Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1471/21.7BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:02/24/2022
Relator:MARIA CARDOSO- Relatora por vencimento
Descritores:RECLAMAÇÃO DA DECISÃO DO ÓRGÃO DA EXECUÇÃO FISCAL
MOMENTO DA SUBIDA
PUBLICITAÇÃO LISTA DE DEVEDORES - RESPONSÁVEL SUBSIDIÁRIO
Sumário:I. A doutrina e jurisprudência dominante, em que nos revemos, vem defendendo que o elenco das situações susceptíveis de causar prejuízos irreparáveis possam exorbitar as descritas nas alíneas do n.º 3, do artigo 278.º do CPPT, sendo inequívoco que a subida imediata, nos casos ali não previstos expressamente só poderá suceder, desde que se revele a possibilidade da ocorrência de prejuízos daquela natureza.

II. A subida imediata da reclamação judicial deduzida pelo revertido contra o despacho de inclusão do seu nome na lista de devedores tributários não tem efeito suspensivo da execução fiscal para cobrança do crédito tributário, uma vez que este procedimento tem natureza administrativa e decorre fora do processo de execução fiscal, e, por isso, não se verificam relativamente a essa reclamação as razões que determinaram o legislador a impor como regra geral a subida diferida da reclamação em sede de execução fiscal.

III. Como é consabido, a publicitação da lista de devedores constitui um instrumento de demonstração a toda a comunidade de contribuintes, não só do montante dos prejuízos resultantes do incumprimento das obrigações fiscais de pagamento de dividas fiscais, como também para dar conhecimento de quem são as pessoas contra as quais foi instaurada execução fiscal para pagamento coercivo de dividas fiscais e não têm a sua situação tributária regularizada.

IV. Não sendo o revertido o devedor principal da dívida exequenda e não aceitando a responsabilidade pelo pagamento que lhe está a ser exigido, por ter deduzido em tempo útil oposição à execução fiscal, onde discute a sua legitimidade substantiva, enquanto não for proferida decisão, com trânsito em julgado, a ATA não poderá publicitar o seu nome na lista de contribuintes cuja situação não se encontre regularizada, sob pena de violar o Direito Constitucional do Recorrido à preservação do seu bom nome, reputação e imagem (cfr. artigo 26.º, n.º da CRP).

Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a 1ª Subsecção da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO

1. A Fazenda Pública veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a reclamação deduzida por H......, contra o despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 7, que determinou a sua inclusão na lista de devedores tributários, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 32391…… e apensos, na qualidade de revertido, para cobrança dividas dos períodos de tributação dos meses de dezembro de 1997, dezembro de 1998 e março de 1999, que é devedora originária a sociedade T......, LDA, no valor total de € 168.670,28.

2. A Recorrente apresentou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

«A - Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença proferida nos autos à margem melhor identificados, que julgou procedente a reclamação apresentada por H......, anulando o despacho reclamado, por vicio de violação de lei, por erro nos pressupostos de direito revogando a decisão de inclusão do Reclamante na lista publica de devedores.

B – Discorda a Fazenda Publica, com o devido respeito, do entendimento sufragado na douta sentença, e com o mesmo não se conforma, porquanto procede a uma errónea apreciação dos factos pertinentes para efeitos de decisão, com consequente inadequado enquadramento jurídico [por não ter feito uma correta interpretação e aplicação das normas estabelecidas mormente aos artigos 52º e 64º/5 da LGT e 169º, 170º, 212º e 278º do CPPT.]

C – Foi decidido pelo tribunal a quo que a presente situação configurava um dos casos em que a reclamação deveria subir imediatamente por configurar a sua subida deferida um prejuízo irreparável ao reclamante, ora recorrido; e, ainda, julgar ilegal o despacho reclamado, [publicitação do nome do reclamante na lista publica de devedores ao Estado] por vicio de violação de lei e por erro nos pressupostos de direito.

Vejamos:

D- No que contende à subida imediata da reclamação a juízo, afigurou-se na sentença ora recorrida que aquilo que o Reclamante pretende salvaguardar é o seu bom nome e, portanto, a subida a final da reclamação retirar-lhe-ia qualquer efeito útil.

E- Não olvidando que o nº 1 do art.º 278º do CPPT dispõe que a regra é a subida diferida da reclamação, situações há em que as reclamações consagradas no art.º 276º do CPPT podem ser desde logo conhecidas pelo tribunal, nomeadamente as situações previstas no nº 3 do art.º 278º do CPPT.

F – Ora, no presente caso não se trata de qualquer uma das situações previstas no aludido nº 3, nem tampouco da leitura da petição inicial apresentada pelo reclamante ora recorrido nem este requer a subida imediata da presente reclamação nem demonstra, nem tampouco prova, o prejuízo irreparável para a subida imediata desta.

G – O tribunal a quo, assumiu que o ato reclamado acarretaria ao contribuinte um prejuízo irreparável, fazendo o seu juízo de valoração, sem, contudo, apresentar os fundamentos que sustentam tal juízo, nem podia, uma vez que não foram levados ao conhecimento do julgador por quem estava obrigado a tal [o reclamante].

H - Nestes termos, e porque se trata se um apuramento subjetivo, o que pode considerar-se prejuízo irreparável neste caso, para um cidadão pode não o ser para outro, deveria o ora recorrido ter requerido a subida imediata da reclamação por si deduzida, alegando e provando o prejuízo que lhe causaria o seu conhecimento a final, uma vez que a presente situação [inclusão do seu nome na lista publica de devedores] não se encontra tipificado no art.º 278º do CPPT.

I – Ao ter julgado pela subida imediata da reclamação, o tribunal substituiu-se ao reclamante tentando trazer ao processo argumentos para a apreciação imediata da reclamação, o que não poderia ter feito, ocorrendo erro no seu julgamento.

J – No que ao próprio ato reclamado diz respeito [a inclusão do reclamante na lista publica de devedores ao Estado] entendeu o tribunal a quo, que não se encontravam preenchidos os requisitos do art.º 64º da LGT nomeadamente a constante na alínea a) do nº 5 do referido preceito legal, uma vez que pelo facto de não ser o contribuinte principal, e estar a litigar a responsabilidade subsidiária pelas dividas exequendas, tem de ser entendido como tendo a sua situação tributária regularizada ao abrigo daquela al.) a).

K – Entendimento com o qual, uma vez mais, não concorda esta Fazenda Publica nos termos seguintes:

M - «Sabemos que, nos termos previstos no artigo 64º, nº 5, alínea a) da LGT, a AT pode, sem quebra do dever de confidencialidade, “proceder à divulgação de listas de contribuintes cuja situação tributária não se encontre regularizada, designadamente listas hierarquizadas em função do montante em dívida, desde que já tenha decorrido qualquer dos prazos legalmente previstos para a prestação de garantia ou tenha sido decidida a sua dispensa.”», in Acórdão proferido pelo TCA Sul de 18-09-2014 no processo 07848/14. (sublinhado e negrito nosso)

N – Ora, a prestação da garantia é imprescindível para a obtenção do efeito suspensivo da execução, sendo apenas dispensada nos casos previstos na lei (artigo 52°, n°4 da LGT e artigo 170° do CPPT). E que o que faz suspender a execução fiscal é a constituição de garantia idónea e suficiente e não a apresentação por si só do contencioso judicial.

O – Conforme se pode verificar a fls. 2 da D. Sentença, consta da al. d) do ponto III. Da fundamentação de Facto que o reclamante não apresentou garantia ou requereu o pedido de dispensa de apresentação de garantia no PEF;

P - Disto, só pode retirar-se que o contribuinte, ainda que chamado ao pagamento da dívida através do instituto da reversão, se conformou com o facto de ser responsável, ainda que subsidiário, assumindo as consequências de não ter prestado garantia na execução fiscal ou requerido a sua dispensa. E, uma dessas consequências, pelas características da dívida exequenda, é a inclusão do seu nome na lista publica de devedores ao Estado!

