Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | MÁRIO RODRIGUES DA SILVA | ||
Descritores: | PRAZO DE PRESCRIÇÃO DO PROCEDIMENTO CONTRAORDENACIONAL CAUSAS DE SUSPENSÃO E INTERRUPÇÃO CONTAGEM | ||
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Data do Acordão: | 07/08/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | JUÍZO DO TRABALHO DE COIMBRA DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA | ||
Texto Integral: | N | ||
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Meio Processual: | RECURSO DE CONTRAORDENAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Legislação Nacional: | ARTIGOS 52.º, 53.º, N.º 2, E 54.º, N.º 3, DA LEI N.º 107/2009, DE 14-09, 7.º, N.ºS 3 E 4, E 10.º, DA LEI N.º 1-A/2020, DE 19-03, 37.º DO DECRETO-LEI N.º 10-A/2020, DE 13-03, 5.º DA LEI N.º 4-A/2020, DE 06-04, 6.º E 10.º DA LEI N.º 16/2020, DE 29-05, 6.º-B, N.ºS 3 E 4, DA LEI N.º 1-A/2020, DE 19-03, NA VERSÃO DA LEI N.º 13-B/2021, DE 05-04, E 5.º E 7.º DA LEI N.º 13-B/2021, DE 05-04 | ||
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Sumário: | I – Nos termos conjugados dos arts. 52.º, 53.º, n.º 2, e 54.º, n.º 3, da Lei n.º 107/2009, de 14-09, a prescrição, cujo prazo normal é de cinco anos, ocorre sempre, apesar de terem ocorrido causas de interrupção e de suspensão, desde que decorridos oito anos desde a data da prática do facto contraordenacional.
II – A este prazo prescricional é ainda de acrescentar o prazo de 86 dias, nos termos dos arts. 7.º, nºs. 3 e 4 e 10.º, da Lei n.º 1-A/2020, de 19-03, 37.º do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13-03, 5.º da Lei n.º4-A/2020, de 06-04, e 6.º e 10.º da Lei n.º 16/2020, de 29-05, e o prazo de 74 dias, nos termos dos arts. 6.º B, nºs. 3 e 4 da Lei n.º 1-A/2020, de 19-03, na versão da Lei n.º 13-B/2021, de 05-04, e 5.º e 7.º da Lei n.º 13-B/2021, de 05-04, ou seja, no total um prazo de 160 dias. (Sumário elaborado pelo Relator) | ||
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Decisão Texto Integral: |
*** Acordam, em conferência, os Juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Coimbra *** RELATÓRIO O Ministério Público interpôs recurso da sentença que declarou prescrito o procedimento contraordenacional e absolveu a arguida AA da contraordenação muito grave de que vem acusada, prevista e punida pelas disposições conjugadas dos artigos 11.º, n.º 1, 39.º-B, al. a) e 39.º-E, al. a) do DL n.º 64/2007, de 14 de março, alterado e republicado pelo DL n.º 33/2014, de 4 de março, formulando as seguintes conclusões: (…). A arguida respondeu, sustentando em síntese que o recurso deve ser julgado improcedente por não provado, dado que carece de sustento factual, probatório e jurídico. O Exmº PGA junto deste tribunal emitiu parecer, cujo teor se transcreve em parte: “Mesmo na hipótese de apenas se considerar como início da contagem do prazo de prescrição a referida data (18 de Abril de 2017) até á qual, de acordo com os factos provados, o estabelecimento em causa se manteve em funcionamento sem a necessária licença ou autorização, sempre se teria de concluir que o procedimento pela respetiva contraordenação não se encontrava e não se encontra prescrito, considerando o prazo normal de prescrição acrescido de metade (sete anos e seis meses) e ressalvado (acrescido) o tempo de suspensão (de 160 dias: de 09-03-2020 a 02/06/2020 e de 22/02/2021 a 06/04/2021) . Reafirmando que se acompanham e subscrevem as doutas alegações do recorrente, entende-se, assim, que o recurso merece provimento.” A arguida respondeu a este requerimento, dando por reproduzido o requerimento apresentado em 26.03.2025. Colhidos os vistos, realizou-se a conferência. *** OBJETO DO RECURSO Como é sabido, de acordo com o disposto nos artigos 33.° n.º 1 e 50.° do Regime Processual das Contraordenações Laborais e de Segurança Social, aprovado pela Lei 107/2009 de 14/09 (RPCLSS) e, subsidiariamente, nos artigos 403.