Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:287/13.9BEALM
Secção:CT
Data do Acordão:12/07/2021
Relator:MARIA CARDOSO
Descritores:FALTA DE NOTIFICAÇÃO DA LIQUIDAÇÃO NO PRAZO DE CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO
NOTIFICAÇÃO ELECTRÓNICA VIACTT
CAUSAS DE SUSPENSÃO DO PRAZO DE CADUCIDADE
Sumário:I. A doutrina e jurisprudência maioritárias consideram que a nulidade da sentença por falta de especificação dos fundamentos de facto só ocorre quando faltem em absoluto os fundamentos de facto em que assentou a decisão, não ocorrendo quando a fundamentação é escassa, incompleta, não convincente, deficiente ou errada.
II. Os documentos emitidos pela AT, não podem servir de prova de que a Impugnante foi notificada das liquidações de imposto e de juros através do Sistema ViaCTT, porquanto tais “prints” informáticos, são elaborados pela própria Administração Tributária para efeitos internos e, por isso, não provam, por si só, a realidade fáctica neles referida.

III. A finalidade que a lei pretende atingir com a exigência de carta registada é atingida quando, não obstante o não cumprimento dessa formalidade, se prove que o destinatário tomou conhecimento do acto notificado, pelo que a formalidade de carta registada degrada-se em não essencial e dela não resulta a invalidade da notificação.

IV. Embora a AT não cumpra todas as formalidades da notificação da liquidação, e ainda assim, resulta demonstrado que a notificação chegou ao poder do destinatário, esta não deve ser anulada porque da violação do preceito legal não resulta qualquer lesão efectiva, real dos interesses protegidos pelo preceito legal.

V. O prazo de caducidade da liquidação de 4 anos, que se corresse ininterruptamente, teria terminado em 31/12/2012, deve ser acrescido de 89 dias (inspecção externa) e de mais 343 (pedido de revisão à matéria colectável), mercê das duas causas autónomas de suspensão do prazo de caducidade, previstas no n.º 1 do artigo 46.º, n.ºs 1 e 2, alínea e) da LGT.

VI. Como pressuposto da tributação pelo lucro real, para que a determinação do rendimento líquido possa servir como base tributável, a lei atribui ao contribuinte deveres de cooperação, realçando-se a obrigação fiscal de manter um completo registo de todas as operações, a fim de permitir a determinação do rendimento pelo contribuinte e o controlo pela Administração tributária dessa mesma determinação.

VII. A não declaração de todos os custos e proveitos obtidos ou incorridos em determinado exercício é que constitui violação do princípio da tributação real, porque se não foram declarados todos os proveitos, o lucro que vier a apurar-se não corresponde ao lucro real desse exercício.

Votação:Unanimidade
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a 1.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO

1. J. F. M. – C. UNIPESSOAL, com os demais sinais nos autos, vem recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Almada, que julgou improcedente a impugnação judicial que deduziu contra a liquidação adicional de Imposto sobre as Pessoas Colectiva (IRC), referente ao exercício de 2008 e respectivos Juros compensatórios, no montante global €13.536,02.

2. A Sociedade Recorrente apresentou as suas alegações e, após convite ao aperfeiçoamento das conclusões, depois do recebimento dos autos neste Tribunal Central Administrativo Sul, formulou as seguintes conclusões:

«CONCLUSÕES

Da Ilegalidade dos Actos Tributários Controvertidos

•i) Consubstanciada na preterição do princípio da participação na decisão

Os actos tributários controvertidos estão feridos de ilegalidade por violação de norma/princípio com consagração constitucional, porquanto preteriram a audição prévia da aqui Impugnante e como tal atentaram contra o princípio da participação, previsto no artºs 267º da CRP, 60º da LGT e 60º do RCPIT. Efectivamente, sem mais, i.é, sem darem oportunidade ao sujeito passivo de se pronunciar quanto a facto prejudicial á sua esfera, corrigiram a liquidação do IRC de 98, agravando o resultado do sujeito passivo.

• ii) Consubstanciada na ineficácia da liquidação por falta de notificação

Atento o disposto no artº36º do CPPT, com referência ao artº268º, nº3 da CRP, os actos em matéria tributária que afectem os direitos do sujeito passivo carecem de lhe ser notificados, o que, atento o artº38º, nº1 do CPPT, terá de ser feito através de carta registada com A/R sob pena de serem ineficazes - verificado que está, que não existiu tal notificação, são ineficazes as liquidações ora impugnadas e ainda que aceitássemos a notificação electrónica - que por mero exercício académico se concebe - nos termos do n.10, do artº39º do CPPT, só no 25º dia posterior ao envio da mesma - 17.12.2012 - se consideraria notificada - logo 11.1.2013.

Efectivamente a administração tributária não notificou validamente o sujeito passivo dentro do prazo de 4 anos, até final de 2012, ou fez prova dessa notificação dentro do prazo prescricional - cfr. prescreve o artigo 46º da LGT -

• iii) Consubstanciada na caducidade do direito de liquidação

Conforme plasmado supra, as liquidações sub judice reportam-se a suposto IRC e juros de 2008, não tendo até fim de 2012 sido notificadas à aqui Impugnante, pelo que se encontra caduco o direito da AT liquidar - já que a presumida notificação electrónica ocorreu em 11.1.2013, decorrido, pois o prazo prescricional - cfr. art.º46º da LGT.

• iv) Consubstanciada na violação do princípio constitucional da tributação do lucro real e da fundamentação dos atos

A regra de que a tributação incide fundamentalmente sobre o seu rendimento real encontra-se consagrada no nº2 do artº104º da Constituição da República Portuguesa, sendo certo que esse rendimento, até prova em contrário, é o que resulta da declaração do contribuinte. A faculdade que a Administração tem de alterar os valores declarados só pode ser utilizada em situações excepcionais, nomeadamente quando seja de todo impossível comprovar e quantificar directa e exactamente os elementos indispensáveis à determinação dos mesmos.

O entendimento dos Serviços de Fiscalização constitui afronta, pois, ao princípio constitucional da tributação do lucro real - n.º2 do art.º104º da C.R.P., o que leva a liquidações viciadas, sendo consequentemente anuláveis [O que se verifica no caso sub judice] - bem como ao princípio constitucional e fiscal da obrigatoriedade de fundamentação de todos os actos que afectem a situação do sujeito passivo – artºs 266º e 268º da CRP, 36º do CPPT e artº 60º e ss da LGT.

Já que pretendem tributar o prejuízo e não o lucro. Efectivamente,

v.) Compulsados os autos, embora não conste da douta sentença e que deverá ser acrescentado aos factos provados, resulta assente/provado que a Impugnante no dia 3 de Janeiro de 2013 tomou conhecimento dos docs. nºs 1, 2 e 3, junto com a sua p.i. de Impugnação, por lhe haverem sido deixados no seu domicílio fiscal com datas de 18 de Dezembro de 2012,19 de Dezembro de 2012 e 20 de Dezembro de 2012.

Como bem se vê dos referidos documentos, os serviços da administração tributária procederam a citação com hora certa – artº 240º nº4, do CPC por, alegadamente, em 20 de Dezembro de 2012 ninguém se encontrar presente para receber a notificação, alegando haverem sido afixados/ depositados tais elementos na caixa do correio.

Falso, como bem se vê, já que os únicos documentos que a Impugnante teve conhecimento, por haverem sido depositados na sua caixa de correio, são os aqui juntos sob os n.ºs 1, 2 e 3 - resultando assente/provado que nunca receberam quaisquer outros.

Resulta igualmente assente/provado que é do conhecimento da administração tributária que a ora Impugnante exercia a sua actividade no seu stand e escritório sito na Rua D. Nuno Álvares Pereira, 260, 28, Quinta do Conde (ex. Anexo IV, folha 16, do projecto de decisão) - local onde se dirigiram aquando do início da acção inspectiva.

Como resulta assente/provado que a administração tributária sabia que a Impugnante já se encontrava à data representada por mandatário forense -subscritor de pedido de revisão à matéria colectável e presente na Comissão de revisão, fls... dos autos.

Poderia pois a AT, ainda que atropelando a notificação postal, avançando para a notificação por contacto pessoal, fazê-lo onde sabia que encontrava o legal representante da Impugnante ou um seu colaborador - o que não fez.

Refere a MMa Juiz a quo sob K) dos factos provados que a demonstração da liquidação de IRC de 2008 foi notificada à impugnante através da caixa postal electrónica via CTT em 17/12/2012 - Tal não é verdade e por isso deve ser dado como não provado, pois não resulta de fls.14 e 19 dos autos, como não resulta da lei. Efectivamente,

O sujeito passivo não acedeu á sua caixa postal e dispõe o n. 10, do artigo 39º do CPPT; "A notificação considera-se efectuada no 25º dia posterior ao seu envio, caso o contribuinte não aceda à caixa postal electrónica em data anterior".

Não poderia a administração tributária haver passado tão pouco à citação nos termos do artº240º do CPC, havendo que proceder nos termos do disposto nos artºs 382 e ss do CPPT e art.º239º do CPC, o que a AT não fez [Temática adiante melhor explicitada]. Com efeito,

Resulta assente/provado que a liquidação do tributo exigida à aqui Impugnante não foi notificada na forma legal e dentro do prazo de caducidade - 31.12.2012.

Dispõe o nº6, do artº77º da LGT "A eficácia da decisão depende da notificação".

