Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00707/07.1BEBRG
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:07/15/2016
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Descritores:ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL, INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL
PRESTAÇÕES DE DESEMPREGO
Sumário:I- Um Membro de órgão estatutário (MOE), cuja função de gerente não é remunerada, mantendo essa condição no quadro da dita sociedade, e confrontado com a cessação do contrato de trabalho dependente que o vinculava a determinada entidade patronal, tem direito a subsídio de desemprego;
I.1- a tal não obsta o facto de a renúncia ter sido comunicada à Conservatória do Registo Comercial muito posteriormente à declaração de renúncia da Autora, aqui Recorrida, ou seja, não é esse facto que deve servir para justificar o pedido de indeferimento das prestações de desemprego, atenta a finalidade do registo.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Instituto da Segurança Social, I.P.
Recorrido 1:MAMG
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
RELATÓRIO
MAMG, casada, residente na Rua …, intentou acção administrativa especial contra o Instituto da Segurança Social, I.P., através da qual impugna o despacho proferido, em 15 de Novembro de 2006, pela Directora do Núcleo de Identificação de Beneficiários e Registo de Remunerações do Centro Distrital de Segurança Social de Braga, que lhe indeferiu o pedido de prestações de desemprego apresentado em 01/06/2006.
Pediu a anulação do acto administrativo consubstanciado naquele despacho e que a Entidade Ré seja condenada a deferir-lhe a concessão das prestações de desemprego, “reconstituindo a situação que existiria se o acto impugnado não tivesse sido praticado”.
Por decisão proferida pelo TAF de Braga foi julgada procedente a acção, anulado o acto impugnado e condenado o Réu a deferir o pedido de prestações de desemprego apresentado pela Autora no dia 01 de Junho de 2006.
Desta vem interposto recurso.
Nas alegações o ISS, I.P. formulou as seguintes conclusões:
A. A decisão proferida nos autos padece de erros de julgamento. Senão vejamos:
B. Em sede de contestação, o Réu, ora Recorrido apenas sustentou como questões prévias a ineptidão da petição inicial e, caso assim não se entendesse, a inimpugnabilidade do ato praticado em 12/01/2007, por entender ser este o ato que estava a ser alvo de impugnação.
C. Porém, como decorre do também despacho saneador, foi julgada não verificada a ineptidão da petição inicial e a impugnabilidade do referido despacho,
D. sendo que, no que à impugnabilidade do ato diz respeito, daquele despacho resulta que o ato que a Autora impugnou, e que é impugnável, é a decisão de 15/11/2006.
E. Em sede de despacho saneador, o Tribunal não se pronunciou quanto à tempestividade da ação, questão que, de resto, não foi suscitada,
F. o mesmo sucedendo na decisão final, embora nesta o Tribunal tenha dado como provado que a petição inicial deu entrada no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga em 24/04/2007 – cfr nº 16 dos factos provados – e que o ato estava inquinado de vício suscetível de anulação.
G. Ora, constatando-se que a Autora impugnou o ato praticado em 15/11/2006, que a ação só deu entrada no Tribunal em 24/04/2007, que o mesmo era passível de anulação, como foi decidido a final, e que o artº 58º, 2, b) do CPTA estipula que a impugnação de atos anuláveis tem lugar no prazo de três meses, a sentença proferida deveria ter verificado, e não verificou, se a petição era tempestiva e, não sendo, como até se constata, ter absolvido o Réu, ora Recorrente, da instância, face à caducidade do direito de ação, que constitui uma excepção dilatória de conhecimento oficioso.
H. E não se diga que esta questão da tempestividade só podia ter sido apreciada em sede de despacho saneador. Na verdade,
I. afirmar isto seria premiar uma das partes, a Autora, pela omissão do próprio Tribunal. Além disso,
J. o nº 2 do artº 87º do CPTA apenas impede a arguição, e consequente decisão, de exceções após o saneador, sendo que no caso em apreço não se trata de exceção que tenha sido suscitada. Por outro lado,
K. a total omissão de apreciação da tempestividade da ação não pode ter um tratamento diferente, por mais gravoso para o Réu, daquele que resulta do disposto do nº 4 do artº 595º do CPC, isto é, a possibilidade de relegar para decisão final a decisão sobre as exceções que o estado do processo não permita ainda conhecer.
L. Aliás, como escrevem Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira sobre o artº 87º do CPTA, “O nº 2 terá, assim, de ser articulado com a al. a) do nº 1, referindo-se às questões que obstem ao conhecimento do objeto do processo que sejam detetáveis no momento em que o juiz se prepare para exercer a competência prevista neste preceito”.
M. E, como é sabido, por vezes, a decisão sobre a existência de um pressuposto processual só é possível no momento da apreciação do mérito, pela sua complexidade ou pela íntima conexão com problemas de fundo, em que haja vícios que importem não a anulabilidade, mas a nulidade do ato, com consequências na decisão relativa à tempestividade.
Sem prescindir,
N. ainda que a exceção em causa devesse ter sido apreciada e decidida no despacho saneador, então este é o momento para se recorrer desse despacho, exatamente por não ter apreciado tal exceção, violando o artº 87º, 1, a) do CPTA. Na verdade,
O. de acordo com o previsto no artº 142º, 5 do CPTA, a decisão, ou melhor, a omissão de decisão do despacho saneador é recorrível com a decisão a final, pois este não pôs termo ao processo e a sua subida a final não o torna inútil, razão pela qual apenas é recorrível com o recurso que venha a ser interposto da decisão final.
P. Veja-se, neste sentido, o Ac do TCA Sul, de 2/04/2009, Proc 01527/06, disponível em www.dgsi.pt que refere: “o despacho que decidiu inexistirem questões prévias, porque não pôs termo ao processo e a não subida imediata de recurso dele interposto não o torna completamente inútil, não era imediatamente recorrível, só o podendo ser no âmbito do recurso que venha a ser interposto da decisão final.”
Q. No mesmo sentido, Mário Aroso de Almeida e Carlos Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 1ª ed., pág. 708 “Entre os despachos interlocutórios que têm subida diferida e se encontram, como tal, abrangidos pela primeira parte do nº 5, contam-se os despachos que, na fase de saneamento do processo, julguem improcedente uma questão prévia (cfr. artº 87º, 1, a) e 2, no que concerne à ação administrativa especial”.
