Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1216/22.4BEPRT
Secção:CT
Data do Acordão:03/14/2024
Relator:MARIA CARDOSO
Descritores:RECLAMAÇÃO DA DECISÃO DO ÓRGÃO DE EXECUÇÃO FISCAL
PRESCRIÇÃO
JUROS COMPENSATÓRIOS
Sumário:I - Não existe regime especial de prescrição quanto aos juros compensatórios, os quais se integram na própria dívida de imposto e nessa medida estão sujeitos ao regime de prescrição aplicável à divida do tributo em causa.
II - O efeito suspensivo da execução fiscal e, consequentemente, o efeito suspensivo da prescrição, é determinado pela instauração de reclamação, impugnação ou recurso, quando, acompanhada ou seguida da constituição ou prestação de garantia que garanta o pagamento da quantia exequenda e acrescido.
III - A paragem da reclamação graciosa, apresentada em 28/11/1996, por mais de um ano por facto que não é imputável ao contribuinte, determina que o prazo de prescrição volte a correr, ainda que exista garantia prestada na execução fiscal e o credor esteja impedido de cobrar coercivamente a dívida exequenda.
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contra-Ordenacionais
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
*

Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Subsecção Tributária das Execuções Fiscais e de Recurso Contraordenacionais da Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I - RELATÓRIO

1. A Autoridade Tributária e Aduaneira, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Juízo de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou procedente a reclamação deduzida por C…, S.A., contra o despacho proferido pela Directora Adjunta da Unidade dos Grandes Contribuintes em 11/02/2022, que, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 3344199601027689, que corre termos no Serviço de Finanças de Lisboa 11, indeferiu o pedido de reconhecimento da prescrição de dívida exequenda e acrescido relativa a juros compensatórios do IVA do ano de 1992 e a inexigibilidade de juros moratórios, no valor total de € 65.123,42, e, determinou a extinção do processo de execução fiscal supra identificado, com as demais consequências legais.

2. A Recorrente apresentou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

«a) Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a reclamação de atos do OEF e, em consequência, “determinou a extinção do processo de execução fiscal n.º 3344199601027689, com as demais consequências legais”.

b) A FP não pode concordar com tal decisão e nas razões que foram apresentadas para a justificar, tendo o tribunal, na sua perspetiva, errado quanto ao direito aplicável ao caso, nomeadamente os arts.º 43,º 48.º e 49.º da LGT, ao declarar a dívida exequenda ainda em dívida no PEF n.º 3344199601027689 prescritos.

c) A sentença assenta desde logo num pressuposto de que a dívida exequenda aqui em causa [juros compensatórios relativos ao período de 1992], tem contencioso associado.

d) Ora, tal facto não é sequer controvertido, como resulta das petições iniciais apresentadas pela ora Reclamante de que o que está em causa é o IVA de 1991 [incluindo, os juros compensatórios daquele período] e não os juros compensatórios do ano de 1992 e, por último, o próprio TCA Sul, no acórdão proferido no âmbito do processo 1575/05.3BELSB refere que o que está em causa é o IVA de 1991 [e não o de 1992].

e) Se estivesse em causa a legalidade dos juros compensatórios de 1992, não só o Tribunal teria analisado também a verificação da prescrição quanto àqueles ou só teria determinada a inutilidade superveniente da lide quanto a legalidade da dívida do IVA e juros compensatórios do ano de 1991 e continuado a lide relativamente à legalidade da dívida dos juros compensatórios do ano de 1992.

f) Assim, não havendo qualquer contencioso associado relativamente à dívida de juros compensatórios de 1992, o Tribunal a quo, não poderia ter analisado a prescrição daqueles tendo por base “os termos em que foi definida a situação que foi objeto da primeira decisão, por força do caso julgado”.

g) É que os juros compensatórios objeto da presente Reclamação i) não têm o mesmo prazo de prescrição do IVA de 1991, nem sendo o prazo inicial e final do respetivo prazo coincidente com o imposto de 1991 [pois dizem respeito ao período de 9203T e 9206T e não ao ano de 1991].

h) Não sendo os juros compensatórios de 1992 devidos pelo retardamento do imposto devido em 1991.

i) Assim, tomando por base a inexistência de contencioso associado à dívida exequenda em causa nos presentes autos, o prazo da prescrição deverá ser tomando por base o art.º 34.º do CPT e o art.º 48.º da LGT [que entrou em vigor em 1999/01/01.

j) Havendo concorrência temporal de dois prazos com a virtualidade de se aplicarem [como se verifica, in casu], decorre do n.º 1 do art.º 297.º do CC.

k) Depois, importa aferir da ocorrência de causas de suspensão ou interrupção da prescrição e quais os seus efeitos na situação concreta [já que, não havendo que contabilizar qualquer causa de interrupção ou suspensão da prescrição, esta ocorreria efetivamente em 1 de janeiro de 2003]

l) As causas de interrupção ou suspensão da prescrição atendíveis para o cômputo em concreto do prazo de prescrição são as previstas na lei vigente à data da respetiva ocorrência, em conformidade com o disposto no nº 2 do artigo 12º do CC, e não, as previstas na lei cujo prazo for aplicável, independentemente do momento em que tais factos se tenham efetivamente verificado.

m) De acordo com o quadro legal aplicável, sem contar com qualquer causa interruptiva e suspensiva da prescrição, considerando que em 1 de janeiro de 1999 [data da entrada em vigor da LGT], faltavam 4 anos para completar o prazo de prescrição, seria de aplicar o prazo de 10 anos do CPT, a contar de 1 de janeiro de 1993, de acordo com o n.º 1 do art.º 297.º do CC e o n.º 2 do art.º 34.º do CPT.

n) No entendo, da factualidade supra referida, verificamos que aconteceu um facto interruptivo [instauração da execução fiscal em 1996/12/13, conforme se pode ver pelo facto 9 do probatório].

o) E três factos suspensivos, consubstanciados na i) suspensão do PEF por via da dedução da reclamação graciosa, recurso hierárquico e da impugnação judicial e ii) suspensão decretada pelo n.º 3 do art.º 7.º e n.º 3 do 6.º B da lei n.º 1-A/2020 de 13 de Março, que institui as medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS- CoV-2 e da doença COVID-19 [de 13 de Março de 2020 (data em que entrou em vigor a Lei 16/2020) a 3 de junho de 2020 e desde 2 de janeiro de 2021 (data da produção de efeitos da Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro) até 5 de abril de 2021] e iii) suspensão nos termos da al. e) do n.º 4 do art.º 49.º da LGT, em virtude da pendência da presente reclamação dos atos do OEF [desde 2022/02/24]. p) Quanto aos efeitos da interrupção do prazo de prescrição, a lei tributária não os regula totalmente, devendo aplicar-se as regras gerais das obrigações previstas no CC nos termos da al. d) do art.º 2º da LGT.

q) Nos termos do n.º 1 do art.º 326º do CC, a interrupção tem como efeito a inutilização para a prescrição de todo o tempo decorrido anteriormente [efeito instantâneo], sendo que, nos termos do n.º 3 do art.º 34.º CPT, os efeitos da interrupção só cessavam em virtude da paragem do processo por período superior a um ano, por facto não imputável ao sujeito passivo, “somando-se neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação”.

r) Resulta dos autos que o processo de execução só esteve parado por ter sido determinada a suspensão do mesmo na sequência da apresentação da garantia por parte da Executada [por causa a si imputável], Pelo que, será de aplicar o efeito interruptivo da instauração da execução fiscal, não tendo o mesmo degradado em suspensivo, devendo ser-lhe atribuído efeito duradouro.

s) no caso concreto, a lei antiga [CPT] reconhece efeito interruptivo à instauração do processo de execução fiscal, efeito que não é reconhecido pela lei nova [LGT].

t) Sendo que, in casu, como já se deixou dito supra, o processo de execução fiscal esteve parado, mas por causa imputável à ora Reclamante [que requereu a suspensão dos autos].

u) Ora, socorrendo-nos das mui doutas palavras do Ilustre Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, na obra supra citada, pág. 106., “numa situação deste tipo [a execução foi instaurada e não parou por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte até à entrada da LGT], o prazo a aplicar é o da LGT, pois o período anterior à instauração foi eliminado pelo facto interruptivo (instauração da execução) e a pendência do processo, sem paragem por mais de um ano, obsta ao decurso da prescrição até à entrada em vigor daquela Lei”.

v) Assim, uma vez definido o início do prazo [1999/01/01] e o prazo de prescrição [8 anos], não tendo ocorrido causas de interrupção na vigência da lei nova, importa aferir da ocorrência de causas de suspensão e quais os seus efeitos na situação concreta.

w) Ocorreram três factos suspensivos, colocando-se mais uma vez uma questão de sucessão de leis no tempo, pois o prazo de prescrição só passou a suspender-se por via da dedução da reclamação graciosa, recurso hierárquico e da impugnação judicial [quando determinem a suspensão da cobrança da dívida] com a entrada em vigor da LGT [suspensão da prescrição que não estava prevista na vigência do CPT].

x) Ora, a suspensão do PEF foi determinada em 28/04/1997 [antes da entrada em vigor da LGT], no entanto, atenta à forma como a lei se expressa [elemento literal], verificamos que a norma atribui efeito suspensivo “enquanto não houver decisão definitiva ou transitada em julgado, que ponha termo ao processo, nos casos de reclamação, impugnação, recurso ou oposição, quando determinem a suspensão da cobrança da dívida”. y) Por força do art.º 12.º do CC, as normas tributárias contidas na LGT não se aplicam a factos e efeitos consumados no domínio da lei anterior; mas se essas normas definirem o conteúdo (ou efeitos) de relações jurídico-tributárias duradouras, sem referência ao facto que lhes deu origem, como se verifica no caso em apreço, elas vão aplicar-se não só às relações e situações jurídicas que se constituírem após a sua entrada em vigor, como, também, a todas aquelas que, constituídas antes, protelem a sua vida para além do momento da entrada em vigor da nova regra.

z) A norma do n.º 3 do art.º 49.º da LGT, que aditou a causa suspensiva do prazo de prescrição, não dispõe sobre as condições de validade formal ou substancial do facto tributário ou da respetiva obrigação, dispondo apenas sobre o conteúdo de situações jurídicas que, com base naqueles factos, se constituíram, pelo que nada obsta à sua aplicação às situações tributárias que subsistam à data da sua entrada em vigor.

aa) Assim, considerando que a lei nova veio atribuir efeito suspensivo à e sendo tal lei nova competente para regular a situação jurídica em curso de extinção, tal efeito suspensivo deve ser aplicado à contagem do prazo em análise, desde a data da entrada em vigor da lei nova, ou seja, desde 1 de janeiro de 1999.

bb) Situação análoga àquela que ocorreu pela introdução de uma nova causa de suspensão do prazo de prescrição consubstanciada pela existência de um inquérito criminal [causa de suspensão aditada pelo OE de 2013], tendo a jurisprudência entendido que, ainda que o inquérito criminal tenha sido instaurado em momento anterior à alteração legislativa, tal não invalida que tal circunstância [existência de um inquérito criminal] não tenha relevância no prazo em curso [claro está, somente desde a dada da entrada em vigor da lei], suspendendo-se o prazo de prescrição.

cc) Assim, considerando a suspensão operada pelo n.º 3 do art.º 49.º da LGT [atualmente, n.º 4], verificamos que, desde 1/01/1999, o prazo só voltou a correr após o trânsito em julgado do acórdão que decidiu o recurso apresentado FP [que ocorreu em 2021/06/11].

dd) Independentemente da dívida de 1992 não ter contencioso associado, pois a execução fiscal apresenta-se como um processo uno e não suscetível de ficar parcialmente suspenso e parcialmente não suspenso.

ee) Assim, não tendo a Reclamante optado por proceder ao pagamento por conta antes da extração da certidão de dívida e tendo solicitado a suspensão total do PEF, conclui-se que o disposto no nº 1 do citado art.º 169º do CPPT, deve interpretar-se no sentido de que os processos executivos em causa ficam suspensos até que sejam decididas as impugnações judiciais.

ff) A factualidade subjacente à decisão do TCA Sul relativa ao ano de 1911 é bem diferente da dos presentes autos [nomeadamente quanto aos factos interruptivos e suspensivos].

gg) Desde logo pelo facto de, nos presentes autos, só existir uma causa de interrupção [instauração da execução], não havendo competição com outras causas de interrupção [que ocorreram quanto à dívida de 1991, nomeadamente, reclamação graciosa, recurso hierárquico e impugnação judicial].

hh) Tendo tal causa de interrupção todos os efeitos no prazo de prescrição, pois ocorrendo várias causas de interrupção do prazo de prescrição, todas devem ser consideradas autonomamente.

ii) Acresce que, in casu, ao contrário do que sucedeu com a reclamação graciosa, recurso hierárquico e impugnação judicial, o processo de execução fiscal esteve parado, mas por causa imputável à Reclamante [que pediu a suspensão dos autos].

