Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2/11.1 BEALM
Secção:CT
Data do Acordão:07/13/2023
Relator:ISABEL FERNANDES
Descritores:APENSAÇÃO
OPOSIÇÃO
CUMULAÇÃO ILEGAL
EXCEPÇÃO INOMINADA
Sumário:I – A dedução de uma única oposição a diversas execuções fiscais que não estão apensadas constitui excepção dilatória inominada que obsta ao conhecimento do mérito daquela (artigo 576º do CPC).
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I – RELATÓRIO

R..., melhor identificado nos autos, na qualidade de revertido, deduziu oposição no processo de execução n.º 21…7, instaurado pelo Serviço de Finanças da Moita, referente a IRS, IRC, IVA e coimas no montante de € 40.682,16 e originariamente instaurado contra a sociedade M… Construções, Lda.

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, por decisão de 15 de Janeiro de 2016, julgou a oposição totalmente procedente.

Não concordando com a decisão, a Fazenda Pública, interpôs recurso da mesma, tendo, nas suas alegações de recurso, formulado as seguintes conclusões:

«I. Ressalvado o merecido respeito, que é muito, entende-se que incorreu a douta sentença em erro sobre o julgamento da matéria de facto, neste caso, ao não levar ao probatório vários factos que constam dos autos;

II. No entendimento da recorrente, foi incorretamente julgado, por não ter sido levado ao probatório, o facto de os processos de execução fiscal (PEF) n.º 218…2 e apensos e o PEF 21… e apensos não se encontram apensos entre si.

III. Não consta do PEF que o Oponente tenha requerido, ao abrigo do n.º 1 do art. 179º, a apensação das execuções ao órgão de execução fiscal;

IV. É entendimento pacífico da doutrina e da jurisprudência que a oposição à execução fiscal, embora com tramitação autónoma em relação ao processo executivo, funciona na dependência deste, assumindo a função de contestação à pretensão do exequente;

V. Refere Jorge Lopes de Sousa, CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO, ANOTADO E COMENTADO, Volume III, 6.ª edição, Áreas Editora, 2011, a pág. 543: "Se correrem duas ou mais execuções contra o mesmo executado, mas não tiver sido efectuada a apensação (esta não é forçosa, como se conclui do preceituado no n.º 3 do art. 179.º do CPPT), não poderá ser apresentada uma única oposição, na sequência das respectivas citações, mesmo que estas tenham sido efectuadas concomitantemente e a contestação relativa a todas as execução assente nos mesmos fundamentos de facto e de direito, pois os processos de execução fiscal têm tramitação separada. Assim, se, na sequência de várias citações respeitantes a diferentes execuções pendentes contra o mesmo executado, este apresentar uma única oposição em relação a mais que uma delas, estar-se-á perante uma situação de cumulação ilegal de oposições.";

VI. Entendimento que tem, também, sido o adotado pelos nossos tribunais superiores.

VII. Ainda que a contestação apresentada nos autos, relativamente a ambas as execuções fiscais, assente nos mesmos fundamentos de facto e de direito, verifica-se uma situação de cumulação ilegal de oposições, que configura uma exceção dilatória inominada porque não constante da enumeração do art. 578.º do CPC, aplicável ex vi al. e) do art. 2.º do CPPT;

VIII. Exceção dilatória que é de conhecimento oficioso, e obsta ao conhecimento do pedido e determina o indeferimento a absolvição da instância, por força do disposto na al. e) do art. 278.º do CPC, ex vi al. e) do art. 2.º do CPPT;

IX. Exceção dilatória não se pode considerar sanada nos termos do n.º 3 do art. 278.º do CPC pois que está em causa o interesse público da boa administração da justiça e não apenas interesse particular do oponente;

X. Ao decidir como o fez a douta sentença fez errada aplicação e interpretação, entre outros, do art. 203.º do CPPT e dos arts. 278.º, n.º 1, al. e), 578.º, 590.º, n.º.1, e 608.º, nº 1, todos do CPC, aplicáveis ex vi al. e) do art. 2.º do CPPT.