Ainda sem prescindir,
R. e como se decidiu no Ac RC, de 8/11/2011, disponível em www.dgsi.pt, ao Tribunal ad quem é sempre lícita a apreciação de qualquer questão de conhecimento oficioso ainda que esta não tenha sido decidida ou sequer colocada na instância recorrida. Estas questões constituem um objeto implícito do recurso, que torna lícita a sua apreciação na instância correspondente, sem prejuízo do direito ao contraditório, o que se requer.
Sem prescindir, mesmo que se entenda que não se verifica a caducidade do direito da ação, o que não se concede mas que por mera hipótese de patrocínio se coloca, sempre se dirá que:
S. A sentença menosprezou a data do registo à renúncia à gerência por parte da Autora face a uma carta simples entregue em mão da qual consta a mesma renúncia,
T. bem como a data de registo da dissolução da sociedade da qual a Autora, como sócia, na ausência de outros gerentes nomeados, mantinha a qualidade de gerente.
U. A decisão não tem em conta que são milhares os beneficiários inscritos na base de dados do Réu que, ao longo da sua vida, alteram a sua qualificação, isto é, e por exemplo, passam de trabalhadores por conta de outrem para membros de órgãos estatutários ou vice versa, ou cumulam ambas as situações, ou passam para trabalhadores independentes, etc, etc.
V. E é - e só pode ser -, a cada um dos beneficiários, neste caso, a Autora, ora Recorrida, que cabe o ónus de informar e provar perante o ISS, IP/Centro Distrital de Braga o facto que origina a alteração à sua qualificação, que no caso é a renúncia da Autora à gerência e dissolução da sociedade, atempadamente.
W. Nunca um bom pai de família, dentro da sua razoabilidade, pode aceitar alterar a qualificação da Autora, isto é, cessando a sua qualificação como membro de órgão estatutário, em 30/06/1998, com base numa carta simples entregue em mão, quando a renúncia à gerência apenas foi registada em 28/04/2006, isto é, passados quase oito anos…
X. Só se pode aceitar alterar a qualificação na data da decisão ou deliberação se o registo desta ocorreu dentro do prazo legal. Com efeito,
Y. é facto notório que “fabricar” uma carta simples com tal conteúdo, com o objectivo final de receber subsídio de desemprego é obviamente fácil e altamente lesivo do Estado.
Z. Ainda se fosse uma ata lavrada por escritura pública, até se podia, eventualmente, considerar este título meio de prova suficiente, mas assim, decididamente, não.
AA. Afinal, não se trata de uma situação sujeita a registo obrigatório?!
BB. Se não fosse sujeito a registo obrigatório, aí sim, com a exigência do registo o ora Recorrente estaria a ser como se diz em linguagem corrente “mais papista que o papa”.
CC. Agora, sendo sujeito a registo obrigatório (cfr art 15º, 1 do Código do Registo Comercial), atentas as funções e objetivos deste, só com o mesmo é que o Réu podia e pode alterar as qualificações dos beneficiários que estão identificados como gerentes.
DD. Repare-se que, em sentido oposto, também só com a apresentação do registo da Autora como gerente é que a mesma foi qualificada como gerente na base de dados do ISS, IP,
EE. não havendo qualquer impedimento para, posteriormente, a mesma cumular a qualificação de membro de órgão estatutário com a trabalhador por conta de outrem. Além disso,
FF. não é verdade que o atraso no registo da renúncia à gerência não lhe possa ser imputado,
GG. até porque a Autora não era uma pessoa estranha à sociedade, antes sendo sócia da mesma,
HH. tendo também participado na assembleia geral sociedade realizada em 31/12/1998… Acresce que,
II. o ISS, IP / Centro Distrital de Braga é um terceiro de boa-fé cujos direitos os efeitos do registo da visam salvaguardar, registo este que constitui a única prova legalmente admissível que atribuiu segurança e transparência jurídica nos procedimentos de qualificação dos beneficiários, alcançando soluções iguais em situações iguais.
JJ. Veja-se o que o Supremo Tribunal de Justiça refere quanto ao registo comercial no Acórdão de 15/03/2012, Proc 954/06 in www.dgsi.pt: “O registo comercial visa publicitar a situação jurídica dos comerciantes e sociedades comerciais, de modo a garantir a segurança do comércio jurídico. Apenas são oponíveis a terceiros os factos sujeitos a registo após a data do respetivo registo, sendo que a noção de terceiros para efeitos de registo comercial não coincide com a noção no sentido técnico registral, pois abrange todas as pessoas que não são parte no facto sujeito a registo, seu herdeiro ou representante”, o que é manifestamente o caso do ISS, IP.
KK. Não atender à data do registo importa um tratamento casuístico da situação, em detrimento do geral.
LL. Em termos analógicos seria como criar normas “ad hoc” para cada caso em concreto, quando há uma lei geral e abstrata que dá resposta, que regula a situação.
MM. Além disso, aquela diferença também penalizaria quem regista, dentro do prazo legal, o ato, premiando, ao invés, quem, com base em títulos falíveis, se colocasse em situação de receber a prestação peticionada, contornando a lei. Acresce que,
NN. com o registo da renúncia de todos os gerentes e na falta de nomeação de gerência, são gerentes todos os sócios, nos termos do artº 253º do CSC.
OO. E, uma vez que o registo na Conservatória do Registo Comercial da dissolução e encerramento da liquidação foi efetuada em 2/08/2006, só nesta data a administração da sociedade ou os seus liquidatários deixam de estar enquadrados no regime de segurança social dos membros dos órgãos estatutários.
PP. Pelo exposto, o ISS, IP / Centro Distrital de Braga só podia alterar a qualificação da Autora em 2/08/2006.
QQ. Assim, na data em que a Autora, ora Recorrida, requereu o subsídio de desemprego – 1/06/2006 - a mesma ainda estava, e bem, qualificada como MOE, não obstante a sua função de gerente não ser remunerada, como, de resto, também nunca o tinha sido (cfr nº 14 dos factos provados). Logo,
RR. não se encontrava em situação de inexistência total de involuntária de emprego, logo,
SS. foi, e bem, indeferido, o subsídio de desemprego pois devidamente fundamentado na lei.
TERMOS EM QUE, - deverá o Tribunal ad quem apreciar a questão da tempestividade da ação, de conhecimento oficioso e que ainda não foi sido decidida ou sequer colocada na instância recorrida, e, em consequência, absolver o Réu, ora Recorrente, da instância, face à caducidade do direito de ação, que se verifica,
ou, caso assim não se entenda,
- deverá o presente recurso ser julgado procedente revogando-se a sentença proferida pelo Tribunal a quo com as devidas consequências legais, como é de JUSTIÇA.

