Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 385/12.6BELRS-R1 |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 12/03/2020 |
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Relator: | MARIA CARDOSO |
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Descritores: | RECLAMAÇÃO CONFERÊNCIA NÃO ADMISSÃO RECURSO JURISDICIONAL INTEMPESTIVIDADE |
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Sumário: | ![]() |
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Votação: | UNANIMIDADE |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: I - RELATÓRIO
1. A..., veio reclamar para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 3, do artigo 652.º do CPC, do despacho proferido pela relatora, em 06/03/2020, que confirmou o despacho da Mma. Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa que não admitiu o recurso deduzido pela Reclamante devido a intempestividade do requerimento de interposição, por ter sido apresentado para além do prazo de 10 dias previsto no n.º 1, do artigo 280.º do CPPT. O Reclamante expôs o fundamento da reclamação para a conferência, no requerimento de fls. 57 (numeração processo electrónico), alegando, em suma, que a Lei n.º 118/2019, no seu artigo 13.º, n.º 1, manda aplicar imediatamente a redacção do CPPT por ela alterada aos recursos das sentenças proferidas após 1 de Janeiro de 2012, alínea c) a contrario, pelo que o recurso interposto da sentença recorrida foi tempestivo. Mais refere que a interpretação da norma contida na citada disposição legal e vertida no despacho recorrido faz interpretação inconstitucional da mesma, ao ofender o artigo 2.º coonestado com o disposto no artigo 20.º, n.ºs 1 e 4 da Constituição da Republica Portuguesa, no sentido em que fere o direito à tutela jurisdicional efectiva que assiste ao recorrente. 2. A Fazenda Pública, notificada nos termos do artigo 652º, nº 3 in fine do CPC, nada disse. 3. O Ministério Público apenas emitiu parecer em sede de reclamação contra o despacho que não admitiu o recurso no sentido de ser negado provimento à reclamação. 4. Colhidos os vistos legais, vem o processo à Conferência para julgamento.
II - FUNDAMENTAÇÃO 1. DE FACTO Com interesse para a apreciação da presente Reclamação, e em função dos elementos existentes nos autos, deu-se como assente no despacho reclamado a seguinte factualidade: «1 – A Reclamante foi notificada da sentença proferida no processo de impugnação através de notificação electrónica expedida ao seu Mandatário em 30/09/2019 (certidão de fls. 14 e segs. da numeração do processo electrónico); 2 – Em 30/10/2019 a Impugnante apresentou requerimento de interposição da sentença referida em 1, acompanhado de alegações (certidão de fls. 14 e segs.); 3 – Por despacho de 12/11/2019, o Tribunal Tributário de Lisboa não admitiu o recurso por ser extemporâneo, em face do disposto no artigo 280.º, n.º 1 do CPPT (fls. 8 da numeração do processo electrónico; 4 – A Reclamante foi notificada do despacho de não admissão do recurso através de ofício datado de 13/11/2019 (certidão de fls. 14 e segs); 5 – Em 18/11/2019 foi apresentada a reclamação que originou o presente processo (fls. 3 e segs. da numeração do processo electrónico).» * 2. DE DIREITO O instituto da reclamação para a conferência, actualmente previsto no artigo 652º, nº 3, do CPC aplicável ao processo judicial tributário por força do disposto no artigo 2.º, alínea e), do CPPT, fundamenta a sua existência no carácter de Tribunal colectivo que revestem os Tribunais Superiores, nos quais a regra é a decisão judicial demandar a intervenção de três juízes, os quais constituem a conferência, e o mínimo de dois votos conformes (artigos 17.º e 35.º, ambos do ETAF). Sempre que a parte se sinta prejudicada por um despacho do relator que não seja de mero expediente, pode requerer que sobre a matéria do despacho recaia um acórdão (artigo 652.º, n.º 3 do CPC). A questão apreciada pela decisão reclamada para conferência consistiu em saber se o despacho de não admissão do recurso incorreu em erro no que respeita à aplicação do n.º 1, do artigo 280.º do CPPT, na redacção anterior à introduzida pela Lei n.