Sem prescindir,

jj) Mesmo que se entenda que a reclamação graciosa, o recurso hierárquico e/ou a impugnação judicial tinha por objeto a legalidade da dívida exequenda dos juros compensatórios de, sempre se dirá que, ainda assim, a dívida não estará prescrita.

kk) Pois, ao contrário do que se decidiu no acórdão proferido em 12 de maio de 2016 pelo TCASul [vide facto 48], não só deverá ser dada relevância à instauração da execução como se deixou dito supra [como causa interruptiva e suspensiva], como também à própria suspensão da prescrição por via da suspensão do PEF, que apesar de ter sido foi determinada em 28/04/1997 [antes da entrada em vigor da LGT], como se pode ver pelo facto 14 do probatório, atenta à forma como a lei se expressa [elemento literal], o efeito suspensivo é atribuído “enquanto não houver decisão definitiva ou transitada em julgado, que ponha termo ao processo, (…) quando determinem a suspensão da cobrança da dívida”, como se verifica, in casu.

ll) Estando, por via disso, o prazo suspenso desde a data da entrada em vigor da lei nova, ou seja, desde 1 de janeiro de 1999, até ao trânsito em julgado da decisão que pôs termo ao processo 1575/05.3BELRS [em 26 de maio de 2021, conforme se pode ver pelo facto 55 do probatório].

mm) De todo o exposto, entende a Fazenda Pública que a sentença aqui em escrutínio deverá ser revogada e substituída por decisão que declare a dívida exequenda não prescrita e, em consequência, julgue a reclamação improcedente.

Nestes termos e nos demais de Direito, deve ser dado provimento ao presente recurso por erro de julgamento, revogando-se a douta sentença recorrida, com as consequências legais.»

3. A Recorrida, C…, S.A., apresentou contra-alegações tendo concluído da seguinte forma:

«i. Ao invés do pretendido pela Recorrente, a prescrição da dívida exequenda afigura-se evidente não apenas face à qualificação jurídica utilizada pelo Tribunal a quo mas, igualmente, face à qualificação jurídica dada pela ora Recorrida – respaldada na factualidade assente.

ii. Face a tal factualidade, e inerente qualificação jurídica, a Recorrente limita-se a repisar o argumentário anteriormente aduzido pela AT, e, inclusivamente, pretende colocar em causa o decidido por acórdão deste Tribunal ad quem, com trânsito em julgado, quanto à prescrição da dívida de imposto e juros do ano de 1991 – como resulta evidente das conclusões jj) a mm).

iii. Cumpre fazer notar que a Recorrida (actualmente “C...”) não está em condições de asseverar os concretos motivos e circunstâncias pelos quais os representantes da empresa à data de 1996 (então “C… P…”) decidiram impugnar e garantir as liquidações em causa – porquanto o Grupo S…, onde se integra a Recorrida, adquiriu o negócio da grande distribuição do Grupo C… em Portugal, muito depois, em 27.07.2007.

iv. De resto, como ressuma dos autos, a Recorrida veio a ser confrontada com a suposta dívida de juros compensatórios do ano de 1992 através da reactivação do processo de execução fiscal, pela Unidade dos Grandes Contribuintes, já no ano de 2021.

v. O próprio Tribunal a quo o faz notar a páginas 17 da sentença:

- QUE na reclamação graciosa apresentada perante a AT, foi peticionada a anulação da liquidação de IVA do ano de 1991, bem como a liquidação de juros compensatórios dos anos de 1991 e 1992;

- QUE o recurso hierárquico, interposto do indeferimento da sobredita reclamação graciosa, pressupôs a manutenção integral da controvérsia quanto aos juros compensatórios de 1992, e;

- QUE a sequente impugnação judicial versa, como objecto mediato, as liquidações de IVA e juros antes mencionadas, e, como objecto imediato, o indeferimento parcial do recurso hierárquico.

vi. Em função das sobreditas premissas, o Tribunal a quo entende que a legalidade da liquidação de juros compensatórios integrou o objecto do contencioso tributário encetado a propósito da liquidação adicional de IVA também promovida pela AT.

vii. Consequentemente, por força da douta decisão proferida por este Tribunal ad quem no processo n.º 1575/05.3BERLSB, onde julgou pela prescrição do direito a exigir coercivamente o valor da aludida liquidação adicional, julga o Tribunal a quo pela prescrição do direito a exigir o valor da liquidação de juros compensatórios.

viii. Considerando que a liquidação de juros compensatórios integrou o sobredito contencioso tributário, não subsiste qualquer fundamento factual ou jurídico susceptível de abalar o julgamento feito por este Tribunal ad quem no douto acórdão de 12.05.2016.

ix. Sem prescindir, estando em causa uma prestação tributária do ano de 1992, o respectivo prazo de prescrição teve início em 01.01.1993, pelo que, pela aplicação das regras previstas no Código de Processo Tributário (considerando que a LGT entrou em vigor em 1999), o prazo legal de prescrição de 10 anos completou-se em 01.01.2003.

x. Em sentido diametralmente oposto ao pretendido pela Recorrente, a circunstância de a dívida de 1992 não ter sido litigada milita precisamente no sentido da prescrição da obrigação tributária.

xi. Conforme entendimento firmado por Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário de 21.01.2015, no recurso n.º 660/1, a mera prestação de uma garantia a que não esteja associado qualquer meio de reacção não releva para efeitos de prossecução da execução, nem impede a prática de atos coercivos (30-Cfr. Ac. STA de 20.02.2005, no rec. n.º 85/05, citado por Jorge Lopes de Sousa, CPPT Anotado, Áreas, Vol I, p. 181.) (31-Cfr. Ac. STA de 10.06.2016, dado no proc. n.º 0935/16).

xii. Em função do teor da reclamação graciosa que foi apresentada junto do Serviço Periférico Local de Lisboa, bem como do sequente recurso hierárquico interposto para a AT, incumbia ao órgão de execução fiscal aferir, como o faz agora a destempo, que o meio de reacção apresentado conjuntamente com a garantia “não tinha por objecto a contestação da liquidação de 1992”.

xiii. Tal constatação conduziria à consolidação da liquidação no ordenamento jurídico, atento o princípio da definitividade dos acto tributários, plasmado no artigo 60.º do CPPT, e, na medida em que não existia meio de reacção associado à garantia, a AT não estava legalmente impedida de prosseguir a cobrança coerciva da liquidação em causa.

xiv. Ainda que a instauração da execução em 30.12.1996 tenha interrompido a contagem do prazo prescricional, a circunstância de à data da prestação da garantia, em 23.04.1997, não existir qualquer contencioso associado à liquidação exequenda acarretou a evidente cessação do efeito interruptivo da prescrição,

xv. Sem prescindir, ainda que assim não se entendesse – o que não se concede - sempre deveria este Tribunal ad quem conhecer de matéria cujo conhecimento, no julgamento empreendido, o Tribunal a quo considerou estar prejudicado.

xvi. No despacho impugnado, entende a AT que a tendo a contagem de juros de mora findado legalmente em 16.11.2001, tal contagem retomou onze anos depois por força do artigo 44.º n.º 2 da LGT com a redação dada pela Lei n.º 64-B/2011, entrada em vigor em 01.01.2012.

xvii. Para tanto, baseia-se a AT em doutrina administrativa veiculada através do Ofício Circulado n.º 60 086/2012 - que não é lei, não tem força de lei e introduz uma norma jurídica inovadora e, portanto, ilegal (32-Cfr. Ac. do TCAN de 15.01.2015, proc. n.º 00946/09.0BEPRT).

xviii. É certo que a redacção em causa do artigo 44.º n.º 2 da LGT aplica-se, por força do disposto no artigo 151.º n.º 2 da Lei n.º 64-B/2011, de 30.12, a todos os processos de execução fiscal que se encontrassem pendentes à data de entrada em vigor da lei.

xix. Todavia, como é evidente, a aludida alteração legislativa não pode aplicar-se retroactivamente a processos executivos onde já se havia completado o prazo legal de contagem de juros de mora.

xx. A aplicação de lei nova aos efeitos de uma relação constituída e sedimentada ao abrigo da lei antiga, representa uma nova valoração do facto passado que, portanto, tem carácter marcadamente retroactivo.

xxi. A aplicação do artigo 44.º n.º 2 da LGT aos processos executivos pendentes à data de entrada em vigor da norma, tinha como óbvio pressuposto o estabelecimento de uma regra aplicável aos juros moratórios em curso de contagem e não a reactivação retroactiva da contagem de juros moratórios que, nos termos da lei, já havia cessado há mais de onze anos atrás (!).

xxii. Segundo o critério de inadequação constata-se que, na dimensão normativa atribuída, a regulamentação do artigo 44.º n.º 2 da LGT é absolutamente desconforme ao fim visado porquanto o referencial de cômputo da mora não tem qualquer relação ou nexo de imputação a um comportamento ou acção do devedor tributário.

xxiii. Está preenchida a dimensão da desnecessidade, porquanto se afigura evidente a existência de meio adequado alternativo para alcançar o fim visado – com a devida ponderação dos interesses em causa, seja do devedor como do credor – constituído pelo estabelecimento de um limite ao vencimento dos juros moratórios consonante com um prazo razoável para resolução do procedimento e/ou processo tributário (cfr. artigo 96.º n.º 2 do CPPT).

xxiv. Mostra-se preenchida a dimensão de desproporcionalidade, no sentido de inadequação entre o fim visado e a imposição tributária, face à total inexistência de uma qualquer relação entre o vencimento de juros moratórios, na sua estrita configuração pelo legislador, e o pressuposto do atraso no cumprimento da obrigação tributária.

xxv. No caso concreto, como se dá nota nos pontos 16, 18 e 26 da matéria assente, o procedimento administrativo não teve qualquer tramitação por diversos anos, e também, de acordo com os factos provados nos pontos 46 e 51 da matéria assente, o mesmo sucedeu com o processo judicial.

xxvi. Daí que, no caso em apreço, as liquidações exequendas foram emitidas no ano de 1996 e a Recorrente apenas veio a obter uma decisão definitiva, já em sede judicial, volvidos vinte e cinco anos (!).

xxvii. Ter-se-á de concluir pela inconstitucionalidade material do artigo 44.º n.º 2 da LGT, na interpretação e aplicação segundo a qual o acesso às garantias constitucionais de defesa contra actos administrativos tributários considerados ilegais acarreta o vencimento de juros moratórios sem qualquer limite - por violação do princípio da proporcionalidade.

xxviii. Quando confrontado com uma liquidação adicional de imposto, e vendo-se na contingência de suspender a sua cobrança coerciva, quando o Contribuinte opta pela prestação de garantia seguramente pondera que continuariam a vencer-se juros moratórios, independentemente do processo executivo se encontrar suspenso no decurso do meio de reacção, mas igualmente considera, nesse mesmo momento, que a divida tributária venceria juros de mora com o limite legal de três anos.

xxix. É necessário ter em conta que, quando os contribuintes tomam decisões e definem rumos, fazem-no tendo em conta o concreto enquadramento factual e jurídico dessas decisões no seu preciso momento, projectado para o futuro os resultados e consequências que legitimamente podem antever, face às circunstâncias em que tomaram aquelas decisões.

xxx. Nestes termos, considerando, como fez o Tribunal a quo, que a dívida de juros compensatórios constituiu objecto do litígio tributário, com suspensão da execução fiscal mediante a prestação de garantia, afigura-se por demais evidente que, na interpretação e aplicação pretendida pela AT, o artigo 44.º n.º 2 da LGT seria materialmente inconstitucional por violação dos princípios da confiança e segurança e jurídicas.