A Autora contra-alegou, concluindo assim:
A- Andou bem o Tribunal a quo ao julgar procedente e provada a ação intentada pela Autora e, determinando a anulabilidade do acto impugnado, e consequentemente, que a Ré deferisse o pedido de prestações de desemprego datado 01.06.2006.

B- A Recorrente, então Ré, em sede de contestação e, sendo esse o momento oportuno (defesa), ter tentado obstar ao prosseguimento da ação administrativa especial pela via do n.º 1, alínea a) e c) do art. 89º do CPTA, mas sem êxito, vem, agora arguir, à luz da alínea h) do supra citado artigo, a caducidade do direito de ação.

C- A invocação de tal exepção dilatória – caducidade do direito de ação - , em sede de alegações de recurso de sentença é, com o devido respeito, de todo intempestiva/extemporânea.

D- Bem sabe a recorrente que toda a matéria relativa à defesa, seja por impugnação, seja por excepção, deve ser arguida em sede de contestação – art. 83º, n.º 1 , do CPTA e art. 573º do CPC.

E- A caducidade do direito de ação, configura defesa por excepção, e o momento oportuno para ser suscitada é em sede de contestação.

F- Mas, não o foi como a própria Ré reconhece.
G- A aceitar-se que tal questão seria de conhecimento oficioso (o que não nos parece, salvo melhor opinião), então a mesma devia ter sido conhecida em sede de despacho saneador , cfr. preceitua a alínea a) do n.º 1, do art. 87º do CPTA. Não foi, logo estava mais do que precludido o direito a suscitá-la.... aliás, assim vem decidindo a Jurisprudência.

H- A caducidade de direito de ação, de conhecimento oficioso ou não, deveria ter sido apreciada em sede de despacho saneador. Ora, tal despacho nada refere acerca de tal exceção. Contudo, e uma vez que, quer a data da prática de ato administrativo, quer a da prolação do ato confirmativo daquele, eram de pleno conhecimento da Ré (que os proferiu), bem como, a data da propositura da ação, então deveria a ora recorrente, em sede de contestação, ter invocado tal exceção, em estrita observância do disposto n.º 1 do art. 83º do CPTA, art. 333º, n.º 2 e art. 303º do Código Civil.

I- O despacho saneador configura uma situação de “caso julgado formal”. E mesmo a aceitar-se, por mera hipótese, que caducidade do direito de ação fosse de conhecimento oficioso tal “não lhe confere um qualquer regime especial que permita ou possibilite operar de um regime de exceção à regra em nada interfere do n.º 2 do art. 87º do CPTA, tanto mais que o desiderato visado pelo legislador foi obstar a que o julgador administrativo pudesse, após o momento próprio da fase do saneador, vir a suscitar oficiosamente ou conhecer de exceções e questões prévias não invocadas e, dessa forma, prolatar decisões de forma sem qualquer pronúncia sobre o mérito”- cfr. Ac. TCA do Norte de 28.06.2013

J- não se quer dizer, que o despacho saneador, oportunamente proferido e notificado, era inatacável, pois poderia ter sido objecto de recurso, mas não foi!! Nem aquando da sua prolação, nem aquando do recurso da sentença em crise, já que, de forma expressa refere a Recorrente, no seu requerimento de interposição de recurso que, “não se conformando com a (…) sentença proferida (…), dela vem interpor recurso”, sem qualquer alusão expressa ao despacho saneador e, sobretudo, sem qualquer remição para o disposto no n.º 5 do art. 142º do CPTA.

K- Convém ainda no tocante à questão da caducidade da ação, esclarecer que petição da ação administrativa especial em crise é tempestiva.

L- O ato administrativo in crise, praticado 21.11.2006, posteriormente, notificado à interessada. Esta reclamou de tal ato.

M- A resposta à reclamação foi proferida no final de Janeiro de 2007, mais precisamente, a 25.01.2007 e, posteriormente, comunicado à interessada, via CTT.

N- Notificação essa que termina assim, “ mais se informa, que V.ª Ex.ª dispõe do prazo de 3 meses para recorrer hierárquica ou contenciosamente do acto administrativo em questão, a contar da data em o acto foi confirmado” . Ou seja, nunca antes do dia 25 de Janeiro de 2007 se inciou a contagem dos 3 meses.”

O- A Petição Inicial foi remetida, via CTT, no dia 23.04.2007 (segunda-feira) e deu entrada no Tribunal no dia seguinte, 24.04.2007. Simples cálculo aritmético confirma a tempestividade daquela.

P- Parece, pois, que pretende a Recorrente fazer tábua rasa do conteúdo, por si, inserto na parte final do ato confirmativo e, contar o prazo de 3 meses, desde a prática do ato administrativo impugnado, o que não se pode aceitar, pois a ser assim, então configuraria um venire contra factum proprium.

Q- Se o prazo se contava desde a prática do ato adminstrativo, então o que pretendeu a Recorrente foi induzir a interessada em erro, no que toca aos prazos de que dispunha, situação que encaixa na alínea a) do n.º 4, do art. 58º do CPTA e, lhe confere prazo de um ano para recorrer do ato.