Dispondo o nº1 do artº36º do CPPT "Os actos em matéria tributária que afectem os direitos e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados"

Esta exigência de notificação como condição de eficácia dos actos com eficácia externa aos serviços da AT é a concretização da imposição constitucional constante do nº3, do artº268º da CRP. Ora,

Estatuindo-se, em consequência, no nº1 do artº38º do CPPT "As notificações são efectuadas obrigatoriamente por carta registada com aviso de recepção, sempre que tenham por objecto actos ou decisões susceptíveis de alterarem a situação tributárias dos contribuintes..."

In casu, é pacífico que as liquidações adicionais de IRC e juros alteravam a situação tributária do sujeito passivo, aqui Impugnante - "Constituindo a liquidação um acto que altera a situação tributária do contribuinte, a respectiva notificação deve ser efectuada por carta registada com aviso de recepção (art 38º, nº1, do CPPT)" cfr. Acórdão da pela Secção de Contencioso Tributário do TCA no Processo nº45/03 publicado em 29/04/2003. Pelo que,

A notificação legalmente obrigatória teria de haver sido efectuada por carta registada com A/R, apenas se considerando efectuada na data da assinatura do aviso de recepção, cfr. nº3, do art39º do CPPT.

Não procedeu, contudo, a AF como lhe era imposto pelo nº1 do artº38º do CPPT, porquanto não notificou a aqui Impugnante da liquidação na forma que estava obrigada. Efectivamente,

Não tentou a notificação postal para a sede da Impugnante.

Não tentou a notificação postal para o escritório/stand onde labora a Impugnante,

Deveria, pois, a administração Tributária de haver dado cumprimento ao disposto nos artºs 36º e 38º e ss do CPPT, em conformidade também com o previsto no artº239º do CPC, para fundamentar o recurso ao previsto no artº240ºdo CPC.

A administração Tributária não pode optar como lhe é mais conveniente no sentido de obter receita pública, ilegal.

Cfr. Acórdão 5998/01 de 14/05/2002 do TCA é "... jurisprudência pacífica e uniforme a doutrina de que a notificação dos actos ou decisões que afectem a situação tributária dos contribuintes..." (como é o caso dos actos de liquidação de IRC e juros controvertidos, efectuados fora do prazo normal de liquidação, que são considerados como susceptíveis de alterar a situação tributária do contribuinte) "...tem de ser efectuada por carta registada com aviso de recepção, recaindo sobre a Administração Fiscal o ónus de provar que a notificação foi feita segundo as prescrições constantes da lei," (cfr., entre outros, os Acs. do STA de 14/04/99, no Rec. Nºs 20.850 e de 13/10/99, no Rec. Nº 23.067 e deste TCA nos Acs. de 4/07/00 no Rec. N° 3153. de 28/03/00, no Rec. Nº 2577 e de 2/05/00, no Rec. Nº 1739/99) e que a falta de comunicação da alteração do domicílio fiscal não dispensa a obrigação de notificação por carta registada com A/R quando esta seja obrigatória, bem como de quaisquer outras regras sobre notificações que sejam aplicáveis, sob pena da respectiva irregularidade ou invalidade.

As notificações são, pois, efectuadas obrigatoriamente por carta registada com aviso de recepção, sempre que tenham por objecto actos ou decisões susceptíveis de alterarem a situação tributária dos contribuintes artº 38° nº1 do CPPT [Sendo a sua falta, sancionada com a ineficácia, cfr. artº36º do CPPT e jurisprudência pacífica], com referência ao artº240º do CPC [Não se revelando pois de importância aludir ao disposto no nº5, do artº39° do CPPT].

A liquidação adicional de IRC, resultante de uma correcção técnica, altera a situação tributária do contribuinte.

Logo, tem de lhe ser comunicada por carta registada por aviso de recepção, sob pena de inexistir notificação válida, cfr. art.º36ºdo CPPT.

A aqui Impugnante não pode, pois, ser considerada notificada pela afixação/depósito dos docs. nºs 1, 2 e 3, aqui juntos, e a lei não reconhece qualquer valor à notificação edital de hora certa nestas situações.

Atento o artº36º, nº1 do CPPT a falta de notificação da liquidação torna-a ineficaz em relação ao contribuinte, cfr. Acórdão do STA de 10.2.1999 in www.dgsi.pt. doc. nºSA21999021002229O.

Havendo, repita-se, pois, as liquidações sub judice alterado a situação tributária do contribuinte, atento o disposto no nº1 do artº 38º do CPPT a sua notificação teria de ser efectuada por carta registada com aviso de recepção a qual, em conjugação com o nº3 do artº39º do CPPT, se considera efectuada na data em que o aviso for assinado pelo destinatário ou por pessoa que o possa fazer nos termos do regulamento dos serviços postais.

Não tendo, repita-se, in casu, existido essa notificação ou mesmo a prevista no nº10, do mesmo artigo 39º (como não houve), a sua eficácia fica prejudicada, cfr.36º, nº1 do CPPT, o que torna inexigível a dívida exequenda.

Efectivamente, resulta assente/provado que a Administração fiscal não notificou a aqui Impugnante da aludida liquidação até ao final dos quatro anos - 31.12.2012 - tal direito encontra-se caduco – artº46º da LGT - já que à AT cabia fazer prova dessa notificação, o que não fez.

Caducou, pois, o direito da Administração Tributária liquidar os tributos incluídos nas liquidações ora impugnadas [Neste sentido, entre outros, o Acórdão do STA de S de Outubro de 1997, Recurso nº19.886].

Como bem se vê de todo o processo administrativo, não foi dada a possibilidade à Impugnante de se pronunciar nos termos do art.º60º da LGT, salvo no âmbito da acção inspectiva e antes da nova declaração modelo 22 e do pagamento constante de fls... – docs. 5, 6 e 8, juntos com a p.i. de Impugnação.

A falta de audiência prévia dos interessados constitui vício insuprível que se traduz na preterição de uma formalidade essencial definida na Lei Geral Tributária. Deste vício só pode resultar a invalidade do acto tributário de liquidação.

Isso mesmo resulta [Quanto ao tipo de vício de que enferma o acto em violação do direito à participação] do Acórdão do STA, proferido no processo 026615, de 27/2/2002:

"Há preterição de formalidade legal se, tendo o contribuinte sido ouvido antes da conclusão do relatório da inspecção tributária, não for de novo ouvido antes do acto de liquidação, pois trata-se de duas audições autónomas relativamente a duas decisões distintas do processo de liquidação."

(...)Deste modo, ainda que o contribuinte tenha sido ouvido antes da conclusão do relatório da inspecção tributária, em caso algum pode ser dispensada nova audiência antes da liquidação"[Quanto à obrigatoriedade de audiência prévia do contribuinte, também. Acórdão do TCA, proferido no processo nº5810/01, de 19/2/2002;Acórdâo do STA, processo 040692, de 21/5/1998; Acórdão do STA, processo 047311, de 5/2/2002; Acórdão do STA, processo 047134, de S/3/2001: bem como, Lei Geral Tributária, comentada e anotada, de Diogo Leite de Campos e outros, pág. 203 da 1ª edição.].

Se a declaração do contribuinte estiver de acordo com os elementos constantes da sua contabilidade ou escrita, esta se mostrar organizada nos termos da lei e não se verificarem erros, inexactidões ou outros indícios fundados de que ela não corresponde à realidade, presume-se que a matéria tributável declarada é a real, isto mesmo se pode inferir do art.º 75º da LGT: «quando a contabilidade ou escrita do sujeito passivo se mostre organizada segundo a lei comercial ou fiscal, presume-se a veracidade dos dados e apuramentos decorrentes, salvo se verificarem erros, inexactidões ou outros indícios fundados de que ela não reflecte a matéria tributável efectiva do contribuinte».

Atendendo a que, como aliás demonstrámos, a Administração Tributária não demonstrou a falta de veracidade das declarações do contribuinte elas têm de continuar a presumir-se verdadeiras, sendo certo, em função disso, que a possibilidade de desconsideração do direito à contabilização como custos fiscais não pode proceder.

Assim sendo, os actos tributários controvertidos improcedem in totum, quer de facto, quer de direito - TUDO APLICÁVEL MUTATIS MUTANDIS À DOUTA SENTENÇA REVIDENDA, POSTO QUE NÃO FAZ QUALQUER ANÁLISE LEGAL OU JURISDICIONAL, EVIDENCIANDO, ALÍAS, ABSOLUTO DESCONHECIMENTO DA LEI, DESIGNADA E EXEMPLIFICADAMENTE DO ARTIGO 39º DO CPPT, QUANTO À PERFEIÇÃO DAS NOTIFICAÇÕES.

Termos, em que V. Exas. mui doutamente suprirão, se requer tendo em conta o plasmado, dignem V. Exas. levar em conta a argumentação expendida, revogando a decisão recorrida e outrossim, concluindo pela invalidade dos actos tributários controvertidos, declarando a caducidade do direito de liquidação, porquanto a notificação desta ocorreu para lá do prazo prescrito no artigo 45º da LGT, ou seja, para lá dos quatro anos, já que ineficaz por não haver sido notificada nos termos legalmente exigidos pelo CPPT, art°s 36°, 38°, 39° e ss., com referência ao CPC, art°s 239° e 240° ou em alternativa, por enfermarem de vicio de forma, por preterição de formalidades essenciais, quer por violação do artigo 60ºda LGT, quer porque omitiu a AT a fundamentação a que estava obrigada para legitimar as liquidações, pois inexistem os pressupostos que fundamentam a aplicabilidade dos métodos indirectos, bem como o critério que aludem para sua fundamentação não resulta da letra da lei; em alternativa liquidações controvertidas ilegais, porquanto atentatórias do princípio constitucional da tributação pelo lucro real e do princípio constitucional da fundamentação dos actos administrativos e fiscais - artºs artº104º, nº2, 266º e 268º, todos da CRP, 36º do CPPT e artº77º e ss da LGT, pois é à Administração Tributária que compete a prova dos pressupostos que, afastando a presunção de veracidade da declaração, lhe permitem o recurso às correcções técnicas e a métodos indirectos no apuramento da matéria tributável, o que não se verificou no caso sub judice; ou se assim não se entender, o que por mero exercício académico se ventila, considerar a sentença nula por violação das alíneas b) e d) do art°668 do CPC, e em consequência ordene que os autos baixem para realização de diligências de prova e todo o mais que se afigure necessário à boa decisão da causa.

