Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
595/20.2T8CNT-C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MÁRIO RODRIGUES DA SILVA
Descritores: AUTORIDADE DO CASO JULGADO
Data do Acordão: 04/26/2022
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO LOCAL CÍVEL DE CANTANHEDE DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA POR UNANIMIDADE
Legislação Nacional: ARTIGO 576.º, N.º 3, DO CPC
Sumário: Verificada a autoridade do caso julgado de uma decisão de mérito que seja incompatível com o objecto a decidir posteriormente noutra acção, o seu alcance não pode deixar de se repercutir no próprio mérito desta, importando, nessa medida, a sua improcedência com a consequente absolvição do réu do pedido.
Decisão Texto Integral:
Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra

RELATÓRIO

AA instaurou a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra BB, pedindo que a ré seja condenada a:

a) Reconhecer o autor como legitimo dono e possuidor do prédio misto suto à Estação ..., composto por casa de habitação com pátio. Adega, currais e terreno com oliveiras, figueiras, pereiras e vinha com área de 7761m2, a confrontar do Norte com serventia pública, do Sul com BB, do Nascente com caminho de ferro e do poente com CC, inscrito na matriz predial respetiva sob os artigos ... e ...-1, descrito na Conservatória de Registo Predial ... sob o nº ...91, e aí, inscrito a favor do autor;

b) Reconhecer  que a linha divisória entre o prédio da ré composto de parcela de terreno para construção descrito sob o nº ...70 da freguesia ... com o prédio misto do autor com a descrição nº ...91 da mesma freguesia ..., é constituída pelos segmentos de reta no alinhamento da parede das edificações de nascente do prédio do autor, não extravasando a área de 882m2, desobstruindo ou desimpedindo as vistas e os acessos ou aberturas existentes nas construções do A, em respeito pelas construções existentes no prédio do autor e seus antepossuidores, passada, presente ou futura, respeitando o afastamento mínimo legal de 1,50m às construções divisórias de muro e paredes do prédio do autor;

c) Desocupar a edificação de “currais” existente no limite poente do prédio do autor e a demolir toda e qualquer obra edificada ilegal, não autorizada ou consentida pelo autor e seus antepossuidores e não licenciada pela câmara ou que viole as disposições legais do art.º 1360º nº 1 (afastamento mínimo legal das novas construções) e do art.º 1362º nº2 e 1365º nº 2 do Código Civil, atenta a servidão de vistas e de estilicídio constituída por usucapião das edificações existentes no prédio do autor, e as normas de proteção da salubridade, estética iluminação natural e de segurança da construção civil (art.º 73º, 74º, 15º, 16º e 121º do RGEU) e/ou que não respeita ou constitua a violação dos legítimos interesses e direito de propriedade do autor e seus antepossuidores ou que com eles contenda, lese ou prejudique, anule, diminua ou afete as funções e utilização anteriormente efetuada pelo autor e seus antepossuidores, atenta a aquisição originária e por usucapião e da constituição de servidão de vistas e de estilicídio;

d)  Pagar, a titulo de danos patrimoniais causados e decorrente da ocupação ilegítima e abusiva da construção de currais a poente pertencente ao autor, a quantia global de €30.000,00, e da ilegalidade e violação das legis artis nas construções da ré., que atentam contra o direito de propriedade do autor, prejudicam e violam a estética, segurança e salubridade das edificações existentes de muros de alvenaria e da edificação do anexo, que são ressarcíeis, a quantia global 6.000,00, a que acrescem os juros que se vencerem até integral pagamento; e

e) As custas devida a juízo e em custas de parte, tudo com as legais consequências.

Alegou para tanto e em síntese que adquiriu um prédio a DD e que a ré, em 19-01-2018, sendo proprietário, em virtude de uma doação realizada por DD, em 30-01-2004, de um prédio confinante (parcela de terreno destacada), se encontra a ocupar uma edificação pertencente ao seu prédio, tendo construído umas placas de betão que tapam a abertura de edificação de “curral/aviário” propriedade do A. Mais referiu que essas edificações impedem o escoamento natural, e permitem a entrada das águas pluviais, gelo, humidades e outros detritos da própria construção, folhas, ramos, que tapam a visibilidade à edificação (anexo) do A., reduzindo a iluminação natural e as vistas. A ré encontra-se assim a ocupar o anexo do curral que pertence ao autor, em virtude de não ter sido objeto da referida doação.

A ré apresentou contestação/reconvenção.

Na contestação, a ré defendeu-se por exceção (dilatória do caso julgado) e por impugnação.

Quanto à matéria de exceção, veio a ré dizer que a questão da dependência/curral integrar ou não a parcela doada já foi discutida e decidida na Ação de Processo Sumário n.º 751/08...., que correu termos no ... Juízo do extinto Tribunal Judicial ..., movida pela DD (doadora) à aqui ré, tendo sido julgados improcedentes por sentença proferida em 07.01.2010, confirmada pelo Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra datado de 21.12.2010, já transitado em julgado.

Em sede de contraditório quanto à matéria da exceção, pugna o autor pela improcedência de tal exceção, afirmando que inexiste identidade das partes, nem que resulte da referida sentença que a construção de armazém ou de curral pertence à ré.

Quanto ao petitório e notificado para tal, o autor veio aos autos esclarecer que com os pedidos a) e b) apenas pretende o reconhecimento do direito de propriedade do seu imóvel, nele incluindo a parcela/edificação ocupada pela ré, esclarecimento este que foi aceite pela ré.

Foi proferido despacho saneador/sentença que julgou procedente a exceção dilatória de caso julgado, absolvendo-se a ré da instância.

Inconformado com o decidido, o autor interpôs recurso, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:

“Primeiro. Mediante douta sentença, datada de 14 de outubro de 2021, foi julgada procedente a exceção dilatória de caso julgado e consequentemente foi a ré absolvida da instância.

Segundo. Ora salvo o devido respeito o Tribunal a quo errou e não se mostram respeitados os mais elementares direitos processuais do recorrente, porquanto face ao andamento dos autos, sempre confiou na realização quer de audiência prévia quer ainda de audiência de discussão e julgamento.

Terceiro. Importa começar por chamar a atenção que a ação intentada não era de mera restituição conforme se comprova pelos pedidos múltiplos que se não reduzem à mera reivindicação. Ademais, conforme é reconhecido pela Meritíssima Juíza a quo na sentença recorrida quando expressamente reconhece que havia pedidos que não se reduzem ao efeito do caso julgado e abre a porta à propositura de uma nova ação, o que configura a violação dos princípios da imediação bem como da economia processual.

Quarto. O que provoca inequivocamente, que os demais pedidos não umbilicalmente afetados pelo caso julgado poderiam muito bem ser apreciados nos presentes autos com o prosseguimento parcial dos mesmos?!

Quinto. A fls. 13 o douto tribunal a quo considerou que “Resulta assim que a causa de pedir não é, pelo menos na globalidade, coincidente com a exposta na ação, o que poderia obstar a que se considerasse a exceção em apreço”.

Sexto.  Ora, face a esta douta apreciação, não havendo tal coincidência integral, não podia sem mais valer unicamente tal exceção e os autos cessarem, configurando uma clara contradição insanável entre a fundamentação e a decisão!;

Sétimo. Destarte, não se vislumbra assim assertividade quanto ao vertido a fls. 13, último parágrafo, quando o douto Tribunal a quo refere que “…impõe-se que se aceite a decisão passada em julgamento no âmbito do proc. 751/08....”.