R- O prazo de 3 meses não havia ainda decorrido aquando da propositura da ação, afastando-se, de todo, a caducidade do direito. Se o que se pretendeu, foi induzir a interessada em erro, esqueceu-se que a lei protege-a, de tais situações, conferindo-lhe prazo para além dos 3 meses, desde que não ultrapasse, 1 ano para recorrer das decisões contra si proferidas – art. 58º, n.º 4, a) do CPTA -. Prazo esse muito longe de expirar aquando da entrada da ação.

S- Quanto à questão material/ de fundo, em 01 de Junho de 2006 a Autora, formulou pedido de prestações de desemprego, devido à caducidade do seu contrato de trabalho a 30.05.2006.

T- Decorrido algum tempo, é informada que enquanto MOE de uma sociedade comercial, não reúne à partida, os pressupostos que lhe permitam auferir do subsídio de desemprego.

U- De imediato, esclarece que em 30 de Junho de 1998 renunciou, por carta, à gerência da Sociedade Agrícola Quinta da S.... Mais, que nessa mesma data, teve lugar Assembleia Geral Extraordinária da dita sociedade, no decurso da qual foi aprovada a renúncia à gerência apresentada pela A.

V- No dia 31.12.1998, em reunião de Assembleia Geral da Sociedade Agrícola foi aprovada a dissolução daquela sociedade. No período que mediou entre estas duas Assembleias da sociedade, ou seja, de 30.06.1998 a 31.12.1998, a Autora conjuntamente com outras das sócias, assumiram as funções de liquidatárias daquela.

W- A 31.12.1998 dissolvida a sociedade, vendido os bens, pagas as dívidas, etc, aquela pode dizer-se “ morreu”.

X- Provado ficou ainda, sem que nada tivesse sido suscitado nesta sede, que as funções de gerência exercidas pela Autora naquela sociedade, nunca foram objecto de remuneração.

Y- Tal como refere, ou melhor reconhece, a Recorrente nas suas alegações, muitas situações idênticas a esta ocorrem, em que a Segurança Social lançando mão de um aspecto formal – falta ou tardio registo do acto de renúncia aos MOE – indefere o pedido de prestações de desemprego.

Z- E, Tantas foram as situações idênticas, a maioria alvo de recurso jurisdicional, por vezes, decidindo-se, de forma diferente situações semelhantes, que para que dúvidas não restem foi proferido Acórdão de fixação de Jurisprudência.

AA- Assim, vem o Acórdão do STA n.º 4/2013, de 14.03.2013, no ponto 4, alínea b) fixar jurisprudência nos seguintes termos: a condição de sócio gerente de uma sociedade comercial, sem direito a qualquer remuneração, de um trabalhador por conta de outrem, cujo contrato de trabalho cessou, não obsta à caracterização da respectiva situação como desemprego, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 6, número 1, do DL119/99, de 14 de Abril, e 2, número 1, do DL 220/2006, de 3 de Novembro respectivamente.”

BB- O sócio gerente de uma sociedade, não remunerado, mantendo essa condição no quadro da dita sociedade, e confrontado com a cessação do contrato de trabalho dependente, que o vinculava a determinada entidade patronal, tem direito a subsídio de desemprego – cfr. Acórdão n.º 4/2013 do STA.

CC- Então e que dizer da situação da Autora, que apenas não registou junto da Conservatória do registo Comercial a sua renúncia à gerência e, por essa única razão, vê ser lhe negado o direito ao acesso às prestações de desemprego??

DD- Injusta, inqualificável e contrária ao Acórdão de fixação de jurisprudência referido, que determina o acesso a prestações de desemprego ainda que exerça, simultaneamente, função de gerente, desde que a mesma não seja remunerada.

EE- Decidiu bem Tribunal a quo, anulando o ato impugnado e, consequentemente, condenando a Ré a deferir o pedido de prestações de desemprego e indo de encontra ao Acórdão do STA n.º 4/2013.

Termos em que,
E atento o supra exposto, deve o Tribunal ad quem, julgar intempestiva a questão da caducidade do direito de ação, sob pena de não o fazendo infringir, entre outros, o n.º 2 do art. 87º do CPTA, bem como, contrariando a jurisprudência dominante e, concomitantemente, proferir decisão que mantenha a sentença objecto de recurso.
Assim, se fazendo JUSTIÇA.

O MP, notificado nos termos e para os efeitos do artº 146º/1 do CPTA, emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso.

Cumpre apreciar e decidir.
FUNDAMENTOS
DE FACTO

Na decisão foi fixada a seguinte factualidade:

