Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:03442/09
Secção:Contencioso Tributário
Data do Acordão:09/22/2009
Relator:José Correia
Descritores:IMPUGNAÇÃO DE APREENSÃO NOS TERMOS DO ARTº 144º DO CPPT. APREENSÃO FEITA NOS TERMOS DO ART. 16 N° 1 DO RBC. NULIDADE POR FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO.
Sumário:I) - A fundamentação das decisões da Administração, que constitui um direito do contribuinte e um dever da administração (Artº 77 da LGT e 268/3 da Constituição), há-de respeitar três princípios essenciais: da suficiência, da clareza e da congruência.
II) -O princípio da suficiência significa que a fundamentação se deve estender a todos os elementos escolhidos pela administração de forma a reconstituir-se o iter lógico e jurídico do procedimento que terminou com a decisão final;
III) -O princípio da clareza postula que a fundamentação deve ser inteligível, sem ambiguidades nem obscuridades, tendo em conta a figura do destinatário normal que na situação concreta tenha de compreender as razões decisivas e justificativas da decisão;
IV) - E o princípio da congruência significa que deve haver consonância entre os pressupostos normativos do acto e os motivos do mesmo. A adopção de fundamentos que por contradição não esclareçam concretamente a motivação do acto equivale à falta de fundamentação.
V) – Estas exigências encontram-se igualmente consagradas no art.º 79.º do RGIT que obriga a que a decisão que determina a apreensão de mercadorias deve conter a descrição sumária dos factos e indicação das normas violadas e punitivas, sendo que, como decorre do preâmbulo do Decreto-Lei n° 147/2003, de 11 -06, o regime regulador dos documentos que devem acompanhar as mercadorias em circulação na sua vertente sancionatória por infracções às obrigações emergentes do diploma é o constante do Regime Geral das Infracções Tributárias.
VI) -Não contendo a notificação remetida à impugnante, com remissão expressa para o quadro fáctico que rodeou a prática da apreensão, a fundamentação (de facto) devidamente enunciada e, quanto ao direito, o auto em causa remete para a totalidade da violação das normas do Regime de Bens em Circulação (RBC), não especificando em concreto que norma foi infringida pela impugnante, pois, nos termos daquele auto, esta terá infringido todas as normas daquele diploma legal e não apenas algumas delas, não se mostrando assim satisfeitos os princípios da suficiência, por não se terem enunciado todos os elementos de facto e de direito que levaram à decisão final; o da clareza, por o discurso não ser inteligível e sem ambiguidades; e o da congruência porque entre os pressupostos e a motivação existem divergências.
VII) -E tanto assim que, em rigor, contrariamente ao pressuposto no auto de notícia, os factos nele apontados não integram a falta do elemento previsto no art° 4° n°2 al. d) do DL 147/2003 "designação comercial dos bens, com indicação das quantidades " pois no auto de apreensão se menciona que não se especifica "a quantidade exacta da mercadoria "mas a norma legal não faz uma tal exigência de exactidão pormenorizada das quantidades, sendo que a guia de transporte constante de fls. 28 identifica a mercadoria e a quantidade de caixas transportadas (30), o que, como bem refere o MP, constitui indicação suficiente para o cumprimento do disposto no art°4° n° 2 al. d), uma vez que cada caixa contém informação do seu conteúdo em número de peças, não se levantando quaisquer dúvidas sobre o mesmo, o que só ocorreria se as caixas estivessem abertas, o que não será o caso.
VIII) -Ora, a indicação do número de caixas, tal como foi feita na guia, mostra-se suficiente para preencher o requisito previsto no art° 4° n° 2 al. d) do DL 147/2003, e, a essa luz, não se verificava a infracção prevista no art° 14° n° 2 do citada diploma, não havendo, pois, lugar à correspondente apreensão, nos termos do art° 16° n°1.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Central Administrativo:

I – RELATÓRIO

A FAZENDA PÚBLICA, não se conformando com a sentença do Mº Juiz do TAF de Loulé que julgou procedente a impugnação deduzida por M ..., SA, contra o acto de apreensão das mercadorias e do veículo onde foram transportadas, correspondente ao auto de apreensão nº 0096506-G (nº 34/2009, no SF de Olhão) de 24.03.2009, da Guarda Nacional Republicana, Comando Territorial de Faro, dela vem interpor recurso para esta Secção do TCAS, formulando as seguintes conclusões:
1 - A douta sentença recorrida fez errónea interpretação e aplicação dos arts. 57 e 79 n° 1 al. b) do RGIT, bem como dos arts. 16 n° 1 e 17 n° 11 do RBC.