Q - Ao aceitar-se a decisão proferida pelo tribunal a quo está a abrir-se a oportunidade de todo e qualquer devedor subsidiário se furte ao mecanismo estabelecido por lei – e não pela Administração Fiscal – da coação moral ao pagamento dos créditos tributários, abrindo a “caixa de pandora” para quem dela saiba aproveitar.

R - Pelo que, salvo o devido respeito, não pode afigurar-se que não estejam preenchidos os requisitos da al. a) do nº 5 do art.º 64º da LGT, devendo a decisão proferida ser revogada.

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que declare a reclamação improcedente.

PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA»

3. O Recorrido não apresentou contra-alegações.

4. Recebidos os autos neste Tribunal Central Administrativo Sul, e dada vista ao Exmo. Procurador-Geral Adjunto, emitiu parecer, pronunciando-se no sentido de ser negado provimento ao recurso.

5. Com dispensa dos vistos, atento o carácter urgente dos autos, vem o processo à Conferência para julgamento.


*

II – QUESTÕES A DECIDIR:

O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, como resulta dos artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.

Assim, considerando o teor das conclusões apresentadas, importa apreciar e decidir se a sentença enferma de erro de julgamento na apreciação dos factos e de direito ao concluir (i) que a reclamação apresentada é de admitir com subida imediata, e, quanto ao acto reclamado (ii) que não se encontram preenchidos os pressupostos que legitimam a Adminsitração Tributária a incluir o nome do Reclamante na lista pública de devedores ao Estado.


*

III - FUNDAMENTAÇÃO

1. DE FACTO

A sentença recorrida proferiu a seguinte decisão relativa à matéria de facto:

«a) O Reclamante é revertido no processo de execução fiscal n.º 323919……6 e apensos, em que é devedora originária a sociedade T......, Lda., NIPC 502…..– cfr. informação prestada pelo Serviço de Lisboa 7, datado de 28/06/2021, que mereceu despacho de concordância do Chefe do Serviço de 28/06/2021, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzida.

b) No PEF identificado na alínea a) anterior estão em cobrança dividas dos períodos de tributação de 12/1997, 12/1998 e 03/1999.

c) O Reclamante apresentou oposição à execução fiscal, na qualidade de revertido, que corre termos no Tribunal Tributário de Lisboa, 1ª Unidade Orgânica, com o n.º de processo 1219/15.5BEAVR.

d) O Reclamante não apresentou garantia ou requereu pedido de dispensa de garantia no PEF identificado na alínea a) supra.

e) O Reclamante foi notificado da intenção de ser incluído na divulgação da lista de devedores tributários na internet no escalão de dívida acima dos €100.001.

f) O Reclamante apresentou defesa na qual alegou que passados mais de 20 anos, as dividas estão prescritas, facto de, alegou, ter sido reconhecido pela Autoridade Tributária.

g) Por despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 7, proferido em 31/05/2021, o pedido foi indeferido, por não obstar à publicitação.

h) Notificado, o Reclamante apresentou a presente reclamação.

i) No processo n.º 1219/15.5BEAVR ainda não foi proferida sentença – consulta SITAF.


*

Inexistem factos não provados que relevem para a decisão da causa.

*

Motivação

Relativamente à matéria de facto, o Tribunal não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de selecionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa [ou causas] de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor e consignar se a considera provada ou não provada [cfr. artigos 94.º do CPTA e 607.º, n.º 3 e 4 do CPC, aplicáveis ex vi do artigo 2.º, alíneas c) e e) do CPPT].

Face à questão a decidir, a convicção do Tribunal, quer quanto aos factos provados, quer aos não provados, resultou da análise dos documentos juntos aos autos com os respetivos articulados, supra id., a propósito de cada uma das alíneas e números do probatório, cujo conteúdo não foi impugnado pelas partes.

Os restantes factos alegados não foram julgados provados [ou não provados], por constituírem conclusões/considerações pessoais ou conclusões de facto ou de direito ou serem meramente exemplificadores/contextualizadores, pelo que, não são os mesmos suscetíveis de ser objeto de juízo probatório [pese embora a sua pertinência nos respetivos articulados]


*

II. DE DIREITO

1. Do conhecimento imediato da reclamação

O Tribunal Tributário de Lisboa entendeu que se justifica o conhecimento imediato da reclamação, como permite o n.º 3, do artigo 278.º do CPPT, interpretado correctivamente pela jurisprudência, por a subida a final lhe retirar qualquer efeito útil, assim se dando cumprimento à tutela jurusdicional efectiva consagrada no artigo 268.º, n.º 4, da CRP.

A Recorrente discorda do assim decidido, alegando que o presente caso não se trata de qualquer uma das situações previstas no n.º 3, do artigo 278.º do CPPT, nem tão pouco o Reclamante requereu a subida imediata da reclamação, nem demonstra, nem prova o prejuízo irreparável para a subida imediata desta. Mais invoca que o tribunal a quo assumiu que o acto reclamado acarretaria ao contribuinte um prejuízo irreparável, fazendo o seu juízo de valoração, substituindo-se ao reclamante, trazendo ao processo argumentos para a apreciação imeditada da reclamação, o que não poderia ter feito, ocorrendo erro de julgamento (cfr conclusões D) A I) da alegação de recurso).

Assim, a primeira questão que cumpre apreciar é a de saber se o Tribunal a quo fez um correcto julgamento quanto o momento de subida da reclamação.

Vejamos.

Nos termos do artigo 278.º n.º 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), o tribunal só conhecerá das reclamações quando, depois de realizadas a penhora e a venda, o processo lhe for remetido a final.

Estabelece-se, neste artigo, a regra da subida diferida das reclamações ao tribunal tributário, após a realização da penhora e venda.

Porém, tal regra consagra excepções, importando, assim, a respectiva subida e conhecimento imediato, sendo que tais excepções encontram-se previstas no artigo 278.º n.º 3 do CPPT, que dispõe o seguinte:

«3- O disposto no nº1 não se aplica quando a reclamação se fundamentar em prejuízo irreparável causado por qualquer das seguintes ilegalidades:

a) Inadmissibilidade da penhora dos bens concretamente apreendidos ou da extensão com que foi realizada;

b) Imediata penhora dos bens que só subsidiariamente respondam pela dívida exequenda;

c) Incidência sobre bens que, não respondendo nos termos de direito substantivo, pela dívida exequenda, não deviam ter sido abrangidos pela diligência;

d) Determinação da prestação de garantia indevida ou superior à devida.

c) Erro na verificação ou graduação de créditos.»

O legislador estabeleceu um regime excepcional à regra da subida diferida das reclamações ao tribunal tributário (só após a realização da penhora e da venda), delimitando com precisão as situações subsumíveis àquele e que se resumem às descritas nas alíneas a), b), c), d) e e) do citado preceito legal.

Como é consabido, a doutrina e jurisprudência dominante, em que nos revemos, vem defendendo que o elenco das situações susceptíveis de causar prejuízos irreparáveis possam exorbitar as descritas nas alíneas do n.º 3, do artigo 278.º do CPPT, sendo inequívoco que a subida imediata, nos casos ali não previstos expressamente só poderá suceder, desde que se revele a possibilidade da ocorrência de prejuízos daquela natureza.

O «prejuízo irreparável» a que se refere o nº 3 do artigo 278. ° do CPPT deve ser estendido a todos aqueles casos em que a regra da subida diferida faz perder toda e qualquer utilidade à reclamação, isto é, a todos aqueles casos em que a reclamação fique sem finalidade alguma por força da sua subida diferida ou em que a sua apreciação e decisão pelo tribunal, ainda que favorável ao recorrente, já não lhe possa aproveitar, situação que acarreta, igualmente, um prejuízo irreparável.

