Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01378/18.5BEAVR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:10/10/2019
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Paulo Ferreira de Magalhães
Descritores:IMPUGNAÇÃO. ERRO NA FORMA DE PROCESSO. ILEGALIDADE DO DESPACHO DE REVERSÃO. PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA.
Sumário:1 - O erro na forma de processo consiste em ter o autor usado de uma forma processual inadequada para fazer valer a sua pretensão, pelo que o acerto ou o erro na forma de processo tem de ser aferido pelo pedido formulado na acção.

2 - Deduzida Impugnação judicial em que é pedida a anulação do despacho que ordenou a reversão da execução fiscal contra o Impugnante, com fundamento na sua ilegitimidade para a reversão, atento o não exercício da gerência de facto da devedora originária e ausência de culpa do revertido pela insuficiência patrimonial daquela para solver as respectivas obrigações tributárias verifica-se ter o Recorrente incorrido em erro na forma de processo.

3 - A convolação do processo de Impugnação judicial em processo de Oposição à execução fiscal só é admissível desde que não seja manifesta a improcedência ou extemporaneidade desta, além da idoneidade da respectiva petição para o efeito.*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:S. R. D. N
Recorrido 1:Administração Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
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Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I - RELATÓRIO

S. R. D. N., inconformado, veio interpor recurso da decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, datada de 21 de fevereiro de 2019, pela qual foi julgado ocorrer erro na forma de processo, tendo por isso sido indeferida liminarmente a Petição inicial apresentada na sequência da sua citação para a execução n.º 0132201481019742, na qualidade de responsável subsidiário.

No âmbito das Alegações por si apresentadas [Cfr. fls. 34 a 39 dos autos em suporte físico], elencou a final as conclusões que ora se reproduzem:

CONCLUSÕES:
“I. Por Sentença de 21 de Fevereiro de 2019, foi decidido
“Com relevância para tal apreciação, consideram-se provados os seguintes factos:
7) Por despacho de 17.01.2018, proferido pelo Chefe do serviço de finanças de . . . no processo de execução fiscal 0132201481019742, instaurado por dívida de retenções da fonte de IRS do ano de 2014, no montante de € 225,00, foi efetuada a reversão contra o Impugnante – cfr. documento, que se dá por integralmente reproduzido, a fls. 32/33 do SITAF;
8) Para citação do ora Impugnante foi remetido oficio por correio registado com aviso de receção, que foi assinado pelo próprio em 26.01.2018 – cfr. documentos, que se dão por integralmente reproduzidos, a fls. 34/35 do SITAF;
9) Em 24.04.2018, o Impugnante apresentou, no serviço de finanças de O. . A., a petição inicial da impugnação judicial contra a reversão referida nos pontos anteriores e que foi autuada com o n.° 636/18.3BEAVR - cfr. fls. 3 e 4 do SITAF do processo n.° 636/18.3BEAVR;

10) Em 10.07.2018, foi proferida decisão de indeferimento liminar da petição inicial referida no ponto anterior, por ineptidão - cfr. fis. 19 a 24 do SITAF do processo n. ° 636/18.3BEAVR;

11) Por ofício expedido em 13.07.2018, foi comunicada ao Impugnante a decisão referida no ponto anterior - cfr. fls. 25 do SITAF do processo n.° 636/18.3BEAVR;

12) Em 11.10.2018, foi apresentada no serviço de finanças de O. . A. a presente petição inicial, com invocação do disposto nos artigos 590.° 560.° do Código de Processo Civil - cfr. fs. 4 e 5 do SITAF.

Não se deram como provados ou não provados quaisquer outros factos com relevância para a decisão da causa.

Os factos foram dados como provados com base na análise crítica dos documentos e informações oficiais constantes dos presentes autos e dos autos instaurados sob o n.° 636/18.3BEAVR, por consulta ao SITAF, conforme se encontra especificado em cada um dos pontos do probatório.
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A presente impugnação judicial vem deduzida no âmbito do processo de execução n.° 0132201481019742, para cuja execução foi o ora Impugnante citado, por reversão, em 26.01.2018.
Do teor da petição inicial, resulta claro que o Impugnante pretende a extinção da execução, pelo que cumpre apreciar, antes demais, se, atendendo ao pedido formulado, o meio processual utilizado é adequado ao efeito jurídico visado pelo Impugnante, uma vez que, à luz do princípio da tipicidade das formas processuais, a cada direito corresponde o meio processual adequado para o fazer valer em juízo (cfr. artigo 2.º do Código de Processo Civil).
Esta adequação afere-se pelo pedido formulado na petição inicial, ou seja, pelo efeito jurídico que se pretende obter com a procedência da causa.