Nestes termos e nos mais de Direito aplicáveis, com o douto suprimento judicial, requer-se a V.as Ex.as se dignem julgar PROCEDENTE o presente recurso, por totalmente provado e, em consequência, ser a douta Sentença ora recorrida, revogada e substituída por douto Acórdão que absolva da instância a Fazenda Pública, tudo com as devidas e legais consequências.»


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Não foram apresentadas contra-alegações.
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O Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo, devidamente notificado para o efeito, ofereceu aos autos o seu parecer no sentido da procedência do recurso.
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Com dispensa de vistos, vem o processo submetido à conferência desta Secção do Contencioso Tributário para decisão.



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II – FUNDAMENTAÇÃO

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:

«Compulsados os autos e analisada a prova documental, encontram-se assentes, por provados, os seguintes factos com interesse para a decisão de mérito:

1. Em 13/05/2009 foi autuado o processo de execução fiscal nº 21… que corre termos no Serviço de Finanças da Moita, referentes a IRS – retenções na fonte - no montante de € 154,00 em que é executada a sociedade comercial por quotas sob a firma M… Construções, Lda. (cfr. doc. junto a fls. 1 e 2 do processo executivo junto aos autos);

2. Ao processo identificado no ponto anterior foram apensos os processos executivos nº 218….8155, 218….3073, 218…5513, 218….3869, 21….3945, 218….93460, 218….0815, 21….837, 21…..1868, 21…..925, 21…..94 e 218…..57, todos da sociedade identificada no ponto anterior, referentes a IVA, IRS e IRC ficando a dívida a valer por € 23.875,01 (cfr. doc. junto a fls. 38 da cópia do processo executivo junto aos autos);

3. Em 17/05/2009 foi autuado o processo de execução fiscal nº 218….862 que corre termos no Serviço de Finanças da Moita, referentes a coimas no montante de € 260,00 em que é executada a sociedade comercial por quotas sob a firma M… Construções, Lda. (cfr. doc. junto a fls. 73 e segs. Do processo executivo junto aos autos);

4. Ao processo identificado no ponto anterior foram apensos os processos executivos nº 21….46, 218…..56, 218….79, 218…..54, 21….130, 21…..49 e 2…..44, todos da sociedade identificada no ponto anterior, referentes a coimas ficando a dívida a valer por € 1.551,76 (cfr. doc. junto a fls. 74 da cópia do processo executivo junto aos autos);

5. Em 08/09/2010 foi elaborada uma informação pelo serviço de finanças da qual consta o seguinte: “(…) 2. A sociedade cessou a sua actividade para efeitos fiscais em 30/06/2010. (…) 4. A dívida exequenda da responsabilidade da sociedade ascende já ao total de € 34.510,10. (…) 6. Após as diligências efectuadas, nomeadamente a consulta de todos os sistemas informáticos, para averiguação de existência de bens, não foi possível encontrar quaisquer bens penhoráveis em nome da executada e devedora originária. (…)” (cfr. doc. junto a fls. 47, verso, e 48, e 81, verso e 82 da cópia do processo instrutor junto aos autos);

6. Por despacho de 15/09/2010 foi determinado proceder à audição do oponente sobre a intenção de contra si reverterem as dívidas exequendas (cfr. doc. junto a fls. 49, verso, e 83, verso, da cópia do processo executivo junto aos autos);

7. Em 15/09/2010 foi remetido ao oponente, por correio registado sob o nº RC467903048PT, um ofício para este se pronunciar sobre a intenção de contra si reverterem as dívidas exequendas (cfr. doc. junto a fls. 50, verso, e 51, 84, verso, e 85 da cópia do processo executivo junto aos autos);

8. O ofício identificado no ponto anterior foi devolvido com a indicação “Não atendeu” (cfr. doc. junto a fls. 51 e 85, verso, da cópia do processo executivo junto aos autos);