Oitavo. Porquanto, bem basta uma análise breve do teor de tal decisão, para aferir que trata-se de uma decisão negativa, que absolveu a ré dos pedidos, pese embora, não tomou nenhuma decisão de reconhecimento ou de constituição de direitos!

Nove. Em boa verdade, não foi julgado que a recorrida tinha razão e que os aviários lhe pertenciam, apenas que a autora (que não o recorrente) não foi capaz de fazer prova cabal do que alegou nem de cumprir o ónus que lhe competia (ponto de facto 3 provado), e ainda que em bom rigor não se podem ter como sinónimos “aviários” e “currais”.

Décimo. Ressaltando claramente que o douto Tribunal a quo errou ao ter por sinónimos tais realidades não totalmente coincidentes e que apenas com a produção de prova (se necessário com uma ida ao local), poderiam ser constatadas e aferidas.

Décimo primeiro. Na presente ação não está causa quaisquer aviários, mas sim currais, como aparece expressamente referido nos pedidos b) e c);

Décimo segundo. Todavia, a haver a dita coincidência, então a douta sentença padece de contradição insanável, pois que assenta numa decisão anterior que fundou tal juízo de improcedência no facto de a descrição posterior à desanexação deixar de conter a palavra “aviários” (ponto provado 4.A). Mas continua a conter a palavra “currais”, pelo que tal elemento terá sido eliminado por ser redundante!

Décimo terceiro. Na verdade, o certo é que tais aviários não passaram a constar da descrição do prédio da recorrida!

Décimo quarto. Pelo que o objeto processual não é liquido que seja o mesmo não havendo litispendência nem verdadeiro caso julgado, pois que se discute coisa diversa!

Décimo quinto. Não havendo assim certeza de identidade de objeto pelo que a subsunção jurídica a tal exceção mostra-se errónea! E, como decorre do facto dado por provado 5), do prédio vendido ao recorrente constam os “currais”, assim mesmo no plural! Bens esses que o recorrente reclama, pois comprou uma propriedade que é composta por três currais dos quais a ré se apropriou ilicitamente!

Décimo sexto. Não há assim verdadeira nenhuma “repetição de uma causa em dois processos”, nem se pode falar que se pretende obter o mesmo efeito jurídico pois que não há identidade de causas de pedir nem de pedidos!

Décimo sétimo. A sentença proferida pela Meritíssima Juíza a quo, pretende obrigar o autor a intentar uma nova ação, o que será deveras lesivo e não conforme a um Direito que se queira justo.

Décimo oitavo. Aliás, o alegado caso julgado é no limite sempre duvidoso pois que verdadeiramente não atribuiu à ré. E mesmo que atribuísse, não pode a coberto de tal caso julgado não ser julgada a forma de fruição, seu abuso e o prejuízo causado ao recorrente, tal como alegado na causa de pedir e maxime no pedido d).

Décimo nono. Julga-se que se trata de um caso paradigmático de absoluta necessidade de prova, sendo incompreensível para o recorrente que a decisão tenha sido proferida com a sua dispensa e sem um mínimo de procura da verdade material, com dimensão ajuizativa e a violação do principio do inquisitivo.

Vigésimo. Outrossim, num litigio judicial a prova não pode circunscrever-se à que seja feita por documentos e/ou pela confissão escrita nos articulados das partes, uma vez que foram arroladas testemunhas com razão de ciência e para ser apurada a verdade terão de ser ouvidas, tal qual requerido…

 Vigésimo primeiro. Importando concluir, que a não realização de tais diligências de prova inquina toda a descoberta da verdade material, ficando esta precludida;

Vigésimo segundo. O Tribunal a quo não exerceu os deveres que sobre si recaem de forma justa e adequada, abstendo-se, aos olhos do recorrente, do cumprimento pleno e cabal da legalidade bem atuando com demissão do exercício pleno dos deveres em que se mostra investido na qualidade de órgão de soberania.

Vigésimo terceiro. E tal circunstancialismo da construção e fruição abusiva é deveres essencial para a boa decisão da causa, só podendo ser apreendido pelo Tribunal, para prolação de decisão justa, se de facto ouvir os envolvidos, tal qual requerido pelo recorrente!

Vigésimo quarto. Temos assim que não estavam nem estão reunidos os pressupostos e requisitos para a prolação decisória sem produção de prova, devendo a douta decisão recorrida ser revogada e substituída por despacho saneador e agendamento da audiência de discussão e julgamento.

Vigésimo quinto. E mesmo que estivessem sempre se teria de reduzir apenas a pedido que contendesse com a propriedade (apenas aquele que poderia ter a relação umbilical com a anterior ação!), nunca com os demais pedidos que nunca foram devidamente apreciados ou decididos!;

Vigésimo sexto. Mostra-se, assim, inconstitucional, por preclusão do principio do acesso à tutela jurisdicional efetiva, plasmado no artigo 20º da Constituição da República Portuguesa a interpretação e dimensão normativa do artigo 591º, nº 2 a) ex vi do artigo 732º, nº 2 do Código de Processo Civil segundo o qual “(E)m sede de petição inicial a coenvolver não só reivindicação como fruição abusiva e danos, com pedido para terminus da mesma e indemnização, é licito ao Tribunal decidir do mérito de tal petição com base na exceção de caso julgado face unicamente a reivindicação de objeto diverso (aviários vs currais), julgando-a totalmente improcedente e dando por não provados os factos alegados, sem realização da audiência de discussão e julgamento bem como produção de prova e audição das testemunhas arroladas pelo autor, as quais têm conhecimento direto dos factos.

Vigésimo sete. Analisada a douta sentença ora recorrida, constatamos que o contraditório exercido pelo autor não se mostrou acolhido, havendo esta discordância de opinião, que é legítima;

Vigésimo oitavo. Conforme ensinamentos do Professor Alberto dos Reis, a exceção de caso julgado consiste na alegação de que a ação proposta já está decidida por sentença transitada em julgado (vid. Código de Processo Civil Anotado, III, p. 86).

Vigésimo novo. Ou seja, pressupõe a repetição de uma causa que se verifica depois de a primeira causa ter sido decidida por sentença que já não admite recurso ordinário (cfr. artigo 580º, nº 1 do Código de Processo Civil);

Trigésimo. Neste particular, de modo a verificar, em concreto, a alegada repetição de uma causa anterior, importa ter em atenção que a exceção de caso julgado tem por finalidade evitar que o Tribunal seja colocado perante a alternativa de contradizer ou reproduzir uma decisão anterior;  

Trigésimo primeiro. O artigo 581º do Código de Processo Civil delimita o que deve entender-se por repetição de uma causa, fazendo coincidir este conceito com o de identidade de ações: assim, repete-se uma causa quando essa identidade respeitar aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir, enquanto elementos essenciais das ações;

Trigésimo segundo. Daqui se infere, desde logo, que o caso julgado comporta limites subjetivos e objetivos, dado que será através da tríplice identidade referida que se define a extensão do caso julgado.

Trigésimo terceiro. No caso sub-judice não há identidade das partes entre a sentença junta pela recorrida!

Trigésimo quarto. E a exceção e caso julgado pressupõe a identidade de sujeitos, de pedido e da causa de pedir, o que inexiste nos presentes autos.

