Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 2495/15.9BEALM |
Secção: | CT |
Data do Acordão: | 03/14/2019 |
Relator: | ANA PINHOL |
Descritores: | CONTRA-ORDENAÇÃO REDUÇÃO COIMA |
Sumário: | I. O pagamento, ainda que parcial, da dívida tributária vale como pedido de redução de coima (artigo 29.º do RGIT) se tiver tem lugar antes de instaurado o processo contra-ordenacional. II. Sempre que nos casos das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º a regularização da situação tributária do agente não dependa de tributo a liquidar pelos serviços, vale como pedido de redução a entrega da prestação tributária ou do documento ou declaração em falta. |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: |
1 |
Decisão Texto Integral: | ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I.RELATÓRIO E..............................................., LDA deduziu junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, na qualidade de arguida, nos termos do artigo 80.º do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), recurso da decisão proferida no processo de contra-ordenação n.º ...................................., instaurado no Serviço de Finanças de Setúbal - …, que lhe aplicou uma coima no valor de € 6.600,00 pela prática da contra-ordenação prevista no n.º 1 do artigo 27.º e al. b) do n.º 1 do art.º 41.º do Código do IVA (CIVA) e punível nos termos do n.º 2 e al. a) do n.º 5 do art.º 114.º e n.º 4 do art.º 26.º do RGIT, relativa ao período 2015-03T. O Tribunal a quo julgou o recurso de aplicação de coima totalmente procedente e, consequentemente, anulou parcialmente a decisão proferida no processo de contra-ordenação n.º ...................................., sendo a condenação da Recorrente reduzida para o montante de € 662,50. Inconformada com o decidido, a Fazenda Pública interpôs recurso, finalizando a sua motivação com as seguintes (transcritas) conclusões: «1. O artigo 30.º, n.º 4, do RGIT, não tem aplicação na situação em apreço, pois ali não se prevê que a entrega parcial da prestação tributária em falta vale como pedido de redução de coima; 2. Nos termos do disposto no artigo 30.º, n.º 4, do RGIT, nos casos das alíneas a) e b), do n.º 1, do artigo 29.º, do RGIT, só a regularização da situação tributária do agente (entrega da totalidade da prestação tributária em falta) vale como pedido de redução de coima; 3. Não prevendo o n.º 4, do artigo 30.º, do RGIT, que a entrega parcial da prestação tributária vale como pedido de redução de coima, decidiu mal a Meritíssima Juíza do Tribunal “a quo” ao determinar que in casu seria de aplicar o disposto nas alíneas a) e b), do n.º 1, do artigo 29.º, do RGIT, o que configura uma situação de erro de julgamento de direito; 4. A coima fixada pela Exma. Senhora Chefe de Finanças de Setúbal …, no valor de € 6 600,00, de acordo com o estabelecido nos artigos 114.º, n.º 2, e 26.º, n.º 4, ambos do RGIT, está correta e deve ser mantida na ordem jurídica, já que não violou o disposto nas alíneas a) e b), do n.º 1, do artigo 29.º, no n.º 4, do artigo 30.º, nem o disposto no n.º 1, do artigo 31.º, todos do RGIT; 5. Mesmo que não se entenda que a coima fixada pela Exma. Senhora Chefe de Finanças de Setúbal …, no valor de € 6 600,00, está correta e deve ser mantida na ordem jurídica, o que se admite como mera hipótese de raciocínio, mas sem conceder, impõe-se reconhecer que a Meritíssima Juíza do Tribunal “a quo”, ao calcular o valor da coima reduzida, incorreu em erro de julgamento de facto e de direito; 6. Nos termos do disposto no artigo 31.º, n.º 1, do RGIT, é considerado montante mínimo, para efeitos das alíneas a) e b), do n.º 1, do artigo 29.º, uma percentagem (10% ou 20%) da prestação tributária devida; 7. In casu, a prestação tributária devida era de € 37 189,55 e não de € 17 500,00 e € 4 500,00, como foi considerado pela Meritíssima Juíza do Tribunal “a quo”, na Sentença ora sob recurso; 8. Ao considerar como prestação tributária devida os montantes das entregas parciais efetuadas pela arguida, a Meritíssima Juíza do Tribunal “a quo” incorreu em erro de julgamento de direito; 9. Por outro lado, ao calcular a coima reduzida em relação a dois períodos distintos (30 dias antes e 30 dias depois da prática da infração) incorreu ainda a Meritíssima Juíza do Tribunal “a quo” em erro de julgamento de facto e de direito; 10. Sendo um dos requisitos do direito à redução de coima previstos no n.º 4, do artigo 30.