1.
A Autora apresentou, no dia 01 de Junho de 2006, no Centro Distrital de Braga do Instituto da Segurança Social, requerimento formulando o pedido de pagamento de prestações de desemprego. (Cfr.Doc. 3 junto com a Petição Inicial (PI) e fls. 2 e 26/59 do PA).
2.
A Autora fez acompanhar o Requerimento da Declaração de Situação de Desemprego, certificando a empregadora, “ABB, SA”, que o contrato de trabalho celebrado, entre ambas teve início em 01 de Outubro de 2004 e cessou em 30 de Maio de 2006, por caducidade do contrato a termo (Cfr. Doc. n.º 3, junto com a PI e fls.2/59 do PA 2).
3.
Em 28 de Setembro de 2006 os serviços do Centro Distrital de Segurança Social de Braga, elaboraram a seguinte «INFORMAÇÃO PARA DESPACHO DE INDEFERIMENTO:
«Propõe-se o indeferimento com base nos fundamentos a seguir assinalados:
- Exercer actividade profissional, não se encontrando, assim em situação de desemprego total (n.º 1 do art.º 6.º do DL n.º 119/99 de 14.04, na redacção dada pelo DL n.º186-B/99 de 31.05).
– Foi sócia – gerente da firma “ Sociedade Agrícola Quinta da S.... Lda.” até 02/08/2006» (Cfr. fls. 13/59 do PA 2).
4.
Em 04 de Outubro de 2006, sobre a informação supra referida, foi exarado pelo Director do Núcleo de Desemprego - Prestações Diferidas e H. Remunerações – do Centro Distrital da Segurança Social, de Braga, o seguinte Despacho:
Concordo
Proceda-se à audiência de interessados nos termos do art.º 100 e seguintes do CPA, notificando-o de que na falta de resposta no prazo de 10 dias úteis a contar da data da notificação, o requerimento é indeferido considerando-se a data do indeferimento o 1.º dia útil seguinte ao termo do referido prazo.
Notifique-se, igualmente, o interessado dos prazos de reclamação e recurso” (Cfr. fls. 13/59 do PA 2).
5.
A Autora foi notificada do despacho supra, através do ofício n.º 140030, do Centro Distrital da Segurança Social de Braga, datado de 12.10.2006,com a referência “REQUERIMENTO DE PRESTAÇÕES DE DESEMPREGO (…) Assunto: Notificação de Decisão”, e do seguinte teor: “Informa-se V. Ex.ª que o requerimento acima indicado será indeferido se, no prazo 10 dias úteis a contar da data da recepção deste ofício, não der entrada nestes serviços, resposta por escrito, da qual contem elementos que possam obstar ao indeferimento, juntando meios de prova se for caso disso.
Os fundamentos para o indeferimento, são os a seguir indicados:
- Exercer actividade profissional, não se encontrando em situação de desemprego total (n.º1 do art.º 6.º do Decreto – Lei n.º119/99, de 14 de Abril, na redacção dada pelo Decreto – Lei n.º 186-B/99, de 31 de Maio).
Mais se informa que, na falta de resposta, o indeferimento ocorre no primeiro dia útil seguinte ao do termo do prazo acima referido, data a partir da qual se inicia a contagem dos prazos de:
- 15 dias úteis para reclamar;
- 3 meses para recorrer contenciosamente ” (Cfr. Doc. nº 9 da P.I e fls. 15/59 do P.A 2)
6.
A Autora, com data de 23.10.2006, resposta ao ofício supra, nos termos seguintes:
«(…) Em resposta à notificação datada de 12 de Outubro de 2006, sob o ofício n.º 140030, de que junto fotocópia, cumpre-me reafirmar o seguinte:
1. Contrariamente ao que assinalam como fundamento para o indeferimento do meu pedido de subsídio de desemprego, deixei de ser sócia – gerente da “Sociedade Agrícola da Quinta da S..., Lda” em 30 de Junho de 1998
(…)
2. As actas, nomeadamente Acta n.º 18 e Acta n.º 19, foram depois de autenticadas enviadas em anexo à carta datada de 9 do corrente, que respondia ao v/ ofício n.º 1296600 de 19/09/2006, da qual junto agora fotocópia (Anexo I).
3. Junto também fotocópia da carta que, em 10 do Corrente, dirigi ao Chefe de Equipa do Desemprego (Anexo 2) (….).(Cfr. Doc. n.º 10 da P.I e fls.46 a 57/59 do P.A 2).
7.
A Directora do Núcleo de Identificação de Beneficiários e Registo de Remunerações do Centro Distrital de Segurança Social de Braga proferiu, em 15 de Novembro de 2006, despacho indeferindo o pedido de prestações de desemprego apresentado pela Autora, em 01.06.2006 – Acto Impugnado – com o teor seguinte:” Notificar a beneficiária que após análise da sua reclamação, se mantém a decisão do seu enquadramento no regime dos MOE`s de 4/2/1988 a 02/08/2006, com base nos seguintes fundamentos:
· A cessação de funções de um MOE só é oponível à Segurança Social desde que devidamente registada, nos termos do art.º 14.º do CRC
· A renúncia à gerência ocorreu em 28/04/2006, data do registo na CRC de Braga
· Com a renúncia de todos os gerentes e na falta de nomeação, são gerentes todos os sócios, nos termos do n.º 1 do art.º 191.º do CSC. Uma vez que a mesma era sócia naquela data manteve a qualidade de gerente e consequentemente o seu enquadramento no regime dos MOE’S até à data da dissolução da sociedade em 2/08/2006” (Cfr. Fls.71 do PA 1).
8.
A Autora foi notificada da decisão supra, através do ofício n.º 163054, datado de 21 de Novembro de 2006, com o “Assunto: Inscrição da entidade empregadora”, nos termos seguintes:
Serve o presente para informar V.Ex.ª, que face à exposição apresentada em 09/10/2009, se procedeu a nova apreciação do processo, mantendo-se o seu enquadramento no Regime dos Membros dos Órgãos Estatutários no período de 4/2/1988 a 02/08/2006, por despacho superior de 15/11/2006 da Directora do Núcleo de Identificação de Beneficiários e Registo de Remunerações (…) (Cfr. Doc. n.º 1 da P.I e fls.72 do P.A 1).
9.
Em 30 de Junho de 1998 a “Sociedade Agrícola da Quinta da S..., Lda.” recebeu uma carta da Autora, onde comunicava a sua renúncia ao cargo de gerente daquela sociedade (Cfr. Doc. n.º 12 da P.I. e fls. 128 – anexo 1,do PA 1)
10.
A renúncia da Autora à gerência foi aprovada em reunião da Assembleia-geral Extraordinária da Sociedade Agrícola da Quinta da S..., Ld.ª, realizada em 30 de Junho de 1998, conforme o ponto terceiro da ordem de trabalhos da Acta n.º18, aqui reproduzida na íntegra (Cfr. Doc. n.º 13 da PI e fls. 115 a 117 do anexo 2, do PA 1).
11.