2 - Na verdade, a situação jurídica para que se pretende solução respeita apenas ao acto de apreensão.
3 - Segue-se daí que para o tribunal julgar procedente ou improcedente o pedido só lhe cabe apurar da fundamentação em que se apoia a decisão de apreensão.
4 - Ora, no auto de notícia em causa enuncia-se ter a apreensão sido feita nos termos do art. 16 n° 1 do RBC.
5 - E, o texto daquele preceito coloca-nos perante o acto material que esteve na sua base, por remeter para o disposto no art. 14 do mesmo diploma.
6 - Logo, especificam-se as disposições que deram origem, sobre que assentou, a apreensão controvertida.
7- De sorte que, ao contrário do decidido pelo tribunal a quo, a decisão sub judice está justificada juridicamente.
Assim, pelo exposto e pelo muito que V. Exc. doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença do tribunal recorrido.
Contra -alegou a recorrida para concluir que:
i - O auto de notícia em causa não estabelece, de forma minimamente consentânea com o dever de fundamentação legalmente exigido, qual ou quais as normas jurídicas cuja infracção é imputada à Recorrida.
ii - A fundamentação do acto em causa deve participar das exigências da fundamentação de uma decisão penal - na especificação dos factos, na enunciação das provas que os suportam e na indicação precisa das normas violadas.
iii - A decisão da autoridade administrativa que não contenha os elementos que a lei impõe, é nula por aplicação do disposto no art. 374º, nº l, al. a), do CPP para as decisões condenatórias.
iv - Caso assim não se entenda, deverá o Tribunal ad quem conhecer das demais questões suscitadas - nomeadamente o mérito da apreensão - ao abrigo do disposto no artigo 715º nº l CPC e artigo 2º CPPT, pois que tem à sua disposição todos os elementos para tal.
TERMOS EM QUE, com a improcedência do presente recurso, deve a Douta sentença recorrida ser mantida nos seus precisos termos, assim se cumprindo a Lei e se fazendo JUSTIÇA!
O EPGA emitiu douto parecer no sentido de que o recurso não merece provimento em termos a que na fundamentação infra se fará alusão.
Os autos vêm à conferência com dispensa de vistos.
*
II – FUNDAMENTAÇÃO:

2.1. – Dos Factos:

Na sentença recorrida deram-se como assentes os seguintes factos:
1) No dia 24-03-2009 foi apreendido o veículo, com a matrícula ..., e as mercadorias, que eram transportadas, conforme auto de apreensão de fls 22 e 23, dos autos, com o n° 0096506;
2) O veículo referido em 1) era utilizado sob a direcção e ao serviço da impugnante (fls 24 e 25, dos autos);
3) Conforme o auto de apreensão referido em l) que se dá por reproduzido para todos os efeitos legais e, com interesse, se reproduz:
"Factos verificados/Legislação infringida
No acto de fiscalização efectuada ao abrigo do n° l, do artigo 13, do Regime dos Bens em Circulação (RBC), aprovado pelo Decreto Lei n° 147/03 de 11 de Julho, foram verificados os factos abaixo descritos, que constituem infracção ao RBC, punida pelo nº l, do art° 117 do regime Geral das Infracções Tributárias, aprovada pela Lei 15/2001 de 05 de Junho.
Por a mercadoria circular a coberto da Guia de Transporte nº 10412669 que se anexa não estando as respectivas quantidades correctamente especificadas. A quantidade referida na respectiva guia refere-se ao n° de caixas, não especificando a quantidade exacta da mercadoria.
(...)
Apreensões
Nos termos do art° 16°, n° l, do RBC, procedemos à apreensão do veículo da marca...matrícula ..., com valor presumível de...
Objecto da infracção:
...consta da descrição da guia de transporte n° 10112669 ".
Anexo ao auto de apreensão referido em 3) foi junta a guia de transporte n° 12669, onde consta:
Código do artigo Descrição Montante Preço Unitário Taxa de IV A
2100000078547 Mosaico 33x33 Polo creme Quant Un por 4,88 20%
Emb
30
A convicção do tribunal fundou-se nos documentos juntos em cada ponto.
*
Factos não provados.
*
Não se provaram quaisquer outros factos com interesse para a decisão da causa.
*
3. - O DIREITO
A recorrente insurge-se contra o decidido na sentença afirmando, em síntese, que a sentença recorrida fez errónea interpretação e aplicação dos arts. 57 e 79 n° 1 al. b) do RGIT, bem como dos arts. 16 n° 1 e 17 n° 11 do RBC porquanto a situação jurídica para que se pretende solução respeita apenas ao acto de apreensão e, assim sendo, ao tribunal apenas incumbe apurar da fundamentação em que se apoia a decisão de apreensão e como no auto de notícia em causa se enuncia ter a apreensão sido feita nos termos do art. 16 n° 1 do RBC cujo texto nos coloca perante o acto material que esteve na sua base, por remeter para o disposto no art. 14 do mesmo diploma, deste modo se especificando as disposições sobre que assentou a apreensão controvertida.
