Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | ORLANDO GONÇALVES | ||
Descritores: | ESCUTA TELEFÓNICA PROVAS | ||
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Data do Acordão: | 02/29/2012 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | 3.º JUÍZO DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE CASTELO BRANCO | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | RECURSO CRIMINAL | ||
Decisão: | ALTERADA | ||
Legislação Nacional: | ARTIGOS 125º, 127º, 188º, 355º NºS 1 E 2 E 357º CPP | ||
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Sumário: | 1.- As escutas telefónicas são um meio de obtenção da prova, isto é, um meio de investigação para demonstração do thema probandi; 2.- As gravações das escutas telefónicas, realizadas na sequência de autorização judicial face a suspeitas fundadas de crimes de tráfico de estupefacientes, mandadas transcrever pela autoridade judiciária competente em auto e juntas ao processo, são um meio de prova documental a valorar pelo Tribunal de acordo com o princípio da livre apreciação da prova previsto no art.º 127.º do Código de Processo Penal; 3.- Daí que as transcrições das escutas telefónicas não constituam declarações dos arguidos prestadas em inquérito, sujeitas ao disposto no art.357.º do C.P.P. – norma específica dirigida às declarações prestadas pelos arguido -, mas sim prova documental, que vale em audiência de julgamento, mesmo que aí não se tenha procedido à sua leitura. | ||
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Decisão Texto Integral: | Pelo 3.º Juízo, do Tribunal Judicial da Comarca de Castelo Branco, sob acusação do Ministério Público, foram submetidos a julgamento em processo comum, com intervenção do Tribunal Colectivo, os arguidos
A..., solteiro, desempregado, e residente no … , Castelo Branco; B..., solteiro, estudante, e residente em … , Castelo Branco; C..., solteiro, servente, e residente na … , Covilhã; e D..., solteiro, serralheiro, e residente em … , Castelo Branco; imputando-se-lhe a prática de factos pelos quais teriam cometido: - o arguido A..., em concurso efectivo, um crime de tráfico de produtos estupefacientes p. e p. pelo artigo 21.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 15/93, de 22 de Janeiro; um crime de detenção de arma e munições proibidas p. e p. art. 86.°, n. º 1 , al c) e d) em conjugação com o artigo 3.°, n.º 6, da Lei n.° 5/2006, na redacção da Lei n.° 17/2009, de 6 de Maio; um crime de receptação p. e p. pelo art. 231.°, n.° 1 do Código Penal; um crime de detenção de arma e munições proibidas, previsto e punido pelo art. 86.°, n.° 1, al) c) e d), com referência ao artigo 3.°, n°. 1 e 4 al. a), e uma contra-ordenação, p. e p. no artigo 97.°, todos da Lei 5/2006 de 23 de Fevereiro, com a redacção que lhe foi introduzida pela Lei 17/2009 de 6 de Maio. - o arguido B..., em concurso efectivo, um crime de tráfico de produtos estupefacientes, p. e p. pelo artigo 21.°, n.° 1, do Decreto-Lei n° 15/93, de 22 de Janeiro; e um crime de detenção de arma e munições proibidas, p. e p, nos arts. 2.°, n.º 3, 3.°, al .e) e 86.°, n.º l , al. d), da Lei 5/2006, de 23 de Fevereiro, com a redacção que lhe foi introduzida pela Lei 17/2009 de 6 de Maio; e - os arguidos C... e D..., cada um deles, um crime de tráfico de produtos estupefacientes de menor gravidade p. e p. no artigo 25.° al. a) do Decreto-Lei n.° 15/93, de 22 de Janeiro.
Realizada a audiência de julgamento – no decurso da qual se procedeu uma comunicação de alteração não substancial da factualidade descrita em sede de acusação pública, em termos de facto e de qualificação jurídica – o Tribunal Colectivo, por acórdão proferido a 29 de Abril de 2011, decidiu julgar parcialmente procedente, por provada, a acusação pública e, em consequência: - Absolver o arguido A... da prática de um crime de detenção de arma e munições proibidas p. e p. art. 86°, n º 1 , al c) e d) em conjugação com o artigo 3°, nº6, da Lei n° 5/2006, na redacção da Lei n° 17/2009, de 6 de Maio; de um crime de receptação p. e p. pelo art. 231°, n° 1 do Código Penal; - Condenar o arguido A... pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelos arts. 21.°, n.° 1, e 24.º, j), ambos do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, com referência à tabela I-C anexa ao referido diploma, na pena de 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de prisão; - Condenar o arguido A... pela prática de um crime de detenção de arma e munições proibidas p. e p. art. 86.°, n.º 1 , al c) e d), em conjugação com os artigos 2.º, n.º 3 e 3.°, nºs 1 e 4 a), da Lei n.° 5/2006, na redacção da Lei n° 17/2009, de 6 de Maio, na pena de 2 anos de prisão; - Condenar o arguido A... pela prática de uma contra-ordenação, p. e p. pelo art. 97º, da Lei n.° 5/2006, na redacção da Lei n.º 17/2009, de 6 de Maio, na coima de € 700, 00; - operar o cúmulo jurídico destas penas e condenar o arguido A... , nos termos do art. 77º, do C.Penal, na pena única de 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de prisão, a que acresce a coima de € 700, 00 (setecentos euros). - condenar o arguido B..., pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelos arts. 21.°, n.° 1, e 24.º, j), ambos do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, com referência à tabela I-C anexa ao referido diploma, na pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão; - condenar o arguido B..., pela prática de um crime de detenção de arma e munições proibidas p. e p. art. 86°, n º 1 , al. d), em conjugação com os artigos 2º, n.º 3 e 3°, nº 2, e), da Lei n.° 5/2006, na redacção da Lei n° 17/2009, de 6 de Maio, na pena de 10 meses de prisão; - operar o cumulo jurídico destas penas e, nos termos do art. 77º, do C.Penal, condenar o arguido B... na pena única de 6 (seis) anos de prisão. - condenar o arguido C..., pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, previsto e punido pelo art. ° 25°, a), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, com referência à tabela I-C anexa ao referido diploma, na pena de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de prisão, cuja execução se substituiu por prestação de trabalho a favor da comunidade, pelo período de 480 (quatrocentas e oitenta) horas; e -condenar o arguido D..., pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, previsto e punido pelo art. ° 25°, a), do Decreto-Lei n. 15/93, de 22 de Janeiro, com referência à tabela I-C anexa ao referido diploma, na pena de 6 (seis) meses de prisão, cuja execução se substituiu por prestação de trabalho a favor da comunidade, pelo período de 180 (quatrocentas e oitenta) horas.
Inconformado com o douto acórdão dele interpôs recurso o arguido D..., concluindo a sua motivação do modo seguinte: l.º O arguido foi condenado nos presentes autos por um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade na pena de seis meses prisão substituída por prestação de 480 horas (condenação por extenso constante do acórdão, visto que em numerário daria 180h.) de trabalho a favor da comunidade, desconhecendo-se qual a real pena aplicada. 2.º Considerou o tribunal “a quo” que as escutas telefónicas foram devidamente autorizadas e a sua gravação consignada em auto. Constituindo meio de prova autónomo relativamente às declarações do arguido, pelo que as transcrições foram valoradas segundo o princípio da livre apreciação da prova, violando os arts.356.º,357.º e 125.º do CPP. 3.º A intercepção e gravação de conversações telefónicas não constituem, no sentido técnico, meios de prova, através exclusivamente do conteúdo de uma conversação interceptada, e sem a concorrência dos adequados meios de prova sobre os factos, não se poderá considerar directamente provado um determinado facto, que não seja a mera existência e o conteúdo da própria conversação. 4.º No caso dos autos foram interceptadas conversas telefónicas mantidas aos telemóveis pertencentes aos arguidos, A...e D…, e que vieram a dar lugar às transcrições juntas, por apenso, aos autos dessa escutas telefónicas e na dimensão das transcrições das intercepções realizadas foram contraditadas pelos arguidos e das mesmas não resulta qualquer negociação acerca de tráfico de estupefacientes. 5.º Impugna da matéria de facto dada como provada em 18.º, 19.º e 24.º dos factos provados do acórdão recorrido, a qual deve ser considerada não provada, por a mesma se alicerçar exclusivamente nas escutas telefónicas, pelo menos, no que diz respeito ao recorrente. 6.º O Recorrente não é nenhum traficante, na verdadeira acepção da palavra, o produto estupefaciente trata-se de uma droga “leve” daí que a pena aplicada se situa muito acima do limite mínimo aplicável tendo em conta o pequeno grau de culpa, as poucas exigências de prevenção face ao arguido, o qual está integrado na sociedade, é pessoa educada, trabalhadora e honesta. Podendo ter sido suspensa a execução da pena sem mais. Nestes termos, requer a V.Exªs. se dignem considerar procedente e provado o recurso, e em consequência absolver-se o arguido; subsidiariamente, caso seja improcedente o recurso reduzir-se a pena aplicada ao arguido.
O Ministério Público na Comarca de Castelo Branco respondeu aos recurso interposto pelos arguido D... pugnando pela manutenção da decisão recorrida.
A Ex.ma Procuradora-geral adjunta neste Tribunal da Relação emitiu parecer no sentido da parcial procedência do recurso do arguido D..., na parte relativa à pena de substituição.
Foi dado cumprimento ao disposto no art.417.º, n.º2 do Código de Processo Penal.
Colhidos os vistos, cumpre decidir.
