Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1418/17.5BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:09/28/2017
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:OMISSÃO DE PRONÚNCIA (VÍCIO DE “PETITIONEM BREVIS”).
ARTº.615, Nº.1, AL.D), DO C.P.CIVIL. ARTº.125, Nº.1, DO C.P.P.TRIBUTÁRIO.
NÃO CONHECIMENTO DE QUESTÃO DEVIDO A NEXO DE PREJUDICIALIDADE. ERRO DE JULGAMENTO.
QUESTÕES NOVAS.
ERRO NA FORMA DO PROCESSO. NULIDADE PROCESSUAL DE CONHECIMENTO OFICIOSO.
PRINCÍPIO DA ECONOMIA PROCESSUAL.
PRESSUPOSTOS DA CONVOLAÇÃO DA FORMA DE PROCESSO.
PRESCRIÇÃO DA DÍVIDA EXEQUENDA.
PASSÍVEL DE EXAME NOUTRAS FORMAS DE PROCESSO, QUE NÃO A OPOSIÇÃO A EXECUÇÃO.
Sumário:1. A omissão de pronúncia (vício de “petitionem brevis”) pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes (cfr.artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil).
2. No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário, no penúltimo segmento da norma.
3. Se o Tribunal entende que o conhecimento de uma questão está prejudicado e o declara, poderá haver erro de julgamento, se for errado o entendimento em que se baseia esse não conhecimento, mas não nulidade por omissão de pronúncia.
4. O direito português segue o modelo do recurso de revisão ou reponderação (modelo que tem as suas raízes no Código Austríaco de 1895). Daí que o Tribunal “ad quem” deva produzir um novo julgamento sobre o já decidido pelo Tribunal “a quo”, baseado nos factos alegados e nas provas produzidas perante este. Os juízes do Tribunal de 2ª. Instância, ao proferirem a sua decisão, encontram-se numa situação idêntica à do juiz da 1ª. Instância no momento de editar a sua sentença, assim valendo para o Tribunal “ad quem” as preclusões ocorridas no Tribunal “a quo”. Nesta linha, vem a nossa jurisprudência repetidamente afirmando que os recursos são meios de obter o reexame de questões já submetidas à apreciação dos Tribunais inferiores, e não para criar decisões sobre matéria nova, não submetida ao exame do Tribunal de que se recorre, visto implicar a sua apreciação a preterição de um grau de jurisdição.
5. O erro na forma do processo consubstancia nulidade processual de conhecimento oficioso (cfr.artºs.193 e 196, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, “ex vi” do artº.2, al.e), do C.P.P.T.), deve ser conhecido no despacho saneador (cfr.artº.595, nº.1, al.a), do C.P.Civil) ou, não existindo este, até à sentença final (cfr.artº.200, nº.2, do C.P.Civil) e só pode ser arguido até à contestação ou neste articulado (cfr.artº.198, nº.1, do C.P.Civil), sendo que, a causa de pedir é irrelevante para efeitos de exame do eventual erro na forma do processo, para os quais apenas interessa considerar o pedido formulado pela parte.
6. No processo judicial tributário o erro na forma do processo igualmente substancia uma nulidade processual de conhecimento oficioso, consistindo a sanação na convolação para a forma de processo correcta, importando, unicamente, a anulação dos actos que não possam ser aproveitados e a prática dos que forem estritamente necessários para que o processo se aproxime, tanto quanto possível, da forma estabelecida na lei (cfr.artº.97, nº.3, da L.G.T.; artº.98, nº.4, do C.P.P.T.).  
7. A análise da propriedade do meio processual empregue pela parte e da sua consequente e eventual admissibilidade legal, deve ser efectuada levando em atenção o princípio da economia processual que enforma todo o direito adjectivo (cfr.artº.130, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, “ex vi” do artº.2, al.e), do C.P.P. Tributário).
8. A possibilidade de convolação da forma de processo pressupõe que todo o processo passe a seguir a tramitação adequada, sendo que o pedido formulado no final do articulado inicial constitui um dos elementos que se deve adequar à nova forma processual a seguir. Por outro lado, a manifesta extemporaneidade do articulado em exame também constitui óbice à convolação.
9. A prescrição consubstancia uma excepção peremptória de conhecimento oficioso no âmbito do processo tributário (cfr.artº.27, §2 e 3, do C.P.C.Impostos; artº.259, do C.P.Tributário; artº.175, do C.P.P.Tributário), a qual é passível de exame noutras formas de processo, que não a oposição a execução fiscal, nomeadamente, no âmbito de reclamação de decisão do órgão da execução fiscal prevista no artº.276 e seg. do C.P.P.T., mesmo quando o objecto inicial de tal reclamação nada tenha a ver com a apreciação da prescrição, mais devendo tal excepção ser conhecida pelo Tribunal nos casos em que o órgão de execução fiscal o não tiver feito (cfr.artº.175, do C.P.P.T.).
Aditamento:
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Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO

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RELATÓRIO

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A..., com os demais sinais dos autos, deduziu salvatério dirigido a este Tribunal tendo por objecto despacho de indeferimento liminar proferida pela Mmª. Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa exarado a fls.37 a 41 dos presentes autos de reclamação de acto do órgão de execução fiscal apresentada pelo reclamante e ora recorrente, tudo em virtude da procedência da excepção de erro na forma do processo.