° n.º 1 e 412.° n.º 1 do Código de Processo Penal (CPP) aplicável “ex vi” do art.º 74º, nº 1 do DL nº 433/82, de 27/10 que aprovou o regime geral das contraordenações (RGCO), o âmbito do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extraia da respetiva motivação, sem prejuízo, contudo, das questões de conhecimento oficioso, designadamente, dos vícios indicados no n.º 2 do artigo 410.° do CPP. Assim, são duas as questões suscitadas: 2. prescrição do procedimento contraordenacional suscitada pelo MP/recorrente. *** FUNDAMENTOS DE FACTO A 1ª instância fixou a matéria de facto da seguinte forma: “Factos provados: 1.º No dia 28 de novembro de 2016, pelas 11 horas, uma equipa da Unidade de Fiscalização do Centro do Instituto de Segurança Social, I.P., constituída pelas inspetoras BB e CC, deslocou-se à rua ..., em ..., ..., com o objetivo de proceder à identificação e avaliação do funcionamento de uma atividade de apoio social a pessoas idosas promovida por AA; 2.º A equipa de inspeção procedeu à visita das instalações, acompanhada pela arguida/proprietária das mesmas, onde constatou que se encontrava a ser promovida uma atividade de apoio social com caraterísticas que a enquadravam numa Estrutura Residencial Para Pessoas Idosas e que acolhia dezoito pessoas idosas, a saber: 1. DD, com o NIF ...70, nascida em ../../1921; 2. EE, NISS ...75, nascida em ../../1929; 3. FF, NIF ...98, nascida em ../../1929; 4. GG, NIF ...73, nascida em ../../1925; 5. HH, NISS ...99, nascida em ../../1938; 6. II, NISS ...79, nascida em ../../1930; 7. JJ, NISS ...65, nascida em ../../1926; 8. KK, NISS ...83, nascida em ../../1950; 9. LL, NIF ...59, nascida em ../../1928; 10. MM, NISS ...87, nascida em ../../1934; 11. NN, NISS ...11, nascida em ../../1926; 12. OO, NISS ...12, nascida em ../../1931; 13. PP, NISS ...40, nascida em ../../1933; 14. QQ, NISS ...56, nascida em ../../1933; 15. RR, NIF ...41, nascida em ../../1936; 16. SS, NIF ...84, nascida em 12.031933; 17. TT, NISS ...66, nascida em ../../1930; 18. UU, NISS ...32, nascido em ../../1931 3.º A atividade de apoio social era desenvolvida num imóvel/moradia unifamiliar de quatro pisos (1.º andar, rés do chão, cave e subcave), cuja área de alojamento era constituída por sete quartos/dezanove camas instaladas (1 quadruplo; 3 triplos e 3 duplos): » o 1.º andar era constituído por instalações sanitárias, um quarto triplo (TT; VV; WW) e um quarto triplo (duas pessoas – MM; LL); » o rés- do - chão era constituído por uma cozinha, arrumos, um escritório (onde se encontram os processos individuais dos utentes e a medicação dos mesmos em caixas individualizadas), uma sala de estar, instalações sanitárias com base de chuveiro, um quarto com quatro camas (JJ; II; KK; DD), um quarto duplo (SS e RR) e um quarto duplo (UU e EE); » a cave era constituída por quarto triplo (FF; XX; GG) e quarto duplo (QQ e NN), uma despensa de dia, uma cozinha e ainda uma sala deestar/sala de refeições; » na subcave encontrava-se instalada a lavandaria/rouparia; 4.º Ao nível das condições de segurança o equipamento dispunha de extintores e uma manta de incêndios colocada na cozinha. Não existiam sistemas de deteção, alarme e alerta contra incêndios, não existindo documentos emitidos pelas entidades competentes que atestassem quer as condições de adequação do ponto de vista funcional e formal das instalações ao uso pretendido, quer das regras de segurança contra risco de incêndio, quer das normas de higiene e de saúde; 5.º No dia da inspeção, foram identificados três trabalhadores que se encontravam presentes no estabelecimento, tendo sido fornecidos os seguintes elementos de identificação: » YY (NISS ...64), ajudante de lar, admitido em junho de 2016; » ZZ, NISS ...12, ajudante de lar, admitida em junho de 2016; » AAA, NISS ...96, sem contrato de trabalho escrito e categoria profissional, admitida em setembro de 2016; 6.