 Trigésimo quinto. Apesar do recorrente não ter sido parte na ação anterior, a decisão recorrida julgou procedente a exceção de caso julgado e absolveu a recorrida da instância;

Trigésimo sexto. Ora, urge concluir que, a Meritíssima Juíza a quo não decidiu com base na autoridade do caso julgado formado pela decisão proferida em ação anterior, pois que caso o tivesse feito teria julgado a ação improcedente e absolvido a recorrida do pedido;

Trigésimo sétimo. Nesta conformidade, existe contradição entre a fundamentação e decisão, pois que ao longo da fundamentação de Direito constante da sentença recorrida alude-se à autoridade de caso julgado, mas a decisão surge com base na exceção de caso julgado…

Trigésimo oitavo. E, por um lado, pois que a autoridade de caso julgado não atribuiu a propriedade da construção à recorrida!

Trigésimo nono. Pelo que não tendo alicerçado a decisão na autoridade de caso julgado não pode haver fundamento para a procedência da exceção em razão da inexistência de identidade de partes nem de pedido!

Quadragésimo. O caso julgado que se forma relativamente à decisão (sentença ou saneador) do mérito da causa, define a relação ou situação jurídica deduzida em juízo (a relação material controvertida), determinando que tal decisão tem força obrigatória dentro e fora do processo (dentro dos limites estabelecidos nos artigos 580º e 581º), e impedindo, dessa forma, que a mesma relação material venha a ser definida em moldes diferentes pelo tribunal ou por qualquer outra autoridade;

Quadragésimo primeiro. Segundo Manual de Andrade, in Noções Elementares de Processo Civil, 1979, pág. 305, o caso julgado material consiste em a definição dada à relação material controvertida se impor a todos os tribunais (e até a quaisquer outras autoridades) - quando lhes seja submetida a mesma relação, quer a título principal (repetição da causa em que foi proferida a decisão), quer a título prejudicial (ação destinada a fazer valer outro efeito dessa relação). Todos têm de acatá-la, julgada em conformidade, sem nova discussão”.

 Quadragésimo segundo. A especifica relação material controvertida que foi alvo da decisão não pode voltar a ser discutida entre as mesmas partes e não pode voltar a ser contrariada. Pese embora, para que opere a exceção (e é disso que se trata na sentença recorrida!) pressupõe-se a identidade de sujeitos, de pedido e de causa de pedir- cfr. artigo 580º, nº 1 Código de Processo Civil), não se podendo dispensar a tripla exigência;

Quadragésimo terceiro. Mesma a autoridade do caso julgado nunca poderá valer fora dos limites definidos pelos sujeitos, pelo pedido e pela causa de pedir, pois resulta do artigo 619º do Código de Processo Civil, é apenas dentro desses limites que a decisão adquire a força de caso julgado.

Quadragésimo quadro. Fica estabilizada a definição vertida na decisão transitada em julgado e da concreta relação jurídica aí delimitada pelos sujeitos, pelo pedido e pela causa de pedir.

Quadragésimo quinto. Tal concreta relação jurídica impõe-se e é vinculativa para os respetivos sujeitos no âmbito de qualquer outro litigio que entre eles venha a ocorrer e que tenha como pressuposto ou condição aquela relação. O que não se verifica in casu pois que a recorrente não foi sujeito processual em qualquer ação anterior!

Quadragésimo sexto. Mostram-se as partes e o Tribunal vinculados, evitando, dessa forma, que a relação ou situação jurídica já definida por decisão transitada em julgado seja novamente apreciado para o efeito de decidir da segunda ação. O que não se verifica in casu porque não se trata de apreciar novamente tal situação jurídica já definida.

Quadragésimo sétimo. Reafirma-se que na sentença de 7 de janeiro de 2010 confirmada por acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 21 de dezembro de 2010, transitada em julgado, não ficou provada que a aludida construção de armazém ou curral pertence à recorrida.

Quadragésimo oitavo. Antes, e ao invés do agora alegado pelo Tribunal a quo, compulsada a aludida decisão final transitada em julgado, é manifesto que não ficou provado de quem era a propriedade da aludida construção, designadamente se era da autora nessa ação, a falecida DD ou da Ré;

Quadragésimo nono. Ademais, a exceção de caso julgado não pode resultar verificada através de um aludido “pedido de destaque”, conforme a Ré invocou nos pontos 12 a 15 da sua contestação inseridos na parte da alínea A) da “exceção de caso julgado”, o qual não é apto à verificação de uma exceção;

Quinquagésimo. Destarte, não há identidade de partes ou dos pedidos/decisão, tanto mais que não lograram as partes nessa ação de processo nº 751/08.... como na ação 536/15.... decidir sobre a propriedade de tal construção (se da Autora DD ou se da Ré, BB).

Quinquagésimo primeiro. Pelo que não poderia proceder a invocada exceção de caso julgado, devendo a douta decisão recorrida ser revogada/alterada, atendendo ainda, ao facto do autor ter esclarecido os pedidos a) e b), o que foi aceite pela ré;

Quinquagésimo segundo. A recorrida é proprietária de uma parcela de terreno para construção- unicamente- sem qualquer construção, anexo ou curral- como declarada e comprovadamente não consta qualquer construção urbana da escritura pública de doação e da descrição predial sob o número 8770 da Conservatória do Registo Predial ... (cf. Documentos 1 e 2, juntos com a petição inicial);

Quinquagésimo terceiro. A linha divisória entre o prédio da recorrida composta de parcelo de terreno para construção descrito sob o número ...70 da freguesia ... com o prédio misto do Autor com a descrição número ...91 da mesma freguesia ..., é constituído pelos segmentos de recta no alinhamento da parede de edificações de “currais” a poente e a sul e do muro divisório a nascente do prédio do recorrente; 

Quinquagésimo quarto. Posto isto, juntou-se levantamento topográfico detalhado, onde se pode ver que o prédio misto do recorrente com 8835m2 está delimitado a tracejado de cor ... e onde se incluem todas as construções a vermelho claro, construções inalteradas pertencentes ao prédio dos antepossuidores e anteproprietários e que ora pertencem ao recorrente; 

Quinquagésimo quinto. O bem imóvel do recorrente, prédio misto, sito em Estação ..., freguesia ..., concelho ..., composto de casa de habitação com pátio, adega, currais e terreno com oliveiras, figueiras, pereiras, inscrito na matriz sob os artigos urbano ...61 e rústico ..., o qual do lado sul passou a confrontar com a parcela destacada por escritura doada à Ré, continua a incluir todas as construções que existiam aquando da aquisição por escritura pública de compra e venda realizada em 01 de Outubro de 1960 entre EE, casado com DD e FF, respetivos anteproprietários do referido bem!