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O recorrente termina as alegações (cfr.fls.46 a 91 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:

1-O reclamante deduziu a presente reclamação contra o acto de penhora de saldo de conta bancária, no montante de € 251,69, sendo a dívida exequenda no montante de € 36.575,68, valor que se considera como valor da causa, relativo ao IRC de 2005;

2-A reclamação dos actos do órgão de execução fiscal foi indeferida liminarmente por erro na forma de processo com fundamento em erro na forma do processo;

3-O reclamante alegou a ilegalidade da penhora constituída no saldo da sua conta bancária porquanto não é responsável subsidiário nem solidário bem sub­rogado para que a mesma lhe possa ser imputada, o que configura, também, a ilegitimidade do reclamante e a prescrição de dívida;

4-O reclamante considerou que a dívida estava prescrita porquanto, sendo ela respeitante ao exercício de 2005, o início do prazo de prescrição, nos termos do art.º 48.º,n.º 1 da LGT, começa em 2006 pelo que o cômputo dos 8 anos tem o seu terminus em 31/12/2013;

5-Ora, tendo sido citado, para efeitos de reversão, em 21/08/2014 já se tinha operado a prescrição pelo que, tendo sido penhorada a conta bancária em Maio de 2017, o mesmo será dizer que a penhora foi efectuada após a prescrição, o que constitui a ilegalidade da penhora, por a mesma ofender o principio da proporcionalidade, da razoabilidade e da legalidade, pelo motivo supra mencionado;

6-Neste pendor, o thema decidendum, assenta em saber se:

- O despacho proferido pelo Tribunal a quo incorre em erro na forma de processo, e

- Se no despacho há omissão de pronúncia porquanto tendo sido suscitada a prescrição da dívida exequenda a qual, consequentemente tem efeitos directos na penhora, pois se está prescrita a penhora não poderá manter­se sob pena de ofender o princípio da segurança e certeza jurídica, da proporcionalidade e da legalidade;

7-Quanto ao erro na forma de processo, o Tribunal a quo, por despacho, decidiu pelo indeferimento liminar da reclamação deduzida com fundamento na excepção de erro na forma de processo;

8-Salvo o devido respeito, não se concorda com a decisão porquanto o erro na forma de processo é uma excepção dilatória e, sendo assim, pode a reclamante intentar nova p.i., nos termos do art.º 590.º conjugado com o art.º 560.º, ambos do CPC aplicável ex vi art. 2.º al. e) do CPPT;

9-Mas, caso assim se não o entenda, a reclamante deduziu reclamação dos actos do órgão de execução fiscal, nos termos do art.º 276.º do CPPT, para se opor à penhora de conta bancária, sendo a reclamação o meio próprio. Vejamos então;

10-No Ac. do TCAN de 14/11/2014, proferido no proc. n.º 00526/11.0BEPFN, disponível no site www.dgsi.pt, consagra que o meio processual adequado para conhecer da penhora é a reclamação (art.ºs 276.º a 278.º do CPPT) e não a oposição, uma vez constituindo a penhora um acto pratica no âmbito da execução fiscal que afecta a esfera jurídica dos destinatários e, nessa medida, potencialmente lesivo dos direitos destes, não pode deixar de ser contenciosamente impugnável atravessa da reclamação para o juiz nos termos dos art.ºs 276.º a 278.º do CPPT;

11-No Ac. do TCAN de 14/11/2014, proferido no proc. n.º 00526/11.0BEPFN, disponível no site            www.dgsi.pt, foi decidido que o erro na forma de processo ocorre sempre que a forma processual escolhida não corresponde à natureza da acção, ou seja, o erro na forma de processo ocorre quando o autor use uma forma processual inadequada para fazer valer a sua pretensão, sendo que a ocorrência do erro se deve aferir pelo pedido formulado na acção, pelo que sendo o pedido a revogação das penhoras o mesmo está em consonância com a causa de pedir, sendo a reclamação, vulgo art.o 276.º do CPPT o meio próprio;

12-No Ac. do TCAN de 14/11/2014, supra mencionado, foi decidido quanto à procedência da excepção do erro na forma, a instância e não a improcedência da oposição, pois a improcedência da acção pressupõe que o pedido tenha sido efectivamente apreciado (que se tenha conhecido do mérito da acção) e que o Tribunal tenha concluído, em definitivo, que o autor não tinha razão, na absolvição da instância o Tribunal não chega a apreciar o mérito da causa, por ter verificado uma irregularidade que impede esse julgamento do mérito da causa e, por isso, esta decisão (de absolvição), ao contrário da decisão de improcedência, não obsta a que se proponha outra acção sobre o mesmo objecto (artigos 279º e 619º e seguintes, todos do CPC). Assim, a procedência da excepção dilatória do erro na forma de processo [artigos 193º, 577º, alínea b), ambos do CPC] implicava que a Fazenda Pública fosse absolvida da instância e não, como decidiu o Tribunal recorrido, que a oposição fosse julgada improcedente;

13-No mesmo sentido, o Ac. do STA de 17/04/2013 que decidiu que "I - Constituindo objecto das reclamações, apresentadas ao abrigo do art. 276º do CPPT, os actos proferidos pelo órgão da execução fiscal, não existe qualquer desarmonia ou discrepância entre o meio processual utilizado e a pretensão formulada de invalidação desses actos, pelo que o meio processual apresentado (reclamação) é em abstracto adequado a obter a revogação ou anulação do despacho reclamado.

