Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:06254/12
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:03/05/2013
Relator:PEDRO VERGUEIRO
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL. ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL. MEIO PROCESSUAL ADEQUADO. CONVOLAÇÃO.
Sumário:I) O meio processual adequado para impugnar uma decisão de indeferimento de recurso hierárquico, interposto de decisão de reclamação graciosa, que comporte ou envolva a apreciação da legalidade de um acto tributário de liquidação, é o processo de impugnação judicial e não a acção administrativa especial.
II) A errónea indicação do meio de defesa na notificação efectuada ao contribuinte ou a existência de uma situação susceptível de induzir o notificado em erro não torna idóneo o meio processual utilizado, determinando apenas a aplicação do disposto no art. 37º nº 4 do CPPT no caso de se tornar impossível a convolação no meio processual adequado, facultando ao contribuinte a possibilidade de utilizar o meio de reacção adequado no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado da decisão.
*
O Relator
Pedro Vergueiro
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário ( 2ª Secção ) do Tribunal Central Administrativo Sul:
1. RELATÓRIO
A..., identificado nos autos, inconformado veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, datada de 28-09-2012, que no âmbito da presente instância de IMPUGNAÇÃO indeferiu liminarmente a petição em função da extemporaneidade da interposição da mesma.

Formula, nas respectivas alegações (cfr. fls. 48-51), as seguintes conclusões que se reproduzem:
“(...)
14. A notificação realizada ao aqui recorrente, pelo ofício nº 1008 da Divisão de justiça Tributária da Direcção de Finanças de Santarém indica unicamente o artigo 50° do CPTA como meio de defesa face à decisão que nega provimento ao recurso hierárquico.
15. Posto o meio de defesa indicado e apresentada Acção Administrativa Especial, que coube o processo n.º 1293/10.OBELRA, à cautela, foi a irregularidade, suscitada a título de questão prévia.
16. Julgada improcedente foi interposto recurso para o TCA Sul, tendo sido negado provimento, por entender a douta decisão do Tribunal ad quem, tratar-se de fundamento para Impugnação Judicial.
17. A douta sentença, consubstancia a decisão no que dispõe o Código do Processo Civil, contudo, há lei especial quanto à presente matéria tributária, designadamente, artigo 37º nº 4 do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
18. A administração tributária não é uma qualquer parte em juízo, assistindo-lhe direitos especiais e deveres especiais.
19. Assiste à AT, o dever especial em determinadas matérias como o dever de informação, correcta, competindo-lhe a informação das garantias dos administrados, no caso, dos correctos meios de defesa por forma, a reagir da decisão desfavorável em sede de recurso hierárquico.
20. A Fazenda Pública, não pode, através dos seus órgãos aproveitar dos seus eventuais erros na comunicação dos meios de defesa para obter a absolvição da instância e absolvição de pedidos, sem a necessária e compreensível protecção dos direitos dos administrados.
21. O legislador, prevendo esses casos e muito bem, através do artigo 37º nº 4 do CPPT, veio especialmente, proteger os direitos dos administrados, de tutela judicial efectiva com consagração constitucional, quando por culpa da administração, com dever acrescido de informação clara e vinculativa, erra na notificação realizada quanto aos meios de defesa.
22. Donde, qualquer interpretação do artigo 37º nº 4 do CPPT que não consagre a possibilidade de interposição de meio processual correcto nos termos aqui descritos, com fundamentos nunca antes apreciados, ainda que tenha existido decisão de mérito quanto a outros fundamentos, deverá ser considerada inconstitucional por violação do princípio da legalidade a que administração está estritamente vinculada, mormente, quanto ao dever de informação correcta dos meios de defesa.
23. Pois, mal se compreende, que veiculando informação errada, pudesse ainda resultar esse erro em proveito próprio, violando ainda o Princípio da Tutela Jurisdicional Efectiva, pois denegaria ao administrado o exercício do seu direito à acção judicial fosse qual fosse a decisão administrativa.
24. Sendo certo que, qualquer decisão judicial oposta ao estabelecido na norma, constituiria, além do que se tem vindo de expender, um grave atentado e violação ao principio de segurança e protecção jurídica dos administrados, entendendo-se o Estado como pessoa de má fé pois os erros por ela cometidos a ela aproveitavam.
Termos em que nos melhores de Direito devem as presentes alegações de recurso ser aceites por estarem em tempo, decidindo a douta decisão do Tribunal ad quem, pela procedência do mesmo, revogando a decisão proferida em 1.ª Instância, admitindo-se assim a impugnação judicial, possibilidade vertida no que dispõe o n.º 4 do artigo 37.º do CPPT.”