A este propósito, cita-se, entre muitos outros o Acórdão do Pleno do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Adminsitrativo, de 06/07/2011, proferido no processo n.º 0459/11 (também citado na sentença recorrida), onde se deixou expresso: «[a]pesar do carácter taxativo que a redacção do n.º 3 do artigo 278.º do CPPT dá ao elenco dos casos de subida imediata das reclamações, deverá ainda admitir-se, sob pena de violação do direito à tutela judicial efectiva de direitos e interesses legítimos em matéria de contencioso administrativo, constitucionalmente garantido (cf. art. 268.º, n.º 4, da Constituição da República), a remessa e conhecimento imediato da reclamação sempre que, sem eles, o interessado sofra prejuízo irreparável ou sempre que, sem ela, a reclamação perca toda a utilidade» (vide ainda ac. do STA de 10/01/2018, processo n.º 01454/17, disponíveis em www.dgsi.pt/).

No caso dos autos, o Recorrido, na qualidade de revertido, com oposição à execução fiscal pendente de decisão, reclamou contra o despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa-7 que determinou sua inclusão na lista de devedores tributários.

O Recorrido sustentou na sua reclamação, em síntese, que deduziu oposição há largos anos, sem qualquer julgamento ou decisão, que tal situação acarreta prejuízo para a sua vida pessoal, familiar e patrimonial e que a sua inclusão na lista de devedores importa humilhação e vexame adicionais, e violação dos princípios da dignidade e bom nome.

Na reclamação não foi requerida expressamente a sua subida imediata.

A Mma juíza a quo depois de citar as normas jurídicas aplicáveis e pertinente doutrina e jurisprudência, concluiu que se justifica o conhecimento imediato da reclamação, tendo para o efeito ponderado o seguinte:

Ora, no caso dos autos, apesar das omissões do Reclamante, fácil é de apreender que o que o Reclamante pretende acautelar e antecipar é a sua inclusão e posterior divulgação na lista de devedores ao Estado, dividas que, como alega e resulta do probatório, ainda se encontram em discussão em processo de oposição, a correr termos neste Tribunal, o qual tem por base factos tributários ocorridos em finais da década de 90.

Não só factos se reportam à década de 90, como nos autos de oposição se encontra em discussão a responsabilidade do Reclamante pelo pagamento da dívida exequenda, inter alia, no que concerne à sua legitimidade substantiva.

Não parecer resultar que da inserção do seu nome na lista de devedores, passados 20 anos, vá conduzir ao pagamento pela vida da pressão social, porquanto o Reclamante em sede de Oposição entende nada dever e, como tal, se entende nada dever, não incumprirá.

Nessa medida, aquilo que o Reclamante pretende salvaguardar, enquanto se discute a oposição à reversão, é o seu bom nome.

Assim, se a subida a final da reclamação lhe retira qualquer efeito útil, como seria o caso, deve a mesma ser imediatamente conhecida, assim se dando cumprimento à tutela jurisdicional efetiva consagrada no artigo 268.º, n.º 4, da CRP.

O assim decidido não nos merece censura.

Na apreciação da questão, não podemos perder de vista, que o Revertido deduziu oposição à execução fiscal instaurada há cerca de 20 anos, no âmbito da qual se discute, como salientou a Mma. Juíza a quo, a sua legitimidade substantiva.

Entendemos, também, que a reclamação deduzida pelo revertido - que aguarda prolação de sentença na oposição deduzida à execução fiscal -, contra o despacho de determinou a sua inclusão na lista de devedores deve ser conhecida imediatamente sob pena da reclamação perder o seu efeito útil e de violação do princípio da tutela jurisdicional efectiva, consagrado no artigo 268.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa.

Embora o Reclamante não tenha requerido expressamente a subida imediata, alegou, como se viu, prejuízo irreparável.

De acordo com o entendimento que tem vindo a ser adoptado pelo Supremo Tribunal Administrativo, na interpretação do pedido não deve o juiz ficar-se pela redacção que lhe foi dada, impõe-se ir um pouco mais longe e descortinar a verdadeira pretensão de tutela jurídica, ainda que com recurso à figura do pedido implícito (vide neste sentido, JORGE LOPES DE SOUSA, in Código de Procedimento e de Processo Tribtário, anotado e comentado, Áreas Editora, vol. II volume, últimos três parágrafo da anotação 10 d) ao art. 98.º, pág. 92.).

Com efeito, a nossa lei processual procura evitar que a forma prevaleça sobre o fundo e aliada ao princípio da tutela jurisdicional efectiva dos direitos e interesses das partes, tem se vindo a afastar o rigor formalista na interpretação das peças processuais, impondo-se, pois, que o tribunal extraia do pedido que lhe é feito o sentido mais favorável aos interesses do peticionante, indagando da sua real pretensão (vide Ac. do STA de 16/12/2015, proc. n.º 01508/14, disponível em www.dgsi.pt/).

Na situação dos autos é perceptível a pretensão do Reclamante da subida imediata da reclamação e que, tal como configurou, a sua inclusão na lista de devedores, enquanto aguarda pela decisão final da oposição, configura um acto lesivo, pelas consequências que lhe podem advir para ao seu bom nome, direito de difícil reparação.

Desta forma, o não conhecimento imediato da reclamação, implica a perda da sua utilidade, por a final estar já consumdo o efeito que o Reclamante pretende obviar.

Acresce que, a subida imediata da reclamação judicial deduzida pelo revertido contra o despacho de inclusão do seu nome na lista de devedores tributários não tem efeito suspensivo da execução fiscal para cobrança do crédito tributário, uma vez que este procedimento tem natureza administrativa e decorre fora do processo de execução fiscal, e, por isso, não se verificam relativamente a essa reclamação as razões que determinaram o legislador a impor como regra geral a subida diferida da reclamação em sede de execução fiscal.

Efectivamente, a regra geral é a do conhecimento imediato pelo tribunal das pretensões que lhe são formuladas e não a de relegar a sua apreciação para momento ulterior, o que só poderá fazer quando houver motivo legalmente atendível.

Neste enquadramento, e também por a aplicação da regra geral da subida diferida levar a que a presente reclamação perda toda a utilidade e visto os prejuízos invocados – violação do bom nome -, conclui-se que a decisão recorrida não padece do erro de julgamento que lhe é imputado no que concerne à interpretação do artigo 278.º do CPPT.

Termos em que improcede, neste segmento, o presente de recurso.


*

2. Do erro de julgamento quanto à não verificação dos requisitos da alínea a) do n.º 5, do artigo 64.º da LGT

Está em causa a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou procedente a reclamação judicial apresentada pelo ora Recorrido, e anulou o acto reclamado, que determinou a inclusão do nome do Reclamante na lista de devedores cuja situação tributária não se encontre regularizada, ao abrigo do disposto no artigo 64.º, n.ºs 5, alínea a) e 6 da LGT, por violação de lei, por erro nos pressupostos de direito.

A Fazenda Pública discorda da decisão da 1.ª instância alegando, em suma, que a garantia é imprescindível para obtenção do efeito suspensivo da execução e não a apresentação por si só do contencioso judicial. Mais alegou que, o reclamante não apresentou garantia ou requereu pedido de dispensa da mesma, do que só pode retirar-se que o contribuinte, ainda que chamado ao pagamento da dívida através do instituto da reversão, assumiu as consequências da não prestação da garantia na execução fiscal ou sua dispensa, sendo uma delas a inclusão do seu nome na lista pública de devedores ao Estado.

Vejamos.