II - Nesta situação, ainda que as concretas causas de pedir sejam adequadas a obter a invalidade do acto de reversão a deduzir através de oposição, não há erro na forma do processo, mas sim improcedência das invalidades imputadas ao despacho reclamado" (Ac do STA de 17/04/2013,proferido no proc n.º 0484/13, disponível no site www.dgsi.pt);

14-Por sua vez, o Ac. do STA de 18/01/2017, no seu sumário consagra que ''I - O erro na forma do processo, nulidade decorrente do uso de um meio processual inadequado à pretensão de tutela jurídica formulada em juízo, afere-se pelo pedido (e não pela causa de pedir).

II - Isto sem prejuízo de na interpretação do pedido se dever indagar da real pretensão do autor, podendo servir de elemento coadjuvante a causa de pedir invocada. " (Ac do STA de 18/01/2017, proferido no proc.    n.º 1223/16, disponível no site www.dgsi.pt);

15-No Ac. do TCAS de 26/06/ 2016, consagrou que ''l - A cada direito corresponde um, e apenas um, meio processual adequado para o seu reconhecimento em juízo (''a acção adequada”), a não ser que a lei determine o contrário (cfr. art 2.º,n. o 2 do Código de Processo Civil (CPC), ex vi do art. 2. alínea e) do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT);

(...)

VI - Se um dos pedidos formulados pelo Recorrente é o de "revogação da penhora' é adequada a reclamação prevista no art. 276.º do CPPT” (Ac. do TCAS de 26/06/2016, proferido no proc. n.º 07729/14, disponível em www.dgsi.pt);

16-No Ac. do STA de 12/09/2012, quanto ao erro na forma de processo, ficou decidido que "Assim, o facto de algumas causas de pedir não constituírem porventura fundamentos válidos da reclamação, tal não pode servir de motivo para se concluir pelo erro na forma de processo, mas sim motivo para se decidir pela improcedência do pedido com base nessas causas de pedir (cfr.entre outros, o Acórdão do STA, de 28/3/2012,proc n°1145/11; Ac. do STA de 12/09/2012, proferido no proc n.º 0877/12, disponível no site www.dgsi.pt);

17-Nos termos expostos, podemos concluir que não há erro na forma de processo e, se o não há, o Tribunal a quo errou no seu julgamento, devendo o despacho ser revogado por outro;

18-Mas, o douto despacho enferma de omissão de pronúncia porquanto, um dos fundamentos invocados, no art.º 31.º da p.i., prescrição, é de conhecimento oficioso, nos termos do art.º 175.º do CPPT;

19-E, sendo de conhecimento oficioso deveria o Tribunal a quo pronunciar­se sobre o mesmo sob pena de omissão de pronúncia;

20-No Ac. do STA de 15/02/2012, decidiu que "(...) II - A continuacão da execucão fiscal, numa situação em que há possibilidade da dívida estar prescrita, permite  prognosticar  a  ocorrência  de  prejuízos irreversíveis, pelo que a reclamação deve subir imediatamente. "(Ac. do STA de 15/02/2012, proferido no proc n.0 061/12, disponível no site www.dgsi.pt);

21-E, no aresto supra, quanto à prescrição decidiu que ''( ..) Mas, como se tratar de uma questão de conhecimento oficioso (art. 175º da CPPT), o executado pode suscitá-la a todo o tempo, mesmo que tenha caducado o direito a deduzir a oposição, o que bem se compreende, na medida em que a prescrição depende do decurso do tempo. (Ac. do STA de 15/02/2012, proferido no proc. n.º 061/12, disponível no site www.dgsi.pt);

22-Para Lopes de Sousa, na anotação 5 ao art.º 175 do CPPT, refere que ''(...) no domínio do direito tributário, o carácter oficioso do conhecimento da prescrição (introduzido no art. 259.º do CPT e confirmado no presente art. 175. º) é um sinal evidente da omnipresença do interesse público como fundamento da prescrição, interesse este que, no caso, é o da segurança ou certeza jurídica. Assim, no direito tributário, a necessidade de segurança ou certeza jurídica é o fundamento comum de ambos os institutos."- Lopes de Sousa, Jorge, Código do Procedimento e Processo Tributário, Vol. II, Edição Áreas, 2011, pp 280);

23-E, o mesmo autor, na anotação 7 al. c) ao art.º 175 do CPPT, menciona que ''Como resulta do teor deste artigo, o juiz deve conhecer da prescrição ou da duplicação de colecta apenas quando o órgão de execução fiscal não o tiver feito. Isto significa que a competência para conhecer da prescrição e da duplicação de colecta é atribuída, em primeira linha, ao órgão da execução fiscal e, por isso, mesmo que esteja pendente no tribunal um processo de oposição da execução fiscal em que seja invocado como fundamento a prescrição ou a duplicação de colecta, o órgão de execução fiscal poderá, no próprio processo de execução fiscal, conhecer desses fundamentos de oposição. No caso de o órgão de execução fiscal declarar prescrita a totalidade ou parte das dívidas que se visam cobrar no processo de execução fiscal ou anular a divida exequenda com fundamento em duplicação de colecta, deverá comunicar o facto ao tribunal, em aplicação directa ou analógica do regime previsto no art. 271. º do CPPT, pois poderá justificar-se extinção da instância da oposição à execução fiscal ou de processo e embargos de terceiro ou de verificação e graduação de créditos, por inutilidade superveniente da lide, nos termos do art. 287.º, alínea e), do CPC "- Lopes de Sousa, Jorge, Código do Procedimento e Processo Tributário, Vol. II, Edição Áreas, 2011, pp 285);

