Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:48/19.1BELLE
Secção:CT
Data do Acordão:05/27/2021
Relator:LURDES TOSCANO
Descritores:ENTREGA DE IMÓVEL
NULIDADES – EXECUÇÃO FISCAL - VENDA
Sumário:Tendo o Recorrente vindo invocar somente nulidades imputadas ao processo de execução fiscal e ao procedimento de venda, que ocorreu no âmbito deste, sendo que delas não cabia conhecer neste incidente de autorização judicial para recurso ao auxílio das autoridades policiais na entrega efectiva de coisa imóvel, nenhuma outra ilegalidade sendo apontada à decisão, o recurso está votado ao insucesso.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I.          RELATÓRIO

A….., com os sinais nos autos, veio, em conformidade com os artigos 279.º, 280.º, n.º 1 e 283.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), interpor recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé a qual autorizou, ao abrigo dos artigos 757.º, n.os 3 e 4 do CPC, e artigo 34.º, n.º 2, da CRP, o auxilío das autoridades policiais para a entrega efetiva do bem imóvel “Prédio Misto, sito em Vale da Rosa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Faro sob o n.º ….., composto por prédio urbano destinado a habitação, inscrito na matriz predial sob o artigo ….. e prédio rústico inscrito na matriz predial sob o artigo ….., secção AP, ambos da freguesia de Estoi, concelho de Faro.”. Mais, aquela sentença, condenou o órgão de execução fiscal em custas, pelo mínimo legal (cfr. artigo 539.º, do CPC, e artigo 7.º, n.º 4 e Tabela II, do RCP).

O Recorrente termina as alegações de recurso formulando as conclusões seguintes:

A) O douto tribunal recorrido deveria ter negado a requerida autorização de auxílio das autoridades policiais para entrega efetiva do imóvel sub iudice. Dado que,

B) O bem em causa constitui casa de habitação do executado e sua mulher. E,

C) Esta, como resulta do probatório que serve de motivação da sentença apenas foi notificada da penhora (alínea D) dos factos provados), na qualidade de cônjuge do executado.

D) Não foi a cônjuge do executado cita/ notificada para proceder á separação judicial de bens. Nem,

E) O foi para exercer o direito de preferência. E,

F) Também não o foi do despacho de verificação e graduação de créditos.

G) O bem sub iudice é bem comum.

H) a divida exequenda é proveniente, em parte, de dividas de IRS elMI.

I) A cônjuge do executado, I….., não (nunca) foi citada/notificada como executada.

J) A cônjuge do executado nunca deu autorização para a venda do imóvel em causa.

L) O bem "vendido" para além da casa de habitação do casal é o local de trabalho (uma oficina de serralharia) do executado e mais três assalariados. Sendo dai,

M) Que todos auferem salário para prover o seu sustento e das suas famílias.

N) Na factualidade que a douta sentença recorrida deu como provada não consta que os fatos supra referidos de D) a F) não se tenham verificado. Isto é,

O) Não resulta o contrário do afirmado de D) a F) destas conclusões.

P) Também do elenco probatório não resulta que o bem em causa não é um bem comum.

Q) Igualmente não resulta do dito probatório que a divida exequenda resulta, em parte de IRS e IMI. Nem,

R) Que a cônjuge do executado tenha sido citada/notificada como executada. E,

T) Da factualidade provada não consta que o requerimento para entrega do bem tivesse justificado o motivo da necessidade de entrega. Mas,

U) Resulta da factualidade provada que o executado tinha cônjuge que habita com ele.

V) O tribunal deve sindicar a legalidade das questões que lhe são colocadas.

X) Do probatório elencado na douta sentença não resulta que a lei tenha sido cumprida. Resulta sim,

Z) Exatamente ao contrário.

AA) A citação referida em D) dos factos provado, no processo de execução fiscal, não constitui uma verdadeira citação nos termos do disposto nos artigos 188º a 193º do CPPT. Nomeadamente,

BB) no disposto no artigo 189º nº 1, 190 nº 1e2, 191º, 192 e 193º, máxime nº 2 e 4 todos do CPPT, tendo os mesmos sido violados pela sentença recorrida. Pois,

CC) Tal violação consubstancia ineficácia da decisão, nos termos do disposto nos artigos 77º nº 6 da LGT e nº 1 do artigo 36º do CPPT. E ainda,

DD) Nulidade prevista no nº 1 alínea a) do artigo 165º do CPPT. Pelo que,

EE) São ineficazes todos os atos praticados pela A.T. sem a notificação/ citação da cônjuge do executado e também executada que contendam com os seus interesses e direitos legalmente protegidos bem como com o seu direito de defesa ( Cfr. também artigos 3º e 4º do CPC).