Fundamentação
A matéria de facto apurada e respectiva motivação constante do acórdão recorrido é a seguinte: Factos provados ( Da acusação pública integrada pela alteração não substancial oportunamente comunicada) 1º O arguido A..., também conhecido por ..., pelo menos durante o ano de 2010, até à data da sua detenção, a 4 de Julho desse ano, dedicou-se à prática da cedência, mediante contrapartida monetária, pelo menos haxixe e pólen de haxixe, na cidade de Castelo Branco, retirando desta actividade, pelo menos parte dos seus rendimentos. 6º O arguido C…, no dia 30 de Agosto de 2009, cerca das 21H00, no Largo da Sé em Castelo Branco, vendeu a ... e ... um produto com o peso líquido de 7, 880 g que o exame laboratorial veio a identificar como canabis resina. Por, no mínimo três vezes, desde 2007 até 30 de Agosto de 2009, o arguido C... vendeu a … cannabis resina, a €20, 00 de cada vez. No dia 9 de Setembro de 2009, no Arrabalde dos Oleiros, n.º 18, em Castelo Branco, no quarto existente no 1º piso, foram apreendidos: uma ( 1 ) nota de 50 Euros, seis ( 6 ) notas de 20 Euros, uma ( 1 ) nota de dez Euros, vinte ( 20 ) notas de 5 Euros, uma ( 1 ) moeda de 2 Euros, uma ( 1 ) moeda de 50 cêntimos, cinco ( 5 ) moedas de 20 cêntimos, sete ( 7 ) moedas de 10 cêntimos, quatro ( 4 ) moedas de 5 cêntimos, uma ( 1 ) moeda de 2 cêntimos, quatro ( 4) moedas de 1 cêntimo, três (3) cofres metálicos, um de cor verde, outro de cor azul e outro de cor vermelha; uma (1) tesoura com cabo em plástico, de cor preta; uma (1) pulseira de metal branco; duas (2) medalhas de metal com a inscrição 50 CENT; uma (1) faca em metal com 14 cm de lâmina; um (1) relógio, marca RIDO; uma (1) navalha com cabo azul, de 6.5 cm de lâmina; uma (1) navalha de cabo em metal, de 7 cm de lâmina: um (1) alicate de pequenas dimensões em metal; um (1) gorro de cor preta (passa montanhas); três (3) cachimbos para fumar droga: um (1) telemóvel, marca SAMSUNG, modelo SGHE250, com o EMEI 353153101/499090/7, de cor preta, sem tampa uma (1) antena exterior para TV, marca GREENTEK; um (1) monitor LCD "ACER", modelo X 193WA; uma (1) camisa de cor azul, com a inscrição " SAFIRA SERVIÇOS"; uma máquina fotográfica marca 'Poloroid' - mod 210 ,cinco carregadores de telemóvel, 1 telemóvel "Samsung - mod. SGH - M61 O, 1 telemóvel Nokia mod: 3100 imei 355357/00651490/0, 1 telemóvel marca Nokia modelo 6630 imei 3597733/00/50062415 e um cinzeiro em metal contendo no seu interior 0, 34gr. de um produto indeterminado. No dia 30 de Setembro de 2009, o arguido C...tinha na sua posse canabis resina com o peso líquido de 0, 670 gramas. 7º No dia 9 de Setembro de 2009, foi apreendido no exterior do n.º 3, do Bairro Grilo Pombal, em Castelo Branco: - um caderno com capa verde, composto com folhas pautadas, contendo várias anotações referentes a nomes e numerários; -uma arma de fogo, tipo caçadeira, com dois canos sobrepostos, calibre 12, marca F. Sarpiugarte Flgoibar, com o número de série F.S. 64974, pertença de … ; - trinta cartuchos próprios para caça calibre 12; 9º O arguido A...desenvolveu, de forma reiterada, a actividade de cedência de haxixe e pólen de haxixe, mediante contrapartida monetária, desde, pelo menos, inícios de 2010, até 4 de Julho do mesmo ano, abastecendo-se do produto estupefaciente designadamente em Espanha. 10º Conforme ocorreu, designadamente, no dia 28 de Março de 2010, conduzindo o arguido A... uma viatura e, ao mesmo tempo, usando igual percurso, outro indivíduo conduzia outra viatura, por forma a avisar aquele da presença das autoridades policiais. 11º Na posse de haxixe e pólen de haxixe, em 2010 e até 4 de Julho desse ano, o arguido A...procedeu à sua venda directa a vários indivíduos, alguns deles consumidores de produtos estupefacientes, por um preço global não inferior a €2 595, 00, estabelecendo contactos telefónicos e troca de SMS para tal efeito, designadamente: a) a 25 de Março de 2010, com … , utilizador do telemóvel com o n° … ; b) no mês de Abril de 2010, com … ; c) com … ; d) a 22 de Junho de 2010, com … , que contactou com o arguido A…, no café … , sito em Castelo Branco, com vista a aquisição de haxixe, o qual, por sua vez, diligenciou pela concretização de tal transacção através do fornecimento do contacto telefónico do arguido B.... e) o arguido A…, entre Janeiro e 4 de Julho de 2010, cedeu a … , por, pelo menos, duas ou três vezes, a €10, 00 ou €20, 00 de cada vez, haxixe ou pólen de haxixe; f) a … , também conhecido por « BB...»; g) bem como a vários outros consumidores não identificados, com quem o arguido A...estabelecia contactos cautelosos relativamente a tais transacções. 12º e 13º O arguido A... também colocava o haxixe e pólen de haxixe à disposição de outros indivíduos, para que fossem estes a cedê-lo aos consumidores, mediante contrapartida monetária, não inferior a €13 450, 00, recolhendo, posteriormente, o primeiro, pelo menos, parte do produto monetário de tal venda. 14º De entre os referidos indivíduos que procediam a escoamento do haxixe e pólen de haxixe, por conta do arguido A…, encontrava-se o arguido B..., também conhecido por B..., que, durante o ano de 2010 e até à data da sua detenção a 4 de Julho de 2010, recebeu daquele, nos referidos termos, quantidade indeterminada de tal produto estupefaciente, mas superior a três placas de cem gramas de pólen de haxixe, envolvendo valores monetários não inferiores a €2500, 00. 15º No desenvolvimento de tal esquema de colaboração na venda de haxixe e pólen de haxixe, os arguidos A...e B... estabeleceram diversos contactos telefónicos relacionados com estes produtos estupefacientes, em que o tema dominante era o dinheiro, aparecendo o arguido B... como devedor relativamente ao arguido A…, de, pelo menos, €570, 00, fruto das vendas efectuadas por aquele do produto estupefaciente entregue por este nos sobreditos termos. 16º Por sua vez, o arguido B... procedeu à venda de haxixe e pólen de haxixe a consumidores, sendo o produto da respectiva venda dividido entre aquele arguido e o arguido António, ficando o primeiro com parte desses proventos, conforme previamente combinado, designadamente assim sucedendo com as vendas de haxixe e pólen de haxixe, por parte do arguido B...: a) a … , utilizador do telemóvel com o número … , a quem, até 4 de Julho de 2010, vendeu, pelo menos, 20 a 30 vezes, haxixe e pólen de haxixe, correspondendo as quantidades adquiridas a valores, pelo menos por vezes, de € 20; b) a … , a quem vendeu, pelo menos uma vez, a quantidade de € 5 de língua de haxixe, contactando o mesmo, para o efeito, através de SMS; c) a … , também conhecido por … , a quem o arguido B... vendeu, até 4 de Julho de 2010, designadamente nas Docas e no café … , tudo em Castelo Branco, haxixe por €20 e €25; d) a … , também conhecido por «…», até 4 de Julho de 2010, pelo menos dez vezes, a um custo de, pelo menos por vezes, €5, €10 ou €25, 00; e) a indivíduo conhecido por " … " por diversas vezes, designadamente um quarto de placa de pólen de haxixe; f) bem como a vários outros consumidores não identificados, sendo que o arguido B... chegava a publicitar através de SMS a vinda de novo produto estupefaciente, que vendia por €10 e/ou €20; tudo ascendendo a um valor não inferior a €2 445, 00. 17º O arguido A...deslocou-se a Espanha no dia 3 de Julho de 2010, com o intuito de aí vir a ser adquirido produto estupefaciente, designadamente haxixe e pólen de haxixe, com vista à sua posterior venda de forma idêntica à descrita. 18º Também o arguido D…, utilizador do telemóvel n.º 92 706 5322, igualmente conhecido por ..., procedeu durante o ano de 2010 e até ao referido dia 4 de Julho desse ano, ao escoamento de haxixe e pólen de haxixe, por conta do arguido A…, no valor de, pelo menos, €220,00. 19º Assim, o arguido D...procedeu à venda a consumidores de tais produtos, sendo que o produto dessa venda era entregue, com os inerentes lucros ao arguido A…, ficando o arguido D...com parte desses proventos, conforme previamente combinado. 20º No dia 4 de Julho de 2010, o arguido A...tinha na sua posse o telemóvel com o IMEI … ( correspondente ao Alvo 43196IE.), onde se encontrava inserido o cartão SIM da operadora TMN com o número … (correspondente ao código ALVO 43196M) e, no interior da sua residência, sita no … , em Castelo Branco: - Uma pistola de calibre 6, 35mm, da marca STAR, semiautomática, em boas condições de funcionamento, na qual se encontrava introduzido um carregador municiado com sete munições, em boas condições de utilização, deflagrando normalmente à primeira percussão; - Quarenta e sete munições de calibre 6,35mm, em boas condições de utilização, deflagrando normalmente à primeira percussão; - Duas munições de calibre 7,65mm, em boas condições de utilização, deflagrando normalmente à primeira percussão; - Uma réplica em metal de uma pistola de 9mm com um carregador próprio para munições de calibre 7,65mm introduzido; - Um cartucho próprio para arma caçadeira de calibre 12, em boas condições de utilização, deflagrando normalmente à primeira percussão; - A caixa do telemóvel da marca NOKIA, modelo E71, utilizado pelo arguido; - Diversos papeis manuscritos com indicações de numerários, números de telefone e contas manuscritas; - Um talão de carregamento de telemóvel relativo ao número 926.973.678; - A quantia de 3700€ (três mil e setecentos euros) em notas do BCE, sendo parte desta quantia composta por cento e vinte e cinco notas de 20 euros. 21º Por seu turno, o arguido B..., nesse dia, tinha consigo o telemóvel com o IMEI … (Alvo 42982IE), onde se encontrava inserido o cartão SIM da operadora TMN, com o número … (código ALVO 42982M), um cartão de segurança da TMN referente a tal cartão SIM supra indicado, e, na sua residência, sita na … , Castelo Branco: - (21) Vinte e uma munições de salva de calibre 5,56mm, em boas condições de utilização, deflagrando normalmente à primeira percussão; - (5) Cinco munições reais de calibre 5,56mm em boas condições de utilização, deflagrando normalmente à primeira percussão; - (ll ) Onze munições reais de calibre 7,62mm, em boas condições de utilização, deflagrando normalmente à primeira percussão; - (2) Duas munições de calibre.32, em boas condições de utilização, deflagrando normalmente à primeira percussão; - (l) Uma faca de cozinha com o punho envolto em fita isoladora de cor preta, apresentando o gume resíduos de canabis. - Uma faca de borboleta. 22º O arguido A...quis ter em seu poder as mencionadas armas e munições, sem que possuísse qualquer licença que o habilitasse ao porte, detenção e uso de tais armas e munições, o mesmo se passando relativamente ao arguido B... no que concerne às munições e à faca de borboleta, sabendo que pelas suas características eram de detenção proibida por lei, sem que os arguidos hajam justificado a sua posse, sendo que podiam ser utilizadas como arma de agressão. 24º Os quatro arguidos tinham perfeito conhecimento da natureza estupefaciente do haxixe e pólen de haxixe que detiveram e cederam da forma descrita e, não obstante, quiseram proceder à sua detenção e cedência, com o propósito de assim obter ganhos patrimoniais. 