24-No Ac. do TCAN de 15/5/2014, no seu sumário consagra que ''I) Em termos de omissão de pronúncia, embora o julgador não tenha que analisar todas as razões ou argumentos que cada parte invoca para sustentar o seu ponto de vista, incumbe-lhe a obrigação de apreciar e resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, isto é, todos os problemas concretos que haja sido chamado a resolver no quadro do litígio (tendo em conta o pedido, a causa de pedir e as eventuais excepções invocadas), ficando apenas exceptuado o conhecimento das questões cuja apreciação e decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras. E questão, para este efeito (contencioso tributário), é tudo aquilo que é susceptível de caracterizar um vício, uma ilegalidade do acto tributário impugnado."(Ac. do TCAN de 15/05/2014, proferido no proc. n. 02071/13.0BEBRG, disponível no site www.dgsi.pt);

25-Ora, face à jurisprudência supra mencionada, dúvidas não restam de que o Tribunal a quo errou no seu julgamento, tendo violado o art.º 125.º do CPPT, ao não se pronunciar pela prescrição da dívida, o que configura uma omissão de pronúncia, devendo o despacho ser revogado;

26-Por último, o reclamante ao ter sido notificado pelo ... de que, a Autoridade Tributária, no âmbito do PEF n.º 3085201101087169, lhe havia penhorado a sua conta bancária, no montante de € 251,69, para pagamento de uma dívida no montante de € 36.575,68, relativo a IRC do exercício de 2005, em que não foi fundamentado qualquer decisão da penhora, desconhecendo o iter volitivo da decisão, o que equivale a falta de fundamentação;

27-A penhora de saldos de conta bancária enferma de vício de falta fundamentação uma vez que não especifica de que modo e quais as razões de facto e de direito que subjazem à penhora efectuada. Ou seja;

28-O reclamante desconhece as razões pelas quais foi efectuada a penhora de saldos da sua conta bancária, o qual foi aludido na p.i., nos arts.º 18.º a 32.º, isto é, o reclamante tentou explicar que a penhora não lhe poderia ser devida uma vez que tinha renunciado à gerência da sociedade "Cervejaria ... Lda", em 25/11/2004, conforme o Av. 1, AP. 163/20090716, constante da Conservatória do Registo Comercial e, sendo a dívida de IRC, referente ao exercício de 2005, já não era da sua responsabilidade a mesma, sendo a penhora ilegal porque ofende o património de quem não era gerente mas, sim um terceiro;

29-Mas, o Tribunal a quo assim o não entendeu, o que fez mal, porquanto, caso não quisesse apreciar a prescrição que se operou em 31/12/2013, isto é, antes de ter sido penhorada a conta bancária deveria ter convolado a reclamação em requerimento autónomo para que o Chefe do Serviço de Finanças apreciasse a prescrição, o que não foi feito, por isso, houve omissão de pronuncia e erro de julgamento devendo o despacho ser revogado por outro;

30-Nos termos expostos deve o despacho de indeferimento liminar ser revogado porquanto não há indeferimento liminar por erro na forma de processo, uma vez que o processo para se opor à penhora de saldo de conta bancária é a reclamação dos actos do órgão de execução fiscal, nos termos do art.º 276.º do CPPT, havendo erro de julgamento e omissão de pronuncia uma vez que a prescrição é de conhecimento oficioso, nos termos do art.º 175.º do CPPT e o Tribunal a quo não se pronunciou sobre a mesma ou, caso assim não o entendesse, deveria ter convolado a reclamação em requerimento autónomo para o Chefe do Serviço de Finanças se pronunciar sobre a prescrição. Por outro lado, os fundamentos constantes na reclamação, que o Tribunal a quo considerou serem de oposição, só foram elencados para justificar a ilegalidade da penhora e não, para serem apreciados como se fosse de oposição se tratasse. Assim, deve o despacho ser revogado por outro que considere deferida e admitida a reclamação ou, caso assim se não o entenda, deve mandar baixar os autos para que se pronuncie sobre a prescrição. Em que se fará a costumada JUSTIÇA.


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Não foram produzidas contra-alegações.

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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer (cfr.fls.114 e 115 dos autos) no sentido de se negar provimento ao recurso.

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Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo (cfr.artº.657, nº.4, do C.P.Civil; artº.278, nº.5, do C.P.P.T.), vêm os autos à conferência para deliberação.