º A responsável pelo estabelecimento - AA - identificou-se como assistente social; 7.º Em data posterior à data da ação inspetiva foram facultados os contratos de trabalho com os seguintes trabalhadores, tendo a equipa procedido à pesquisa e recolha de elementos de prova no Sistema de Informação da Segurança Social: » BBB, contrato de trabalho a termo certo parcial (1 ano) celebrado em 1/11/2015, na categoria de cozinheiro; » ZZ, contrato de trabalho a termo certo (6 meses) celebrado em 1/11/2016, na categoria de ajudante de ação direta; » CCC, contrato de trabalho a termo certo (6 meses) celebrado em 1/11/2016, na categoria de ajudante de ação direta; » DDD, contrato de trabalho a termo certo (12 meses) celebrado em 16/07/2016, na categoria de ajudante de ação direta; » EEE, contrato de trabalho a termo certo (12 meses), celebrado em 16/07/2016, na categoria de ajudante de ação direta; » YY, contrato de trabalho a termo certo (12 meses), celebrado em 16/07/2016, na categoria de ajudante de ação direta; » FFF, contrato de trabalho a termo certo (1 ano), celebrado em 1/03/2016, na categoria de ajudante de ação direta; 8.º Segundo a informação fornecida pela arguida, os cuidados de saúde eram disponibilizados pelos médicos de família dos utentes, do Centro de Saúde ... e os cuidados de enfermagem eram assegurados pela em empresa A..., que prestava cuidados ao domicílio; 9.º A prestação de serviços aos residentes tinha como contrapartida o pagamento de valores mensais entre os 650,00 e os 850,00 (informação constante de listagem de residentes fornecida pela responsável pela ERPI); 10.º Na data da inspeção não foram detetadas condições de instalação e de funcionamento que representassem um perigo atual e eminente, suscetível de colocar gravemente em causa a qualidade de vida e os direitos dos utentes; 11.º O equipamento/ imóvel onde o estabelecimento de apoio social se encontrava a ser promovido e desenvolvido, não dispunha de licença de funcionamento ou autorização provisória emitidas pelo Centro Distrital de Coimbra para a promoção e desenvolvimento de tal atividade; 12.º Não existia no Centro Distrital de Coimbra qualquer procedimento de licenciamento das instalações do equipamento em presença; 13.º Em novembro de 2016, a pedido da arguida (requerimento de 5 de novembro de 2016), foi emitido um parecer técnico sobre um projeto de arquitetura para a construção de raiz de um edifício num terreno sito na rua ..., na freguesia ..., no distrito ..., tendo por objetivo uma Estrutura Residencial Para Pessoas Idosas; 14.º O parecer de 22 de novembro de 2016 (Informação do Núcleo de Planeamento n.º 414/2016), foi favorável ao projeto apresentado fixando a capacidade em dezassete residentes; 15.º Em junho de 2018, a pedido da arguida (requerimento de 17 de maio de 2018), foi emitido novo parecer técnico, favorável, sobre um projeto de arquitetura para a construção de uma Estrutura Residencial Para Pessoas Idosas na rua do ..., em ..., no distrito ..., com a capacidade de dezoito residentes; 16ª A arguida não agiu com o cuidado e o dever a que estava obrigada e lhe era exigível em função das circunstâncias, não tendo observado as normas legais inerentes ao exercício da atividade social de ERPI, prosseguindo a referida atividade social de forma ilícita; 17.º Em 18 de abril de 2017, a arguida foi notificada pela Segurança Social da ordem de encerramento administrativo imediato do estabelecimento referido em 1.