Assim fazendo V. Exas. Venerandos Desembargadores Serena, Sã e Objectiva a tão costumada JUSTIÇA! »

3. Não foram apresentadas contra-alegações.

4. Foram os autos a vista da Exma. Procuradora-Geral Adjunta que emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

5. Colhidos os vistos legais, vem o processo à Conferência para julgamento.


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II – QUESTÃO A DECIDIR:

O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, como resulta dos artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (artigo 7.º, n.º 1 da Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho).

Assim, considerando o teor das conclusões apresentadas, importa apreciar e decidir se a sentença padece de nulidade por violação das alíneas b) e d) do artigo 615.º do CPC e se incorreu em erro de julgamento de facto e de direito.


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III. FUNDAMENTAÇÃO

1. DE FACTO

A sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada proferiu decisão da matéria de facto com o seguinte teor:

«OS FACTOS

Compulsados os autos e vista a prova produzida, apuraram-se os seguintes factos:

A. Em 27/10/2011 foi emitido o ofício nº032123 dirigido à ora impugnante para efeito de notificação do projecto de relatório de inspeção bem como para o exercício do direito de audição prévia encontrando-se o mesmo assinado com a seguinte menção “recebi o original, nesta data 2011/10/27” (cfr. fls. 192 do relatório de inspeção em apenso).

B. Em 27/10/2011 foi lavrado o termo de diligência no qual consta que foi entregue pessoalmente ao sr. J. F. F. M. na qualidade de sócio-gerente da ora impugnante o projecto de relatório de inspeção e respetivos anexos no total de 182 folhas bem como o ofício mencionado na alínea anterior, encontrando-se o referido termo assinado pelo contribuinte (cfr. fls. 193 do apenso).

C. Em 08/11/2011 deu entrada na Direção de Finanças de Setúbal, requerimento em nome da ora impugnante e referente ao exercício do direito de audição prévia sobre o projecto de relatório de inspeção (cfr. fls. 194/197 do apenso).

D. Em 18/11/2011 foi elaborado o relatório final da ação de inspeção à ora impugnante de que resultaram correções em sede de IRC e IVA dos exercícios de 2008, 2009 e 2010 com os fundamentos nele vertidos e cujo teor se dá por integralmente reproduzido (cfr. teor de fls. 1/203 do relatório em apenso).

E. Em 29/11/2011 foi emitido o ofício nº035527 dirigido à ora impugnante para efeitos de notificação do relatório de inspeção tendo sido enviado através de carta registada com aviso de recepção tendo este sido assinado em 09/12/2011 (cfr. fls. 204/206 do relatório de inspeção em apenso)

F. Em 07/12/2012 foi efectuada a liquidação de IRC e de juros compensatórios do exercício de 2008 e após compensação resultou imposto a pagar de €13.536,02 (cfr. fls. 38/40 dos autos).

G. Em 18/12/2012 foi emitido pela Chefe do Serviço de Finanças de Setúbal 2, em substituição, o “mandado de notificação do conteúdo da liquidação de IRC do ano de 2008” (cfr. fls. 37 dos autos).

H. Em 19/12/2012 foi emitida a “nota de citação de hora certa” com o teor de fls. 41dos autos.

I. Em 20/12/2012 foi emitida a “verificação de notificação/citação com hora certa” com o teor de fls. 42 dos autos.

J. A ora impugnante aderiu à Via CTT em 11/01/2011 (cfr. fls. 20 do processo administrativo em apenso)

K. A demonstração de liquidação de IRC do exercício de 2008, a demonstração da liquidação de juros compensatórios e a demonstração de acerto de contas foram notificados à ora impugnante através da caixa postal electrónica via CTT em 17/12/2012 (como consta de fls. 14/19 do processo administrativo em apenso).


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A convicção do tribunal formou-se com base no teor dos documentos juntos ao processo e acima expressamente referidos em cada uma das alíneas do probatório.

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Não existem factos relevantes para a decisão que importe destacar como não provados.»

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2. ADITAMENTO OFICIOSO DE FACTOS À MATÉRIA DE FACTO ASSENTE

Ao abrigo do disposto no artigo 662.º, n.º 1 do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT, acorda-se em aditar ao probatório os seguintes factos que resultam provados, nos termos que se seguem:

L) Em 05/07/2001, a Direcção de Finanças de Setúbal enviou à impugnante uma Carta Aviso, no âmbito da Ordem de Serviço n.º OI201101011, notificando-a de que a muito curto prazo se deslocarão à Rua F., Lote .., B. A., técnico(s) dos Serviços de Inspecção Tributária, com a finalidade de verificação do cumprimento das correspondentes obrigações tributárias, indicando como âmbito da acção inspectiva Geral, com incidência temporal aos exercícios de 2008, 2009 e 2010, a qual foi entregue em 06/07/2011 (cfr. anexo I, fls. 1 e 2, ao RIT, apenso aos presentes autos).

M) Em 12/09/2011, a Impugnante foi notificada da ordem de serviço do início do procedimento externo de inspecção, a que se referem as alíneas A. a D supra (cfr. anexo I, fls. 3, ao RIT, apenso aos presentes autos).

N) A impugnante tomou conhecimento, pelo menos, em 03/01/2013, dos documentos docs. n.ºs 1, 2 e 3 que juntou à petição inicial, consubstanciados na demonstração de acerto de contas e demonstração de liquidação de IRC do exercício de 2008, a que se referem as alíneas F., G., H. e I. supra (cfr. admitido na petição inicial, fls.3 dos autos de suporte físico).

O) Em 10/01/2012, a impugnante apresentou pedido de revisão da matéria tributável fixada por métodos indirectos, que aqui se dá por integralmente reproduzido (cfr. requerimento junto ao apenso do RIT).

P) Em 13/02/2012, no âmbito do procedimento de revisão da matéria colectável, reuniram os peritos da Administração Tributária, do contribuinte e o perito independente, sem que tivesse havido acordo entre eles, conforme “Acta da reunião do pedido de revisão” e laudo do perito independente, que aqui se dão por integralmente reproduzidos (cfr. apenso do RIT).

Q) Por decisão do Director de Finanças de Setúbal, de 30/11/2012, que aqui se dá por integralmente reproduzida, em consonância com a posição assumida pelo perito da Administração Tributária e com a posição concordante da perita independente quanto à realização da avaliação indirecta, foram mantidos os valores apurados com recurso a métodos indirectos, em resultado da acção inspectiva, no respeita que a IRC do exercício de 2008 (cfr. Decisão no apenso RIT).

R) Em 17/12/2012, a impugnante foi notificada da decisão referida na alínea anterior, na pessoa do seu mandatário, através do ofício n.º 034452, de 13/12/12, registado com aviso de recepção (cfr. documentos junto ao apenso RIT).

S) Em 01/12/2011, a Impugnante apresentou Declaração Modelo 22 de substituição relativa ao exercício de 2008 (cfr. Docs. n.ºs 5 e 6 da p.i.).

T) Em 02/12/2011 a AT emitiu a liquidação n.º 2011 2500414973, com o valor a disponibilizar de € 9.711,75 (cfr. Docs. n.ºs 7 e 8 da p.i.).

U) A Demonstração de Acertos de Contas referida na F. supra, considerou a liquidação referida na alínea anterior, e tinha como data limite de pagamento voluntário, 16/01/2013 (cfr. fls. 38 dos autos de suporte físico).

V) Em 13/03/2013 foi deduzida a presente impugnação.


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3. DO MÉRITO DO RECURSO

3.1. Da nulidade da sentença por violação das alíneas b) e d) do artigo 615.º do CPC

A Recorrente arguiu a nulidade da sentença, que formulou como pedido subsidiário, sem que tenha incluindo tal fundamento das alegações de recurso e respectivas conclusões.

A Mma. Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa apreciou as nulidades, nos termos do artigo 617.º, n.º 1 do CPC, tendo concluído que não foi cometida as nulidades assacadas à sentença sob recurso.

Vejamos, então, se lhe assiste razão.

Na arguição da recorrente distingue-se duas nulidades que imputa à sentença, uma decorrente da não especificação dos fundamentos de facto que justificam a decisão e a outra por falta de pronúncia sobre questões que devesse apreciar.

Começando pela falta de especificação dos fundamentos de facto que justificam a sentença.

Importa referir em primeiro lugar que esta nulidade é do conhecimento oficioso (cfr. artigo 662.º do CPC).

O n.º 2 do artigo 123.° do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) determina que na sentença o juiz discriminará a matéria provada da não provada, fundamentando as suas decisões.