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FUNDAMENTAÇÃO

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DE FACTO

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O despacho recorrido julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.38 dos autos):

“Para conhecimento do erro na forma do processo, apurou-se a seguinte matéria de facto:

1-No ... Serviço de Finanças de Lisboa corre termos o processo de execução fiscal n.º 3085-2011/108716.9, instaurado, entre outros, contra “Cervejaria ..., Lda.”, por dívida de IRC, do ano de 2005, no valor de € 36.575,68 (cfr.cópia do processo execução fiscal apenso; informação exarada a fls.26 a 28 dos presentes autos);

2-Por despacho de 27/05/2014 do Chefe do ... Serviço de Finanças de Lisboa foi determinada a reversão contra o reclamante, A..., por a devedora originária não possuir bens para a satisfação da dívida exequenda naqueles autos de execução (cfr.cópia do processo execução fiscal apenso; informação exarada a fls.26 a 28 dos presentes autos);

3-Na sequência do despacho a que alude o ponto anterior, em 21/08/2014 o reclamante foi citado para os termos da execução fiscal (cfr.documentos juntos a fls.38 e verso do processo execução fiscal apenso; informação exarada a fls.26 a 28 dos presentes autos);

4-No âmbito do processo identificado no nº.1, em 10/05/2017 foi efectuada penhora de saldo da conta bancária n.º13142556, no montante de € 251,69 (cfr.documento junto a fls.19 dos presentes autos);

5-Em 31/05/2017 o reclamante deduziu reclamação do acto do órgão de execução fiscal visando a penhora efectuada pelo Serviço de Finanças e identificada no nº.4 (cfr.data de entrada aposta a fls.3 dos presentes autos).


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Levando em consideração que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou em prova documental constante dos presentes autos e apensos, este Tribunal julga provada a seguinte factualidade que se reputa igualmente relevante para a decisão do recurso e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.662, nº.1, do C.P.Civil (“ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário):

6-A p.i. que originou os presentes autos, que o ora recorrente titula como reclamação deduzida ao abrigo do artº.276, do C.P.P.T., apresenta os seguintes fundamentos:

a)Que a penhora efectuada é ilegal devendo ser ordenado o seu levantamento, visto que o reclamante não era gerente de facto da sociedade executada originária no ano a que respeita a dívida exequenda, assim não sendo responsável pelo seu pagamento;

b)Que a dívida exequenda se encontra prescrita desde 31/12/2013, nos termos do artº.48, nº.1, da L.G.T.;

c)Termina pugnando pela procedência da reclamação com as consequências legais, devendo declarar-se a ilegitimidade do reclamante e a ilegalidade da penhora realizada (cfr.conteúdo da p.i. junta a fls.3 a 15 dos presentes autos).


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ENQUADRAMENTO JURÍDICO

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Em sede de aplicação do direito, o despacho recorrido ponderou, em síntese, julgar procedente a excepção de erro na forma do processo, mais não estando reunidos todos os pressupostos para a convolação para a forma de oposição a execução fiscal.

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Desde logo, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).

O recorrente discorda do decidido sustentando, em primeiro lugar e em síntese, que o despacho recorrido enferma de omissão de pronúncia porquanto, um dos fundamentos invocados no articulado inicial, a prescrição, é de conhecimento oficioso, nos termos do artº.175, do C.P.P.T. Que sendo de conhecimento oficioso deveria o Tribunal “a quo” pronunciar­se sobre o mesmo sob pena de omissão de pronúncia (cfr.conclusões 18 a 25 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo consubstanciar, supomos, uma nulidade por omissão de pronúncia da decisão recorrida.

Examinemos se a sentença objecto do recurso enferma de tal vício.

A sentença é uma decisão judicial proferida pelos Tribunais no exercício da sua função jurisdicional que, no caso posto à sua apreciação, dirimem um conflito de interesses públicos e privados no âmbito das relações jurídicas administrativo-tributárias. Tem por obrigação conhecer do pedido e da causa de pedir, ditando o direito para o caso concreto. Esta peça processual pode padecer de vícios de duas ordens, os quais obstam à eficácia ou validade da dicção do direito:

1-Por um lado, pode ter errado no julgamento dos factos e do direito e então a consequência é a sua revogação;

2-Por outro, como acto jurisdicional, pode ter atentado contra as regras próprias da sua elaboração ou contra o conteúdo e limites do poder à sombra da qual é decretada e, então, torna-se passível de nulidade, nos termos do artº.615, do C.P.Civil.

Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil, é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não poderia tomar conhecimento. Decorre de tal norma que o vício que afecta a decisão advém de uma omissão (1º. segmento da norma) ou de um excesso de pronúncia (2º. segmento da norma). Na verdade, é sabido que essa causa de nulidade se traduz no incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever prescrito no artº.608, nº.2, do mesmo diploma, o qual consiste, por um lado, no resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e, por outro, de só conhecer de questões que tenham sido suscitadas pelas partes (salvo aquelas de que a lei lhe permite conhecer oficiosamente). Ora, como se infere do que já deixámos expresso, a omissão de pronúncia pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes. Por outras palavras, haverá omissão de pronúncia, sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido. Pelo que deve considerar-se nula, por vício de “petitionem brevis”, a sentença em que o Juiz invoca, como razão de decidir, um título, ou uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que a parte colocou na base (causa de pedir) das suas conclusões (pedido). No entanto, uma coisa é a causa de pedir, outra os motivos, as razões de que a parte se serve para sustentar a mesma causa de pedir. E nem sempre é fácil fazer a destrinça entre uma coisa e outra. Com base neste raciocínio lógico, a doutrina e a jurisprudência distinguem por uma lado, “questões” e, por outro, “razões” ou “argumentos” para concluir que só a falta de apreciação das primeiras (ou seja, das “questões”) integra a nulidade prevista no citado normativo, mas já não a mera falta de discussão das “razões” ou “argumentos” invocados para concluir sobre as questões (cfr.Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.53 a 56 e 142 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.690; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.37).

