Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01295/10.7BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:11/23/2023
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Rosário Pais
Descritores:OPOSIÇÃO; REVERSÃO; NULIDADE DA CITAÇÃO;
PRESSUPOSTOS; FUNDAMENTAÇÃO DESPACHO;
ÓNUS DA PROVA; GERÊNCIA DE FACTO; CULPA;
Sumário:
I - A nulidade da citação não é fundamento de oposição devendo ser arguida em requerimento dirigido ao órgão de execução fiscal, como vem sendo entendido, de forma pacífica e reiterada.

II – Se, na p.i., o Recorrente não questionou o exercício da gerência, a sua invocação em sede recursiva constitui uma questão nova, sobre a qual este Tribunal não pode pronunciar-se, uma vez que também não é do seu conhecimento oficioso.

III - Está devidamente fundamentado o Despacho de Reversão que, além do mais, indica a concreta alínea do artigo 24º da LGT ao abrigo da qual foi operada a reversão.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes da Subsecção de execução fiscal e de recursos contraordenacionais da Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:


1. RELATÓRIO
1.1. «AA», devidamente identificado nos autos, vem recorrer da sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga em 01.07.2013, pela qual foi julgada improcedente a oposição por si deduzida à execução fiscal nº ...50 e apensos, originalmente instaurada, contra a sociedade [SCom01...], LDA. e depois contra ele revertido, para cobrança de dívidas de IVA de 2002, 2003, 2004 e 2005, IRS de 2001, 2002, 2003 e 2004 e IRC referente a 2006.

1.2. o Recorrente terminou as respetivas alegações formulando as seguintes conclusões:
«1 – O presente recurso visa atacar a decisão recorrida em dois momentos distintos: num primeiro momento, de um ponto de vista, estritamente formal, corroborar a alegação feita nos Autos da nulidade da citação e, num segundo momento, aferir da existência, ou não, dos pressupostos da responsabilidade subsidiária do recorrente em relação às dívidas da sociedade devedora originária.
2 – Relativamente à invocada nulidade da citação: decorre do disposto no nº4, do art. 22º da LGT, a essencialidade da obrigação de fundamentação, pois só assim é possível por parte do responsável subsidiário o exercício efectivo do direito de defesa e do contraditório relativamente às decisões que lhe dizem respeito, uma vez que só com o conhecimento dos elementos essenciais da liquidação ou liquidações objecto da reversão lhe será possível o exercício de tais direitos;
3 – A obrigação de que a arguição da nulidade da citação ocorra mediante requerimento a apresentar perante o órgão de execução fiscal, impedindo que a mesma se faça através da oposição à execução, afigura-se susceptível de gerar como efeito perverso a impossibilidade de arguir o referido vício, uma vez que se estaria na prática a colocar o revertido perante a difícil escolha entre a apresentação de um requerimento autónomo e a apresentação de oposição à execução – estando o prazo para a apresentação desta em curso;
4 – Assim, sempre se dirá que, não obstante, conceptualmente, a arguição de tal nulidade poder ser feita mediante apresentação de requerimento junto do órgão de execução fiscal, todavia, o princípio constitucional da tutela jurisdicional efectiva e mesmo o princípio da economia processual determinam que semelhante arguição possa ocorrer em sede de oposição à execução, enquadrando-se o seu fundamento no previsto no art. 204º, nº1, al. i) do CPPT.
5 – Já relativamente a determinar qual o regime de responsabilidade subsidiária que fundamenta a reversão da execução fiscal contra o ora recorrente e respectivos requisitos, cumpre, desde logo, salientar que é exclusivamente a partir da fundamentação expendida no despacho de reversão que deve aferir-se a legalidade do mesmo, não podendo considerar-se outros fundamentos, por mais adequados que se afigurem, se a Administração Tributária não os invocou naquele despacho;
6 – Com efeito, a fundamentação expendida no despacho de reversão é a seguinte: “Inexistência ou insuficiência dos bens penhoráveis do de devedor principal e responsáveis solidários, sem prejuízo do benefício da excussão;
7 – Sucede que, para que o Tribunal “ a quo” pudesse ter decidido como decidiu, a reversão deveria ter sido ordenada com o fundamento de que as dívidas exequendas provenientes de tributos deveriam ter sido pagas no período da gerência do recorrente;
8 – Assim, tendo o recorrente sido gerente da sociedade originária devedora, quer nos períodos em que se constituíram as dívidas por contribuições, quer no período em que as mesmas deveriam ter sido pagas, a reversão só poderia ter tido lugar ao abrigo da alínea a) do art. 24.º, n.º1, da LGT, cabendo, neste caso, à Fazenda Nacional provar os pressupostos da responsabilidade tributária;
9 - Isto é, a Administração Fiscal estava obrigada a demonstrar o desempenho de efectivas funções pelo recorrente, da gerência da devedora originária;
10 – O mesmo será dizer que o Despacho de reversão deveria apontar em que medida se verificou a culpa do recorrente na frustração dos créditos tributários, que deram origem à execução fiscal, pelo que, ao omitir -se as circunstâncias que permitiriam considerar verificados aqueles pressupostos, aquele Despacho carece de sustentabilidade.
11 – Como essa prova não foi feita, a sua ausência tem de ser valorada contra a Administração Fiscal;
12 - Concluindo-se, pela ilegitimidade do recorrente na presente execução fiscal.
13 - A douta sentença recorrida violou, entre outros, os arts. 45º, e 165º do CPPT, 191º do CPC e 22º e 24º da LGT.
Nestes termos, e nos melhores de direito que Vªs Exªs doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente e consequentemente ser alterada a sentença recorrida por outra que julgue a oposição totalmente procedente. Assim decidindo, farão V.Ex.ªs, Venerandos Desembargadores, a habitual JUSTIÇA.».