Ora, a impugnação judicial destina-se à apreciação da legalidade de atos tributários, como sejam, atos de liquidação de tributos, atos de fixação de matéria tributável quando não haja lugar a liquidação, atos administrativos em matéria tributária que comportem a apreciação da legalidade de ato de liquidação, atos que decidam agravamentos à coleta, atos de fixação de valores patrimoniais, providências cautelares adotadas pela autoridade tributária e atos de apreensão (cf artigos 97.° n.° 1 e 143. ° conjugados com o disposto no artigo 99. °, todos do Código de Procedimento e de Processo Tributário).
Conclui-se, portanto, que a impugnação judicial não é o meio processual adequado para apreciar o pedido de anulação ou de declaração de nulidade do despacho de reversão.
Pelo contrário, a forma de processo adequada à apreciação de tal pedido é a oposição judicial, deduzida nos termos dos artigos 203.° e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário, cujos fundamentos são os taxativamente elencados no artigo 204.° n.° 1.
Concretizando, uma vez que existe desadequação entre o pedido formulado pelo autor e a finalidade abstratamente figurada pela lei para a impugnação judicial, ocorre erro na forma do processo, que constitui uma nulidade de conhecimento oficioso (cfr. artigos 193º n.° 1 e 196.º do Código de Processo Civil, ex vi artigo 2.º alínea e) do Código de Procedimento e de Processo Tributário).
Todavia, o erro na forma do processo é suscetível de sanação mediante convolação para o meio processual adequado, numa perspetiva de concessão de uma tutela jurisdicional efetiva e plena e de máximo aproveitamento dos atos processuais praticados, e de favorecimento do processo, desde que de tal aproveitamento não resulte uma diminuição das garantias da parte contrária (cfr. artigos 20.º da Constituição da República Portuguesa, 97.° n.° 2 e 3 da Lei Geral Tributária, 98.º n.º 4 do Código de Procedimento e de Processo Tributário, 2. 0n.0 2 e 193.º do Código de Processo Civil).
A convolação da petição na forma processual adequada deve ser determinada quando dela constem pedido e causa de pedir idóneos para o efeito e desde que seja viável o prosseguimento do processo na forma processual adequada, designadamente no que respeita à tempestividade da ação.
De facto, caso seja manifesta a intempestividade da petição inicial com referência ao meio processual adequado ao pedido, não deve ser ordenada a convolação, pois tal conduziria à sua subsequente rejeição liminar e, assim, a convolação consubstanciaria a prática de um ato inútil e, portanto, proibida (cf artigo 130.º do Código de Processo Civil).
Assim, importa apreciar se o pedido é tempestivo para a forma de processo adequada, isto é, para a oposição à execução.

O prazo para deduzir oposição é de 30 dias a contar da citação pessoal ou, não a tendo havido, da primeira penhora, ou da data em que tiver ocorrido facto superveniente ou do seu conhecimento pelo executado (cfr. artigo 203. ° n.° do Código de Procedimento e de Processo Tributário).
No caso dos autos, resulta dos factos provados que o Impugnante foi citado, como revertido, para a execução em 26.01.2018. Consequentemente, o prazo para deduzir oposição à execução terminou em 26.02.2018 (1.º dia útil seguinte ao termo do prazo de 30 dias).
Por outro lado, tendo a primeira petição inicial sido apresentada em 24.04.2018, conclui-se que o foi quando o prazo de 30 dias estava já largamente ultrapassado.
Assim, porque a oposição à execução seria manifestamente extemporânea, revelar-se-ia inútil uma eventual convolação.
Verifica-se, assim, uma situação de erro na forma do processo e de inviabilidade da convolação da presente ação de impugnação judicial para a forma processual adequada, que seria a oposição à execução, o que constitui exceção dilatória que conduz ao indeferimento liminar da petição inicial (cfr. artigos 193.º n.º 1, 278. ° n. ° 1 alíneas b) e 590.º n. ° 1 do Código de Processo Civil).”

II - Inconformado com tal Sentença o Requerente interpôs Recurso pois entende que

III. O método processual adequado é a Impugnação Judicial, uma vez que

IV. “sustenta que determinado imposto deveria ser liquidado não a si, mas a outrém”, “questionando assim a ilegalidade concreta da liquidação”.