 Quinquagésimo sexto. De facto, basta atentar na escritura pública de compra e venda realizada em 01 de Outubro de 1960 entre EE, casado com DD e GG. 93 a 95 do livro de notas para escrituras diversas nº 2B do Cartório Notarial ... a cargo do licenciado HH, que se mostra junta aos autos;

Quinquagésimo sétimo. Na verdade, conforme já referido nos autos, as áreas registadas enfermam de lapso manifesto, porquanto, da escritura pública de compra e venda realizada em 01 de Outubro de 1960 entre EE (sogro do Autor), e FF, pode ver-se que a área total do prédio é de doze mil e seiscentos metros quadrados;

Quinquagésimo oitavo. Daí que, o levantamento topográfico tenha aferido que atualmente o prédio misto da recorrente tenha ainda oito mil oitocentos e trinta e cinco metros quadrados;

Quinquagésimo nono. Ora, bem sabe a recorrida que a área descrita no registo não é a real, pois que as áreas antigamente levadas “a registo” eram muitas vezes medidas a passo, pelo que para os registos eram levadas áreas de terreno maioritariamente imprecisas e desfasadas- como é o caso;

Sexagésimo. Razão pela qual, aquando da doação de DD à recorrida, a mesma doou uma parcela rústica- unicamente- sem qualquer construção, anexo ou curral- como declarada e comprovadamente não consta qualquer construção urbana (de anexo, curral, aviário ou outra) da escritura pública de doação à recorrida;

Sexagésimo primeiro. Face ao exposto, é falso que do prédio da recorrida conste qualquer anexo/curral que tenha adquirido seja por doação e/ou a qualquer outro título;

Sexagésimo segundo. Da mesma forma inexiste qualquer sentença ou decisão judicial transitada em julgado a atribuir tal construção à ré!

Sexagésimo terceiro. De facto, o julgamento como improcedentes de tais pedidos vertidos na ação 751/08.... fez-se pelas regras do ónus da prova, não sendo a decisão final a de atribuir a propriedade à ré.

Sexagésimo quarto. E repita-se, em tal ação judicial o recorrente não foi parte, pois que a mesma foi muito anterior à sua aquisição, que só teve lugar em Janeiro de 2018;

Sexagésimo quinto. O recorrente instaurou a presente ação declarativa de condenação, na qualidade de legitimo proprietário do prédio misto em questão, peticionando que a recorrida reconheça o seu (dele!) direito de propriedade sobre o bem imóvel em questão;

Sexagésimo sexto. No referido prédio misto, existem várias edificações típicas das aldeias portuguesas cujos anteproprietários e antepossuidores dedicavam-se à atividade agropecuária.

Sexagésimo sétimo. Todas as edificações têm a mesma construção, foram construídas sensivelmente na mesma época e pelo mesmo proprietário, fazendo parte de um aglomerado urbanizado e destinado ao mesmo fim;

Sexagésimo oitavo. O autor, instaurou a ação alicerçada no facto de que aquilo que comprou não se mostra na prática aquilo que tem, pois que a sua descrição alude a “currais” e a recorrida ocupa-os.

Sexagésimo nove. Designadamente, ocupou aquela que se encontra situada a poente do seu prédio, ou seja, aquela que se encontra encortelhada entre o seu prédio e o outro onde é herdeira (herança ilíquida indivisa por óbito de II).

Setuagésimo. O recorrente, face a esta ocupação ilegítima, peticionou que a recorrida fosse condenada a desocupar a referida edificação que faz parte integrante do seu prédio e condenada a pagar-se uma indemnização pela abusiva ocupação e consequente privação do seu legitimo uso e fruição; Ademais pretende como efeito útil que lhe seja reconhecida a propriedade integral do seu bem, incluindo a edificação ocupada pela recorrida;

Setuagésimo primeiro. O recorrente pretende recuperar a edificação ocupada pela recorrida cuja propriedade lhe pertence e que se encontra devidamente registada na Conservatória de Registos Civil, Predial, Comercial e Automóveis ... sob o número 8591/20..., freguesia ..., presunção registral de titularidade constante do artigo 7º do Código de Registo Predial.

Setuagésimo segundo. Ademais, para o recorrente não existe qualquer controvérsia quanto à titularidade/confrontações e/ou quanto aos limites entre o seu prédio e o da recorrida que justificasse a instauração de uma ação de demarcação

Setuagésimo terceiro. Outrossim, nem se compreenderia que tal existisse no presente caso, dado que, o prédio da recorrida resulta de um destaque;

Setuagésimo quarto. E nunca a anterior autora DD em tal ação, que tramitou com o número de processo 536/15.... reconheceu qualquer integração e/ou propriedade da dita herança indivisa sobre as construções, barracões do prédio, portanto edificados a “nascente” do prédio da herança indivisa!

Setuagésimo quinto. E o prédio do recorrente, como supra se alegou e a recorrida admite, tem área superior à constante do registo predial;

Setuagésimo sexto. Pelo que, é falso que à área de 7761m2 antes descrita tenha que ser deduzida a área reconhecida na ação de demarcação “devendo o prédio do Autor ter apenas cerca de 4.752m2”

Setuagésimo sétimo. Mostra-se assim imperiosa a revogação da douta sentença proferida e ora recorrida pois a mesma não só não é justa como ainda padece dos supra apontados vícios, estando a reposição da legalidade manifestamente inquinada;

                                                           ****

Nestes Termos, contando com o douto e imprescindível suprimento de V. Exas deve o douto Tribunal da Relação e Coimbra, dar provimento ao presente recurso.
· E, consequentemente revogar-se douta sentença e prosseguirem os autos tendo em vista a produção de prova e ser proferida decisão que reconheça o seu direito de propriedade, a qual compreende a edificação ocupada pela recorrida e, por consequência, deve a mesma desocupá-la e proceder a devolução do seu legitimo proprietário;
· Bem como ser apreciada a ilicitude da ocupação e fruição bem como indemnização dos danos provados.

*****

                                                                                                                                     Destarte, interpõe-se recurso, visando a revogação de douta decisão recorrida, atento os vícios de que padece: errada subsunção jurídica, com preterição de realização de audiência de discussão e julgamento e produção de prova testemunhal bem como errónea apreciação da prova documental a redundar em injustiça e não conformidade a um Direito materialmente justo e processualmente conforme.”

Não foram apresentadas contra-alegações.

O recurso foi admitido.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

OBJETO DO RECURSO

Considerando as conclusões das alegações, as quais delimitam o objeto do recurso sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, a questão a decidir consiste em saber se verifica a exceção de caso julgado ou a autoridade de caso julgado.