Dissentindo desse ponto de vista, advoga a recorrida que a decisão da autoridade administrativa não contem os elementos que a lei impõe, não estabelecendo a especificação dos factos, nem a enunciação das provas que os suportam e a indicação precisa das normas violadas, pelo que é nula por aplicação do disposto no art. 374º, nº l, al. a), do CPP para as decisões condenatórias.
A sentença recorrida pronunciou-se sobre a falta de fundamentação do acto impugnado partindo do princípio de que, por apelo ao preâmbulo do Decreto-Lei n° 147/2003, de 11 -06, o regime regulador dos documentos que devem acompanhar as mercadorias em circulação na sua vertente sancionatória por infracções às obrigações emergentes do diploma é o constante do Regime Geral das Infracções Tributárias.
A decisão recorrida, baseando-se na doutrina expressa no Ac. deste TCA Sul de 15-07-2008, tirado no Recurso n° 02389/08, cuja relação é da autoria do relator da presente formação, veio a expender que “É entendido na Doutrina e Jurisprudência Portuguesas que a fundamentação há-de ser «a indicação dos factos e das normas jurídicas que a justificam» (Prof. J. Alberto Reis in vol. V-pag.24), Ou como diz Henri Capitant, no seu «Vocabulaire Juridique», a «exposição das razões de facto e /ou de direito que determinam... uma decisão» ou, como diz Prof. Marcelo Caetano, no seu Manual, pág. 477, «a fundamentação consiste em deduzir expressamente a resolução tomada das premissas em que assenta, ou em exprimir os motivos por que se resolve de certa maneira, e não de outra».
Constituindo um direito essencial dos administrados a defesa dos seus direitos a qual se traduz, duma banda, na participação activa na fase que conduz à produção do acto administrativo (v. art° 48°, n°s. l e 2 e 268° n° l da CRP) e, doutra, pela possibilidade de recorrer contenciosamente contra quaisquer actos administrativos definitivos e executórios (art°s- 20° e 268° n° 4 da CRP ) é inquestionável que a obrigação de enunciar expressamente os fundamentos de facto e de direito que determinaram o autor do acto é de extrema relevância porquanto, face à fundamentação do acto é que se podem verificar a legalidade da actuação e conhecer as razões que determinaram o órgão administrativo".
Como decorre do n° l do art° 77° da LGT, o dever de fundamentação imposto à AT concretiza-se «por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram», sendo que o n° 2 do mesmo normativo explicita que a «A fundamentação dos actos tributários pode ser efectuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo».
Mais se aduz na sentença recorrida que do constante da al. b) do n° l do art. 79 do RGIT, temos que o legislador erigiu como requisito legal da decisão de aplicação da coima, a descrição sumária dos factos e a indicação das normas violadas e punitivas, pelo que é necessário incluir nela a descrição dos factos e indicar as normas violadas e punitivas que sejam suficientes para permitir ao arguido saber quais são os factos que justificaram a sua aplicação.
Qualquer destas normas erige como questão fundamental a necessidade de descrição sumária dos factos e bem assim como as normas violadas e punitivas, pois só assim o impugnante está verdadeiramente em condições de apresentar a sua defesa.
No quadro legal e doutrinal exposto, a sentença veio então a considerar que do auto de fls 22 e 23 e a fazer fé do mesmo verifica-se que, no dia 24 de Março de 2009, foi apreendido o veículo com a matricula ..., e as mercadorias, que eram transportadas por "a mercadoria circular a coberto da Guia de Transporte nº 10412669 que se anexa não estando as respectivas quantidades correctamente especificadas. A quantidade referida na respectiva guia refere-se ao n° de caixas, não especificando a quantidade exacta da mercadoria", o que constitui infracção ao RBC, punida pelo n° l, doart°117°, do RGIT.
Conclui a Mº Juíza «a quo» que o auto em causa remete para a totalidade da violação das normas do RBC, não especificando em concreto que norma foi infringida pelo impugnante, pois nos termos daquele auto este terá infringido todas as normas daquele diploma legal e não apenas algumas delas, o que configura falta de fundamentação do auto de notícia e motiva a procedência da impugnação.