1.3. A Recorrida não contra-alegou.

1.4. A DMMP junto deste Tribunal emitiu o parecer, concluindo que o recurso não merece provimento.
*
Dispensados os vistos legais, nos termos do artigo 657º, nº 4, do CPC, cumpre apreciar e decidir, pois que a tanto nada obsta.
*

2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR
Uma vez que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações da Recorrente, cumpre apreciar e decidir se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento ao não conhecer da nulidade da citação e ao considerar o Recorrente como parte legítima na execução.

3. FUNDAMENTAÇÃO
3.1. DE FACTO
3.1.1. A sentença recorrida acolheu a seguinte fundamentação de facto:
«Com interesse para a decisão a proferir, julgo provados os seguintes factos:
1 – Pela apresentação n.º ...9/19990223, de 23 de março de 1999, foi registada na Conservatória do Registo Predial/Comercial de ..., a sociedade “[SCom01...], LDA.”, tendo ficado consignado como único sócio e gerente «AA», ora Oponente, – cfr. certidão de fls. 15 e ss. do processo de execução fiscal.
2 – Contra a referida sociedade foi instaurado e corre termos no Serviço de Finanças ... o processo de execução fiscal n.º ...50, destinado à cobrança coerciva de 8.725,15 €, respeitante a IVA referente aos meses de janeiro a março de 2002.
3 – Serve de base à execução referida no ponto anterior a certidão de dívida n.º ...21, que consta de fls. 3 do processo de execução fiscal e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
4 – Por apenso ao processo de execução fiscal referido no ponto 1, corre termos o processo de execução fiscal n.º ...60, destinado à cobrança coerciva de 8.558,61 €, respeitante a dívidas de IVA referentes ao período 2002/06T e respetivos juros de mora – cfr. fls. 53 do processo de execução fiscal.
5 – Serve de base à execução referida no ponto anterior a certidão de dívida n.º 2003/...67, que consta de fls. 54 do processo de execução fiscal e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
6 – Por apenso ao processo de execução fiscal referido no ponto 1, corre termos o processo de execução fiscal n.º ...16, destinado à cobrança coerciva de 8.071,71 €, respeitante a dívidas de dívidas de IVA referentes ao período 2002/06T – cfr. fls. 56 do processo de execução fiscal.
7 – Serve de base à execução referida no ponto anterior a certidão de dívida n.º 2003/....52, que consta de fls. 57 do processo de execução fiscal e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
8 – Por apenso ao processo de execução fiscal referido no ponto 1, corre termos o processo de execução fiscal n.º ...45, destinado à cobrança coerciva de 1.623,19 €, respeitante a dívidas de dívidas de IRC do ano 2001 e 2002 – cfr. fls. 58 do processo de execução fiscal.
9 – Serve de base à execução referida no ponto anterior as certidões de dívidas n.º 2003/...89 e 2003/...90, que constam de fls. 59 e 60 do processo de execução fiscal e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
10 – Por apenso ao processo de execução fiscal referido no ponto 1, corre termos o processo de execução fiscal n.º ...17, destinado à cobrança coerciva de 98,00 €, respeitante a dívidas de dívidas de IRS do ano de 2003 – cfr. fls. 61 do processo de execução fiscal.
11 – Serve de base à execução referida no ponto anterior a certidão de dívida n.º 2005/...03, que consta de fls. 62 do processo de execução fiscal e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
12 – Por apenso ao processo de execução fiscal referido no ponto 1, corre termos o processo de execução fiscal n.º ...28, destinado à cobrança coerciva de 156,00 €, respeitante a dívidas de dívidas de IRS do ano 2004 – cfr. fls. 64 do processo de execução fiscal.
13 – Servem de base à execução referida no ponto anterior as certidões de dívida n.º 2005/...45 e 2005/...59, que constam de fls. 65 e 66 do processo de execução fiscal e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
14 – Por apenso ao processo de execução fiscal referido no ponto 1, corre termos o processo de execução fiscal n.º ...00, destinado à cobrança coerciva de 156,00 €, respeitante a dívidas de IRS do ano 2004 – cfr. fls. 68 do processo de execução fiscal.
15 – Servem de base à execução referida no ponto anterior as certidões de dívida n.º 2005/...20 e 2005/...71, que constam de fls. 69 e 70 do processo de execução fiscal e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
16 – Por apenso ao processo de execução fiscal referido no ponto 1, corre termos o processo de execução fiscal n.º ...29, destinado à cobrança coerciva de 78,00 €, respeitante a dívidas de dívidas de IRS do ano 2004 – cfr. fls. 72 do processo de execução fiscal.
17 – Serve de base à execução referida no ponto anterior a certidão de dívida n.º 2005/...02, que consta de fls. 73 do processo de execução fiscal e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
18 – Por apenso ao processo de execução fiscal referido no ponto 1, corre termos o processo de execução fiscal n.º ...89, destinado à cobrança coerciva de 78,00 €, respeitante a dívidas de dívidas de IRS do ano 2004 – cfr. fls. 75 do processo de execução fiscal.
19 – Serve de base à execução referida no ponto anterior a certidão de dívida n.º 2005/....05, que consta de fls. 76 do processo de execução fiscal e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
20 – Por apenso ao processo de execução fiscal referido no ponto 1, corre termos o processo de execução fiscal n.º ...67, destinado à cobrança coerciva de 100,00 €, respeitante a dívidas de dívidas de IRS do ano 2004 – cfr. fls. 77 do processo de execução fiscal.