No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário, no penúltimo segmento da norma (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 5ª. edição, 2006, pág.911 e seg.; ac.S.T.A-2ª.Secção, 24/2/2011, rec.50/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 1/3/2011, proc.2442/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/5/2011, proc.4629/11).

Mais se dirá que a sentença nula é a que está inquinada por vícios de actividade (erros de construção ou formação), os quais devem ser contrapostos aos vícios de julgamento (erros de julgamento de facto ou de direito). A nulidade da sentença em causa reveste a natureza de uma nulidade sanável ou relativa (por contraposição às nulidades insanáveis ou absolutas), sendo que a sanação de tais vícios de actividade se opera, desde logo, com o trânsito em julgado da decisão judicial em causa, quando não for deduzido recurso (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/10/2013, proc.6608/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/12/2013, proc.7119/13; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.122 e seg.).  

Trata-se, em qualquer caso, nesta nulidade, de falta de pronúncia sobre questões e não de falta de realização de diligências instrutórias ou de falta de avaliação de provas que poderiam ter sido apreciadas. A falta de realização de diligências constituirá uma nulidade processual e não uma nulidade de sentença. A falta de avaliação de provas produzidas, tal como a sua errada avaliação, constituirá um erro de julgamento da matéria de facto. Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e referir se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P. Tributário).

Ainda, embora o Tribunal tenha também dever de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso não suscitadas pelas partes (cfr.artº.608, nº.2, do C.P.Civil), a omissão de tal dever não constituirá nulidade da sentença, mas sim um erro de julgamento. Com efeito, nestes casos, a omissão de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso deve significar que o Tribunal entendeu, implicitamente, que a solução das mesmas não é relevante para a apreciação da causa. Se esta posição for errada, haverá um erro de julgamento. Se o não for, não haverá erro de julgamento, nem se justificaria, naturalmente, que fosse declarada a existência de uma nulidade para o Tribunal ser obrigado a tomar posição explícita sobre uma questão irrelevante para a decisão. Aliás, nem seria razoável que se impusesse ao Tribunal a tarefa inútil de apreciar explicitamente cada uma das questões legalmente qualificadas como de conhecimento oficioso sobre as quais não se suscita controvérsia no caso concreto, o que ressalta, desde logo, da dimensão da lista de excepções dilatórias de conhecimento oficioso (cfr.artºs.577 e 578, do C.P.Civil), e da apreciável quantidade de vícios geradores de nulidade contida no artº.133, nº.2, do C.P.Administrativo (cfr.ac.S.T.A-2ª.Secção, 28/5/2003, rec.1757/02; ac.T.C.A.Sul-2.ªSecção, 25/8/2008, proc.2569/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 18/9/2012, proc.3171/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/12/2013, proc.7119/13; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.365).

Por último, conforme é jurisprudência constante quando o Tribunal entende que o conhecimento de uma questão está prejudicado, poderá haver erro de julgamento, se for errado o entendimento em que se baseia esse não conhecimento, mas não nulidade por omissão de pronúncia (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 30/1/2014, proc.6995/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/2/2014, proc.7343/14; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 26/6/2014, proc.7784/14).

"In casu", foi precisamente isso que se passou. O Tribunal "a quo" julgou procedente a excepção de erro na forma do processo, o qual implicou o não conhecimento do mérito da causa.

Atento o acabado de mencionar, não se vê que o despacho recorrido tenha omitido pronúncia e, nestes termos, improcedendo este fundamento do recurso.

O apelante discorda do decidido defendendo, igualmente e em sinopse, que a penhora de saldos de conta bancária efectuada enferma do vício de falta fundamentação uma vez que não especifica de que modo e quais as razões de facto e de direito que lhe subjazem (cfr.conclusões 26 a 28 do recurso), com base em tal alegação pretendendo consubstanciar, supomos, um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.

A questão sob apreciação não foi invocada no articulado inicial do presente processo em 1ª. Instância. Na verdade, não se alcança do exame do articulado inicial (cfr.fls.3 a 15 dos autos - nº.6 do probatório) que a matéria vertida nas conclusões que se deixaram expostas (a invocada falta de fundamentação da penhora realizada) haja sido alegada em 1ª. Instância, pelo que não poderia ser objecto de conhecimento e correcção pelo Tribunal “a quo”, sendo nesta sede de recurso pela primeira vez suscitada. Igualmente, não sendo matéria de conhecimento oficioso.