º, do RGIT, a regularização da situação tributária do agente, deve considerar-se que, in casu, essa regularização só ocorreu com o pagamento efetuado em 19-06-2015, ocorrido portanto, para além dos 30 dias posteriores ao da prática da infração; 11. Porque na situação em apreço a regularização da situação tributária da arguida só ocorreu depois do prazo de 30 dias posteriores ao da prática da infração, a coima reduzida deveria ter sido calculada, unicamente, de acordo com o estatuído no artigo 29.º, n.º 1, alínea b), do RGIT; 12. Assim, o valor da coima reduzida não podia ser de € 662,50, como foi calculado pelo Tribunal “a quo”, devendo antes ser de € 1 859,48 (€ 37 189,55 x 20% x 25%); 13. Mesmo que se entenda que, na situação em apreço, e para efeitos de cálculo da coima reduzida, o valor da prestação tributária devida não é de € 37 189,55 (valor apurado pela arguida), mas sim de € 22 000,00 (valor não entregue no prazo legal), o que também só se admite como hipótese de raciocínio, mas sem conceder, o valor da coima reduzida deveria ser de € 1 100,00 (€ 22 000,00 x 20% x 25%); 14. Perante os erros de julgamento de facto e de direito de que padece não pode a Sentença ora sob recurso manter-se na ordem jurídica; 15. Se vista à luz do entendimento de que na situação sub judice a arguida não podia beneficiar da redução de coima a Sentença ora sob recurso, violou o disposto nos artigos 30.º, n.º 4, 114.º, n.º 2, e 26.º, n.º 4, do RGIT não podendo, por essa razão, 16. Se analisada sob o ponto de vista da hipotética admissibilidade da redução de coima, a Sentença ora sob recurso violou o disposto nos artigos 30.º, n.º 4, 29.º, n.º 1, alínea a), e 31.º, n.º 1, todos do RGIT. Nestes termos e nos mais de Direito aplicável, requer-se a V.as Ex.as se dignem julgar o presente recurso PROCEDENTE, por totalmente provado e, em consequência, ser a douta Sentença ora recorrida, revogada e substituída por douto Acórdão que julgue totalmente improcedente o presente recurso de contraordenação e que mantenha na ordem jurídica a coima fixada pela Exma. Senhora Chefe de Finanças de Setúbal …, no valor de € 6 600,00, ou, se assim não entenderem, que aplique à arguida uma coima reduzida no valor de € 1 859,48, ou, se também assim não entenderem, que aplique à arguida uma coima reduzida no valor de € 1 100,00, tudo com todas as devidas e legais consequências.» ** A Recorrida, E..............................................., LDA, devidamente notificada para o efeito, não apresentou contra-alegações. ** Neste Tribunal Central Administrativo, o MINISTÉRIO PÚBLICO emite Parecer no sentido do provimento do recurso. ** Colhidos os vistos legais, vem o processo submetido à conferência desta Secção do Contencioso Tributário para decisão. ** II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO O objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso. Assim, e face ao teor das conclusões formuladas a solução a alcançar pressupõe a análise da seguinte questão: - Erro de julgamento por errada interpretação e aplicação das alíneas a) e b), do n.º1, do artigo 29.º e n.º4 d artigo 30.º ambos do RGIT. ** III. FUNDAMENTAÇÃO A.DOS FACTOS Na sentença recorrida fixou-se a matéria de facto e indicou-se a respectiva fundamentação nos seguintes termos: «A) Em 7-05-2015, a Recorrente apresentou declaração periódica de IVA pela internet, referente ao período 2015-03T, relativamente à qual foi emitido o seguinte documento de pagamento: "texto integral no original; imagem" "texto integral no original; imagem" (Cfr. fls. 11 dos autos); B) Em 15-05-2015, foi efetuado o pagamento de € 15.189,55 referente à importância a pagar constante em A) (Cfr. fls. 11 dos autos); C) Em 9-06-2015, a Recorrente efetuou o pagamento de € 7.500,00 referente à importância a pagar constante em A) (Cfr. fls. 12 dos autos); D) Em 11-06-2015, a Recorrente efetuou o pagamento de € 10.000,00 referente à importância a pagar constante em A) (Cfr. fls. 13 dos autos); E) Em 19-06-2015, a Recorrente efetuou o pagamento de € 4.500,00 referente à importância a pagar constante em A) (Cfr. fls. 14 dos autos); F) Em 23-06-2015, o Serviço de Finanças de Setúbal – … emitiu em nome da Recorrente o auto de notícia n.º ...................................., com o seguinte teor: "texto integral no original; imagem" "texto integral no original; imagem" "texto integral no original; imagem" (Cfr. fls. 5 e 6 dos autos); G) Na sequência da emissão do auto de notícia referido na alínea antecedente, foi instaurado pelo Serviço de Finanças de Setúbal – …, o processo de contraordenação nº ...................................., tendo a Recorrente sido notificada mediante ofício datado de 24-06-2015 para apresentar defesa (Cfr. fls. 4 e 10 dos autos); H) Em resultado da notificação referida na alínea antecedente, a Recorrente, em 8-07-2015, apresentou defesa, na qual peticiona o seguinte: «Termos em que se requer a V.