Na Assembleia Geral da Sociedade Agrícola da Quinta da S..., Lda., realizada 31de Dezembro de1998, foi deliberado, na sequência da assembleia geral realizada em 30 de Junho de 1998, dissolver a sociedade a partir desta data, dando definitivamente por encerrada e finda a actividade desenvolvida pela mesma, conforme Acta n.º19, aqui também reproduzida na íntegra (Cfr. Doc. n.º 13 da PI e fls. 112 a 114, do anexo 3 do PA 1 e depoimentos das testemunhas MGRPS e MLVBLG)
12.
O acto da renúncia à gerência da Autora, supra referido, está registado na Conservatória de Registo Comercial de Braga, por referência ao Averbamento (Av.) 1-AP. 6/20060428 – CESSAÇÃO DE FUNÇÕES DE MEMBRO(S) DO(S) ORGÃO(S) SOCIAL(AIS) com a Anotação (An.) 1 – 20060509 – publicado em 20060509 no site http:/www.mj.gov.pt.publicações. – Cfr. Certidão emitida em 2006-08-02 pela Conservatória de Registo Comercial de Braga, que constitui o Doc. n.º 15 da PI e fls. 104 a 107, do anexo3, do PA 1
13.
No período compreendido entre 30 de Junho de 1998 e 31 de Dezembro de 1998 a Autora e a também sócia, MLVBLG assumiram as funções de liquidatários da Sociedade Agrícola da Quinta da S..., Lda. (Cfr. Depoimentos das testemunhas MMAMRN e BR).
14.
A Autora, no período em que exerceu funções de gerência, não recebeu a respectiva remuneração (Cfr. depoimentos das testemunhas MGRPS e MLVBLG)
15
As Sócias da “Sociedade Agrícola da Quinta da S..., Ld.ª” decidiram, em Abril de 1994, encerrar a actividade agrícola da quinta (Cfr. documento juntos pela Autora a fls. 179 – 189).
16
A petição relativa à presente acção administrativa especial deu entrada neste Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, em 24 de Abril de 2007 (Cfr. Fls. 2 do suporte físico).
X
DE DIREITO
Está posta em causa a decisão que julgou procedente a acção, anulou o acto impugnado e condenou o Réu a deferir o pedido de prestações de desemprego apresentado pela Autora no dia 01 de Junho de 2006.
Na óptica do Recorrente, que não questiona a factualidade apurada, a decisão recorrida padece de erros de julgamento de direito.
1º deveria ter verificado - e não verificou - se a petição era tempestiva e, não sendo, como se constata, ter absolvido o Réu, ora Recorrente, da instância, face à caducidade do direito de acção, que constitui uma excepção dilatória de conhecimento oficioso.
2º menosprezou a data do registo à renúncia à gerência por parte da Autora face a uma carta simples, entregue em mão, da qual consta a mesma renúncia, bem como a data de registo da dissolução da sociedade da qual a Autora, como sócia, na ausência de outros gerentes nomeados, mantinha a qualidade de gerente.
Assim, na data em que a Autora, ora Recorrida, requereu o subsídio de desemprego - 1/06/2006 -, a mesma ainda estava, e bem, qualificada como MOE, não obstante a sua função de gerente não ser remunerada, como, de resto, também nunca o tinha sido.
Logo, não se encontrava em situação de inexistência total de involuntária de emprego, pelo que foi, e bem, indeferido, o subsídio de desemprego.
Cremos que não lhe assiste razão.
Antes, porém, deixa-se transcrito o discurso jurídico fundamentador da sentença sub judice:
“Está em causa nos presentes autos o pedido de anulação do despacho de 15 de Novembro de 2006, da Directora do Núcleo de Prestações do Sistema Previdencial, que indeferiu o pedido de prestações de desemprego apresentado pela Autora no dia 01 de Junho de 2006, com o fundamento de exercer actividade profissional e, por tal motivo não se encontrar em situação de desemprego total, dado a sua situação se enquadrar no regime dos MOE`s de 4/2/1988 a 02/08/2006, à data do seu pedido constar como MOE da firma ““ABB, SA”.
Vejamos:
O Decreto – Lei n.º119/99, de 14 de Abril, que regula a concessão de prestações de subsídio de desemprego, sendo reconhecido direito a prestações de desemprego aos beneficiários que, cumulativamente, se encontrem em situação de desemprego involuntário, nos termos do artigo 9.º do Diploma Legal citado, reúnam as condições de atribuição previstas nos artigos 18.º a 27.º do mesmo Diploma e residam em território nacional, conforme exige o artigo 8.º, n.º1 do mesmo DL, prescreve no seu artigo 6.º:
“ Caracterização da eventualidade
1- Para efeitos do presente diploma, é considerado desemprego toda a situação decorrente da inexistência total e involuntária de emprego do beneficiário com capacidade e disponibilidade para o trabalho.
2- O requisito de inexistência total de emprego tem-se ainda por preenchido nas situações em que, cumulativamente com trabalho por conta de outrem, o beneficiário exerce uma actividade independente cujos rendimentos não ultrapassem mensalmente 50% da remuneração mínima garantida à generalidade dos trabalhadores.
Classifica o artigo 9.º do DL n.º 220/2006 desemprego involuntário “ (…) sempre que a cessação do contrato de trabalho decorra de:
a) Iniciativa do empregador;
b) Caducidade do controlo não determinada por atribuição de pensão;
c) Resolução com justa causa por iniciativa do trabalhador;
d) Acordo de revogação celebrado nos termos definidos no presente decreto-lei”
A renúncia ao cargo de gerente por parte da Autora ocorreu em 30 de Junho de 1998, como resulta da matéria fáctica assente (pontos 10 e 11).
E, também está assente que, face à declaração emitida pela entidade empregadora, “ABB, SA”, a Autora cessou em 30 de Maio de 2006 as funções de técnica de contas, que para aquela exercia, por caducidade do contrato a termo.
Assim, no dia 01 de Junho de 2006, data do pedido de pagamento de prestações de desemprego no Centro Distrital de Braga do Instituto da Segurança Social, formulado pela Autora, será de concluir que a mesma estava em condições para beneficiar legalmente do subsídio de desemprego, uma vez que se encontrava numa situação de inexistência total e involuntária de emprego mostrando-se, quanto a nós, irrelevante o facto de a renúncia ter sido comunicada à Conservatória do Registo Comercial muito posteriormente à declaração de vontade da Autora (Renúncia), por entendermos que os efeitos consequentes deste registo, visam salvaguardar direitos de terceiros de boa-fé (artigo 14.º do Código de Registo Comercial), mormente quanto a saber que actos praticados pelos representantes legais da sociedade vinculam a sociedade.