É que o direito português segue o modelo do recurso de revisão ou reponderação (modelo que tem as suas raízes no Código Austríaco de 1895). Daí que o Tribunal “ad quem” deva produzir um novo julgamento sobre o já decidido pelo Tribunal “a quo”, baseado nos factos alegados e nas provas produzidas perante este. Os juízes do Tribunal de 2ª. Instância, ao proferirem a sua decisão, encontram-se numa situação idêntica à do juiz da 1ª. Instância no momento de editar a sua sentença, assim valendo para o Tribunal “ad quem” as preclusões ocorridas no Tribunal “a quo”. Nesta linha, vem a nossa jurisprudência repetidamente afirmando que os recursos são meios de obter o reexame de questões já submetidas à apreciação dos Tribunais inferiores, e não para criar decisões sobre matéria nova, não submetida ao exame do Tribunal de que se recorre, visto implicar a sua apreciação a preterição de um grau de jurisdição (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 22/1/1992, rec.13331; ac.S.T.J., 25/2/1993, proc.83552; ac.T.C.A.Sul-2ª. Secção, 1/3/2011, proc.2442/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 8/8/2012, proc.5857/12; ac.T.C.A.Sul-2ª. Secção, 9/7/2013, proc.6817/13). Não vale, contudo, também entre nós, em toda a sua pureza, o modelo de recurso de reponderação. Além de outras excepções (v.g.as partes podem acordar, em 2ª. Instância, a alteração ou ampliação do pedido - cfr.artº.264, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6), o Tribunal “ad quem” pode conhecer de questões novas, ou seja, não suscitadas no Tribunal recorrido, desde que de conhecimento oficioso e ainda não decididas com trânsito em julgado. E essas questões podem referir-se, quer à relação processual (v.g.excepções dilatórias, atento o disposto no artº.578, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6), quer à relação material controvertida (v.g.prescrição e duplicação de colecta - cfr.artº.175, do C.P.P. Tributário). No que respeita à matéria de direito, são os Tribunais de recurso inteiramente livres quanto à determinação, interpretação e aplicação das normas jurídicas ao caso ajuizado, devendo, mesmo, tomar em consideração as modificações da lei sobrevindas após o julgamento ocorrido na instância inferior, caso elas abranjam a relação jurídica litigiosa (cfr.António Santos Abrantes Geraldes, Recurso em Processo Civil, Novo Regime, 2ª. Edição Revista e Actualizada, 2008, Almedina, pág.92 e seg.; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.153 e seg.; Armindo Ribeiro Mendes, Direito Processual Civil III, Recursos, AAFDL, 1982, pág.174).

Concluindo, o recorrente pretende a emissão de pronúncia sobre questão nova, o que o mesmo é dizer que o tema suscitado nas conclusões apelatórias em análise excede o objecto do recurso, implicando a sua apreciação a preterição de um grau de jurisdição, pelo que dele se não conhece.

Aduz, por último e em síntese, o recorrente que deduziu reclamação de acto do órgão de execução fiscal, nos termos do artº.276, do C.P.P.T., para se opor à penhora de conta bancária, sendo a reclamação o meio processual próprio para o efeito. Que não existe erro na forma de processo. Que o Tribunal “a quo” devia ter apreciado a prescrição suscitada pelo apelante no articulado inicial do processo (cfr.conclusões 6 a 17 e 29 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo concretizar mais um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.

Examinemos se a decisão objecto do presente recurso comporta tal vício.

Releve-se que a análise da propriedade do meio processual empregue pela parte e da sua consequente e eventual admissibilidade legal, deve ser efectuada levando em atenção o princípio da economia processual que enforma todo o direito adjectivo (cfr.artº.130, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, “ex vi” do artº.2, al.e), do C.P.P.Tributário).

O erro na forma do processo consubstancia nulidade processual de conhecimento oficioso (cfr.artºs.193 e 196, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, “ex vi” do artº.2, al.e), do C.P.P.T.), deve ser conhecido no despacho saneador (cfr.artº.595, nº.1, al.a), do C.P.Civil) ou, não existindo este, até à sentença final (cfr.artº.200, nº.2, do C.P.Civil) e só pode ser arguido até à contestação ou neste articulado (cfr.artº.198, nº.1, do C.P.Civil), sendo que, a causa de pedir é irrelevante para efeitos de exame do eventual erro na forma do processo, para os quais apenas interessa considerar o pedido formulado pela parte (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/3/2013, proc.6415/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6862/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 17/3/2016, proc.5361/12; José Lebre de Freitas e Outros, C.P.Civil anotado, Volume I, Coimbra Editora, 1999, pág.344).

No processo judicial tributário o erro na forma do processo igualmente substancia uma nulidade processual de conhecimento oficioso, consistindo a sanação na convolação para a forma de processo correcta, importando, unicamente, a anulação dos actos que não possam ser aproveitados e a prática dos que forem estritamente necessários para que o processo se aproxime, tanto quanto possível, da forma estabelecida na lei (cfr.artº.97, nº.3, da L.G.T.; artº.98, nº.4, do C.P.P.T.; ac.S.T.A.-2ª. Secção, 29/2/2012, rec.441/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 26/6/2012, proc.4704/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/12/2013, proc.7103/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 17/3/2016, proc.5361/12; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.88 e seg.).

Por último, recorde-se que a possibilidade de convolação da forma de processo pressupõe que todo o processo passe a seguir a tramitação adequada, sendo que o pedido formulado no final do articulado inicial constitui um dos elementos que se deve adequar à nova forma processual a seguir. Por outro lado, a manifesta extemporaneidade do articulado em exame também constitui óbice à convolação.