25º Todos os arguidos actuaram de modo livre e voluntário, sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei. Outros Factos: Arguido C...: Natural de Castelo Branco, C... cresceu junto da sua família de origem, sendo o mais novo dos dois filhos do casal. O pai, auxiliar de educação, faleceu em Janeiro do ano passado, e a mãe exerce a actividade laboral como empregada de limpezas, numa empresa local. Registando um processo de desenvolvimento dentro dos parâmetros normativo, o arguido abandonou os estudos com dezasseis anos de idade, após terminar o 9°. ano de escolaridade. Apesar de ter frequentado um curso de formação profissional, não o concluiu, demonstrando nessa altura, pouco interesse pela valorização pessoal. Ao nível profissional, desempenhou várias funções, em empregos precários, por períodos de tempo muito reduzidos. No presente e desde Setembro 2009, trabalha muna pedreira perto de casa, em regime de part-time. Viveu em união de facto com uma companheira, de quem se separou no verão passado, depois de cerca de três anos de vida em comum. Até agora, nunca conseguiu uma real autonomia, sendo a sua subsistência garantida pela família, sempre que as despesas excedem as receitas. Tendo iniciado consumos esporádicos de estupefacientes aos treze anos, com grupo de pares, em espaço escolar, veio a manifestar a toxicodependência aos dezassete/dezoito anos, apresentando dificuldades em se desvincular dos consumos de tóxicos. São conhecidos ao arguido C... os seguintes antecedentes criminais: - Por acórdão datado de 14.05.2008, transitado em julgado a 16.06.2008, relativamente a factos praticados a 09.08.2006, integrantes de um crime de tráfico de menor gravidade, na pena de 10 meses de prisão, suspensa na sua execução, pelo período de um ano, com regime de prova, extinta, sem revogação; - Por sentença datada de 21.12.2009, transitada em julgado a 02.02.2010, relativamente a factos praticados a 12.11.2008, integrantes de um crime de tráfico de menor gravidade, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão, substituída por 480 horas de trabalho, extinta pelo cumprimento. Arguido D...: D..., sendo natural de Faro. Viveu na sua terra natal durante poucos meses, dado que a família entretanto mudou-se para Castelo Branco, onde veio a fixar-se. O arguido tem um irmão mais velho com o qual estabelece uma relação de proximidade. Os pais constituíram uma sociedade empresarial na área da serralharia e mecânica automóvel. D... iniciou a escolaridade em Castelo Branco. Não revelava grande motivação pela vida escolar, vindo a abandonar, por iniciativa própria, a escolaridade no regime normal, no decurso da frequência do 8.° ano. Passou então a frequentar um curso de formação profissional de serralharia no Centro de Formação Profissional de Castelo Branco, cuja conclusão lhe conferiu a equivalência ao 9.° ano de escolaridade e a respectiva certificação profissional. Aos 18 anos, passou a trabalhar com o pai, na oficina deste, actividade em que se mantém. O arguido refere ter começado a consumir haxixe na adolescência, consumos que se mantiveram durante algum tempo. O actual processo surge neste contexto em que o arguido consome haxixe com regularidade e passa a estabelecer amizades com pessoas ligadas ao meio da toxicodependência. D... refere que tem vindo a diminuir progressivamente esses consumos, passando a consumidor ocasional situação que refere não interferir no seu modo de vida e nas responsabilidades face ao trabalho. D... vive com os pais. O pai tem 49 anos de idade e é sócio gerente de uma empresa de … . A mãe tem 54 anos e é sócia da empresa do marido, colaborando na respectiva actividade. Vai efectuando ainda algumas horas como empregada doméstica em casas particulares. O agregado familiar reside em casa propriedade dos pais do arguido. Trata-se de uma habitação tipo moradia, de dois pisos, dotada das necessárias infra-estruturas de habitabilidade. O arguido estabelece boas relações de sociabilidade com os vizinhos, existindo uma opinião favorável sobre o seu comportamento no meio residencial. D... aufere cerca de 600,00 euros mensais. Não tem despesas fixas mensais, as quais são suportadas na sua totalidade pelos progenitores. O dinheiro auferido pelo arguido é para os seus gastos pessoais. O arguido iniciou recentemente uma situação de namoro que está a ser vivida de forma gratificante e que tem vindo a contribuir para estabilizar o seu comportamento e para diminuir os consumos de haxixe. D...alterou também os seus relacionamentos, passando a conviver com pares com comportamentos mais normativos e integrados socialmente. O arguido não tem actividades estruturadas para ocupação do seu tempo livre, dedicando o mesmo ao convívio com a namorada. D... apresenta capacidades de raciocínio autocrítico em relação ao seu envolvimento na presente situação jurídico-penal e reconhece os danos causados a si próprio e a eventuais vítimas. O actual processo constituiu um alerta para a necessidade de mudança do seu estilo de vida e de alteração das suas relações sociais. O arguido manifesta-se apreensivo com as possíveis consequências deste processo. Os pais mostram-se receptivos em continuar a apoiar o arguido aos vários níveis. Consideram que D... tem vindo a adoptar um comportamento mais responsável e consequente. Em termos sociais, não parece ter havido repercussões negativas. Não são conhecidos antecedentes criminais ao arguido D.... Arguido A...: Oriundo de uma família de etnia cigana efectuou o seu processo de crescimento integrado na sua família de origem constituída pelos pais e seis irmãos, com dinâmica relacional de proximidade. Iniciou a escolaridade em idade própria, e logo nos primeiros anos registou dificuldades de aprendizagem, absentismo e dificuldades de adaptação ao sistema escolar, que acabou por abandonar. Mais tarde, em regime nocturno, terá completado o 4° ano de escolaridade Ainda criança, passou a acompanhar os pais na venda ambulante em feiras e passava os tempos livres com amigos da mesma etnia, sem actividades estruturadas que evoluíram posteriormente para uma vivência conotada com a prática de condutas marginais. Desde jovem, inicia consumos de estupefacientes e de álcool, problemáticas que vieram a condicionar o seu modo de vida. Independentemente dos tratamentos a estas dependências, que alegadamente terão sido ultrapassadas, não conseguiu estruturar uma actividade profissional regular, passando a depender dos pais, situação que se foi arrastando e que ainda hoje persiste, À data dos factos pelos quais está indiciado, A... residia com a companheira e três filhos menores (6, 4 e 2 anos de idade) numa habitação arrendada (rendas em atraso), localizada num bairro degradado de Castelo Branco e conotado com a prática de actividades delituosas. Trata-se de uma zona habitacional fundamentalmente habitada por pessoas da mesma etnia, com uma vivência de rua e estreitas relações de sociabilidade entre os seus elementos. Dedicava-se com irregularidade à venda de artigos de vestuário em feiras na região e o agregado familiar beneficiava do rendimento social de inserção no valor de 400€ mensais. Tendo em conta as limitações sentidas pelo arguido em contribuir de forma regular para a manutenção do seu agregado familiar, sempre contou com o apoio económico dos pais que colmatavam as necessidades elementares sentidas sobretudo pelos filhos. Continua a ser apoiado pelos progenitores que, embora não residam neste bairro, o visitam com regularidade e com os quais pode contar para qualquer adversidade. O agregado familiar continua a ser beneficiário do rendimento social de inserção, actualmente no valor de 600€ mensais. A nível económico, continua a beneficiar do apoio dos progenitores e os subsídios sociais foram aumentados. A nível familiar pôde continuar a integrar o seu contexto familiar constituído pela companheira e filhos e a beneficiar do convívio com outros familiares e amigos. Neste período de tempo, percepciona-se que o arguido efectua uma avaliação superficial do actual e anteriores confrontos com o sistema de justiça penal, bem como do seu percurso de vida e tem dificuldade em interiorizar adequadamente normas socialmente vigentes, aspectos que poderão constitui factor de risco no seu processo de reinserção social. Relativamente aos factos pelos quais está indiciado não quis pronunciar-se, considerando apenas que a acusação é excessiva, o que limita uma adequada percepção da sua atitude perante o presente processo judicial e consecutivamente um juízo de prognose relativamente ao seu projecto de reinserção social. São conhecidos ao arguido A...os seguintes antecedentes criminais: - Por sentença datada de 13.07.2000, transitada em julgado a 25.09.2000, relativamente a factos praticados a 22.05.1999, integrantes de um crime de burla para obtenção de serviços, na pena de 40 dias de multa, à taxa diária de 700$00, já extinta pelo pagamento; - Por sentença datada de 20.11.2002, transitada em julgado a 16.12.2002, relativamente a factos praticados a 09.11.1999, integrantes de um crime de furto simples, na pena de 7 meses de prisão, suspensa por 3 anos sob regime de prova; - Por sentença datada de 19.04.2006, transitada em julgado a 24.05.2006, relativamente a factos praticados a 31.03.2003, integrantes de um crime de receptação, na pena de 14 meses de prisão, suspensa por 3 anos; - Por sentença datada de 19.01.2005, transitada em julgado a 07.04.2006, relativamente a factos datados de 10.03.2003, integrantes de um crime de ofensa à integridade física simples, na pena de 220 dias de multa, à taxa diária de €5, 00, extinta pelo cumprimento. Arguido B.... Este arguido é natural de Castelo Branco, onde efectuou o seu processo de crescimento integrado na sua família de origem constituída pelos pais e mais três irmãos. Ambos os progenitores exerciam actividades por conta de outrem, o pai como mecânico numa oficina de pneus e a mãe como engomadeira, o que lhe permitia prover à satisfação das necessidades básicas. O pai, com consumo excessivo de bebidas alcoólicas e com comportamentos agressivos para todos os elementos do agregado familiar, demitiu-se das suas funções parentais, passando as mesmas a ser assumidas apenas pela mãe que as exerceu de forma permissiva e incapaz de responder às necessidades educativas dos filhos. Concluiu o 6º ano de escolaridade com 16 anos, registando várias reprovações, resultantes do desinvestimento escolar, absentismo. Nesta fase, iniciou o consumo de haxixe e privilegiou o convívio com grupos de pares passando a adoptar um modo de vida sem actividade estruturante. Aos 16 anos, estabeleceu uma relação como uma jovem, com a qual viveu cerca de dois anos, ambos com actividades profissionais ocasionais e situações de desemprego, deambulando entre Castelo Branco e Amadora, com recurso aos respectivos agregados familiares. No período que precedeu o seu envolvimento no presente processo judicial, o arguido residia sozinho há cerca de sete meses num apartamento arrendado em Castelo Branco. Trabalhava de forma irregular numa oficina de pintura e reparação de automóveis que lhe permitia auferir cerca de 300€ mensais, quantia insuficiente para fazer face às despesas fixas que tinha que assumir, nomeadamente o pagamento de 200€ mensais da renda de casa. Efectuava as refeições em casa dos pais. Considera-se consumidor regular de haxixe, não havendo consumos nem dependência de outras drogas. A presente medida de coacção (OPHVE), com todos os condicionalismos a que está sujeito, mas que percepciona de forma positiva, está a permitir-lhe avaliar criticamente o seu percurso de vida e porventura perspectivar o futuro de modo diferente, que de outra forma considera não ter conseguido. Neste período de tempo, frequenta o Centro de Novas Oportunidades (segundas feiras das 09:00h às 11:00h) que lhe permite habilitar-se, a curto prazo, com o 9º ano de escolaridade. Tem sido pontual, assíduo e demonstra motivação e capacidades pessoais para prosseguir a escolaridade. Caso seja viável, logo que concluído este ciclo de escolaridade, tem possibilidades de integrar um curso de aprendizagem que lhe proporciona a aquisição do 12° ano e simultaneamente uma certificação profissional na área de topografia com a duração de dois anos e meio. Manifesta vontade em estruturar um projecto de vida através desta oferta formativa, que promove a aquisição de competências escolares e profissionais. Ainda, no decurso da presente medida, recebeu visitas da ex-namorada, que entretanto ficou grávida. Caso se prove a paternidade pretende assumir as suas responsabilidades parentais. São conhecidos a este arguido os seguintes antecedentes criminais: - Por sentença datada de 14.01.2009, transitada em julgado a 03.02.2009, relativamente a factos praticados na mesma data, integrantes de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, na pena de 115 dias de multa, à taxa diária de €5, 00. Factos não provados Além dos que estão em contradição com os assentes e daqueles que se encontram prejudicados pela resposta dada a outros e dos formulados em termos conclusivos, não se provou[1]: Da Acusação Pública: 1º O arguido A..., também durante o ano de 2009, dedicou-se à prática da venda e cedência de produtos estupefacientes a um grande número de pessoas interessadas em tais produtos, desenvolvendo tal actividade na cidade de Castelo Branco e zonas limítrofes, constituindo tal actividade, nesse período temporal, o seu exclusivo modo de vida e sendo referenciado, em 2009 e até 4 de Julho de 2010, nesta cidade como traficante de produtos estupefacientes, que o arguido adquiria, sempre, a pessoa não identificada em Espanha. 