V. Na verdade a base do pedido do Recorrente é que quem exerceu as funções de gerente no período da liquidação, não foi ele, mas sim Carlos Manuel Simões da Silva (Artigo 4º da P.I.).

VI. Impugna, ainda que indirectamente, os actos de liquidação pois expressamente diz nunca ter assinado quaisquer documentos de qualquer tipo (Artigo 14º da P.I.).

VII. E que a empresa ainda tem bens, aonde se encontram, e quem os levou (Artigo 12º P.I.), motivo pelo qual naturalmente não se pode aceitar que não existam bens suficientes para pagamento das verbas que originaram a liquidação e a reversão.

VIII. Assim foram alegados factos que só por si põe em causa a liquidação do acto tributário pelo que o meio processual adequado é a Impugnação Judicial.

IX. Mais solicitou o Recorrente a apensação de todos os processos contra si revertidos cuja lista expressamente consta de todas as P.I., sem que tal não tenha sido objecto de decisão, o que naturalmente levaria a uma enorme economia processual.

X. Assim, o Recorrente ao indicar quem deveria ter sido a pessoa contra quem deveria ter sido feita a reversão,

XI. E ao indicar a existência de bens da devedora originária, aonde se encontram e que os levou,

XII. Manifestamente coloca em causa que o “imposto deveria ser liquidado não a si mas a outrém” e que a devedora originária ainda tem bens pelo que não é admissível a reversão, manifestamente questiona a ilegalidade concreta da liquidação do imposto.

XIII. Pelo que e independentemente do peticionário final, o meio processual para decidir o que alega em sua defesa é a impugnação judicial

XIV. Sendo até certo que o Recorrente nunca foi convidado a aperfeiçoar a P.I. como poderia e deveria, no verdadeiro espírito da tutela fundamentada e efectiva da inexistência do acto tributário e da ilegalidade concreta da liquidação.

XV. Foram violados os dispositivos legais,
a) Artigo 102º C.P.P.T, alínea c).
b) Artigo 204º C.P.PT., alínea h).
c) Artigo 66º L.G.T..
d) Artigo 58º C.P.T.A..
e) Artigo 99 C.P.PT.
f) Artigo 268 C.R.P..
g) Artigo 211 C.P.PT..
h) Artigo 257º C.P.PT.
i) Artigo 110º, n.º 2 C.P.PT., e
j) Artigo 22º, n.º 4 L.G.T..

Assim e nestes termos e nos de douto entendimento de V. Exas. deve o presente Recurso ser aceite, e, em consequência ser ordenado o prosseguimento dos autos como Impugnação Judicial, meio processual adequado, desta forma se fazendo JUSTIÇA!”
*
A Recorrida Autoridade Tributária e Aduaneira não apresentou contra-alegações.
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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso, mantendo-se a Sentença recorrida.
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Colhidos os vistos das Ex.mas Senhoras Juízas Desembargadoras Adjuntas, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Em torno do que vem suscitado nas Alegações de recurso por parte do Recorrente, cumpre a este Tribunal apreciar e decidir da invocada ocorrência de erro de julgamento por parte do Tribunal a quo, e nesse conspecto, na parte em que decidiu que o Impugnante, ora Recorrente, incorreu em erro na forma de processo, e nesse conspecto, concluído pela impossibilidade de convolação dos autos no meio processual considerado idóneo, ou seja, em Oposição à execução fiscal.
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III - FUNDAMENTOS
IIIi - DE FACTO

No âmbito da factualidade considerada pela decisão recorrida, dela consta o que por facilidade para aqui se extrai como segue:

“Com relevância para tal apreciação, consideram-se provados os seguintes factos:

1) Por despacho de 17.01.2018, proferido pelo Chefe do serviço de finanças de ... no processo de execução fiscal 0132201481019742, instaurado por dívida de retenções da fonte de IRS do ano de 2014, no montante de € 225,00, foi efetuada a reversão contra o Impugnante – cfr. documento, que se dá por integralmente reproduzido, a fls. 32/33 do SITAF;

2) Para citação do ora Impugnante foi remetido ofício por correio registado com aviso de receção, que foi assinado pelo próprio em 26.01.2018 – cfr. documentos, que se dão por integralmente reproduzidos, a fls. 34/35 do SITAF;