FUNDAMENTOS

De facto

Na decisão recorrida foi fixada a seguinte matéria de facto:
A- Factos Provados

Encontram-se provados nos autos, e no que releva na presente sede, quer por documento (designadamente, escritura pública de doação de fls. 12 e seguintes, sentença de fls. 67 e seguintes, escritura pública de compra e venda de fls. 95 e seguintes, Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra junto com a contestação/reconvenção), quer por acordo das partes, os seguintes factos:
1) Em 30.01.2004, DD declarou doar a BB, e esta declarou aceitar, o seguinte imóvel: Prédio urbano, parcela de terreno para construção, com a área de oitocentos e oitenta e dois metros quadrados, sito na Estação ..., concelho ..., a confrontar: do norte com parcela A, DD (remanescente), do sul com estrada camarária, do nascente com caminho de ferro e do poente CC, inscrito na respectiva matriz sob o artigo ...93, a que atribuem o valor de dez mil euros, parcela esta a destacar do prédio misto, sito à Estação ..., freguesia ..., concelho ..., com a área de oito mil seiscentos e quarenta e três metros quadrados, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ..., onde se mostra o prédio registado a favor da doadora pela inscrição “G-Um” e inscrito na matriz urbana sob o artigo ...61 e na matriz rústica sob o artigo ...;
2) Na mesma data, declarou ainda DD que em virtude desta desanexação a parte remanescente do indicado prédio ficou com a composição e confrontação seguintes: - Misto, sito à Estação ..., freguesia ..., concelho ..., composto de casa de habitação com pátio, adega, currais e terreno com oliveiras, figueiras,  pereiras e vinha com a área total de sete mil setecentos e sessenta e um metros quadrados, inscrito na matriz sob os referidos artigos urbano ...61 e rústico ..., o qual do lado sul passou a confrontar com a parcela destacada, (…) doada a BB;
3) No âmbito do Processo n.º 751/08...., que correu os seus termos no extinto Tribunal Judicial ..., foi proferida sentença, em 07.01.2010, e na qual consta, entre o mais, o seguinte
a. (Relatório) DD instaurou a presente acção declarativa de condenação sob a forma de processo sumário contra BB, alegando, em síntese, que, doou à ré uma parcela de terreno para construção, destacada do prédio misto pertencente à autora, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...91...…) sob a contrapartida de a ré lhe prestar alimentos, companhia e assistência médica e hospitalar e na convicção de que tal condição estava expressamente prevista no documento que subscreveu. Invoca também a autora, como causa de pedir, que a ré não lhe tem prestado qualquer auxílio ou assistência e ainda que tem vindo a ocupar as dependências e construções existentes no prédio da autora, as quais não foram objecto da referida doação. Em consequência pede a autora que seja anulada a escritura de doação outorgada entre si e a ré e, subsidiariamente, que a ré seja condenada a desocupar as dependências cobertas do prédio da autora e a pagar a esta uma indemnização pelos prejuízos causados no valor de €10.000,00;
b. (Relatório) À cautela, apresentou ainda a ré defesa por impugnação, contraditando a versão dos factos apresentada pela autora, alegando nomeadamente que a escritura de doação não foi celebrada sob qualquer condição ou contrapartida e que o prédio objecto do negócio compreende a dependência nele implantada, destinada a arrumos e galinheiros;
c. (Questões a decidir) Quanto ao pedido formulado subsidiariamente, a questão está em conhecer os limites do prédio objecto do negócio, por forma a saber se as dependências cobertas nele existentes pertencem à autora ou à ré;
d. (Factos Provados) G -A ré tem vindo a ocupar um anexo implantado no prédio descrito em A, arrecadando nele diversos materiais;

e. (De Direito- Do objecto mediato da doação) A questão está, pois, em definir os limites do prédio objecto do contrato de doação, por forma a saber se aquele abrange ou não o anexo referido em G, o que nos permitirá determinar o titular da sua propriedade e, consequentemente, saber se a sua ocupação por parte da ré é ou não legítima.
Sem prejuízo do que resulta já, a este respeito, da decisão da matéria de facto, a resolução desta questão passará também por interpretar o teor das declarações constantes da escritura pública aludida em B e C, designadamente no que concerne à descrição da parcela doada, comparando-a com a descrição do prédio da autora, do qual aquele foi desanexado.
Ora, dos factos provados em B e C resulta que a autora declarou doar á ré uma parcela de terreno para construção com a área de 882 m2, a destacar do prédio misto, descrito em A. que é o prédio mãe e que em virtude dessa desanexação a parte remanescente do prédio ficou composto por casa de habitação com pátio, adega, currais e terreno com oliveiras, figueiras, pereiras e vinha, o que significa que deixaram de integrar a descrição inicial do prédio “os aviários” que dela constavam. Por outro lado, não tendo ficado provado que a parcela de terreno doada não incluía qualquer tipo de construção, não podemos concluir que o prédio da autora abrange o anexo aludido em G, sendo certo que era àquela que incumbia o ónus de demonstrar que a titularidade da propriedade do referido anexo lhe pertence.
Assim, não se encontram reunidos elementos bastantes para considerar que a autora é proprietária do anexo referido em G nem, consequentemente, que a ré faz dele uma ocupação ilegítima. O que conduz, também nesta parte, à improcedência do pedido subsidiário formulado pela autora.
f. (Decisão) Face ao exposto, julgo totalmente improcedente, por não provada, a presente acção e, em consequência, absolvo a Ré BB dos pedidos formulados pela autora;
4) Da sentença referida em 3) foi interposto recurso pela Autora DD, tendo sido proferido, em 21.12.2010, acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, que se pronuncia, entre o mais, nos seguintes termos:
a. (O direito- b) A desocupação do anexo) Para o caso de não proceder o pedido de anulabilidade da doação, pediu a recorrente a condenação da recorrida a desocupar uma dependência, alegando que a mesma a vem ocupando, apesar de a doação só abranger uma parcela de terreno, sem quaisquer dependências ou construções.
O pedido foi julgado improcedente, na perspectiva de se não ter provado o direito de propriedade da recorrente sobre o anexo ou dependência em causa.
Insiste a recorrente, na sua alegação de recurso, em que o anexo não foi descrito na escritura de doação, pelo que a recorrida o ocupa ilegitimamente.
Nesta parte, a demanda configura uma verdadeira acção de reivindicação, uma vez que
a recorrente afirma o seu direito de propriedade sobre coisa determinada e a sua detenção por parte da recorrida e conclui pela desocupação, o que vale o mesmo que restituição (artigo 1311.º).
               (…)
               Ora, basta ler os factos comprovados para se ver que a recorrente não fez prova de ser
dona do anexo ou dependência que a recorrida ocupa.
               O que resultou provado foi que a recorrente era dona de um prédio misto, composto
por casa de habitação com pátio, adefa, currais, aviários e terreno com várias árvores (…), que doou à recorrida uma parcela de terreno para construção, a destacar desse prédio (…), que, em virtude da desanexação, o prédio mãe passou a ser composto por casa de que resultou provado foi que a recorrente era dona de um prédio misto, composto por casa de habitação com pátio, adega, currais e terreno com árvores (…) e que a ré tem vindo a ocupar um anexo que estava implantado no prédio com a primitiva configuração (…).
               É certo, como alega a recorrente, que o anexo não consta, de forma expressa, da parcela
de terreno para construção objecto da doação.
Mas, se cotejarmos a descrição do original prédio mãe com a descrição posterior à desanexação da parcela doada, é sem esforço que constatamos uma substancial diferença: enquanto o primeiro inclui aviários, o segundo já os não contempla
O que significa, para um observador normalmente atento, que os mesmos deixaram de
fazer parte do prédio mãe para passarem a ficar englobados na parcela doada.
Diz agora, a recorrente que foi por lapso de escrita que o anexo ou dependência foi omitido do remanescente do prédio mãe. A afirmação é absolutamente gratuita, uma vez que isso não foi oportunamente alegado, ficando, como tal, por demonstrar.
Como quer que seja, a recorrente não logrou provar que o anexo ou dependência faz parte, ainda, do que lhe sobejou do prédio mãe, pelo que falece o primeiro e essencial pressuposto em que assenta a acção de reivindicação: a propriedade da coisa reivindicada.
Em conclusão, improcede este segmento do recurso.;
b. (Decisão) Nos termos expostos, acorda-se em julgar a apelação improcedente e, por via de consequência, em confirmar a sentença recorrida
5) Em 10.01.2018, DD declarou vender a AA, e este declarou comprar, o seguinte imóvel: prédio misto, composto de casa de habitação com pátio, adega, currais e terreno com oliveiras, figueiras, pereiras e vinha, sito em Estação ..., da freguesia ..., do concelho ..., descrito na Conservatória dos Registos Civil, Predial, Comercial e Automóveis ..., sob o número .../..., da dita freguesia, registado a seu favor pela Apresentação ..., inscrito na respectiva matriz rústica sob o artigo ..., com o valor patrimonial de €214,25 e para efeitos de IMT de 6.364,03 e na respetiva matriz urbana sob o artigo ...61, com o valor patrimonial de €61.754,03.
B- Factos Não Provados
Inexistem factos não provados com relevo para a presente decisão