A questão que se coloca no presente resurso é a de saber se a pendência de oposição à execução fiscal, em que se discute a legitimidade substantiva do revertido obsta ou não a que a Adminsitração Tributária divulge o seu nome da lista de devedores cuja situação tributária não se encontra regularizada, ao abrigo do disposto no artigo 64.º, n.ºs 5, alínea a) e 6 da LGT (na redacção introduziada pela Lei n.º 83-B/2014, de 31/12).

Resultam do probatório, os seguintes factos que não se mostram controvertidos:

O Reclamante é revertido no processo de execução fiscal, no âmbito do qual se encontram em cobrança dividas dos anos de 1997, 1998 e 1999, tendo o revertido apresentado oposição à execução fiscal, que corre termos com o n.º de processo 1219/15.5BEAVR, onde se encontra em discussão a responsabilidade do Reclamante pelo pagamento da dívida exequenda, inter alia, no que respeita à sua legitimidade substantiva. O executado por reversão não apresentou garantia ou requereu pedido de dispensa de garantia no identificado processo de execução fiscal.

A sentença recorrida, ancorada no acórdão do STA de 18/04/2007, processo n.º 0242/07 (disponível em www.dgsi.pt/), que seguiu de perto, expendeu o seguinte discurso fundamentador:

«(…) a expressão contribuintes usada pelo artigo 64.º da LGT inclui os devedores subsidiários.

Porém, o que ao caso importa é, antes, saber se o Reclamante é um contribuinte [e, para o efeito, basta que o seja em sentido lato, como se viu] “cuja situação tributária não se encontre regularizada”, na expressão da alínea a) do n.º 5 do artigo 64.º da LGT, pois só os nomes dos contribuintes nessa condição podem ser incluídos nas listas autorizadas pela mesma alínea.

Vimos já qual a concreta situação em que se acha o Reclamante: reverteram contra ele várias execuções fiscais inicialmente instauradas contra a sociedade de que é responsável subsidiário, às quais se opôs alegando não ser responsável pelas dívidas exequendas e invocando a sua prescrição, sem que tenha prestado garantia ou requerido a sua dispensa.

A pergunta a que importa dar resposta é esta: o descrito circunstancialismo faz do recorrido um contribuinte cuja situação tributária se não acha regularizada?

A resposta impõe-se negativa.

É que o Reclamante, não sendo devedor principal, não aceita ser responsável subsidiário pelas dívidas exequendas, e ainda não foi judicialmente convencido do contrário. Enquanto a discussão nas oposições às execuções não for encerrada, não está definida a sua responsabilidade pelo pagamento dos impostos cuja falta originou a publicitação do seu nome como prevaricador. Tudo o que se sabe é que a Administração lhe atribui tal responsabilidade, por isso que fez contra si reverter as execuções fiscais; e que ele, não se tendo por responsável, despoletou o meio de defesa ao seu alcance para questionar a sua responsabilidade.

(…)

Noutro plano, não deve esquecer-se que “(…) no instituto da responsabilidade fiscal tem-se em vista estabelecer uma segunda linha de garantia dos créditos fiscais, em termos que, se não forem satisfeitos pelo devedor principal (isto é, pelo seu património), sejam os mesmos satisfeitos por determinados terceiros que tenham específicas relações jurídico-económicas idóneas com aquele e na medida exclusiva dessas relações (…)”

Não estamos, pois, perante uma situação em que o executado seja um verdadeiro contribuinte, em sentido estrito, ou seja, em cuja esfera patrimonial ocorreu um facto revelador de capacidade contributiva; trata-se, apenas, do uso de uma técnica tributária cujo objetivo é a cobrança do imposto de que outrem é devedor [JOSÉ CASALTA NABAIS, O DEVER FUNDAMENTAL DE PAGAR IMPOSTOS, pág. 488/489]. Técnica que, como aponta o mesmo Autor [obra citada, pág. 492] “(…) pode afectar diversos princípios e preceitos constitucionais, designadamente os relativos aos direitos fundamentais, devendo, por isso, essa instrumentalização dos particulares na cobrança dos impostos ser rodeada de algumas cautelas».

Nesta linha de pensamento se pode afirmar que a divulgação dos nomes dos contribuintes faltosos, tendo em vista pressioná-los ao cumprimento, para desse modo evitarem a censura social que, supostamente, recai sobre quem não cumpre as suas obrigações fiscais, é um instrumento que, por constrangedor dos direitos consagrados pelo artigo 26.º n.º 1 da Constituição da República Portuguesa, deve ser usado na limitada medida em que o sacrifício de tais direitos seja justificado pelos interesses coletivos – o direito à cobrança dos impostos –, e que as cautelas devem redobrar quando o visado não é o devedor principal.

É que dificilmente se justifica uma pressão do mesmo grau para pagar impostos seus, reveladores da capacidade contributiva própria que legitima a sujeição a imposto, ou alheios. Tanto mais quando o suposto devedor [de segunda linha] não aceita a responsabilidade pelo pagamento que lhe é exigido, e está ainda no uso dos meios processuais que a lei lhe atribui para convencer da ausência dessa responsabilidade.

Se ninguém pode ser obrigado a pagar impostos cuja cobrança se não faça nos termos da lei [artigo 103.º, n.º 3 da Constituição], também não será legítimo o exercício, pela Administração, de meios tendentes a constranger alguém a pagar impostos que não são da sua originária responsabilidade, quando a respetiva obrigação esteja ainda em discussão perante os tribunais [cfr., nesse sentido, o Ac. do STA de 18/04/2007/Proc. 0242/07, que temos vindo a seguir].

Sub judicio, o Reclamante em sede de oposição à execução não se limitou a invocar a prescrição das dividas, mas igualmente a sua legitimidade substantiva, questão que ainda não se encontra decidida e, nessa medida, em última rácio não ainda não é devedor, nos termos em que o é a devedora originária e, portanto, à luz da jurisprudência citada, não se encontram preenchidos os pressupostos que legitimam a Autoridade Tributária a praticar o ato reclamado, o que só se justificaria no caso de improcedência da oposição à execução fiscal n.º 1219/15.5BEAVR, a correr termos na 1ª Unidade Orgânica do Tribunal Tributário de Lisboa

Adiantamos, desde já, que o assim decidido não nos merece censura.

A Recorrente não faz qualquer referência ao acórdão do STA citado na sentença, invocando antes em abono da sua tese, o acórdão do TCA Sul de 18/09/2014, proferido no processe n.º 07848/14 (disponível em www.dgsi.pt/).

Porém, não há total identidade entre a questão que nos ocupa e a que foi apreciada no identificado acórdão deste TCAS, uma vez que, nesse arresto, o executado tratava-se do devedor originário, e aqui trata-se do devedor subsidiário contra quem foi revertida a execução fiscal, pelo que o aí decidido não é útil para os presentes autos.

Como é consabido, a publicitação da lista de devedores constitui um instrumento de demonstração a toda a comunidade de contribuintes, não só do montante dos prejuízos resultantes do incumprimento das obrigações fiscais de pagamento de dividas fiscais, como também para dar conhecimento de quem são as pessoas contra as quais foi instaurada execução fiscal para pagamento coercivo de dividas fiscais e não têm a sua situação tributária regularizada.

Atenta a alteração legislativa operada no artigo 64.º da LGT e o aditamento do artigo 177.º-A ao CPPT, importa que nos debrucemos sobre as diferenças nos regimes da situação tributária regularizada, uma vez que à data em que o acórdão do STA de 18/04/2007 foi prolatado aplicava-se o regime da publicitação introduzido pela Lei n.º 60-A/2005, de 30/12.

Até 31/12/2014, o conceito de situação tributária regularizada encontrava-se prevista no n.º 6, do artigo 64.º da LGT (redacção dada pela Lei n.º 60-A/2005, de 30/12), que dispunha: Considera-se como situação tributária regularizada, para efeitos do dispostona alínea a) do número anterior, o pagamento integral de quaisquer tributos, a inexistência de situações de mora ou a sua regularização em conformidade comas disposições e planos previsto no Código de Procedimento e de Processo Tributário e demais legislação em vigor.