º nos termos que constam da certidão junta aos autos em sede de audiência de julgamento cujos dizeres dou por integralmente reproduzidos.” Mais se provou: -Em 11 de novembro de 2024 os autos foram remetidos pela Segurança Social a este tribunal (aditado por este Tribunal). * “IV- Factos não provados: Provaram-se todos os factos com interesse para a decisão do mérito da causa: *** Não se responde à restante matéria constante da proposta de decisão e do requerimento de interposição do recurso, por conterem juízos conclusivos, de valor e de direito.” *** FUNDAMENTOS DE DIREITO Alega o mandatário da recorrida de que “em 06-01-2025, o Tribunal de primeira instância proferiu a sentença que, declarando prescrito o procedimento criminal, absolveu a aqui arguida da prática da contraordenação muito grave que lhe vinha assacada. O Ministério Público, discordando da referida decisão, interpôs dela recurso no dia 20-01-2025. Por despacho de 07-02-2025, foi admitido o recurso interposto pelo MP e, no mais, ordenada a notificação da arguida nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 411.º/6 do Código de Processo Penal. O mencionado despacho e o recurso interposto pelo MP foram notificados à arguida, via citius, por ofício de 14-02-2025. No corpo da notificação mencionada no ponto antecedente, pode ler-se o seguinte: «Fica V. Exa. notificada, na qualidade de Mandatário do Recorrente AA, nos termos e para os efeitos a seguir mencionados De todo o conteúdo do despacho de admissão do recurso proferido nos autos acima indicados, que se anexa, bem como dos requerimentos e / ou das motivações apresentadas, com cópia dos mesmos, e para os termos do n.º 1 do artigo 413.º do CPP. Resulta do disposto no artigo 413.º/1 do CPP que “os sujeitos processuais afetados pela interposição do recurso podem responder no prazo de 30 dias contados da notificação referida no n.º 6 do artigo 411.º”. O artigo 248.º/1 do CPC (aplicável ex vi artigo 104.º do CPP) dispõe que a notificação efetuada aos mandatários por via eletrónica presume-se feita no terceiro dia posterior ao do seu envio, ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando não o seja. Assim: a arguida considerou-se notificada para, querendo, contra-alegar, no dia 17.02.2025. O prazo de trinta dias para responder ao recurso terminava, assim, no dia 19.03.2025. A recorrida apresentou a sua resposta ao recurso, no dia 19.03.2025 e, por isso, dentro do prazo previsto no artigo 413.º/1 do CPP conforme foi notificada. Entrementes, e sem que a arguida tenha sido desse facto notificada e / ou tido conhecimento, o processo subiu a este Venerando Tribunal da Relação. E, em 13-03-2025, o MP junto deste Tribunal da Relação de Coimbra emitiu parecer, tendo a arguida sido notificada de tal, em 14-03-2025. Ora, nesta data, como resulta do exposto ut supra, ainda não tinha decorrido o prazo para apresentação da resposta ao recurso interposto pelo Ministério Público. O parecer do Ministério Público não teve assim em consideração a resposta apresentada pela recorrente. Ora, impõe a tramitação processual do recurso que o processo vá com vista ao Ministério Público junto do Tribunal de Recurso após o exercício do contraditório pelo sujeito processual afetado pela interposição do recurso. A preterição da formalidade da audição (ainda que por escrito) da arguida quando a lei comina essa obrigatoriedade (nos termos do disposto nos artigos 411.º/6 e 413.º/1 do Código de Processo Penal) integra a nulidade insanável prevista no artigo 119.º, al. c) do Código de Processo Penal, o que ora se argui para os legais e devidos efeitos. Posto isto: deve ser declarado nulo o parecer do Ministério Público junto do Tribunal da Relação, devendo a resposta ao recurso apresentada pela arguida a 19.03.2025 ser notificada ao Ministério Público junto do Tribunal da Relação para, ulteriormente, elaborar o seu parecer”. Em 31/03/2025 foi proferido o seguinte despacho: “Requerimento de 26-03-2025: Tendo em conta que o Exmº Sr. Procurador-Geral Adjunto no seu parecer, não teve em consideração a resposta da ora recorrida, vão os autos ao MP para querendo, se pronunciar, no prazo de 10 dias sobre o requerimento acima aludido.” O Exmº PGA emitiu o seguinte parecer: “Vista a resposta da arguida, mantém-se o parecer de 13-03-25 (ref.