TERMOS EM QUE, com a falta de provimento do presente recurso, deve a Douta sentença recorrida manter-se nos seus precisos termos - assim se cumprindo a Lei e se fazendo JUSTIÇA!»


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3. Recebidos os autos neste Tribunal Central Administrativo Sul, e dada vista ao Exmo. Procurador-Geral Adjunto, pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso.

4. Com dispensa dos vistos legais, atenta a natureza urgente do processo (artigo 657.º, n.º 4 do CPC e artigo 278.º, n.º 6 do CPPT), vêm os autos à Conferência para julgamento do recurso.


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II – QUESTÕES A DECIDIR:

O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, como resulta dos artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.

Assim, considerando o teor das conclusões apresentadas, importa apreciar e decidir se a sentença enferma de erro de julgamento, no respeitante à questão da prescrição da dívida exequenda de juros compensatórios do ano de 1992.


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III - FUNDAMENTAÇÃO

1. DE FACTO

A sentença recorrida proferiu a seguinte decisão relativa à matéria de facto:

«1) A sociedade “C… (P…) – S… CENTROS COMERCIAIS, S.A.”, atualmente designada por “C…, S.A.”, é titular do número de identificação fiscal 5… (cfr. informação pública disponível no sítio da internet https://publicacoes.mj.pt/pesquisa.aspx);

2) Em 24 de junho de 1996, a DIREÇÃO-GERAL DE CONTRIBUIÇÕES E IMPOSTOS emitiu a liquidação do Imposto sobre o Valor Acrescentado n.º 96077358, no montante de 22.085.584 escudos, bem como as liquidações de juros compensatórios n.ºs 96077355, 96077356 e 96077357, nos montantes, respetivamente, de 3.202.166 escudos, 8.675.372 escudos e 4.380.702 escudos (cfr. documentos em fls. 6, 9, 10 e 11 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos);

3) Em 16 de novembro de 1996, o DIRETOR-GERAL DAS CONTRIBUIÇÕES E IMPOSTOS emitiu “Certidão de Dívida” com o n.º 960144904, a qual se dá integralmente por reproduzida e nos termos da qual certifica que a sociedade mencionada no parágrafo 1) acima é devedora da importância de 3.202.166 escudos [€ 15.972,34], respeitante a juros compensatórios (n.º de liquidação 96077355 – ano 1991 – período 9106T), cujo termo do prazo para pagamento voluntário terminou em 31 de agosto de 1996, incidindo “[s]obre a importância desta liquidação (…) juros de mora, contados desde a data de emissão desta certidão de dívida até à data do pagamento” (cfr. documento em fls. 2 do processo de execução fiscal apenso aos autos);

4) Em 16 de novembro de 1996, o DIRETOR-GERAL DAS CONTRIBUIÇÕES E IMPOSTOS emitiu “Certidão de Dívida” com o n.º 960144905, a qual se dá integralmente por reproduzida e nos termos da qual certifica que a sociedade mencionada no parágrafo 1) acima é devedora da importância de 8.675.372 escudos [€ 43.272,57], respeitante a juros compensatórios (n.º de liquidação 96077356 – ano 1992 – período 9203T), cujo termo do prazo para pagamento voluntário terminou em 31 de agosto de 1996, incidindo “[s]obre a importância desta liquidação (…) juros de mora, contados desde a data de emissão desta certidão de dívida até à data do pagamento” (cfr. documento em fls. 3 do processo de execução fiscal apenso aos autos);

5) Em 16 de novembro de 1996, o DIRETOR-GERAL DAS CONTRIBUIÇÕES E IMPOSTOS emitiu “Certidão de Dívida” com o n.º 960144906, a qual se dá integralmente por reproduzida e nos termos da qual certifica que a sociedade mencionada no parágrafo 1) acima é devedora da importância de 4.380.702 escudos [€ 21.850,85], respeitante a juros compensatórios (n.º de liquidação 96077357 – ano 1992 – período 9206T), cujo termo do prazo para pagamento voluntário terminou em 31 de agosto de 1996, incidindo “[s]obre a importância desta liquidação (…) juros de mora, contados desde a data de emissão desta certidão de dívida até à data do pagamento” (cfr. documento em fls. 4 do processo de execução fiscal apenso aos autos);

6) Em 16 de novembro de 1996, o DIRETOR-GERAL DAS CONTRIBUIÇÕES E IMPOSTOS emitiu “Certidão de Dívida” com o n.º 960144907, a qual se dá integralmente por reproduzida e nos termos da qual certifica que a sociedade mencionada no parágrafo 1) acima é devedora da importância de 22.085.584 escudos [€ 110.162,43], respeitante a Imposto sobre o Valor Acrescentado (n.º de liquidação 96077358 – ano 1991 – período 91), cujo termo do prazo para pagamento voluntário terminou em 31 de agosto de 1996, incidindo “[s]obre a importância desta liquidação (…) juros de mora, contados desde a data de emissão desta certidão de dívida até à data do pagamento” (cfr. documento em fls. 5 do processo de execução fiscal apenso aos autos);

7) Em 28 de novembro de 1996, a sociedade mencionada no parágrafo 1) acima apresentou escrito, o qual se dá integralmente por reproduzido, pelo qual reclama da liquidação efetuada, na sequência da notificação para pagamento do Imposto sobre o Valor Acrescentado, no montante de 22.085.584 escudos, bem como de juros compensatórios no valor de 16.258.240 escudos, pedindo, a final, a anulação da “(…) liquidação adicional efectuada, relativa ao IVA, do ano de 1991, bem como dos juros compensatórios” (cfr. documento em fls. 2 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos);

8) Por referência à reclamação mencionada no parágrafo anterior, foi autuado o respetivo processo em 10 de dezembro de 1996 (cfr. documento em fls. 1 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos);

9) A REPARTIÇÃO DE FINANÇAS DO 11.º BAIRRO FISCAL DE LISBOA, tendo por base as certidões de dívida mencionadas nos parágrafos 3) a 6) acima, instaurou o processo de execução fiscal n.º 3344199601027689 (cfr. documento em fls. 1 do processo de execução fiscal apenso aos autos);

10) Em 26 de dezembro de 1996, a REPARTIÇÃO DE FINANÇAS DO 11.º BAIRRO FISCAL DE LISBOA elaborou “CITAÇÃO”, a qual se dá integralmente por reproduzida, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 3344199601027689, dirigida à sociedade mencionada no parágrafo 1) acima (cfr. documento em fls. 6 do processo de execução fiscal apenso aos autos);

11) A “CITAÇÃO” mencionada no parágrafo anterior foi remetida por carta registada com aviso de receção, a qual foi rececionada em 30 de dezembro de 1996 (cfr. documento em fls. 7 e 8 do processo de execução fiscal apenso aos autos);

12) Em 24 de abril de 1997, a sociedade mencionada no parágrafo 1) acima apresentou um escrito, o qual se dá integralmente por reproduzido, dirigido ao CHEFE DA REPARTIÇÃO DE FINANÇAS DO 11.º BAIRRO FISCAL DE LISBOA, no qual se peticiona que este “(…) se digne informar qual o valor da garantia bancária a prestar pelo ora requerente, no processo de execução fiscal n° 3344961027689, para promover a suspensão do mesmo, na medida em que, se encontra para despachar a reclamação apresentada junto da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, em Janeiro de 1997 (…)” (cfr. documento em fls. 12 do processo de execução fiscal apenso aos autos);

13) Em 28 de abril de 1997, deu entrada na REPARTIÇÃO DE FINANÇAS DO 11.º BAIRRO FISCAL DE LISBOA a GARANTIA BANCÁRIA N.º D.8802, emitida pelo BANCO I…, S.A., datada de 23 de abril de 1997, a qual se dá integralmente por reproduzida e na qual se pode ler que “(…) se destina a garantir o processo nº. 3344961027689 (IVA) (…)” (cfr. documento em fls. 14 do processo de execução fiscal apenso aos autos);

14) Em 28 de abril de 1997, por despacho do CHEFE DA REPARTIÇÃO DE FINANÇAS DO 11.º BAIRRO FISCAL DE LISBOA, foi deferida a suspensão do processo de execução fiscal mencionado no parágrafo 9) acima (cfr. documento em fls. 16 do processo de execução fiscal apenso aos autos);

15) Em 30 de maio de 1997, foi elaborado “TERMO DE REMESSA” do processo de reclamação graciosa mencionado no parágrafo 8) acima para a DIREÇÃO DE FINANÇAS DO DISTRITO DE LISBOA (cfr. documento em fls. 39/verso do processo de reclamação graciosa apenso aos autos);

16) Não foi praticado qualquer ato pelos Serviços no procedimento de reclamação graciosa entre 31 de maio de 1997 e 20 de setembro de 1999 (cfr. documentos em fls. 39/verso e 40 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos);

17) Em 21 de setembro de 1999, foi elaborado o Ofício n.º 25405, pelo DIRETOR DE FINANÇAS ADJUNTO DA 2.ª DIREÇÃO DE FINANÇAS DE LISBOA, o qual se dá integralmente por reproduzido (cfr. documento em fls. 40 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos);

18) Não foi praticado qualquer ato pelos Serviços no procedimento de reclamação graciosa entre 22 de setembro de 1999 e 7 de agosto de 2001 (cfr. documentos em fls. 40 e 45 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos);

19) Em 8 de agosto de 2001, a DIREÇÃO DE SERVIÇOS DE PREVENÇÃO E INSPEÇÃO TRIBUTÁRIA, no âmbito do processo de reclamação graciosa mencionado no parágrafo 8) acima, elaborou Informação, a qual se dá integralmente por reproduzida (cfr. documento em fls. 43 a 45 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos);

20) Em 10 de setembro de 2001, foi elaborado o Ofício n.º 02835, pelo DIRETOR DE SERVIÇOS DA DIREÇÃO DE SERVIÇOS DE PREVENÇÃO E INSPEÇÃO TRIBUTÁRIA, o qual se dá integralmente por reproduzido e que deu entrada na 2.º DIREÇÃO DE FINANÇAS DE LISBOA em 12 de setembro de 2001 (cfr. documento em fls. 42 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos);

21) Em 5 de novembro de 2001, foi proferido Despacho pelo DIRECTOR DE FINANÇAS ADJUNTO a determinar a notificação para audição prévia (cfr. documento em fls. 57 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos);

22) Em 28 de novembro de 2001, deu entrada na 2.ª DIREÇÃO DE FINANÇAS DE LISBOA um escrito designado por “Direito de Audição”, elaborado pela sociedade mencionada no parágrafo 1) acima, o qual se dá integralmente por reproduzido (cfr. documento em fls. 64 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos);