O EPGA sustenta que o julgado não merece a censura que vem reclamada pelo recorrente FP pois o auto de notícia que contém a apreensão da mercadoria da viatura, por força da lei, corresponde à acusação, em tudo idêntica à desenhada no processo penal, não pode ser vaga ou genérica; e, por força do disposto no art. 283 n° 3 do CPP e dos princípios constitucionais da legalidade, da defesa, do acesso ao direito e d realização da justiça, tal acusação há-de conter: i) A precisa e concreta identificação dos factos da vida humana individuais ou plurais, que correspondem aos descritos na previsão normativa; ii) A identificação da correspondente sanção ou medida punitiva inscrita na norma legal e iii) As circunstâncias de espaço, tempo, modo e motivação da realização da infracção.
E o auto de notícia em causa não espelha aqueles requisito legais, não se descortinando fundamento legal nas conclusões do recurso da FP que desvalorizem e invalidem o julgado.
Concorda-se inteiramente como o fundamentado e decidido na sentença recorrida, acolhendo-se, outrossim, por válidos, os argumentos doutamente aduzidos pelo EPGA.
Quid juris?
A decisão da autoridade administrativa referida no ponto 3 do probatório (cfr. auto de apreensão referido em l) é do seguinte teor:
"Factos verificados/Legislação infringida
No acto de fiscalização efectuada ao abrigo do n° l, do artigo 13, do Regime dos Bens em Circulação (RBC), aprovado pelo Decreto Lei n° 147/03 de 11 de Julho, foram verificados os factos abaixo descritos, que constituem infracção ao RBC, punida pelo nº l, do art° 117 do regime Geral das Infracções Tributárias, aprovada pela Lei 15/2001 de 05 de Junho.
Por a mercadoria circular a coberto da Guia de Transporte nº 10412669 que se anexa não estando as respectivas quantidades correctamente especificadas. A quantidade referida na respectiva guia refere-se ao n° de caixas, não especificando a quantidade exacta da mercadoria.
(...)
Apreensões
Nos termos do art° 16°, n° l, do RBC, procedemos à apreensão do veículo da marca...matrícula ..., com valor presumível de...
Objecto da infracção:
...consta da descrição da guia de transporte n° 10112669 ".
Anexo ao auto de apreensão referido em 3) foi junta a guia de transporte n° 12669, onde consta:
Código do artigo Descrição Montante Preço Unitário Taxa de IV A
2100000078547 Mosaico 33x33 Polo creme Quant Un por 4,88 20%
Emb
30
Ora, na verdade, a fundamentação das decisões da Administração, que constitui um direito do contribuinte e um dever da administração (Artº 77 da LGT e 268/3 da Constituição), há-de respeitar três princípios essenciais: da suficiência, da clareza e da congruência.
A jurisprudência adopta as mesmas exigências, expressas no sumário do Ac do STA de 15/12/1999, ( "Bases Jurídico Documentais' http://www.dgsi.pt/): A fundamentação do acto tributário tem de expressar-se em um discurso contextual, formal, acessível, congruente e suficiente para dar a conhecer ao contribuinte, pressuposto como um contribuinte normal colocado nas circunstâncias concretas do recorrente, as razões de facto a de direito que levaram a administração a pratica-lo, variando a exigência de densificação daquele discurso em função do Voo de acto e da participação ou não participação do contribuinte no procedimento da sua formação.)
O princípio da suficiência significa que a fundamentação se deve estender a todos os elementos escolhidos pela administração de forma a reconstituir-se o iter lógico e jurídico do procedimento que terminou com a decisão final;
o princípio da clareza postula que a fundamentação deve ser inteligível, sem ambiguidades nem obscuridades, tendo em conta a figura do destinatário normal que na situação concreta tenha de compreender as razões decisivas e justificativas da decisão;
por último, o princípio da congruência significa que deve haver consonância entre os pressupostos normativos do acto e os motivos do mesmo. A adopção de fundamentos que por contradição não esclareçam concretamente a motivação do acto equivale à falta de fundamentação.
Analisando o conteúdo da supra transcrita notificação remetida à impugnante com remissão expressa para o quadro fáctico que rodeou a prática da apreensão, verifica-se que a fundamentação (de facto) não está devidamente enunciada e, quanto ao direito, estão indicadas as normas jurídicas violadas e as punitivas, ou melhor e como assertivamente refere a sentença, o auto em causa remete para a totalidade da violação das normas do RBC, não especificando em concreto que norma foi infringida pelo impugnante, pois nos termos daquele auto este terá infringido todas as normas daquele diploma legal e não apenas algumas delas.
Não estão assim satisfeitos os princípios da suficiência, por não se terem enunciado todos os elementos de facto e de direito que levaram à decisão final; o da clareza, porque o discurso não é inteligível e sem ambiguidades; e o da congruência porque entre os pressupostos e a motivação existem divergências.