2º Ao longo do ano de 2009, o arguido A...desenvolvia a referida actividade de venda e cedência de produtos estupefacientes na sua residência, sita no Bairro … , tendo habitualmente, para tal efeito, na sua posse, quantidades indeterminadas de pólen de haxixe, desde 250 g e até cerca de três quilos. 3º Assim, no interior da sua residência, o arguido A...vendeu, diariamente durante o ano de 2009 e pelo período de 4 meses, a … 1 grama de cocaína, pelo preço de € 60,00, e até por duas vezes 2 gramas de cada vez. 4º Durante o ano de 2009, o arguido A...também colocava à disposição de outros indivíduos produtos estupefacientes para os revenderem por sua conta. 5º No período compreendido entre Junho e 30 de Agosto de 2009, o arguido A...entregou ao arguido C... um quilo de pólen de haxixe em placas. 6º Sem prejuízo do assente em 6º, ao nível da matéria assente, o arguido C...tinha na sua posse precisamente 8, 18 g de canabis; … e ... costumavam adquirir haxixe e pólen de haxixe ao arguido C...desde o mês de Abril. O arguido C..., no dia 9 de Setembro de 2009, tinha na sua posse a quantia de € 284,46, em notas e moedas e os objectos descriminados ao nível do art. 6º, da matéria assente, à excepção do produto estupefaciente aí referenciado. 7º No dia 9 de Setembro de 2009, o arguido A...tinha na sua posse, no interior da sua residência, sita no Bairro … : - um caderno com capa verde, composto com folhas pautadas, contendo várias anotações referentes a nomes e numerários, que o arguido utilizava para anotar os dados relativos a tal actividade de venda de produtos estupefacientes; - uma arma de fogo, tipo caçadeira, com dois canos sobrepostos, calibre 12, marca F. Sarpiugarte Flgoibar, com o número de série F.S. 64974; - trinta cartuchos próprios para caça calibre 12. 8º O arguido A…, em data não concretamente apurada, mas seguramente compreendida entre finais de Agosto de 2009 e 9 de Setembro do mesmo ano, aceitara receber a arma caçadeira supra referida que ali lhe foi entregue por um toxicodependente não concretamente identificado, em troca de uma quantidade indeterminada de pólen de haxixe, sendo que a referida arma, pertença de … , lhe havia sido retirada contra a sua vontade. O arguido A...tinha na sua posse a referida arma, sem que possuísse qualquer licença que o habilitasse ao porte, detenção e uso de tal arma e tinha perfeito conhecimento tal objecto era produto de furto e, não obstante, quis ficar com o mesmo na sua posse, com vista a obter um benefício económico indevido no respectivo património. 9º Sem prejuízo do assente ao nível do art. 9º, da matéria assente, o arguido A... deslocou-se regularmente a Espanha para adquirir haxixe e pólen de haxixe. 10º Nas circunstâncias de tempo e lugar assentes ao nível do art. 10º, da matéria provada, foi utilizada uma viatura de primeira e segunda linha e foi feito uso de veículos de outras pessoas com vista a dificultar um eventual controlo por parte das autoridades. 11º e) sem prejuízo do assente no art. 11º, e), durante os meses de Maio e Junho de 2010, o arguido A...vendeu, de forma regular, a … pólen de haxixe; f) sem prejuízo do assente no art. 11º, f), o arguido A... procedeu à venda directa de haxixe e pólen de haxixe a … . 16º a) sem prejuízo do assente ao nível do art. 16º a), o arguido B... vendeu, a … , por cerca de cem vezes, haxixe e pólen de haxixe, correspondendo as quantidades adquiridas a valores de € 10, € 30, €40 e € 50; b) sem prejuízo do assente ao nível do art. 16º b), o arguido B... vendeu, a … , por três vezes, quantidades de € 5 de línguas de haxixe, que o arguido B... guardava na sua residência sita na Rua … dentro de uma caixa, contactando o mesmo, para o efeito, através de SMS; c) sem prejuízo do assente ao nível do art. 16º c), o arguido B... vendeu, a … , em 2009, por várias vezes, junto à porta da sua residência, bem como nas Docas e no … em Castelo Branco, línguas de haxixe por valores de € 15, € 20 e €25, e à irmã daquele, … , bem como durante 2010, até 4 de Julho do mesmo ano, junto à porta da sua residência; d) sem prejuízo do assente ao nível do art. 16º d), o arguido B... vendeu, a … , durante cerca de um ano, até 4 de Julho de 2010, duas a três vezes por semana, haxixe e pólen de haxixe, em quantidades que custavam €25. 17º O arguido B... deslocou-se, de forma concertada com o arguido A…, a Espanha no dia 4 de Julho de 2010 com o intuito de aí vir a ser adquirido produto estupefaciente por parte deste último. 24º Os ganhos patrimoniais obtidos pelo arguido A... eram mais elevados que os obtidos pelos demais arguidos. Convicção do tribunal: Da acusação pública: Os arguidos remeteram-se, indiferenciadamente, ao silêncio. Artigo 1º, da acusação pública (factos provados e não provados): A prova respectiva resulta do que infra se pormenorizará como súmula das intercepções telefónicas devidamente autorizadas e cuja gravação foi consignada em auto, no processo. Antes de avançarmos com a escalpelização deste meio de prova, á que deixar bem claro o nosso entendimento acerca do respectivo valor probatório. As mensagens de texto e conversações telefónicas do arguido transcritas em auto não são declarações de arguido, tal como previstas nos artigos 356º e 357º, do CPPenal, antes constituindo meio de prova próprio e autónomo daquelas declarações. Nessa medida, Eis porque, sob pena de violação dos artigos 356°, 357° e 125º e ss. do CPPenal, por erro de interpretação e aplicação, as competentes transcrições devem ser valoradas pelo Tribunal do julgamento, segundo os princípios da livre apreciação da prova e da livre convicção do juiz, em conjugação com as regras da experiência comum, desde que ninguém conteste a sua válida produção no processo, dado terem sido previamente autorizadas pelo competente juiz de instrução, que igualmente fez o controlo judicial do seu processamento e transcrição, numa altura em que já havia sido consumado o crime investigado e existia processo de inquérito, com arguido constituído. Daqui não resulta, pois, qualquer violação das garantias de defesa do arguido ou que por essa via seja postergado o seu direito ao silêncio ou de qualquer princípio constitucional atinente aos direitos, liberdades e garantias, em particular, os da subsidiariedade e da proporcionalidade dos meios e das medidas de intromissão na vida privada, no domicílio e nas telecomunicações, sob pena de se tornar inoperante qualquer processo criminal em que haja recurso a intercepções telefónicas, ainda que substancial e formalmente fundado, para tanto bastando que o arguido optasse pelo direito ao silêncio em audiência[2]. O mesmo é dizer que a análise da prova produzida em julgamento supõe uma apreciação crítica, não sendo o tribunal um mero receptor de declarações ou depoimentos produzidos em julgamento. Os julgadores têm de raciocinar quando analisam a prova produzida em julgamento, o que devem fazer com recurso às regras da lógica, da ciência, da experiência comum, consoante os casos, cabendo-lhes determinar se esta ou aquela prova merece ou não crédito. Nessa avaliação da prova o tribunal não está impedido de conferir crédito apenas a parte de um depoimento ou declaração. O importante é que o tribunal se convença da veracidade daquela prova e que esse convencimento se imponha de forma objectiva e racional. Por outro lado, podem as transcrições das conversas telefónicas interceptadas constituir meio único de prova. Di-lo o STJ em Ac. de 19.10.2005 (Processo Nº1941/05 -3ª)[3]: Eis porque o tribunal, para o facto englobante contido neste artigo, valora, essencialmente, a prova encerrada nas transcrições das escutas telefónicas, as quais se processam a partir de 24 de Março de 2010, aludindo, porém, os arguidos a transacções já efectuadas e, sobretudo, a entregas que já tinham ocorrido, no âmbito de um esquema de colaboração e de venda directa anterior, pelo que não faz sentido cingir o termo inicial de tal esquema à data das intercepções telefónicas. Quanto à espécie de droga em causa, como resulta das transcrições das gravações, bem como das vendas directas confirmadas testemunhalmente, eram apenas o haxixe e o pólen de haxixe o transaccionado segundo o esquema objecto da acusação pública. Artigos 2º, 4º e 5º, da acusação pública (factos não provados): Quanto ao ano de 2009, nenhuma prova foi produzida, ou que possa ser valorada para efeitos de condenação. Artigo 3º, da acusação pública (factos não provados): A testemunha … negou que alguma vez tenha adquirido droga ao arguido A..., confirmando antes que se dirigia ao Bairro … para adquirir produto estupefaciente a um indivíduo aí residente, de alcunha «… ». Quanto ao arguido A…, chegou a vender-lhe objectos diferenciados. Artigo 6º, da acusação pública (factos provados e não provados): Atendemos ao depoimento das testemunhas … e ..., que confirmaram o constante da acusação pública, neste artigo (1º período), negando, porém, que tal já se passasse desde o mês de Abril, à excepção do … , nos termos assentes. A identificação e quantificação do produto estupefaciente resulta da perícia de fls. 604. Deu-se por não provado o demais consignado no art. 6º, da acusação, relativo à apreensão no n.º 18, do … , em virtude de o auto em causa não se encontrar assinado pelo arguido C... e os Srs. agentes da PSP que procederam à diligência, desconheciam a relação entre o local da apreensão e o arguido em causa. Por outro lado, o agente da PSP , titular do inquérito policial n.