Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1412/08.7TBCVL.C2
Nº Convencional: JTRC
Relator: CATARINA GONÇALVES
Descritores: EXPROPRIAÇÃO
PERITO
CONTRADIÇÃO
RISCO OU ESFORÇO
ACTIVIDADE CONSTRUTIVA
Data do Acordão: 03/12/2013
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: 3º JUÍZO DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COVILHÃ
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ART.26º Nº 10 DO CÓDIGO DAS EXPROPRIAÇÕES
Sumário: I – Apesar de o juiz não estar vinculado aos laudos apresentados pelos peritos e apesar de ter o dever de os analisar criticamente, verificando, designadamente, a sua conformidade com os critérios legais, a verdade é que, no que toca às questões técnicas que constituem o cerne da avaliação, o julgador não estará, por regra, habilitado a contrariar as conclusões dos peritos e a formular o seu próprio juízo técnico.

II – Assim, existindo laudos divergentes e não possuindo o juiz quaisquer conhecimentos ou elementos concretos que lhe permitam aferir qual deles tem melhor aptidão para alcançar o valor da justa indemnização, justifica-se que considere ou adira ao laudo maioritário ou ao laudo dos peritos do Tribunal por se dever presumir que as conclusões subscritas por um número maior de peritos, reunindo maior consenso, terão maior aptidão para atingir aquele objectivo ou que os peritos do Tribunal, não tendo sido indicados pelas partes e não tendo com elas qualquer ligação, oferecem melhores garantias de isenção e imparcialidade, estando, por isso, em melhores condições de, com objectividade e isenção, determinar o justo valor da indemnização.

III – Quando o art. 26º, nº 10, do Código das Expropriações se refere à inexistência de risco e esforço inerente à actividade construtiva, está a reportar-se à inexistência de risco que decorre da expropriação (ou seja, o risco não existe porque o expropriado não vai construir efectivamente) e não à inexistência de risco e esforço inerente à actividade construtiva que esteve subjacente à avaliação; a dedução imposta pela norma citada pressupõe que este risco e esforço existem (sendo que quanto maior for esse risco ou esforço maior será a dedução), sucedendo apenas que, por via da expropriação, eles não existirão para o expropriado porque não irá suportá-los.

IV – Porque o grau de risco ou esforço inerente à actividade construtiva condicionam e influenciam o valor do bem no mercado, justifica-se que esse factor seja igualmente ponderado na determinação da justa indemnização, de forma a corrigir o valor obtido com base num determinado aproveitamento construtivo que implicaria um determinado esforço e risco e que não vão ser suportados pelo expropriado, não padecendo de qualquer inconstitucionalidade a norma que assim o determina (o citado art. 26º, nº 10).

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

I.

Nos presentes autos de expropriação, em que é Expropriante o Município da Covilhã e em que é Expropriado, A..., melhor identificados nos autos, e referente à parcela (nº 25), com a área de 341m2, a destacar de um prédio urbano inscrito na matriz urbana sob o art. 778º da freguesia de Santa Maria e descrito na Conservatória do Registo Predial da Covilhã, sob o nº 00163/021192, ambas as partes vieram interpor recurso da decisão arbitral que fixou a indemnização devida pela expropriação em 93.734,17€.

No recurso que interpôs, o Expropriante sustentava que o valor fixado era exagerado e não correspondia ao valor real e corrente do bem e alegava que o factor redutor do potencial de construção não deveria ser superior a 30%, já que o terreno é muito declivoso e está ladeado por construções, além de que o índice de construção de 1,66 não é rigoroso.

Concluía dizendo que o valor do terreno não é superior a 72.274,46€.

O Expropriado, por seu turno, contestava a decisão arbitral pelas seguintes razões:

- Por ter estabelecido a percentagem do art. 26º, nº 6, em 11%, em vez de 15%;

- Por ter feito um agravamento do custo de construção do art. 26º, nº 8, em 15.000,00€, em vez de 5.000,00€;

- Por ter feito indevida aplicação do art. 26º, nº 10, com indevido factor correctivo de 10%;

- Por ter estabelecido um custo de construção com base na Portaria nº 1243/03, de 29/10, apesar de tal interpretação ser inconstitucional;

- Por ter procedido à redução indevida de 10% da área de construção;

- E por ter omitido indevidamente a consideração de caves nas áreas de construção.

Concluía pedindo que a indemnização fosse fixada no valor de 262.500,00€.

Cada uma das partes respondeu ao recurso interposto pela outra, sustentando a sua improcedência.

Foi efectuada a avaliação e, posteriormente, tendo sido constatado que o acórdão arbitral havia avaliado a totalidade do prédio e não apenas a parcela expropriada (o que teria levado o Expropriado a pensar que a expropriação se referia à totalidade do prédio), foi admitido o pedido de expropriação total que havia sido formulado pelo Expropriado para a hipótese de se considerar que a expropriação não incidia sobre a totalidade do prédio.

A expropriação total veio a ser decretada por decisão proferida em 17/06/2010.

Efectuada nova avaliação e apresentadas alegações, foi proferida sentença que, julgando improcedente o recurso do Expropriante e parcialmente procedente o recurso do Expropriado, fixou a indemnização em 111.294,40€ a actualizar nos termos do art. 24º do C.E.

Na sequência da interposição de recurso relativamente a essa sentença (recurso interposto por ambas as partes), veio a ser proferido Acórdão nesta Relação que, anulando a sentença, determinou que se procedesse à realização das diligências necessárias com vista à determinação da área do prédio inscrito na matriz urbana sob o artigo 778 da freguesia de Santa Maria, concelho da Covilhã, após o que seria proferida nova decisão.

Os autos baixaram à 1ª instância onde, na sequência das diligências que aí foram ordenadas, foi proferida nova decisão que, julgando improcedente o recurso do Expropriado e procedente o recurso do Expropriante, fixou a indemnização em 45.059,05€, acrescida da quantia que resultar da sua actualização nos termos do art. 24º do C.E.

Inconformado com tal decisão, o Expropriado veio interpor o presente recurso – admitido como apelação – formulando as seguintes conclusões:

1.ª – O objecto único de uma nova sentença – por determinação do anterior douto acórdão deste Venerando Tribunal – era o de conhecer a área exacta do bem expropriado.

2.ª – A nova douta sentença gorou totalmente tal desiderato, pois que, em vez de procurar a área exacta do bem expropriado, ateve-se à pura forma, sem atender à substância.

3.ª – É que a sentença teve, pela primeira vez, a justificação clara para a fonte do imbróglio que se criara no processo – desde a Decisão Arbitral, aliás – e que levou o Tribunal Superior a decidir que tal dúvida de imbróglio não podia manter-se e tinha de ser tirada de vez.

4.ª – A dúvida do impasse foi tirada, através de documentos fidedignos, e, não obstante, a sentença não os considerou, como se tudo estivesse na mesma, o que é insustentável e premeia a incompetência da EXP.TE.

5.ª – Com efeito, o EXP.TE julga que pode tirar partido das suas falhas, em estilo de venire contra factum proprium, pois

5.ª/1. – que a EXP.TE classificou duas parcelas, a que deu números diferentes, 24 e 25, atribuindo-as por culpa sua a dois proprietários diferentes;

5.ª/2. – que, porém, o EXP.DO é o proprietário da área global das duas parcelas, como resulta de sentença já de 26.03.2001 ocorrida entre vizinhos, um dos quais o EXP.DO, que obteve ganho de causa, isso muito antes da DUP;

5.ª/3. – que foi a EXP.TE que cometeu o erro de ter diferenciado a área global em duas parcelas, a 24 e a 25, o que jamais pode ser imputado ao EXP.DO;

5.ª/4. – que a EXP.TE terá, então, pago a um não proprietário, logo só inventado expropriado, a indemnização por uma das parcelas, a dita 24;

5.ª/5. – que o ora EXP.DO não tem culpa dos erros da EXP.TE, pelo que esta não pode prevalecer-se, sob pena de venire contra factum proprium, desses erros e do indevido pagamento;

5.ª/6. – que uma expropriação não se define por números, mas por áreas reais e por verdadeiros, e não fantasiados, expropriados;

5.ª/7. – que quem paga mal paga duas vezes, o que quer dizer que, tendo a EXP.TE pago a um não expropriado aquilo que devia ter pago ao ora EXP.DO não ficou desonerada de pagar bem a quem devia ter pago, agora com sujeição ao resultado final do processo presente;

5.ª/8. – que nada impede a EXP.TE de pedir a quem pagou o que lhe não era devido a restituição do indevido;

5.ª/9. – que, finalmente, se fosse feita "a vontade" à EXP.TE todo o mais recente processado tinha sido uma inutilidade, desde logo patrocinada pelo Tribunal da Relação – melhor dizendo seria a consagração da prática de actos inúteis, que o Código repele.