De Direito
Na decisão recorrida entendeu-se que “por força da autoridade de caso julgado, que abarcou a matéria atinente à propriedade da dependência curral/aviário ocupado pela Ré, impõe-se que se aceite a decisão transitada em julgado no âmbito do proc. 751/08...., na medida em que o núcleo fulcral das questões de facto ali apreciadas e decididas são as mesmas que o Autor pretende ver apreciada e discutida (nomeadamente, a amplitude da parcela doada à Ré por DD e se a mesma abrange a construção designada por “curral” ou “aviário” e que já se encontrava ocupada pela Ré aquando da propositura de tal acção).
Há, pois uma relação de prejudicialidade dessa matéria com os termos subsequentes desta acção. De outro modo, a decisão proferida no processo nº 751/08...., abrangendo os fundamentos de facto e de direito que lhe dão sustento, seria posta em causa, de novo apreciada e decidida de modo diverso neste processo.
Ora, como flui do que se deixou explanado, é precisamente isso que a autoridade do caso julgado visa obstar, relembrando-se que, para a sua verificação, não é exigível que haja plena identidade entre as partes, causa de pedir e pedidos.
O pedido que afecte a autoridade de caso julgado é sancionado processualmente como excepção dilatória de conhecimento oficioso, tendo sido inclusive invocada pela Ré, e sobre a qual o Autor teve oportunidade de se pronunciar, implicando a absolvição da Ré da instância (cf. art.º 278º, al. e), 576º, nº 2, 577º, al. i), 578º e 580º, todos do Código de Processo Civil).
Ainda que se equacionasse determinar o prosseguimento dos autos quanto aos pedidos que extravasam a referida reivindicação e restituição, compulsados os autos, em especial os articulados apresentados pelo Autor que refletcem a relação material controvertida na sua óptica, retira-se que os mesmos s encontram irremediavelmente relacionados coma factualidade aduzida relativa aos demais pedidos pelo que não se demonstra possível tal determinação, sem prejuízo da propositura de outra ação, pelo Autor, relativamente ao demais peticionado.”
“Doutrina e jurisprudência, são unânimes em reconhecer que o caso julgado material pode funcionar, em teoria, como exceção ou como autoridade.
A exceção de caso julgado implica uma não decisão sobre a nova ação e pressupõe uma total identidade entre as duas. A autoridade do caso julgado implica uma aceitação de uma decisão proferida numa ação anterior, decisão que se insere, quanto ao seu objeto, no objeto da segunda ação, enquanto questão prejudicial”[1] .
Nas palavras de MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA, “os efeitos do caso julgado material projectam-se em processo subsequente necessariamente como autoridade do caso julgado material, em que o conteúdo da decisão anterior constitui uma vinculação à decisão de distinto objecto posterior, ou como exceção de caso julgado, em que a existência da decisão anterior constitui impedimento à decisão do idêntico objeto posterior”[2] .
O caso julgado é uma (verdadeira) excepção dilatória (cfr. art.º 577º, al. i) do CPC), cujo objectivo é evitar a reprodução ou contradição de uma dada decisão transitada em julgado (cfr. n° 2 do art.º 580 do CPC).
E, como é sabido, constitui pressuposto formal básico da excepção do caso julgado a chamada tríplice identidade entre as causas - relativamente aos sujeitos, ao pedido (efeito jurídico visado) e à causa de pedir (facto jurídico fundamento) - como vem referido no art.º 581º do CPC.
Já diferentemente se passam as coisas, porém, na referida figura da autoridade do caso julgado.
Nas palavras do Acórdão do STJ, de 28-03-2019[3] :
“(…) [A] autoridade do caso julgado não depende da verificação integral ou completa da tríplice identidade prescrita no artigo 581.º do CPC, mormente no plano do pedido e da causa de pedir. Já no respeitante à identidade de sujeitos, esse efeito de caso julgado só vinculará quem tenha sido parte na respetiva ação ou quem, não sendo parte, se encontre legalmente abrangido por via da sua eficácia direta ou reflexa, consoante os casos (…)».
A verificação da exceção de caso julgado é mais exigente em termos de pressupostos, dependendo da tríplice identidade prevista no art.º 581º do CPC. A autoridade do caso julgado apenas pressupõe a identidade subjetiva nas duas ações: os pedidos e as causas de pedir podem ser diferentes.
Sustenta o recorrente que não tendo a decisão recorrida alicerçado a decisão na autoridade de caso julgado não pode haver fundamento para a procedência da excepção em razão da inexistência de identidade de partes nem de pedidos.
Na contestação a ré invocou a exceção de caso julgado, prevista nos artigos 580º e 581º do CPC, pugnando, pela sua absolvição da instância.
A decisão recorrida depois de apreciar ao longo de várias páginas a autoridade de caso julgado, e concluir pela procedência desta exceção, acaba por fazer constar do dispositivo que “Face ao exposto, julga-se procedente a excepção dilatória de caso julgado, absolvendo-se a Ré da instância”.
A verificar-se uma tal exceção, ela não é dilatória, importando a absolvição do réu da instância, mas perentória, importando a absolvição do réu do pedido.
Invocada a exceção de caso julgado, o tribunal não está impedido de, sendo caso disso, decidir pela verificação da autoridade do caso julgado, figura que entronca na mesma razão de ser da que foi invocada e que não pode considerar-se estranha em relação a esta, representante uma solução perfeitamente plausível (ante a possibilidade de não se demonstrarem todos os requisitos da exceção).
Por conseguinte, mesmo em caso de invocação de verificação da exceção dilatória de caso julgado, não estaria este tribunal ad quem impedido de, sendo disso o caso, decidir pela verificação da autoridade do caso julgado enquanto exceção perentória, e concluir pela absolvição da ré do pedido.
O que a Senhora Juíza a quo não podia ter feito era, com fundamento na autoridade do caso julgado, absolver a ré da instância a julgar verificada tal exceção, que é perentória, impunha-se que a absolvesse do pedido[4].
Em suma, ao entender-se que se verifica a exceção (de autoridade) de caso julgado e ao decidir-se a final pela procedência da exceção dilatória de caso julgado, absolvendo-se a ré da instância, verifica-se na decisão recorrida um evidente equívoco entre a figura da exceção dilatória de caso julgado anterior e a figura da autoridade do caso julgado, cujo efeito preclusivo é em tudo similar ao de uma exceção perentória impeditiva subsumível ao conceito vertido no nº 3 do art.º 576º do CPC[5].
No caso de se tratar efetivamente de uma situação de autoridade de caso julgado, por se tratar de um erro de qualificação jurídica, poderia este tribunal de recurso supri-lo, e como tal, em vez de absolver a ré da instância, como fez o tribunal a quo, absolvê-la do pedido, como aquele tribunal deveria ter feito, se na realidade se verificasse a situação de autoridade de caso julgado[6].
Advoga a recorrente que não existe caso julgado porque trata-se de uma decisão negativa, que absolveu a ré dos pedidos, não tendo tomado nenhuma decisão de reconhecimento ou de constituição de direitos.
Conforme se refere no Ac. desta Relação[7], A expressão “caso julgado” é uma forma sincopada de dizer “caso que foi julgado”, ou seja, caso que foi objeto de um pronunciamento judicativo, pelo que, em sentido jurídico, tanto é caso julgado a sentença que reconheça um direito, como a que o nega, tanto constitui caso julgado a sentença que condena como aquela que absolve”.
Já CASTRO MENDES entende que “As decisões de procedência quanto ao pedido terão sempre força de caso julgado absoluto. Já as decisões de improcedência terão valor relativo: aquela decisão de que determinada pretensão não procede, apenas significa que a pretensão improcede porque não pode ser fundamentada naquela causa de pedir. Se fundamentada em outra poderá ser procedente[8].
Sustenta o recorrente que não há identidade de partes, já que o recorrente não foi parte naquela ação.
No processo nº 751/08...., a autora é DD e a ré BB e na presente ação, o autor é AA e a ré é BB.
A sentença foi proferida em 7-01-2010, tendo sido proferido acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra em 21-12-2010.
O autor adquiriu o imóvel em causa nos presentes autos em 20.01.2018
Nos termos do nº 2 do art.º 581º do CPC “há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas do ponto de vista da sua qualidade jurídica”.
“Para a identidade de sujeitos a lei não exige a presença das mesmas e concretas pessoas físicas ou jurídicas nas suas causas, mas antes releva a sua qualidade jurídica na relação material controvertida, de modo a abranger nomeadamente, os transmissários ou sucessores do direito ou bem litigioso, e de modo a ser irrelevante a concreta posição processual ocupada pelos sujeitos das duas causas- se autor, réu, requerido ou requerente.
A abrangência de transmissários ou sucessores no direito ou bem litigioso significa que o caso julgado pode ser oposto ao cessionário, herdeiro ou adquirente do direito”[9].
No caso em apreço, dado que o autor AA adquiriu a DD o imóvel que está em causa nos presentes autos, as partes são as mesmas do ponto de vista da sua qualidade jurídica (art.º 581-2, do CPC).
Alega ainda o recorrente que não há identidade de objeto.
No processo nº 751/08...., foram formulados os seguintes pedidos:
a) Que seja anulada a escritura de doação outorgada entre si e a ré