FF) É que, de acordo com a doutrina e jurisprudência, a nulidade por falta da citação não se limita aos casos em que a mesma tem o executado por destinatário. Ela,

GG) Estende-se aos casos de falta da citação do cônjuge do executado, nos termos do artigo 239º do CPPT ( cfr. Neto, Serena Cabrita, Trindade, Carla Castelo, Contencioso Tributário, Vol. II, Almedina, Coimbra, 2017, pag. 671; e Martine Jesuíno, Coimbra, 2015, pg.263. Na jurisprudência AC. Do STA de 30/10/2013, proferido no âmbito do processo nº 01312/13, e AC do TCA Norte de 10/10/2013 proferido no âmbito do processo nº 0000194/13.5BEPNF, disponíveis em www.dgsi.pt. E,

HH) Constituem pressupostos cumulativos da sua ocorrência (nulidade insanável), a falta de citação e o prejuízo para defesa do executado.

II) No caso subs iudice os dois pressupostos estão preenchidos. Assim,

JJ) Violou a douta sentença recorrida, entre outros, os normativos legais supra identificados. Nomeadamente,

LL) Os artigos 3º e 4º do CPC, os artigos 36º nº 1, 165nº 1 al a), 188º a 193º, 220º e 239º todos do CPPT e artigo 77º nº 6 da LGT.

Termos em que com o douto suprimento deve a sentença recorrida ser revogada, por outra que declare não autorizar o auxílio das autoridades policiais, para entrega do bem sub iudice, dado que A.T. não ter feito prova de que cumpriu a legalidade na sua decisão da entrega do bem e, tinha o douto Tribunal recorrido, o dever/ obrigação de se certificar de que tal violação ocorrera.

Contudo V. Exas. Collendos Juízes Conselheiros farão a HABITAL JUSTIÇA!


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O Recorrido M….. apresentou contra-alegações, pugnando pela manutenção da sentença recorrida e pela consequente prossecução do procedimento de entrega do imóvel.


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Cumpre referir que o recurso foi interposto para o Supremo Tribunal Administrativo. O Ministério Público do STA emitiu parecer no sentido da incompetência daquele Tribunal em razão da hierarquia para conhecer do recurso. Em resposta, o Recorrente alegou estar em crise somente matéria de direito, o que determinaria a competência do STA ao abrigo da alínea b), do art. 26.º, do ETAF e do n.º 1, do art. 280.º do CPPT.

Por decisão datada de 13 de Julho de 2020, o Supremo Tribunal Administrativo, porquanto o recurso versa sobre matéria de facto e de direito, julgou procedente a excepção de incompetência em razão da hierarquia, sendo competente este Tribunal Central Administrativo Sul.


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Notificado, o Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso, porquanto a sentença recorrida não merece censura alguma.


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Sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é pelas conclusões com que a recorrente remate a sua alegação (art. 639º do C.P.C.) que se determina o âmbito de intervenção do referido tribunal.

De outro modo, constituindo o recurso um meio impugnatório de decisões judiciais, neste apenas se pode pretender, salvo questões de conhecimento oficioso, a reapreciação do decidido e não a prolação de decisão sobre matéria não submetida à apreciação do Tribunal a quo.

Assim, atento o exposto e as conclusões das alegações do recurso interposto, temos que no caso concreto, a questão fundamental a decidir reconduz-se a saber se este incidente é o meio próprio para se conhecer das nulidades imputadas ao processo de execução fiscal e ao procedimento de venda, que ocorreu no âmbito deste, e se a sentença recorrida errou no seu julgamento quando ordenou o arrombamento/entrega do imóvel.