A exigência de que a sentença especifique os fundamentos de facto e de direito é justificada pela necessidade de permitir que as partes conheçam as razões em que se apoiou o veredicto do tribunal a fim de as poderem impugnar e para que o tribunal superior exerça sobre elas a censura que se impuser.

Mas na discriminação dos factos que há-de fazer não tem o juiz que se pronunciar sobre todos os factos alegados pela parte, tendo antes o dever de seleccionar os que interessam para a decisão segundo as várias soluções plausíveis de direito (artigo 607.º do CPC).

No que respeita à discriminação dos factos provados, a Mma. Juíza a quo, levou ao probatório os factos relevantes para a decisão a proferir (cfr. fls. 295 e 296 dos autos de suporte físico).

A discriminação dos factos não provados a Mma. Juiz a quo deixou expresso que não existem factos relevantes para a decisão que importe destacar como não provados.

Não obstante, o entendimento da referida irrelevância, tal não fere a sentença de nulidade.

A doutrina e jurisprudência maioritárias consideram que a nulidade da sentença por falta de especificação dos fundamentos de facto só ocorre quando faltem em absoluto os fundamentos de facto em que assentou a decisão, não ocorrendo quando a fundamentação é escassa, incompleta, não convincente, deficiente ou errada.

Efectivamente, só existirá nulidade da sentença por falta de indicação de factos provados e não provados relativamente a factos essências, isto é, que possam relevar para a decisão da causa.

Da leitura da sentença resulta que a fundamentação elucidativa das razões que levaram a decidir como se decidiu, e que tal foi perfeitamente apreendido pela Recorrente como resulta das suas alegações, visto demonstrar compreender a fundamentação de facto e de direito da sentença sob recurso.

Contudo, caso se concluísse pela existência de factos relevantes para a decisão ou errado enquadramento jurídico, tal poderia configurar eventuais erros de julgamento quer sobre a irrelevância desses factos, quer na aplicação de norma jurídicas, mas não a invocada nulidade. Apreciaremos a seu tempo o erro de facto e de direito, uma vez que foram invocados.

Assim, não se verifica a apontada nulidade.

Questão diferente da nulidade da sentença por falta de discriminação dos factos provados e não provados é a nulidade de omissão de pronuncia.

Nos termos do artigo 125.º, n.º 1 do CPPT, constituem causas de nulidade da sentença (…) a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer.

Entende a Recorrente que o Tribunal a quo incorreu na referida nulidade, sem, contudo, a concretizar.

No entanto, a nulidade por omissão de pronuncia só acontece quando sentença deixa de decidir alguma das questões suscitadas pelas partes, salvo se a decisão tiver ficado prejudicada pela solução dada a outra questão submetida à apreciação do Tribunal (vide entre outros acórdãos do STA de 10/9/2008, proc. n.º 0812/07 e de 20/04/2020, proc. n.º 02145/12.5BEPRT, ambos disponíveis em www.dgsi.pt/)

E as questões submetidas à apreciação do tribunal identificam-se com os pedidos formulados, com a causa de pedir ou com as excepções invocadas, desde que não prejudicadas pela solução de mérito encontrada para o litigio (vide Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, Volume II, 6.ª edição, 2011, nota 10 ao artigo 125.º, pág. 364).

Só a violação do dever de pronuncia torna nula a decisão, consequência que se justifica, uma vez que tal omissão traduz-se em denegação de justiça.

Coisa bem diferente é o que pretende a Recorrente, visto que a Recorrente não identifica qualquer questão que o Tribunal a quo devesse conhecer e não conheceu. O que parece pretender a Recorrente, de acordo com o pedido subsidiário formulado, é aditar ao probatório factos (que não identifica), através de diligências de prova.

Termos em que improcede, também, a arguida nulidade de omissão de pronuncia.


*

3.2. Do erro de julgamento de facto

A Recorrente questiona a matéria de facto fixada na sentença, como se colhe das conclusões v. da alegação de recurso.

Alega a Recorrente que só tomou conhecimento do teor dos documentos n.ºs 1, 2 e 3 que juntou à petição inicial em 03/01/2013.

Este facto foi alegado na petição inicial.

Este Tribunal ad quem decidiu oficiosamente aditar tal facto ao probatório, pelo que mostra-se, nesta sede, prejudicada a sua apreciação.

A Recorrente questiona o facto vertido na alínea K) dos factos provados, alegando que deve ser dado como não provado, por não ser verdade e por não resultar de fls. 14 e 19 dos autos (cfr. paragrafo 7 do ponto v. das conclusões da alegação de recurso).

Vejamos.

O n.º 1 do artigo 662. ° do Código de Processo Civil (CPC), determina que A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.

Por sua vez, o n.º 1 do artigo 640.º do mesmo diploma impõe que:

1 - Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

Resulta da conjunção dos artigos 662.º e 640.º do CPC que o TCA deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se a prova produzida impuser decisão diversa desde que o recorrente especifique os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados e indique os concretos meios probatórios.

A Recorrente cumpre minimamente o ónus que sobre si impendia.

A alínea K) dos factos dados como provados tem o seguinte teor:

«K. A demonstração de liquidação de IRC do exercício de 2008, a demonstração da liquidação de juros compensatórios e a demonstração de acerto de contas foram notificados à ora impugnante através da caixa postal electrónica via CTT em 17/12/2012 (como consta de fls. 14/19 do processo administrativo em apenso).»

Os documentos de prova mencionadas são compostos por:

- fls. 14: cópia da “Demonstração de liquidação de IRC” do exercício de 2008;

- fls. 15: cópia de “Histórico de Operações” da Demonstração de Liquidação de IRC do ano de 2008.

- fls. 16: cópia da “Demonstração de Liquidação de Juros”

- fls. 17: cópia de “Histórico de Operações” da Demonstração de Liquidação de juros.

- fls. 18: cópia da “Demonstração de Acerto de Contas”

- fls. 19: cópia de “Histórico de operações” da Demonstração Acerto Contas.

Apreciemos, então se estes documentos demonstram com a segurança que se exige, o envio à ora Recorrente via CTT a notificá-la da liquidação impugnada.

A Recorrente é uma sociedade por quotas, não colocando em causa que aderiu ao serviço público de Caixa Postal Electrónica, nos termos do artigo 4.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 112/2006, de 9 de Junho e 19.º da LGT (cfr. alínea J. do probatório; e artigo 39.º, n.º 9 do CPPT).

O citado artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 112/2006, definia o serviço público de caixa postal electrónica, da seguinte forma:

1- O serviço público de caixa postal electrónica é o serviço que permite ao aderente receber, por via electrónica ou por via electrónica e física, comunicações escritas ou outras provenientes dos serviços e organismos da administração directa, indirecta ou autónoma do estado, bem como das entidades administrativas independentes e dos tribunais, incluindo, designadamente, citações, notificações no quadro de procedimentos administrativos ou de processos judiciais, de qualquer natureza, (…)

2- A adesão ao serviço público de caixa postal electrónica é voluntária, quer por parte dos expedidores, quer por parte dos respectivos clientes.

3- Para os efeitos previstos no presente decreto-lei, qualquer pessoa singular ou colectiva pode aderir à caixa postal electrónica.

4- (…)

Nos procedimentos respeitantes à gestão do serviço público correspondente à utilização da caixa postal electrónica, fica a entidade concessionária especialmente obrigada ao dever de inviolabilidade e de sigilo de correspondência, nos termos do estabelecido no artigo 3º da Lei nº 102/99, de 26 de Julho, não podendo transmitir dados pessoais, designadamente os relativos ao endereço postal electrónico de cada cliente, sem o consentimento dos respectivos titulares.

«A adesão a este serviço era voluntária e gratuita, podendo ser efectuada no portal das Finanças (…). Na sequência da adesão será criada e activada uma caixa postal electrónica, no serviço ViaCTT. (…) Os CTT (entidade certificadora) garantem a integridade e a confidencialidade dos documentos, utilizando certificados digitais de autenticação. Essa garantia consta expressamente da legislação que regula Caixa Postal Electrónica e assegura que só os CTT colocam nela notificações, citações e outras comunicações enviadas pela DGCI.» (Diogo Leite de campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, in Lei Geral Tributária, anotada e comentada, 4ª edição, 2012, pag. 201, nota 11 ao artigo 19.º).

Assim, a Caixa Postal Electrónica (CPE) é um serviço que permite receber correio em formato digital, com valor legal, respeitando as características definidas na Lei do Comércio Electrónico (Decreto-Lei n.º 7/2004, de 7 de Janeiro), com garantia da integridade e confidencialidade do correio, e integra o domicílio fiscal nos contribuintes, nos termos do artigo 19.º da LGT.

O serviço da CPE está concessionado aos CTT (Serviço ViaCTT).

O comprovativo do documento de acesso à caixa postal electrónica, emitido pelo CTT-Correios de Portugal faz prova, nos termos da legislação aplicável, da data da entrega na Caixa Postal Electrónica da notificação e da data de acesso à Caixa Postal electrónica.

No caso vertente, os documentos n.ºs 15, 17 e 19, referidos na alínea K. da matéria de facto assente, tratam-se de documentos emitidos pela própria Administração Tributária, com o título de “Histórico das Operações” relativos às Demostrações das Liquidações de Imposto e de Juros e à Demonstração de Acerto de Contas, onde consta as datas da criação do documento, da sua assinatura, envio para o Via CTT, entrega do documento na caixa electrónica Via CTT, o acesso do contribuinte à caixa postal Via CTT e a data em que o contribuinte é considerado notificado.