21 – Serve de base à execução referida no ponto anterior a certidão de dívida n.º 2005/...37, que consta de fls. 78 do processo de execução fiscal e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
22 – Por apenso ao processo de execução fiscal referido no ponto 1, corre termos o processo de execução fiscal n.º ...20, destinado à cobrança coerciva de 78,00 €, respeitante a dívidas de dívidas de IRS do ano 2003 – cfr. fls. 79 do processo de execução fiscal.
23 – Serve de base à execução referida no ponto anterior a certidão de dívida n.º 2005/....77, que consta de fls. 80 do processo de execução fiscal e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
24 – Por apenso ao processo de execução fiscal referido no ponto 1, corre termos o processo de execução fiscal n.º ...58, destinado à cobrança coerciva de 78,00 €, respeitante a dívidas de dívidas de IRS do ano 2004 – cfr. fls. 81 do processo de execução fiscal.
25 – Serve de base à execução referida no ponto anterior a certidão de dívida n.º 2005/....90, que consta de fls. 82 do processo de execução fiscal e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
26 – Por apenso ao processo de execução fiscal referido no ponto 1, corre termos o processo de execução fiscal n.º ...30, destinado à cobrança coerciva de 78,00 €, respeitante a dívidas de dívidas de IRS do ano 2004 – cfr. fls. 83 do processo de execução fiscal.
27 – Serve de base à execução referida no ponto anterior a certidão de dívida n.º 2005/....43, que consta de fls. 84 do processo de execução fiscal e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
28 – Por apenso ao processo de execução fiscal referido no ponto 1, corre termos o processo de execução fiscal n.º ...33, destinado à cobrança coerciva de 63.156,91 €, respeitante a dívidas de dívidas de IVA dos anos de 2002, 2003, 2004 e 2005 – cfr. fls. 85 do processo de execução fiscal.
29 – Servem de base à execução referida no ponto anterior as certidões de dívidas melhor identificadas a fls. 86 a 105 do processo de execução fiscal e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
30 – Por apenso ao processo de execução fiscal referido no ponto 1, corre termos o processo de execução fiscal n.º ...05, destinado à cobrança coerciva de 1.122,30 €, respeitante a dívidas de dívidas de IVA do ano 2005 – cfr. fls. 117 do processo de execução fiscal.
31 – Serve de base à execução referida no ponto anterior a certidão de dívida n.º 2007/....94, que consta de fls. 118 do processo de execução fiscal e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
32 – Por apenso ao processo de execução fiscal referido no ponto 1, corre termos o processo de execução fiscal n.º ...47, destinado à cobrança coerciva de 1.515,51 €, respeitante a dívidas de dívidas de IRC do ano de 2006 – cfr. fls. 119 do processo de execução fiscal.
33 – Serve de base à execução referida no ponto anterior a certidão de dívida n.º 2008/....52, que consta de fls. 120 do processo de execução fiscal e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
34 – Por sentença, datada de 21 de dezembro de 2005, foi a sociedade devedora originária declarada insolvente, tendo o processo de insolvência sido encerrado por falta de bens da devedora – cfr. certidão de fls. 14 e ss. do processo de execução fiscal.
35 – Em 24.08.2009, foi emitido um mandado de penhora contra a sociedade devedora originária – cfr. fls. 4 do processo de execução fiscal.
36 - O órgão de execução fiscal constatou a inexistência de quaisquer bens, suscetíveis de serem penhorados, em nome da sociedade devedora originária, tendo iniciado o procedimento de reversão contra o sócio gerente – cfr. auto de diligências de fls. 20 do processo de execução fiscal.
37 – A reversão contra o Oponente foi efetuada por despacho, datado de 12 de maio de 2010, – cfr. fls. 40 e 41 do processo de execução fiscal.
38 – Através de carta registada com aviso de receção dirigida ao executado foi enviada a nota de citação cujo teor consta de fls. 43 do processo de execução fiscal, acompanhada de cópia do despacho de reversão e relação dos processos executivos.
39 – Em separado, sob o registo RM......02PT, foram enviadas as cópias dos títulos executivos – cfr. menção de fls. 46 e fls. 47 do processo de execução fiscal.
40 – Os avisos de receção que acompanharam as cartas foi assinados em 18.05.2010 – cfr. fls. 48 e 50 do processo de execução fiscal.
41 - Em 2001/2002, na indústria têxtil, verificou-se uma diminuição das margens de lucro que, de 20% a 25% passaram para 5%.
42 - A sociedade executada não tinha marca própria, trabalhava a feitio para outras empresas.
43 – No trabalho a feitio, quem determinava o preço da peça era quem contratava o serviço.
44 – O Oponente era uma pessoa trabalhadora.
3.2. Factos não provados:
Para além dos supra referidos, não foram provados outros factos com relevância para a decisão da causa.
Motivação da matéria de facto dada como provada:
A convicção do Tribunal relativamente à matéria de facto provada resultou dos elementos especificamente identificados em cada um dos pontos do probatório, resultando essencialmente da análise dos documentos constantes do processo de execução fiscal e dos autos.
Formou-se, ainda, a convicção do Tribunal para a fixação dos factos elencados nos pontos 41 a 45 do probatório, com base no depoimento das testemunhas inquiridas: «BB» e «CC».».