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II. FUNDAMENTAÇÃO

II.1. De facto

A sentença recorrida deu por provados os seguintes factos:

A) Em 28-02-2012, no âmbito do processo de execução fiscal n.º ….. e apensos, instaurado contra A….., foi penhorado o prédio misto, propriedade do executado, sito em Vale da Rosa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Faro, freguesia de Estoi sob o n.º ….., composto por prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo ….. e prédio rústico inscrito na matriz predial sob o artigo ….., secção AP, ambos da freguesia de Estoi, concelho de Faro (cfr. fls. 6 do Documento n.º 004486537 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);

B) Em 12-03-2012, através da AP. 2293, foi registada na Conservatória do Registo Predial de Faro, a penhora identificada em A) supra, (cfr. fls. 7 a 9 do Documento n.º 004486537 dos autos, idem);

C) Por ofício n.º ….., de 28-03-2012, do Serviço de Finanças de Faro, o executado foi notificado/citado da penhora identificada em A) supra, e de que fora nomeado fiel depositário (cfr. fls. 10 a 11 do Documento n.º 004486537 dos autos, ibidem);

D) Por ofício n.º ….., de 28-03-2012, do Serviço de Finanças de Faro, a cônjuge do executado foi notificada/citada da penhora identificada em A) supra (cfr. fls. 12 a 13 do Documento n.º 004486537 dos autos, ibidem);

E) Em 23-04-2013, foi proferido despacho pelo Chefe do Serviço de Finanças de Faro, em regime de substituição, a determinar a venda do bem identificado em A) supra, a realizar, tendo designado como data limite para aceitação das licitações o dia 05-07-2013 (cfr. fls. 14 do Documento n.º 004486537 dos autos, ibidem);

F) Por ofício n.º ….., de 29-04-2013, do Serviço de Finanças de Faro, foi notificado o executado e fiel depositário dos bens penhorados, de que se iria proceder à venda por meio de leilão electrónico (cfr. fls. 15 a 16 do Documento n.º 004486537 dos autos, ibidem);

G) Em 05-07-2013 foi realizada a venda judicial do imóvel identificado em A), tendo o mesmo sido adjudicado ao preferente Sr. M….. (cfr. fls. 21 do Documento n.º 004486537 dos autos, ibidem);

H) Em 05-07-2013, o adjudicatário efectuou o depósito do preço da venda e pagou os impostos devidos pela transmissão (cfr. fls. 17 a 22 do Documento n.º 004486537 dos autos, ibidem);

I) Em 15-07-2013, o executado entregou no Serviço de Finanças de Faro, requerimento de anulação de venda (cfr. fls. 23 a 29 do Documento n.º 004486537 dos autos, ibidem);

J) Em 09-08-2013, foi proferido despacho pelo Director de Finanças de Faro a indeferir o pedido de anulação de venda identificado em I) supra (cfr. fls. 35 a 36 do Documento n.º 004486537 dos autos, ibidem);

K) Por ofício n.º ….., de 03-09-2013, do Serviço de Finanças de Faro, o executado foi notificado da decisão identificada em J) supra e, de que da mesma podia apresentar reclamação nos termos do disposto no artigo 276.º do CPPT (cfr. fls. 37 a 40 do Documento n.º 004486537 dos autos, ibidem);

L) Por ofícios n.ºs ….. e ….., de 03-09-2013, foram os mandatários do executado notificados da decisão identificada em J) supra e, de que da mesma podiam apresentar reclamação nos termos do disposto no artigo 276.º do CPPT (cfr. fls. 41 a 48 do Documento n.º 004486537 dos autos, ibidem);

M) Em 07-10-2013, o adquirente M….. requereu ao Chefe do Serviço de Finanças de Faro a entrega efectiva do imóvel adquirido (cfr. fls. 49 a 50 do Documento n.º 004486537 dos autos, ibidem);

N) Em 21-10-2013, o Executado e fiel depositário foi notificado para no prazo de 5 dias entregar as chaves do imóvel identificado em A) supra, no Serviço de Finanças de Faro (cfr. fls. 53 a 54 dos autos, ibidem);

O) Em 12-11-2013, foi proferido despacho pelo Chefe do Serviço de Finanças de Faro, a solicitar a presença da GNR para se proceder ao arrombamento do imóvel identificado em A) supra, no dia 22 de Novembro, pelas 11 horas (cfr. fls. 55 do Documento n.º 004486537 dos autos, ibidem);