º 8/09.0PECTB, apenas soube referir tratar-se da morada em que o arguido em causa residia com a companheira que então tinha, desconhecendo se aí residia mais alguém e qual o quarto ocupado pelo casal (cfr. fls. 543, dos referidos autos). Ora, não se encontrando ninguém no interior da residência, no momento da diligência, não fica esclarecido que o quarto onde foram apreendidos os bens fosse sequer o ocupado pelo arguido. Já o mesmo se não pode dizer a respeito da detenção do produto estupefaciente por parte do arguido, considerando que resultou de revista pessoal e foi confirmada pelo agente da PSP . Quanto à quantidade, atendemos a fls. 574 e 657 dos mesmos autos. Artigos 7º e 8º, da acusação pública (factos provados e não provados): Reporta-se o art. 7º ao auto de apreensão de fls. 173, do referido processo 8/09. Porém, como resulta daí, em conjugação com o depoimento do Sr. Agente da PSP, a apreensão em causa não foi na residência do arguido António, mas sim em local próximo indicado pelo indivíduo de nome … , que não se logrou notificar para a audiência, a fim de depor como testemunha, e que, então, residia no que veio a corresponder ao . … em Castelo Branco, por autorização do dito arguido, segundo o que o dito indivíduo declarou à entidade policial. Não tendo, porém, sido ouvida a dita testemunha, pela razão vista, à face da norma do art. 356º, n.º 7, do C.P.Penal, não poderão ser valoradas as respectivas declarações perante essa mesma entidade policial. O mesmo se diga a respeito do art. 8º, da mesma acusação, pois que nenhuma provas foi produzida nesse sentido. Aliás, o aí referido … , indicado como testemunha para julgamento, foi prescindido pelo Ministério Público, pelas razões exaradas em acta. Artigos 9º e 10º, da acusação pública (factos provados e não provados): Analisemos, então, as transcrições das intercepções telefónicas. A fls. 85-87, do apenso I, surpreende-se uma conversa entre o arguido A...e um tal … , sendo este a falar de um telefone com o indicativo 34 (indicativo de Espanha), em que este pede ao primeiro que lhe pague pelo menos parte do abastecimento de droga que lhe tinha feito em data anterior, ao que o arguido responde que apenas consegue pagamento no final desse mês, por só então os distribuidores do produto se haverem comprometido a pagar-lhe o preço devido. Por seu lado, as intercepções registadas a fls. 19-22 e 24-32, do mesmo apenso I) dão conta do assente em 10º, precisamente o abastecimento pelo qual o tal … estava a reclamar, pelo menos, parcial pagamento. Com efeito, o arguido ... pede ao irmão … que lhe disponibilize uma viatura pelas 14h20m. Pelas 15h12m, o mesmo arguido efectua uma chamada, activando a célula respeitante a Amieira e Nisa. Pelas 16h20m, regista-se uma tentativa de chamada por parte do arguido para uma telefone espanhol (indicativo 34), sendo activada a célula respeitante à localidade de Caia. Sucessivamente, pelas 21h46m, é activada a célula de Campo Maior Centro, e, pela s 21h54m, é accionada a célula relativa à localidade de Degolados, altura em que se regista uma conversa entre o arguido A...e o indivíduo que o acompanhou a Espanha, numa outra viatura, sobre o facto de terem que estar atentos a viaturas das autoridade s policiais que pudessem encontrar no seu trajecto. Posteriormente, até às 23h09m, são activadas sucessivamente as células de Monforte e Arronches, Urra, Gardete e Fratel Vila Velha de Ródão, Sarnadas- Ródão e Castelo Branco (cfr. fls. 478-480). Artigo 11º, da acusação pública (factos provados e não provados): a) A fls. 4, do apenso I), o referido … dá conta de estar interessado em estupefaciente, respondendo o arguido A...que não dispõe de produto estupefaciente, que a testemunha em causa - reconhecidamente «…», pela própria testemunha - informou tratar-se de haxixe. É certo que esta testemunha negou, em audiência, que a conversa se relacionasse com droga, antes se refugiando na falta de memória, mas, atentas as regras da experiência comum, ao nível da análise de diálogos telefónicos codificados, nestes meandros, não nos restam dúvidas quanto à conclusão que antecede. Aliás, a testemunha não apresentou justificação para a conversa em causa, assumindo que já consumiu haxixe. b) A fls. 71, 72, 75, 77, 79 e 80, do apenso I, a testemunha … confronta o arguido «...» com a possibilidade de o mesmo entrar, juntamente com a testemunha … no negócio da distribuição da droga, sendo o diálogo tão perceptível que o referido arguido até alertou a testemunha … para ele não falar assim consigo ao telefone. De qualquer modo, são chamadas frequentes e rápidas de telefone. Então, entre a chamada de 4 de Abril de 2010, pelas 19h47m, e 5 de Abril do mesmo ano, percebe-se, perfeitamente, que foi combinado entre os dois que o arguido arranjaria droga à testemunha … . É certo que a testemunha explicou o diálogo por se tratar de roupa para a própria comercializar (30 casacos por €210, 00), sob fornecimento do arguido. Mas confrontado com os cuidados telefónicos, inclusive a advertência do arguido para não ser a testemunha tão explícita, não o soube explicar. Aliás, a ser esse o objecto dos contactos telefónicos, não se compreendem os cuidados na sua expressão verbal, quanto mais a censura explícita, por parte do arguido A… . c) A fls. 18-19, do apenso III, a conversa revela mesmo que a testemunha … está em dívida para com o arguido ... em 1000 euros e, por não dispor de capital para a saldar, pede àquele que lhe arranje droga, a fim de o mesmo realizar algum dinheiro. A testemunha explicou os €1000, 00 pelo facto de o arguido «...» lhe ter vendido uma viatura automóvel da marca «SAAB», ficando aquele em dívida com a quantia de €1000, 00. Quanto às «cenas» a que se reporta no diálogo, identifica-as como camisolas, o que se afigura inverosímil, considerando a certa dificuldade em realizar o lucro desse montante com a venda de camisolas, para além dos cuidados na expressão oral, colocados pelo arguido e pela testemunha. Para rematar, a experiência comum - tal como o esclareceu o Inspector da PJ … - revela que à «tá-se mal», exclamado pelo arguido «...» significa que se não tem droga disponível. d) A fls. 134, 139 e 141 a 143, do apenso II, é explícita a insistência do arguido «...» junto do arguido «… » (B...) no sentido de o mesmo aparecer junto dele, no café « … », pois que estavam lá 4 ou 5 «gajos» (consumidores de produto estupefaciente) a querem comprar «cenas», ou seja, produto estupefaciente. Então, o ... confronta o … sobre a quantidade de que o mesmo dispõe para vender, obtendo a resposta de que apenas placas de €25, 00 ou €50, 00 e não de €10, 00, como, designadamente, a testemunha … estava a sugerir três placas de €10, 00. A determinada altura, estando a conversa tão explícita, mais uma vez, o arguido ... teve necessidade de chamar a atenção do arguido … para não ser tão evidente ao telefone. É elucidativo, aliás, constatar que a testemunha … logo no minuto seguinte – porque o … estava à espera da namorada e não podia ausentar-se -, telefona ao … , para saber se o mesmo não podia aparecer para fornecer a droga. A explicação da testemunha … , tendo negado conhecer o … e saber o que fossem «cenas», foi no sentido de que estava a tentar comprar haxixe ao … , não tendo, a final, comprado, o que é inverosímil, face à não continuação da conversa telefónica e ao teor da sessão 9964, de 22.06.2010, pelas 21h46m.. e) A testemunha … confirmou-o, nos termos assentes, nitidamente com receio do que lhe pudesse acontecer, na sequência da revelação de tais factos. Reconheceu a alcunha « … » e a conversa de fls. 53-54, do apenso II, sendo notório que o arguido «...» aproveitou a chamada para reclamar o pagamento do preço da droga que já havia cedido à testemunha. Aliás, isso mesmo resulta claríssimo de fls. 83-84, em que o arguido «...» pede o dinheiro da droga cedida. f) A testemunha … negou que alguma vez tivesse utilizado o telefone do seu irmão, com o n.º … , sendo esse, porém, o número que estabelece contacto a fls. 38-39, do apenso I, contrariamente ao que o próprio irmão … já havia afirmado. A testemunha, visivelmente contraída nas suas respostas, chegou a negar conhecer o arguido «...», mas não pode deixar de admitir que a sua alcunha em Castelo Branco é de « … », como resulta da própria conversação, mais à frente. Por fim, a fls. 73, do apenso III, a testemunha justificou não ter entregue o pagamento ao ..., por haver sofrido um acidente com uma mota, acidente o que a testemunha confirmou em audiência. De qualquer forma, comprometeu-se a proceder ao pagamento, de, pelo menos, €1000, 00, em Setembro. Quanto a … , negou o mesmo que fosse sequer consumidor de qualquer produto estupefaciente, o que não foi desmentido pelo referido irmão. g) Os diálogos (a fls. 40-45, do Apenso I) são esclarecedores do cuidado deste interlocutor ao telefone, reportando-se a «t.shirts», quando pretendia reportar-se a droga, e da disputa entre os fornecedores de droga, nesta cidade, pelos distribuidores, de entre os quais a ora testemunha. Noutro telefonema, combinam encontro para que o arguido A... ceda droga a um amigo do interlocutor, comprometendo-se esta última a pagar €500, 00 pelo produto que o mesmo ... já lhe havia cedido. Noutro telefonema, o interlocutor combina com o ... que este vá ter às traseiras de um determinado café, que aí estaria um amigo do primeiro, à espera daquele, para lhe ceder droga. Por seu lado, a fls. 20, do apenso III, o interlocutor informa o arguido ... que o seu telemóvel normal se encontrava sob escuta, recomendando-lhe que apague os números de telemóvel gravados. Quanto à droga, o ... reclama mais pagamento e o interlocutor justifica-o com a falta de pagamento por parte dos consumidores. Ainda assim, o interlocutor pede que o ... lhe arranje mais produto estupefaciente, comprometendo-se a enviar-lhe quem lhe entregue o produto arranjado pelo .... A fls. 83-84, do apenso I, o interlocutor do ... pede mais droga, mas este nega-lha enquanto não lhe for pago, pelo menos em parte, o fornecimento anterior, sendo que o dito interlocutor se justifica com o facto de ter entregue o produto, para venda, a outrem, que só regressaria no domingo. A fls. 33-34, do apenso III, é notório que a mulher do ... o repreende por telefone, por aquele ir, de novo, para o Café … encontrar-se com os distribuidores de droga e consumidores, que, sintomaticamente, ela chama «ciganos», repetindo o que vinha fazendo, não obstante os seus avisos para parar com a actividade. Artigos 12º e 13º, da acusação pública (factos provados): Além do já referido, a fls. 10-11, do apenso I, é o arguido A... a pedir mais dinheiro ao distribuidor, por conta do fornecimento de droga que lhe fizera anteriormente. A fls. 17-18, é a mulher do ... a perguntar-lhe se o distribuidor já lhe tinha dado o dinheiro da distribuição do produto estupefaciente. A fls. 55-56, do mesmo apenso, mais uma vez, o ... pede dinheiro ao distribuidor e este responde-lhe que já tinha vendido uma dose. A fls. 57-59, do apenso I, é límpida a estratégia deste em encobrir o conhecimento que tem acerca daquele arguido, dando a entender que o seu receio é relativamente ao tribunal e sobretudo a outros fornecedores de droga rivais do .... Mais: o que o ... lhe tinha dado no dia anterior era droga e, na opinião da interlocutor, não prestava, sendo certo que este ia distribuir a droga, tendo o preço acordado sido superior a outro fornecimento, tentando, por isso, negociar esse preço com o ..., alegando a má qualidade do produto. O ... não cede e prefere a devolução do produto entregue. Notório é também que o interlocutor arranjou mais um distribuidor ao ..., alertando-o para um possível telefonema dele. A fls. 60-61, do mesmo apenso, o arguido A... fez que não reconheceu um tal … , mas este, por SMS, exigiu-lhe os €500, 00 que um rapaz tinha dado a este último, por conta de um fornecimento de droga que não chegou a ter lugar, por parte do ..., apesar de prometido. A fls. 73-74, ainda do