9. Em 12/10/2010 foi elaborada uma informação da qual consta que o oponente tendo sido notificado não se pronunciou em sede de audiência prévia (cfr. doc. junto a fls. 52 e 86 da cópia do processo executivo junto aos autos);

10. Por despacho de 15/10/2010, foi determinada a reversão contra o oponente com fundamento gerência do oponente remetendo para a letra do art. 24º da LGT (cfr. doc. junto a fls. 52, verso, da cópia do processo executivo junto aos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido);

11. Por despacho de 18/10/2010, foi determinada a reversão contra o oponente com fundamento gerência do oponente remetendo para a letra do art. 24º da LGT (cfr. doc. junto a fls. 86, verso, da cópia do processo executivo junto aos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido);

12. Por ofício de 29/10/2010, o Banco Millennium BCP veio informar que não existem direitos de crédito para penhorar/arrestar/arrolar, em nome da devedora originária (cfr. doc. junto a fls. 55 da cópia do processo executivo junto aos autos);

13. A sociedade tinha várias viaturas para fazer as deslocações aos locais onde instalavam os sistemas de seguranças (depoimento da testemunha D…);

14. A devedora originária tinha sistemas de segurança e ferramentas em 2009 (depoimento da testemunha D…);»


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Factos não provados

«A AF não efectuou qualquer diligência para apurar da existência ou não de bens propriedade da devedora originária. De facto, no processo instrutor junto aos autos pela AT, nenhum documento consta que possa comprovar o desenvolvimento de diligências no sentido de encontrar bens da devedora originária. Apenas é elaborada uma informação referida no ponto 3 do probatório onde se afirma que foram efectuadas diligências. Não são especificadas que diligências que foram feitas, nem consta nenhum documento comprovativo da realização das mesmas.
A Fazenda Pública não faz qualquer prova da culpa do oponente na falta de pagamento das coimas.
Dos factos constantes da oposição, todos objectos de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita.»

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Motivação da decisão de facto

«A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações, não impugnados, que dos autos constam, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório, bem como no depoimento das testemunhas arroladas. A primeira testemunha, Sr. D…., foi empregado da sociedade fazendo montagens de sistemas de segurança, sendo que considerava o Sr. R…. como o patrão. A testemunha demonstrou conhecer bem a realidade da sociedade, foi espontânea e segura pelo que o seu testemunho foi considerado credível. A sociedade tinha carrinhas e carros. Pelo menos em relação a duas tinha a certeza que eram da sociedade porque o livrete indicavam a sociedade. Em relação às outras não sabe mas pensa que sim. Começou a trabalhar na sociedade em 2007 e deixou de trabalhar nela no final de 2009 ou inícios de 2010, não conseguindo, no entanto, estabelecer datas certas.

A segunda testemunha inquirida, é companheira do oponente, e trabalhou nos escritórios da sociedade devedora originária em 2008 e não soube precisar a sua saída da empresa. Questionada numa primeira fase afirmou que tinha saído em 2009, no início, mas depois a instâncias do advogado respondeu que teria saído em 2010. O seu depoimento foi um pouco confuso e pouco preciso, tendo poucas recordações especialmente no que toca às notificações. Também confirmou que existiam viaturas cujos seguros eram pagos pela sociedade.»


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- De Direito

Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.

Ora, lidas as conclusões das alegações de recurso, resulta que está em causa saber se o Tribunal a quo errou ao não apreciar a excepção inominada de conhecimento oficioso de cumulação ilegal de oposições apresentadas contra dois processos de execução fiscal distintos e não apensados.

Vejamos, então.

O Oponente, ora Recorrido, deduziu oposição à execução fiscal contra os processos de execução fiscal nº 2186/….862 e apensos e nº …..5427 e apensos, como resulta da p.i.