A recorrida Fazenda Pública não apresentou contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal pronunciou-se no sentido da improcedência do presente recurso.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.
2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

A questão suscitada pelo recorrente resume-se, em suma, em indagar da verificação da apontada extemporaneidade da interposição da presente acção, enquanto suporte do indeferimento liminar da petição subjacente aos presentes autos de impugnação judicial.

3. FUNDAMENTOS
3.1. DE FACTO

Da análise da decisão recorrida e da situação dos autos, importa considerar, por nossa iniciativa, a seguinte factualidade:

1. O ora Recorrente apresentou a presente impugnação judicial no TAF de Leiria via CTT, com data de 19-07-2012, com referência à liquidação de IRS de 2005, concluindo pela anulação da respectiva liquidação.

2. Em 27/11/2008, deu entrada no Serviço de Finanças de Santarém, reclamação graciosa da liquidação de IRS do ano de 2005, que foi indeferida por despacho proferido em 28/07/2009 (fls. 23 dos presentes autos).

3. Em 24/09/2009 o A. apresentou recurso hierárquico do despacho de indeferimento que recaiu sobre o pedido de reclamação graciosa (fls. 23 dos presentes autos).

4. Tal pedido foi indeferido por despacho da Directora de Serviços do IRS, por subdelegação, proferido em 14/04/2010 (fls. 23 e 34 dos presentes autos).

5. Pelo ofício nº 1008 de 17/05/2010 o ora A. foi notificado do despacho referido no número anterior, o qual tem o seguinte teor: “…

Assunto: NOTIFICAÇÃO DE DECISÃO PROFERIDA EM RECURSO HIERÁRQUICO

Fica V/Exa notificado do despacho de indeferimento proferido no RH de IRS 2005, em 2010-04-14 pela Directora de Serviços do IRS (Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares), por subdelegação, conforme consta na informação/parecer n.º 1387/10, que contém os fundamentos e cuja cópia integral se junta.

Informa-se ainda que, a decisão proferida no Recurso Hierárquico é passível de impugnação de actos administrativos, nos termos do n.º 50.º do CPTA (Código do Processo dos Tribunais Administrativos), salvo se de tal decisão já tiver sido deduzida impugnação judicial com o mesmo objectivo (n.º 2 do art.º 76.º do CPPT), no prazo de 3 meses, contados a partir da notificação, nos termos do art.º 58.º, n.º 2, alínea b), do CPTA.

Com os melhores cumprimentos. …” (fls. 23 e 34 dos presentes autos).

6. Nesta sequência, o ora Recorrente remeteu por correio ao TAF de Leiria em 17/08/2010 e deu entrada no dia seguinte a acção administrativa especial que correu termos com o n.º 1293/10.0BELRA (fls. 23 dos presentes autos).