Os documentos emitidos pela AT, não podem servir de prova de que a Impugnante foi notificada das liquidações de imposto e de juros através do Sistema ViaCTT, porquanto tais “prints” informáticos, são elaborados pela própria Administração Tributária para efeitos internos e, por isso, não provam, por si só, a realidade fáctica neles referida (vide neste sentido, entre muitos outros, relativos a registo CTT via tradicional, Acs. do TCAS de 09/02/2010, proc. n.º 659/10 e de 13/10/2017, proc. n.º 1245/09, disponível em www.dgsi.pt/).

Para dar como provada tal factualidade importava que tivessem sido juntos aos autos os documentos de expedição das aludidas demonstrações para os CTT (ViaCTT), bem como o documento comprovativo de acesso à Caixa Postal Electrónica emitido pelos CTT, o que não foi feito.

Assim, os documentos n.ºs 15, 17 e 19 não permitem que se dê como provada a factualidade vertida na alínea K. dos factos dados como provados.

Concluindo, não podemos deixar de dar razão à Recorrente, eliminando-se assim o facto vertido na alínea K. do probatório.

Procede, nesta parte, o recurso.


*

Além do aditamento oficioso realizado nos termos do disposto no artigo 662.º, n.º 1 do CPC, considera-se a decisão da matéria de facto estabilizada.

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3.3. DE DIREITO

3.3.1. Da caducidade do direito à liquidação

Insurge-se a Recorrente contra a decisão recorrida, desde logo, por entender que a mesma padece de erro de julgamento relativo à decisão da caducidade do direito à liquidação, referindo que a liquidação de IRC reporta-se ao exercício de 2008, não tendo até ao fim de 2012 sido notificada à ora Recorrente (conclusão iii) da alegação de recurso).

Alega ainda a Recorrente que a Administração Tributária não notificou validamente o sujeito passivo dentro do prazo de 4 anos (conclusão ii) da alegação de recurso).

Mais invocou, ainda que mesmo aceitando a notificação electrónica, nos termos do n.º 10, do artigo 39.º do CPPT, só no 25.º dia posterior ao envio da mesma (17/12/2012), se consideraria notificada, logo em 11/01/2013.

Advogou que a liquidação adicional devia ter-lhe sido comunicada por carta registada com aviso de recepção, sob pena de inexistir notificação válida, nos termos do artigo 36.º do CPPT, não podendo a Recorrente considerar-se notificada pela afixação/depósito dos documentos n.ºs 1, 2 e 3.

Vejamos.

A sentença sobre recurso, apreciou a questão da seguinte forma:

De acordo com o nº1 do art.45º da LGT “O direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro”.

No caso em apreço tratando-se de uma liquidação de IRC sendo um imposto periódico, o prazo de quatro anos conta-se a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário (cfr. art.45º, nº4 da LGT).

Do probatório resultou que a liquidação do IRC e juros compensatórios do ano de 2008 foi efectuada em 07/12/2012 (alínea F) do probatório) e notificada através da caixa postal electrónica via CTT em 17/12/2012 (cfr. alíneas J) e K) do probatório).

De acordo com o disposto no nº 1 do art.41º do CPPT “As pessoas colectivas e sociedades são citadas ou notificadas na sua caixa postal electrónica ou na pessoa de um dos seus administradores ou gerentes, na sua sede, na residência destes ou em qualquer lugar onde se encontrem” (destacado nosso)

O serviço de finanças de Setúbal 2, para além da notificação efetuada via CTT tentou assegurar que a ora impugnante tivesse conhecimento da liquidação ora impugnada tendo procedido à notificação com hora certa (cfr. alíneas G), H) e I ) do probatório.

Em face do exposto resultou provado não só que a liquidação ora impugnada foi efetuada dentro do prazo de caducidade mas que a respetiva notificação foi também efetuada na forma legalmente prevista dentro desse prazo, pelo que improcede a alegada caducidade do direito à liquidação.

Aqui chegados e considerando a decisão supra sobre a impugnação da matéria de facto dada como provada na sentença recorrida, que determinou a eliminação da alínea K., impõe-se, desde já, que se dê razão à Recorrente, quanto à notificação por via electrónica, visto que a Administração Tributária não provou nos autos que a tenha realizado.

Assim, a questão a decidir, em primeiro lugar, é a de saber se a Recorrente só podia ser notificada por carta registada, com aviso de recepção, como defende a Recorrente, ou, se podia ser notificada da liquidação de IRC do exercício de 2008, com origem em métodos indirectos, por contacto pessoal, através “Nota de citação com hora certa” e nos termos do artigo 240.º do CPC (cfr. alíneas G., H. e I. do probatório).

Determinava o artigo 38º do CPPT (na redacção aplicável) com a epígrafe” Avisos e notificações por via postal ou telecomunicações endereçadas”, e para o que aqui releva, que:

«1- As notificações são efectuadas obrigatoriamente com carta registada com aviso de recepção, sempre que tenham por objecto actos ou decisões susceptíveis de alterarem a situação tributária dos contribuintes ou a convocação para estes assistirem ou participarem em actos ou diligências.

(…)

3 -As notificações não abrangidas no nº1, bem como as relativas às liquidações de tributos que resultem de declarações dos contribuintes ou de correcções à matéria colectável que tenha sido objecto de notificação para efeitos do direito de audição, são efectuadas por carta registada.

(…)

5 – As notificações serão pessoais nos casos previstos na lei ou quando a entidade que elas proceder o entender necessário.

(…).»

Por sua vez, o artigo 41.º, n.º 1, do CPPT preceitua «as pessoas colectivas serão citadas ou notificadas na pessoa de um dos seus administradores ou gerentes, na sua sede, na residência destes ou em qualquer lugar onde se encontrem.»

Na situação dos autos, a notificação da liquidação devia ter sido feita por carta registada, uma vez que as correcções à matéria tributável foram objecto de notificação para audição prévia, nos termos do n.º 3, do artigo 38.º do CPPT (cfr. alíneas B. e C. do probatório).

Porém, a entidade que dirige o procedimento pode ordenar a notificação pessoal, quando o entender necessário (artigo 38.º do CPPT).

A notificação pessoal «(…) para além dos casos em que a lei preveja especialmente, justificar-se-á nos casos em que houver dificuldade em efectuar a notificação por outra forma ou não houver a certeza se foi realizada uma notificação.

As regras da citação através de contacto com o citando, que se aplicam a esta notificação pessoal, constam do art. 190.º deste Código e do CPC, para que remete o n.º 1 do artigo 192.º» (Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, 2006, áreas Editora, I vol., nota 5 ao artigo 38.º, pág. 347).

Conforme resulta das alíneas H. e I. do probatório, a AT notificou a Impugnante através de “Nota de citação de Hora Certa”, mediante afixação na porta da sede de nota com o objecto da notificação, nos termos dos artigos 235.º e 240.º do CPC.

Impunha-se, neste caso, em obediência ao disposto no artigo 241.º do CPC (na redacção aplicável) que fosse enviada, no prazo de dois dias úteis, carta registada ao notificado, comunicando-lhe, nomeadamente, a data e o modo por que o acto se considera realizado e o prazo para o oferecimento da defesa, o que não resultou provado que tenha sido realizado.

A notificação, para valer como tal, designadamente como interpelação para pagamento, torna-se necessário que tenha sido eficaz (no sentido de dela ter havido efectivo conhecimento) e regular (no sentido de terem sido cumpridas todas as formalidades legalmente impostas para o efeito).

Nesta perspectiva, entendemos que na situação dos autos foram preteridas formalidades legais. Com efeito, a notificação da liquidação devia ter sido feita por carta registada, visto que não se encontra justificada a notificação por outra forma, designadamente impunha-se a tentativa de notificar o legal representante da sociedade, também por carta registada, e por outro lado, no que respeita à notificação com hora certa, não resultou provado que a AT tenha enviado carta a registada a que alude o artigo 241.º do CPC (na redacção aplicável), embora a Recorrente reconheça que os documentos n.ºs 1, 2 e 3 da petição inicial foram depositados na sua caixa do correio.

No entanto, apesar de não ter sido observada a forma de notificação exigida, comprovou-se nos autos que ela foi efectuada e que a Impugnante dela teve conhecimento.

Ora, «diz-se notificação o acto pelo qual se leva um facto ao conhecimento de uma pessoa ou se chama alguém a juízo.» (artigo 35.º, n.º 1 do CPPT).

Na situação dos autos, a Impugnante alega ter recebido a notificação em 03/01/2013 e que a mesma não chegou pela forma legalmente exigida, embora não tenha razão quanto à exigência de carta registada com aviso de recepção.

Assim, a finalidade que a lei pretende atingir com a exigência de carta registada é atingida quando, não obstante o não cumprimento dessa formalidade, se prove que o destinatário tomou conhecimento do acto notificado, pelo que a formalidade de carta registada degrada-se em não essencial e dela não resulta a invalidade da notificação.

Nas palavras de Jorge Lopes de Sousa «A não observância da forma de notificação exigida constituirá uma irregularidade que não afectará o valor da notificação, desde que se comprove que ela foi efectivamente efectuada, pois as formalidades processuais são meios de garantir objectivos e não finalidades em si mesmas.

Por isso, sempre que seja atingido o objectivo, serão irrelevantes as irregularidades, considerando-se sanada a deficiência.» (in CPPT, anotado e comentado, Áreas Editora, 2011, Vol. I, 6.ª edição, nota 8 ao artigo 38.º, pág. 375).