3.1.2. Alteração da matéria de facto
Ao abrigo do disposto no artigo 662º do Código de Processo Civil, vamos proceder à alteração da matéria de facto, aditando o ponto 37-A, por necessário para a boa apreciação da causa e constar do processo de execução apenso o documento que tanto permite:
37-A – O despacho de reversão de 12.05.2010, tem o seguinte teor, na parte aqui relevante:
«(…)
Ao contrário do que refere constam da notificação os pressupostos em que assenta o projecto de reversão. Com efeito, da simples leitura da mesma conclui-se facilmente que inexistindo bens da sociedade devedora originária, irá proceder-se à reversão das dívidas contra os gerentes ao tempo a que a mesmas respeitam. Toma portanto o administrador ou gerente conhecimento do projecto, da direito de participar na decisão, das quantias em dívida, da origem e dos períodos a que respeitam, das datas de pagamento voluntário e da exigibilidade dos juros.
Leva-se ainda ao seu conhecimento toda a legislação que suporta a reversão e o direito de audição artºs. 23º, 24º e 60º da LCT[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Pode pois concluir-se que a citada notificação é efectuada no estrito cumprimento das disposições legais, em nada prejudica ou diminui o direito de participação, e não enferma de qualquer vício.
Quanto à circunstância de ter sido declarada insolvente a sociedade devedora originária, em nada diminui a responsabilidade subsidiária dos gerentes ou administradores que continuam a responder pelas dívidas tributárias na medida em que as mesmas não sejam pagas pela massa insolvente. Ora no caso dos autos, o processo de insolvência foi encerrado por insuficiência de massa falida, não tendo sido graduado qualquer crédito da Fazenda Publica.
Não assiste também razão ao respondente quando pretende que não foi feita prova da sua culpa na insuficiência de património e na falta de pagamento das dívidas tributárias.
É que, assente o exercício da gerência efectiva por parte do sócio, para decidir da culpa e do ónus da prova, há que averiguar se os factos geradores das dívidas e os prazos legais de pagamento ocorreram ou não no período da sua gerência.
E no caso dos autos não restam quaisquer dúvidas que quer os factos geradores das dívidas exigidas, quer os períodos legais de pagamento se verificaram durante o período da gerência do respondente.
Ora assim sendo, para a efectivação da responsabilidade subsidiária, rege a disposição legal contida na al. b) do nº 1 do artº 24 da LGT, nos termos da qual é ao administrador ou gerente que compete o ónus de provar que não lhe pode ser imputada a culpa pela falta de pagamento das dívidas tributárias.
Coisa que, com todo o respeito, o respondente claramente não faz
Desatendem-se assim na totalidade as razões invocadas pelo responsável subsidiário, e conclui-se pela verificação dos pressupostos em que assenta a reversão — o exercício efectivo da gerência e a falta de pagamento das dívidas imputável ao sócio gerente.
Em face do vem referido, e, de harmonia com o disposto no artº 23º da LGT, verificadas as condições estabelecidas no artº 153º do CPPT, nº 2 al. a), reverto contra o sócio gerente «AA», (…) as dívidas da sociedade [SCom01...] UNIPESSOAL, LDA [Imagem que aqui se dá por reproduzida]exigidas nestes autos de execução fiscal.
(…)».