Entendemos, pois, que o regime registral desta renúncia, não deve servir para justificar o pedido de indeferimento de uma prestação social, como é o caso.
A Autora comunicou a sua renúncia ao cargo de gerente da sociedade da “Sociedade Agrícola da Quinta da S..., Ld.ª” em 30 de Junho de 1998, a qual foi aprovada na reunião da Assembleia-geral Extraordinária, realizada naquela data.
Á data do pedido formulado em 01 de Junho de 2006, não existia nos serviços da Entidade Ré registos de remunerações, ou descontos como MOE, relativos à Autora.
Ao ver cessado, involuntariamente, e de forma total o seu contrato de trabalho (ponto 2), ficou a Autora sem qualquer tipo de remuneração, ficando assim numa situação de desemprego relevante para efeitos de atribuição do respectivo subsídio.
Verificando-se, consequentemente, como preenchida a condição supra aludida contida no artigo 9.º do DL n.º 220/2006, de 3 de Novembro – Desemprego involuntário –
Deste modo, no caso presente, atento os factos dados como assentes e as normas supra transcritas, vislumbra-se que a decisão impugnada violou o disposto naqueles normativos, resultando, pois, que à data do pedido da prestação de desemprego, a Autora reunia os requisitos legais previstos para o efeito (Cfr. artigos 6.º, n.º1 e 7.º do Decreto Lei n.º 119/99 de 14 de Abril.”
X
Vejamos:
Da caducidade do direito de acção -
Depois de o Réu/Recorrente, aquando da sua contestação e, sendo esse o momento oportuno (defesa), ter tentado obstar ao prosseguimento da acção pela via do n.º 1, alíneas a) e c) do artº 89º do CPTA, vem, agora, arguir, à luz da alínea h) do supra citado artigo, a caducidade do direito de acção.
A invocação de tal excepção dilatória - caducidade do direito de acção -, em sede de alegações de recurso de sentença, é de todo intempestiva.
Toda a matéria relativa à defesa, seja por impugnação, seja por execepção deve ser arguida em sede de contestação - artºs 83º, n.º 1 do CPTA e 573º do CPC.
A caducidade do direito de acção da Autora, que mais não é do que uma defesa por excepção, deveria ter sido levantada no momento oportuno - na contestação - mas não o foi, como o próprio Réu reconhece.
Ora, é certo que tal questão não foi oportunamente suscitada e nem oficiosamente apreciada em sede de despacho saneador. Assim, há muito que se encontra precludido o direito de invocar a excepção - cfr. a alínea a) do nº 1 do artº 87º do CPTA.
Na verdade, este normativo prevê e institui um regime de exercício dos poderes/deveres processuais, derivando do seu n.º 2 uma limitação/ preclusão do conhecimento de questões ou excepções que obstem ao conhecimento do mérito da causa após a prolação do despacho saneador - neste sentido, cfr. o acórdão deste TCAN de 28/06/2013, no proc. 00501/10.2BEPRT(1)
A agora invocada caducidade de direito de acção deveria ter sido apreciada em sede de despacho saneador. Ora, tal despacho nada refere acerca de tal excepção.
Contudo, e uma vez que, quer a data da prática do acto administrativo, quer a da prolação do acto confirmativo daquele, eram de pleno conhecimento do Réu (que os proferiu), bem como, a data da propositura da acção, então deveria, em sede de contestação, repete-se, ter alegado tal excepção, em estrita observância do disposto no n.º 1 do artº 83º do CPTA e artºs 333º, n.º 2 e 303º do Código Civil.
O despacho saneador configura uma situação de “caso julgado formal”, de forma a reafirmar o princípio da promoção e acesso à justiça, obviando-se que seja relegado para final, o conhecimento de questões que conduzam à prolação de decisões de forma.
Assim, uma vez que o referido despacho saneador não foi objecto, em momento algum, de recurso - o Réu recorre da sentença - estabilizou-se a instância com a prolação e trânsito em julgado do mesmo.
Mas, ainda que tal excepção fosse de conhecimento oficioso, tal em nada interfere com o regime consagrado no n.º 2 do artº 87º do CPTA, “porquanto com o mesmo se pretendeu concentrar na fase do despacho saneador a apreciação de todas e quaisquer questões que obstassem ao conhecimento de mérito de processo, proibindo-se que fossem suscitadas e decididas em momento posterior do processo quaisquer outras questões ou excepções que não tenham sido arguidas e apreciadas no saneador” - cfr. o citado ac. do TCAN.
Aliás, a não ser assim, desprovia-se o despacho saneador da sua função de estabilizador da instância, relegando-se para sentença, ou mesmo para acórdão, a apreciação de questões formais.
Com isto, não se quer dizer, que o despacho saneador, oportunamente proferido e notificado, era inatacável, pois poderia ter sido objecto de recurso, mas não foi. Nem aquando da sua prolação, nem aquando do recurso da sentença em crise, já que, de forma expressa, refere o Recorrente, no seu requerimento de interposição de recurso “não se conformando com a (…) sentença proferida (…), dela vem interpor recurso”, sem qualquer alusão ao despacho saneador e, sobretudo, sem qualquer remição para o disposto no n.º 5 do artº 142º do CPTA.
Nenhum pressuposto processual, ou o quer que se pretenda, surgiu ex novo no processo, quer após o despacho saneador, quer durante ou após o julgamento, que só agora tornasse possível, a qualquer uma das partes, pronunciar-se acerca do mesmo.
Desatende-se, assim, este segmento do recurso.
E o que dizer do 2º fundamento do recurso, isto é, a data do registo de renúncia ao MOE como razão para afastar a concessão do subsídio de desemprego?
Resulta dos autos que a 01 de Junho de 2006 a Autora apresentou, no Centro Distrital da Segurança Social de Braga, requerimento de prestações de desemprego, dado que o seu contrato de trabalho havia caducado a 30 de Maio desse ano, sendo informada que, enquanto MOE da Sociedade Agrícola Quinta da S..., Lda., não preenche, à partida, os pressupostos que lhe permitam auferir a prestação de desemprego requerida.
Face a tal informação esclareceu que, em 30 de Junho de 1998, renunciou, por carta, à gerência da Sociedade Agrícola Quinta da S....