Esta questão também já foi decidida pelo Supremo Tribunal Administrativo de forma reiterada, relativamente à qual se consolidou jurisprudência, entre muitos outros destacamos o acórdão de 29/05/2013, prolatado no processo n.º 0472/13, cujo discurso fundamentador acompanhamos e com a devida vénia transcrevemos as seguintes passagens:

«(…) A notificação tem por objectivo dar conhecimento pessoal aos interessados dos actos administrativos susceptíveis de afectar a sua esfera jurídica, como exigência da garantia constitucional consagrada no nº 3 do art. 268º da CRP, segundo a qual impende sobre a Administração o dever de dar conhecimento aos administrados dos actos que lhes respeitam.

Neste sentido, diz o nº 1 do art. 36º do CPPT que “os actos em matéria tributária que afectem os direitos e interesse legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados”.

E embora a CRP relegue para a liberdade constitutiva do legislador ordinário o encargo de determinar as formalidades das notificações, a verdade é que esse formalismo deverá mostrar-se constitucionalmente adequado e observar o princípio constitucional da proibição da indefesa ( Cfr. o Acórdão do Tribunal Constitucional nº 130/2002, de 14 /3/2002, proc nº 607/01.).

Mais concretamente, de acordo com a jurisprudência do Tribunal Constitucional, o dever de notificação que impende sobre a Administração Tributária “tem um conteúdo obrigatório, devendo estarem reunidos alguns requisitos essenciais, nomeadamente, a pessoalidade e a efectiva cognoscibilidade do ato ao notificando” (Acórdão de 11/2/2009, proc nº 916/2007).

(…)

No caso dos autos, a notificação respeita a liquidações adicionais de IRC apuradas na sequência de inspecção tributária, onde a recorrente exerceu o direito de audição, razão pela qual sendo de aplicar o nº 3 do art. 38º do CPPT, tais notificações hão-de ser efectuadas por carta registada.

E o que resulta do probatório é que “a liquidação foi remetida à oponente para a morada sita na …………, 2495-……… Santa Catarina da Serra, através do registo postal n º RY52658..PT”.

E como se pode ler, a dado passo, na sentença recorrida, “(…) a administração tributária logrou comprovar nos autos “(…) ter remetido para a morada da oponente a demonstração de liquidação de IRC nº 20118310001254, no montante de € 2.038.642,71, cuja entrega foi conseguida no dia 06/06/2011”.

Por conseguinte, a Administração Tributária operou a notificação das liquidações em causa através de entrega por registo simples. (…)

Acontece, porém, que o facto de a recorrente alegar e com razão que a Administração Tributária não terá observado todas as formalidades da notificação exigidas por lei, tal não significa por si só que se tenha de concluir pela sua invalidade, se foi atingido o objectivo que se visava alcançar com a notificação: transmitir à destinatária o teor da liquidação.

Com efeito, análise atenta da argumentação da recorrente verifica-se que em caso algum a mesma alega que a notificação não tenha sido recepcionada no receptáculo do seu domicílio fiscal ou que lhe seja difícil ou impossível fazer prova do não recebimento da mesma.

Logo na petição da oposição o que a recorrente alega é que “não foi notificada validamente para proceder ao pagamento voluntário da liquidação de IRC…” (art. 3º) pois “nem na sede da oponente, nem no domicílio fiscal dos administradores, foi recebida notificação registada com vista ao pagamento voluntário da dívida exequenda” (art.4º), “Dito de outra forma, nem na sede da sociedade, nem no domicílio dos administradores foi assinado o respectivo registo contendo a notificação da liquidação para se ter procedido ao pagamento voluntário” (art. 5º).

E nas alegações de recurso a recorrente reitera o mesmo discurso, concluindo imputando à notificação a não observância das formalidades legais exigidas para a carta registada.

Em suma, em caso algum vem alegado que a notificação não chegou à esfera de cognoscibilidade da recorrente, mas tão só que não chegou pela forma legalmente exigida.

Assim sendo, constituindo jurisprudência reiterada deste Supremo Tribunal que as formalidades procedimentais previstas na lei são essenciais, mas desgraduam-se em não essenciais se, apesar delas, foi atingido o fim que a lei visava alcançar com a sua imposição (Cfr., entre outros, o Acórdão de 8/9/2010, proc nº 437/10. No mesmo sentido, cfr., JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário, 6ª ed., 2011, Áreas Editora, anotação ao art. 39º do CPPT, p. 384. )» (vide ainda no mesmo sentido Acs. do STA de 08/09/2010, proc. n.º 0437/10, de 19/04/2012, proc. 0852/11, de 15/11/2018, proc. 0278/16 e de 14/10/2020, proc. 01554/14, todos disponíveis em www.dgsi.pt/).

No caso dos autos, como se viu, resultou provado que, apesar da Impugnante não ter sido notificada por carta registada tomou conhecimento do conteúdo do acto notificado (demonstração da liquidação de IRC do ano de 2008) e usou do meio adequado tempestivamente para reagir contra o acto notificado, que juntou como documentos n.ºs 1, 2 e 3 à petição inicial.

Embora a AT não cumpra todas as formalidades da notificação da liquidação, e ainda assim, resulta demonstrado que a notificação chegou ao poder do destinatário, esta não deve ser anulada porque da violação do preceito legal não resulta qualquer lesão efectiva, real dos interesses protegidos pelo preceito legal.

Face ao exposto, por a notificação da liquidação de IRC ter chegado ao conhecimento da Impugnante, permitindo-lhe no prazo legal deduzir impugnação judicial, impõe-se concluir que não assiste razão à Recorrente, improcedendo, nesta parta, o recurso.

Avancemos, então para o conhecimento da caducidade do direito à liquidação.

O direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro, e conta-se, nos impostos periódicos (caso do IRC) a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário (artigo 45.º, n.ºs 1 e 4, da LGT).

Porém, o n.º 1 do artigo 46.º da LGT prevê uma causa de suspensão do prazo de caducidade do direito à liquidação das prestações tributárias, com a notificação ao contribuinte, nos termos legais, da ordem de serviço ou despacho de inicio da acção de inspecção externa, cessando, no entanto, esse efeito, contando-se o prazo dos seu inicio, caso a duração da inspecção externa tenha ultrapassado o prazo de seis meses após a notificação.

E a alínea e) do n.º 2, do artigo 46.º da LGT (na redacção introduzida pela Lei n.º 64-B/2011, de 30/12), prevê como causa de suspensão do prazo de caducidade a apresentação do pedido de revisão da matéria colectável, até à notificação da respectiva decisão.

A Jurisprudência e a doutrina são unânimes na posição de que as causas interruptivas ou suspensivas relevantes são aquelas que decorrem de factos aos quais a lei em vigor atribuiu essa relevância, no momento da sua prática (cfr. n.º 2, do artigo 12.º do Código Civil; vide Acórdão do STA, de 12/10/2016, processo n.º 353/16, disponível em www.dgsi.pt/).

O prazo de caducidade começou a correr em 01/01/2009 e sem considerar os períodos de suspensão o prazo de 4 anos completava-se em 31/12/2012 (cfr. artigo 45.º, n.º 4 da LGT).

Atenta a factualidade provada nos autos, resulta que:

- o IRC aqui em causa é relativo ao ano de 2008;

- a Recorrente foi alvo de um processo de inspecção tributária que decorreu entre 12/09/2011 e 09/12/2011 (cfr. alíneas M) e E) do probatório.

- a Recorrente requereu pedido de revisão em 10/01/2012, cuja decisão foi notificada em 17/12/2012 (cfr. alíneas O) e R) do probatório).

- a Recorrente tomou conhecimento da liquidação adicional em 03/01/2013 (cfr. alínea N) do probatório).

Assim sendo, o prazo de caducidade da liquidação de 4 anos, que se corresse ininterruptamente, teria terminado em 31/12/2012, deve ser acrescido de 89 dias (inspecção externa) e de mais 343 (pedido de revisão à matéria colectável), mercê das duas causas autónomas de suspensão do prazo de caducidade, previstas no n.º 1 do artigo 46.º, n.ºs 1 e 2, alínea e) da LGT (vide neste sentido Ac. do STA de 07/06/2017, processo n.º 0350/16, disponível em www.dgsi.pt/).

Dito por outras palavra, adicionando os dois períodos de suspensão ao prazo de 4 anos, verifica-se que quando a Impugnante foi notificada do acto de liquidação em 03/01/2013, ainda se não havia completado o prazo de caducidade do direito à liquidação de 4 anos (artigo 45.º n.º 1 da LGT), pois o prazo de caducidade que se iniciou em 01/01/2009 e cessaria em 01/01/2013, caso não tivessem existido a suspensão de 432 dias, fizeram avançar o prazo de caducidade até aos primeiros dias de Março de 2014.

Concluindo, quando a Recorrente foi notificada da liquidação adicional ainda não se havia completado o prazo de caducidade, atendendo aos dois períodos de suspensão do prazo de caducidade.

Pelo exposto, improcede nesta parte o recurso.


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3.3.2. Do invocado erro de julgamento por julgar improcedente o vício de preterição de audição prévia antes da liquidação

A Recorrente discorda da decisão da primeira instância, alegando, em síntese, que o acto tributário está ferido de ilegalidade por violação de audição prévia, por não lhe ter sido dada tal possibilidade, salvo no âmbito da acção inspectiva.

Defende a Recorrente que lhe devia ter sido dada a oportunidade de ter sido ouvida antes da prática do acto de liquidação. Cita a fundamentar a sua posição o Ac. do STA de 27/02/2002, proferido no processo n.º 026615.