O artigo 64.º da LGT, com a epígrafe Confidencialidade, nos seus nºs 5, alínea a) e 6, (o n.º 6 na redacção introduzida pela Lei n.º 82-B/2014, de 31/12), dispõe o seguinte:

5 - Não contende com o dever de confidencialidade:

a) A divulgação de listas de contribuintes cuja situação tributária não se encontre regularizada, designadamente listas hierarquizadas em função do montante em dívida, desde que já tenha decorrido qualquer dos prazos legalmente previstos para a prestação de garantia ou tenha sido decidida a sua dispensa; (Redação introduzida pela Lei n.º 60-A/2005, de 30 de dezembro)

6 - Para efeitos do disposto na alínea a) do número anterior, considera-se como situação tributária regularizada o disposto no artigo 177.º-A do CPPT. (Redação introduzida pela Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro)

E o artigo 177.º-A do CPPT, com a epígrafe “Situação tributária regularizada”, estatui:

1 - Considera-se que o contribuinte tem a situação tributária regularizada quando se verifique um dos seguintes requisitos:

a) Não seja devedor de quaisquer impostos ou outras prestações tributárias e respetivos juros;

b) Esteja autorizado ao pagamento da dívida em prestações, desde que exista garantia constituída, nos termos legais;

c) Tenha pendente meio de contencioso adequado à discussão da legalidade ou exigibilidade da dívida exequenda e o processo de execução fiscal tenha garantia constituída, nos termos legais; (Redação da Lei n.º 7-A/2016 de 30 de março)

d) Tenha a execução fiscal suspensa, nos termos do n.º 2 do artigo 169.º, havendo garantia constituída, nos termos legais.

2 - À constituição de garantia é equiparada, para estes efeitos, a sua dispensa e a sua caducidade.

Das normas citadas resulta que a alínea a) do artigo 5.º do artigo 64.º da LGT, permite a divulgação de listas de conbribuintes sem situação tributária regularizada, o que constitui uma excepção ao dever de confidencialidade.

Por sua vez, o n.º 6, da mesma norma, esclarece o conceito de situação tributária regularizada.

Resulta do n.º 6, do artigo 64.º da LGT (na redacção dada pela Lei n.º 60-A/2005) que considera-se que está regularizada a situação em todas as situações em que não puder instaurar-se ou continuar-se um processo de execução fiscal para cobrança coerciva, designadamente nos casos em que a execução fique suspensa nos termos do artigo 169.º do CPPT (vide neste sentido Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, in Lei Geral Tributária, 4.º edição, 2012, encontro de escrita, nota 8 ao artigo 64.º, pág. 600).

O conceito de situação regularizada, para efeitos de publicitação, é actualmente o que consta do artigo 177.º-A do CPPT, tendo sido introduzido pela Lei n.º 82-B/2014, de 31/12.

Os regimes são substancialmente idênticos, pois, tal como sucedia no regime anterior, actualmente considera-se que está regularizada a situação tributária, nos casos em que as dívidas fiscais em cobrança coerciva se encontrem a ser pagas em prestações devidamente autorizadas (cfr. artigo 196.º a 198.º do CPPT), ou se tiver sido manifestada a intenção de apresentar, reclamação, recurso, impugnação judicial ou oposição à execução fiscal e, em qualquer dos casos, tenha sido prestada garantia ou a penhora garanta a totalidade da dívida exequenda ou, em alternativa, tenha sido dispensada a prestação de garantia (artigo 169.º do CPPT).

Entendemos, assim, que o decidido no acórdão do STA de 18/04/2007, proferido no processo n.º 0242/07, e todo o seu discurso fundamentar tem inteira aplicação ao caso dos presentes autos, não obstante a referida aleteração legislativa, não se vislumbrando motivos para nos afastarmos desta jurisprudência.

Transcrevemos, assim, com a devida vénia, o sumário do identificado arresto:

«A pendência de oposição à execução fiscal em que se discute a verificação dos pressupostos da reversão contra o responsável subsidiário obsta a que a Administração insira o seu nome na lista de contribuintes cuja situação tributária não se encontra regularizada, ao abrigo da alínea a) do nº 5 do artigo 64º da Lei Geral Tributária, na redacção da lei nº 60-A/2005, de 30 de Dezembro.»

O STA em recente acórdão de 12/01/2022, proferido no processo n.º 02457/21 (disponível em www.dgsi.pt/), apreciou situação idêntica à dos presentes autos, já na vigência do artigo 177.º-A do CPPT, sufragando o entendimento vertido no acórdão do STA de 18/04/2007, embora com declaração de voto de um dos elementos integrante da formação de julgamento.

No citado arresto, cujo discurso fundamentador acompanhamos, por com o mesmo concordarmos, expendeu-se o seguinte:

«(…) não merece qualquer censura, por ter feito uma correcta hermenêutica e aplicação da lei ao caso concreto, a chamada à colação da jurisprudência fixada neste STA pelo acórdão do Supremo Tribunal Administrativo datado de 18.04.2007 (R. 0242/07), publicado in www.dgsi,pt, segundo a qual “Se ninguém pode ser obrigado a pagar impostos cuja cobrança se não faça nos termos da lei (artigo 103º nº 3 da Constituição), também não será legítimo o exercício, pela Administração, de meios tendentes a constranger alguém a pagar impostos que não são da sua originária responsabilidade, quando a respectiva obrigação esteja ainda em discussão perante os tribunais.”

Aponta, pois, tal jurisprudência para que, sendo certo que a inclusão na questionada lista tem o propósito de publicitação dessa mesma situação de devedor, também é certo que tal contende com direitos do executado que devem ser preservados e garantidos, enquanto a discussão na oposição à execução em apreço não estiver encerrada, não está definida a sua responsabilidade pelo pagamento dos impostos cuja falta originou a publicitação do seu nome como prevaricador.

Por assim ser e em sintonia com essa linha jurisprudencial, não obstante a AT haja procedido à reversão da execução fiscal, uma vez que o reclamante, não se assumiu como responsável, desencadeou o meio de defesa ao seu alcance para questionar a sua responsabilidade subsidiária pelo que, na senda do julgador e do douto Parecer do Ministério Público emitido nesta instância, a questão controvertida não deve ser decidida tendo apenas por fundamento a estrita literalidade dos preceitos legais aplicáveis, mas antes buscando uma interpretação sistemática das normas, ou seja, tendo por base a unidade do sistema jurídico, nos termos do artigo 9.º, n.º 1 do Código Civil.

Substanciando.

Na esteira do doutrinado por Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária-Anotada e Comentada, 3ª edição, p. 502, o artigo 97.º n.º1 da LGT, em consideração ao artigo 20.º, n.º4 da CRP, reconhece o direito de obter, em prazo razoável, uma decisão que aprecie a pretensão regularmente deduzida em juízo, o que vale por dizer, “dentro do tempo que possibilite a obtenção do máximo da tutela efetiva e eficaz dos direitos e interesses legalmente protegidos ou que menos obste à perturbação da situação lesiva”.

Por esse prisma e porque o ora reclamante deitou mão, em tempo útil, dos meios processuais próprios para defesa da sua posição que passava por discutir a sua responsabilidade subsidiária e não tendo obtido decisão, transitada em julgado, sobre tal questão, não pode ser penalizado pelo facto de tal litígio não se encontrar resolvido. Considerando, para além do mais, que o artigo 96.º, n.º2 do CPPT prevê não dever o processo judicial tributário ter duração acumulada superior a dois anos contados entre a data da respectiva instauração e a da decisão proferida em 1.ª instância.
Releve-se, a tal propósito, que, como também realça o Ministério Público, a jurisprudência nacional, no rasto da jurisprudência do TEDH, vem sinalizando como um tempo razoável para a tramitação de um processo judicial em 1.ª instância, o período de 3 anos.