ª 11936258) que, por conseguinte, aqui se dá por reproduzido.” O Ilustre Mandatário da recorrida AA, notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 417.º, n.º 2 do Código de Processo Penal, veio requerer que se dê por integralmente reproduzido o requerimento apresentado em 26.03.2025 (com a refª citius 256538) no que concerne à resposta ao parecer, por razões de economia processual. Tendo em conta esta última tramitação processual (vista e resposta), tem de ser considerar sanada a nulidade arguida. * Na sentença declarou-se a prescrição do procedimento contraordenacional com a seguinte fundamentação: “Á infrações em apreço nos autos aplica-se o regime processual específico das contraordenações laborais e da segurança social previsto na Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro. Este diploma legal estabelece que o procedimento extingue-se por efeito de prescrição logo que sobre a prática de contraordenação hajam decorridos 5 anos (art.º 52.º). Mais se estabelecendo que a prescrição do procedimento tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tenha decorrido o prazo da prescrição acrescido de metade (art.º 54.º, n.º 3). No caso vertente, remontando a infração a 28 de novembro de 2016 (data da visita inspetiva), os sete anos e seis meses (prazo de prescrição de 5 anos acrescido de metade), completar-se-iam em 28 de maio de 2024. Sucede, porém, que atendendo à emergência de saúde pública de âmbito internacional, declarada pela Organização Mundial de Saúde, no dia 30 de janeiro de 2020, bem como à classificação do vírus SARS CoV-2 e da doença COVID-19 como uma pandemia, no dia 18 de março de 2020 foi decretado o estado de emergência em Portugal, através do Decreto do Presidente da República n.º 14-A/2020, renovado pelo Decreto n.º 17-A/2020, de 2 de abril de 2020 (primeira renovação) e pelo Decreto n.º 20-A/2020, de 17 de abril (segunda renovação). Através do Decreto n.º 2-A/2020, de 20 de março, o Governo procedeu à execução do declarado estado de emergência em todo o território nacional (art.º 2.º). Nesse contexto, foi publicada a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março que estabelecia no artigo 7.º, n.ºs 3 e 4 da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março que: 3 - A situação excecional [de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença Covid-19] constitui igualmente causa de suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade relativos a todos os tipos de processos e procedimentos; 4 - O disposto no número anterior prevalece sobre quaisquer regimes que estabeleçam prazos máximos imperativos de prescrição ou caducidade, sendo os mesmos alargados pelo período de tempo em que vigorar a situação excecional; O início da vigência da causa de suspensão do prazo de prescrição prevista neste preceito legal foi fixado em 9 de março de 2020 (art.ºs 10.º da Lei n.º 1-A/2020, 37.º do Decreto-Lei n.º 10-A/2020 e 5.º e 6.º, n.º 2 da Lei 4-A/2020). Em 6 de abril de 2020 foi publicada a Lei n.º 4-A/2020, que alterou o artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, mas manteve os citados n.ºs 3 e 4. A Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, revogou o art.º 7.º da Lei n.º 1-A/2020 (artigo 8.º) e no seu n.º 2 aditou um artigo - o 6.º-A - a essa mesma lei, contendo um regime processual transitório e excecional (art.º 2.º) e deixou de prever a suspensão de quaisquer prazos. Esta lei entrou em vigor no quinto dia seguinte ao da sua publicação, pelo que tendo sido publicada em 29 de maio, o início da sua vigência aconteceu em 3 de junho (artigo 10.º). Em 2021, devido a novo agravamento da crise pandémica, a Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, veio novamente declarar suspensos os prazos de prescrição e de caducidade relativos a todos os processos e procedimentos identificados no n.º 1 do respetivo art.º 6.º-B (n.º 3, do art.º 6.