23) Em 6 de fevereiro de 2002, foi proferido Despacho pelo DIRETOR DE FINANÇAS a indeferir o peticionado na “reclamação” mencionada no parágrafo 7) acima (cfr. documento em fls. 169 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos);

24) Em 22 de março de 2002, deu entrada, na REPARTIÇÃO DE FINANÇAS DO 11.º BAIRRO FISCAL DE LISBOA, um escrito designado por “Recurso Hierárquico”, o qual se dá integralmente por reproduzido, por referência ao despacho de indeferimento mencionado no parágrafo anterior (cfr. documento em fls. 178 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos);

25) Em 6 de maio de 2002, foi elaborado o Ofício n.º 13849, pela DIRETORA DE FINANÇAS ADJUNTA DA 2.ª DIREÇÃO DE FINANÇAS DE LISBOA, o qual se dá integralmente por reproduzido e pelo qual se remete, para apreciação, ao DIRETOR DA DIREÇÃO DE SERVIÇOS DO IVA, “(…) o Recurso Hierárquico n.º 47/02, incorporado no processo de Reclamação Graciosa nº 400270.9/96, de IVA de 1991 (…)” (cfr. documento em fls. 195 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos);

26) Não foi praticado qualquer ato pelos Serviços no procedimento entre 7 de maio de 2002 e 19 de janeiro de 2004 (cfr. documentos em fls. 195 e 203 a 211 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos);

27) Em 20 de janeiro de 2004, foi elaborada Informação pela DIREÇÃO DE FINANÇAS DE LISBOA, por referência ao “Recurso Hierárquico” mencionado no parágrafo 24) acima, a qual se dá integralmente por reproduzida (cfr. documento em fls. 203 a 211 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos);

28) Em 20 de agosto de 2004, a CHEFE DE DIVISÃO DA DIREÇÃO DE SERVIÇOS DO IVA confirmou a Informação elaborada nessa Direção (cfr. documento em fls. 202 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos);

29) Em 6 de janeiro de 2005, por Despacho do SUBDIRETOR-GERAL DOS IMPOSTOS, foi parcialmente deferido o “Recurso Hierárquico” mencionado no parágrafo 24) acima (cfr. documento em fls. 201 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos);

30) Em 16 de março de 2005, foi elaborado o Ofício n.º 831, dirigido à sociedade mencionada no parágrafo 1) acima, nos termos do qual se comunica a decisão mencionada no parágrafo anterior, o qual foi recebido em 18 de março de 2005 (cfr. documentos em fls. 213 e 214 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos);

31) Em 16 de junho de 2005, a sociedade mencionada no parágrafo 1) acima remeteu, ao TRIBUNAL ADMINISTRATIVO E FISCAL DE LISBOA, Impugnação Judicial, a qual se dá integralmente por reproduzida, da decisão que recaiu sobre o “Recurso Hierárquico” mencionada no parágrafo 29) acima, peticionando-se, a final, a anulação da “(…) liquidação efectuada pelos serviços em sede de IVA de 1991, com todas as consequências legais daí advindas” (cfr. documentos em fls. 3 e 25 do processo n.º 1575/05.3BELSB);

32) A Impugnação Judicial mencionada no parágrafo anterior correu termos sob o número de processo 1575/05.3BELSB (cfr. documento em fls. 1 do processo n.º 1575/05.3BELSB);

33) Em 8 de fevereiro de 2006, foi aberta conclusão no processo mencionado no parágrafo anterior (cfr documento em fls. 39 do processo n.º 1575/05.3BELSB);

34) Entre 9 de fevereiro de 2006 e 21 de fevereiro de 2007, não foi praticado qualquer ato no processo mencionado no parágrafo 32) acima (cfr. documento em fls. 39 do processo n.º 1575/05.3BELSB);

35) Em 22 de fevereiro de 2007, foi proferido despacho no processo mencionado no parágrafo 32) acima (cfr documento em fls. 39 do processo n.º 1575/05.3BELSB);

36) Em 30 de abril de 2007, foi proferido despacho no processo mencionado no parágrafo 32) acima (cfr documento em fls. 42 do processo n.º 1575/05.3BELSB);

37) Em 7 de setembro de 2007, foi aberta conclusão no processo mencionado no parágrafo 32) acima (cfr documento em fls. 54 do processo n.º 1575/05.3BELSB);

38) Em 2 de julho de 2008, foi proferido despacho no processo mencionado no parágrafo 32) acima (cfr documento em fls. 55 do processo n.º 1575/05.3BELSB);

39) Em 4 de setembro de 2008, foi aberta conclusão no processo mencionado no parágrafo 32) acima (cfr documento em fls. 59 do processo n.º 1575/05.3BELSB);

40) Entre 5 de setembro de 2008 e 29 de setembro de 2011, não foi praticado qualquer ato no processo mencionado no parágrafo 32) acima (cfr. documentos em fls. 59 e 62 do processo n.º 1575/05.3BELSB);

41) Em 30 de setembro de 2011, foi proferido despacho no processo mencionado no parágrafo 32) acima (cfr. documento em fls. 62 do processo n.º 1575/05.3BELSB);

42) Em 28 de fevereiro de 2012, foi proferida sentença no processo mencionado no parágrafo 32) acima (cfr documento em fls. 68 do processo n.º 1575/05.3BELSB);

43) Em 26 de abril de 2012, foi admitido o Recurso, interposto pela sociedade mencionada no parágrafo 1) acima, da sentença mencionada no parágrafo anterior (cfr. documento em fls. 102 do processo n.º 1575/05.3BELSB);

44) Em 20 de dezembro de 2012, os autos provenientes do TRIBUNAL TRIBUTÁRIO DE LISBOA foram distribuídos no TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL sob o n.º 06266/12 (cfr. documento em fls. 134 do processo n.º 1575/05.3BELSB);

45) Em 5 de março de 2013, foi aberta conclusão no processo mencionado no parágrafo anterior (cfr. documento em fls. 140v do processo n.º 1575/05.3BELSB);

46) Entre 6 de março de 2013 e 17 de junho de 2015, não foi praticado qualquer ato no processo mencionado no parágrafo 44) acima (cfr. documentos em fls. 140v e 142 do processo n.º 1575/05.3BELSB);

47) Em 18 de junho de 2015, foi proferido um despacho no processo mencionado no parágrafo 44) acima (cfr. documento em fls. 142 do processo n.º 1575/05.3BELSB);

48) Em 12 de maio de 2016, foi proferido acórdão pelo TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL, o qual se dá integralmente por reproduzido e no qual, concluindo-se pela prescrição do IVA de 1991, concedeu-se “(…) provimento ao recurso e em consequência [julgou-se] extinta a presente instância, por inutilidade superveniente da lide” (cfr. documento em fls. 144 do processo n.º 1575/05.3BELSB);

49) Em 31 de maio de 2016, deu entrada no TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL um requerimento de interposição de Recurso, quanto à condenação em custas, pela FAZENDA PÚBLICA, do acórdão mencionado no parágrafo anterior (cfr. documento em fls. 170 do processo n.º 1575/05.3BELSB);

50) Em 7 de julho de 2016, foi aberta conclusão no processo n.º 06266/12 (cfr. documento em fls. 173 do processo n.º 1575/05.3BELSB);

51) Entre 8 de julho de 2016 e 21 de maio de 2019, não foi praticado qualquer ato no processo mencionado no parágrafo anterior (cfr. documentos em fls. 173 e 174 do processo n.º 1575/05.3BELSB);

52) Em 22 de maio de 2019, foi admitido o Recurso mencionado no parágrafo 49) acima (cfr. documento em fls. 174 do processo n.º 1575/05.3BELSB);

53) Em 4 de julho de 2019, foi aberta conclusão no processo n.º 06266/12 (cfr. documento em fls. 187 do processo n.º 1575/05.3BELSB);

54) Em 17 de setembro de 2020, o TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL proferiu acórdão, o qual se dá integralmente por reproduzido, nos termos do qual rejeitou o pedido de reforma do acórdão quanto a custas (cfr. documento em fls. não numeradas do processo n.º 1575/05.3BELSB);

55) Em 26 de maio de 2021, o SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO proferiu acórdão, o qual se dá integralmente por reproduzido e nos termos do qual se decidiu julgar findo o recurso (cfr. documento em fls. não numeradas do processo n.º 1575/05.3BELSB);

56) Em 27 de setembro de 2021, por Despacho da DIRETORA ADJUNTA DA JUSTIÇA TRIBUTÁRIA DA UNIDADE DOS GRANDES CONTRIBUINTES, proferido no âmbito do processo de execução fiscal mencionado no parágrafo 9) acima, a concordar com a Informação e Parecer dos Serviços, os quais se dão integralmente por reproduzidos, foi, entre o mais, reconhecida a prescrição das dívidas tributárias resultantes das certidões de dívida mencionadas nos parágrafos 3) e 6) acima, afirmando-se que, “relativamente aos Juros compensatórios de IVA do período de 1992 [que] não há evidência de qualquer contencioso associado ou pagamento efetuado, concluindo-se, por isso, que a dívida de juros compensatórios do período de 1992-01-01 a 1992-12-31, no valor de 43.272,57 € e do período de 1992-04-01 a 1992-06-30, no valor de 21.850,85 €, é exigível” (cfr. documento em fls. 187 do processo de execução fiscal apenso aos autos);

57) Em 9 de novembro de 2021, a sociedade mencionada no parágrafo 1) acima, apresentou, junto da UNIDADE DOS GRANDES CONTRIBUINTES, um escrito, no âmbito do processo de execução fiscal mencionado no parágrafo 9) acima, o qual se dá integralmente por reproduzido (cfr. documento em fls. 265 do processo de execução fiscal apenso aos autos);

58) Em 11 de fevereiro de 2022, foi proferido Despacho pela DIRETORA ADJUNTA DA JUSTIÇA TRIBUTÁRIA DA UNIDADE DOS GRANDES CONTRIBUINTES, no âmbito do processo de execução fiscal mencionado no parágrafo 9) acima, de concordância com a Informação e respetivo Parecer, os quais se dão integralmente por reproduzidos (cfr. documento em fls. 275 do processo de execução fiscal apenso aos autos);

59) Em 24 de fevereiro de 2022, a sociedade mencionada no parágrafo 1) acima remeteu, por meio de mensagem de correio eletrónico e por carta registada, dirigida à UNIDADE DOS GRANDES CONTRIBUINTES, a presente Reclamação (cfr. documentos em fls. 130 e 131 do SITAF);

60) Até 1 de setembro de 2023, foram apurados juros de mora, no processo de execução fiscal mencionado no paragrafo 9) acima, nos seguintes termos:





(cfr. requerimento em fls. 1838 do SITAF).

Factos não provados:

Não se identificam factos que, face às plausíveis soluções de Direito, importe registar como não provados.

Motivação de facto:

A decisão quanto aos factos provados com interesse para a decisão – e elencados nos parágrafos 1) a 60) da respetiva matéria de facto – foi formada com base na análise crítica dos documentos constantes nos autos, os quais não foram impugnados e não há indícios que ponham em causa a sua genuinidade, identificando-se à margem de cada parágrafo do probatório o respetivo suporte documental.


*

2. DE DIREITO

Assente a factualidade apurada, que não vem impugnada, cumpre, agora entrar na análise da matéria em discussão nos autos, estando cometida a este Tribunal ad quem a tarefa de indagar se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao declarar prescrita a dívida tributária de juros compensatórios do ano de 1992.

Entende a Recorrente que não há qualquer contencioso associado relativamente à dívida de juros compensatórios de 1992, e não sendo estes juros devidos pelo retardamento do imposto de 1991, pois dizem respeito ao período de 9203T e 9206T, não têm o mesmo prazo de prescrição, por o prazo inicial e final do respectivo prazo não ser coincidente com o imposto de 1991.