Por último mas, cumpre enfatizar que do probatório, que não vem impugnado, consta como facto não provado que a AT haja notificado o reclamante para prestar garantia, visando a suspensão do processo de execução fiscal, obrigação a que estava expressamente adstrita por força do disposto no artigo 169.º, n.º2 do CPPT (na redacção vigente).

Ora, como bem denota o julgador no tangente à publicidade a dar do nome e demais elementos de identificação do contribuinte Reclamante e ora Recorrido, este tem direito constitucional “ao bom nome e reputação e imagem...” (cf. n°. 1 do art°.26°. da C.R.P.), sendo que, como enfatiza o Recorrido nas suas contra-alegações não é necessário alegar qualquer prejuízo, sendo bastante que e num juízo de normalidade, enquanto gerente de uma Sociedade que pretenda concorrer a fornecimentos ao Estado ou Entidades Públicas em geral ter tal informação e tal situação ser certificada para ser excluído de concursos públicos, trará a situação de devedor cuja divulgação sem a prévia, rigorosa, segura e concludente averiguação do fundamento da reversão da execução contra o Recorrido é compressora de um seu direito constitucional.

Isso mesmo resulta cristalino do aresto do STA de 18.4.2007 a que se arrimou a sentença para decidir o pleito ao expender que «A divulgação dos nomes dos contribuintes faltosos, tendo em vista pressioná-los ao cumprimento, para desse modo evitarem a censura social que, supostamente, recai sobre quem não cumpre as suas obrigações fiscais, é um instrumento que, por constrangedor dos direitos consagrados pelo artigo 26°, n° 1, da Constituição, deve ser usado na limitada medida em que o sacrifício de tais direitos seja justificado pelos interesses colectivos - o direito à cobrança dos impostos -, e que as cautelas devem redobrar quando o visado não é o devedor principal. É que dificilmente se justifica uma pressão do mesmo grau para pagar impostos seus, reveladores da capacidade contributiva própria que legitima a sujeição a imposto, ou alheios. Tanto mais quando o suposto devedor (de segunda linha) não aceita a responsabilidade pelo pagamento que lhe é exigido, e está ainda no uso dos meios processuais que a lei lhe atribui para convencer da ausência dessa responsabilidade.

Se ninguém pode ser obrigado a pagar impostos cuja cobrança se não faça nos termos da lei (art°. 103.º, n.º 3 da Constituição), também não será legítimo o exercício, pela Administração, de meios tendentes a constranger alguém a pagar impostos que não são da sua originária responsabilidade, quando a respectiva obrigação esteja ainda em discussão perante os tribunais.

(…)

“ A inclusão de cada devedor na lista depende sempre da conclusão de um procedimento, com decisão de publicitação.

A publicitação dos devedores ocorre no final de um procedimento, no âmbito do qual a administração tributária analisa e verifica se estão reunidos os pressupostos legais da publicitação. Esses pressupostos são a existência de situação tributária não regularizada e terem decorrido os prazos de prestação de garantia ou tenha sido indeferida a sua dispensa, (v.d. anotação ao artigo 64º. Em Lei Geral Tributária - Comentada e Anotada, comentada por José Maria Fernandes Pires, Gonçalo Bulcão, José Ramos Vidal e Maria João Menezes. (pág. 723).

Apurando-se que a ATA não cumpriu as obrigações, a que estava adstrita, mormente, as de notificar o Recorrido / Reclamante para prestar garantia que suspendesse a execução e de averiguar e justificar o fundamento da Execução por Reversão que o reclamante pôs em causa pelo meio judicial legalmente consentido, não aguardando pela sua decisão com trânsito em julgado determinante da sua responsabilidade, corroborando o ponto de vista do recorrido, da sentença e do Ministério Público junto desta instância, notoriamente essas omissões e decisão de publicitação nos aludidos termos, violam as obrigações da Fazenda Nacional e o Direito Constitucional do Recorrido à preservação do seu bom nome, reputação e imagem, direito que claramente é violado com a decisão da sua inclusão na lista de devedores à Fazenda Nacional, direito dificilmente ou mesmo impossível de reparar, após violado.

Destarte, a sentença não é digna da censura que lhe vem dirigida pois interpretou e aplicou correctamente o Direito ao caso sub judice, anulando o despacho que ordenou a inclusão do nome do reclamante na Lista de Devedores Tributários, publicitada pela AT, tal acarretando a improcedência do recurso interposto e a integral manutenção da sentença recorrida na ordem jurídica.» (disponível em www.dgsi.pt/).

Acolhemos a argumentação jurídica constante do arresto acabado de transcrever, cujo entendimento perfilhamos e por as questões aqui em análise não deferirem, atento o disposto no artigo 8.º, n.º 3, do Código Civil, visando a interpretação e aplicação uniforme do direito, resta-nos remeter para o anteriormente decidido.

Por outro lado, não foram apresentados argumentos novos, que não tivessem sido ponderados nos acórdãos citados que justificassem a sua reapreciação.

Impõe-se, por último, que se aprecie da eventual relevância do fundamento da anulação do acto reclamado consubstanciado na falta de notificação do executado para prestar garantia, apreciado no acórdão do STA de 12/01/2022, tendo presente também o teor da declaração de voto.

De referir que no citado acórdão de 12/01/2022 não resultou provado que a Administração Tributária tenha notificado o revertido para prestar garantia, como a isso estava obrigada, nos termos do artigo 169.º, n.º 2 do CPPT, por força do disposto no n.º 5 da mesma norma (na redacção dada pelo artigo 37.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30/12).

Na situação dos presentes autos, resultou provado que o Reclamante não apresentou garantia ou requereu pedido de dispensa de garantia na execução fiscal.

Considerando a data em que a oposição foi deduzida (2015), o artigo 169.º do CPPT tinha a redacção introduzida pela Lei n.º 66-B/2012, de 31/12, por força da qual se deixou de impor à Adminstração Tributária a notificação do executado para prestar garantia. De acordo com o preceituado no n.º 2 desta norma competia ao Oponente apresentar requerimento para prestação de garantia ou a sua dispensa (cfr. artigos 169.º, n.ºs 1 a 7 e 10 e 170.º, ambos do CPPT).

No caso em apreço, o acto reclamado nunca poderia ser anulado com fundamento na falta de notificação para prestação de garantia.

Com o devido respeito por opinião contrária, a falta de prestação de garantia ou o indeferimento da sua dispensa para suspender a execução fiscal, em face do regime actualmente aplicável ao caso dos autos em que está em causa um revertido que deduziu oposição à execução fiscal, apenas permitem à ATA proceder à penhora de bens do executado, sendo totalmente inócuos para efeitos de incluir o revertido, que deduziu oposição, na lista de devedores.

Não será demais realçar que os pressupostos para a publicitação de lista de devedores são a existência de situação tributária não regularizada (o conceito de situação tributária regularizada foi alterado com efeitos a partir de 01/01/2015) e terem decorrido os prazos de prestação de garantia ou tenha sido indeferida a sua dispensa, desde a alteração ao artigo 64.º, n.ºs 5, alínea a) e 6 da LGT, introduzida pela Lei n.º 60-A/2005, mas no que respeita a um revertido que tenha deduzido oposição à excução fiscal, no âmbito da qual está em discussão a sua obrigação pelo pagamento da divida exequenda, como se escreveu no acórdão do STA de 12/01/2022 «a questão controvertida não deve ser decidida tendo apenas por fundamento a estrita literalidade dos preceitos legais aplicáveis, mas antes buscando uma interpretação sistemática das normas, ou seja, tendo por base a unidade do sistema jurídico, nos termos do artigo 9.º, n.º 1 do Código Civil.»