E tanto assim que, em rigor, os referidos factos não integram a falta do elemento previsto no art° 4° n°2 al. d) do DL 147/2003 "designação comercial dos bens, com indicação das quantidades " pois no auto de apreensão se menciona que não se especifica "a quantidade exacta da mercadoria "mas a norma legal não faz uma tal exigência de exactidão pormenorizada das quantidades, sendo que a guia de transporte constante de fls. 28 identifica a mercadoria e a quantidade de caixas transportadas (30), o que, como bem refere o MP, constitui indicação suficiente para o cumprimento do disposto no art°4° n° 2 al. d), uma vez que cada caixa contém informação do seu conteúdo em número de peças, não se levantando quaisquer dúvidas sobre o mesmo, o que só ocorreria se as caixas estivessem abertas, o que não será o caso.
Assim, a indicação do número de caixas, tal como foi feita na guia, mostra-se suficiente para preencher o requisito previsto no art° 4° n° 2 al. d) do DL 147/2003, e, em consequência, não se verifica a infracção prevista no art° 14° n° 2 do citada diploma, não havendo, pois, lugar à correspondente apreensão, nos termos do art° 16° n° l.
Todavia e como bem observa a Mª Juíza, a regularidade dos actos deve ser aferida em face da lei em vigor à data em que foram praticados, as normas pertinentes do RGIT por ser este o diploma que se encontrava em vigor.
Nesse sentido, há que atentar também no artigo 79 do RGIT aprovado pelo art. 1° da Lei 15/2001, aqui aplicável, e que estabelece as exigências de fundamentação do acto impugnado em termos que não se afastam do regime geral.
Com efeito, decorre daquele normativo que a decisão deve conter” 1 -...
b) A descrição sumária dos factos e indicação das normas violadas e punitivas;
C) A coima e sanções acessórias, com indicação dos elementos que contribuíram para a sua fixação”.
Os requisitos legais da decisão de apreensão por parte da autoridade administrativa são os enunciados no citado artigo 79 do RGIT, e, da sua análise, logo se vê que na decisão impugnada não se mostra satisfeito o requisito da al. b) do n.° l do art. 79 do RGIT, conter - "A descrição sumária dos factos e indicação das normas violadas e punitivas".
Da estatuição da al. b) do n° l do art. 79 do RGIT, resulta claramente que o legislador erigiu como requisito legal da decisão, a descrição sumária dos factos e a indicação das normas violadas e punitivas, pelo que é necessário incluir nela a descrição dos factos e indicar as normas violadas e punitivas que sejam suficientes para permitir ao arguido saber quais são os factos que justificaram a apreensão.
Esta exigência da descrição dos factos e a indicação das normas violadas e punitivas na decisão que determina a apreensão, respeita os finalidades da fundamentação em geral, pois visa assegurar à impugnante a possibilidade de exercício efectivo dos seus direitos de defesa que, doutro modo, poderiam ficar diminuídos ou mesmo coarctados se não constasse da decisão a descrição dos factos que justificaram a aplicação da medida de apreensão. Esta exigência da descrição dos factos não se satisfaz com a simples remissão para o auto de notícia.
Em nota ao art. 212 do CPT, equivalente ao art. 79 do RGIT, a páginas 806, Alfredo José de Sousa e José da Silva Paixão in CPPT comentado e anotado referem que "a descrição dos factos, ainda que sumária, não pode limitar-se a afirmar conclusões vagas ou a reproduzir as expressões contidas na norma que prevê a contra-ordenação. É necessário descrever os actos materiais praticados pelo arguido, a data, o local, se possível, ou aqueles que deixou de praticar estando obrigado a fazê-lo". Só com estas indicações se satisfaz, portanto, a exigência da al. b) do art. 79 do RGIT- "descrição sumária dos factos".
Tais exigências abrangem a situação dos autos, em que está em causa a apreensão de um veículo e das mercadorias nele transportadas.
Para se satisfazer a exigência legal deveria indicar-se na decisão, como se disse, em concreto, que norma foi infringida pelo impugnante, pois nos termos daquele auto este terá infringido todas as normas daquele diploma legal e não apenas algumas delas, para, assim, se poder possibilitar uma eficaz defesa por parte da impugnante.
Improcedem, pois, «in totum», as conclusões de recurso.
*
4. – DECISÃO:
Nestes termos acordam os Juízes da secção de contencioso tributário em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
*
Lisboa 22/09/2009
(Gomes Correia)
(Pereira Gameiro)
(Manuel Malheiros)