Mais alega que, da factualidade dada como provada resulta um facto interruptivo (instauração da execução fiscal) e três factos consubstanciados na (i) suspensão do PEF por via da dedução da reclamação graciosa, recurso hierárquico e da impugnação judicial e (ii) suspensão decretada pelo n.º 3 do art.7.º e n.º 3 do 6.º B da Lei n.º 1-A/2020 de 13 de Março, que institui medidas excepcionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo COVID-19, e, (iii) suspensão nos termos da alínea e) do n.º 4 do artigo 49.º da LGT, em virtude da pendência da presente reclamação dos actos do OEF.

Invoca que o processo de execução fiscal só esteve parado por ter sido determinada a suspensão do mesmo na sequência da apresentação da garantia por parte da Executada (por causa por si imputável), pelo que será de aplicar o efeito interruptivo da instauração da execução fiscal, não tendo o mesmo se degradado em suspensivo, devendo ser-lhe atribuído efeito duradoiro, e, assim, o prazo só voltou a correr após o trânsito em julgado do acórdão que decidiu o recurso apresentado pela Fazenda Pública, que ocorreu em 11/06/2021.

Alega, ainda, que independentemente de a dívida ser de 1992 e não ter contencioso associado, a execução fiscal apresenta-se como um processo uno e não susceptível de ficar parcialmente suspenso e parcialmente não suspenso, concluindo que o processo de execução fiscal esteve parado por causa imputável à Reclamante.

Mas mesmo que se entenda que a reclamação graciosa, o recurso hierárquico e a impugnação judicial tinham por objecto a legalidade da dívida exequenda dos juros compensatórios, a divida não está prescrita, por se dever dar relevância à instauração da execução fiscal e à suspensão do PEF.

A Recorrida sustenta a prescrição da dívida exequenda.

A sentença recorrida, partindo do princípio de que os juros compensatórios do ano de 1992 foram apurados sobre a liquidação de IVA do ano de 1991, decidiu a questão da prescrição nos seguintes termos:

Aquando da liquidação dos juros compensatórios, vigorava o Código de Processo Tributário (“CPT”), o qual determinava no número 1 do artigo 83.º (“Juros compensatórios. Quando são devidos”) que, “[e]m caso de atraso na liquidação por motivo imputável ao contribuinte, são devidos juros compensatórios”.

No mesmo sentido, o número 1 do artigo 89.º do Código do IVA, na redação em vigor à data dos factos, estabelecia que, quando por facto imputável ao contribuinte fosse retardada a liquidação ou entrega de parte ou da totalidade do imposto devido, acresceriam ao montante do imposto juros compensatórios.

“Os juros compensatórios (…) [t]êm a natureza de uma reparação civil, indemnizando o credor pela perda de disponibilidade de quantia que não foi liquidada oportunamente ou que foi indevidamente reembolsada” (cfr. Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues, Jorge Lopes de Sousa, em “Lei Geral Tributária Anotada e Comentada”, 4.ª Edição, Encontro da Escrita, Lisboa, 2012, página 283).

Refira-se, a este propósito, que os juros compensatórios se encontram atualmente previstos no artigo 35.º (“Juros compensatórios”) da Lei Geral Tributária (“LGT”), no qual se estabelece que:

“1 - São devidos juros compensatórios quando, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido ou a entrega de imposto a pagar antecipadamente, ou retido ou a reter no âmbito da substituição tributária.

(…)

8 - Os juros compensatórios integram-se na própria dívida do imposto, com a qual são conjuntamente liquidados.

9 - A liquidação deve sempre evidenciar claramente o montante principal da prestação e os juros compensatórios, explicando com clareza o respetivo cálculo e distinguindo-os de outras prestações devidas.

(…)”.

Ora, à luz da norma antes transcrita, resulta hoje expressamente previsto na lei que os juros compensatórios se integram na própria dívida do imposto, sendo com esta conjuntamente liquidados.

Com efeito, tal como afirma JORGE LOPES DE SOUSA, “[o]s juros compensatórios integram-se na própria dívida de imposto, sendo liquidados em conjunto com a liquidação deste e formam com aquela a globalidade da quantia devida. Esta natureza dos juros compensatórios, como componente da dívida global de imposto resulta hoje com evidência do preceituado no n.º 8 do art. 35.º da LGT (…). No entanto, como imposto que são, os juros compensatórios também poderão ser liquidados de forma autónoma, da mesma forma que o tributo pode ser liquidado adicionalmente, até ao limite do prazo legal de caducidade (…)” (em “Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado”, Volume IV, 6.º ed., Áreas Editora, 2011, página 234).

Refira-se, igualmente, a este propósito, a alínea c) do número 4 do artigo 40.º (“Pagamento e outras formas de extinção das prestações tributárias”) da LGT, a qual determina que, em caso de pagamento realizado em montante inferior ao devido, o mesmo é sucessivamente imputado aos juros moratórios, outros encargos legais e, por último, à “[d]ívida tributária, incluindo juros compensatórios”.

Deste modo, fica em evidência, uma vez mais, que os juros compensatórios não têm autonomia em relação à respetiva dívida de imposto, inclusivamente para efeitos de imputação de pagamento (veja-se, neste sentido, Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues, Jorge Lopes de Sousa, ob. cit., página 334).

De notar que, à data da liquidação dos juros compensatórios em apreciação, o Supremo Tribunal Administrativo (cfr. acórdão datado de 27 de novembro de 1996, proferido no processo n.º 020775), já vinha afirmando que:

“I - Os juros compensatórios têm por base o retardamento da liquidação do imposto devido.

II - Os juros compensatórios aparecem como um agravamento ex lege (uma cláusula penal, uma sopratassa) ao imposto.

III - Só podem haver juros compensatórios quando o imposto for devido”.

Com efeito, atento o artigo 89.º do Código do IVA, afirma-se no mencionado acórdão que esse normativo “(…) determina que os juros compensatórios têm por base o imposto esse retardamento e acrescem-lhe. Portanto, os juros compensatórios acrescem ao imposto devido cuja liquidação foi retardada (…). Ora, quando o imposto não é devido (…) não pode haver lugar à liquidação de juros compensatórios pela razão simples de não haver IVA devido ao qual devia acrescer”.

“Tudo isso resulta da natureza dos juros compensatórios (v. Francisco Rodrigues Pardal, Juros Compensatórios, na Ciência e Técnica Fiscal, 114 (1968) p.43 e segs.) que aparecem como um agravamento ex lege (uma cláusula penal, sopratassa) ao imposto, sendo incluído na liquidação - acto tributário - revelando uma única prestação pecuniária, sendo arrecadado conjuntamente com o imposto, constituindo um todo, vencendo todo o montante juros de mora, tendo os mesmos prazos de cobrança, relaxando conjuntamente e tendo também o mesmo prazo de prescrição que o imposto (…)”.

No mesmo sentido, mais recentemente, o Tribunal Central Administrativo Sul, em acórdão datado de 27 de outubro de 2016, proferido no processo n.º 09810/16, conclui que:

“Os juros compensatórios podem definir-se como os que constituem compensação para o credor, por certas utilidades concedidas ao devedor, tendo a função de completar a indemnização devida, assim reparando o credor prejudicado do ganho perdido até que tenha conseguido a reintegração do seu crédito. No âmbito do direito tributário os juros compensatórios podem configurar-se como tendo a natureza de uma verdadeira cláusula penal legal, aparecendo como um agravamento “ex lege” ao imposto, sendo incluídos na liquidação deste e arrecadados juntamente com ele, tendo os mesmos prazos de cobrança e estando sujeitos ao mesmo período prescricional, sobre ambos podendo incidir o cálculo dos juros de mora (cfr.artº.83, do C.P.T.; artº.35, da L.G.T.)”.

Com efeito, a jurisprudência dos Tribunais superiores (como resulta dos acórdãos antes elencados) tem vindo a afirmar reiteradamente e uniformemente, quanto ao regime de prescrição dos juros compensatórios, que este coincide com o da dívida tributária a que respeitam e na qual se integram (veja-se, neste sentido, ainda, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, datado de 6 de fevereiro de 2013, proferido no âmbito do processo n.º 0728/12).

No mais, sempre se dirá que o artigo 48.º (“Prescrição”) da LGT refere-se à prescrição das “dívidas tributárias”, nas quais se incluem os juros compensatórios – sem qualquer autonomia –, em coerência com o antes exposto (e, em especial, com os artigos 35.º e 40.º da LGT).

O mesmo se conclui, atento o antes exposto, também à luz do artigo 34.º (“Prescrição das obrigações tributárias”) do CPT.

Decorre, portanto, da própria lei uma dependência dos juros compensatórios em relação ao imposto da dívida que integra, a qual se manifesta em três dimensões: (i) na liquidação (conforme resulta atualmente no artigo 35.º da LGT); (ii) no pagamento (conforme resulta atualmente do artigo 40.º da LGT); e (iii) na prescrição (conforme resulta atualmente do artigo 48.º da LGT).

Pelo exposto, atentos os factos provados nos autos (e trazidos ao conhecimento do Tribunal pelas partes), concordando-se integralmente com a jurisprudência citada e tendo em consideração, na decisão a proferir, “(…) todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito” [número 3 do artigo 8.º (“Obrigação de julgar e dever de obediência à lei”) do Código Civil], resta concluir, com fundamento nas normas antes transcritas, que não existe um regime especial de prescrição quanto aos juros compensatórios, os quais se integram na própria dívida e, nessa medida, estão sujeitos ao regime/período de prescrição atendível para o tributo em causa.

Em síntese, como se afirma no acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, datado de 11 de janeiro de 2018, proferido no processo n.º 301/12.5BELLE, “[n]o cômputo do prazo de prescrição da dívida de juros compensatórios, o facto tributário relativo (…) [aos] juros corresponde ao facto tributário da dívida de imposto (…)”. “O termo a quo do prazo de prescrição da dívida de juros compensatórios coincide com o termo a quo do prazo de prescrição da dívida do imposto”.

Não releva, portanto, para o prazo de prescrição dos juros compensatórios que os mesmos se apurem por referência a um período [o do retardamento] posterior ao termo inicial do referido prazo, o qual tão-pouco depende do concreto ato de liquidação, pois outra interpretação não só não teria suporte legal como seria contrária a própria natureza dos juros.

Por outras palavras, os juros compensatórios objeto da presente Reclamação têm o mesmo prazo de prescrição do IVA de 1991, sendo o termo inicial e final do respetivo prazo coincidente com o do imposto.

No mais, quanto aos factos suspensivos e interruptivos do prazo de prescrição, sempre se dirá que são os mesmos/comuns, pois se a lei define um prazo de prescrição da dívida tributária (e não apenas de parte ou partes dela), se ocorre um facto interruptivo ou suspensivo previsto na lei, o mesmo afeta – por imperativo legal – toda a dívida tributária, pois onde a lei não distingue, não deve o intérprete distinguir, uma vez que, tal como decorre do artigo 9.º (“Interpretação da lei”) do Código Civil, se a interpretação da lei não deve cingir-se à sua letra (elemento literal), não pode, contudo, ser considerada uma interpretação que nesta não tem um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expressa, devendo presumir-se que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.

Corroborando o exposto, o Supremo Tribunal Administrativo, em acórdão datado de 3 de abril de 2013, proferido no âmbito do processo n.º 0395/13, considerou que “(…) a apresentação de reclamação graciosa e de subsequente impugnação judicial, associada à prestação de garantia idónea, e ainda que se discuta a legalidade de apenas uma parte da dívida exequenda, suspende a execução fiscal para cobrança da totalidade da quantia exequenda (e não apenas da parcela contestada dessa quantia)”.