3) Em 24.04.2018, o Impugnante apresentou, no serviço de finanças de O. . A., a petição inicial da impugnação judicial contra a reversão referida nos pontos anteriores e que foi autuada com o n.° 636/18.3BEAVR – cfr. fls. 3 e 4 do SITAF do processo n.º 636/18.3BEAVR;

4) Em 10.07.2018, foi proferida decisão de indeferimento liminar da petição inicial referida no ponto anterior, por ineptidão – cfr. fls. 19 a 24 do SITAF do processo n.º 636/18.3BEAVR;

5) Por ofício expedido em 13.07.2018, foi comunicada ao Impugnante a decisão referida no ponto anterior – cfr. fls. 25 do SITAF do processo n.º 636/18.3BEAVR;

6) Em 11.10.2018, foi apresentada no serviço de finanças de … a presente petição inicial, com invocação do disposto nos artigos 590.° 560.° do Código de Processo Civil – cfr. fls. 4 e 5 do SITAF.
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Não se deram como provados ou não provados quaisquer outros factos com relevância para a decisão da causa.
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Os factos foram dados como provados com base na análise crítica dos documentos e informações oficiais constantes dos presentes autos e dos autos instaurados sob o n.° 636/18.3BEAVR, por consulta ao SITAF, conforme se encontra especificado em cada um dos pontos do probatório.”
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IIIii - DE DIREITO

Está em causa a decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, datada de 21 de fevereiro de 2019, pela qual julgou ocorrer erro na forma de processo, e consequentemente, também, impossibilidade de convolação dos autos em Oposição à execução fiscal, tendo por isso sido indeferida liminarmente a Petição inicial apresentada na sequência da sua citação para a execução n.º 0132201481019742, na qualidade de responsável subsidiário.

As questões suscitadas nestes autos foram já objecto de diversos Acórdãos deste TCA Norte, de que salientam os Doutos Acórdãos proferidos nos processos n.º 649/18.1BEAVR, 1299/18.1BEAVR e 645/18.2BEAVR, todos prolatados em 23 de maio de 2019, onde as partes e as questões a apreciar, incluindo as alegações do recurso jurisdicional e suas conclusões, são idênticas.

Daí que, por semelhança ao caso sub judice e por economia de meios, visando a interpretação e aplicação uniforme do direito [cfr. artigo 8.º n.º 3 do Código Civil], aqui acolhemos aqui a argumentação jurídica aduzida no Acórdão desta Secção, proferido no processo n.º 645/18.1BEAVR, fazendo as adaptações que se mostrem necessárias, que por facilidade de explicitação, para aqui se extrai parte dele, como segue:

“[…]
Está em causa no presente recurso a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro que julgou verificada a excepção de erro na forma de processo e concluiu pela impossibilidade de convolação da impugnação judicial deduzida em oposição à execução fiscal.
O Recorrente insurge-se contra esta decisão, começando por esgrimir em defesa da sua posição a alegação de que a decisão recorrida padece de erro de julgamento de direito quando aí se entendeu que, face ao teor da petição inicial não vinham ali invocados nenhuns dos fundamentos da Impugnação Judicial, elencados no artigo 99º do CPPT, no entendimento, em suma, de que sustentou no seu articulado inicial “que determinado imposto deveria ser liquidado não a si, mas a “outrem”, questionando assim a ilegalidade concreta da liquidação”(…) Impugna, ainda que indirectamente, os actos de liquidação pois expressamente diz nunca ter assinado quaisquer documentos de qualquer tipo (…) Pelo que e independentemente do peticionário final, o meio processual para decidir o que alega em sua defesa é a impugnação judicial (…)”.
Nos termos do disposto no artigo 2º, nº 2, do CPC, subsidiariamente aplicável no contencioso tributário, por força do disposto no artigo 2º, alínea d), da LGT e artigo 2º, alínea e), do CPPT, “a todo o direito, excepto quando a lei determine o contrário, corresponde a acção adequada a fazê-lo reconhecer em juízo, a prevenir ou reparar a violação dele e a realizá-lo coercivamente, bem como os procedimentos necessários para acautelar o efeito útil da acção”.
Em face dessa correspondência entre direito e a acção adequada a fazê-lo reconhecer em juízo, haverá apenas um determinado meio processual que, em cada caso, pode ser utilizado para obter a tutela judicial - assim, Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, 6ª edição, 2011, Vol. II, p. 88.
Tal como resulta da decisão recorrida, perante a invocação de fundamentos de oposição em sede de Impugnação judicial, o Tribunal a quo rejeitou liminarmente a petição inicial apresentada pelo ora Recorrente, por erro na forma de processo, alicerçada na consideração, em síntese, de que «(…) o acto que constitui objecto dos presentes autos, isto é, o acto que determinou a reversão das dívidas da originária devedora para o ora Impugnante não cabe em nenhuma das formas que a impugnação judicial pode revestir, consoante o seu objecto, tal como vem previsto nas alíneas a) a g) do artigo 97.º do CPPT.(…). De facto, e como se disse, o acto que ordena a reversão da execução contra um responsável subsidiário não cabe no elenco dos actos previstos, no que toca ao objecto da impugnação judicial, no citado artigo 97.º do CPPT. Assim, podemos afirmar que a impugnação judicial não é, no caso sub judice, o meio processual adequado a fazer valer a pretensão da ora Impugnante – declaração de nulidade do despacho de reversão. Efectivamente, o processo de impugnação judicial, quando admitido, nunca termina com uma decisão que declare nulo o despacho de reversão.
Na verdade, a satisfação da pretensão do ora Impugnante só poderia ser apreciada, atentos os fundamentos invocados – falta de pressupostos legais da reversão (onde se inclui a alegada falta de gerência de facto e de culpa) – e o pedido efectuado, em sede de oposição à execução fiscal (art. 204.º n.º 1 b), d) e i) do CPPT). (…) perante o referido erro na forma de processo, ter-se-á, então, que averiguar da possibilidade de convolação dos presentes autos na espécie processual adequada (art. 98.º n.º 4 do CPPT).
Como se viu, as causas de pedir e o pedido são subsumíveis à forma processual de oposição à execução fiscal, pelo que, numa primeira análise, não haveria obstáculo à convolação.
Acontece, no entanto, que, tendo o Autor sido citado pessoalmente em 26-01-2018 e tendo apresentado a primeira p.i. em 24-04-2018, verifica-se que o fez excedendo em muito o prazo de 30 dias de que dispunha para deduzir oposição, que seria o meio correcto e que, nos termos do art. 203.º n.º 1 a) do CPPT, tinha que ter sido apresentada no prazo de 30 dias a contar da citação pessoal, ou seja, até 26-02-2018.
E, assim, não sendo a p.i. tempestiva no meio correcto, não pode ser convolada, não podendo deixar de se considerar verificada a excepção dilatória consistente no erro na forma de processo, impeditiva do conhecimento do mérito do pedido (artigos 193.º, 576.º, 577.º e 578.º do CPC, aplicáveis por força do artigo 2.º, al. e) do CPPT) e que, verificada numa fase liminar, implica o indeferimento da petição – art. 590.º n.º 1 do CPC, aplicável, ex vi art. 2.º e) do CPPT. (…)»
Concretamente, importa apreciar e decidir se, como defende o Recorrente, na p.i, foi invocado algum fundamento de impugnação constante do citado normativo.
O erro na forma de processo, contemplado no art. 193º do Código de Processo Civil, consiste em ter o autor usado de uma forma processual inadequada para fazer valer a sua pretensão, pelo que o acerto ou o erro na forma de processo se tem de aferir pelo pedido formulado na acção.
Com efeito, constitui entendimento doutrinal e jurisprudencial pacífico [Cfr., entre outros, Rodrigues Bastos, in “Notas ao Código de Processo Civil”, 3ª ed., 1999, pág. 262; Antunes Varela, in RLJ 115, pág. 245 e segs; Acórdão do STJ de 12/12/2002, no Rec. nº 3981/02, in Sumários, 12/2002; Acórdão da R.Coimbra de 14/3/2000, in BMJ 495, pág. 371; Ac. R.Évora de 12/11/98, in Col.Jur. Ano XXIII, T5, pág. 256; Acórdão da R.Lisboa de 19/1/1995, in Col.Jur. Ano XX, T1, pág. 95, e Acórdão da R.Porto de 5/7/1990, in Col.Jur. Ano XV, T4, pág. 201] que é pelo pedido final formulado, ou seja, pela pretensão que o requerente pretende fazer valer, que se determina a propriedade ou impropriedade do meio processual empregue para o efeito, pelo que, no caso vertente, será pelo pedido formulado pelo impugnante na petição inicial que se terá de aferir do acerto (ou não) do meio processual de que lançou mão para atingir tal desiderato.