P) Em 26-11-2013, o executado apresentou impugnação judicial neste Tribunal, na qual requereu que fosse declarada nula a venda do imóvel identificado em A) supra, a qual correu termos sob o processo n.º 921/13.0BELLE (cfr. consulta do SITAF, fls. 1 a 7 da Impugnação Judicial n.º 921/13.0BELLE, ibidem);

Q) Por ofício n.º ….., de 04-12-2013, do Serviço de Finanças de Faro, o adquirente M….., foi notificado do despacho proferido em 03-12-2013, pelo Chefe daquele Serviço de Finanças, de que dado estar a decorrer impugnação judicial apresentada pelo executado junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, só poderia entregar as chaves do prédio adquirido depois da sentença judicial, e de que poderia reclamar daquela decisão, nos termos do artigo 276.º do CPPT (cfr. fls. 61 do Documento n.º 004486537 dos autos, ibidem);

R) Em 27-12-2013, o adquirente M….., apresentou no Serviço de Finanças de Faro, reclamação nos termos do artigo 276.º do CPPT, do despacho identificado em Q) supra (cfr. fls. 58 a 60 do Documento n.º 004486537 dos autos, ibidem);

S) A reclamação identificada em R) supra, correu termos neste Tribunal sob o processo n.º 36/14.4BELLE (facto que se extrai do PEF e da consulta ao SITAF);

T) Em 16-01-2014, foi proferida sentença a rejeitar liminarmente a impugnação judicial identificada em P) supra, por se verificar a existência de erro na forma de processo, insusceptível de sanação (cfr. consulta do SITAF, fls. 59 a 63 da Impugnação Judicial n.º 921/13.0BELLE, ibidem);

U) Em 31-03-2014, foi proferida sentença a julgar improcedente a reclamação judicial identificada em R) supra (cfr. fls. 83 a 93 do Documento n.º 004486537 dos autos, ibidem);

V) Em 18-06-2014, foi proferido Acórdão pelo Supremo Tribunal Administrativo no processo n.º 566/14, o qual concedeu provimento ao Recurso, tendo revogado a sentença proferida no processo de reclamação n.º 36/14.4BELLE e, em substituição julgou a reclamação judicial procedente e anulou a decisão do Chefe do Serviço de Finanças de Faro que determinou a suspensão da entrega efectiva (cfr. fls. 111 a 124 do Documento n.º 004486537 dos autos, ibidem);

W) Em 25-09-2014, o executado foi notificado do despacho proferido pela Chefe do Serviço de Finanças de Faro em 23-09-2014, para no prazo de 5 dias entregar as chaves do imóvel identificado em A) supra, com a advertência de que, não o fazendo naquele prazo, seria solicitado o auxílio das forças policiais (cfr. fls. 126 a 128 do Documento n.º 004486537 dos autos, ibidem);

X) Em 15-10-2014, o executado apresentou no Serviço de Finanças de Faro, oposição à execução para entrega de coisa certa, dirigida ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, na qual se opunha à ordem de entrega das chaves do imóvel identificado em A) supra (cfr. fls. 129 a 141 do Documento n.º 004486537 dos autos, ibidem);

Y) A oposição identificada em X) supra, correu termos neste Tribunal sob o processo n.º 893/14.4BELLE (facto que se extrai da consulta ao SITAF);

Z) Em 17-12-2014, foi proferido Acórdão pelo Supremo Tribunal Administrativo no Recurso n.º 362/14-30, a negar provimento ao recurso e a confirmar a decisão proferida no processo de impugnação judicial n.º 921/13.0BELLE, identificado em T) supra (cfr. fls. 194 a 202 do Documento n.º 004486537 dos autos, ibidem);

AA)  Em 28-01-2015, foi proferida sentença no processo de oposição n.º 893/14.4BELLE, a indeferir liminarmente a petição inicial identificada em X) supra, por “existência da exceção dilatória de erro na forma do processo” (cfr. consulta do SITAF, fls. 60 a 65 do processo de oposição n.º 893/14.4BELLE, ibidem);

BB)  Em 19-05-2016, foi proferido Acórdão pelo Tribunal Central Administrativo Sul no processo n.º 09192/15, a negar provimento ao recurso e a confirmar a decisão proferida no processo de oposição n.º 893/14.4BELLE, referida em AA) supra (cfr. fls. 167 a 182 do Documento n.º 004486537 dos autos, ibidem);