º-B), prevalecendo o disposto no número anterior sobre quaisquer regimes que estabelecessem prazos máximos imperativos de prescrição, aos quais acrescia o período de tempo em que a suspensão vigorasse (n.º 4, do art.º 6.º-B). A Lei n.º 4-B/2021 entrou em vigor no dia a seguir ao da sua publicação (art.º 5.º), em 2 de fevereiro e veio retroagir a produção de efeitos a data anterior, determinando a produção de efeitos a 22 de janeiro de 2021, sem prejuízo das diligências e atos processuais entretanto realizados e praticados (art.º 4.º). O artigo 6.º-B da Lei 1-A/2020 foi depois revogado pela Lei n.º 13-B/2021, de 5 de abril (art.º 6.º), que entrou em vigor em 6 de abril de 2021 (art.º 7.º). Da sucessão dos diplomas legais anteriormente elencados, resulta que por força das medidas excecionais adotadas em decorrência da pandemia por covid-19, operaram-se duas suspensões dos prazos de prescrição: uma suspensão de 86 dias, no período que mediou entre 9 de março e 2 de junho de 2020 (Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril e Lei n.º 16/2020, de 29 de maio) e uma suspensão de 74 dias, no período que mediou entre 22 de janeiro e 6 de abril de 2021 (Lei 4-B/2021, de 1 de fevereiro e Lei n.º 13-B/2021, de 5 de abril), num total de 160 dias. O que significa que, no caso vertente, o prazo de prescrição do procedimento esteve suspenso durante o total de 160 dias, dias estes que terão de acrescer ao dia 28 de maio de 2024, para contagem do prazo de prescrição. Vindo, por isso, a prescrição do procedimento contraordenacional a ocorrer no dia 4 de novembro de 2024. Verifica-se, assim, que na data em que os autos foram remetidos pela Segurança Social a este tribunal -11 de novembro de 2024- já havia decorrido o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional de sete anos e seis meses, previsto no citado art.º 54.º, n.º 3 da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro. Para o início da contagem deste prazo de prescrição não releva a data da notificação da arguida da ordem definitiva de encerramento do estabelecimento - 18 de abril de 2017- ou a data do subsequente cumprimento pela arguida desta ordem (que se desconhece), por três razões. Em primeiro lugar, porque a infração em apreço nos autos, consubstanciada na falta de licenciamento de funcionamento para ERPI, consumou-se no dia da visita inspetiva, ou seja, no dia 28 de novembro de 2016. Em segundo lugar, porque na presente impugnação não é da ordem de encerramento do estabelecimento que a arguida recorre, mas da decisão que lhe aplicou a coima, não sendo o encerramento uma consequência obrigatória e inextrincável do sancionamento da infração praticada pela arguida. Tal resulta do estatuído nos art.ºs 35.º e 36.º do DL n.º 64/2007, ao disporem sobre o encerramento administrativo dos estabelecimentos nos seguintes termos: Artigo 35.º - Condições e consequências do encerramento administrativo 1 - Pode ser determinado o encerramento imediato do estabelecimento nos casos em que apresente deficiências graves nas condições de instalação, segurança, funcionamento, salubridade, higiene e conforto, que ponham em causa os direitos dos utentes ou a sua qualidade de vida; 2 - A medida de encerramento implica, automaticamente, a caducidade da licença ou da autorização provisória de funcionamento, bem como a cessação dos benefícios e subsídios previstos na lei; Artigo 36.º - Competência e procedimentos 1 - O encerramento do estabelecimento compete ao conselho diretivo do Instituto da Segurança Social, I.P., mediante deliberação fundamentada; 2 - Para a efetivação do encerramento do estabelecimento, a entidade referida no número anterior pode solicitar a intervenção das autoridades administrativas e policiais competentes; 3 - O encerramento do estabelecimento não prejudica a aplicação das coimas relativas às contraordenações previstas no regime sancionatório aplicável; E também expressamente do art.º 39.º-H, n.