Neste mesmo sentido, se pronuncia Jorge Lopes de Sousa in Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, 6ª edição 2011, II volume, página 88, segundo o qual: “É à face do pedido ou conjunto de pedidos formulado pelo interessado que se afere a adequação das formas de processo especiais e, consequentemente, a existência de erro na forma de processo.”
Debruçando-nos mais de perto sobre o caso sub judice, verifica-se que o Recorrente deduziu a presente impugnação judicial em sede de execução fiscal contra ele revertida.
De acordo com o disposto no artigo 99º do CPPT, e conforme referido supra, a Impugnação visa primacialmente a apreciação da legalidade da liquidação.
Todavia, perscrutado o articulado inicial, resulta que se por um lado toda a argumentação expendida pelo Impugnante não é, na sua totalidade, subsumível às situações consagradas naquele normativo, constata-se que o Recorrente termina peticionando que seja a impugnação judicial julgada procedente e consequentemente:«(…) as reversões contra si operadas pelas dívidas da S…, Lda., NIF …., sejam declaradas nulas(…)»
Sobre a questão que ora nos ocupa, se tem vindo a pronunciar reiterada e uniformemente jurisprudência no sentido de que a impugnação judicial, regulada nos artigos 99.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), constitui o meio de reacção padrão de que dispõe o contribuinte para atacar, com fundamento em qualquer ilegalidade, o acto tributário, tomado este em sentido próprio, ou seja, como acto de liquidação do tributo, sendo igualmente este o meio processual adequado para reagir contra outros actos em matéria tributária para os quais a lei preveja ser este o meio de reacção do contribuinte (cfr. o n.º 1 do artigo 97.º do CPPT) – vide, neste sentido, entre outros, os Acórdãos deste Supremo Tribunal de 30 de Setembro de 2009, rec. n.º 626/09, de 14.07.2007, recurso 172/07, de 5.07.2012, recurso 328/12, e de 10.04.2013, recurso 230/13, todos in www.dgsi.pt). Todavia, da leitura do pedido formulado pelo Recorrente no seu articulado inicial resulta que este não imputa ao acto de liquidação que está na génese da execução contra ele revertida, qualquer vício formal ou substancial.
Diversamente, o Impugnante, almejando ver expurgado da ordem jurídica o despacho que contra ele ordenou a reversão da execução fiscal nº 0132201401274082 [no caso dos autos, o n.º 0132201481019742] a correr termos no Serviço de Finanças de …., peticiona (ainda que sem o rigor que um boa técnica jurídica impunha) a extinção daquele processo com fundamento na sua ilegitimidade para a execução, estruturando a respectiva causa de pedir nos seguintes termos
i) a sua ilegitimidade para a execução, na medida em que não exerceu a gerência de facto da sociedade executada sendo, por isso, impossível responsabilizá-lo pelo pagamento da dívida exequenda;
ii) a ausência de culpa pela insuficiência do património societário para solver as obrigações tributárias da executada originária
De facto, toda a alegação do Impugnante assenta na falta de pressupostos para a reversão, nunca este tendo colocado em causa as liquidações que estão na génese da divida exequenda.
Conforme jurisprudência consolidada do STA, estando toda a posição assumida nos autos pelo impetrante dirigida no sentido de fazer vingar a tese da sua ilegitimidade para execução atento o não exercício da gerência de facto o meio processual adequado para impugnar o despacho de reversão é a oposição à execução e não a impugnação judicial,
Sobre esta questão, chamamos à colação os doutos ensinamentos de Jorge Lopes de Sousa in Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado 4ª Edição, 2003, Vislis, nota 31 ao artigo 204º, pág.900, segundo o qual: ”O meio processual adequado para atacar uma decisão relativa à reversão da execução fiscal com fundamento de o revertido não ser responsável pelo pagamento da dívida é a oposição à execução fiscal, nos termos da alínea b) do nº1 do art. 204º deste Código.
A reclamação graciosa e o processo de impugnação judicial, a que os revertidos também podem recorrer nos termos do nº4 do art.22º da LGT, destinam-se a atacar a legalidade da liquidação visando obter a sua anulação ou declaração da sua nulidade ou inexistência (arts. 70º, nº1, 99º e 124º deste Código).
Por outro lado, por força do preceituado no nº1 do art. 151º deste Código, todas as questões relacionadas com os pressupostos da responsabilidade subsidiária deverão ser apreciadas em processo de oposição.
A ser deduzida impugnação judicial em vez de oposição à execução fiscal estar-se-á perante um erro na forma de processo, que poderá conduzir à convolação da petição respectiva em petição de oposição à execução fiscal, se para tal puder ser aproveitada, nos termos dos arts.97º, nº3 da L.G.T., 98º, nº4, deste Código e 199º do C.P.C..” .
Neste sentido, aliás, se tem vindo também a pronunciar, de forma pacífica e reiterada, o Supremo Tribunal Administrativo, nomeadamente, no Acórdão de 08.03.2006, proferido in proc.1249/05, nos termos do qual: É a oposição à execução, e não a impugnação judicial, o meio processual adequado para o executado por reversão discutir em juízo o despacho determinativo dessa reversão.”