3.2. DE DIREITO
3.2.1. Da nulidade da citação
O Recorrente pugna pela nulidade da sua citação e entende que a obrigação de que a arguição da nulidade da citação ocorra mediante requerimento a apresentar perante o órgão de execução fiscal, impedindo que a mesma se faça através da oposição à execução, afigura-se susceptível de gerar como efeito perverso a impossibilidade de arguir o referido vício, uma vez que se estaria na prática a colocar o revertido perante a difícil escolha entre a apresentação de um requerimento autónomo e a apresentação de oposição à execução. Daí que, na sua perspetiva, a arguição de tal nulidade poder ser feita mediante apresentação de requerimento junto do órgão de execução fiscal, todavia, o princípio constitucional da tutela jurisdicional efectiva e mesmo o princípio da economia processual determinam que semelhante arguição possa ocorrer em sede de oposição à execução, enquadrando-se o seu fundamento no previsto no artigo 204º, nº1, al. i) do CPPT.
Sobre esta questão, pronunciou-se o Meritissímo Juiz a quo, nos seguintes termos:
«O Oponente invoca a nulidade da citação por a mesma não ter sido acompanhada de qualquer título executivo, não conter a menção da data de emissão do título executivo, o nome e o domicílio dos responsáveis subsidiários e a indicação por extenso do respetivo montante.
Mais refere que a citação não foi acompanhada dos atos de liquidação dos impostos, em violação do disposto no artigo 24.º da L.G.T.
Vejamos.
Há nulidade da citação quando não tenham sido observadas as formalidades previstas na lei [cfr. artigo 198.º, n.º 1 do C.P.C. aplicável ex vi do artigo 1.º, alínea e) do C.P.P.T.].
A primeira questão que se coloca é a de saber se a nulidade da citação pode ser arguida diretamente perante o tribunal ou se é necessário argui-la junto do órgão de execução fiscal, com possibilidade de posterior reclamação para o juiz da decisão que sobre a reclamação recair.
Segundo jurisprudência pacífica e uniforme do STA, o conhecimento das nulidades processuais do processo de execução fiscal não pode ser feito em processo de oposição à execução fiscal. Com efeito, o processo de oposição tem por fim a extinção ou suspensão do processo executivo, nessa medida apenas serão aceites fundamentos que conduzam a esse objetivo. Neste sentido vide, entre outros, acórdãos do Pleno do STA de 28.02.2007, processo n.º 803/04 e de 06.05.2009, processo n.º 632/08 e acórdãos de 04.11.2009, processo n.º 416/06 e de 10.03.2007, processo n.º 042/11.
A falta dos requisitos da citação constitui nulidade da citação, quando a falta cometida puder prejudicar a defesa do citado [cfr. artigo 198.º, n.º 1 do C.P.C.]. A nulidade da citação tem como consequência a anulação dos termos subsequentes que dela dependam absolutamente [cfr. artigo 165.º, n.º 2 do C.P.P.T.].
Assim, a nulidade da citação constitui nulidade do processo executivo devendo ser nele arguida, no prazo da oposição, com posterior reclamação para o tribunal tributário de 1.ª instância da eventual decisão de indeferimento [cfr. artigo 276.º do C.P.P.T e 103.º, n.º 2 da L.G.T.].».
A sentença recorrida não nos merece qualquer reparo nesta parte.
Com efeito, a nulidade da citação não é fundamento de oposição devendo ser arguida em requerimento dirigido ao órgão de execução fiscal, como vem sendo dito, de forma pacífica e reiterada, pela jurisprudência do STA (de que são exemplos Acórdãos de 22.02.2017, recurso 1528/14, 07.05.2014, recurso 283/14, de 24.02.2010, de 25 de Maio de 2011, proferido no recurso nº 187/11, de 10.03.2011, recurso 42/11 e do Pleno da Secção de Contencioso Tributário de 05.07.2011, recurso 873/11, de 28.02.2007, recurso 803/04, e de 22.03.2018, recurso 0714/15, todos in www.dgsi.pt.).