Neste domínio a sentença recorrida para fundamentar o decidido exarou o seguinte discurso:

A audiência dos interessados no procedimento administrativo e tributário traduz a efetiva participação dos cidadãos nas decisões que lhes digam respeito sendo certo que o princípio da participação encontra-se intimamente ligado ao princípio da colaboração da administração com os particulares.

Com a entrada em vigor da Lei Geral Tributária, o princípio da participação ficou consagrado expressamente no seu art.60º, pressupondo e assumindo a existência de diversas particularidades do procedimento tributário, em que se destacam a massificação dos actos tributários e a colaboração do contribuinte no cumprimento das suas obrigações fiscais.

O art.60º da LGT trata do princípio da participação dos contribuintes no procedimento tributário. Depois de enunciar o princípio, traduzido na participação dos contribuintes na formação das decisões que lhes digam respeito, o nº 1 enuncia cinco formas de participação dos contribuintes:

a)Direito de audição antes da liquidação;

b) Direito de audição antes do indeferimento total ou parcial dos pedidos, reclamações, recursos ou petições;

c) Direito de audição antes da revogação de qualquer benefício ou acto administrativo em matéria fiscal;

d) Direito de audição antes da decisão de aplicação de métodos indirectos, quando não haja lugar a relatório de inspecção;

e) Direito de audição antes da conclusão do relatório da inspecção tributária.

Contudo o nº 3 do mesmo art.60º da LGT consagra o seguinte “ Tendo o contribuinte sido anteriormente ouvido em qualquer das fases de procedimento a que se referem as alíneas b) a e) do nº 1, é dispensada a sua audição antes da liquidação, salvo em caso de invocação de factos novos sobre os quais ainda se não tenha pronunciado”.

No caso em apreço ficou provado que a ora impugnante foi notificada do projecto de relatório de inspeção (cfr. alíneas A) e B) do probatório) e que exerceu o seu direito de audição prévia (cfr. alínea C) do probatório).

Atendendo ao disposto no nº3 do art. 60º da LGT acima transcrito resulta que, tendo o contribuinte sido ouvido antes da conclusão do relatório de inspeção tributária, não tem de ser ouvido novamente antes da liquidação do imposto.

Nesse sentido veja-se o Acórdão do STA de 16/05/2012 – rec. 0675/11 quando se afirma claramente “I-Tendo o contribuinte, no decurso de uma acção de fiscalização, sido notificado, nos termos do art. 60.º da LGT, do projecto de conclusões do relatório de inspecção, sendo ouvido numa das fases do procedimento inspectivo, não tem que ser de novo ouvido antes da liquidação, salvo em caso de invocação de factos novos em relação aos quais ainda não tenha tido oportunidade de se pronunciar.

II - É o que resulta do disposto no n.º3 do art.60.º da LGT, na redacção do n.º 1 do art. 13.º da Lei n.º 16- A/2002, de 31 de Maio, como é o que resultava já da anterior redacção do art.60.º da LGT, sendo que o referido n.º 1 do art. 13.º da Lei n.º 16 -A/2002, tal como o legislador consignou no n.º 2 daquele artigo, tem natureza interpretativa.”

Em face do exposto improcede o alegado vício de forma por preterição de formalidade legal consubstanciada em falta de audição prévia antes da liquidação.

Perfilhamos o entendimento vertido na sentença recorrida.

Dir-se-á ainda que o acórdão do STA citado pela Recorrente não tem aplicação ao caso dos autos, uma vez que os factos aí em apreciação são anteriores à introdução do actual n.º 3 do artigo 60.º da LGT pela Lei n.º 16-A/2002, tendo os anteriores n.ºs 3 a 6 passado a serem os nºs 4 a 7. Acresce que, a nova redacção do n.º 3, então introduzida, tem natureza interpretativa.

Estabelece, pois, o n.º 3 do artigo 60.º da LGT, a dispensa de audição do interessado prevista na alínea a) do n.º 1 (antes da liquidação), no caso daquele já ter sido ouvido, como no caso dos autos, antes da conclusão do relatório de inspecção (tendo participado no âmbito do procedimento de revisão), por o acto de liquidação ser um acto consequente daquele procedimento.

O Recorrente não alegou que a Administração Tributária invocou novos factos e que não lhe foi conferido quanto a eles novo direito de audição prévia, ou que tenha invocado factos que não foram apreciados, em violação desse mesmo direito, mas, tão só, que não lhe foi dada a possibilidade do exercício do direito de audição entas da notificação da liquidação.

Desta maneira, dúvidas não subsistem de que foi dada a possibilidade ao sujeito passivo de se pronunciar sobre o teor do projecto do RIT pois que foi notificado para esse efeito, tendo o mesmo apresentado pronúncia, conforme resulta do probatório, pelo que foi cumprida a formalidade procedimental consubstanciada na audição prévia do contribuinte inspecionado e, por força dessa audição é dispensada nova audição antes da liquidação (artigo 60.º, n.º 3 da LGT).

Pelo que deixamos dito, não merece a sentença recorrida censura, pelo que improcede o alegado vício de forma por preterição de formalidade legal consubstanciada em falta de audição prévia antes da liquidação.


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3.3.3. Erro de julgamento quanto à violação do principio constitucional da tributação do lucro real e da fundamentação dos autos

A última questão objecto do presente recurso consiste em saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento no que respeita à violação do princípio constitucional da tributação do lucro real e da fundamentação dos autos.

Alega a Recorrente que o entendimento dos Serviços de Fiscalização constitui uma afronta ao princípio constitucional da tributação pelo lucro real, o que leva a liquidações viciadas, por a AT pretender tributar o prejuízo e não o lucro (ponto iv. da conclusão da alegação de recurso).

A este propósito escreveu-se na sentença:

Na verdade os serviços de inspeção no âmbito dos poderes que legalmente lhe estão atribuídos, recolheram elementos que permitiram aplicar métodos indiretos e correções meramente aritméticas que resultou na correção da matéria coletável do IRC de 2008 tendo vertido no respetivo relatório de inspeção, as razões de facto e de direito que conduziram a essas correcções (cfr. alínea D) do probatório) pelo que improcede a alegada violação do princípio da tributação do lucro real e da fundamentação dos atos.

Vejamos.

O artigo 104.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa (CRP) preceitua:

«2. A Tributação das empresas incide fundamentalmente sobre o rendimento real.»

Como apontam J.J. Gomes Canotilho e Vital Moreira «Tal opção, porém, exige um sistema fiável de informação sobre os resultados das empresas, pelo que, não sendo possível em muitos sectores, acabam por ser tributados não os lucros efectivamente auferidos mas sim os presumidamente realizados. Foi certamente para ter em conta tal situação que o preceito constitucional apenas exige que a tributação incida «fundamentalmente» sobre o rendimento real das empresas.» (in Constituição da República Portuguesa, Anotada, Vol. I, 4.ª Edição Revista, Coimbra Editora, nota III ao artigo 104.º, pág. 1100).

Dispõe o n.º 1 do artigo 17.º do CIRC:

«1 - O lucro tributável das pessoas colectivas (…) é constituído pela soma algébrica do resultado líquido do exercício e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo período e não reflectidas naquele resultado, determinados com base na contabilidade e eventualmente corrigidas nos termos deste Código.»

Nos termos do artigo 115.º do CIRC as sociedades têm de ter contabilidade, a qual deve espelhar registos fiáveis, capazes de revelar a real situação económica da empresa.

Nas palavras de Rui Duarte Morais «(…) há que não o ignorar, a tributação pelo rendimento real – que, ao menos num primeiro momento, corresponderá ao apurado pelo sujeito passivo com base na sua contabilidade – coloca problemas, seja pela evasão fiscal que assim se possibilita, seja pela extensão das obrigações acessórias que um tal sistema põe a cargo do contribuinte.» (in Apontamentos ao IRC, Almedina, pág. 59).

Com efeito, como pressuposto da tributação pelo lucro real, para que a determinação do rendimento líquido possa servir como base tributável, a lei atribui ao contribuinte deveres de cooperação, realçando-se a obrigação fiscal de manter um completo registo de todas as operações, a fim de permitir a determinação do rendimento pelo contribuinte e o controlo pela Administração tributária dessa mesma determinação.

Sobre o principio da tributação do lucro tributável, pronunciou-se este Tribunal Central Administrativo Sul, de 09/05/2006, proferido no processo n.º 01096/06, com o seguinte discurso fundamentador:

«O nosso ordenamento jurídico consagra, como regime regra da tributação, o método declarativo em que coloca na esfera de actuação dos particulares contribuintes a iniciativa no procedimento de apuramento, fixação e pagamento dos impostos.

Tal sistema pressupõe uma cooperação estreita entre a AT e o contribuinte, em ordem a alcançar a tributação dos rendimentos reais, cooperação essa que impõe, desde logo, que o último faculte à primeira, todos os elementos que viabilizem o correcto apuramento daqueles.

Para hipótese de tal cooperação se gorar o ordenamento faculta à AT o recurso a meios alternativos, sob pena de se colocar nas mãos dos contribuintes, o livre arbítrio de pagarem, ou não, os impostos que forem devidos.

Esses meios alternativos são não só o recurso às correcções técnicas ou aos métodos indiciários, como o próprio regime de tributação simplificado ora em questão.