º 118/2019, de 17 de Setembro. O Recorrente insurge-se contra a decisão reclamada para a conferência insistindo que o recurso por si interposto da sentença é tempestivo, por a Lei n.º 118/2019, no seu artigo 13.º, n.º 1 manda aplicar imediatamente a redacção do CPPT por ela alterada aos recursos das sentenças proferidas após 1 de Janeiro de 2012. Limita-se, pois, o Recorrente a reiterar que o artigo 13.º, n.º 1 da Lei 118/2019, de 17 de Setembro manda aplicar imediatamente a redacção que introduziu ao CPPT aos recursos das sentenças proferidas após 1 de Janeiro de 2012, sem que tenha expendido qualquer argumento quanto ao teor da norma de entrada em vigor da referida lei, previsto no artigo 14.º Invoca, apenas, que a interpretação do despacho reclamado fere o direito à tutela jurisdicional efectiva que assiste ao recorrente, não desenvolvendo qualquer esforço argumentativo no sentido de substanciar essa violação, que tem que se dar por indemonstrado. Submetida à conferência a decisão proferida em 06/03/2020, cabe confirmar a mesma, por se impor concordância com os seguintes termos: «Com efeito, a presente reclamação tem por objecto o despacho que não admite o recurso da sentença proferida no processo de impugnação, por a apresentação do requerimento não ter observado o prazo previsto no n.º 1, do artigo 280.º do CPPT, na redacção anterior à introduzida pela Lei n.º 118/2019, de 18/07, no entendimento que a redacção que a citada Lei n.º 118/2019 confere ao artigo 280.º do CPPT, não se aplica ao caso em apreço, cuja sentença foi prolatada em 30/09/2019 e notificada em 03/10/2019, uma vez que a citada Lei foi publicada no Diário da República n.º 178/2019, Série I, de 17/09/2019, e dispõe sobre a “aplicação no tempo” que entra em vigor 60 dias após a sua publicação, nos termos do seu artigo 14.º. O reclamante defende que ao presente processo é aplicável o regime de recursos previsto no artigo 280.º e seg. do CPPT na redacção introduzida pela Lei n.º 118/2019, de 17/09, por serem imediatamente aplicáveis aos processos judiciais tributários pendentes, pelo que a Mma. Juiz a quo ofendeu o disposto no artigo 13.º, n.º 1 da Lei n.º 118/2019, de 17/09, ao não admitir o recurso de apelação interposto pelo Reclamante. A questão em apreço é resolvida pelo disposto no artigo 14.º da Lei n.º 118/2019, que regula a aplicação no tempo das normas cujas alterações introduz nos diversos diplomas legais referidos no seu artigo 1.º. Com efeito, o referido artigo 14.º, com a epigrafe “Entrada em vigor” dispõe o seguinte A presente lei entra em vigor 60 dias após a sua publicação. Daqui resulta que a Lei n.º 118/2019 fixou o dia da sua entrada em vigor, o mesmo é dizer, regula os seus efeitos, não sendo de aplicação imediata, mas antes e apenas 60 dias após a sua publicação. Como se ponderou no acórdão do STA de 06/07/2011, proferido no processo n.º 0384/11 «Como se sabe, em matéria de aplicação de lei processual no tempo rege o princípio de que, salvo disposição especial, a lei processual ou adjectiva é de aplicação imediata mas não retroactiva, princípio que embora não estabelecido no Código de Processe Civil, se extrai do critério geral de que a lei só dispõe para o futuro, contido no artigo 12.º Código Civil. E, nesse seguimento, também o artigo 12.º, n.º 3 da Lei Geral Tributária estabelece que «As normas sobre procedimento e processo são de aplicação imediata, sem prejuízo das garantias, direitos e interesses legítimos anteriormente constituídos dos contribuintes». O que significa que, quanto à aplicação no tempo da lei processual civil e tributária, a regra é a mesma que vale na teoria geral do direito: a lei nova é de aplicação imediata aos processos pendentes, mas não possui eficácia retroactiva. Ou, como afirmam ANTUNES VARELA, MIGUEL BEZERRA e SAMPAIO E NORA, in “Manual de Processo Civil”, pág. 45, «a nova lei processual deve aplicar-se imediatamente, não apenas às acções que venham a instaurar-se após a sua entrada em vigor, mas a todos os actos a realizar futuramente, mesmo que tais actos se integrem em acções pendentes, ou seja, em causas anteriormente postas em juízo».»(disponível em www.dgsi.pt/). Ora, o artigo 13.º da Lei n.