Assim, a nulidade da citação, porque não determina a extinção da execução fiscal, mas apenas a repetição do ato com cumprimento das formalidades omitidas, não constitui fundamento de oposição à execução fiscal, antes devendo ser arguida em primeira linha perante o órgão de execução fiscal, com possibilidade de reclamação judicial de eventual decisão desfavorável.
Note-se que apenas a falta de citação constitui uma nulidade insanável do processo de execução fiscal, quando possa prejudicar a defesa do interessado, de harmonia com o artigo 165º, nº 1, alínea a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, pois que só essa nulidade da citação tem por efeito a anulação dos termos subsequentes do processo que dele dependam absolutamente, é de conhecimento oficioso e pode ser arguida até ao trânsito em julgado da decisão final, conforme prescrevem os nºs 2 e 4 do já citado artigo 165º.
É esta também a posição de JORGE LOPES DE SOUSA quando afirma o seguinte:
“(...) No art.º 165.º do CPPT estão previstas as nulidades insanáveis em processo de execução fiscal, que são situações de falta de citação e de falta de requisitos essenciais do título executivo quando não puder ser suprida por prova documental. Como referido supra, distintas são as situações de nulidade da citação, que ocorrem quando não tenham sido observadas as formalidades previstas na lei (cfr. art.º 191.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do art.º 2.º alínea e) do CPPT). Estas nulidades só podem ser conhecidas na sequência de arguição dos interessados que, em obediência ao disposto no n.º 2 do art.º 191.º do CPC, deve ser feita no prazo que tiver sido indicado para deduzir oposição (equivalente a contestação em processo declarativo) e só pode ser atendida se a falta cometida puder prejudicar a defesa do citado, nos termos do n.º 4 do citado normativo solução que sempre resultaria do disposto no art.º 165.º, n.º 1, alínea a) do CPPI” (in Código do Procedimento e do Processo Tributário Anotado e Comentado, Vol. II, Áreas Editora, 5.ª edição, 2007, págs. 107 e segs.).
A oposição, que tem a natureza de uma contestação, visa, em regra, a extinção da execução fiscal, enquanto a nulidade da citação apenas pode determinar a repetição do ato com suprimento das irregularidades que determinaram a anulação e a repetição dos atos subsequentes que, porque dependentes da citação anulada, tenham sido também anulados. Assim, porque a nulidade da citação não tem como efeito a extinção da execução fiscal não pode ser erigida, em circunstância alguma, em fundamento de oposição à execução fiscal.
Acresce que este entendimento jurisprudencial em nada colide com o princípio da tutela jurisdicional efetiva, pois o visado pode, simultaneamente, lançar mão do requerimento de arguição de nulidade e da oposição à execução fiscal, podendo, eventualmente, esta ser suspensa até decisão final sobre a nulidade da citação.
Também se nos afigura que este entendimento não belisca o princípio da economia processual, pois dele não resulta uma especial oneração do interessado, nem este princípio pode colidir com o nº 2, do artigo 97º, da LGT (“A todo o direito de impugnar corresponde o meio processual mais adequado de o fazer valer em juízo”.), que faz depender o meio processual do efeito jurídico pretendido.
Improcede, por isso, o recurso nesta parte.