b) E, subsidiariamente, que a ré seja condenada a desocupar as dependências cobertas do prédio da autora e a pagar a esta uma indemnização pelos prejuízos causados no valor de €10.000,00.
Na presente ação foram formulados os seguintes pedidos:
a) Reconhecer o A. como legítimo dono e possuidor do prédio misto sito à Estação ..., composto por casa de habitação com pátio, Adega, currais e terreno com oliveiras, figueiras, pereiras e vinha com área de 7761m2, a confrontar do norte, com serventia pública, do sul com BB, do nascente com caminho de ferro e do poente com CC, inscrito na matriz predial respetiva sob os artigos ... e ...-1, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...91, e aí, inscrito a favor do A.;
b) Reconhecer-se que a linha divisória entre o prédio da ré composto de parcela de terreno para construção descrito sob o nº ...70 da freguesia ... com o prédio misto do A., com a descrição nº ...91 da mesma freguesia ..., é constituído pelos segmentos de recta no alinhamento da parede das edificações de “currais” a poente e a sul e do muro divisório a nascente do prédio do A., não extravasando a área d 882m2, desobstruindo ou desimpedindo as vistas e os acessos ou aberturas existentes nas construções do A., em respeito pelas construções existentes no prédio do A. e seus antepossuidores, passada, presente ou futura, respeitando o afastamento mínimo legal de 1,50m às construções divisórias de muro e paredes do prédio do A;
c) Desocupar a edificação de “currais” existente no imite poente do prédio do A. e a demolir toda e qualquer obra edificada ilegal, não autorizada ou consentida pelo A. e seus ante possuidores e não licenciada pela câmara ou que nele viole as disposições legais do art.º 1360º, nº 1 (afastamento mínimo legal das novas construções) e do art.º 1362º, nº 2 e 1365º, nº 2 do Código Civil, atenta a servidão de vistas e de estilicídio constituída por usucapião das edificações existentes no prédio do A., e as normas de protecção da salubridade, estética iluminação natural e de segurança da construção civil (art.º 73º, 74º, 15º, 16º e 121º do RGEU e/ou que não respeita ou constitua a violação dos legítimos interesses e direito de propriedade do A. e seus antepossuidores ou que com eles contenda, lese ou prejudique, anule, diminua ou afecte as funções e utilização anteriormente efetuada pelo A. e seus antepossuidores, atenta a aquisição originária e por usucapião e da constituição de servidão de visitas e estilicídio; 
d) Pagar, a título de danos patrimoniais causados e decorrente da ocupação ilegítima e abusiva da construção de currais a poente pertencente ao A., a quantia global de 30.000,00€, e da ilegalidade e violação das legis artis nas construções da R., que atentam contra o direito de propriedade do A., prejudicam e violam a estética, segurança e salubridade das edificações existentes de muros de alvenaria e da edificação do anexo, que são ressarcíveis, a quantia global de 6.000€ (seis mil euros), a que acrescem os juros que se vencerem até integral pagamento; e
-Fundamentou os pedidos, formulados no proc. 751/08...., alegando em síntese que, doou à ré uma parcela de terreno para construção, destacada do prédio misto pertencente à autora, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...91.....) sob a contrapartida de a ré lhe prestar alimentos, companhia e assistência médica e hospitalar e na convicção de que tal condição estava expressamente prevista no documento que subscreveu. Invoca também a autora, como causa de pedir, que a ré não lhe tem prestado qualquer auxílio ou assistência e ainda que tem vindo a ocupar as dependências e construções existentes no prédio da autora, as quais não foram objeto da referida doação.
Nesse processo foi proferida sentença de cuja parte dispositiva consta o seguinte:
“Julgo totalmente improcedente, por não provada, a presente ação e, em consequência, absolvo a ré BB dos pedidos formulados pela autora.”
-Desta sentença foi interposto recurso pela autora DD, tendo sido proferido em 21.12.2010, acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra que julgou a apelação improcedente e, em consequência, confirmou a sentença recorrida.
Em sede de fundamentação consta daquela sentença:
“A questão está, pois, em definir os limites do prédio objeto do contrato de doação, por forma a saber se aquele abrange ou não o anexo referido em G, o que nos permitirá determinar o titular da sua propriedade e, consequentemente, saber se a sua ocupação por parte da ré é ou não legítima.
Sem prejuízo do que resulte já, a este respeito da decisão da matéria de facto, a resolução desta questão passará também por interpretar o teor das declarações constantes da escritura pública aludida em B e C, designadamente no que concerne à descrição da parcela doada, comparando-a com a descrição do prédio da autora, da qual aquele foi desanexado.
Ora, dos factos provados em B e C resulta que a autora declarou doar à ré uma parcela de terreno para construção com a área de 882m2, a destacar do prédio misto, descrito em A.. que é o prédio mãe- e que em virtude essa desanexação a parte remanescente do prédio ficou composta por casa de habitação com pátio, adega, currais e terreno com oliveiras, figueiras, pereiras e vinha, o que significa que deixaram de integrar a descrição inicial do prédio, os “aviários” que dela constavam. Por outro lado, não tendo ficado provado que a parcela de terreno doada não incluía qualquer tipo de construção, não podemos concluir que o prédio abrange o anexo aludido em G, sendo certo que era àquela que incumbia o ónus de demonstrar que a titularidade da propriedade do referido anexo lhe pertence.
Assim, não se encontram reunidos elementos bastantes para considerar que a autora é proprietária do anexo referido em G nem, consequentemente, que a ré faz dele uma ocupação ilegítima. O que conduz, também nesta parte, à improcedência do pedido subsidiário formulado pela autora.”
Em sede de fundamentação de direito consta daquele acórdão:
“Para o caso de não proceder o pedido de anulabilidade da doação, pediu a recorrente a condenação da recorrida a desocupar uma dependência, alegando que a mesma vem ocupando, apesar de a doação só abranger uma parcela de terreno, sem quaisquer dependências ou construções.
O pedido foi julgado improcedente, na perspectiva de se não ter provado o direito de propriedade da recorrente sobre o anexo ou dependência em causa.
Insiste a recorrente, na sua alegação de recurso, em que o anexo não foi descrito na escritura de doação, pelo que a recorrida o ocupa ilegitimamente.
Nesta parte, a demanda configura uma verdadeira ação de reivindicação, uma vez que a recorrente afirma o seu direito de propriedade sobre coisa determinada e a sua detenção por parte da recorrida e conclui pela desocupação, o que vale o mesmo que restituição (artigo 1311º).
(…)
Ora, basta ler os factos comprovados para se ver que o recorrente não fez prova de ser dona do anexo ou dependência que a recorrida ocupa.
O que resultou provado foi que a recorrente era dona de um prédio misto, composto por casa de habitação, com pátio, adega, currais, aviários e terreno com várias árvores (…), que doou à recorrida uma parcela de terreno para construção, a destacar desse prédio (…), que, em virtude da desanexação, o prédio mãe passou a ser composto por casa de habitação com pátio, adega, currais e terrenos com árvores (…) e que a ré tem vindo a ocupar um anexo que estava implantado no prédio com a primitiva configuração (…).
É certo, como alega a recorrente, que o anexo não consta, de forma expressa, da parcela de terreno para construção objecto da doação.
Mas, se cotejarmos a descrição do original prédio mãe com a descrição posterior à desanexação da parcela doada, é sem esforço que constatamos uma substancial diferença: enquanto o primeiro inclui aviários, o segundo já os não contempla.
O que significa, ara um observador normalmente atento, que os mesmos deixaram de fazer parte do prédio mãe para passarem a ficar englobados na parcela doada.
Diz, agora a recorrente que foi por lapso de escrita que o anexo ou dependência foi omitido do remanescente do prédio mãe. A afirmação é absolutamente gratuita, uma vez que isso não foi oportunamente alegado, ficando, como tal, por demonstrar.
Como quer que seja, a recorrente não logrou provar que o anexo ou dependência faz parte, ainda, do que lhe sobejou do prédio mãe, pelo que falece o primeiro e essencial pressuposto em que assenta a ação de reivindicação: a propriedade da coisa reivindicada.
Em conclusão, improcede este segmento do recurso.”
O autor fundamentou os pedidos formulados na presente ação, alegando em síntese que adquiriu um prédio a DD e que a ré, em 19-01-2018, sendo proprietário, em virtude de uma doação realizada por DD, em 30-01-2004, de um prédio confinante (parcela de terreno destacada), se encontra a ocupar uma edificação pertencente ao seu prédio, tendo construído umas placas de betão que tapam a abertura de edificação de “curral/aviário” propriedade do A. Mais referiu que essas edificações impedem o escoamento natural, e permitem a entrada das águas pluviais, gelo, humidades e outros detritos da própria construção, folhas, ramos, que tapam a visibilidade à edificação (anexo) do A., reduzindo a iluminação natural e as vistas. A ré encontra-se assim a ocupar o anexo do curral que pertence ao autor, em virtude de não ter sido objeto da referida doação.