º 118/2019 vem regular a aplicação no tempo das normas de processo tributário, a cuja alteração procede, aos processos pendentes, dispondo no corpo do n.º 1 o seguinte: «1 – As alterações efetuadas pela presente lei ao Código de Procedimento e de Processo Tributário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de outubro, na sua redação atual, são imediatamente aplicáveis, com as seguintes exceções: (…)» Em consonância com o que se acaba de expor, e da leitura conjugada dos artigos 13.º e 14.º da Lei n.º 118/2019, retira-se que a nova redacção do n.º 1 do artigo 280.º do CPPT só é aplicável aos processos pendentes após a entrada em vigor da citada Lei n.º 118/2019, sendo que o adverbio “imediatamente” só pode reportar-se à data de entrada em vigor da citada Lei n.º 118/2019, pois, outra leitura levaria à aplicação de uma norma que ainda não entrou em vigor na ordem jurídica. Dito por outras palavras, só a partir da data da entrada em vigor da Lei n.º 188/2019, ou seja, 16/11/2019, as alterações efectuadas por esta Lei ao Código de Procedimento e de Processo Civil serão imediatamente aplicáveis, com as excepções referidas no artigo 13.º. Assim sendo, as alterações efectuadas são de aplicação imediata após a entrada em vigor da Lei n.º 118/2019 e não após a sua publicação como parece pretender o Reclamante, uma vez que o legislador estabeleceu no artigo 14.º uma vacatio legis de 60 dias. O Reclamante confunde aplicação imediata aos processos pendentes com entrada em vigor do diploma que introduz alterações aos Código de Procedimento e de Processo Tributário. Não tem o Reclamante, manifestamente, razão. Definido o regime jurídico aplicável, vejamos se o recurso foi tempestivamente apresentado. Nos termos do artigo 280.º, n.º 1, do C.PPT, na redacção em vigor à data da notificação sentença, das decisões dos Tribunais Tributários de 1ª. Instância cabe recurso a interpor no prazo de dez dias. In casu, o termo inicial de tal prazo de dez dias ocorreu em 04/10/2019, pelo que o termo final ocorreu em 14/10/2019. Tendo o requerimento de interposição de recurso dado entrada no Tribunal no dia 30/10/2019, é manifestamente extemporâneo. Concluindo, não tem razão o reclamante, devendo confirmar-se o despacho do Tribunal a quo objecto da presente reclamação, ao que se procederá na parte dispositiva.» Assim, haverá que concluir que, ao contrário do defendido pelo Recorrente, as alterações introduzidas pela Lei n.º 118/2019, de 17/09, ao CPPT só entraram em vigor em 16/11/2019, pelo que, só a partir desta data serão aplicáveis imediatamente nos termos determinados no n.º 1, do artigo 13.º da citada lei. De referir que a Lei n.º 118/2019 estabelece uma excepção na alínea c), do n.º 1, do artigo 13.º, relativamente a acções instaurada antes de 1 de Janeiro de 2012, determinando a aplicação das alterações das normas relativas aos recursos jurisdicionais, mas ainda, assim, desde que a sentença tenha sido proferida depois da entrada em vigor da citada lei. Ora, retira-se do probatório que a sentença recorrida foi proferida em 30/09/2019, e notificada ao ora Recorrente em 03/10/2019, datas anteriores à entrada em vigor da Lei n.º 118/2019, bem como o requerimento de interposição do recurso (30/10/2019) embora estas duas últimas datas sejam totalmente irrelevantes para determinar a aplicação do novo prazo de interposição de recurso, uma vez que o que determina o regime jurídico aplicável é a data da prolação da sentença de que se recorre. As alterações efectuadas aos recursos jurisdicionais pela Lei n.º 118/2019, de 17/09 aplicam-se imediatamente aos recursos interpostos de sentenças proferidas após a sua entrada em vigor. Nesta conformidade, é de manter a decisão singular proferida na ordem jurídica, indeferindo-se a presente reclamação. * III - DECISÃO Termos em que os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, acordam, em conferência, indeferir a presente reclamação para a conferência, mantendo-se o despacho reclamado na ordem jurídica. Custas pelo Reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 2 UC. Notifique. Lisboa, 3 de Dezembro de 2020
Maria Cardoso - Relatora Catarina Almeida e Sousa – 1.ª Adjunta Hélia Gameiro Silva – 2.ª Adjunta (assinaturas digitais) |