apenso I, o mesmo arguido pede dinheiro ao distribuidor. A fls. 98-101, também do apenso I, o distribuidor promete ao arguido A... dar cerca de €1000, 00 pelo produto estupefaciente que este lhe forneceu e pede-lhe que lhe arranje mais droga para dar, inclusive, a outro distribuidor. O ... responde que primeiro tem que juntar algum dinheiro. Então, a fls. 23-24, do apenso III, o arguido A...pede dinheiro ao arguido B..., pelo abastecimento que lhe tinha feito, por se encontrar necessitado dele, tanto mais que um outro distribuidor, de nome … , lhe estava dever na ordem dos €12 000, 00, por fornecimento de droga. A fls. 40-42, do apenso III, mais uma vez o arguido A... pede dinheiro ao distribuidor e este , ainda que com medo de ir a tribunal, porque os consumidores andam a insistir com ele, pede pelo menos mais cinco doses de produto estupefaciente para distribuir. A fls. 81-82, do apenso III, o arguido A...reclama o pagamento de €400, 00 a um tal « … », por causa da droga que lhe forneceu, escudando-se este em o « … » também lhe estar a dever. Artigo 14º, da acusação pública (factos provados e não provados): A fls. 23-24, do apenso II, o B… pede a um sub-distribuidor de apelido « … » que arranje €400 ou €500 para o ... (o arguido António), porque tinha recebido placa de pólen de haxixe. A fls. 61-62, 76, 78, 80, 86-87 e 107-110 do mesmo apenso, o arguido A...continua a pedir dinheiro ao arguido B..., com base nos mesmos pressupostos, sendo que a fls. 80, pede €1500 ou €2000, e a fls. 109 é o arguido B... a pedir ao sub-distribuidor dinheiro , porque, por sua vez, o arguido A... lho estava a exigir. A fls. 107, do apenso III, o arguido B... refere que apenas tem €1000 e tal, da venda da droga que não prestava. A fls. 109, do mesmo apenso, o arguido A... reclama mais pagamento pela venda da droga ao arguido B..., porque se está a aproximar o dia em que o primeiro tem que pagar aos fornecedores, senão levam-lhe um carro. Ora, tendo sido confirmado pelo Inspector da PJ que cada placa de pólen de haxixe tem normalmente 100 gr. ou 200 gr., custando no mercado da revenda deste produto pelo menos €200, 00, é manifesto até que as quantidades cedidas excedem o valor consignado pelo mínimo na matéria assente. A fls. 95 a 98, do apenso II, o arguido B... desabafa com o mesmo sub-distribuidor, que alguém comentou com o arguido A... que aqueles não lhe iam pagar pelo produto cedido. A fls. 121-124, do apenso II, o arguido B... pede ao mesmo sub-distribuidor para apareça e traga produto estupefaciente, pois tem lá interessados, sem dispor, nesse momento, daquele para lhe ceder. Artigo 15º, da acusação pública (factos provados e não provados): A fls. 2-3, do apenso I, o arguido A...pede dinheiro e o arguido B... responde que o sub-distribuidor só lhe arranja cerca de €500, 00 no dia seguinte. A fls. 6 e 9, do apenso I, o arguido B... diz ao arguido A...que lhe vai entregar dinheiro derivado da venda de produto estupefaciente. A fls. 93, do apenso I, o arguido A...diz ao arguido B... que tinha lá um rapaz que pretendia €70 de produto estupefaciente, combinando levá-lo ao pé deste, para lhe vender o produto estupefaciente. A fls. 39-40, do apenso II, o arguido A...pede mais uma vez dinheiro, pela mesma razão, ao arguido B.... A fls. 41-42, do apenso II, o arguido A... combina entregar droga ao arguido B..., para este distribuir, e, a fls. 43-45, é notória dificuldade de encontrarem um sítio para proceder à entrega, sem que sejam notados. A fls. 66-67, do mesmo apenso, voltam a combinar a entrega de droga «qualquer coisinha». A fls. 132-133, ainda do apenso II, o arguido A...dá conta ao arguido B... que, no café Tulipa, há «uns gajos» que querem comprar droga. A fls. 25-26, 52 e 54, do apenso II, o arguido B... promete entregar dinheiro ao arguido A... pela venda de droga e pede-lhe que entregue mais produto dessa natureza para vender. A fls. 59, do apenso II, o arguido A...mostra-se irritado com o arguido B..., por este não lhe ter entregue o dinheiro da venda da droga no dia anterior, como prometido. Artigo 16º, da acusação pública (factos provados e não provados): a) Quanto ao arguido B... (B...), negou a testemunha … que alguma vez lhe tenha comprado droga, mas antes que comprou juntamente com este último, a meias, por 20 ou 30 vezes, sendo o preço, de cada vez, entre €10/€20. A fls. 117, do apenso II, o arguido B... pede €20 ao consumidor … , e, a fls. 18, do apenso III, a testemunha (consumidor) pede droga ao arguido A...para vender e assim conseguir pagar a dívida de €1000 que tem para com aquele. Ora, assim sendo, não resulta credível a versão da testemunha quanto às admitidas 20 a 30 vezes, considerando a dívida do próprio designadamente para com o arguido A...e o facto de o arguido B... fazer vida da transacção da droga. b) A fls. 112-113, do apenso II, a consumidora … pede €5 de haxixe ao arguido B... e ele responde afirmativamente. Enquanto testemunha, a pessoa em causa confirma-o em audiência, excepto que, com certeza, a droga tenha sido fornecida, por alegadamente não se recordar. O certo é que, perante a resposta telefónica do arguido B..., não se crê que a transacção não tenha tido lugar. c) A fls. 2-6, do apenso II, o arguido B... responde à testemunha (consumidor) … , que apenas lhe poderá arranjar €25,00 de haxixe, com o que este concordou, combinando encontrar-se. Por outro lado, a testemunha apenas reconheceu, em audiência, ter adquirido uma vez ao arguido B..., por €20, 00, nas Docas, pelo que apenas poderemos concluir ter-se tratado de mais uma vez, além daquela. d) A testemunha (consumidor) … apenas reconheceu o custo de €5 ou €10, por um vez, o que se considerou incredível, atendendo a que o arguido B... fazia vida da distribuição remunerada de produto estupefaciente, não tendo sido revelada qualquer situação de favor relativamente a esta testemunha. Quanto ao número mínimo de 10 vezes, foi a própria testemunha a reconhecê-lo em audiência. Por seu lado, a fls. 36 e 137, do apenso II, a mensagem é clara quanto ao custo do produto estupefaciente cedido - €25, 00. e) A fls. 27 e 46, do apenso II, o consumidor pede €10 de haxixe ao arguido B..., combinando encontrar-se para a entrega. A fls. 30, do mesmo apenso, o referido consumidor pede um quarto de placa de pólen de haxixe ao arguido B..., que este acede a entregar-lhe, contra setenta euros. A fls. 146-147, era também a entrega de droga que estava subjacente à conversa entre os mesmos personagens. f) A fls. 10-18, do apenso II, um tal « … » pede €20 de haxixe ao arguido B..., sendo que depois consegue desenrascar-se por outro lado. Mas o dito arguido trazia-lhe a mercadoria nesse valor. A fls. 48, do mesmo apenso, o arguido B... combina entregar €10 de haxixe a um interessado e a fls. 50 o mesmo produto, na quantidade equivalente a €20. A fls. 70-73, também do apenso II, o arguido B... publicita, por SMS que já tem pólen de haxixe (mel). A fls. 88-89, idem, o arguido B... e um interessado combinam ver o produto estupefaciente em casa daquele. A fls. 90-91, idem, o arguido B... insiste com uma tal … , em programa de metadona, a ir à residência dele, a fim de buscar haxixe, ao que ela pede que seja noutro dia. A fls. 99-105, idem, dois consumidores pedem ao arguido B... se tem €5 e €20 de haxixe, respondendo este ao primeiro de forma afirmativa. A fls. 114-118, idem, o arguido B... quer vender €20 de haxixe e vai perguntando por telefone, a fim de saber quem precisa. A fls. 119-120, 130-131, idem, o arguido B... responde a um interessado que não tem haxixe com ele, porque o deixou em casa de outra pessoa, sendo que, na segunda vez, é pedida uma placa de pólen de haxixe inteira. A fls. 150-153, idem, um interessado, de nome … , pretenda comprar ao arguido B... uma placa de pólen de haxixe por €100, mas este já a tinha partido em fatias de €25, o que desgostou o primeiro, porque também queria ganhar com a venda das fatias. A fls. 127-132, do apenso II, o arguido B... comenta com o arguido A... que um interessado lhe devolveu placa de pólen de haxixe no valor de €200, por a considerar alegadamente «podre». De qualquer forma, já tinha feito €1300 de venda desse produto. Entretanto, consegue despachar €10 do mesmo produto a um outro interessado. Artigo 17º, da acusação pública (factos provados e não provados): A fls. 77-78, do apenso III, a 1 de Julho de 2010, o arguido A...tenta convencer o arguido B... a deslocarem-se com vista à aquisição de produto estupefaciente, mas o segundo pretende, antes disso, despachar o resto do produto estupefaciente que tem em seu poder, combinando ainda ser este último a entrar em contacto com o arguido D..., para despachar droga, pois que o mesmo não liga para o que o pai lhe diz. A fls. 117-118, do mesmo apenso, a 2 de Julho de 2010, alguém a telefonar de Espanha (indicativo 34), pergunta ao arguido A...se o mesmo se desloca aí tendo o mesmo respondido que, em princípio, apenas no dia seguinte. A fls. 133, idem, a 3 de Julho de 2010, a mesma pessoa de Espanha certifica-se junto do arguido A...se o mesmo aí se deslocava nesse dia. Passadas duas horas, chega o arguido A...a Espanha e encontra-se com a tal pessoa. Apenas poderia ser para adquirir droga, tendo em conta os diálogos anteriores com o arguido B.... Quanto ao arguido B..., desconhecemos se o mesmo se deslocou com o arguido António, tendo em conta que apenas o facto de haverem combinado em 1 de Julho e terem sido encontrados juntos na madrugada de 4 de Julho, não nos permite inferir, com segurança nesse sentido. Artigos 18º e 19º, da acusação pública (factos provados e não provados): A fls. 89-92 e 94-97, do apenso I, é o arguido A...a reclamar dinheiro junto do arguido D...(também conhecido por ...) – utilizador do telemóvel n.º … (foi este o contacto que o mesmo forneceu, como contacto pessoal, aquando da sua inquirição pela PSP, no âmbito do NUIPC 8/09.0PECTB – cfr. fls. 363, desse inquérito) - pelo produto estupefaciente que lhe foi entregue e este a pedir-lhe que o preço da placa de pólen de haxixe passe para €200, enquanto que o primeiro a situa nos €220. A fls. 157-160, do apenso II, o arguido A...pede novamente dinheiro da venda do produto estupefaciente entregue, ao arguido D...até 31 (é lapso manifesto) de Junho, porque, depois dessa data, tem que ir abastecer-se a Espanha de mais droga. A fls. 7, do apenso III, o arguido D...pede mais uma ou duas placas de pólen de haxixe ao arguido A…, para venda, dando a entender que já despachou a quantidade que anteriormente lhe havia sido cedida pela mesma pessoa, mas sem ainda ter recebido o preço. A fls. 86, através do mesmo 927 065 322, o arguido D...a prometer ao arguido A...que apenas lhe pode entregar o dinheiro da venda do produto estupefaciente a 2 de Julho. Logo de seguida, a fls. 88-89, é o arguido A...a telefonar ao arguido B... – que lhe diz andar a ajudar a cobrar o preço da droga vendida por um « … » - , pedindo-lhe para enviar uma mensagem ao arguido D...para ele entregar o produto da venda imediatamente, pois que o arguido A... já anda no encalço do pai do D...para lhe bater a sério. De imediato, nova conversa telefónica entre os arguidos A...e D..., sendo o primeiro a exigir-lhe o pagamento imediato ou até às 15 horas do dia seguinte, senão iria ter com o pai dele. No dia seguinte, pelas 13 h35m, o arguido A...insiste com o D...pelo dinheiro. O mais resulta inelutavelmente das regras da experiência. Artigo 20º, da acusação pública (factos provados): Valorámos os autos de revista pessoal de fls. 417 e de busca e apreensão de fls. 423-424, confirmado pelos Srs. Inspectores da PJ , sendo estes claros quanto à localização dos bens em causa e à não indicação, por banda da mulher do arguido A…, que os bens em causa não pertencessem àquele, confirmando sim que era ali que o mesmo morava, com ela e os filhos menores. Atendemos, também, às fotografias de fls. 425-427 e 431-436 e às perícias de fls. 1412 e ss.. Mais considerámos o exame pericial a telemóvel de fls 655 a 800. Artigo 21º, da acusação pública (factos provados): Valorámos os autos de revista pessoal de fls. 442 e de busca e apreensão de fls. 446, confirmado pelos Srs. Inspectores da PJ , sendo estes claros quanto à localização dos bens em causa e à indicação, por banda do arguido B..., de que o quarto onde foram apreendidos os bens era por si ocupado, não tendo sequer declinado a detenção, por si, dos bens em causa. Atendemos, também, às fotografias de fls. 447-448 e às perícias de fls. 1412 e ss e 1445. Mais considerámos o exame pericial a telemóvel de fls 889 a 957. Artigos 22º a 25º, da acusação pública (factos provados): Tais factos inferem-se da matéria provada, sendo que não há o menor indício de que os arguidos hajam sido coagidos a actuar da forma como o fizeram. Aliás, é do conhecimento geral a ilicitude criminal deste tipo de condutas, o que, no concernente à droga, resulta à evidência da linguagem codificada empregue nas conversações telefónicas. Outros Factos: Atendemos aos relatórios sociais juntos ao processo, bem como aos certificados de registo criminal aí também juntos. * No caso dos autos, face às conclusões da motivação do recorrente arguido D... as questões a decidir são as seguintes : - se a matéria dada como provada nos pontos n.