Como se deixou expresso no acórdão do STA de 18/04/2007, citando José Casalta Navais, aqui o executado não é um verdadeiro contribuinte, em sentido estrito, ou seja, em cuja esfera patrimonial ocorreu um facto revelador de capacidade contributiva; a reversão da execução fiscal trata-se de uma técnica tributária cujo objectivo é a cobrança do imposto de que outrem é devedor, técnica que pode afectar diversos princípios e preceitos constitucionais.

No último paragrafo do acórdão do STA de 12/01/2022, realçou-se, em termos de conclusão, os diversos comportamentos de incumprimento das obrigações a que a ATA estava adstrita, designadamente as de notificar o Recorrido /Reclamante para prestar garantia que suspendesse a execução.

Porém, tal fundamento, como já se dixou expresso não tem aplicação, nem no presente caso, nem a casos futuros, atenta a alteração legislativa operada.

Mas, todos os demais fundamentos de anulação do acto reclamado, mormente, o facto da ATA não «(…) averiguar e justificar o fundamento da Execução por Reversão que o reclamante pôs em causa pelo meio judicial legalmente consentido, não aguardando pela sua decisão com trânsito em julgado determinante da sua responsabilidade (…) omissões e decisão de publicitação nos aludidos termos, violam as obrigações da Fazenda Nacional e o Direito Constitucional do Recorrido à preservação do seu bom nome, reputação e imagem, direito que claramente é violado com a decisão da sua inclusão na lista de devedores à Fazenda Nacional.» são inteiramente transponíveis para o caso sub judice.

Entendemos, também, que a inclusão do nome do revertido na lista de devedores só poderá ocorrer depois de estar definitifivamente decidida a responsabilidade pelo pagamento da dívida exequenda, ou seja, só depois de confirmação judicial do despacho de reversão.

Não sendo o revertido o devedor principal da dívida exequenda e não aceitando a responsabilidade pelo pagamento que lhe está a ser exigido, por ter deduzido em tempo útil oposição à execução fiscal, onde discute a sua legitimidade substantiva, enquanto não for proferida decisão, com trânsito em julgado, a ATA não poderá publicitar o seu nome na lista de contribuintes cuja situação não se encontre regularizada, sob pena de violar o Direito Constitucional do Recorrido à preservação do seu bom nome, reputação e imagem (cfr. artigo 26.º, n.º da CRP).

Por último, mas não menos importante, o Reclamante não pode ser penalizado pelo facto de a oposição deduzida no ano de 2015 não se encontrar definitivamente decidida, prevendo o artigo 96.º, n.º 2 do CPPT, que o processo judicial tributário não deve ter duração acumulada superior a dois anos contados desde a data da respectiva instauração e a decisão proferida em 1.ª instância que lhe ponha termo.

O n.º 2, do artigo 96.º do CPPT visa favorecer a concretização do direito a decisão a obter, em prazo razoável, uma decisão que aprecie com força de caso julgado, a pretensão deduzida (cfr. artigo 97.º da LGT e 20.º, n.º 4 da CRP).

Concluindo, a AT deve aguardar pela decisão com transito em julgado da oposição à execução fiscal, independentemente de ter sido prestada garantia ou da dispensa da mesma no âmbito da execução fiscal, e só no caso de improcedência da oposição está autorizada a iniciar o procedimento em vista da inclusão do nome do devedor na lista de contribuintes cuja situação não se encontre regularizada, sob pena de violação do direito do Recorrido à preservação do seu bom nome.

Daí que na improcedência das conclusões da alegação da Recorrente, se impõe, nos termos acima expostos, confirmar a decisão ora sindicada.

Improcede, por conseguinte, o presente recurso jurisdicional


*

Conclusões/Sumário:

I. A doutrina e jurisprudência dominante, em que nos revemos, vem defendendo que o elenco das situações susceptíveis de causar prejuízos irreparáveis possam exorbitar as descritas nas alíneas do n.º 3, do artigo 278.º do CPPT, sendo inequívoco que a subida imediata, nos casos ali não previstos expressamente só poderá suceder, desde que se revele a possibilidade da ocorrência de prejuízos daquela natureza.

II. A subida imediata da reclamação judicial deduzida pelo revertido contra o despacho de inclusão do seu nome na lista de devedores tributários não tem efeito suspensivo da execução fiscal para cobrança do crédito tributário, uma vez que este procedimento tem natureza administrativa e decorre fora do processo de execução fiscal, e, por isso, não se verificam relativamente a essa reclamação as razões que determinaram o legislador a impor como regra geral a subida diferida da reclamação em sede de execução fiscal.

III. Como é consabido, a publicitação da lista de devedores constitui um instrumento de demonstração a toda a comunidade de contribuintes, não só do montante dos prejuízos resultantes do incumprimento das obrigações fiscais de pagamento de dividas fiscais, como também para dar conhecimento de quem são as pessoas contra as quais foi instaurada execução fiscal para pagamento coercivo de dividas fiscais e não têm a sua situação tributária regularizada.

IV. Não sendo o revertido o devedor principal da dívida exequenda e não aceitando a responsabilidade pelo pagamento que lhe está a ser exigido, por ter deduzido em tempo útil oposição à execução fiscal, onde discute a sua legitimidade substantiva, enquanto não for proferida decisão, com trânsito em julgado, a ATA não poderá publicitar o seu nome na lista de contribuintes cuja situação não se encontre regularizada, sob pena de violar o Direito Constitucional do Recorrido à preservação do seu bom nome, reputação e imagem (cfr. artigo 26.º, n.º da CRP).


*

IV – DECISÃO

Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da 1.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas a cargo da Recorrente.

Notifique.

Lisboa, 10 de Março de 2022.




Maria Cardoso – Relatora por vencimento
Catarina Almeida e Sousa – 2.ª Adjunta
Lurdes Toscano – Vencida conforme declaração infra

(assinaturas digitais)

Voto de Vencida

Contrariamente à posição que aqui logrou vencimento, concederia provimento ao recurso.
Está em causa a inclusão do reclamante na lista de devedores ao Estado.

Alega a recorrente que a prestação da garantia é imprescindível para a obtenção do efeito suspensivo da execução, sendo apenas dispensada nos casos previstos na lei (artigo 52°, n°4 da LGT e artigo 170° do CPPT). E que o que faz suspender a execução fiscal é a constituição de garantia idónea e suficiente e não a apresentação por si só do contencioso judicial. Conforme se pode verificar a fls. 2 da D. Sentença, consta da al. d) do ponto III. Da fundamentação de Facto que o reclamante não apresentou garantia ou requereu o pedido de dispensa de apresentação de garantia no PEF [conclusões de recurso N. e O.]

Vejamos.

O art. 64º da LGT, sob a epígrafe “Confidencialidade”, dispõe nos seus nºs 5 e 6, o seguinte:

5 - Não contende com o dever de confidencialidade:

(Redação da Lei n.º 60-A/2005, de 30 de dezembro)

a) A divulgação de listas de contribuintes cuja situação tributária não se encontre regularizada, designadamente listas hierarquizadas em função do montante em dívida, desde que já tenha decorrido qualquer dos prazos legalmente previstos para a prestação de garantia ou tenha sido decidida a sua dispensa; (Redação da Lei n.º 60-A/2005, de 30 de dezembro)

b) A publicação de rendimentos declarados ou apurados por categorias de rendimentos, contribuintes, sectores de actividades ou outras, de acordo com listas que a administração tributária deve organizar anualmente a fim de assegurar a transparência e publicidade. (Redação da Lei n.º 60-A/2005, de 30 de dezembro)

c) A notificação, pela administração tributária, de sujeito passivo que disponibilize uma interface eletrónica para efeitos de acionar a responsabilidade solidária deste. (Aditada pela Lei n.º 47/2020, de 24 de agosto)

6 - Para efeitos do disposto na alínea a) do número anterior, considera-se como situação tributária regularizada o disposto no artigo 177.º-A do CPPT. (Redação da Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro)

Para o caso aqui em apreço, interessa-nos, sobretudo, o disposto no art. 64º, nº 5, alínea a), bem como no nº 6 da mesma norma, da LGT.