Afirmou, no artigo 2º da p.i., que apresentou uma única oposição contra os dois processos executivos em virtude de os fundamentos serem os mesmos.

Compulsados os autos, verifica-se que, a fls. 81, foi proferido despacho no qual se determinou a notificação do Oponente para se pronunciar quanto à ilegal cumulação de oposições.

No entanto, não obstante a questão prévia ter sido suscitada pela juiz a quo, o que se constata é que, na sentença recorrida nada se disse quanto a esta, tendo sido conhecido o mérito da oposição.

Ora, não só a questão era de conhecimento oficioso, como foi, efectivamente, suscitada pelo Tribunal, pelo que se impunha conhecê-la, o que não foi feito.

Em sede recursiva vem, agora, a Fazenda Pública pugnar pela verificação da referida excepção de cumulação ilegal de oposições, uma vez que os processos de execução fiscal não se encontram apensados entre si, circunstância que não vem posta em causa.

Pelo contrário, o Recorrido afirma que assim é, como vimos.

A situação descrita enquadra-se no âmbito da nulidade da sentença por omissão de pronúncia, já que a sentença recorrida não emitiu pronúncia quanto à excepção de cumulação ilegal de oposições que tinha sido suscitada pelo Tribunal.

Uma vez que às partes já foi dada oportunidade para sobre a mesma se pronunciar, e considerando o teor da argumentação da Recorrente, está este TCAS em condições de a apreciar, conhecendo em substituição, o que se fará de seguida.

Vejamos.

Esta questão tem vindo a ser tratada na jurisprudência de forma constante no sentido de não ser possível deduzir uma única oposição contra processos de execução fiscal que não estejam apensados.

Relativamente a esta matéria foi proferido Acórdão pelo STA, em 4 de Outubro de 2019, no âmbito do processo nº 824/12, do qual nos permitimos extrair o seguinte:

“(…) como vem sublinhando a jurisprudência consolidada desta Secção de Contencioso Tributário, não é legalmente admissível deduzir uma única oposição a várias execuções fiscais que não se encontrem apensadas, constituindo tal situação uma excepção dilatória inominada que determina o indeferimento liminar da petição inicial ou a absolvição da Fazenda Pública da instância, consoante seja verificada em fase liminar ou na sentença. – cf. neste sentido, os Acórdãos de 05.12.2007, recurso 795/07, de 09.09.2009, recurso 521/09, de 04.09.2011, recurso 242/11, de 25.01.2012, recurso 802/11, de 21.03.2012, recurso 867/11, de 28.11.2012, recurso 840/12, de 16.01.2013, recurso 292/12, de 17.04.2013, recurso 199/13, de 02.07.2014, recurso 390/14, de 24.05.2016, recurso 810/15 e de 21.06.2017, recurso 883/14, todos in www.dgsi.pt.
Fazendo uma síntese da doutrina defendida nestes arestos assim se sublinhou no Acórdão 802/11 de 25 de Janeiro de 2012:

«(….) conquanto a oposição apresente a fisionomia de uma acção, instaurada pela apresentação duma petição inicial, a verdade é que ela funciona como contestação. O seu fim é impugnar a própria execução fiscal; daí o nome de oposição» (ALFREDO JOSÉ DE SOUSA e JOSÉ DA SILVA PAIXÃO, Código de Processo Tributário Comentado e Anotado, Almedina, 4.ª edição, anotação 2 ao art. 285.º, pág. 603.) e «a oposição à execução fiscal, embora com tramitação processual autónoma relativamente à execução fiscal, funciona na dependência deste como uma contestação à pretensão do exequente» (JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., volume III, anotação 2 ao art. 203.º, pág. 428, com indicação de jurisprudência.)(….)
A dedução de uma única oposição a diversas execuções fiscais que não estão apensadas constitui uma razão obstativa do conhecimento do mérito e, por isso, uma excepção dilatória (A excepção dilatória, segundo MANUEL DE ANDRADE, Noções Elementares de Processo Civil, 1979, pág. 129, consiste na «arguição de quaisquer irregularidades ou vícios de natureza processual que faz obstáculo - se não for sanada, quando a lei o consinta - à apreciação do mérito da causa (bem ou mal fundado na pretensão do autor; procedência ou improcedência da acção) no processo de que se trata ou pelo tribunal onde ela foi proposta».), nos termos do art. 493.º, n.ºs 1 e 2, do CPC; excepção dilatória inominada, porque não consta do elenco meramente exemplificativo do art. 494.º do mesmo Código. Essa excepção, porque evidente, se detectada na fase liminar, determina o indeferimento liminar da oposição, nos termos do art. 234.º-A, n.º 1, sem prejuízo do recurso à faculdade concedida pelo art. 476.º, ambos do CPC.
Se não detectada liminarmente, a excepção dilatória deve ser conhecida na sentença, dando origem à absolvição da instância, nos termos do disposto nos arts. 288.º, n.º 1, alínea e), 493.º, n.ºs 1 e 2, 495.º e 660.º, n.º 1, do CPC, sempre sem prejuízo da faculdade concedida pelo art. 289.º, n.º 2, do mesmo Código (Cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., volume III, anotação 12 ao art. 206.º, págs. 543 a 545, que considera juridicamente adequadas estas soluções).
É certo que nem sempre a verificação de uma excepção dilatória deverá conduzir à decisão de absolvição da instância, atento o disposto no art. 288.º, n.º 3, do CPC, preceito introduzido pela reforma de 1995/1996 (Decretos-Leis n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro, e n.º 180/96, de 25 de Setembro.) e que dispõe: «As excepções dilatórias só subsistem enquanto a respectiva falta ou irregularidade não for sanada, nos termos do n.º 2 do artigo 265.º; ainda que subsistam, não terá lugar a absolvição da instância quando, destinando-se a tutelar o interesse de uma das partes, nenhum outro motivo obste, no momento da apreciação da excepção, a que se conheça do mérito da causa e a decisão deve ser integralmente favorável a essa parte».

Trata-se de «um regime francamente inovador», que surge por razões de «economia processual decorrentes da necessária prevalência das decisões de fundo sobre as de mera forma – ultrapassando os obstáculos a uma verdadeira composição do litígio, fundados numa visão puramente lógico-conceptualista do processo» (Cf. o Preâmbulo do Decreto-Lei n.º 180/96, de 25 de Setembro.).

Significa isto que, por força do citado art. 288.º, n.º 3, do CPC, aplicável subsidiariamente ao processo judicial tributário (cf. art. 2.º, alínea e), do CPPT), a verificação de uma excepção dilatória não suprida não conduz inexoravelmente à absolvição da instância: se o pressuposto processual em causa se destinar à tutela do interesse de uma das partes, desde que se não verifique qualquer outra circunstância impeditiva do conhecimento do mérito e se a decisão a proferir dever ser inteiramente favorável à parte em cujo interesse o pressuposto foi estabelecido, o juiz poderá, no momento da apreciação da excepção, conhecer do mérito da causa. Visa-se, assim, assegurar a prevalência dos critérios de justiça material sobre os critérios de justiça formal, tendo sempre presentes também razões de economia processual.