6.ª – Ora, o apuramento que o douto acórdão deste Tribunal da Relação, anulando a sentença, mandou fazer, com baixa do processo à 1.ª Instância, era a dúvida – muito para além do que incorrectamente constasse do teor da DUP ou dos elementos matriciais e registrais – a de se a área era ou 341,84m2 ou 760,00m2.

7.ª – A douta sentença concluiu, nesta matéria e de facto o que se transcreveu em supra 8., pelo que à questão justamente colocada pelo Venerando Tribunal da Relação sobre a área do bem expropriado a sentença optou pela área de 341,84m2, renegando que tal área fosse de 760,00m2 e, a partir disso, passou ao cálculo do valor da indemnização.

8.ª – Para tanto, usou da argumentação que se transcreveu em supra 10., reportando-se a meros aspectos formais, que, por natureza, o douto Acórdão da Relação afastara, precisamente porque não eram suficientes, pois caso contrário não se manteria a questão, pelo que, como fundamentação da matéria de facto, nada valem, tornando-a incongruente.

9.ª – Ainda a sentença argumentou o que se transcreveu em supra 12., mas nessa parte a fundamentação não tem igualmente qualquer valor em si, pois que se limita a remeter para os Relatórios Periciais e, sem qualquer juízo crítico, a optar por aquele que designa premonitoriamente de «relatóriomaioritário», pelo tal fundamentação é igual à sua inexistência.

10.ª – Mas a douta sentença vai mais longe, argumentando já para a fixação factual o que também se transcreveu nas alíneas de supra 14., 18. e 19..

11.ª – Tal argumentação representa, salvo o devido respeito, verdadeiro partie prie ou prè-juízo, e também de várias petições de princípio,

12.ª – designadamente desprezando sem qualquer sentido crítico documentos que todos os Srs. Peritos tinham invocado e estavam juntos ao processo e definindo uma "autonomia jurídica" que nada tem a ver com a titularidade da posse e propriedade das ditas parcelas 24 e 25, ambas do EXP.DO, como se demonstrou em supra 14. a 22.3..

13.ª – Em suma: ademais dos factos 1. a 3. de 2.1.1. da douta sentença,

13.ª/1. – deve dar-se como provado que «o EXP.DO é o proprietário das duas Parcelas n.ºs 24 e 25, assim designadas pela EXP.TE na DUP, embora aí por esta indicadas como tendo proprietários diferentes»;

13.ª/2. – deve dar-se como provado que «a área dos bens pela EXP.TE expropriada ao EXP.DO é, no seu cômputo global de 760m2, soma das áreas das referidas parcelas n.ºs 24 e 25»; e

13.ª/3. – deve ser retirado de "não provado" o facto a) de 2.1.2. da douta sentença.

14.ª – A restante matéria de facto está explanada nos pontos 4. a 14. do item 2.1.1. da douta sentença (suas págs. 4 e 5).

POSTO ISTO:

15.ª – Passando à parte de "fundamentação de Direito", pode afirmar-se que a sentença não tem fundamentação de Direito autónoma (cf. suas págs. 8-9.º § em diante).

16.ª – Com efeito, a sentença limita-se a remeter para o Laudo em que faz fé e mais nada (salvo a crítica à matéria de inconstitucionalidade).

17.ª – Mas uma sentença não pode bastar-se com uma fundamentação por remissão.

18.ª – Se tal remissão é lícita, não é suficiente, pelo que não pode aceitar-se que, sobre apenas afirmar crença num Laudo, só porque o subscreveram os Peritos designados pelo Tribunal, a respeito daquilo com que não concorda, se atenha a arredar, sem mais, o outro Laudo.

19.ª – Tinha, no mínimo, o dever de responder a cada um dos argumentos usados pelo EXP.DO – constantes, aliás, na quase totalidade, do "relatório minoritário" – e, salvo no que respeita à matéria de constitucionalidade/inconstitucionalidade do art. 26.º-10 CExp., não o fez em parte alguma.

20.ª – Aliás, a jurisprudência é firme quanto ao valor dos Laudos, como se deixou exposto em supra 35. a 41..

21.ª – Há que, pois, submeter ao Venerando Tribunal da Relação a apreciação dos desprezados argumentos e tratar também de novo a matéria constitucional relativa ao art. 26.º-10 CExp.

22.ª – Ora, os Srs. Peritos designados pelo Tribunal e pelo EXP.TE obstinaram-se em não responderem aos esclarecimentos pedidos, sob o pretexto de que eles é que sabem o que é e deve ser, assim não fornecendo ao Tribunal todos os elementos para este poder julgar bem (supra 39.).

23.ª – O douto Tribunal teria de atentar neste alerta que lhe foi feito nas alegações de 1.ª Instância, pronunciando-se sobre isso, o que o levaria, por certo, a não poder acriticamente dar como credível o chamado «relatóriomaioritário».

24.ª – E isso seria uma razão acrescida para que a sentença demonstrasse por que é os ditos «critérios» do dito «relatório maioritário» deviam prevalecer em comparação com os «critérios» do dito «relatório divergente» – o que não fez em parte alguma, assim privilegiando, sem crítica e sem esclarecimento quanto à preferência cada um desses critérios.

POIS BEM:

25.ª – A renovação da sentença, ora recorrida, não alterou senão nesta os elementos que o processo já possuía que tinham tido incidência sobre o mesmo objecto/área.

26.ª – É, então, possível verificar que sobre o mesmo objecto/área de 760m2 expropriados existem as seguintes avaliações:

a) da Decisão Arbitral = € 93.734,17;

b) do Laudo dos Srs. Peritos designados pelos Tribunal e EXP.TE = € 111.294,40;

c) do Laudo do Sr. Perito designado pelo EXP.DO = € 269.040,00;

d) da redução do pedido pelo EXP.DO para € 239.301,20.

27.ª – A sentença apelada, atendo-se ao Laudo "maioritário" e baseando-se na área expropriada de, apenas, 341,84m2, fixou agora a indemnização em €45.059,05 (a anterior fixara em € 111.294,40).

ORA:

28.ª – Quatro factores ou critérios de avaliação militam para dar crédito ao Laudo do Sr. Perito designado pelo Exp.do e para descredibilizar o Laudo conjunto oposto.

28.ª/1. – O primeiro (supra B1) resulta de o Laudo conjunto aplicar os «valores unitários da construção de acordo com a Portaria nº 1243/2003 de 29 de Outubro publicada na I Série B nº 251» (fls. 502 e 544), enquanto o Laudo do Sr. Perito designado pelo Exp.do se preocupou exclusivamente com a fixação do valor que conduzisse à justa indemnização, sem regime necessariamente restritivo que da aplicação daquela Portaria resulta (fls. 478).

28.ª/1.1. – Ao Tribunal só seria razoavelmente possível aquilatar dos efeitos da aplicação daquela Portaria se os Srs. Peritos do Laudo conjunto cumprissem o que lhes foi ordenado, qual fosse o de apresentarem a sua avaliação com desaplicação desse critério meramente administrativo, atido de maneira fixa ao que dispõe o n.º 5 do art. 26.º CExp. – e não o fizeram.

28.ª/1.2. – Disso não cuidou o douto Tribunal, apesar de saber que, por seu lado, o Sr. Perito designado pelo EXP.DO não aplicou o critério administrativo restritivo, o que já é suficiente – o que foi factor de substancial diferença de valores entre os dois Laudos.

28.ª/1.3. – Adoptar os valores fixados administrativamente, a despeito da norma do art. 26.º-5 CExp, pode estar errado, uma vez que as portarias publicadas ao abrigo daquele artigo se destinam aos «regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada», antes a aplicação de tais «regimes» pode ter como consequência, e normalmente tem, não ser obtido o valor real e corrente e de mercado e, logo, a obtenção, da juta indemnização.

28.ª/1.4. – Aqueles «regimes», para além de se reportarem tão-somente à avaliação para efeitos de arrendamentos para habitação a custos controlados ou de renda condicionada, dividem apenas o País em três Zonas, sendo que cada uma abrange diversos distritos e/ou concelhos (DL. n.º 13/86), pelo que é óbvio que para áreas de determinada Zona com a mesma percentagem, calculada ao abrigo dos n.ºs 6 e 7 do art. 26.º CExp., teríamos o mesmo valor onde quer que o terreno se localize;

28.ª/1.5. – além de que é sabido que o valor dos terrenos varia dentro de uma cidade, e até numa rua de um lado para o outro da mesma.

28.ª/1.6. – E o valor de construção de custos controlados e de rendas condicionadas (habitação social, com pé-direito mínimo e de qualidade inferior à real e corrente do mercado) não corresponde ao valor real e corrente numa situação normal de mercado.