Da referida norma resulta claro que não contende com o dever de confidencialidade a divulgação de listas de contribuintes cuja situação não se encontre regularizada, desde que já tenha decorrido qualquer dos prazos legalmente previstos para a prestação de garanta ou tenha sido decidida a sua dispensa.

Do que se acabou de escrever, ressalta desde logo a expressão contribuintes cuja situação não se encontre regularizada.

Importa, pois, aferir se o reclamante é, ou não, um contribuinte cuja situação não se encontra regularizada.

Na sentença recorrida, escreveu-se o seguinte:

«Ora, nos termos previstos no artigo 64.º, n.º 5, alínea a) da LGT, a Autoridade Tributária pode, sem quebra do dever de confidencialidade, proceder à divulgação de listas de contribuintes, cuja situação tributária não se encontre regularizada, designadamente listas hierarquizadas em função do montante em dívida, desde que já tenha decorrido qualquer dos prazos legalmente previstos para a prestação de garantia ou tenha sido decidida a sua dispensa.

Para efeitos do disposto na alínea a) do n.º 5, considera o n.º 6 do mesmo artigo 64.º da LGT que considera-se como situação tributária regularizada, para efeitos do disposto na alínea a) do número anterior, o pagamento integral de quaisquer tributos, a inexistência de situações de mora ou a sua regularização em conformidade com as disposições e plano previstos no Código de Procedimento e de Processo Tributário e demais legislação em vigor.

Portanto, “para este efeito, considerar-se-á que está regularizada a situação em todas as situações em que não puder instaurar-se ou continuar-se um processo de execução fiscal para cobrança coerciva, designadamente nos casos em que a execução fique suspensa nos termos do art. 169º do CPPT”.

Contudo, a pendência de oposição à execução fiscal em que se discute a verificação dos pressupostos da reversão contra o responsável subsidiário, obsta a que a Administração insira o seu nome na lista de contribuintes, cuja situação tributária não se encontra regularizada, ao abrigo da alínea a) do n.º 5 do artigo 64.º da Lei Geral Tributária, na redação da lei nº 60-A/2005, de 30/12

Verifica-se, pois, que a sentença recorrida seguiu o douto Acórdão do STA de 18/04/2007, Proc. 0242/07, proferido em data anterior às alterações legislativas introduzidas pela Lei nº 82-B/2014.

Ora, conforme supra citámos, o artigo 64º da LGT, o seu nº 6, passou a ter a nova redacção introduzida pela Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro, e passou a dispor que:

Para efeitos do disposto na alínea a) do número anterior, considera-se como situação tributária regularizada o disposto no artigo 177.º-A do CPPT.

Por sua vez, o art. 177º-A do CPPT (Aditado pelo artigo 223.º da Lei n.º 82-B/2014, de 31/12), dispõe que:


Situação tributária regularizada

1 - Considera-se que o contribuinte tem a situação tributária regularizada quando se verifique um dos seguintes requisitos:


a) Não seja devedor de quaisquer impostos ou outras prestações tributárias e respetivos juros;

b) Esteja autorizado ao pagamento da dívida em prestações, desde que exista garantia constituída, nos termos legais;


c) Tenha pendente meio de contencioso adequado à discussão da legalidade ou exigibilidade da dívida exequenda e o processo de execução fiscal tenha garantia constituída, nos termos legais;
(Redação da Lei n.º 7-A/2016 de 30 de março)


d) Tenha a execução fiscal suspensa, nos termos do n.º 2 do artigo 169.º, havendo garantia constituída, nos termos legais.


2 - À constituição de garantia é equiparada, para estes efeitos, a sua dispensa e a sua caducidade.

Aqui chegados, retornemos ao caso concreto.

Conforme probatório, o reclamante deduziu oposição ao processo de execução fiscal n.ºs 32391999…… e apensos, onde se discute, além do mais, os pressupostos da sua responsabilização subsidiária, processo que corre termos no Tribunal Tributário de Lisboa com o n.º 1219/15.5BEAVR e no mesmo ainda não foi proferida sentença, sendo que nos processos de execução fiscal identificados nos autos, o reclamante não apresentou garantia ou requereu pedido de dispensa de garantia, pelo que os mesmos não se encontram suspensos.

Ora, perante esta factualidade forçoso é concluir que nos termos do art. 177º-A, do CPPT, o reclamante não se pode considerar um contribuinte com a situação tributária regularizada, uma vez que não se verifica nenhum dos requisitos nele elencados.

Não podemos olvidar que, muito recentemente, foi apreciado e decidido no STA, um Acórdão datado de 12/01/2022, Proc. 01457/21.1BELRS, disponível em www.dgsi.pt., onde em caso semelhante foi dada razão ao reclamante.

No entanto, embora no referido Acórdão se tenha escrito que:

«Por esse prisma e porque o ora reclamante deitou mão, em tempo útil, dos meios processuais próprios para defesa da sua posição que passava por discutir a sua responsabilidade subsidiária e não tendo obtido decisão, transitada em julgado, sobre tal questão, não pode ser penalizado pelo facto de tal litígio não se encontrar resolvido. Considerando, para além do mais, que o artigo 96.º, n.º2 do CPPT prevê não dever o processo judicial tributário ter duração acumulada superior a dois anos contados entre a data da respectiva instauração e a da decisão proferida em 1.ª instância.»

Entende-se que a decisão final do referido Acórdão prendeu-se com o facto de, naquele caso concreto, estar comprovado que o responsável subsidiário não foi notificado, pelo órgão de execução fiscal para, querendo, prestar garantia, capaz de suspender as execuções visadas pela oposição que deduziu, conforme se extrai do referido Acórdão onde se escreveu:

«Por último mas, cumpre enfatizar que do probatório, que não vem impugnado, consta como facto não provado que a AT haja notificado o reclamante para prestar garantia, visando a suspensão do processo de execução fiscal, obrigação a que estava expressamente adstrita por força do disposto no artigo 169.º, n.º2 do CPPT (na redacção vigente).»

Sendo que o mesmo se extrai da declaração de voto anexa ao Acórdão.

Ora, no caso concreto que aqui apreciamos, o art. 169º, nº 2 do CPPT, tem a redacção que lhe foi dada pela Lei nº 3-B/2010-28/04, e que dispõe da forma seguinte:

2 - A execução fica igualmente suspensa, desde que, após o termo do prazo de pagamento voluntário, seja prestada garantia antes da apresentação do meio gracioso ou judicial correspondente, acompanhada de requerimento em que conste a natureza da dívida, o período a que respeita e a entidade que praticou o acto, bem como a indicação da intenção de apresentar meio gracioso ou judicial para discussão da legalidade ou da exigibilidade da dívida exequenda. (Redação dada pela Lei n.º 3-B/2010-28/04)

Assim sendo, no presente caso, ao contrário do que acontecia no caso apreciado pelo douto Acórdão do STA que temos vindo a seguir, a AT não tinha a obrigação a que estava expressamente adstrita por força do disposto no artigo 169.º, n.º2 do CPPT (na redacção vigente) para notificar o reclamante para prestar garantia, visando a suspensão do processo de execução fiscal.

Deste modo, e tal como invoca a recorrente, entendemos que a prestação da garantia é imprescindível para a obtenção do efeito suspensivo da execução, e consequentemente, para o contribuinte ter a situação tributária regularizada.

Lisboa, 10 de Março de 2022


Lurdes Toscano