ª Exa.ª que deve a coima ser fixada aplicada de acordo com a alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RGIT e n.º 4 do art.º 30.º do RGIT, a saber: 12,5 % x 20 % x 22.000 = 550,00 €»(Cfr. fls. 8 e 9 dos autos) I) Em 25-08-2015, a Técnica Responsável do Serviço de Finanças de Setúbal …, emitiu o seguinte parecer no processo n.º ....................................: "texto integral no original; imagem" "texto integral no original; imagem" (Cfr. fls. 20 dos autos); J) Em 25-08-2015, na sequência da defesa e da prolação do parecer referido na alínea antecedente, a Chefe do Serviço de Finanças de Setúbal – … proferiu o seguinte despacho: «Em face da informação que antecede e do alegado no documento de defesa junto aos autos, não existem motivos que justifiquem o arquivamento de processos, devendo os autos prosseguir a sua normal tramitação.» (Cfr. fls. 20 dos autos) K) Em 26-08-2015, a Chefe do Serviço de Finanças de Setúbal – … proferiu a seguinte decisão administrativa de fixação de coima: "texto integral no original; imagem" "texto integral no original; imagem" "texto integral no original; imagem" (Cfr. fls. 24 e 25 dos autos); L) De ofício da Chefe do Serviço de Finanças de Setúbal – …, datado de 26-08-2015, foi a Recorrente notificada a 31-08-2015, via carta registada com aviso de receção, com a referência .........................., da decisão administrativa de aplicação de coima referida na alínea antecedente (Cfr. fls. 23 e 25 dos autos); M) A Recorrente encontra-se registada com o CAE referente a Restauração e atividades similares, sendo proprietária do restaurante denominado “..........................” (cfr. publicação on line de ato societário disponível no Portal MJ e corroborado pelo depoimento das testemunhas de José ..................... e Maria .....................); N) Entre 12 e 27 de maio de 2015, o restaurante “..........................” esteve encerrado por motivos de saúde da sua chefe de cozinha (Artigos 4 e 5 da petição: cfr. depoimentos de José ..................... e Maria .....................); O) Na conta geral 721113, a Recorrente registou a seguinte faturação mensal referente aos meses de janeiro a julho de 2015:
(Cfr. fls. 38 dos autos) P) Em 9-09-2015, a Recorrente apresentou, no Serviço de Finanças de Setúbal – …, o recurso de contraordenação em apreço (Cfr. fls. 26 a 32); *** Inexistem factos alegados não provados com relevo para a decisão da causa. *** A convicção do tribunal fundou-se no teor dos documentos juntos aos autos, os quais não foram impugnados, assim como no depoimento das testemunhas, conforme indicado em cada uma das alíneas. Quanto à prova testemunhal produzida em audiência, o Tribunal valorou o depoimento de José .........................................., uma vez que demonstrou conhecer o gerente da empresa e o estabelecimento comercial em causa nos autos, concretamente, “..........................” por virtude de frequentar, todas as semanas, o aludido restaurante. Depôs, de forma credível, sobre o encerramento do restaurante, precisando que o mesmo esteve fechado por motivo de doença da chefe de cozinha, embora não tenha circunstanciado em termos temporais o aludido encerramento. O Tribunal valorou, outrossim, o depoimento de Maria ................................................., uma vez que demonstrou ter conhecimento direto dos autos, por ser empregada de mesa no restaurante .........................., desde 1985. Sem hesitações, reservas e de forma clara, afirmou que o restaurante esteve encerrado de 12 a 27 de maio de 2015 porque a única cozinheira esteve doente, sendo essa a única altura em que se recorda que o restaurante tenha estado fechado. Testemunhou ainda sobre a altura do mês em que o restaurante fatura mais.» ** B. DO DIREITO O Chefe do Serviço de Finanças de Setúbal …, aplicou à arguida (doravante recorrida) uma coima, no valor de € 6.600,00, imputando-lhe a prática de uma infracção prevista no n.º 1 do artigo 27.º e al. b) do n.º 1 do artigo 41.º do CIVA e punível nos termos do n.º 2 e al. a) do n.º 5 do artigo 114.º e n.º 4 do artigo 26.º do RGIT, relativa ao período 2015-03T. Lisboa, 14 de Março de 2019. (Ana Pinhol) (Tânia Meireles da Cunha) (Isabel Fernandes) |