28.ª/1.7. – Deste modo, aplicar cegamente o sistema propugnado pelo citado art. 26.º-5 CExp. – como o faz a douta sentença de maneira acrítica – representa a aplicação de uma norma, ou pelo menos a sua interpretação, inconstitucional, por violação óbvia dos art.s 62.º-2 e 13.º-1 da CRP e correlativos princípios da justa indemnização e da igualdade.

28.ª/2. – A segundo (supra B2) ocorre na divergente percentagem aplicável a "garagem e arrumos", pela qual os cálculos correlativos dão origem a resultados finais diferentes nos dois Laudos.

28.ª/2.1. – Da leitura dos Laudos não vem explanada justificação cabal para o uso da percentagem de 20% ou de 50%.

28.ª/2.2. – Ficava, pois, ao prudente critério do douto Tribunal, cuja experiência corrente é também factor do seu bom senso, mais não seja do que obter oficiosamente ainda informações ou aceitar o que a jurisprudência vem acatando neste particular, que não é, de modo algum, aquilo que o Laudo conjunto pretende.

28.ª/2.3. – A percentagem proposta pelo Laudo do Sr. Perito (corrigida de 0,60 para 0,50) tem a ver com a experiência comum do espaço necessário por cada fogo.

28.ª/2.4. – Mas, alertado para estoutro aspecto, a douta sentença nada decidiu sobre ele, aceitando acriticamente o que consta do Laudo conjunto.

28.ª/3. – O terceiro (supra B3) refere-se à diversa percentagem do art. 26.º-6 CExp., apesar de ambos os Laudos coincidirem nas percentagens do art. 26.º-7 CExp..

28.ª/3.1. – Tratando-se de pequena diferença, não deixa de se reflectir no valor final.

28.ª/3.2. Ao douto Tribunal caberia tomar em consideração a excepcional (i) localização, (ii) qualidade ambiental e (iii) estruturas e deveria atentar nos elementos de facto que o processo contém, com uma Parcela (iv) situada em plena cidade, (v) com todos os equipamentos, (vi) com transportes, (vii) «ausência de focos de poluição» e (viii) apoios urbanos.

28.ª/3.3. – Se o tivesse feito, o Tribunal, no seu prudente arbítrio, escolheria a percentagem de 13%.

28.ª/3.4. – Todavia, sobre isto não se pronuncia, mais uma vez recebendo acriticamente o que consta do Laudo conjunto.

28.ª/.4. – O quarto (supra B4) respeita à divergência quanto à aplicação/desaplicação do art. 26.º-10 CExp., matéria que se reflecte no cálculo do valor final.

28.ª/4.1. – A norma do n.º 10 do art. 26.º não tem qualquer lógica jurídica, pois que é incompreensível que um terreno seja desvalorizado pela inexistência do risco e/ou pela inexistência do esforço inerente à actividade construtiva, pois que tais inexistências só justificam a sua valorização e não o contrário.

28.ª/4.2. – Com mais rigor, deve sustentar-se que esta norma, a do citado n.º 2, é manifestamente inconstitucional, já que, por sua natureza, não permite obter o valor da justa indemnização, assim violando o art. 62.º-2 da CRP, na medida em que leva, por princípio, a desvalorizar a propriedade por factores que são motivo óbvio da sua valorização.

28.ª/4.3. – As "inexistências" a que se refere a norma vão reflectir-se necessariamente no «valor real e corrente» dos bens, «numa situação normal de mercado», tudo indispensável para alcançar o valor da justa indemnização (cf. art. 23.º-1 e 5 CExp., e CRP, art. 62.º-2), ou seja, é absurdo (e por isso inconstitucional) que, através de um critério de desvalorização, se não atinja o valor de mercado.

28.ª/4.4. – As existências de risco e/ou do esforço inerente à actividade construtiva é que desvalorizam os bens expropriados perante o mercado.

28.ª/4.5. – Não se trata de qualquer questão de "igualdade", pois que deve ser tratado desigualmente o que é desigual, pelo que é desfocado tratar a matéria do citado n.º 10 no plano do princípio da igualdade e mais absurdo é tratá-lo, ainda, por comparação com os não expropriados (relação externa), pois que a situação não muda de maneira alguma entre os expropriados e os não expropriados.

28.ª/4.6. – No caso vertente, são até os Srs. Peritos do Laudo conjunto quem se encarregam de informar aspectos contraditórios com a pretensão de aplicar a citada norma, como atrás se demonstrou.

28.ª/4.7. – A douta sentença funda-se quase que exclusivamente na transcrição de parte do Ac. TC. n.º 505/2004, pois que praticamente nada acrescenta ao que daquele aresto consta, centrando-se, substancialmente, no princípio da igualdade, que o próprio EXP.DO arredou, pelo que "contraria" aquilo que não foi suscitado.

28.ª/4.8. – E o argumento que usa a seguir nada responde à questão que está posta, antes, pelo contrário, o Tribunal não justifica em parte alguma, com base no artigo em causa, por que razão optou pela percentagem maior de 15% – e sem isso não é cumprido o seu dever de fundamentar.

29.ª – Da exposição objectiva, assim feita nas alegações, pode aquilatar-se que o Tribunal poderia ter dificuldade em compaginar os dois Laudos em divergência, para formular o seu Juízo decisório, pois que eles usam métodos discursivos diferentes, aos quais aplicam de seguida os critérios diferentes que ficaram destacados, mas nem por isso devia eximir-se ao dever de afrontar um por um os argumentos que servem de base ao Laudo efectuado pelo Sr. Perito designado pelo EXP.DO.

30.ª – Se o tivesse feito concluiria que a isenção e fundamentação correcta consta precisamente deste último e desprezado Laudo.

31.ª – Por isso, o Rte. fez ainda o esforço, para maior esclarecimento de quem julga, de uma "uniformização" daqueles métodos divergentes, para que melhor possa o Venerando Tribunal da Relação aperceber-se das consequências do uso de diferentes critérios (supra 93. a 103.).

32.ª – Esta correctíssima maneira de seguir um mesmo método discursivo permitiu estabelecer uma análise objectiva e firme e fazer verificar que não pode merecer credibilidade o Laudo conjunto por demais referido, tratando-se, como se trata em exclusivo, de fixar a justa indemnização (CRP, art. 62.º-2, CExp., art. 23.º) e no que respeita ao Laudo do Sr. Perito designado pelo Exp.do que ele deve ser corrigido para menos, com a correlativa redução do pedido para € 239.301,20.

32.ª – Mas nisso não atentou a douta sentença – a qual, pelo exposto, violou o art. 23.º CExp. e 62.º-2 CRP..

Assim, conclui, julgada provida a apelação, deve a sentença ser revogada, fixando-se o valor da indemnização, não em € 45.059,05, mas em € 239.301,20.

O Expropriante/Apelado apresentou contra-alegações, sustentando a improcedência do recurso.


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II.

Questões a apreciar:

Atendendo às conclusões das alegações do Apelante – pelas quais se define o objecto e delimita o âmbito do recurso – são as seguintes as questões a apreciar e decidir:

• Apurar a área do prédio a considerar nos presentes autos para efeitos de avaliação e indemnização;

• Determinar o custo de construção a considerar, a área destinada a garagem e arrumos, bem como a percentagem a aplicar ao abrigo do disposto no art. 26º, nº 6, do C.E., analisando o valor das conclusões periciais e os termos em que o julgador as deve considerar;

• Determinar se o art. 26º, nº 10, do C.E., ao impor a consideração de um factor correctivo pela inexistência de risco e esforço inerente à actividade construtiva, padece de inconstitucionalidade e se tal dedução deve ou não ser aqui efectuada.


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III.

Na 1ª instância, foi fixada a seguinte matéria de facto:

1. A parcela a expropriar, identificada com o nº 25, é constituída por 341,84 m2, situada na Rua Marquês D’Ávila e Bolama, da freguesia de Santa Maria, na Covilhã, correspondente a um prédio, com a mesma área, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 778 da freguesia de Santa Maria, descrito na Conservatória do Registo Predial da Covilhã, sob o nº 00163/021192, como confrontando de norte com Calçada de Santo André, de sul com as Escadas de Santo André, de nascente com a Rua Marquês D’Ávila e Bolama e de poente com Manuel Penedo Leitão.

2. A declaração de utilidade pública da expropriação, com carácter urgente, da parcela de terreno de A, com a área de 341, 84 m2, descrito na matriz urbana sob o n.º 778, Santa Maria e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº 00163/021192, foi publicada no Diário da República nº 200, II Série, em 25 de Agosto de 2004, com vista à implementação do Programa Polis.

3. O acórdão arbitral, datado de 23.09.2008, por unanimidade, atribuiu “à parcela de terreno com a área de 760,00 m2, que constituiu um prédio inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 778º e descrito na Conservatória do Registo predial sob o n.º 163/021192, da freguesia de S. Maria, concelho da Covilhã”, o valor de 93.734.17 €.

