou nos casos previstos expressamente nas disposições legais e regulamentares aplicáveis”. Também o artigo 8º do referido Código de Conduta estabelece que, “1- As entidades abrangidas por este código só poderão aceder e de alguma forma tratar (v.g. copiar, transmitir, alterar, difundir ou destruir) dados pessoais que estejam sob a responsabilidade do Grupo no que for estritamente necessário ao desempenho das suas funções. 2- As entidades abrangidas por este Código estão proibidas de transmitir a terceiros, por qualquer forma ou meio, dados pessoais que estejam sob a responsabilidade do Grupo exceto com autorização ou sob as instruções expressas deste. 3- As entidades abrangidas por este Código obrigam-se a comunicar ao Grupo, de imediato, qualquer situação ou evento que possa afetar a segurança no tratamento de dados pessoais efetuado no âmbito do exercício das suas funções ou que, de algum modo, possa dar origem ao incumprimento pelo mesmo das disposições legais em matéria de proteção de dados pessoais”. Face aos citados normativos, dúvidas não restam que a informação prestada estava a coberto de sigilo bancário, sendo que, o autor não podia diligenciar pela obtenção de tal informação que não lhe era diretamente acessível, nem através das consultas que levou a cabo, nem as podia facultar a um terceiro que não estava mandatado para a sua obtenção.” Vejamos: Tendo em conta a matéria de facto provada acompanhamos a sentença recorrida, pouco mais se impondo dizer. Na verdade, ao contrário do alegado pelo recorrente, tendo em conta que o Autor efetuou as consultas descritas no ponto 29 à conta à ordem do cliente, com base no pedido efetuado por um terceiro não autorizado, questionou um seu colega e, após, transmitiu àquele terceiro que o pedido de empréstimo do cliente “estava aprovado” (pontos 30 a 32) e, ainda, o disposto no n.º 1 do artigo 78.º do DL n.º 298/92, de 31/12 e no n.º 2 do artigo 4.º do Código de Conduta, facilmente se conclui que o Autor violou o segredo bancário pois a ele estão sujeitas, além do mais, as respetivas operações bancárias. Assim sendo, improcedem as conclusões do recorrente.
3ª questão Se a sanção aplicada ao Autor é desproporcional. Alega o recorrente que a sanção disciplinar de cinco dias de suspensão da prestação de trabalho com perda de retribuição que lhe foi aplicada se mostra manifestamente desproporcional às concretas circunstâncias do caso, atento até a matéria de facto provada nos pontos 6, 10, 41 e 42, sendo que não existiu qualquer prejuízo financeiro para a Ré, nem o Autor obteve qualquer benefício económico, não se locupletou com qualquer quantia, nem atuou com o propósito de prejudicar o Réu. A este propósito consta da sentença recorrida: “Acresce que, a larga experiência do autor torna mais censurável a sua conduta, pois o mesmo bem sabia que não podia agir da forma como agiu, prestando informações a terceiro sobre o estado do empréstimo do cliente do réu. Ora, o autor na data em que foi aplicada esta sanção não tinha antecedentes disciplinares, contudo, a infração por si praticada colocou em causa a credibilidade do réu perante um cliente, sendo a mesma grave, pois o autor com tantos anos de serviço, bem sabia ou não podia ignorar que a informação prestada estava a coberto do sigilo bancário, pelo que, entendemos que, a sanção de suspensão de 5 (cinco) dias, com perda de retribuição é proporcional e adequada à gravidade da infração, respeitando os limites previstos no artigo 328º, n º3 do CT. Assim sendo, diremos que, a sanção foi devidamente aplicada, não enfermando de qualquer ilegalidade, pelo que, deve ser mantida, não tendo o autor direito ao recebimento das quantias que lhe tenham sido descontadas em virtude do cumprimento da mesma.” Apreciando: Tendo em conta a matéria de facto provada, desde já avançamos que também nesta parte acompanhamos a sentença recorrida. Na verdade, resulta do disposto no artigo 328.º do CT, sob a epígrafe “Sanções disciplinares”: <<1 – No exercício do poder disciplinar, o empregador pode aplicar as seguintes sanções: a) Repreensão; b) Repreensão registada; c) Sanção pecuniária; d) Perda de dias de férias; e) Suspensão do trabalho com perda de retribuição e de antiguidade; f) Despedimento sem indemnização ou compensação. 2 – O instrumento de regulamentação coletiva de trabalho pode prever outras sanções disciplinares, desde que não prejudiquem os direitos e garantias do trabalhador. 