7. No âmbito da acção administrativa especial referida em 6., foi proferida sentença em 25-10-2011, que julgou tal acção improcedente, e onde se ponderou, além do mais, o seguinte: “…
QUESTÃO PRÉVIA
Foi invocada a questão da impropriedade do presente meio processual.
A questão que importa, desde já, decidir, prende-se com a idoneidade do presente meio processual para a formulação da pretensão manifestada em juízo, de anulação da liquidação por preterição de formalidades essenciais.
Ora, o artigo 97° nºs 1, alíneas d) e p) e 2 do C.P.P.T., preceituam o seguinte:
«1- O processo tributário compreende: (…)
d) A impugnação dos actos administrativos em matéria tributária que comportem a apreciação da legalidade do acto de liquidação: (…)
p) O recurso contencioso do indeferimento total ou parcial ou da revogação de isenções ou outros benefícios fiscais, quando dependentes de reconhecimento da administração tributária, bem como de outros actos administrativos relativos a questões tributárias que não comportem apreciação da legalidade do acto de liquidação;»
2 - O recurso contencioso dos actos administrativos em matéria tributária, que não comportem a apreciação da legalidade do acto de liquidação, da autoria da administração tributária, compreendendo o governo central, os governos regionais e os seus membros, mesmo quando praticados por delegação, é regulado pelas normas sobre o processo nos tribunais administrativos;»
Refira-se que a partir da entrada em vigor do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, as remissões feitas em lei especial para o regime do recurso contencioso de actos administrativos consideram-se feitas para o regime da acção administrativa especial (cfr. artigo 191º do CPTA).
Nos termos do artigo 99º do CPPT, constitui fundamento da impugnação qualquer ilegalidade, designadamente, ausência ou vício da fundamentação legalmente exigida e preterição de outras formalidades legais.
Tais ilegalidades reconduzem-se, necessariamente, quando praticadas no procedimento de liquidação de tributos ou de fixação de matéria colectável e quando provadas, à respectiva anulação da liquidação impugnada.
O Ac. do STA, de 25/06/2009, processo nº 0194, pronunciou-se sobre a questão de que nos vimos a ocupar, nestes termos «Como se vê, a utilização do processo de impugnação judicial ou do recurso contencioso (actualmente acção administrativa especial, por força do disposto no art. 191° do CPTA) depende do conteúdo do acto impugnado: se este comporta a apreciação da legalidade de um acto de liquidação será aplicável o processo de impugnação judicial e se não comporta uma apreciação desse tipo é aplicável o recurso contencioso/acção administrativa especial.» (in http://www.dgsi.pt/).
Ora, a causa de pedir nos autos é o despacho de indeferimento do recurso hierárquico proferido pela Directora de Serviços de IRS
O pedido formulado consiste na anulação de tal decisão e na anulação do acto tributário de liquidação do imposto, por preterição de formalidades legais
Do exposto resulta que a acção administrativa especial não é o processo próprio para apreciar da legalidade da liquidação por preterição de formalidades legais.
O meio processual próprio para reagir é a impugnação judicial.
Verifica-se, assim, a questão prévia da falta de idoneidade do presente meio processual para um dos pedidos.
O A. veio juntar aos autos cópia do ofício que a notificou da decisão proferida no recurso hierárquico.
Com efeito, as decisões de indeferimento constituem um acto administrativo em matéria tributária, impugnável por via da acção administrativa especial, que não comporta a apreciação da legalidade do acto de liquidação e que segue as normas do processo dos tribunais administrativos.
Sendo certo, igualmente, que os meios de defesa indicados no referido oficio correspondem ao que se encontra estatuído no nº 2 do artigo 76° do CPPT, formulado de acordo com a actualização imposta pelo disposto no artigo 191° do CPTA.
Contudo, nos termos do artigo 99° do CPPT a preterição de outras formalidades legais são fundamentos de impugnação.
Face ao supra exposto, os fundamentos invocadas não podem ser apreciados na presente acção administrativa especial.
Assim sendo, os autos prosseguem apenas para conhecimento da causa de pedir e pedido compatíveis com a forma processual utilizada. …” (fls. 19 a 22 dos presentes autos).