Revertendo ao caso dos autos, defende o apelante que o Tribunal “a quo” não podia indeferir liminarmente a p.i. que originou o presente processo, desde logo, porque foi invocada como causa de pedir a prescrição da dívida exequenda, matéria de conhecimento oficioso.

O decurso do prazo de prescrição extingue o direito do Estado à cobrança do imposto. O instituto da prescrição, tal como o da caducidade, tem na sua base o interesse da certeza e segurança jurídicas, encontrando aquele igualmente fundamento na negligência do credor (cfr.Pedro Soares Martínez, Direito Fiscal, Almedina, 1996, pág.274 e seg.; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.98 e seg.).

O prazo de prescrição das obrigações tributárias em geral é actualmente de oito anos (cfr.artº.48, da L.G.Tributária), sendo anteriormente de dez anos (cfr.artº.34, do C.P.Tributário), e antes de vinte anos nos termos do artº.27, do C.P.C.Impostos. Embora mais favorável ao contribuinte, o prazo actual não é de aplicação retroactiva, devendo, em tal situação, lançar-se mão dos princípios consagrados no artº.297, do C. Civil, no que diz respeito ao cômputo do mesmo. Nestes termos, o prazo de dez anos consagrado no artº.34, do C.P.Tributário, ou o prazo de oito anos consagrado no artº.48, da Lei Geral Tributária, somente se contam a partir da entrada em vigor dos respectivos diplomas (cfr. ac.S.T.A.-2ª.Secção, 28/4/93, Acórdãos Doutrinais, nº.385, pág.461; ac.T.T.2ª.Instância, 29/10/91, C.T.F.365, pág.243 e seg.; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.98; Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2010, pág.94 e seg.).

O termo inicial do prazo de prescrição conta-se em função da ocorrência do facto tributário, sendo computado a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário, nos impostos periódicos, ou a partir da data em que o facto tributário ocorreu, nos impostos de obrigação única, salvo em relação ao I.V.A. em que tal prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que ocorreu a exigibilidade do tributo, se o regime aplicável for o previsto na L.G.T.- cfr.artº.48, nº.1, da L.G.Tributária.

Embora o legislador consagre, há muito, a possibilidade da prescrição da dívida exequenda constituir fundamento de oposição à execução (cfr.artº.176, al.d), do C.P.C.Impostos; artº.286, nº.1, al.d), do C.P.Tributário; artº.204, nº.1, al.d), do C.P.P.Tributário), a mesma prescrição consubstancia uma excepção peremptória de conhecimento oficioso no âmbito do processo tributário (cfr.artº.27, §2 e 3, do C.P.C.Impostos; artº.259, do C.P.Tributário; artº.175, do C.P.P.Tributário), a qual é passível de exame noutras formas de processo, que não a oposição a execução fiscal, nomeadamente, no âmbito de reclamação de decisão do órgão da execução fiscal prevista no artº.276 e seg. do C.P.P.T., mesmo quando o objecto inicial de tal reclamação nada tenha a ver com a apreciação da prescrição, mais devendo tal excepção ser conhecida pelo Tribunal nos casos em que o órgão de execução fiscal o não tiver feito (cfr.artº.175, do C.P.P.T.; ac.S.T.A.-2ª. Secção, 3/10/2007, rec.702/07; ac.S.T.A.-2ª. Secção, 27/2/2013, rec.82/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/11/2014, proc.8145/14; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/01/2017, proc.1089/16.6BESNT; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.285 e seg.).

"In casu", conforme se retira do exame do articulado inicial do presente processo, a prescrição foi identificada como causa de pedir (cfr.nº.6 do probatório), matéria passível de apreciação na presente forma de processo, constatação que obvia, desde logo, ao alegado exame da nulidade processual de erro na forma do processo e dos pressupostos da convolação processual, tudo levando em atenção o princípio da economia processual que enforma todo o direito adjectivo. No mesmo sentido vai, de resto, a aduzida ilegalidade da penhora realizada.

Deve concluir-se, contrariamente ao Tribunal "a quo", que não se verifica uma situação de erro na forma de processo, mais não estando reunidos os pressupostos para o indeferimento liminar do articulado inicial com este fundamento.

Arrematando, sem necessidade de mais amplas ponderações, julga-se procedente o recurso e, em consequência, revoga-se a decisão recorrida, a qual padece do vício de erro de julgamento de direito que se consubstancia na violação do regime previsto no artº.276, do C.P.P.Tributário, ao que se procederá na parte dispositiva deste acórdão.


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DISPOSITIVO

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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em CONCEDER PROVIMENTO AO RECURSO, REVOGAR A DECISÃO RECORRIDA E ORDENAR A BAIXA DOS AUTOS À 1ª. INSTÂNCIA para que se exare despacho de admissão liminar do requerimento identificado nos nºs.5 e 6 do probatório, enquanto articulado inicial relativo ao meio processual de reclamação da decisão do órgão da execução fiscal, se nenhuma outra excepção/questão prévia a tal obstar.

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Sem custas.

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Registe.

Notifique.


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Lisboa, 28 de Setembro de 2017

(Joaquim Condesso - Relator)



(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)

(Bárbara Tavares Teles - 2º. Adjunto)