ºs 18.º, 19.º e 24.º dos factos provados do acórdão recorrido deve ser considerada não provada, por a mesma se alicerçar relativamente ao recorrente exclusivamente nas escutas telefónicas, violando o disposto nos artigos 356.º, 357.º e 125.º do C.P.P.; e - subsidiariamente, caso não seja absolvido, se a pena aplicada lhe deve ser reduzida e suspensa na execução. ---- Passemos ao conhecimento da primeira questão. O arguido D... impugna a matéria dada como provada nos pontos n.ºs 18, 19 e 24, dos factos dados como provados, começando por dizer que não se conforma com o entendimento do Tribunal a quo no sentido de que as escutas telefónicas constituem um meio de prova autónomo relativamente às declarações do arguido. No seu entender, a intercepção e gravação de conversações telefónicas não constituem, em sentido técnico, meios de prova e aquela factualidade dada como provada alicerça-se, pelo menos no que diz respeito ao recorrente, exclusivamente nas escutas telefónicas. Através da escutas telefónicas não se poderá considerar directamente provado um determinado facto que não seja a mera existência e o conteúdo da própria conversação. O arguido/recorrente negou peremptoriamente que se dedicava ao tráfico de estupefacientes – remeteu-se ao silêncio – e nenhum co-arguido ou testemunha ouvida em audiência de julgamento confirmou tal actividade. As transcrições das escutas telefónicas, quando muito, poderão indiciar que o recorrente consumiu haxixe e que poderia tê-lo comprado, justificando dessa forma a falta de pagamento. As transcrições foram valoradas segundo o princípio da livre apreciação da prova, violando assim os arts.356.º, 357.º e 125.º do C.P.P.. Vejamos. O art.125.º do C.P.P. estabelece que “ são admissíveis as provas que não forem proibidas por lei.”. Esta norma deixa pressuposta, por um lado, a existência de provas que são proibidas e que como tal não podem ser utilizadas para formar a convicção do tribunal relativamente ao objecto do processo e, por outro, a existência de meios de prova atípicos, que podem ser valorados pelo julgador. As provas proibidas ou inadmissíveis são aquelas que não podem ser admitidas ou valoradas no processo, ainda que obtidas por meios não proibidos, como são exemplo a leitura em audiência de julgamento, de autos e declarações prestadas no inquérito e na instrução, fora do condicionalismo legal estabelecido nos artigos 356.º e 357.º do Código de Processo Penal. Se o Tribunal proceder ou admitir a leitura proibida nos termos destes preceitos, essa admissão é inválida e o meio de prova não pode ser considerado para formar a convicção do julgador.[7] O art.356.º do C.P.P., estabelece as circunstâncias em que é permitida a leitura em audiência de julgamento de autos e declarações do assistente, das partes civis ou de testemunhas, e o seguinte, art.357.º, regula os termos em que é permitida a leitura em audiência de julgamento de autos e declarações do arguido. Passando às escutas telefónicas, cremos ser pacífico dizer que elas são um meio de obtenção da prova, isto é, um meio de investigação para demonstração do thema probandi. Já a transcrição das gravações obtidas através de operação de intercepção telefónica e sua junção aos autos não tem que ver com meios de investigação, mas sim com prova, com fonte de convencimento do tribunal que fica documentada nos autos, como resulta do estabelecido no art.188.º do Código de Processo Penal. A jurisprudência vem entendendo que as escutas telefónicas transcritas em auto e juntas ao processo passam a constituir prova documental , submetida ao princípio da livre apreciação da prova.[8] Na doutrina, o Prof. Germano Marques da Silva, fazendo a distinção entre meios de obtenção de prova e meios de prova, defende que enquanto a escuta telefónica é um meio de obtenção de prova, as gravações são já um meio de prova.[9] O Dr. Guedes Valente entende, por sua vez, que “ desde que o auto de transcrição esteja junto ao processo , o mesmo passa a ser prova documental.”.[10] Esta é também a posição seguida pela doutrina e jurisprudência na vizinha Espanha , como se pode ver , nomeadamente , na obra “La prueba penal” , do Magistrado e Doutor em Direito Carlos Climent Durán , onde , para além da transcrição de trechos de sentenças do Tribunal Supremo , se diz: “ Tras las escuchas telefónicas , y una vez recibidas em el Julgado de Instrucçion las grabaciones íntegras y originales , entregadas por los funcionarios policiales que han realizado las escuchas , se entra en uma fase processual diferente , en la que se trata de formalizar el resultado de las escuchas telefónicas a fin de que puedan servir de medio probatorio durante el juicio oral. Dicho de outra manera , la información en bruto que existe en las citas magnetofónicas , o sea , el contenido de las conversaciones telefónicas , integras y originales , se ha de transformar en un instrumento probatorio preconstituido capaz de destruir la presunción de inocencia durante el acto del juicio oral”.[11] O Tribunal da Relação não vê razão para modificar o que vem sendo defendido pela doutrina e jurisprudência citada. As gravações das escutas telefónicas, realizadas na sequência de autorização judicial face a suspeitas fundadas de crimes de tráfico de estupefacientes, mandadas transcrever pela autoridade judiciária competente em auto e juntas ao processo, são um meio de prova documental a valorar pelo Tribunal de acordo com o princípio da livre apreciação da prova previsto no art. 127.º do Código de Processo Penal. Este princípio estabelece que “Salvo quando a lei dispuser de modo diferente , a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.”. As normas da experiência são «...definições ou juízos hipotéticos de conteúdo genérico, independentes do caso concreto “sub judice”, assentes na experiência comum, e por isso independentes dos casos individuais em cuja observação se alicerçam, mas para além dos quais têm validade.»[12]. Sobre a livre convicção do juiz diz o Prof. Figueiredo Dias que esta é “... uma convicção pessoal - até porque nela desempenha um papel de relevo não só a actividade puramente cognitiva mas também elementos racionalmente não explicáveis (v.g. a credibilidade que se concede a um certo meio de prova) e mesmo puramente emocionais - , mas em todo o caso , também ela uma convicção objectivável e motivável , portanto capaz de impor-se aos outros.”[13]. O preceituado no art.127.º do Código de Processo Penal tem-se, assim, por cumprido, quando a convicção a que o Tribunal chegou se mostra objecto de um procedimento lógico e coerente de valoração, com motivação bastante, e onde não se vislumbre qualquer assumo de arbítrio na apreciação da prova. Feita esta breve abordagem ao processo penal podemos já concluir que as transcrições das escutas telefónicas não constituem declarações dos arguidos prestadas em inquérito, sujeitas ao disposto no art.357.º do C.P.P. – norma específica dirigida às declarações prestadas pelos arguido -, mas sim prova documental, que vale em audiência de julgamento, mesmo que aí não se tenha procedido à sua leitura ( art.355.º, n.º1 e 2 do C.P.P.). Assim, a sua valoração pelo Tribunal a quo não viola o disposto nos artigos 356.º, 357.º e 125.º do C.P.P.. No caso em apreciação, o Tribunal a quo deu como provado, no ponto n.º1 do acórdão recorrido, que o arguido A..., pelo menos durante o ano de 2010 até á sua detenção a 4 de Julho do mesmo ano, na cidade de Castelo Branco, dedicou-se à prática da cedência, mediante contrapartida monetária, de pelo menos haxixe e pólen de haxixe, retirando dessa actividade, pelo menos parte dos seus rendimentos. Dos pontos n.ºs 12 e 13 da factualidade dada como provada no acórdão recorrido consta que o arguido A…, no âmbito daquela actividade também colocava o haxixe e pólen de haxixe à disposição de outros indivíduos para que fossem estes a cedê-los aos consumidores, mediante contrapartida monetária, recolhendo posteriormente pelo menos parte do produto monetário de tal venda. Fundamentou o Tribunal a quo esta matéria de facto dada como provada e que não foi impugnada por parte do arguido D..., nas transcrições das gravações, bem como em prova testemunhal quanto a serem apenas haxixe e pólen de haxixe os estupefacientes transaccionados. Assente, em face desta factualidade, que o arguido A...traficava haxixe e pólen de haxixe, por si e através outros indivíduos, para que fossem estes a cedê-los aos consumidores, mediante contrapartida monetária, recolhendo posteriormente pelo menos parte do produto monetário de tal venda, verifica-se das transcrições juntas aos autos que o arguido D... não só mantinha contactos telefónicos com aquele arguido A…, mas ainda que esses contactos respeitavam ao escoamento daquele tipo de produto estupefaciente, e que o arguido/recorrente para além de o vender tinha de apresentar contas ao arguido A...das vendas que efectuava. Pese embora o arguido/recorrente D... se tenha remetido ao silêncio, fazendo uso de um direito, as transcrições constantes dos Apensos, descritas na fundamentação da matéria de facto dada como provada nos pontos n.ºs 18 e 19 do acórdão recorrido, explicam de forma medianamente clara e por vezes bem explicita, como este desenvolvia a venda daquele tipo de estupefacientes por conta do arguido António. Nada aponta nas transcrições em causa para que a falta de pagamento que se menciona nas transcrições respeitava a haxixe que ele próprio consumiu. Deste modo, não é arbitrário e violador das regras da experiência comum, que o Tribunal a quo, no âmbito da imediação e da oralidade, tenha dado credibilidade à prova documental resultante das citadas transcrições das escutas telefónicas e, face à globalidade da prova produzida em audiência de julgamento, examinada criticamente na fundamentação da matéria de facto do acórdão recorrido, tenha dado como assentes os factos constantes dos impugnados pontos n.