8. O ora Recorrente interpôs recurso da decisão id. em 7., o que deu origem ao Acórdão do TCA Sul de 24 de Maio de 2012, que negou provimento ao recurso, e onde se considerou, além do mais, o seguinte: “…
1. A..., residente na Rua ..., em Casais da Aroeira, Abitureiras, interpôs recurso jurisdicional da sentença do T.A.F. de Leiria que julgou improcedente a acção administrativa especial que intentara para impugnação do despacho, de 14/4/2010, da Directora de Serviços da Direcção de Serviços de IRS.
Nas conclusões da sua alegação, invocou, em síntese, o seguinte:
- O meio de defesa que utilizou foi o indicado no ofício de notificação do acto impugnado;
- Se existiu erro na indicação do meio processual adequado, não pode este aproveitar à Administração para obter a absolvição da instância;
- A sentença afirma a competência do autor do acto impugnado com base em subdelegação de poderes publicada em data posterior à daquele acto;
- Verificada a tempestividade da acção de impugnação - judicial, nada obstava à convolação - para o meio processual correcto. …
2.2. A sentença recorrida começou por apreciar a questão prévia da impropriedade do meio processual, entendendo que era impugnação judicial, e não a acção administrativa especial, o processo próprio para apreciar da legalidade da liquidação por preterição de formalidades legais, motivo porque os autos prosseguiram “apenas para causa de pedir e pedido compatíveis com a forma processual utilizada”. Conhecendo do vício de incompetência imputado ao acto impugnado, concluiu pela sua não verificação, por a competência para decidir o recurso hierárquico poder ser delegada e, no caso, a autora desse acto beneficiava da subdelegação de competências da subdirectora-­geral dos impostos que fora publicada no D.R., II Série, de 2/7/2010.
Vejamos se este entendimento é de manter, analisando a impugnação que dele é feito pelo recorrente.
Sendo formulado o pedido de anulação do despacho de 14/4/2010, que negou provimento ao recurso hierárquico interposto pelo recorrente, não há dúvidas que o meio processual utilizado é adequado a esse pedido. O que, em rigor, a sentença entendeu foi que haviam sido invocados vícios que não podiam ser apreciados nesse meio processual, pelo que não os conheceu.
Assim, nunca poderia o Tribunal proceder à convolação pretendida pelo recorrente para conhecer desses vícios.
Aliás o que o recorrente parece pretender é que o tribunal determinasse a cisão da acção intentada em dois meios processuais distintos (acção administrativa especial onde se conheceriam uns vícios e impugnação judicial onde se apreciam outros), o que não é legalmente admissível. …” (fls. 31-33 dos presentes autos).
9. O ora Recorrente foi notificado com data de 18-06-2012 do Acórdão do TCA referido em 8. (fls. 30 dos presentes autos).
10. O despacho recorrido ponderou, além do mais, o seguinte: “…
Ora, das decisões supra transcritas já resulta a decisão que necessariamente terá que recair sobre o presente processo.
O que o IMPUGNANTE pretende é apresentar uma nova petição para conhecimento de um pedido não apreciado em acção anterior, na qual foram formulados pedidos incompatíveis, tendo aí sido apenas conhecido o pedido para o qual o meio processual apresentado era adequado.
Na verdade, também aqui o IMPUGNANTE pretende fazer valer um direito que não encontra qualquer acolhimento legal.
É que o benefício de apresentação de uma nova petição inicial, valendo como data da prática do acto, a data de apresentação da petição rejeitada (independentemente da norma que preveja tal benefício), não se aplica quando é proferida uma decisão de mérito, ainda que apenas referente a um dos pedidos. A qual, inclusive, já transitou em julgado.
Acrescente-se que, no caso concreto, nada obstaria a que fossem interpostas as duas acções em simultâneo. Aliás, seria esse o procedimento adequado para a pretensão do ora IMPUGNANTE.
Assim sendo, no caso concreto, o prazo de interposição da impugnação judicial contar-se-ia a partir da notificação do indeferimento proferido no recurso hierárquico (notificado ao IMPUGNANTE por Ofício de 15 de Maio de 2010).
Sabendo que o prazo de interposição de tal acção, é de 90 dias (cf. artigo 102º n.º 1 do CPPT), resulta óbvia a extemporaneidade da interposição da presente acção, apresentada a juízo em 20 de Julho de 2012. Ou seja, volvidos mais de dois anos.
Por todo o exposto, indefiro liminarmente a presente impugnação judicial. …” (fls. 36-38 dos presentes autos).