(…)

Conceptualmente, em termos gerais e como decorre hoje do disposto no nº 2 do artº 87º da LGT, procede-se à avaliação indirecta nas situações em que não existem elementos fiáveis e suficientes para demonstrar exactamente o valor dos rendimentos ou bens ou serviços sujeitos a tributação e, por essa razão, a sua tributação é feita com base em indícios, presunções ou outros elementos de que a AT disponha, inclusivamente aqueles que poderiam ser utilizados na avaliação directa.

A avaliação indirecta é, de resto, excepcional, a ela apenas se procedendo quando não seja viável a determinação da matéria tributável por meio da avaliação directa, seja por falta de elementos para se operar com esta, seja por existirem razões para suspeitar que o valor a que conduz a aplicação dos métodos de avaliação directa não é a matéria tributável real – cfr. artºs 87º, nº 1, al. c), e 89º da LGT).

E, definindo o âmbito da avaliação directa, dispõe o Artigo 81.° da LGT que: 1. A matéria tributável é avaliada ou calculada directamente segundo os critérios próprios de cada tributo, só podendo a administração tributária proceder a avaliação indirecta nos casos e condições expressamente previs-tos na lei.

No preceito faz-se a referência cumulativa a avaliação e cálculo da matéria colectável dir-se-á, na senda de Diogo Leite de Campos, Benjamim da Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, LGT Comentada e Anotada, 3ª ed., pág. 418 e ss, que a designação de avaliação estará reservada para os casos em que a determinação da matéria tributável é feita através de métodos que, mesmo com uti-lização de critérios objectivos (como exige o n.° l do art. 84.° da L.G.T.), não podem dei-xar de envolver uma margem de subjectividade, como sucede nos casos de determinação do valor de bens (entre outros casos, para efeitos de sisa, imposto sobre sucessões e doa-ções, contribuição autárquica, em certos casos, direitos alfandegários e imposto automó-vel) e naqueles em que a determinação é feita utilizando métodos indirectos.
Destarte
as referências a avaliação circunscrevem-se aos casos em que houver aplicação de elementos de carácter subjectivo.

Conforme preceitua o Artigo 83.° da LGT a avaliação directa, visa a determinação do valor real dos rendi-mentos ou bens sujeitos a tributação ( nº 1) e a avaliação indirecta ( que o contribuinte disse ter sido utilizada) visa a determinação do valor dos rendimentos ou bens tributáveis a partir de indícios, presunções ou outros elementos de que a administração tributária disponha (nº 2).

Resulta do inciso legal transcrito que quer a avaliação directa como a indirecta têm por fim determinar o valor dos ren-dimentos ou bens sujeitos a tributação, nos seguintes termos:

a)- no primeiro caso, a avaliação é feita com base em elementos de prova do valor real dos bens ou rendimentos tributáveis e, por isso, visa-se determinar com exactidão este valor;

b)- Os casos em que se procede a avaliação indirecta, indicados no art. 87.° da L.G.T., são situações em que não existem elementos fiáveis suficientes para demonstrar exacta-mente o valor daqueles bens ou rendimentos, metodologia que o contribuinte diz ter sido seguida pela IT, o que não corresponde à verdade pois a avaliação do bem sujeitos a tributação não foi feita com base em indícios, presunções ou outros elementos de que a administração tributária dis-puser, inclusivamente alguns que poderiam ser utilizados na avaliação directa.

De resto, dado o seu carácter excepcional, apenas se procede a avaliação indirecta em casos em que não seja viável determi-nar a matéria tributável através de avaliação directa, quer por falta de elementos para esta ser levada a cabo, quer por haver razões para suspeitar que o valor a que conduz a apli-cação dos métodos de avaliação directa não é a matéria tributável real [arts. 87.°, n.° l, alínea c), e 89.° da L.G.T.].» (disponível em www.dgsi.pt/).

Prosseguindo.

No caso em apreço, a Administração Tributária fundamentou o recurso a métodos indirectos no disposto nos artigos 57.º do CIRC e 87.º, alínea b), 88.º, alínea a) e 90.º da LGT, face às omissões, inexactidões e irregularidades encontradas, como decorre do relatório de inspecção Tributária (alíneas A. e D. do probatório)

A Administração Tributária demonstrou a verificação dos pressupostos do recurso a métodos indiciários, no que respeita ao ano de 2008, em resultado da verificação de facturação fictícia e registo fraudulento nos montantes das compras. Apuraram os Serviços de Inspecção Tributária o valor das vendas presumidas e não declaradas pelo sujeito passivo em 2008, no valor de € 53.263,19, que constitui um acréscimo ao lucro tributável de igual montante.

Tendo ainda Administração Tributária fundamentado o critério de quantificação utilizado em termos claros e inteligíveis, incumbia à Impugnante a prova do erro ou excesso ou da manifesta inadequação do critério de quantificação à realidade, a qual tem de ser ajuizada por referência àquela fundamentação.

Ora, cabia a Impugnante o ónus da alegação e prova de que se encontrava numa situação em que não era permitido o uso de métodos indiretos. Porém, não alegou factos eficazes para pôr em causa, quer a aplicação de tais métodos, quer a existência de erro ou excesso na quantificação da matéria colectável, nem se afigura evidente para este Tribunal que o alegado excesso na quantificação seja manifesto, notório ou ostensivo.

Alega a Recorrente que a AT incorreu em equivoco nas liquidações impugnadas por referência à Declaração Modelo 22 de substituição do ano de 2008, relativa às correcções que aceitou, por o resultado se ter mantido negativo, originando um reembolso de € 9.711,75 (ponto II.III. das alegações de recurso).

Contudo, a Recorrente não identifica quais foram as correcções que aceitou e, por maioria de razão, se têm correspondência com as correcções propostas pelos Serviços de Inspecção Tributária e mantidas em sede de procedimento de revisão da matéria colectável, sendo certo que a declaração de substituição e subsequente liquidação (considerada na demonstração de acerto de contas) são anteriores ao pedido de revisão e respectiva decisão, que manteve a correcção ao lucro tributável proposta no RIT.

Assim, os factos alegados pela Recorrente são imprestáveis para lograr obter a anulação da liquidação impugnada.

Acresce referir, que lido o requerimento de pedido de revisão, em lado algum se faz referência à aludida declaração de substituição, pelo que tudo indica que respeita às correcções aritméticas que foram aceites pela Impugnante e referidas na decisão de procedimento de revisão.

Dir-se-á, ainda, que a não declaração de todos os custos e proveitos obtidos ou incorridos em determinado exercício é que constitui violação do princípio da tributação real, porque se não foram declarados todos os proveitos, o lucro que vier a apurar-se não corresponde ao lucro real desse exercício.

Concluindo, não se mostra violado o princípio da tributação do lucro real, nem o dever de fundamentação dos actos.

Improcede, portanto, este fundamento do recurso.

Nesta conformidade, impõe-se negar provimento ao mesmo e confirmar a decisão recorrida, com a presente fundamentação.

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Conclusões/Sumário:

I. A doutrina e jurisprudência maioritárias consideram que a nulidade da sentença por falta de especificação dos fundamentos de facto só ocorre quando faltem em absoluto os fundamentos de facto em que assentou a decisão, não ocorrendo quando a fundamentação é escassa, incompleta, não convincente, deficiente ou errada.

II. Os documentos emitidos pela AT, não podem servir de prova de que a Impugnante foi notificada das liquidações de imposto e de juros através do Sistema ViaCTT, porquanto tais “prints” informáticos, são elaborados pela própria Administração Tributária para efeitos internos e, por isso, não provam, por si só, a realidade fáctica neles referida.

III. A finalidade que a lei pretende atingir com a exigência de carta registada é atingida quando, não obstante o não cumprimento dessa formalidade, se prove que o destinatário tomou conhecimento do acto notificado, pelo que a formalidade de carta registada degrada-se em não essencial e dela não resulta a invalidade da notificação.

IV. Embora a AT não cumpra todas as formalidades da notificação da liquidação, e ainda assim, resulta demonstrado que a notificação chegou ao poder do destinatário, esta não deve ser anulada porque da violação do preceito legal não resulta qualquer lesão efectiva, real dos interesses protegidos pelo preceito legal.

V. O prazo de caducidade da liquidação de 4 anos, que se corresse ininterruptamente, teria terminado em 31/12/2012, deve ser acrescido de 89 dias (inspecção externa) e de mais 343 (pedido de revisão à matéria colectável), mercê das duas causas autónomas de suspensão do prazo de caducidade, previstas no n.º 1 do artigo 46.º, n.ºs 1 e 2, alínea e) da LGT.

VI. Como pressuposto da tributação pelo lucro real, para que a determinação do rendimento líquido possa servir como base tributável, a lei atribui ao contribuinte deveres de cooperação, realçando-se a obrigação fiscal de manter um completo registo de todas as operações, a fim de permitir a determinação do rendimento pelo contribuinte e o controlo pela Administração tributária dessa mesma determinação.

VII. A não declaração de todos os custos e proveitos obtidos ou incorridos em determinado exercício é que constitui violação do princípio da tributação real, porque se não foram declarados todos os proveitos, o lucro que vier a apurar-se não corresponde ao lucro real desse exercício.


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IV – DECISÃO

Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da 1.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença, embora com a presente fundamentação.

Custas a cargo da Recorrente.

Notifique.


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Após trânsito em julgado, remeta cópia do presente acórdão ao processo n.º 832/12.7BEALM (cfr. fls. 149 dos autos de suporte físico).

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Lisboa, 7 de Dezembro de 2021.


Maria Cardoso - Relatora
Catarina Almeida e Sousa – 1.ª Adjunta
Isabel Fernandes – 2.ª Adjunta