Destarte, considerando que o processo de impugnação judicial apenas poderia reconduzir-se ao ataque da legalidade da liquidação, visando obter a sua anulação ou a declaração da sua nulidade ou inexistência (artigo 99.º do C.P.P.T.), e que todas as questões relacionadas com os pressupostos da responsabilidade subsidiária apenas poderiam ser apreciadas em sede de processo de oposição, incorreu o impugnante em manifesto erro na forma de processo.
Da (im)possibilidade da convolação
Nos termos do artigo 98º nº4 do C.P.P.T. e artigo 97º nº3 da L.G.T., em caso de erro na forma de processo, este será convolado na forma de processo adequada, nos termos da lei.
Importa, assim, averiguar da possibilidade de convolação da presente Impugnação para o meio processual idóneo.
Ora, em face da causa de pedir e do pedido formulado nos presentes autos, constata-se, com já referido supra, que o Impugnante pretende que o tribunal conheça da sua ilegitimidade para a execução.
Todavia, constatando-se que o efeito jurídico pretendido com a petição inicial e os fundamentos de facto e de direito de que o interessado o faz derivar se mostram adequados, não à forma processual utilizada, mas a outra existente na ordem jurídica adjectiva, importa determinar da possibilidade de se proceder à convolação dos presentes autos no meio processual compatível com a defesa dos interesses a proteger.
Tendo presente que o erro na forma de processo não está catalogado na lei adjectiva fiscal como uma nulidade insanável, importando unicamente a anulação dos actos que não possam ser aproveitados ou que diminuam as garantias de defesa e devendo praticar-se os que forem estritamente necessários para que o processo se aproxime, quanto possível, da forma estabelecida na lei, afigura-se, no imediato e em abstracto, legalmente possível convolar a petição para o meio processual idóneo, nos termos dos artigos 97º nº3 da Lei Geral Tributária e 94º, nº4 do C.P.P.T., preceitos estes que constituem corolário lógico do direito de acesso aos tribunais consagrado nos artigos 20º e 268º da Constituição da República Portuguesa (C.R.P.).
Sobre esta questão, já se pronunciou o Supremo Tribunal Administrativo, no douto Acórdão de 17-03-2004, proferido in processo 0929/03, segundo o qual: «IV - O erro na forma de processo implica a nulidade respectiva atento o disposto no art.199º, nº1 do C.P.C., quando o autor indica para a acção uma forma processual inadequada ao critério legal, usando de uma forma de processo distinta da legalmente prevista para fazer valer a sua pretensão. V- Constatando-se que o efeito jurídico pretendido com aquele pedido e os fundamentos de facto e de direito de que o requerente o faz derivar se mostram adequados, não à forma processual por ele eleita, mas a outra existente na nossa ordem jurídica adjectiva, pode-se, todavia, e nos termos do disposto nos arts. 97º nº3, da LGT e 94º, nº4 do CPPT, convolar a petição para tal meio processual.”( vide, ainda, o Acórdão de 29.05.96 proferido no processo 019850).
Ainda, neste sentido, se pronuncia Jorge Lopes de Sousa in Código de Procedimento e de Processo Tributário», anotado, 4ª edição, da Vislis, 2003, pág. 1045, anotação 5ª ao art. 276º.segundo o qual:” A haver erro na forma de processo utilizada, deverá efectuar-se a convolação para a forma de processo adequada, sempre que não haja obstáculo intransponível.
Assim, nos termos do preceituado no artigo 193º do Código de Processo Civil, “ex vi” artigo 2º al. e) do Código de Procedimento e de Processo Tributário, o erro de na forma de processo importa unicamente a anulação dos actos que não possam ser aproveitados, devendo praticar-se os que forem estritamente necessários para que o processo se aproxime quanto possível, da forma estabelecida na lei, devendo ser ordenada oficiosamente a convolação na forma de processo adequada – artigo 98º nº4 do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Porém, para ser ordenada a convolação impera que o meio processual idóneo se mostre tempestivo e a causa de pedir e o pedido formulados se mostrem igualmente adequados.
No que concerne à possibilidade de convolação da presente impugnação em oposição, impõe-se ter em consideração o prazo legalmente fixado para o revertido se opor à execução, se a petição para tal puder ser aproveitada, nos termos dos arts. 97.º, n. 3, da L.G.T., 98.º, n. 4, deste Código e 193.º do C.P.C..
Sobre esta matéria, aliás, se tem vindo também a pronunciar, de forma pacífica e reiterada, o STA, nomeadamente, no Acórdão do S.T.A. de 06.04 2005, lavrado in proc. 01100/04, segundo o qual: I - O meio processual adequado para reagir contra o despacho do Chefe da Repartição de Finanças que ordena a reversão da execução fiscal contra o gerente da sociedade executada, na sua qualidade de responsável subsidiário, é a oposição à execução fiscal. II - A convolação do processo de impugnação judicial em processo de oposição à execução fiscal só é admissível desde que não seja manifesta a improcedência ou extemporaneidade desta, além da idoneidade da respectiva petição para o efeito. (vide, entre outros, os Acórdãos de 4/11/99, in rec. nº22.728 e de 24/3/04, in rec. nº 1.844/03)
Ora, se da análise dos autos resulta que a petição inicial se afigura idónea (ainda que o pedido denuncie alguma falta de rigor técnico-jurídico), todavia, perscrutado o probatório resulta manifesto um “obstáculo intransponível” que obsta à convolação, e que concerne à intempestividade do meio processual considerado idóneo, uma vez que, tendo o Oponente sido citado pessoalmente em 26.01.2018 (ponto 1.), quando a petição inicial foi apresentada no Serviço de Finanças de O. . A., concretamente em 24.04.2018, há muito que se encontrava esgotado o prazo legalmente fixado para deduzir oposição (30 dias - cfr . art 203º nº1 al a) do CPPT).