º 1, al. d) do mesmo diploma legal, ao prever a possibilidade de aplicação da sanção acessória de encerramento do estabelecimento nos seguintes termos: 1 - Cumulativamente com as coimas previstas pela prática de infrações muito graves e graves, podem ser aplicadas ao infrator as seguintes sanções acessórias: (…) d) Encerramento do estabelecimento e suspensão da licença ou da autorização provisória de funcionamento. E por último, porque o facto de ter sido notificada em 18 de abril de 2017 da ordem e encerramento e de posteriormente ter cumprido esta ordem não significa, por si só, que a arguida continuou a desenvolver a sua atividade nos mesmos termos desde a visita inspetiva - 28 de novembro de 2016 - até essas datas, sendo que também nada é alegado ou comprovado nos autos pela Segurança Social neste sentido. E, assim sendo, procede a prescrição do procedimento contraordenacional invocada pela arguida e impõe-se decretar a sua absolvição.”- Fim da transcrição. Alega o MP/recorrente que contrariamente ao que refere a sentença sob recurso, é verdade que a infração se consumou na data da visita inspetiva ( 28/11/2016 ) mas não é verdade que nada interesse a ordem de encerramento por estar em causa a falta de licenciamento e não ser o encerramento uma consequência obrigatória e inextrincável do sancionamento da infração, e que tal não significa que continuou a arguida a desenvolver a atividade em causa nos mesmos termos, o que sempre diremos que é em si mesmo uma contradição nos próprios termos: pois se a ordem de encerramento foi cumprida é porque o estabelecimento continuava sem licenciamento de funcionamento para Estrutura Residencial para Idosos ( ERPI ) que é exatamente o cerne da atividade antijurídica objeto dos presentes autos. Pois, a consumação do ilícito prolongou-se no tempo por vontade do seu autor (conclusões 12 e 15). Segundo o MP/recorrente, o termo inicial da prescrição inicia-se quando termina o facto: pelo menos em Janeiro de 2019, pelo que mesmo sem contabilizar os 160 dias de suspensão de tal prazo por força das leis temporárias referentes à Covid 19: art.º 7º, nº 4 da Lei nº 1-A/2020 e art.º 6º- B, nº 4 da Lei nº 4-B/2021, a prescrição apenas ocorrerá em julho de 2026 (conclusão 14). Vejamos. Dispõe o art.º 52.º da Lei n.º 107/2009, de 14-09, que: “Sem prejuízo das causas de suspensão e interrupção da prescrição previstas no regime geral das contraordenações, o procedimento extingue-se por efeito da prescrição logo que sobre a prática da contraordenação hajam decorrido cinco anos. Preceitua ainda o art.º 53.º da Lei n.º 107/2009, de 14-09, que: 1- A prescrição do procedimento por contraordenação suspende-se, para além dos casos especialmente previstos na lei, durante o tempo em que o procedimento: a) Não possa legalmente iniciar-se ou continuar por falta de autorização legal; b) Não possa prosseguir por inviabilidade de notificar o arguido por carta registada com aviso de receção; c) Esteja pendente a partir do envio do processo ao Ministério Público até à sua devolução à autoridade administrativa competente, nos termos previstos no regime geral das contraordenações. d) Esteja pendente a partir da notificação do despacho que procede ao exame preliminar do recurso da decisão da autoridade administrativa competente, até à decisão final do recurso. 2 - Nos casos previstos nas alíneas b), c) e d) do número anterior, a suspensão não pode ultrapassar seis meses.” Estabelece, por fim, o art.º 54.º da Lei n.º 107/2009, de 14-09,3 que: “1 - A prescrição do procedimento por contraordenação interrompe-se: a) Com a comunicação ao arguido dos despachos, decisões ou medidas contra ele tomados ou com qualquer notificação; b) Com a realização de quaisquer diligências de prova, designadamente exames e buscas, ou com o pedido de auxílio às autoridades policiais ou a qualquer autoridade administrativa; c) Com a notificação ao arguido para exercício do direito de audição ou com as declarações por ele prestadas no exercício desse direito; d) Com a decisão da autoridade administrativa competente que procede à aplicação da coima. 