4. A parcela referida em 1. insere-se, segundo o PDM da Covilhã, em “Espaço Urbano – Aglomerado de Nível 1”, sendo o solo classificado como “solo apto para construção”.

5. Tal parcela encontra-se suportada, na parte em que confina com a Rua Marques D´Ávila e Bolama, por um muro em alvenaria aparelhada com a altura de 5,50 metros e, na parte confinante com as escadas de Sto. André, existe um muro de suporte em alvenaria, onde está o portal de entrada para o terreno.

6. De acordo com a planta de ordenamento do PDM, o índice máximo de construção é o seguinte: (i) na faixa de 30 m. de largura compreendida entre os limites das vias públicas pavimentadas e as linhas paralelas a estas, o índice é de 1,66; e (ii) em relação à restante área da parcela, o índice é de 0,66.

7. Toda a área da parcela referida em 1. encontra-se inserida na faixa dos 30 metros: por cada metro quadrado de terreno, pode construir-se (índice de construção bruto): habitação: 1,66 m2, sendo de garagens e arrumos: 0,20 m2.

8. A área útil de construção é de 85 % da área bruta.

9. O custo da construção é de 570,10 € / m2 (área útil).

10. O custo da construção de garagens e arrumos corresponde a cerca de 50 % do da habitação.

11. Ao nível das infra-estruturas existentes (em percentagem):

i. A localização e qualidade ambiental é de 12% (em 15%);

ii. A pavimentação em betuminoso é de 1,5% (em 1,5%);

iii. Os passeios: 0,5% (em 0,5%);

iv. A rede de abastecimento de águas: 1,0% (em 1,0%);

v. A rede de saneamento: 1,5% (em 1,5%);

vi. A rede de distribuição de energia eléctrica: 1,0% (em 1,0%);

vii. A rede de drenagem de águas pluviais: 0,5% (em 1,0%);

viii. A rede de distribuição de gás: 1,0% (em 1,0%);

ix. A rede telefónica: 1,0% (em 1,0%).

12. O factor correctivo, face à inexistência de esforço e risco (desvalorização), é de 15%.

13. Com encargos com desmonte e demolição (correcção pelas especiais condições do local): 5.000,00 €.

14. O valor unitário do solo é de 146,44 € / m2.

A decisão recorrida considerou expressamente como não provado que:

a) O prédio referido em 1. tem uma área de 760 m2.

b) O custo da construção é de 900,00 € / m2.

c) O valor unitário do solo é de 354,00 € / m2.


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IV.

Analisemos, pois, as questões suscitadas no recurso.

Área do prédio.

A propósito da área do prédio – a considerar na presente expropriação para efeitos de avaliação e indemnização – o Apelante, nas conclusões 1ª a 14º das suas alegações, insurge-se contra a sentença recorrida, referindo, em suma, que a mesma desconsiderou a anterior decisão do Tribunal da Relação e que, apesar de existirem elementos para resolver as dúvidas que se suscitavam, a sentença não os considerou.

De facto, alega, resulta dos autos que o Expropriante classificou duas parcelas com números diferentes (24 e 25), atribuindo-as por culpa sua a dois proprietários diferentes, apesar de o Expropriado ser o proprietário das duas parcelas, como resulta de sentença que foi junta aos autos. Mais alega que foi o Expropriante quem cometeu esse erro e, portanto, não poderá o Expropriado ser prejudicado, tendo direito à respectiva indemnização, ainda que o Expropriante a tenha pago a outrem indevidamente.

Sustenta, portanto, o Apelante que a indemnização deve reportar-se à área total dessas duas parcelas (760m2) e que a matéria de facto deve ser alterada, dando-se como provado que o «o Expropriado é o proprietário das duas Parcelas n.ºs 24 e 25, assim designadas pela Expropriante na DUP, embora aí por esta indicadas como tendo proprietários diferentes» e que «a área dos bens pela Expropriante expropriada ao Expropriado é, no seu cômputo global de 760m2, soma das áreas das referidas parcelas n.ºs 24 e 25», devendo ainda ser retirado de "não provado" o facto a) de 2.1.2. da sentença.

Analisando a questão suscitada, importa dizer, desde já, que a sentença recorrida não desconsiderou o anterior acórdão proferido nesta Relação, sucedendo apenas que interpretou os novos elementos que foram obtidos – na sequência do ordenado naquele Acórdão – de forma diferente daquela que é pretendida pelo Apelante.

Vejamos.

Conforme resulta dos autos, a DUP referente à parcela a que os presentes autos se reportam (parcela nº 25) reportava-se a uma parcela com a área de 341,84m2 que fazia parte do prédio inscrito na matriz sob o art. 778 e descrito na Conservatória sob o nº 00163/021192, prédio este que constava da matriz e da Conservatória com a área de 760m2. No acórdão arbitral, os Árbitros avaliaram a totalidade do prédio, considerando a área de 760 m2, e fixaram a respectiva indemnização.

Mais tarde, tendo-se constatado que, não obstante a avaliação efectuada pelos árbitros, estaria em causa uma expropriação parcial, já que a área expropriada era apenas de 341,84m2, foi requerida e foi ordenada a expropriação total do prédio e foi aí que começaram as divergências, já que, tendo sido ordenada a avaliação da totalidade do prédio, os peritos vieram afirmar que, afinal, a expropriação havia incidido sobre a totalidade do prédio e que este não tinha a área que constava das respectivas inscrições matricial e predial mas sim a área que constava da DUP.

Não obstante as dúvidas que se suscitavam, a 1ª sentença proferida nos autos acabou por considerar que o prédio tinha a área de 760m2 e, porque havia sido decretada a expropriação total, fixou a indemnização correspondente a essa área.

Tal sentença foi objecto de recurso, sustentando o Expropriante que o prédio não tinha essa área, mas apenas a área que constava da DUP, inexistindo, por isso, qualquer parcela sobrante.

E foi no âmbito desse recurso que, nesta Relação, veio a ser proferido Acórdão que, anulando a sentença, determinou a realização de diligências com vista a apurar a área do prédio. De facto, porque havia sido decretada a expropriação total – e, portanto, a indemnização deveria reportar-se a toda a área – era importante saber qual era a sua área efectiva (já que havia sérias dúvidas e divergências no que toca a essa matéria).

O que vem, então, a ser apurado na sequência dessas diligências?

Apura-se que, afinal, não existe qualquer parcela sobrante que não tenha sido objecto de expropriação; existiam, sim, duas parcelas igualmente expropriadas: uma com o nº 25 (a que se reportam os presentes autos) e outra com o nº 24 (que está identificada na DUP com a área de 323m2 e como pertencendo ao prédio inscrito na matriz sob o art. 821 e propriedade de Manuel Penedo Valente Leitão).

Importa notar que, quer os peritos, quer as partes (e, portanto, também o Apelante) estão de acordo no que respeita ao facto de não existir qualquer outro terreno no local que pudesse corresponder à parcela sobrante do prédio que foi objecto da expropriação a que se reportam os presentes autos, sendo que o que sustenta o Apelante é que a área sobrante do seu prédio corresponde, afinal, à referida parcela nº 24, mais afirmando, com base em sentença que junta aos autos, que essa parcela é de sua propriedade e que fará parte integrante do seu prédio (prédio que, como se referiu, está inscrito com a área de 760m2) e que, como tal, tem direito à respectiva indemnização, não podendo ser prejudicado pelo erro do Expropriante que indevidamente considerou aquela parcela nº 24 como pertencente a outra pessoa que não o aqui Expropriado.

Que dizer, então, perante esta situação?

Em primeiro lugar, importa dizer que não temos elementos bastantes para concluir que a referida parcela nº 24 faz parte do prédio do Apelante e seja de sua propriedade.

Com efeito, de acordo com os elementos que constam dos autos, a parcela nº 24, com a área de 323m2, fará parte do prédio, que está inscrito na matriz sob o art. 821 e que pertenceria a Manuel Penedo Valente Leitão (importando notar que, como resulta de certidão junta aos autos, a aquisição do respectivo direito de propriedade está inscrito na Conservatória a favor do referido Manuel Penedo, em conformidade com a escritura de justificação referente a esse prédio que também se encontra junta aos autos). Ora, a existência deste prédio e o respectivo direito de propriedade foi reconhecido na sentença na qual o Apelante se baseia para sustentar o seu direito de propriedade, pois que aí se reconheceu que esse prédio (inscrito na matriz sob o art. 821º) pertencia aos ali Réus – o referido Manuel Penedo Valente Leitão e mulher. Importa notar que, nessa acção, os Autores invocavam o seu direito de propriedade relativamente ao prédio em causa nos presentes autos (inscrito na matriz sob o art.778º, com a área de 760 m2) e alegavam que os Réus ocupavam uma parte do referido prédio, pedindo por isso que os mesmos fossem condenados a restitui-lo aos Autores. Ora, a referida sentença, embora reconhecendo o direito de propriedade dos Autores relativamente ao art. 778º, julgou improcedentes os demais pedidos e julgou-os improcedentes por ter considerado que o terreno que os Autores reclamavam não pertencia ao seu prédio e correspondia ao logradouro do prédio dos Réus (o prédio inscrito na matriz sob o art. 821º) que estes haviam adquirido por usucapião.