               Perante isto, entendemos que na presente ação não está em causa o anexo que a ré utiliza para arrecadar nele diversos materiais, como aconteceu no proc. 751/08...., mas sim o reconhecimento do direito de propriedade do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº ...91, e aí inscrito a favor do autor; da linha divisória entre os prédios do autor e da ré; a desocupação de currais existente no limite poente do prédio do A.; a demolição de obras e indemnizações.

               Não se verifica assim identidade dos pedidos, entendida esta quando numa causa de pretende obter o mesmo efeito jurídico (art.º 581º-3, do CPC).

               Por sua vez, no que respeita à causa de pedir, dúvidas não restam dúvidas que estamos perante causas de pedir diferentes, dado que as mesmas procedem de factos jurídicos diferentes (art.º 581º-4, do CPC).

               A autoridade do caso julgado produzida pela decisão proferida no proc. 751/08.... não é extensível à presente ação; ou seja, a autoridade do caso julgado da decisão de mérito proferida naquele processo não é incompatível com o objeto a decidir na presente ação, o seu alcance não se repercute no mérito desta ação.

Não ocorre assim, a exceção dilatória de caso julgado, como também não ocorre a exceção perentória de autoridade de caso julgado.

                                                                                         x
As custas deste recurso ficam a cargo da apelada- artigo 527º do CPC[10].

(…).

DECISÃO

Com fundamento no atrás exposto, acorda-se em julgar procedente a apelação, revogando-se, em consequência, a decisão proferida, determinando-se que os autos prossigam seus termos.

Custas a cargo da apelada.

                                                                                                       Coimbra, 26 de abril de 2022

Mário Rodrigues da Silva- relator

Cristina Neves- adjunta

Teresa Albuquerque- adjunta

Texto redigido com aplicação da grafia do (novo) Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, respeitando-se, no entanto, em caso de transcrição, a grafia do texto original                                                                




([1]) MARIANA FRANCA GOUVEIA, A Causa de Pedir na Ação Declarativa, Almedina, p. 394.
([2]) O Objeto da Sentença e o Caso Julgado Material (O Estudo sobre a Funcionalidade Processual, 1983, p. 168.
([3]) Ac. do STJ, de 28.03.2019, Proc. 6659/08.3TBCSC.L1.S1, relator TOMÉ GOMES, www.dgsi.pt.

([4]) Ac. do TRL, de 21-12-2021, proc. 131/21.3T8PDL.L1-7, relator JOSÉ CAPACETE, www.dgsi.pt.
([5]) Ac. do TRL, de 21-12-2021, já citado.
([6]) Ac. do STJ, de 28.03.2019, proc. 6659/08.3TBCSC.L1.S1, relator TOMÉ GOMES, www.dgsi.pt.
([7]) De 12-12-2017, proc. 3435/16.3T8VIS-A.C1, relator ISAIAS PÁDUA, www.dgsi.pt.

([8]) Limites Objectivos de Caso Julgado em Processo Civil, 1968, p. 161.
([9]) RUI PINTO, Código de Processo Civil, Vol. I, Almedina, p. 80.
([10]) SALVADOR DA COSTA, Responsabilidade pelas custas no recurso julgado procedente sem contra-alegação do recorrido, https://drive.google.com/file/d/1AUCq7fmuDEcJjTOH7adY2whdoybrxrEY/view.