Com efeito, se a execução fiscal se apresenta como um processo uno e não suscetível de ficar parcialmente suspenso e parcialmente não suspenso, enquanto a liquidação subjacente à dívida em execução está a ser discutida em sede judicial, por maioria de razão, os factos interruptivos e suspensivos quanto à dívida (do imposto) não podem deixar de se refletir nos juros compensatórios que a integram.

Consequentemente, estando em causa, nos presentes autos, os juros compensatórios que se integram na dívida do IVA de 1991, o qual se encontra prescrito – conforme decisão transitada em julgado –, não se poderá deixar de concluir que também estes estão prescritos.

Vejamos.

Como é consabido, a prescrição é o instituto jurídico pelo qual se extingue o direito do credor de poder exigir o cumprimento da respectiva obrigação.

A obrigação tributária constitui-se com a ocorrência do facto tributário, daí que o início do prazo prescricional se reporte ao facto tributário.

Nos autos está em causa a prescrição da dívida de juros compensatórios do ano de 1992 – períodos de 9203T e 9206T -, pelo que terá que se atender, para efeitos de contagem da prescrição, aos regimes de prescrição fixados, sucessivamente, no artigo 34.º do Código de Processo Tributário (CPT) e no artigo 48.º da Lei Geral Tributária (LGT), uma vez que estamos perante uma situação tributária que, iniciada antes da entrada em vigor de uma nova lei reguladora da prescrição, continuou depois de revogada a lei anterior.

Efectivamente, o anterior CPT, entrou em vigor em 01/07/1991 e, no que toca ao regime de prescrição, foi substituído pela LGT, sendo que esta entrou em vigor em 01/01/1999, conforme preceituado no artigo 6.º do Decreto-Lei nº 398/98 de 17 de Dezembro que aprovou aquele diploma.

Assim, em obediência aos princípios que regulam a aplicação da lei no tempo, a situação em análise haverá de encontrar solução à luz da lei vigente à data da constituição da dívida, sem prejuízo de se considerar a regra do artigo 297.º do Código Civil, preceito este que ainda hoje rege a alteração de prazos e consequentemente as normas aplicáveis da LGT (cfr. n.º 1, do artigo 5.º do Dec.-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro).

O artigo 34.º do CPT, previa um prazo de prescrição de 10 anos, contado a partir do início do ano seguinte àquele em que tivesse ocorrido o facto tributário.

Todavia, com a entrada em vigor da LGT, em 01/01/1999, o prazo prescricional foi reduzido para 8 anos, contados, nos termos do nº 1 do seu artigo 48.º.

O artigo 297.º do CC estatui que, um prazo mais curto do que o fixado na lei anterior é também aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar.

Importa salientar que não existe regime especial de prescrição quanto aos juros compensatórios, os quais se integram na própria dívida de imposto e nessa medida estão sujeitos ao regime de prescrição aplicável à divida do tributo em causa (cfr., entre outros, Ac. do STA de 26/05/1999, Proc. n.° 020653 e Ac. do TCAS de 11/01/2018, Proc. n.º 301/12.8BELLE, este também citado pelo Tribunal a quo (disponíveis em www.dgsi.pt/).

Ao contrário do entendimento vertido na sentença, nos autos não resulta provado que tais juros foram apurados sobre o valor de IVA do ano de 1991, no montante de Esc.: 22.085.584$00, mas também não resultou provado que não dizem respeito ao IVA do ano de 1991 (cfr. ponto 3 do probatórios).

A liquidação de IVA do ano de 1991 e as liquidações de juros compensatórios dos anos de 1991 e 1992 foram emitidas na mesma data, 24/06/1996, mas daqui, sem outros elementos, não se pode retirar que os juros compensatórios do ano de 1992 foram apurados sobre a quantia de IVA do ano de 1991.

Assim, por não resultar provado nos autos que os juros compensatórios em apreço nos autos se integram na dívida de IVA do ano de 1991, dá-se razão à Recorrente quando refere que o prazo inicial do respectivo prazo de prescrição não é coincidente com o prazo inicial de prescrição do IVA do ano de 1991.

O prazo prescricional da divida de IVA do ano de 1992, de 10 anos, em vigor à data da dívida e independentemente de qualquer causa de interrupção ou suspensão do prazo, conta-se desde 01/01/1993 e terminaria em 01/01/2003.

Assim sendo, no caso em apreço, atendendo ao momento de entrada em vigor da LGT tinham decorrido até então 6 anos do prazo de prescrição.

Mas, para efeitos de contagem da prescrição e saber o prazo aplicável tem de se considerar todas as causas de suspensão e interrupção do prazo prescricional.

É justamente quanto ao prazo inicial da prescrição e factos que configuram causas interruptivas e suspensivas que a Recorrente manifestou, embora com argumentos contraditórios, discordância com a decisão da primeira instância.

Mas, façamos primeiro o enquadramento jurídico da questão a dilucidar.

De acordo com o disposto no artigo 34.º do CPT, o prazo prescricional era de 10 anos.

No que respeita à contagem do prazo prescricional dispunha o n.º 2 do referido normativo, que O prazo de prescrição conta-se desde o início do ano seguinte àquele em que tiver ocorrido o facto tributário, salvo regime especial.

Por sua vez, o n.º 3 do citado artigo 34.º do CPT estabelecia que A reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e a instauração da execução interrompem a prescrição, cessando, porém esse efeito se o processo estiver parado por facto não imputável ao contribuinte durante mais de um ano, somando-se neste caso, o tempo que decorrer após este período ao que tiver decorrido até à data da autuação.

Nos termos do n.º 1 do artigo 255.º do CPT, A reclamação graciosa, a impugnação judicial e o recurso judicial que tenham por objecto a legalidade da dívida exequenda suspendem a execução até à decisão do pleito, desde que seja prestada garantia nos termos do artigo 282.º ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido, o que será informado no processo pelo escrivão.

In casu, a dívida exequenda respeita não a imposto, mas a juros compensatórios do ano de 1992, períodos de 9203T e 9206T, respectivamente de Esc.: 8.675.372$00 (€ 43.272,57) e de Esc.: 4.380.702$00 (€ 21.850,85) – Cfr. pontos 4 e 5 do probatório).

Importa apurar se o prazo de prescrição já decorreu perante a ocorrência de factos com efeitos interruptivo ou suspensivo previsto na lei vigente à data da respectiva ocorrência (artigo 12.º CC).

A Recorrente advoga, mas sem convicção e razão, que não existe qualquer contencioso associado à divida de juros compensatórios do ano de 1992, para mais à frente, em manifesta contradição, invocar os factos interruptivos/suspensivos da apresentação da reclamação graciosa, recurso hierárquico e impugnação judicial (cfr. alíneas i) e o) das conclusões da alegação de recurso).

E, com efeito, as causas interruptivas e suspensivas assentes nos autos são aplicáveis, como bem se decidiu na sentença recorrida, ao ponderar o seguinte:

Nos presentes autos, discute-se, entre o mais, se a dívida exequenda se encontra prescrita, a qual consiste, à presente data, nos juros compensatórios de 1992 [parágrafos 4) a 6) e 56) da matéria de facto provada].

Denote-se que, na sequência das liquidações antes mencionadas, foram emitidas as respetivas certidões de dívida e foi instaurado o processo de execução fiscal n.º 3344199601027689 para cobrança coerciva das mesmas – parágrafo 9) da matéria de facto provada.

No âmbito do referido processo de execução fiscal, foi prestada garantia, pelo montante total da dívida exequenda – incluindo, por isso, o montante correspondente ao dos juros compensatórios de 1992 – parágrafo 13) da matéria de facto provada.

Após a prestação da referida garantia, foi deferida, em 28 de abril de 1997, a suspensão do processo de execução fiscal – parágrafos 12) e 14) da matéria de facto provada.

Ora, muito embora se alegue nos autos que não foi apresentado qualquer meio de reação administrativo ou judicial quanto aos juros compensatórios de 1992, tal afirmação não tem respaldo nos factos provados, uma vez que:

1) Atento o teor da reclamação apresentada em 28 de novembro de 1996 – parágrafo 7) da matéria de facto provada –, é peticionada a anulação da liquidação adicional relativa ao IVA do ano de 1991, bem como dos juros compensatórios, os quais, no introito da mesma, são identificados pelo seu valor total – 16.258.240 escudos –, englobando, por isso, tanto os juros compensatórios de 1991 como os de 1992.

2) Por seu turno, o próprio Recurso Hierárquico, apresentado em 20 de março de 2002, no seguimento da decisão de indeferimento do peticionado na Reclamação Graciosa, ao dirigir-se – “in totum” – contra a mencionada decisão de indeferimento, pressupõe a manutenção da controvérsia quanto aos juros compensatórios de 1992 – parágrafo 24) da matéria de facto provada.

3) Quanto à Impugnação Judicial, sempre se dirá que a mesma é apresentada na sequência da decisão de deferimento parcial do Recurso Hierárquico, datada de 6 de janeiro de 2005, a qual, atenta a Informação que lhe subjaz, apenas se pronunciou quanto à liquidação do IVA de 1991, no montante de € 110.162,43 (22.085.584 escudos), tendo concluído pela sua limitação ao montante de € 88.129,94 (17.668.467 escudos), sem prejuízo da regularização efetuada pelo contribuinte no montante de € 44.064,99 (8.834.237 escudos) – parágrafos 27) a 29) da matéria de facto provada.

Com efeito, resulta expressamente da petição inicial da Impugnação Judicial que se “(…) vem impugnar a liquidação de IVA, relativa ao ano de 1991, efectuada pelos Serviços (…), na quantia de € 44.064,95 (importância não aceite, após deferimento parcial do recurso hierárquico apresentado) (…)”, pedindo-se, a final, a anulação da “(…) liquidação efectuada pelos serviços em sede de IVA de 1991, com todas as consequências legais advindas” – parágrafo 31) da matéria de facto provada.

Pelo exposto, resta concluir que a liquidação dos juros compensatórios controvertidos na presente Reclamação foi objeto da Reclamação Graciosa apresentada, tal como o IVA de 1991 e demais juros compensatórios, e, por maioria de razão, mantida/confirmada pela decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa, da qual foi apresentado Recurso Hierárquico, sobre o qual recaiu uma decisão de deferimento parcial em que se procedeu a uma nova quantificação do IVA de 1991 alegadamente devido.

Mas ainda que inexistisse contencioso associado à divida em causa nos presentes autos, a prestação de garantia só por si não impedia a prática de actos coercivos, e, daqui resultava, sem margem para dúvidas, atento o tempo decorrido, a prescrição da dívida.

Com efeito, neste sentido no Acórdão do Pleno do Contencioso Tributário de 21/01/2015, prolatado no processo n.º 060/14, ponderou-se sobre esta questão o seguinte:

«(…) o efeito suspensivo da execução fiscal não é consequência directa e imediata da instauração da reclamação, impugnação ou recurso, nem é consequência directa e imediata da prestação de garantia; o que determina o efeito suspensivo da execução – e, por consequência, o efeito suspensivo da prescrição – é a instauração de reclamação, impugnação ou recurso, quando acompanhada ou seguida da constituição ou prestação de garantia idónea, da autorização da sua dispensa, ou da penhora de bens que garantam o pagamento integral da quantia exequenda e do acrescido.» (no mesmo sentido vide Acs. do STA de 02/03/2005, processo n.º 085/05 e de 10/06/2016, processo n.º 0935/16, todos disponíveis em www.dgsi.pt/).

Assim, o efeito suspensivo da execução fiscal e, consequentemente, o efeito suspensivo da prescrição, é determinado pela instauração de reclamação, impugnação ou recurso, quando, acompanhada ou seguida da constituição ou prestação de garantia que garanta o pagamento da quantia exequenda e acrescido.