Ora, se a referida parcela nº 24 corresponde efectivamente ao prédio inscrito na matriz sob o art. 821º, parece claro que ela não fará parte do prédio do Apelante e nunca tal direito lhe foi reconhecido pela sentença a que alude e que, como se referiu, reconheceu que esse direito pertencia aos Réus.

Assim, se a referida parcela nº 24 corresponder, efectivamente, ao prédio inscrito na matriz sob o art. 821º (e nada permite conclusão contrária), o respectivo direito de propriedade não pertencerá ao Apelante, mas sim ao referido Manuel Penedo (como se reconheceu na sentença acima mencionada) e, a ser assim, ter-se-ia que concluir que o prédio do Apelante não tem a área que consta da inscrição matricial e predial, mas apenas a área correspondente à parcela nº 25 (objecto dos presentes autos), já que não há notícia (e nem o Apelante o alega) que exista ali qualquer outra parcela de terreno que pudesse corresponder à parte sobrante do seu prédio.

A fls. 15 das suas alegações, refere o Apelante que o art. 821º corresponde a um prédio com a área coberta de 93 m2 e um logradouro de 323m2 e que a posse deste logradouro foi reconhecida – na sentença acima mencionada – como pertencendo ao aqui Expropriado e que, portanto, o prédio inscrito no art. 821º corresponde apenas à área coberta de 93m2 (sustentando, assim, que aquele logradouro de 323m2 – correspondente à supra referida parcela nº 24 – faz parte do seu prédio, sendo essa, portanto, a área sobrante relativamente à expropriação da parcela nº 25).

Não conseguimos, todavia, descortinar o fundamento dessa alegação, já que o que resulta da sentença junta aos autos é precisamente o contrário daquilo que é afirmado pelo Apelante (ou seja, que o logradouro que era reclamado pelos Autores – em cuja posição o Expropriado veio a suceder – pertencia ao prédio inscrito na matriz sob o art. 821º e não aos Autores, razão pela qual os Réus foram absolvidos do pedido que os Autores formulavam no sentido de tal logradouro lhes ser restituído).

Daí que não seja legítimo afirmar, pelo menos com os elementos que temos disponíveis, que a referida parcela nº 24 pertença ao Apelante e não ao referido Manuel Penedo (reafirma-se que tal conclusão não pode ser extraída, pelas razões invocadas, da sentença em que o Apelante se baseia para sustentar a sua pretensão).

E, como parece evidente, nada permite afirmar – como afirma o Apelante – que o Expropriante tenha incorrido em qualquer erro, ao classificar aquelas duas parcelas com números diferentes, atribuindo-as a proprietários diferentes. É que, de facto, essas parcelas reportam-se a prédios autónomos, com inscrições matriciais próprias e que constavam das inscrições e descrições matricial e predial como pertencendo a pessoas diferentes e – reafirma-se – nada permite afirmar que assim não seja, já que, como resulta da sentença que o Apelante invoca, esses prédios existiam e eram confrontantes, ali tendo sido reconhecido que um deles pertencia ao aqui Expropriado e o outro pertencia a Manuel Penedo.

 

Mas, ainda que a referida parcela pertença ao Apelante (o que não está demonstrado), a verdade é que não existe qualquer parcela sobrante do prédio que pudesse ser aqui objecto de avaliação e indemnização.

Os presentes autos reportam-se apenas à expropriação de uma parcela (nº 25) que faz parte do prédio inscrito na matriz sob o art. 778º e, portanto, a indemnização a fixar nestes autos reportar-se-ia, em princípio, apenas a essa área. Só assim não seria se estivesse em causa uma expropriação parcial e se viesse a ser decretada a expropriação total, caso em que a indemnização teria que ser reportada a todo o prédio. Acontece que a expropriação total pressupõe a existência de uma expropriação parcial que, posteriormente, vem a estender-se à totalidade do prédio e foi nesse pressuposto que ela foi decretada nos presentes autos. A verdade é que – como agora se constata – não existiu qualquer expropriação parcial, porque a parcela de terreno que, segundo o Apelante, corresponderia à parte sobrante também foi objecto de expropriação.

Ou seja, ainda que aquela parcela (nº 24) pertença ao Apelante ela não poderia ser considerada nestes autos como parcela sobrante para efeitos de expropriação total, uma vez que também ela foi expropriada.

É certo que, se ambas as parcelas pertencessem ao mesmo prédio ou a prédios do mesmo proprietário, deveria ser aberto um único processo (no 1º caso) ou deveria ser ordenada a apensação dos processos (no 2º caso), como decorre do disposto no art. 39º do Código das Expropriações.

Tal não foi efectuado, nunca foi requerido e nunca essa questão foi invocada, sendo certo, porém, que nada permite concluir pela verificação dos pressupostos de que tal dependia, já que as referidas parcelas estão identificadas como pertencentes a prédios e proprietários diferentes e nada permite afirmar que assim não seja.

A verdade é que a presente expropriação reporta-se à parcela nº 25 com a área de 341m2; não existe qualquer parcela sobrante que possa ser aqui objecto do incidente de expropriação total, já que a parcela sobrante – a existir – corresponderia à parcela nº 24 que também foi objecto de expropriação e que não está incluída no objecto dos presentes autos; não estando demonstrado – ou sequer indiciado – que essa parcela nº 24 pertença ao aqui Expropriado/Apelante, a verdade é que tal parcela foi objecto de expropriação autónoma e, portanto, as questões relacionadas com a respectiva indemnização, quer no que respeita ao valor da indemnização, quer no que respeita à sua titularidade, terão que ser resolvidas no processo referente a tal expropriação ou por qualquer outro meio que se venha a justificar.

Assim, porque os presentes autos apenas respeitam à parcela nº 25 e porque não existe qualquer parcela sobrante que possa aqui ser considerada para efeitos de expropriação total, a indemnização a fixar ter-se-á que reportar apenas à área expropriada, ou seja, à área de 341 m2.

Nestes termos e no que respeita a esta questão, improcedem as conclusões das alegações do Apelante.

Valor da indemnização.
O direito a receber uma justa indemnização pela expropriação por utilidade pública de quaisquer bens ou direitos encontra-se consagrado na Constituição e é concretizado no art.º 23º do Código das Expropriações[1], onde se determina que a justa indemnização visa ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação e que corresponde ao valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efectivo ou possível numa utilização económica normal, à data da declaração de utilidade pública, tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes naquela data.
Conforme dispõe o art. 25º, para efeitos de cálculo da indemnização por expropriação, o solo classifica-se em solo apto para a construção e solo para outros fins.
A sentença recorrida classificou a parcela expropriada como “solo apto para construção” e tal classificação não é posta em causa no presente recurso, não tendo, por isso, sido submetida à apreciação deste Tribunal.
Assim, e dando como assente que estamos perante um “solo apto para construção”, resta saber se a determinação do seu valor obedeceu ou não aos critérios que, para esse efeito, se encontram previstos na lei, sendo certo que, na perspectiva do Apelante, tal não terá acontecido.
A sentença recorrida – adoptando o critério proposto pela laudo maioritário (subscrito pelos peritos do Tribunal e do Expropriante) – fixou a indemnização em 45.059,05€, com base nos seguintes pressupostos:
• Foi considerado o valor unitário de construção de 570,10€/m2 de área útil, de acordo com a Portaria nº 1243/2003 de 29/10, e, com base na relação entre área útil e área bruta, chegou ao custo de construção de 484,59€/m2 para a habitação e de 285,05€/m2 para garagem/arrumos;
• Foi considerado um índice de construção de 1,66m2 para habitação e de 0,20m2 para garagens, chegando ao valor de construção de 861,43€/m2;
• Foi considerada a percentagem total de 20% ao abrigo do disposto nos nºs 6 e 7 do art. 26º, assim distribuída:

i. Localização e qualidade ambiental --------------- 12%;

ii. Pavimentação em betuminoso ------------------- 1,5%;

iii. Passeios -------------------------------------------- 0,5%;

iv. Rede de abastecimento de águas ---------------- 1,0%;

v. Rede de saneamento --------------------------------1,5%;

vi. Rede de distribuição de energia eléctrica -------1,0%;

vii. Rede de drenagem de águas pluviais ----------- 0,5%;

viii. Rede de distribuição de gás ----------------------1,0%;

ix. Rede telefónica --------------------------------------1,0%.