«»
3.2. DE DIREITO

Assente a factualidade apurada cumpre, agora, entrar na análise da realidade que envolve o presente recurso jurisdicional, impondo-se indagar da verificação da apontada extemporaneidade da interposição da presente acção, enquanto suporte do indeferimento liminar da petição subjacente aos presentes autos de impugnação judicial.
Como acima ficou exposto, o despacho recorrido considerou que o que ora Recorrente pretende “é apresentar uma nova petição para conhecimento de um pedido não apreciado em acção anterior, na qual foram formulados pedidos incompatíveis, tendo aí sido apenas conhecido o pedido para o qual o meio processual apresentado era adequado” e bem assim que “o benefício de apresentação de uma nova petição inicial, valendo como data da prática do acto, a data de apresentação da petição rejeitada (independentemente da norma que preveja tal benefício), não se aplica quando é proferida uma decisão de mérito, ainda que apenas referente a um dos pedidos. A qual, inclusive, já transitou em julgado”, de modo que, “no caso concreto, o prazo de interposição da impugnação judicial contar-se-ia a partir da notificação do indeferimento proferido no recurso hierárquico (notificado ao IMPUGNANTE por Ofício de 15 de Maio de 2010) e sabendo que o prazo de interposição de tal acção, é de 90 dias (cf. artigo 102º n.º 1 do CPPT), resulta óbvia a extemporaneidade da interposição da presente acção, apresentada a juízo em 20 de Julho de 2012. Ou seja, volvidos mais de dois anos.”.