Relembremos as causas de suspensão e de interrupção do prazo prescricional em apreço que resultam da factualidade vertida na sentença:

- Em 24/06/1996 foram emitidas as liquidações de IVA do ano de 1991 e juros compensatórios do ano de 1991 e 1992 (cfr. ponto do probatório);

- Em 28/11/1996 a sociedade impugnante deduziu reclamação graciosa contra a liquidação de IVA do ano de 1991 e juros compensatórios do ano de 1991 (período 9106T) e 1992(períodos de 9203T e 9206T) – cfr. ponto 7 do probatório;

- Em data não concretamente apurada foi instaurada execução fiscal n.º 3344199601027689, com base nas certidões de divida relativas ao IVA e juros compensatórios emitidas em 16/11/1996, e, que a sociedade foi citada para os termos da execução em 30/12/1996 (cfr. pontos 9, 10 e 11 do probatório);

- Em 28/04/1997 a execução fiscal foi suspensa por prestação de garantia (cf. pontos 12, 13 e 14 do probatório);

- Não foi praticado qualquer acto pelos Serviços no procedimento de reclamação graciosa entre 31/05/1997 e 20/09/1999, e, entre 22/09/1999 e 07/08/2001 (cfr. pontos 16 e 18 do probatório);

- Em 22/03/2002 foi apresentado Recurso Hierárquico do indeferimento da reclamação graciosa (cfr. pontos 23 e 24 do probatório);

- Não foi praticado qualquer acto pelos Serviços no procedimento de recurso hierárquico entre 07/05/2002 e 19/01/2004 (cfr. ponto 27 do probatório);

- Em 16/06/2005 a sociedade executada deduziu impugnação judicial contra o indeferimento parcial do recurso hierárquico, que correr termos com o n.º 1575/05.3BELSB no Tribunal Tributário de Lisboa (cfr. pontos 27 a 32 do probatório);

- Entre 09/02/2006 e 21/02/2007, e, entre 05/09/2008 e 29/09/2011 não foram praticados quaisquer actos no processo de impugnação judicial (cfr. pontos 34 e 40 do probatório).

Entende a Recorrente que a obrigação tributária não prescreveu porquanto a execução fiscal só esteve parada por ter sido determinada a suspensão da mesma na sequência da garantia apresentada pela Executada.

Não tem, porém, razão a Recorrente.

Na verdade, o decurso do prazo de prescrição foi interrompido devido à apresentação da reclamação graciosa e da garantia, mas deixou de o estar por força da paragem daquela por mais de um ano por facto que não pode ser imputado à recorrida.

A paragem da reclamação graciosa, apresentada em 28/11/1996, por mais de um ano por facto que não é imputável ao contribuinte, determina que o prazo de prescrição volte a correr, ainda que exista garantia prestada na execução fiscal e o credor esteja impedido de cobrar coercivamente a dívida exequenda.

A interrupção da prescrição, quer na vigência do CPT, quer na vigência da LGT, elimina o prazo anteriormente decorrido para a prescrição (efeito instantâneo), obstando a que o novo prazo de prescrição decorra na pendência do processo que deu causa à interrupção (efeito duradouro), salvo se este processo esteja parado por mais de um ano, por facto não imputável ao sujeito passivo (artigos 326.º, nº 1 e 327.º, nº 1 do CC e 49.º, n.º 2 da LGT).

Neste caso, desaparece o efeito próprio da interrupção, de inutilização do tempo decorrido anteriormente, e tudo se passando como se o facto que era interruptivo fosse um facto suspensivo.

Dito por outras palavras, as causas de interrupção da prescrição que ocorreram antes da alteração ao n.º 1 do artigo 49.º da LGT, introduzida pela Lei n.º 53-A/2006, ou seja, antes de 01/01/2007, produzem os efeitos que a lei vigente no momento em que elas ocorreram associava à sua ocorrência, isto é, eliminam o período de tempo anterior à sua ocorrência e obstam ao decurso do prazo de prescrição, enquanto o respectivo processo estiver pendente ou não estiver parado por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte (vide, entre outros, neste sentido, os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 16/10/2013, proc. n.º 1476/13, de 05/06/2013, proc. n.º 903/13, de 06/03/2013, proc. n.º 208/13, de 19/12/2012, proc. n.º 1372/12, de 20/10/2010 proc. n.º 720/10 e de 2/3/2011, proc. n.º 1038/10, e Jorge Lopes de Sousa, in Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2ª ed., 2010, pág. 73).

Como se escreveu no Acórdão do STA de 05/07/2007, prolatado no processo n.º 0407/07:

«É que, embora seja imputável ao contribuinte a paragem da execução fiscal por ter prestado garantia, não foi esta paragem que deu azo à prescrição.
Com efeito, o que sucedeu no caso em apreço é que estando interrompido o decurso do prazo de prescrição devido à instauração da impugnação judicial deixou de o estar por força da paragem desta por mais de um ano por facto que de modo algum pode ser imputado à recorrida.

E estando, neste caso, a impugnação judicial – que teve a virtualidade de interromper a prescrição – parada por mais de um ano por facto que não é imputável ao contribuinte, é evidente que o prazo de prescrição volta a correr, indiferente à prestação da garantia entretanto prestada.

E não se diga que tal entendimento beneficia o devedor na medida em que, estando o credor impossibilitado de prosseguir com a cobrança da dívida por causa da garantia prestada, o prazo de prescrição continua a correr, pois em circunstâncias normais isso não sucederia (prestada a garantia, o prazo de prescrição continuaria interrompido e nenhum prejuízo havia para o credor).

Só que aqui esse prazo só volta a correr por motivo alheio à impugnante – a paragem do processo de impugnação judicial por mais de um ano – e que é da inteira responsabilidade do Estado, a quem incumbe assegurar uma justiça tempestiva, imputando-lhe a lei as consequências da demora excessiva nessa prestação (acórdão deste Tribunal de 9/8/06, no recurso 229/06).» (disponível em www.dgsi.pt/).

Prosseguindo.

Resulta do probatório que a prescrição do IVA do ano de 1991 foi declarada em Acórdão do TCAS de 12/05/2016, já transitado em julgado, prolatado no processo n.º 06266/12 (cfr. pontos 44 e 48 dos factos dados como assentes).

Ora, as causas interruptivas e suspensivas do prazo de prescrição são comuns às dos juros compensatórios do ano de 1992, com a diferença que aqui o prazo inicial de prescrição se conta a partir de 01/01/2003.

Significa que este Tribunal apreciou no referido arresto em concreto a questão da prescrição da dívida exequenda relativa ao IVA de 1991, tendo-se pronunciado expressamente sobre as mesmas causas de interrupção da prescrição aplicáveis aos juros compensatórios de 1992 em cobrança no mesmo PEF.

A data do início do prazo de prescrição não altera a verificação da prescrição dos juros compensatórios do ano de 1992, uma vez que, como melhor se verá infra, aqui também à data da instauração da impugnação judicial já tinham decorrido mais de 10 anos.

Nesta conformidade, em função da semelhança em relação ao caso em apreço, pois, tratam-se das mesmas situações de facto e de direito, e por economia de meios, visando a interpretação e aplicação uniforme do direito (artigo 8.º, n.º 3, do Código Civil), acolhemos a argumentação jurídica constante do referido acórdão deste Tribunal Central Administrativo Sul de 12/05/2016, prolatado no processo n.º 06266/12, pelo que, passaremos a transcrever a fundamentação de tal arresto, aderindo a todo o seu discurso fundamentador:

«Conforme resulta dos autos, constitui objecto do presente recurso a decisão proferida que considerou, antes de mais que o IVA relativo ao ano 1991, em causa na impugnação judicial, não se mostra prescrito. A prescrição da obrigação tributária não constitui fundamento de impugnação judicial, pois que não respeita à legalidade da liquidação, como resulta do disposto no art" 990 e 1240, do CPPT, mas, antes, à inexigibilidade judicial da correspondente obrigação. No entanto, seguindo o entendimento que tem merecido acolhimento na jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, "a questão da prescrição é de conhecimento oficioso mesmo em sede de impugnação judicial tendo em vista a eventual inutilidade superveniente da lide", desde que os autos forneçam os elementos necessários para conhecer das causas de interrupção e de suspensão da prescrição - cfr., neste sentido, acórdãos do STA de 10/03/2011, no proc. n' 01004110 e de 11/03/2009, no proc. n' 0659108, acessível em www.dçsi.pt. Vejamos, antes de mais os factos provados considerados relevantes para a apreciação da prescrição: 1. Em 28/11/1996 a Recorrente apresentou reclamação graciosa, cf. alínea 1-1 do probatório. 2. O processo de execução fiscal contra a Recorrente foi instaurado em 12/1996, cf. alínea EE) do probatório. 3. Em 30/12/1996 foi emitida remetida a nota de citação para a Recorrente, cf. alínea J) do probatório. 4. Em 28/04/1998 foi determinada a suspensão do processo de execução fiscal por despacho do Chefe do serviço de finanças do 110 Bairro Fiscal de Lisboa, em virtude de prestação de garanta, cf. alínea N) do probatório. 5. O processo de reclamação graciosa esteve parado entre 30/05/1997 a 21/09/1999, cf. alínea O) do probatório. — em 30/05/1998 completou-se 1 ano de paragem. 6. Em 22/02/2002 a ora Recorrente interpôs recurso hierárquico do despacho que indeferiu a reclamação graciosa, cf. alínea U) do probatório. 7. O recurso hierárquico esteve parado entre 06/05/2002 a 08/03/2004, cf. alínea Y) do probatório — em 06/05/2003 completou-se um ano de paragem. 8. Em 20/06/2005 foi intentada a presente impugnação judicial, cf. alínea CC) do probatório. 9. O processo de impugnação judicial esteve parado entre 08/02/2006 a 22/02/2006, cf. alínea DD) do probatório — em 08/02/2007 completou-se um ano de paragem.

Avancemos. Tratando-se de dívidas de IVA de 1991, estando em vigor o CPT, e com a entrada da Lei Geral Tributária (doravante LGT) apenas em 1999, importa antes de mais determinar qual a lei aplicável aos autos. Á data a que o imposto em causa se reporta, o prazo de prescrição das obrigações tributárias era de 10 anos (cfr. art. 340, n. 1, do Código de Processo Tributário (doravante CPT), aprovado pelo Decreto-Lei n.° 154/91, de 23 de Abril, que vigorou de 01/07/1991 a 01/01/1999. Segundo o mesmo diploma legal o termo inicial do prazo de prescrição contava-se a partir do início do ano seguinte àquele em que tivesse ocorrido o facto tributário, quer se tratasse de impostos de obrigação perlódica ou de impostos de obrigação única (cfr. art. 340, no 2, do CPT). Nos termos do CPT, constituíam causas interruptivas da prescrição, a "reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e a instauração da execução (...) cessando, porém, esse efeito se o processo estiver parado por facto não imputável ao contribuinte durante mais de um ano, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após este período ao que tiver decorrido até à data da autuação." (cfr. art. 340, n°3, do CPT). A partir de 01/01/1999 e com a entrada em vigor da LGT sucedeu-lhe o regime de prescrição previsto nos artigos 48° e 49° da LGT. Assim, na aplicação no tempo das normas sobre prescrição haverá que ter-se presente o disposto no n.° 1 do art. 5° do DL 398/98, de 17.12, que impõe a aplicação do preceituado no art. 297 do CC, ao prazo de prescrição, o que já vinha sendo entendido pela jurisprudência na vigência do CPT, pelo que "a lei que estabelecer, para qualquer efeito, um prazo mais curto do que o fixado na lei anterior é também aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar— n.° 1 do art. 297 do CC. Segundo Jorge Lopes de Sousa in "Notas Sobre Aplicação no Tempo das Normas sobre Prescrição da Obrigação Tributária" , publicado no site da AMJAFP http://amjafp.no.sapo.pt/.