Impõe-se, pois, indagar dos interesses que a referida excepção dilatória inominada visa tutelar.
A generalidade dos pressupostos processuais visa acautelar os interesses das partes, ou seja, assegurar que a parte possa defender convenientemente os seus interesses em juízo (quando autor) e não seja indevidamente incomodada com a propositura de acções inúteis ou destituídas de objecto (quando réu). É para estas situações que o art. 288.º, n.º 3, 2.ª parte, do CPC, estipula que, ainda que a excepção dilatória subsista, não deverá ser proferida a absolvição da instância quando, destinando-se o pressuposto em falta a tutelar o interesse de uma das partes, nenhum outro motivo obste, no momento da sua apreciação, a que se conheça do mérito da causa e a decisão possa ser integralmente favorável a essa parte.
Mas os pressupostos processuais podem ter como escopo acautelar, não o interesse das partes, mas o interesse público da boa administração da justiça, e, neste caso, já não pode funcionar o princípio da sanação contido no n.º 3 do art. 288.º do CPC.
No caso sub judice, a exigência de que seja deduzida uma oposição relativamente a cada execução fiscal que não esteja apensada, não visa tutelar o interesse das partes, designadamente o do oponente; visa, isso sim, assegurar o interesse público da boa administração da justiça, sabido que se pode tornar inviável para o tribunal apreciar uma contestação a diversas execuções que não estão apensadas e que até podem estar em fases processuais completamente distintas, eventualmente, até em serviços de finanças diferentes, bem como lhe será impossível, a final, dar cumprimento ao disposto no art. 213.º do CPPT, que prescreve que a oposição, quando terminada, deverá ser apensada ao processo de execução fiscal.» (fim de citação)(…)”

Acolhendo a doutrina expressa no Acórdão transcrito e considerando que, no caso dos presentes autos, o Recorrido sabia que os processos de execução fiscal não se encontram apensados entendemos que a Recorrente tem razão.

Consta da informação elaborada pelo Serviço de Finanças da Moita, ao abrigo do preceituado no artigo 208º do CPPT, que os processos de execução fiscal não se encontram apensados – cfr. fls. 34.

Por outro lado, não resulta dos autos que o Recorrido tenha requerido a apensação junto do órgão da Execução Fiscal.

Como resulta do probatório, foram proferidos despachos de reversão distintos em cada uma dos processos executivos.

Acresce dizer que, como se afirma no Acórdão do STA citado, numa situação destas, em que o executado deduz oposição, mediante uma única petição inicial, a execuções que não estejam apensadas entre si, não se justifica que o tribunal o notifique para indicar, no prazo que fixar, qual o pedido ou os pedidos que continuarão a ser apreciados no processo.

Isto, porque, admitindo que o oponente viesse escolher uma dessas execuções para que o processo de oposição prosseguisse, ele ficaria aqui desprotegido no que respeita às restantes execuções; é que, nesse caso, a lei não prevê a possibilidade de apresentação de novas petições de oposição relativamente às execuções restantes (cf. ainda neste sentido, os também já referidos acórdãos da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 5 de Dezembro de 2007, recurso 795/07 e de 17.04.2013, recurso 199/13).
Neste contexto, e tendo em conta que o direito do oponente à tutela jurisdicional efectiva não fica comprometido, já que pode ainda fazer-se valer da faculdade que lhe concede o Código de Processo Civil (arts. 560º e 590º, nº 1 do Código de Processo Civil) de deduzir oposições autónomas contra as várias execuções, no prazo de 30 dias contados do trânsito em julgado desta decisão, impõe-se manter a decidida absolvição da Fazenda Pública da instância por força da excepção dilatória inominada da ilegal dedução de uma única oposição contra várias execuções fiscais não apensadas.

Assim sendo, julga-se verificada a nulidade da sentença recorrida e, conhecendo em substituição, tem-se por verificada a excepção dilatória inominada da ilegal dedução de uma única oposição contra várias execuções fiscais não apensadas, concedendo-se provimento ao recurso, o que conduzirá à absolvição da Fazenda Pública da instância.


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III- Decisão

Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em:


· Conceder provimento ao recurso,


· Anular a sentença recorrida e, conhecendo em substituição, julgar verificada a excepção dilatória inominada da ilegal dedução de uma única oposição contra várias execuções fiscais não apensadas, absolvendo-se a Fazenda Pública da instância.

Custas pelo Recorrido.

Registe e Notifique.

Lisboa, 13 de Julho de 2023

(Isabel Fernandes)

(Catarina de Almeida e Sousa)

(Maria Cardoso)