CC)  Em 26-09-2018, foi proferido Acórdão pelo Pleno do Supremo Tribunal Administrativo, no Processo n.º 1365/17-50-17, a julgar findo o recurso por oposição de julgados, do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul identificado em BB) supra, por não existir entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento, contradição sobre a mesma questão fundamental de direito (cfr. fls. 150 a 166 do Documento n.º 004486537 dos autos, ibidem);

DD)  O Acórdão identificado em DD) supra foi notificado ao mandatário do executado por correio registado sob n.º ….., entregue em 02-10-2018 (cfr. consulta do SITAF, fls. 281 do processo de oposição n.º 893/14.4BELLE e site dos CTT, ibidem);

EE)  Em 30-06-2017, executado intentou neste Tribunal Acção para Reconhecimento de um Direito ou interesse Legítimo em Matéria Tributária, a que coube o processo n.º 351/17.5BELLE, na qual requer a anulação da venda do prédio identificado em A) supra (facto que se extrai da consulta ao SITAF);

FF)  Em 11-09-2018, foi proferida sentença no processo n.º 351/17.5BELLE, a rejeitar a acção (cfr. consulta do SITAF, fls. 113 a 119 do processo n.º 351/17.5BELLE, ibidem);

GG) Em 02-10-2018, o executado interpôs recurso judicial a decisão proferida no processo n.º 351/17.5BELLE (cfr. consulta do SITAF, fls. 124 do processo n.º 351/17.5BELLE, ibidem);

HH)  O executado tem a sua residência no imóvel identificado em A) supra (cfr. fls. 238 dos autos, ibidem);

II) O executado não procedeu até ao momento à entrega efectiva do imóvel vendido (cfr. informação de fls. 1 a 5 do Documento n.º 004486537 dos autos, ibidem);


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A convicção do Tribunal assentou “(…) no teor dos documentos junto aos autos (…).


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Dá-se como provado a seguinte factualidade, ao abrigo do artigo 662.º do CPC, com relevo para a decisão do recurso:

JJ) No Proc. 351/17.5BELLE, em 17/12/2019, no STA foi proferido Acórdão, tendo sido negado provimento ao recurso, conforme consulta do referido processo no SITAF.

KK)  O recorrente deduziu reclamação, que correu termos sob o nº 507/19.6BELLE, contra o despacho proferido pela Chefe do Serviço de Finanças de Faro, em regime de substituição, em 13 de Junho de 2019, que determinou a data e hora da entrega efectiva do prédio misto vendido no processo de execução fiscal n.° ….. e apensos, sito em Vale da Rosa, freguesia de Estoi, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.° ….., composto por prédio urbano inscrito na matriz predial sob o art. ….. e o prédio rústico inscrito na matriz predial sob o art. ….., secção AP, ambos da freguesia de Estoi, concelho de Faro, para o dia 11 de Julho de 2019, tendo o TAF de Loulé, por decisão de 14 de Janeiro de 2020, i) absolvido a Fazenda Pública dos pedidos de declaração de nulidade do processo de execução fiscal n.° ….. e outros, do pedido de declaração de nulidade dos despachos proferidos em 21.10.2013 e em 25.09.2014 e ii) julgado a reclamação improcedente, , conforme consulta do referido processo no SITAF.

LL)  Interposto recurso da decisão referida na alínea anterior, por Acórdão do TCAS de 17/09/2020, foi negado provimento ao recurso, conforme consulta do referido processo no SITAF.


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II.2. De Direito

A decisão de que se recorre tem o seguinte teor:

«Determinam os n.ºs 2 e 3 do artigo 256.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), sob a epígrafe “Formalidades de venda”, aditados pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, que:

“2 – O adquirente pode, com base no título de transmissão, requerer ao órgão de execução fiscal, contra o detentor e no próprio processo, a entrega dos bens.

3 – O Órgão de execução fiscal pode solicitar o auxílio das autoridades policiais para a entrega do bem adjudicado ao adquirente”.

Assim, é ao órgão de execução fiscal que cabe decidir o incidente de entrega efectiva do bem imóvel.