ºs 18, 19 e 24 do acórdão recorrido. ---- Passemos agora ao conhecimento da segunda questão. Considerando os factos dados como provados é inquestionável que o arguido D..., com a sua conduta descrita nos factos dados como provados, preencheu todos ao elementos constitutivos de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p. e p. pelo art. 25.°, alínea a), do Decreto-Lei n.º15/93, de 22 de Janeiro, com referência à tabela I-C anexa ao referido diploma. O crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, tipificado no art. 25.°, alínea a), do DL. n.º 15/93, de 22 de Janeiro, é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos. O Tribunal a quo, tendo em consideração que o arguido D... tinha à data dos factos 20/21 anos de idade (considerando a indefinição temporal no primeiro semestre de 2010), não lhe sendo conhecidos antecedentes criminais e dispondo de retaguarda familiar e profissional, proporcionada pelos pais, entendeu haver razões para formular um juízo de prognose favorável à ressocialização do arguido D... e, consequentemente, decidiu aplicar-lhe o regime penal especial para jovens com idade compreendida entre os 16 e os 21 anos de idade, estabelecido pelo DL n.º 401/82, de 23 de Setembro. Por força do disposto no art.4.º do DL n.º 401/82, de 23 de Setembro, e do art.73.º do Código Penal, a pena abstracta aplicável ao arguido D...., passou a ser de 30 dias a 3 anos e 4 meses de prisão. O Tribunal a quo, fazendo apelo às circunstâncias que o levou à aplicação ao arguido D... do regime penal especial para jovens delinquentes, ao valor monetário do pólen de haxixe decidido ao arguido e à sua participação no esquema de distribuição, decidiu aplicar-lhe uma pena de 6 meses de prisão. Seguidamente, ponderou o Tribunal a quo a substituição desta pena de 6 meses de prisão por penas não detentivas. Depois de afastar a substituição da pena de 6 meses de prisão pela pena de multa, decidiu que a pena de prestação de trabalho a favor da comunidade, seria a pena de substituição adequada, por só esta garantir que a pena é sofrida pessoalmente pelo condenado e o trabalho ser uma forma digna e responsabilizante do arguido. Assim, na fundamentação de direito, decidiu substituir a pena de 6 meses de prisão em 180 horas de trabalho a favor da comunidade - por manifesto lapso, no dispositivo do acórdão, o Tribunal a quo, depois de declarar que substituia a pena de 6 meses de prisão, por prestação de trabalho a favor da comunidade, pelo período de 180 horas, colocou entre parênteses (quatrocentas e oitenta) horas. O recorrente D... vem agora, subsidiariamente à sua absolvição, sustentar que lhe deve ser reduzida a pena aplicada na decisão recorrida e ser-lhe suspensa a execução da pena de prisão, pois não é nenhum traficante na verdadeira acepção da palavra; o produto estupefaciente é uma droga “leve”, é o pequeno grau de culpa, poucas as exigências de prevenção e está integrado na sociedade, é pessoa educada, trabalhadora e honesta. Vejamos. O art.71.º do Código Penal estatui que a determinação concreta da medida da pena , dentro dos limites definidos na lei , é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção , devendo o tribunal atender a todas as circunstâncias que , não fazendo parte do tipo de crime , depuserem a favor do agente ou contra ele . O art.40.º, n.º1 do Código Penal, define as finalidades das penas e das medidas de segurança , estabelecendo que « a aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade » . O objectivo último das penas é , pois , a protecção , o mais eficaz possível , dos bens jurídicos fundamentais. A protecção dos bens jurídicos implica a utilização da pena como instrumento de prevenção geral, servindo quer para dissuadir a prática de crimes, através da intimidação das outras pessoas face ao sofrimento que com a pena se inflige ao delinquente ( prevenção geral negativa ou de intimidação ) , quer para manter e reforçar a confiança da comunidade na validade e na força de vigência das normas do Estado na tutela de bens jurídicos e , assim , no ordenamento jurídico-penal ( prevenção geral positiva ou de integração). A reintegração do agente na sociedade está ligada à prevenção especial ou individual , isto é , à ideia de que a pena é um instrumento de actuação preventiva sobre a pessoa do agente , com o fim de evitar que no futuro, ele cometa novos crimes, que reincida. Em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa ( art.40.º, n.º 2 do Código Penal ). No presente caso, o grau de ilicitude dos factos é mediano, pois apenas se apurou que o arguido, durante um período de cerca de meio ano participou num plano de escoamento de haxixe e pólen de haxixe, por conta do arguido A…, procedendo para o efeito à venda dos produtos a consumidores, ficando uma parte dos lucros para o arguido A...e outra para o arguido/recorrente. Nesta actividade o arguido D... vendeu pelo menos produtos estupefacientes no valor de € 220,00. As consequências do crime embora não sejam elevadas, também não são diminutas, sendo mediano o grau de violação dos deveres que lhe são impostos. Quanto à conduta posterior do arguido, foi apurado que alterou os seus relacionamentos, passando a conviver com pessoas mais integrados socialmente e apresenta capacidades de raciocínio autocrítico em relação ao seu envolvimento na presente situação jurídico-penal e reconhece os danos causados a si próprio e a eventuais vítimas. O arguido é de modesta condição social e económica, encontrando-se inserido na família, de quem tem apoio, e exerce uma profissão, na qual aufere cerca de € 600,00 mensais. As exigências de prevenção geral são elevadas e prementes , tendo em conta , nomeadamente, o elevado número de pessoas que praticam este tipo de tráfico de estupefacientes, com grande prejuízo para a saúde dos consumidores, e contribuição indirecta para a prática de outros crimes, quer contra as pessoas , quer contra o património. As razões de prevenção especial ou individual são medianas. Conjugando todas as circunstâncias descritas concluímos que a pena de prisão de 6 meses aplicada pelo Tribunal a quo ao arguido é equilibrada e ajustada à culpa e às exigências de prevenção, não violando as disposições legais invocadas pelo recorrente . Dentro das penas de substituição da prisão, em sentido próprio, encontram-se para além da pena de multa, a que alude o art.43.º do Código Penal, também as penas de suspensão de execução da prisão ( art.50.º do C.P.) e de prestação de trabalho a favor da comunidade ( art.58.º do C.P.). São só considerações preventivas, nomeadamente de prevenção de socialização, que podem ser erigidas em critério de escolha da pena de trabalho a favor da comunidade, posto que a ela não se oponham razões de salvaguarda do mínimo de prevenção de integração, sob a forma de tutela do ordenamento jurídico.[15] Acontece, porém, que o arguido D... não deu pessoalmente o seu consentimento ou adesão a esta pena de substituição, tendo sido a sua Ex.ma Defensora quem, na ausência daquele na audiência de julgamento do dia 29 de Abril de 2011, aceitou a eventual substituição da pena de prisão em que viesse a ser condenado por pena de trabalho a favor da comunidade. O pressuposto material da suspensão da execução da pena de prisão é que o tribunal , atendendo à personalidade do arguido e às circunstâncias do facto , conclua que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição . A suspensão da execução da pena é , sem dúvidas , um poder vinculado do julgador , que terá de a decretar sempre que se verifiquem os respectivos pressupostos . Deste modo, o tribunal, quando aplicar pena de prisão não superior a 5 anos deve suspender a sua execução sempre que , reportando-se ao momento da decisão , o julgador possa fazer um juízo de prognose favorável ao comportamento futuro do arguido , juízo este não necessariamente assente numa certeza , bastando uma expectativa fundada de que a simples ameaça da pena seja suficiente para realizar as finalidades da punição e consequentemente a ressocialização , em liberdade , do arguido . Todavia, « a suspensão da execução da prisão não deverá ser decretada » - mesmo em caso de « conclusão do tribunal por um prognóstico favorável ( à luz de considerações exclusivas de prevenção especial de socialização), se a ela se opuseram (…) as finalidades da punição » ( art.50.º, n.º 1 e 40.º , n.º1 do Código Penal ), nomeadamente « considerações de prevenção geral sob a forma de exigência mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico », pois que « só por estas exigências se limita – mas por elas se limita sempre – o valor da socialização em liberdade que ilumina o instituto.».[16] A pena aplicada ao arguido D... é inferior a 5 anos de prisão, e existe um prognóstico favorável àquele à luz de considerações exclusivas de prevenção especial de socialização, uma vez que é um jovem, sem antecedentes criminais, com apoio familiar e hábitos de trabalho, que revela capacidade autocrítica do seu comportamento, mostrando vontade de abandonar os relacionamentos pessoais que o ligavam ao meio da toxicodependência. Considerando a gravidade do facto, a integração social e a conduta posterior do arguido, é razoável considerar que não voltará a delinquir no âmbito do tráfico de estupefacientes e, assim, que não existem razões de prevenção geral que obstem à suspensão da execução da pena aplicada. Sendo de concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, o Tribunal da Relação entende suspender-lhe a execução da pena de prisão, pelo período de um ano ( art.50.º, n.º 5 do Código Penal ), suspensão esta acompanhada de regime de prova, assente num plano de reinserção social ( art.53.º, n.ºs 2 e 3 do Código Penal ). Pelo exposto, procede parcialmente esta questão e, consequentemente, o recurso interposto pelo arguido D.....
Decisão
Nestes termos e pelos fundamentos expostos acordam os juízes do Tribunal da Relação de Coimbra em conceder parcial provimento ao recurso interposto pelo arguido D... e, revogando o acórdão recorrido na parte em que substituiu a pena de 6 meses de prisão por pena de trabalho a favor da comunidade pelo período de 180 horas, decide-se suspender-lhe a execução da pena de 6 ( seis) meses de prisão que lhe foi aplicada, pelo período de um ano, suspensão esta acompanhada de regime de prova, assente num plano de reinserção social ( art.53.º, n.ºs 2 e 3 do Código Penal ), mantendo-se, no mais, o douto acórdão recorrido. Sem custas.
Orlando Gonçalves (Relator) Alice Santos
[3] In www.dgsi.pt. No mesmo sentido, nas Relações, entre outros, os Acs. da RP, de 09.03.2011, relator Des. DONAS BOTO, in www.dgsi.pt, e de 05.11.2008, relator Des. MARIA DO CARMO SILVA DIAS, no mesmo sítio da internet, e da RC, de 29.03.2006, relator Des. Ribeiro ., in www.dgsi.pt. [8] Cfr. entre outros , os acórdãos do STJ de 5 de Fevereiro de 1998 ( CJ , STJ , ano VI , 1º pág. 192) e de 17 de Junho de 2004 ( www.stj.pt) , da Relação de Lisboa , de 12 de Janeiro de 2000 ( CJ, ano XXV, 1, pág. 135) e da Relação de Guimarães , de 19 de Maio de 2003 ( CJ, n.º 167 , pág. 299). [9] Curso de Processo Penal , II , Verbo, 5.ª edição, pág. 280. [10] “Processo Penal” , I , Almedina , pág.409. [12] cfr. Prof. Cavaleiro de Ferreira , in “Curso de Processo Penal”, Vol. II , pág.300. [15] - cfr. Prof. Figueiredo Dias, “Direito Penal Português, as Consequências do Crime”, páginas 371 e 372. [16] Cfr. Prof. Figueiredo Dias , in “Direito Penal Português , as Consequências do Crime”, § 520). |