3.2.2. Da fundamentação do despacho de reversão
Alega, ainda, o Recorrente que é exclusivamente a partir da fundamentação expendida no despacho de reversão que deve aferir-se a legalidade do mesmo, não podendo considerar-se outros fundamentos, por mais adequados que se afigurem, se a Administração Tributária não os invocou naquele despacho. No caso, a fundamentação expendida no despacho de reversão é a seguinte: “Inexistência ou insuficiência dos bens penhoráveis do de devedor principal e responsáveis solidários, sem prejuízo do benefício da excussão” e, para que o Tribunal a quo pudesse ter decidido como decidiu, a reversão deveria ter sido ordenada com o fundamento de que as dívidas exequendas provenientes de tributos deveriam ter sido pagas no período da gerência do recorrente.
Mais refere que “tendo o recorrente sido gerente da sociedade originária devedora, quer nos períodos em que se constituíram as dívidas por contribuições, quer no período em que as mesmas deveriam ter sido pagas, a reversão só poderia ter tido lugar ao abrigo da alínea a) do art. 24.º, n.º1, da LGT, cabendo, neste caso, à Fazenda Nacional provar os pressupostos da responsabilidade tributária; ”, estando obrigada a demonstrar o desempenho de efectivas funções pelo recorrente, da gerência da devedora originária, bem como a apontar em que medida se verificou a culpa do recorrente na frustração dos créditos tributários, que deram origem à execução fiscal, prova essa que não foi feita.
Analisada a p.i., constatamos que o ora Recorrente não questionou o exercício da gerência, pelo que esta é uma questão nova, sobre a qual este Tribunal não pode pronunciar-se, uma vez que também não é do seu conhecimento oficioso.
No que respeita à prova da culpa, a sentença recorrida acolheu a seguinte fundamentação jurídica:
«Nos presentes autos, foi determinada a reversão contra o Oponente, nos termos do disposto no artigo 24.º, n.º 1, alínea b) do L.G.T., que se refere às situações em que é imputável a falta de pagamento da dívida ao gerente de facto, quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período de exercício do cargo. Estas situações comportam aquelas em que no período de exercício do cargo de gerência concorrem o facto constitutivo e a cobrança.
Segundo as regras gerais do ónus da prova, àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado [cfr. artigo 342.º, n.º 1 do C.C.]. Contudo, se o onerado com o ónus da prova beneficia de uma presunção legal, inverte-se o ónus [cfr. artigos 350.º, n.º 1 e 344.º, n.º 1 do C.C.].
Cumpre assim aferir se o Oponente logrou provar que a falta de pagamento dos tributos não se ficou a dever a culpa sua.
O Oponente refere um contexto de crise na indústria têxtil, o elevado número de crédito mal parado que a empresa foi acumulando ao longo dos anos e uma penhora das finanças sobre os bens que deixou a empresa sem meios de laboração. Relativamente à sua gestão, alega que tudo fez de modo a evitar o depauperamento progressivo da empresa e honrar os seus compromissos, usando no exercício da gerência da diligência de um “bonus pater familiae”.
Todavia, a mera alegação de factores exógenos revela-se insuficiente para afastar a presunção de culpa, por outro lado, a prova testemunhal produzida não se revelou bastante para dar como assentes os factos probandos, nomeadamente no que ao crédito mal parado concerne.
Acresce que, conforme se tem decidido, não basta ao responsável subsidiário, para ilidir a presunção de culpa, criar a dúvida quanto à culpa pela referida insuficiência patrimonial da sociedade devedora originária, antes se lhe exige que demonstre que a situação de insuficiência ficou a dever-se exclusivamente a factores exógenos e que, no exercício da gerência, usou da diligência de um bonus pater familiae, ou seja, de um gestor diligente e criterioso, no sentido de evitar essa situação [vide, neste sentido, acórdão do TCA Norte de 24.04.2008, proferido no processo 041/05.1BEBRG].