2- Nos casos de concurso de infrações, a interrupção da prescrição do procedimento criminal determina a interrupção da prescrição do procedimento por contraordenação. 3- A prescrição do procedimento tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tenha decorrido o prazo da prescrição acrescido de metade.” Deste modo, nos termos conjugados dos preceitos acima citados, a prescrição do procedimento contraordenacional ocorre quando sobre a prática da contraordenação tenham decorrido 5 anos, independentemente do valor da coima aplicável ou a gravidade da infração artigo 52º do RPCOLSS. A contagem da prescrição do procedimento contraordenacional inicia-se com a prática dos factos puníveis por contraordenação e interrompe-se com as diligências previstas no artigo 54º do RPCOLSS. Nessa altura, todo o tempo decorrido se anula, voltando a contagem do prazo a iniciar-se após a diligência que motivou a interrupção. Apesar disto, a prescrição do procedimento verifica-se sempre quando – ressalvado apenas o tempo de suspensão (artigo 53º do RPCOLSS)- sobre a prática do facto tenha ocorrido o prazo normal acrescido de metade, ou seja, 7 anos e meio.[1] Apreciemos, então, a situação concreta. Nos termos do facto provado (1), o facto contraordenacional imputado à arguida neste processo contraordenacional ocorreu em 28/11/2016. Esclarece-se, desde já, que se entende ser a partir desta data, e não a partir de 18/04/2017 que foi a data da notificação da arguida pela Segurança Social da ordem de encerramento administrativo imediato do estabelecimento referido em 1.º. Na realidade, não consta dos factos provados que o referido local onde a arguida exercia a sua atividade profissional tivesse estado em funcionamento, entre 28/11/2016 e 18/04/2017, nas exatas condições verificadas no referido dia 28/11/2016.[2] No caso vertente, remontando a infração a 28 de novembro de 2016 (data da visita inspetiva), os sete anos e seis meses (prazo de prescrição de 5 anos acrescido de metade), completar-se-iam em 28 de maio de 2024. A este prazo prescricional é ainda de acrescentar o prazo de 86 dias, nos termos dos arts. 7.º, nºs. 3 e 4 e 10.º, da Lei n.º 1-A/2020, de 19-036, 37.º do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13-03, 5.º da Lei n.º 4-A/2020, de 06-04, e 6.º e 10.º da Lei n.º 16/2020, de 29-05, e o prazo de 74 dias, nos termos dos arts. 6.º B, nºs. 3 e 4 da Lei n.º 1-A/2020, de 19-03, na versão da Lei n.º 13-B/2021, de 05-04, e 5.º e 7.º da Lei n.º 13-B/2021, de 05-04, ou seja, no total é acrescentado um prazo de 160 dias. O que significa que, no caso vertente, o prazo de prescrição do procedimento esteve suspenso durante o total de 160 dias, dias estes que terão de acrescer ao dia 28 de maio de 2024, para contagem do prazo de prescrição. Vindo, por isso, a prescrição do procedimento contraordenacional a ocorrer no dia 4 de novembro de 2024. Verifica-se, assim, que na data em que os autos foram remetidos pela Segurança Social a este tribunal - 11 de novembro de 2024 - já havia decorrido o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional de sete anos e seis meses, previsto no citado art.º 54.º, n.º 3 da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro. *** DECISÃO: Com fundamento no atrás exposto, acorda-se em negar provimento ao recurso, confirmando-se a sentença recorrida. Sem custas, por o MP ser o recorrente. Coimbra, 8 de julho de 2025 Mário Rodrigues da Silva- relator Jorge Manuel Loureiro Paula Maria Roberto *** Sumário: (…). Texto redigido com aplicação da grafia do (novo) Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, respeitando-se, no entanto, em caso de transcrição, a grafia do texto original
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