"A determinação do prazo de prescrição faz-se no momento da entrada em vigor da nova lei. (...) Assim, no caso de leis que encurtam prazos de prescrição, que são as que tem ocorrido em matéria tributária, se no momento da entrada em vigor da nova lei falte menos tempo para o prazo se completar à face da lei antiga, é desta que se aplica. Nos outros casos aplica-se o prazo da lei nova, contado da data da sua entrada em vigor. (...) Esta contagem do prazo que falta faz-se considerando tudo que consta da lei antiga (inicio, causas de suspensão, e de prescrição) como se depreende do texto da parte final do n° Ido art. 297° do CC (...) No caso de ter ocorrido um facto interruptivo na vigência do CPT e, no momento em entrada em vigor o processo já tiver parado por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte, o efeito da eliminação do prazo decorrido antes do facto interruptivo desaparecerá, passando o seu efeito a ser meramente suspensivo da prescrição. Assim contar-se-à o prazo desde o seuu inicio (à face do CPT) até à autuação do processo, somando-se o prazo que decorrer depois do momento em que se completou um ano de paragem (art. 34° n° 3 do CPT), até à data da entrada em vigor da LGT, que é o momento a considerar na opção pelo prazo da lei nova ou da lei antiga. Se esta soma for inferior ou igual a dois anos, não faltará menos tempo à face do CPT para a prescrição se completar, pois o prazo nele previsto é de 10 anos enquanto na LGT é de 8 anos. Por isso, será de aplicar o prazo da LGT por força da regra do art. 279° n° 1, do CC. Se esta soma for superior a dois anos, à data da entrada em vigor da LGT faltará menos tempo para o prazo se completar à face da LGT pelo que o prazo de prescrição a aplicar será o do CPT." Sendo o IVA aqui em causa de 1991, o respectivo prazo precricional teve início e 01/01/1992. O prazo foi interrompido com a apresentação da reclamação graciosa em 28/11/1996. Posteriormente em 1211996 foi instaurado o processo de execução fiscal e a citação remetida à Recorrente em 30/12/1996. Sucede que a instauração da execução fiscal não tem eficácia interruptiva do prazo prescricional uma vez que este já esta interrompido em virtude da reclamação graciosa. Estando interrompido o prazo prescricional, pela ocorrência de algum dos factos previstos no artigo 34° n°3 do CPT, a posterior eclosão de outro, embora em abstracto capaz de interromper o prazo, é inócua, pela impossibilidade de interromper o que já está interrompido — veja-se sobre este assunto, entre outros o Ac. do STA de 24/10/2007, proc. n° 0244/O 7. Posto isto, cumpre, agora, verificar se ocorreu algum facto interruptivo da prescrição até à entrada em vigor da LGT. Sendo o IVA de 1991 o prazo prescricional começa a contar-se desde 01/01/1992. Dos factos provados resulta que em 28/11/1996, a Recorrente apresentou reclamação graciosa da liquidação adicional referente a IVA do ano de 1991. Mais resulta provados que no em 12/1996 foi instaurado o processo de execução fiscal. No entanto esta instauração não teve eficácia interruptiva do prazo de prescrição uma vez que este prazo já se encontrava interrompido por forma da reclamação graciosa. Estando interrompido o prazo prescricional, pela ocorrência de algum daqueles factos, a posterior eclosão de outro, embora em abstracto capaz de interromper o prazo, é inócua, pela impossibilidade de interromper o que já está interrompido, no entanto se após a cessação do efeito interruptivo ocorrer nova causa, não pode deixar de lhe atribuir efeito — veja-se sobre este assunto, entre outros do Acórdão do STA n° 0244/07 de 24/10/2007. Mais resulta dos factos provados que, mais tarde, o processo de reclamação graciosa esteve parado entre 30/05/1997 e 21/09/1999 e assim sendo completou-se um ano de paragem em 30/05/1998. A interrupção da prescrição, neste caso com a reclamação graciosa, tem como efeito a inutilização para a prescrição de todo o tempo decorrido anteriormente, não começando a correr o novo prazo enquanto não for proferida a decisão final do processo que teve aquele efeito interruptivo - cfr. art. 326°, n° i e 327°, n° 1, ambos do CC. A paragem do processo por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte implicava o desaparecimento dos efeitos da interrupção, passando o facto que tinha efeito interruptivo a ter efeito suspensivo, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período com o que tiver decorrido até à data da autuação- cf. artigo 34•0, n.° 3, segunda parte, do CPT. Ora, entre 01/01/1992 data de início do decurso do prazo prescricional e 28/11/1996 data da apresentação da reclamação graciosa decorreram 4 anos, 10 meses e 28 dias. Entre 30/05/1998, data de paragem do processo de reclamação graciosa, por um ano e 01/01/1999, decorrem apenas 7 meses, o que dá um total de 5 anos, 5 meses e 28 dias. Pelo resta concluir que, sendo o prazo prescricional da LGT de 8 anos e o prazo previsto no CPT de 10 anos, e face a todo que foi dito, nomeadamente a reflexão de Jorge Lopes de Sousa supra citada, é manifesto que faltava mais tempo para que o prazo prescricional se completasse de acordo com a lei nova, cabendo assim aplicar a lei antiga. Avancemos, começando por transcrever, na íntegra, o que determina o artigo 340 do CPT, aplicável ao caso em análise: 1. A obrigação tributária prescreve no prazo de 10 anos, salvo se outro mais curto estiver fixado na lei. 2. O prazo de prescrição conta-se desde o inicio do ano seguinte àquele em que tiver ocorrido o facto tributário, salvo regime especial. 3. A reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e a instauração da execução interrompem a prescrição, cessando, porem esse efeito se o processo estiver parado por facto não imputável ao contribuinte durante mais de um ano, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após este período ao que tiver decorrido até à data da autuação." Considerando o determinado na citada norma, tudo que já foi dito, o ano da divida, IVA 1991 e o ano em que começa a contar o prazo precricional, 01/01/1992 verifica-se que: Em 28/11/1996, com a reclamação graciosa, interrompeu-se a prescrição cujo prazo começou a contar-se e, 01/01/1992. Mas, de acordo com o n° 3 do citado artigo 34° da, "reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e a instauração da execução (...) cessando, porém, esse efeito se o processo estiver parado por facto não imputável ao contribuinte durante mais de um ano, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após este período ao que tiver decorrido até à data da autuação." Até à data da autuação da reclamação estavam decorridos 4 anos, 10 meses e 28 dias, por outro lado, o procedimento de reclamação graciosa não foi movimentado entre 30/05/1997 e 21/09/1999, facto a que a Recorrente é alheia. E, assim, em 30/05/1998 cessou o efeito interruptivo da reclamação graciosa, voltando a decorrer o prazo prescricional. Mas a verdade é que, entretanto, haviam ocorrido mais três factos que não podem deixar de ser ponderados: a instauração da execução, 12/1996, a do recurso hierárquico em 22702/2002 e a da impugnação judicial em 2010612005. A instauração da execução é irrelevante uma vez que quando foi instaurada o prazo já estava interrompido, como vimos supra, além de que não ocorreu após a reclamação estar parada por mais de um ano, mas antes, ou seja quando a reclamação ainda produzia efeitos interruptivos. Importa no entanto referir que com a instauração da execução a Recorrente apresentou garantia e em consequência disso, em 28/04/1998 foi determinada a suspensão do processo de execução fiscal por despacho do Chefe do serviço de finanças. Sendo certo que, apesar da lei aplicável aos autos ser o CPT, as causas interruptivas e suspensivas previstas na nova lei ser-lhe-ão aplicáveis se surgir uma causa nova após a sua entrada em vigor. Acontece porem que a suspensão da execução fiscal ocorreu em 28/04/1997 e a LGT entrou em vigor apenas em 1999 e assim sendo a suspensão da execução fiscal não tem relevância para efeitos de suspensão do prazo prescricional em apreciação. Veja-se sobre este assunto o douto Acórdão do STA n° 0935/14 de 29/04/2014 onde se diz: As causas de interrupção ou suspensão da prescrição atendíveis para o cômputo em concreto do prazo de prescrição são as previstas na lei vigente à data da respectiva ocorrência, em conformidade com o disposto no n.° 2 do artigo 12.0 do Código Civil. 01!! - As normas que dispõem sobre as causas de suspensão ou de interrupção do prazo de prescrição não são normas que estatuam sobre o conteúdo da relação jurídicotributária ou normas sobre prazos mas sim normas que dispõem sobre os efeitos (interruptivos os suspensivos) de determinados factos - citação, reclamação, recurso hierárquico, impugnação, pedido de revisão oficiosa da liquidação do imposto, pagamento em prestações legalmente autorizadas - e que por isso só se aplicam aos factos novos (art° 12°, no 2, 1 parte do Código Civil). Sobre o mesmo assunto, Jorge Lopes de Sousa, na obra supra citada diz também: "5,3 A lei nova reconhece efeito interrutivo a um facto a ue não é atribuído esse efeito na lei antiqa Nestas situações apenas pode ser atribuida relevância interruptiva a causas que ocorram na vigência da lei nova, pois a anterior não lhes atribuía esses efeito e a lei se aplica a factos ocorridos na sua vigência, segundo o principio básico sobre aplicação da lei no tempo (art. 120 n°1 do CC) Porém, o recurso hierárquico instaurado em 22/02/2002 interrompe novamente a prescrição. Assim desde 30/05/1998 (data em que a reclamação graciosa deixa de interromper o prazo) até 22/02/2002, data da instauração do recurso hierárquico, decorreram 3 anos, 8 meses, 22 dias. Porém o recurso hierárquico também esteve parado por mais de um ano por facto não imputável à Recorrente entre 06/05/2002 a 08/03/2004, e por força disso em 06/05/2003 completou-se um ano de paragem. Assim sendo o prazo prescricional volta a contar-se desde 06/05/2003 até 20/06/2005, data da instauração da impugnação judicial. Assim desde 06/05/2003 até 20/06/2005 decorreram 2 anos, 1 mês e 14 dias. Se somarmos todos os períodos que à luz do CPT decorreu a prescrição tendo em conta todos os factos interruptivos verifica-se que até à data da instauração da impugnação judicial decorreram mais de 10 anos, pelo que o IVA de 1991 aqui em causa se encontra prescrito.»

Aplicando todo o exposto aos presentes autos, também aqui é de concluir que à data da instauração da impugnação judicial já se tinha esgotado o prazo prescricional de 10 anos fixado na lei.

Resta, pois, negar provimento ao recurso e confirmar a sentença com a presente fundamentação.


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Conclusões/Sumário:

I. Não existe regime especial de prescrição quanto aos juros compensatórios, os quais se integram na própria dívida de imposto e nessa medida estão sujeitos ao regime de prescrição aplicável à divida do tributo em causa.

II. O efeito suspensivo da execução fiscal e, consequentemente, o efeito suspensivo da prescrição, é determinado pela instauração de reclamação, impugnação ou recurso, quando, acompanhada ou seguida da constituição ou prestação de garantia que garanta o pagamento da quantia exequenda e acrescido.

III. A paragem da reclamação graciosa, apresentada em 28/11/1996, por mais de um ano por facto que não é imputável ao contribuinte, determina que o prazo de prescrição volte a correr, ainda que exista garantia prestada na execução fiscal e o credor esteja impedido de cobrar coercivamente a dívida exequenda.


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IV – DECISÃO

Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Subsecção das Execuções Fiscais e de Recurso Contraordenacionais da Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso, confirmando-se a sentença recorrida com a presente fundamentação.

Custas pela Recorrente

Notifique.

Lisboa, 14 de Março de 2024.


Maria Cardoso - Relatora
Luísa Soares – 1.ª Adjunto
Catarina Almeida e Sousa – 2.ª Adjunto
(assinaturas digitais)