Ainda no dia 30/06/1998 teve lugar Assembleia Geral Extraordinária da dita sociedade, no decurso da qual foi aprovada a renúncia à gerência apresentada pela Autora/Recorrida.
A 31/12/1998, em reunião de Assembleia Geral da Sociedade Agrícola da Quinta da S..., Lda., foi aprovada a dissolução da sociedade.
No período que mediou entre estas duas Assembleias da sociedade, ou seja, de 30/06/1998 a 31/12/1998, a Autora, conjuntamente com a outra sócia, assumiram as funções de liquidatárias daquela.
A partir do dia 31/12/1998 dissolvida a sociedade, (vendidos os bens, pagas as dívidas, etc.), aquela, como advogado pela Recorrida, pode dizer-se que “morreu”. Era um assunto encerrado.
Provado ficou ainda que as funções de gerência exercidas pela Autora naquela sociedade, nunca foram objecto de remuneração.
Esta, em Junho de 2006, uma vez que se encontrava em situação de desemprego involuntário, solicitou, junto dos serviços da Recorrente, prestações de desemprego.
Ora, um MOE, cujo função de gerente não é remunerada, mantendo essa condição no quadro da dita sociedade, e confrontado com a cessação do contrato de trabalho dependente que o vinculava a determinada entidade patronal, tem direito a subsídio de desemprego - cfr. o Acórdão n.º 4/2013 do STA.
Na verdade, veio este Acórdão, no ponto 4, alínea b), fixar jurisprudência nos seguintes termos: “a condição de sócio gerente de uma sociedade comercial, sem direito a qualquer remuneração, de um trabalhador por conta de outrem, cujo contrato de trabalho cessou, não obsta à caracterização da respectiva situação como desemprego, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 6, número 1, do DL119/99, de 14 de Abril, e 2, número 1, do DL 220/2006, de 3 de Novembro respectivamente”.
Então e o que dizer da situação da Autora, que apenas não registou junto da Conservatória do registo Comercial a sua renúncia à gerência e, por essa única razão, vê ser-lhe negado o direito ao acesso às prestações de desemprego?
Apenas que é contrária ao Acórdão de fixação de jurisprudência referido, que determina o acesso a prestações de desemprego ainda que se exerça, simultaneamente, função de gerente, desde que a mesma não seja remunerada.
Em suma, andou bem o Tribunal a quo ao decidir como decidiu, anulando o acto impugnado e, consequentemente, condenando o Réu a deferir o pedido de prestações de desemprego e indo de encontro ao Acórdão do STA n.º 4/2013. Isto é, um MOE, cuja função de gerente não é remunerada, mantendo essa condição no quadro da dita sociedade, e confrontado com a cessação do contrato de trabalho dependente que o vinculava a determinada entidade patronal, tem direito a subsídio de desemprego.
A tal não obsta o facto de a renúncia ter sido comunicada à Conservatória do Registo Comercial muito posteriormente à declaração de renúncia da Autora, aqui Recorrida, ou seja, não é esse facto que deve servir para justificar o pedido de indeferimento das prestações de desemprego, atenta a finalidade do registo(2) em causa e a filosofia firmada no acórdão de fixação de jurisprudência atrás aludido.
Improcedem, assim, todas as conclusões da alegação.
DECISÃO
Termos em que se nega provimento ao recurso.
Custas a cargo do Recorrente.
Notifique e DN.
Porto, 15/07/2016
Ass.: Fernanda Brandão
Ass.: Frederico Branco
Ass.: Joaquim Cruzeiro
_______________________________
(1) I. Prevê-se e institui-se com o art. 87.º do CPTA um regime de exercício dos poderes/deveres processuais, derivando do seu n.º 2 uma limitação/preclusão do conhecimento de questões/exceções que obstem ao conhecimento de mérito da causa após prolação despacho saneador.
II.Configura-se no mesmo uma situação de «caso julgado tácito», reafirmando-se o princípio da promoção do acesso à justiça e, assim, evitar que seja relegado para final o conhecimento de questões que conduzam a prolação de decisões de forma e que no processado se possam suscitar a todo o tempo questões meramente formais.
III. Estabilizando-se a instância com a prolação do despacho saneador esta decisão, por princípio, uma vez proferida sobre as questões obstativas do conhecimento do mérito que hajam sido arguidas ou devido ser conhecidas consolida-se sem possibilidade de reapreciação posterior salvo se objeto de recurso, sendo que o conhecimento em sede de recurso daquela decisão também não constituirá qualquer violação do n.º 2 do art. 87.º.
IV. Ao julgar improcedente por intempestiva e extemporânea a exceção dilatória da caducidade do direito de ação que havia sido só invocada após apresentação das alegações previstas no art. 91.º do CPTA a decisão judicial recorrida observou devida e corretamente os comandos legais insertos nos arts. 58.º, n.º 2, 69.º, n.º 2 e 87.º do CPTA.
V. O caráter oficioso do suscitar e conhecer da referida exceção dilatória, tal como as demais referidas no n.º 1 do art. 89.º do CPTA, em nada interfere com o regime decorrente do n.º 2 do art. 87.º do citado código, porquanto com o mesmo se pretendeu concentrar na fase do despacho saneador a apreciação de todas e quaisquer questões que obstassem ao conhecimento de mérito do processo, proibindo-se que fossem suscitadas e decididas em momento posterior do processo quaisquer outras questões ou exceções dilatórias ainda que de conhecimento oficioso que não tenham sido arguidas e apreciadas no despacho saneador.
VI. E a conclusão antecedente em nada é beliscada com o regime previsto no art. 510.º, n.º 4 do CPC porquanto o CPTA, através do regime decorrente, mormente, do art. 87.º, envolve regime especial que o afasta e, nessa medida, não pode ser convocado como aplicável à tramitação e aos poderes do julgador administrativo em sede de ação administrativa especial como é o caso vertente.
(2) Os efeitos consequentes deste registo visam salvaguardar direitos de terceiros de boa-fé (artigo 14.º do Código de Registo Comercial), mormente quanto a saber que actos praticados pelos representantes legais da sociedade vinculam a sociedade, como bem salientou a sentença recorrida.