3 - A aplicação das sanções deve respeitar os seguintes limites: a) As sanções pecuniárias aplicadas a trabalhador por infrações praticadas no mesmo dia não podem exceder um terço da retribuição diária e, em cada ano civil, a retribuição correspondente a 30 dias; b) A perda de dias de férias não pode pôr em causa o gozo de 20 dias úteis; c) A suspensão do trabalho não pode exceder 30 dias por cada infração e, em cada ano civil, o total de 90 dias. 4 - Sempre que o justifiquem as especiais condições de trabalho, os limites estabelecidos nas alíneas a) e c) do número anterior podem ser elevados até ao dobro por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho. 5 - A sanção pode ser agravada pela sua divulgação no âmbito da empresa. 6 - Constitui contraordenação grave a violação do disposto nos n.ºs 3 ou 4.>>. E <<a sanção disciplinar deve ser proporcional à gravidade da infração e à culpabilidade do infrator (…).>> - n.º 1 do artigo 330.º do CT. Por outro lado, apurou-se que o Autor trabalha por conta do Réu há mais de 31 anos, não tem antecedentes disciplinares, sempre se mostrou disponível para atender às necessidades e exigências de serviço da ré, dando horas do seu descanso e, em prejuízo da sua família, a favor dos interesses do réu e em cumprimento das exigências impostas pelo serviço, em favor dos clientes da ré, o que é reconhecido por parte dos clientes e dos superiores hierárquicos do autor, é um profissional sério e diligente, no exercício da sua profissão zela pelos interesses comerciais do Banco 1... e procura atingir os objetivos que lhe são propostos e não se apurou a existência de prejuízo financeiro para o Réu nem a obtenção de um benefício económico por parte do Autor. Acontece que resulta da matéria de facto provada que o cliente apresentou uma reclamação alegando quebra de sigilo bancário por parte do Réu e nos termos descritos nos pontos 23 a 27, o Réu foi notificado pelo Banco de Portugal para prestar esclarecimentos na sequência da queixa apresentada pelo cliente junto do mesmo, a conduta do Autor causou no cliente uma situação de desconforto e desconfiança no Réu e transmitiu uma imagem e insegurança quanto às informações dos clientes. Assim sendo, ponderando a matéria de facto provada e face ao elenco constante do citado artigo 328.º do CT, a sanção aplicada ao Autor afigura-se-nos adequada e proporcional. Por fim, resta dizer que conforme vem sendo entendimento jurisprudencial, quando o trabalhador tenha impugnado judicialmente a sanção disciplinar que lhe foi aplicada pelo empregador, ao tribunal compete apenas confirmar ou revogar a sanção, não podendo substituir-se àquele na determinação desta, posto que o exercício do poder disciplinar é uma prerrogativa do empregador. Como se decidiu no acórdão do STJ, de 16/05/2012, disponível em www.dgsi.pt: <<I - O efeito da neutralização de uma circunstância, tida então como agravante da responsabilidade disciplinar do trabalhador na prática posterior de uma outra infracção, apenas pode ver-se reflectido, quando muito, na determinação do ‘quantum’/medida da pena. II - Todavia, nessa determinação inexiste possibilidade de intervenção ou controlo jurisdicional, na medida em que o poder disciplinar pertence, por inteiro, à entidade empregadora e ao tribunal apenas está conferido o poder de confirmar ou invalidar a sanção, mas não modificá-la. III - Na verdade, sendo as sanções disciplinares ‘penas privadas’, o critério da sua graduação pertence ao empregador, norteado pragmaticamente por princípios gestionários e de oportunidade e, principalmente, pelo princípio da proporcionalidade, sendo vectores determinantes, para o efeito, a gravidade da infracção e a culpa do infractor. IV - Assim, e desde que respeitados estes critérios, oportunamente apreciados e valorados pelo detentor do poder disciplinar, não pode o tribunal substituir-se-lhe corrigindo a sanção aplicada. (…)>>.[2] Pelo exposto, improcedem as conclusões do recorrente. * Improcedem, assim, as conclusões formuladas pelo Autor recorrente, impondo-se a manutenção da sentença recorrida em conformidade. * * IV – Sumário[3] (…). * * V - DECISÃO Nestes termos, sem outras considerações, na improcedência do recurso acorda-se em manter a sentença recorrida. * * Custas a cargo do A. recorrente. * * Coimbra, 2025/10/24 ____________________ (Paula Maria Roberto) _____________________ (Mário Rodrigues da Silva) ____________________ (Felizardo Paiva)
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