• Foi considerado, ao abrigo do disposto no nº 10 do art. 26º, um factor correctivo de 15%, face à inexistência de esforço e risco;

• E, com base nesses factores, chegou ao valor unitário do solo de 146,44 € / m2, tendo sido ainda deduzido, ao abrigo do nº 8 do art. 26ºum encargo de 5.000,00€ com desmonte e demolição;

Tendo sido esse o critério adoptado na sentença, apreciemos, agora, as razões da discordância do Apelante.

Custo da construção.

A primeira discordância do Apelante relativamente à sentença recorrida prende-se com o valor unitário de construção, dizendo, em termos gerais, que a sentença não deveria ter adoptado, acriticamente, o relatório maioritário e deveria antes ter adoptado o critério proposto pelo perito do Expropriado, por ser este o que conduz à justa indemnização e alegando que a aplicação cega dos valores fixados administrativamente pela referida Portaria é inconstitucional por violação dos arts. 62º, nº 2, e 13º, nº 1, da CRP.

Segundo dispõe o art. 26º, nº 5, “na determinação do custo de construção atende-se, como referencial, aos montantes fixados administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada”.

Quer a sentença recorrida, quer o acórdão arbitral, quer os peritos do Tribunal e do Expropriante atenderam, como referencial, ao preço fixado pela Portaria nº 1243/2003 de 29/10, que, para o ano de 2004 e para a Zona aqui em causa, era de 570,10€€ por m2 de área útil.

O perito do Expropriado considerou um valor de 900,00€/m2, justificando esse facto com a prospecção de mercado que alega ter feito junto da Agência Imobiliária “ERA”.

Ora bem.

Podemos até concordar com o Apelante quando diz que a aplicação cega daqueles valores fixados administrativamente não teria idoneidade para alcançar o valor da justa indemnização e seria, eventualmente, inconstitucional.

Mas, salvo o devido respeito, não foi isso que fez a sentença recorrida e nem tão pouco é isso que decorre do citado art. 26º, nº 5, já que o que aqui se determina não é a aplicação automática daqueles valores, mas sim a sua consideração como valor referencial. Com efeito, e como resulta da norma citada, não é imposta uma correspondência do preço por metro quadrado de construção, para efeito de expropriação, ao preço por metro quadrado de construção fixado administrativamente para efeito da aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada, existe apenas uma obrigação de considerar estes valores como padrão de referência ou como factor indiciário do custo do metro quadrado de construção para o cálculo da indemnização por expropriação.
Ou seja, os referidos valores fixados administrativamente servem apenas como critérios orientadores e referenciais e como forma de obter o valor real e corrente dos bens, até porque aqueles valores reportam-se ao metro quadrado de área útil de construção e não ao metro quadrado de área bruta.
Mas não foi isso que fizeram os peritos do Tribunal e do Expropriante (tal como a sentença)?
De facto, como resulta do relatório inicial que tais peritos apresentaram (e que é confirmado nos subsequentes), aquele valor foi considerado como referência e, segundo dizem, foi adaptado à realidade da construção actual, acrescentando que consideram esses valores ajustados à realidade dos custos praticados na região tendo em atenção a qualidade média das habitações que estão disponíveis no mercado.
Parece claro, portanto, que os referidos peritos não aplicaram aqueles valores de forma cega e automática, antes fizeram as adaptações que entenderam necessárias (operando, designadamente, a conversão da área útil em área bruta) e concluindo por um valor que consideraram ajustado aos custos praticados na região.
Mas, perguntar-se-á, o valor adoptado pelos peritos será mesmo aquele que melhor permite chegar ao valor real e corrente do bem no mercado?

Aqueles peritos dizem que sim; o perito do Expropriado entenderá que não, já que considera um valor superior.

Na perspectiva do Apelante, o laudo que se aproxima do valor da justa indemnização é aquele que foi apresentado pelo seu perito.

Mas por que razão?

Importa notar que este perito do Expropriado considerou um valor de 900,00€/m2, justificando esse facto com a prospecção de mercado que alega ter feito junto da Agência Imobiliária “ B”.

Mas que prospecção? Quais as concretas diligências que fez? Quantas situações ou negócios foram considerados nessa prospecção e que tipo de construção estava aí em causa?

Não sabemos. E, se não sabemos, como poderíamos aderir a esse critério (que é proposto por um único perito) e como poderíamos concluir que o valor assim obtido tem melhor aptidão para se aproximar do valor de mercado do que o valor proposto por quatro peritos?

A verdade é que estamos perante dois laudos divergentes: um subscrito por um perito e outro subscrito por quatro peritos.

Importa não esquecer que, apesar de o juiz não estar vinculado aos laudos apresentados pelos peritos e apesar de estar obrigado a proceder à sua análise crítica para verificar a sua conformidade com os critérios legais, a verdade é que a natureza técnica das questões que lhes estão inerentes – e que, muitas vezes, escapam aos que não possuem conhecimentos específicos na matéria, como será o caso dos juízes – nem sempre permitirá ao julgador aferir se o laudo se aproxima ou não daquele que é o justo valor da indemnização.

Daí que, existindo laudos divergentes e não possuindo o juiz elementos e conhecimentos que lhe permitam infirmar as conclusões técnicas que neles foram vertidas, se imponha ao juiz a necessidade de aderir ao laudo maioritário ou ao laudo dos peritos nomeados pelo Tribunal. É que, apesar de todos os peritos terem, em princípio, iguais conhecimentos e competências, o juiz (que, por regra, não possui conhecimentos específicos na matéria), quando colocado perante diversos laudos divergentes, não consegue infirmar as conclusões técnicas que neles foram vertidas e não consegue, por isso, avaliar qual é o laudo que melhor se adequa ao objectivo que se pretende alcançar: a determinação do valor da justa indemnização. E, nessas circunstâncias, não podendo deixar de decidir e de fixar o valor da indemnização, não terá outra solução que não seja a de aderir ao laudo maioritário (por presumir que as conclusões subscritas por um número maior de peritos terão maior aptidão para atingir aquele objectivo) ou a de aderir ao laudo dos peritos nomeados pelo Tribunal (por presumir que estes, não tendo sido indicados pelas partes e não tendo com elas qualquer ligação, oferecem melhores garantias de isenção e imparcialidade, estando, por isso, em melhores condições de, com objectividade e isenção, determinar o justo valor da indemnização).

Ora, a verdade é que quatro peritos (habilitados a responder a estas questões de carácter técnico e, certamente, conhecedores da envolvente do solo expropriado) consideraram que aquele valor era o adequado, utilizando os critérios legais que, em princípio, são idóneos para alcançar o valor da justa indemnização e não dispomos de quaisquer elementos que nos permitam, de forma fundada e justificada, discordar dessa opinião técnica que, como tal, merece o nosso acolhimento.

E, ao contrário do que considerará o Apelante, isto não corresponde a qualquer adesão ou aceitação acrítica ao referido laudo, sucedendo apenas que não dispondo o Tribunal de quaisquer elementos que lhe permitam discordar da opinião dos peritos em questões de natureza técnica, terá que ser dada prevalência à opinião adoptada por quatro peritos (ao invés daquela que foi adoptada por um), por se dever presumir que as conclusões subscritas por um número maior de peritos, reunindo um consenso mais alargado, terão maior aptidão para atingir o objectivo pretendido: a fixação da justa indemnização.
Afigura-se-nos, pois, em face do exposto, que nada justifica a alteração do valor do custo de construção que foi considerado na sentença recorrida.

Percentagem aplicável a garagem e arrumos.

O Apelante também discorda da sentença recorrida no que se refere à percentagem considerada para garagem e arrumos, alegando, em suma, que a sentença aderiu acriticamente ao laudo conjunto e considerando dever ser adoptada a percentagem adoptada pelo seu perito que tem a ver com a experiência comum do espaço necessário para cada fogo.

Mas, se, na perspectiva do Apelante, a adesão ao relatório maioritário é acrítica, não o seria também a adesão ao relatório subscrito pelo seu perito? Este laudo (subscrito por um perito) tem mais credibilidade que o laudo maioritário (subscrito por quatro peritos) porquê? Tem maior aptidão para chegar ao valor de mercado porquê? Diz o Apelante que a percentagem proposta pelo seu perito (corrigida para 50%) tem a ver com a experiência comum do espaço necessário para fogo. Mas porquê? Quais são as bases ou fundamentos concretos que sustentam essa conclusão? O Apelante não o diz, sendo certo que se limita a fazer afirmações de carácter genérico e abstracto.

É que, na verdade, nada nos permite infirmar ou contrariar as opiniões técnicas de qualquer um dos peritos (sejam eles os do Tribunal, ou os das partes). O apuramento das áreas de construção (designadamente das garagens) prende-se com questões técnicas e com a experiência profissional de cada um dos peritos e, portanto, o tribunal apenas poderá afastar-se das suas conclusões se tiver razões fundadas para considerar que elas estão erradas ou desconformes com a realidade e que, por isso, não têm a aptidão necessária para alcançar o valor da justa indemnização.