Nas suas alegações, o Recorrente refere que a notificação realizada ao aqui recorrente, pelo ofício nº 1008 da Divisão de justiça Tributária da Direcção de Finanças de Santarém indica unicamente o artigo 50° do CPTA como meio de defesa face à decisão que nega provimento ao recurso hierárquico e apresentada Acção Administrativa Especial, a que coube o processo n.º 1293/10.OBELRA, à cautela, foi a irregularidade, suscitada a título de questão prévia, sendo que julgada improcedente foi interposto recurso para o TCA Sul, tendo sido negado provimento, por entender a douta decisão do Tribunal ad quem, tratar-se de fundamento para Impugnação Judicial.
Ora, a douta sentença, consubstancia a decisão no que dispõe o Código do Processo Civil, contudo, há lei especial quanto à presente matéria tributária, designadamente, artigo 37º nº 4 do Código de Procedimento e de Processo Tributário, que pretende proteger os direitos dos administrados, de tutela judicial efectiva com consagração constitucional, quando por culpa da administração, com dever acrescido de informação clara e vinculativa, erra na notificação realizada quanto aos meios de defesa, donde, qualquer interpretação do artigo 37º nº 4 do CPPT que não consagre a possibilidade de interposição de meio processual correcto nos termos aqui descritos, com fundamentos nunca antes apreciados, ainda que tenha existido decisão de mérito quanto a outros fundamentos, deverá ser considerada inconstitucional por violação do princípio da legalidade a que administração está estritamente vinculada, mormente, quanto ao dever de informação correcta dos meios de defesa, pois, mal se compreende, que veiculando informação errada, pudesse ainda resultar esse erro em proveito próprio, violando ainda o Princípio da Tutela Jurisdicional Efectiva, pois denegaria ao administrado o exercício do seu direito à acção judicial fosse qual fosse a decisão administrativa, sendo certo que, qualquer decisão judicial oposta ao estabelecido na norma, constituiria, além do que se tem vindo de expender, um grave atentado e violação ao principio de segurança e protecção jurídica dos administrados, entendendo-se o Estado como pessoa de má fé pois os erros por ela cometidos a ela aproveitavam.
Que dizer?
Desde logo cabe salientar, tal como se aponta no Ac. deste Tribunal de 19-01-2011, Proc. nº 03889/10, www.dgsi.pt. que “… no âmbito do processo tributário judicial, o interessado tem o direito de impugnar ou recorrer de todo o acto lesivo dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, segundo as formas de processo prescritas na lei, podendo ser lesivos, entre outros, o indeferimento, expresso ou tácito e total ou parcial, de reclamações, recursos ou pedidos de revisão ou reforma da liquidação – cfr. art.º 95.º, n.ºs 1 e 2 e alínea d) da LGT – sendo que tal prazo é de 90 dias a contar dos diversos factos que a lei elegeu como termo inicial ou dies a quo ou dies ex quo desse prazo, previstos nas várias alíneas e números do art.º 102.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), sendo que a fixação deste prazos, neste artigo, não prejudica outros prazos especiais fixados no mesmo Código ou em outras leis tributárias, como proclama o seu n.º 4.
Neste art.º 102.º não se prevê expressamente o prazo para a dedução da impugnação judicial a contar do indeferimento expresso do recurso hierárquico [mas apenas da presunção de indeferimento tácito, alínea d) e do indeferimento da reclamação graciosa, seu n.º2], mas como o mesmo não esgota todos os casos e nem prejudica a existência de outros prazos previstos para o efeito, temos de nos socorrer de outras normas do mesmo Código, no caso do procedimento de reclamação graciosa, art.º 68.º e segs e que a regulam, designadamente o recurso hierárquico dela interposto, previsto no seu art.º 76.º, cujo n.º2 dispõe:
A decisão sobre o recurso hierárquico é passível de recurso contencioso, salvo se de tal decisão já tiver sido deduzida impugnação judicial com o mesmo objecto.
Ou seja, esta norma do n.º2, no caso de recurso hierárquico interposto de reclamação graciosa, expressamente atribui o direito de contra a respectiva decisão interpor recurso contencioso, redacção deste normativo que se mostra deficiente Cfr. neste sentido, Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado, 2.ª edição, 2000, Vislis, pág. 381, nota 7., porque o recurso contencioso era então (hoje, acção administrativa especial) apenas a forma de reacção judicial contra a decisão que não comportasse a apreciação da legalidade do acto de liquidação, sendo que, quando a comportasse, a forma adequada já era a impugnação judicial – cfr. art.ºs 101.º da LGT e 97.º do CPPT – pelo que tal forma de reacção aí prevista, ao referir-se ao recurso contencioso, deve ser entendida como se referindo ao meio processual tributário judicial que legalmente caiba ao objecto desse meio gracioso, como acto lesivo que é, nos termos do disposto no art.º 95.º da LGT.
Prevendo a lei o meio de reacção judicial contra tal acto de indeferimento (expresso) proferido no recurso hierárquico, o prazo para o efeito já encontra guarida na norma da alínea f) do n.º1 do citado art.º 102.º, que o fixa, igualmente em 90 dias, a contar do conhecimento desse acto, o que normalmente acontecerá com a respectiva notificação.
Esta tem sido também a jurisprudência dominante no STA, senão mesmo unânime, como se pode ver dos inúmeros acórdãos citados pelo ora recorrente, na matéria das suas conclusões das alegações do recurso Cfr. a título de exemplo, dois dos recentes acórdãos no mesmo sentido: acórdãos de 30/05/2007 e de 9/9/2009, recursos n.ºs 340/07 e 461/09, respectivamente.. …”.