[…]
Destarte, verificando-se ter o Impugnante, ora Recorrente, incorrido em erro na forma de processo e afigurando-se impossível a convolação dos autos no meio processual idóneo, improcedem in totum as conclusões de recurso apreciadas, não merecendo a sentença a quo a censura que lhe é desferida.(…)”.

Em face do que deixamos expendido supra, porque a doutrina do citado Acórdão [com as adaptações feitas] se aplica ao presente recurso jurisdicional, pois que, claramente, ocorre o decidido erro na forma de processo, e mostra-se inviável a convolação dos autos no meio processual adequado [Oposição] a Sentença recorrida não merece por isso censura, pelo que improcedem todas as conclusões do recurso.

Efectivamente, em face da jurisprudência agora citada e que vem sendo extraída de modo uniforme e reiterado pela Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, julgamos assim, também, que é de negar provimento ao recurso e manter a sentença prolatada pelo Tribunal a quo.
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E assim formulamos as seguintes CONCLUSÕES/SUMÁRIO:

Descritores: Impugnação. Erro na forma de processo. Ilegalidade do despacho de reversão. Pressupostos da responsabilidade subsidiária.

1 - O erro na forma de processo consiste em ter o autor usado de uma forma processual inadequada para fazer valer a sua pretensão, pelo que o acerto ou o erro na forma de processo tem de ser aferido pelo pedido formulado na acção.

2 - Deduzida Impugnação judicial em que é pedida a anulação do despacho que ordenou a reversão da execução fiscal contra o Impugnante, com fundamento na sua ilegitimidade para a reversão, atento o não exercício da gerência de facto da devedora originária e ausência de culpa do revertido pela insuficiência patrimonial daquela para solver as respectivas obrigações tributárias verifica-se ter o Recorrente incorrido em erro na forma de processo.

3 - A convolação do processo de Impugnação judicial em processo de Oposição à execução fiscal só é admissível desde que não seja manifesta a improcedência ou extemporaneidade desta, além da idoneidade da respectiva petição para o efeito.
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IV - DECISÃO

Nestes termos, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202.º da Constituição da República Portuguesa, os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, Acordam em negar provimento ao recurso, confirmando a Sentença recorrida.
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Custas a cargo do Recorrente.
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Notifique.
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Porto, 10 de outubro de 2019.


Paulo Ferreira de Magalhães
Cláudia de Almeida
Cristina da Nova