Mas, salvo o devido respeito, tal não acontece no caso sub júdice, já que não temos quaisquer razões concretas – e o Apelante também não as enuncia – para fazer aquele juízo relativamente a qualquer um dos laudos que foi apresentado.

Ora, sendo assim e não existindo unanimidade dos peritos, não restará outra solução que não seja a de considerar o laudo maioritário, já que, inexistindo razões concretas para pôr em causa as conclusões de qualquer um dos peritos, teremos que presumir que o laudo maioritário, reunindo maior consenso, é o que terá maior aptidão para atingir o objectivo que se pretende alcançar.

Foi isto que fez a sentença recorrida – o que não se confunde com uma adesão acrítica ao relatório maioritário, como sustenta o Apelante – e não encontramos razões para discordar.

Assim, também nesta questão, improcedem as conclusões do Apelante.

Percentagem aplicada nos termos do art. 26º, nº 6.

Dispõe a norma citada que:

 “Num aproveitamento economicamente normal, o valor do solo apto para construção deverá corresponder a um máximo de 15% do custo da construção, devidamente fundamentado, variando, nomeadamente, em função da localização, da qualidade ambiental e dos equipamentos existentes na zona, sem prejuízo do disposto no número seguinte”.

A sentença recorrida – aderindo ao relatório subscrito pelos peritos do Tribunal e do Expropriante – considerou, a este título, uma percentagem de 12%, sendo que, na perspectiva do Apelante, deveria ter sido adoptada a percentagem de 13% que era proposta pelo seu perito.

Para tanto, alude ao facto de a parcela estar situada em plena cidade, com todos os equipamentos, com transportes, sem focos de poluição e com apoios urbanos.

A percentagem a fixar ao abrigo da norma em causa tem um valor máximo de 15% que, naturalmente, ficará reservado para os solos que se encontram numa situação de “excelência”, ao nível da localização, da qualidade ambiental e dos equipamentos existentes na zona e, importa notar, quando falamos em localização para este efeito, reportamo-nos a todo o território nacional e não apenas à localização do solo dentro do aglomerado urbano do qual faz parte. Quer isto dizer que um solo situado numa localidade pequena e pouco valorizada, ainda que esteja muito bem localizado dentro dessa localidade e ainda que tenha uma óptima qualidade ambiental, nunca se aproximará do valor de um solo que fique situado em zonas “nobres” do país, muito apetecidas e, por isso, muito valorizadas pela respectiva localização.

Assim, e sendo de 15% a percentagem máxima a atribuir, parece claro que uma percentagem de 12% ou 13% (como propõem os peritos) já corresponde a uma parcela bem localizada e com boa qualidade ambiental.

Mas existirão alguns elementos que nos permitam optar pela percentagem de 13% ao invés dos 12% que foram considerados na sentença?

Parece-nos que não, sendo certo que nada nos autos aponta para a excelência ou qualidade acima da média que o Apelante pretende transmitir.

Embora seja certo – como resulta dos relatórios periciais e das respostas dadas pelos peritos aos quesitos que lhes foram formulados – que a parcela se situa face ao arruamento principal de acesso ao centro da cidade da Covilhã, a verdade é que esse facto, ainda que a possa valorizar em termos de localização, desvaloriza-a em termos de qualidade ambiental, já que, como referem os peritos, esse arruamento tem um elevado nível de tráfego automóvel, o que, naturalmente, não deixará de se reflectir negativamente na sua qualidade ambiental, quer em termos de ruído, quer em termos de poluição atmosférica.

Alude ainda o Apelante ao facto de a parcela ter todos os equipamentos. Mas que equipamentos são esses? O Apelante não diz e a única coisa que resulta dos relatórios periciais é que se situa a 400 ou 500m da Câmara Municipal e a 100 ou 200m da Universidade da Beira Interior.

Ou seja, perante os elementos que temos disponíveis, nada aponta para uma situação de excelência, ao nível de todos os factores acima mencionados (localização, qualidade ambiental e equipamentos).

Quatro dos peritos consideraram adequada a percentagem de 12% (importando notar que os árbitros consideraram uma percentagem inferior – 11%). Perante os elementos que temos disponíveis, não é possível afirmar que a localização da parcela, a qualidade ambiental de que usufrui e os equipamentos de que beneficia atinjam os padrões que seriam necessários para justificar a consideração de uma percentagem superior a essa e, portanto, nada justificaria que se desse prevalência à opinião de um perito (que entende adequada a percentagem de 13%), desvalorizando – sem qualquer fundamento concreto – a opinião técnica de quatro peritos.

Assim, e também nesta questão, improcedem as conclusões do Apelante.

Factor correctivo pela inexistência de risco e esforço inerente à actividade construtiva – art. 26º nº 10.
Dispõe o art. 26º nº 10 que “o valor resultante da aplicação dos critérios fixados nos nºs 4 a 9 será objecto da aplicação de um factor correctivo pela inexistência do risco e do esforço inerente à actividade construtiva, no montante máximo de 15% do valor da avaliação”.
A sentença recorrida – aderindo ao laudo subscrito pelos peritos do Tribunal e do Expropriante – considerou um factor correctivo de 15%.
Na perspectiva do Apelante, esse factor correctivo não deve ser aplicado, na medida em que a norma em causa não tem qualquer lógica jurídica por ser incompreensível que um terreno seja desvalorizado pela inexistência de risco e/ou pela inexistência de esforço inerente à actividade construtiva, pois que tais inexistências só justificam a sua valorização e não o contrário (afirmando que a existência desse risco ou esforço é que desvaloriza os bens expropriados perante o mercado). Consequentemente, e em função daquela alegação, sustenta que a norma citada é inconstitucional já que, por natureza, não permite obter o valor da justa indemnização, violando o disposto no art. 62º, nº 2, da CRP.
A questão não é nova e já foi suscitada perante o Tribunal Constitucional que, não obstante alguns votos de vencido, concluiu e decidiu que a norma em causa não era inconstitucional – cfr. Acórdãos do Tribunal Constitucional nºs 505/2004, 499/2005 e 312/2006 de 13/07/2004, 04/10/2005 e 17/05/2006, respectivamente[2].
E não poderemos deixar de acompanhar esse entendimento.
É verdade – como diz o Apelante – que, no funcionamento das regras normais de mercado, o risco e esforço inerente à actividade construtiva desvalorizam os solos para construção e isso significa que quanto maior for o risco e esforço, menor será o valor que um comprador prudente estará disposto a pagar por um terreno destinado a construção.
Todavia, quando o citado nº 10 se refere à inexistência de risco e esforço inerente à actividade construtiva, reporta-se à inexistência que decorre da expropriação, ou seja, o risco não existe porque o expropriado não vai construir (já que foi expropriado), mas o que nele se reflecte (pela dedução da uma percentagem maior ou menor em função do risco e esforço inerentes àquela construção) é o mero funcionamento da regra de mercado segundo a qual quanto maior for o risco, menor será o preço. Daí que não seja correcto o entendimento do Apelante quando sustenta que a norma em causa não tem qualquer lógica jurídica por ser incompreensível que um terreno seja desvalorizado pela inexistência de risco e/ou pela inexistência de esforço inerente à actividade construtiva, pois que tais inexistências só justificam a sua valorização e não o contrário. É que a dedução imposta pela norma em causa não decorre da inexistência de risco e esforço inerente à actividade construtiva (sendo certo que, caso se constate que não existia qualquer risco ou esforço, não será aplicada qualquer dedução); tal dedução pressupõe, naturalmente, que esse risco e esforço existem (sendo que quanto maior for o risco e esforço, maior será a dedução), sucedendo apenas que, por via da expropriação, eles não existirão para o expropriado (porque não irá suportá-los); por isso e com vista a atingir aquele que seria o real valor do bem no mercado, terá que ser aplicado aquele factor com vista a corrigir o valor obtido com base num determinado aproveitamento urbanístico que implicaria um determinado risco e que, por força da expropriação, não será suportado pelo expropriado.
De facto, a determinação do valor do solo para efeitos de expropriação e de acordo com os critérios que estão estabelecidos nos nºs 4 e segs. do art. 26º não parte do valor do bem no mercado, pretendendo antes atingir esse valor. Ou seja, considerou o legislador que, na impossibilidade de obter o valor real do bem no mercado em função do critério estabelecido nos nºs 2 e 3 do citado art. 26º, a melhor forma de atingir aquele valor corresponderia à aplicação dos critérios que estão estabelecidos nos nºs 4 e segs. da norma citada e atendendo a todos os factores que, em termos de mercado, o podem influenciar. Ora, de acordo com esses critérios, o valor do solo (quando tem aptidão construtiva) é calculado com referência ao custo da construção que nele seria possível efectuar num aproveitamento económico normal, aí se dispondo que o valor do solo corresponderá a uma determinada percentagem do custo de construção. Mas, porque o valor assim determinado é feito em função de um determinado aproveitamento urbanístico e porque esse aproveitamento implicava um determinado risco e esforço que não deixaria de se reflectir no preço do bem no mercado, não poderemos deixar de concluir que o valor calculado em função daquele aproveitamento não poderá deixar de ser corrigido em função do risco e esforço que ele implicaria e que o expropriado não irá suportar. É que, sendo evidente que esse risco se reflecte no valor do bem no mercado (sendo que quanto maior for o risco maior será a desvalorização do bem e, portanto, menor será o preço de mercado), não se justificaria que o mesmo não fosse também considerado no cálculo da indemnização devida pela expropriação, diminuindo o valor dessa indemnização por aplicação da dedução prevista no citado nº 10 (dedução que será maior ou menor conforme o grau de risco que seria inerente ao aproveitamento urbanístico que foi considerado para o respectivo cálculo e que o expropriado não vai suportar).
Parece-nos, pois, em face do exposto e seguindo a jurisprudência do Tribunal Constitucional, que a norma em causa não padece de qualquer inconstitucionalidade.