Avançando, e tendo presente o exposto no Ac. do S.T.A. de 07-09-2011, Proc. nº 0677/10, www.dgsi.pt, importa sublinhar também que “… o prazo de impugnação judicial é um prazo de natureza substantiva, de caducidade e peremptório e conta-se nos termos do art. 279º do CCivil (transcrito nº 1 do art. 20º do CPPT) e se terminar em período de férias, o seu termo transfere-se para o primeiro dia útil subsequente a estas (cfr. entre outros, os acs. de 3/5/00, rec. nº 24.562; de 23/5/01, rec. nº 25.778; de 30/5/01, rec. nº 26.138; de 13/3/02, rec. nº 28/02; e de 14/3/2007, rec. nº 0831/06).
A questão colocava-se já no âmbito de aplicação do CPT e a respeito da mesma escreviam Alfredo José de Sousa e J. S. Paixão (CPT Comentado e anotado, 2ª ed., 1994, an. 7 ao art. 123º pp. 255/256):
«Donde resulta que o prazo para impugnar judicialmente é de direito substantivo, regulado no referido art. 279°.
Assim, o prazo para a apresentação da impugnação judicial é contínuo, correndo seguidamente, mesmo durante os sábados, domingos, dias feriados e férias.
Todavia, se o prazo terminar em sábado, domingo, dia feriado ou férias judiciais, transfere-se para o primeiro dia útil seguinte.
À primeira vista, poderíamos ser tentados a considerar que, se o último dia do prazo caísse nas férias judiciais, não haveria lugar a essa transferência.
Entendimento que pareceria decorrer da parte final da alínea e) do citado art. 279°, conjugado com a circunstância de, nas repartições de finanças, não haver férias judiciais (art. 6° do DL n° 500/79, de 22 de Dezembro).
Pensamos, no entanto, que a questão tem de ser analisada por uma outra perspectiva, chegando-se, então, à solução oposta.
Realmente, conquanto a petição da impugnação deva ser apresentada na repartição de finanças, o certo é que ela é endereçada, não ao respectivo chefe, mas ao juiz do tribunal tributário de 1ª instância competente (art. 127° n° 1), a quem cabe a sua apreciação.
Assim, tal acto não pode deixar de ser dirigido ao exercício duma função jurisdicional e, nessa medida, a essa mesma função.
Logo, a repartição de finanças, ao receber a petição comporta-se como receptáculo do tribunal, funciona como prolongamento deste. Actua em substituição do tribunal, como que por delegação do mesmo, uma vez que a petição a este é dirigida.
A situação é, por conseguinte, em todo semelhante à que ocorria com a interposição do recurso contencioso administrativo antes da vigência da LPTA, ou seja, no domínio do DL n° 256-A/77, de 17 de Junho.
Com efeito, de acordo com o n° 1 do art. 2° deste último diploma, a petição de recurso contencioso administrativo era dirigida ao tribunal competente e apresentada perante a autoridade» que tivesse praticado o acto impugnado.
Ora, em face desse normativo, sempre se entendeu (mesmo os que consideravam o prazo de interposição do recurso contencioso como prazo de natureza substantiva e não de natureza processual ou adjectiva), com base em argumentação idêntica à precedentemente ensaiada, que, se o prazo desse recurso findasse em férias, o seu termo transferia-se para o primeiro dia útil (cfr., neste sentido, entre muitos, os Acs. do STA de 21/11/78, Recurso n° 10936, de 12/2/79, Acs. Douts. n° 215°, pág. 990, de 3/6/82, Recurso n° 13179, de 14/10/82, Acs. Douts. n° 253, pág. 29, e de 2/2/84, Acs. Douts. nº 272-273, pág. 960; ver, também, A. Queiró, Rev. de Leg. e de jurisp. 113°, pág. 90).»
Tal argumentação mantém validade também no âmbito do CPPT.
Como se salienta no acórdão deste STA, de 5/7/07, proferido no rec. nº 359/07, citando o Cons. Mário de Brito, Código Civil anotado, vol. I, p. 342, nota 570, a razão de ser do art. 279º, ao ordenar a predita transferência de prazos «concretiza-se em que, se há prazos que não têm que ser praticados em juízo, como normalmente acontece relativamente aos negócios jurídicos, outros têm efectivamente de ser praticados nos tribunais, como é o caso dos prazos judiciais, tendo o legislador resolvido equipará-los para tal efeito. É que, enquanto os prazos processuais se suspendem nas férias judiciais (excepto se a sua duração for igual ou superior a seis meses ou se tratar de actos a praticar em processos que a lei considere urgentes) e o seu termo se transfere para o primeiro dia útil seguinte se terminarem em dia em que os tribunais estejam encerrados - artigo 144º, nºs. 1 e 2 do Código de Processo Civil -, os prazos substantivos, normalmente mais longos, não sofrem tal suspensão nas férias, feriados ou fins de semana. Todavia, nos preditos termos do artigo 279º, o termo do seu prazo, ocorrendo num destes dias, transfere-se para o primeiro dia útil. Caso contrário, o interessado teria menos prazo do que o concedido por lei para praticar o acto. Cfr. o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de Março de 1991, processo nº 002785.».
No mesmo sentido podem, aliás, conferir-se, ainda, entre outros, os acs. desta Secção do STA, de 4/6/1997, rec. nº 021653; de 20/2/02, rec. nº 26.600; de 14/3/2007, rec. nº 0831/06; de 29/10/2008, rec. nº 0458/08; de 7/10/2009, rec. nº 0555/09; e de 12/1/2011, rec. nº 0751/10, onde se acentuou, até, que o serviço de finanças funciona, nesse caso, como uma “extensão” do tribunal, pelo que é um “juízo” para esse efeito.
E na doutrina, podem, igualmente, conferir-se Jorge Sousa, CPPT, anotado e comentado, 5ª ed., Vol. I, anotação 2 ao art. 102º, pag. 730, bem como Aníbal de Castro, A Caducidade (Na doutrina, na lei e na jurisprudência) 2ª ed., 1980, pp. 171 e sgts. …”.