Porém, quando para concretizar a entrega haja necessidade de arrombamento de portas de local utilizado como habitação, a solicitação das autoridades policiais carece de prévio despacho judicial, nos termos do artigo 757.º, n.º 4 do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi do artigo 2.º, alínea e) do CPPT.

Efectivamente, por força do disposto no n.º 2 do artigo 34.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), “a entrada no domicílio dos cidadãos contra a sua vontade só pode ser ordenada pela autoridade judicial competente, nos casos e segundo as formas previstas na lei”.

Tal entendimento tem sido sufragado pela jurisprudência, nomeadamente, no Acórdão do STA, de 20-11-2010, Proc. n.º 0631/10 e no Acórdão do TCA Sul, de 18-09-2014, Proc. n.º 07035/13, ambos disponíveis in www.dgsi.pt.

Também na doutrina Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, Volume IV, 6.ª Edição, 2011, Áreas Editora, pág. 151, defende que: “A Lei n.º 55-A/2010 veio aditar os n.ºs 2 e 3 ao artigo 256.º em que se prevê um regime especial para concretização da entrega dos bens simplificado e se consubstancia num incidente iniciado por um requerimento de entrega de bens contra o detentor, a apresentar ao órgão da execução fiscal e a tramitar no próprio processo de execução fiscal, podendo aquele solicitar o auxílio das autoridades policiais para entrega do bem adjudicado ao adquirente. No entanto, quando para concretizar a entrega haja necessidade de arrombamento de portas de local que seja utilizado como habitação, parece que não se poderá dispensar a intervenção do tribunal, por força do disposto no art. 34.º, n.º 2 da CRP em que se estabelece que «a entrada no domicílio dos cidadãos contra sua vontade só poderá ser ordenada pela autoridade judicial competente, nos casos e segundo as formas previstas na lei”.

(…) Cabe ao órgão da execução fiscal, em primeira linha, praticar os actos necessários para concretizar a entrega da coisa ao adquirente (…) inclusivamente a requisição do auxílio da força pública, como resulta do art. 151.º, n.º 1 (…), e dos n.ºs 2 e 3 do art. 256.º, com a excepção dos actos que impliquem entrada em domicílio contra a vontade do seu detentor”.

Por fim, dispõe o artigo 828.º do CPC que: “O adquirente pode, com base no título de transmissão a que se refere o artigo anterior, requerer contra o detentor, na própria execução, a entrega dos bens, nos termos prescritos, no artigo 861.º, devidamente adaptados”.

No caso vertente, decorre do probatório que o imóvel em referência foi penhorado em 28-02-2012 e, posteriormente, vendido, através da modalidade de “leilão electrónico”, em 05-07-2013, ao Sr. M….. (cfr. alíneas A) e G) do probatório).

Resulta, também, do probatório que o imóvel objecto de alienação é utilizado como habitação do executado, bem como, que o mesmo ainda não foi entregue ao adjudicatário, apesar dos pedidos formulados pelo mesmo nesse sentido, e das diversas diligências tendentes à entrega imediata do bem imóvel, levadas a efeito pelo órgão de execução fiscal desde 21-10-2013 (cfr. alíneas M), N), W), HH) e II) do probatório).

Mais resulta dos autos, que no processo de impugnação judicial n.º 921/13.0BELLE, já foi proferida decisão judicial transitada em julgado, que apreciou a possibilidade da anulação da venda, tendo concluído que tal não era possível, tendo a mesma sido confirmada pelo Supremo Tribunal Administrativo, no Acórdão proferido no Recurso n.º 362/14-30 (cfr. alíneas T) e Z) do probatório).

Deste modo, a legalidade da venda deixou de poder ser sindicada com vista à sua anulação.

Sendo que, a pendência da Acção para Reconhecimento de um Direito ou Interesse Legítimo em Matéria Tributária, de que foi interposto recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, não contende com a entrega do imóvel ao adjudicatário (cfr. alíneas FF) e GG) do probatório).

Assim, face ao disposto nas normas legais supra citadas e perante a factualidade resultante do processo de execução fiscal, constante do probatório, a Chefe do Serviço de Finanças de Faro, para proceder à entrega efectiva do bem imóvel ao adjudicatário, carece de despacho judicial prévio para solicitar o auxílio das autoridades policiais.