Ultrapassada a questão da constitucionalidade da norma, analisemos a sua aplicação ao caso concreto.
Ainda que se entenda que o referido factor correctivo não é de funcionamento automático, o certo é que, se uma parcela é avaliada como terreno apto para construção, haverá sempre uma margem de risco, maior ou menor, pelo que só em situações absolutamente excepcionais, em que haja garantia quase absoluta de sucesso da operação urbanística e imobiliária e sem qualquer esforço por banda do investidor, se poderá dizer que o aludido risco se não verifica[3]. De facto, em situações normais, existirão sempre riscos inerentes à construção que devem ser tomados em conta no valor da avaliação, riscos esses inerentes à actividade e esforço financeiro que eram necessários para construir e que o expropriado não suporta.
Como refere Salvador da Costa[4], “…em situação normal de mercado, há não raro riscos inerentes à construção, como acidentes, mau tempo, encarecimento da mão-de-obra e dos materiais, bem como inerentes à comercialização, designadamente a depreciação do imóvel, as dificuldades de venda por retracção do mercado em virtude do aumento da taxa de juros, por exemplo (…) Temos, pois, que no cálculo da indemnização deve ser considerado o referido factor correctivo, com o limite máximo de quinze por cento, por virtude de o expropriado não ter desenvolvido qualquer actividade construtiva, sendo certo que, se a tivesse desenvolvido, teria suportado o respectivo custo e o inerente risco empresarial”.
Tendo em atenção as considerações que acabámos de efectuar, é evidente que nada, na matéria de facto, permite afirmar que a situação dos autos seja uma daquelas situações excepcionais em que tal risco não existe.
Tal risco existe – como existe sempre, ressalvando algumas situações absolutamente excepcionais – e isso mesmo foi considerado por quatro peritos, que fixaram esse factor correctivo em 15% (apenas o perito do Expropriado considerou não ser aplicável esse factor).
E não se diga – como diz o Apelante – que o Tribunal não justificou por que razão optou pela percentagem de 15%.
De facto, a sentença recorrida indica claramente as razões que determinaram tal opção, enunciando, de forma clara e precisa, as razões pelas quais aderia às conclusões de quatro peritos (entre os quais se encontravam os do Tribunal) e que apontavam uma dedução equivalente a 15%.

Já dissemos – e reafirmamos – que o Tribunal, não possuindo conhecimentos específicos e técnicos na matéria, necessita de recorrer a quem o auxilie nessa tarefa. É para isso que servem as perícias e foi por reconhecer o carácter técnico das questões que se prendem com a avaliação dos solos que o legislador impôs, nos processos de expropriação, a realização de uma avaliação a realizar por peritos. Embora o julgador possa e deva fazer uma análise crítica das conclusões dos peritos, a verdade é que, na maioria dos casos, essa análise resume-se a verificar a conformidade dos critérios utilizados pelos peritos com os critérios legais, já que, no que diz respeito às questões técnicas que constituem o cerne da avaliação, o julgador não está, por regra, em condições de as contrariar e muito menos terá condições para formular o seu próprio juízo técnico. Assim, a não ser que existam razões objectivas e concretas que lhe permitam discordar dos juízos técnicos dos peritos, o julgador terá que se conformar e aceitar esses juízos. E, não existindo unanimidade dos peritos e não existindo razões objectivas e concretas que permitam ao julgador aferir qual o relatório que melhor se adequa aos objectivos que se pretendem atingir, terá que atender às conclusões que reúnem o maior consenso dos peritos ou às conclusões dos peritos do Tribunal, por se dever presumir – como acima se assinalou – que as conclusões subscritas por um número maior de peritos terão maior aptidão para atingir aquele objectivo ou que os peritos do tribunal, não tendo sido indicados pelas partes e não tendo com elas qualquer ligação, oferecem melhores garantias de isenção e imparcialidade, estando, por isso, em melhores condições de, com objectividade e isenção, determinar o justo valor da indemnização.

Foi isto que fez a sentença recorrida e, na nossa perspectiva, outra coisa não poderia ter feito.

De facto, existindo quatro peritos (entre os quais se encontram os do Tribunal) que consideram dever ser aplicada a dedução de 15% e não existindo quaisquer elementos concretos e objectivos que permitam contrariar esse juízo técnico, nenhuma justificação existiria para não aceitar essas conclusões e para, ao invés, aceitar as conclusões que são propostas por um único perito.

Improcede, pois, o recurso, confirmando-se a sentença recorrida.


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SUMÁRIO (elaborado em obediência ao disposto no art. 713º, nº 7 do Código de Processo Civil, na sua actual redacção):

I – Apesar de o juiz não estar vinculado aos laudos apresentados pelos peritos e apesar de ter o dever de os analisar criticamente, verificando, designadamente, a sua conformidade com os critérios legais, a verdade é que, no que toca às questões técnicas que constituem o cerne da avaliação, o julgador não estará, por regra, habilitado a contrariar as conclusões dos peritos e a formular o seu próprio juízo técnico.

II – Assim, existindo laudos divergentes e não possuindo o juiz quaisquer conhecimentos ou elementos concretos que lhe permitam aferir qual deles tem melhor aptidão para alcançar o valor da justa indemnização, justifica-se que considere ou adira ao laudo maioritário ou ao laudo dos peritos do Tribunal por se dever presumir que as conclusões subscritas por um número maior de peritos, reunindo maior consenso, terão maior aptidão para atingir aquele objectivo ou que os peritos do Tribunal, não tendo sido indicados pelas partes e não tendo com elas qualquer ligação, oferecem melhores garantias de isenção e imparcialidade, estando, por isso, em melhores condições de, com objectividade e isenção, determinar o justo valor da indemnização.

III – Quando o art. 26º, nº 10, do Código das Expropriações se refere à inexistência de risco e esforço inerente à actividade construtiva, está a reportar-se à inexistência de risco que decorre da expropriação (ou seja, o risco não existe porque o expropriado não vai construir efectivamente) e não à inexistência de risco e esforço inerente à actividade construtiva que esteve subjacente à avaliação; a dedução imposta pela norma citada pressupõe que este risco e esforço existem (sendo que quanto maior for esse risco ou esforço maior será a dedução), sucedendo apenas que, por via da expropriação, eles não existirão para o expropriado porque não irá suportá-los.

IV – Porque o grau de risco ou esforço inerente à actividade construtiva condicionam e influenciam o valor do bem no mercado, justifica-se que esse factor seja igualmente ponderado na determinação da justa indemnização, de forma a corrigir o valor obtido com base num determinado aproveitamento construtivo que implicaria um determinado esforço e risco e que não vão ser suportados pelo expropriado, não padecendo de qualquer inconstitucionalidade a norma que assim o determina (o citado art. 26º, nº 10).


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V.
Pelo exposto, nega-se provimento ao presente recurso e, em consequência, confirma-se a sentença recorrida.
Custas a cargo do Apelante.
Notifique.

Maria Catarina Gonçalves (Relatora)

Maria Domingas Simões

Nunes Ribeiro

                          


[1] Diploma a que se reportam as demais disposições legais que venham a ser citadas sem menção de origem.
[2] Disponíveis em http://www.tribunalconstitucional.pt.
[3] Cfr. Acórdãos da Relação do Porto de 16/01/2006 e 13/07/2006 com os nºs convencionais JTRP00039949 e JTRP00039414, respectivamente e Acórdão da Relação de Coimbra de 28/11/2006, processo 451-A/2001.C1, disponíveis em http://www.dgsi.pt.
[4] Código das Expropriações e Estatuto dos Peritos Avaliadores Anotados e Comentados, 2010, pág. 186.