Para ilidir a presunção de culpa pela falta de cumprimento das obrigações tributárias, o Recorrente estava obrigado a alegar e subsequentemente provar que não existiu qualquer relação causal entre a sua actuação e a falta de pagamento do imposto, sabido que aos gerentes é exigível uma postura responsável e ponderada, que corresponda a uma actuação que, de acordo com o exigível a um administrador criterioso colocado em idêntica situação e dentro da inerente discricionaridade técnica, se mostre, em princípio, como adequada ao alcance dos objectivos para que a sociedade se constituiu”. Neste sentido vide acórdão do TCAN de 31.05.2012, processo n.º 00959/08.0BEBRG.
O Oponente alega, de modo conclusivo, que tudo fez de modo a evitar o depauperamento progressivo da empresa e honrar os seus compromissos, usando no exercício da gerência da diligência de um “bonus pater familiae”, todavia não logrou alegar e provar que, através de comportamento diligente, tomou as providências adequadas e necessárias ao normal exercício da sociedade executada e na prossecução do seu objeto, evitando, como esse comportamento diligente, que a sociedade viesse a encontrar-se na situação deficitária que a levou a incumprir com as suas obrigações fiscais.
Descendo ao detalhe, o Oponente não indicou qualquer medida concreta que tivesse tomado de modo a impedir o agravamento da situação, também não justificou o motivo pelo qual não requereu atempadamente a insolvência da devedora originária, de modo a evitar o agravamento da situação e permitir que os credores da sociedade fossem pagos de acordo com as preferências legais.
Conforme resulta do artigo 64.º do C.S.C., sobre os gerentes e administradores das sociedades impende o dever de diligência de um gestor criterioso e ordenado, o qual integra os deveres de cuidado e lealdade.
Em suma, o Oponente não logrou provar a ausência de culpa na falta de pagamento dos tributos, pelo que improcede o fundamento invocado.».
Ora, atento o teor do Despacho de Reversão, parcialmente transcrito no ponto 37-A dos factos provados, por nós aditado, logo se alcança que o Recorrente labora em erro, porquanto aquele Despacho está devidamente fundamentado, indicando, entre o muito mais, a concreta alínea do artigo 24º da LGT ao abrigo da qual foi operada a reversão.
Consequentemente e sem necessidade de outros considerandos, concluímos que o recurso não merece provimento também nesta parte.
*
Assim, preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:

I - A nulidade da citação não é fundamento de oposição devendo ser arguida em requerimento dirigido ao órgão de execução fiscal, como vem sendo entendido, de forma pacífica e reiterada.

II – Se, na p.i., o Recorrente não questionou o exercício da gerência, a sua invocação em sede recursiva constitui uma questão nova, sobre a qual este Tribunal não pode pronunciar-se, uma vez que também não é do seu conhecimento oficioso.

III - Está devidamente fundamentado o Despacho de Reversão que, além do mais, indica a concreta alínea do artigo 24º da LGT ao abrigo da qual foi operada a reversão.

4. DECISÃO
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso e manter a sentença na recorrida.

Custas a cargo do Recorrente, por aqui sair vencido, nos termos do artigo 527º, nº 1 e 2 do Código de Processo Civil.

Porto, 23 de novembro de 2023

Maria do Rosário Pais - Relatora
Cláudia Almeida – 1ª Adjunta
Ana Cristina Gomes Marques Goinhas Patrocínio – 2ª Adjunta