Nestes termos, e ao abrigo dos artigos 757.º, n.º 3 e 4 do CPC e artigo 34.º, n.º 2 da CRP, autorizo o auxílio das autoridades policiais para a entrega efectiva do seguinte bem imóvel:

“Prédio misto, sito em Vale da Rosa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Faro sob o n.º ….., composto por prédio urbano destinado a habitação, inscrito na matriz predial sob o artigo ….. e prédio rústico inscrito na matriz predial sob o artigo ….., secção AP, ambos da freguesia de Estoi, concelho de Faro”


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Vem agora o Recorrente, interpor o presente recurso jurisdicional alegando nulidades imputadas ao processo de execução fiscal e ao procedimento de venda, que ocorreu no âmbito deste.

Vejamos.
Nos termos do disposto no n.º3 do art.º256.º do CPPT,
“o órgão da execução fiscal pode solicitar o auxílio das autoridades policiais para entrega do bem adjudicado ao adquirente”.

Sucede que, estando em causa um domicílio, entendeu o órgão da execução fiscal colher prévio despacho judicial antes de solicitar o auxílio das autoridades policiais para efectivar a posse do imóvel e concretizar a sua entrega ao adquirente, conforme por este solicitado na execução, nos termos previstos no artº 757º do CPC, disposição essa referente à realização da penhora de coisas imóveis.

A decisão recorrida deferiu o requerido, autorizando o auxílio das autoridades policiais, com vista a concretizar a posse efectiva do imóvel adjudicado, nos termos requeridos pelo Chefe de Finanças.


«Ora, este incidente não é o próprio para o executado deduzir qualquer oposição jurídica à pretensão de entrega efectiva do imóvel. Mesmo estando o processo executivo inquinado de nulidades insanáveis (art.º165.º, n.º1 do CPPT), o que o executado deve fazer é reagir contra elas no processo principal e não neste incidente e, caso se não conforme com o ali decidido, solicitar a sindicância do competente tribunal tributário de 1.ª instância através do meio processual da reclamação judicial, prevista e regulada no art.º276.º e seguintes, do CPPT.»
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No presente caso, e conforme probatório, o recorrente já apresentou reclamação contra o despacho proferido pela Chefe do Serviço de Finanças de Faro, em regime de substituição, em 13 de Junho de 2019, que determinou a data e hora da entrega efectiva do prédio misto vendido no processo de execução fiscal (cfr. alíneas KK) e LL), requerimento de anulação de venda (cfr. alínea I), impugnação judicial (cfr. alínea P), oposição à execução para entrega de coisa certa, na qual se opunha à ordem de entrega das chaves do imóvel (cfr. alínea X) e acção para reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária (cfr. alínea EE).

No entanto, tal não significa que o recorrente não pudesse sindicar a decisão sob recurso.

Podia, mas o objecto do recurso teria de limitar-se à apreciação da legalidade dos pressupostos de que depende a requisição da força pública: que seja oposta alguma resistência, ou haja receio justificado de oposição de resistência, ou quando seja necessário o arrombamento da porta e a substituição da fechadura para efectivar a entrega do imóvel (artº 757º, nºs. 2 e 3, do CPC).

Tendo o Recorrente vindo invocar somente nulidades imputadas ao processo de execução fiscal e ao procedimento de venda, que ocorreu no âmbito deste, sendo que delas não cabia conhecer neste incidente de autorização judicial para recurso ao auxílio das autoridades policiais na entrega efectiva de coisa imóvel, nenhuma outra ilegalidade sendo apontada à decisão, o recurso está votado ao insucesso.


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III – DECISÃO

Termos em que, acordam os Juízes da 1ª Subsecção da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso, e em consequência, manter a sentença recorrida.

Custas pelo recorrente, sem prejuízo de eventual apoio judiciário.

Registe e notifique.

                                                             Lisboa, 27 de Maio de 2021

[O Relator consigna e atesta, que nos termos do disposto no artigo 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13.03, aditado pelo artigo 3.º do DL n.º 20/2020, de 01.05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão as restantes Desembargadoras integrantes da formação de julgamento, as Desembargadoras Ana Cristina Carvalho e Catarina Almeida e Sousa]

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[1] Acórdão do TCAN de 25/02/2016, Proc. 03547/14.8BEPRT, disponível em www.dgsi.pt