Feita a caracterização da matéria que envolve a apreciação da extemporaneidade da presente impugnação judicial, importa ter presentes os contornos particulares da situação em análise e que se prendem com a conclusão do procedimento e a primeira fase do processo judicial.

Com efeito, perante a liquidação de IRS do ano de 2005, o ora Recorrente apresentou reclamação graciosa, que foi indeferida por despacho proferido em 28/07/2009, o que deu lugar à interposição de recurso hierárquico, indeferido por despacho da Directora de Serviços do IRS, por subdelegação, proferido em 14/04/2010.

Este despacho foi comunicado ao ora Recorrente através do ofício nº 1008 de 17/05/2010, o qual tem o seguinte teor: “…

Assunto: NOTIFICAÇÃO DE DECISÃO PROFERIDA EM RECURSO HIERÁRQUICO

Fica V/Exa notificado do despacho de indeferimento proferido no RH de IRS 2005, em 2010-04-14 pela Directora de Serviços do IRS (Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares), por subdelegação, conforme consta na informação/parecer n.º 1387/10, que contém os fundamentos e cuja cópia integral se junta.

Informa-se ainda que, a decisão proferida no Recurso Hierárquico é passível de impugnação de actos administrativos, nos termos do n.º 50.º do CPTA (Código do Processo dos Tribunais Administrativos), salvo se de tal decisão já tiver sido deduzida impugnação judicial com o mesmo objectivo (n.º 2 do art.º 76.º do CPPT), no prazo de 3 meses, contados a partir da notificação, nos termos do art.º 58.º, n.º 2, alínea b), do CPTA.

Com os melhores cumprimentos. …” (fls. 23 e 34 dos presentes autos).


Nesta sequência, o ora Recorrente apresentou a acção administrativa especial identificada nos autos, no âmbito da qual foi considerado que “a causa de pedir nos autos é o despacho de indeferimento do recurso hierárquico proferido pela Directora de Serviços de IRS” e que “o pedido formulado consiste na anulação de tal decisão e na anulação do acto tributário de liquidação do imposto, por preterição de formalidades legais”, o que significa que “do exposto resulta que a acção administrativa especial não é o processo próprio para apreciar da legalidade da liquidação por preterição de formalidades legais” e “meio processual próprio para reagir é a impugnação judicial”, para depois se concluir que “os fundamentos invocadas não podem ser apreciados na presente acção administrativa especial” e “assim sendo, os autos prosseguem apenas para conhecimento da causa de pedir e pedido compatíveis com a forma processual utilizada”.

Apesar da reacção do ora Recorrente, a situação não conheceu alteração, na medida em que o TCA Sul negou provimento ao recurso, dando então lugar à apresentação da presente impugnação judicial, em que o ora Recorrente reclama a oportunidade do presente processo por referência ao disposto no art. 37º nº 4 do CPPT, na medida em que o meio de defesa que utilizou foi o indicado no ofício de notificação do acto impugnado, o que significa que se existiu erro na indicação do meio processual adequado, tal não pode afectá-lo, devendo a situação ser enquadrada nos termos da norma apontada.

Neste domínio, é sabido que o meio processual adequado para impugnar uma decisão de indeferimento de recurso hierárquico, interposto de decisão de reclamação graciosa, que comporte ou envolva a apreciação da legalidade de um acto tributário de liquidação, é o processo de impugnação judicial e não a acção administrativa especial.

Além disso, e com referência à matéria em discussão, pode dizer-se que a pretensão fundamental do ora Recorrente prende-se com a liquidação de IRS apontada nos autos, o que significa que este teria sempre de ser ponderado como o pedido principal.

No entanto, tal evidência não transparece na notificação efectuada ao ora Recorrente, em que se refere à possibilidade de colocar em crise a decisão do recurso hierárquico por referência às normas aí descritas do CPTA, elegendo apenas este domínio para a realidade em apreço, sendo conhecido que, nestas condições, o ora Recorrente reagiu através da apresentação da aludida acção administrativa especial.

Assim sendo, perante a realidade apurada nos autos, não pode deixar de conferir-se relevância à forma como que foi feita a notificação, entendendo-se que a mesma é susceptível de induzir o notificado em erro, sendo de notar que a evidência acima referida tem de impor-se, desde logo, à própria AT, a quem cabe a obrigação de comunicar ao interessado, além do mais, os meios de reacção contra o acto notificado.

Com efeito, embora não se possa dizer que a acção administrativa especial constitua a indicação de meio de reacção errado, na medida em que, como se viu, era o meio adequado para colocar em crise a decisão de recurso hierárquico, com fundamento em vício de incompetência, é manifesto que esta análise redutora deixa de lado o pedido principal acima apontado e, mais do que isso, além de que tem o condão de passar uma mensagem que não permite ao destinatário apreender cabalmente o alcance da matéria em causa.
Por outro lado, é sabido que o dever de determinar a convolação processual, sempre que possível prende-se com o princípio “pro actione”, no sentido de promover a celeridade processual sempre que não existam obstáculos que a impeçam (cfr. art. 97º da LGT), sendo que tem sido entendido que constituem obstáculos a essa mesma convolação, a inadequação do pedido formulado e a intempestividade, por referência à forma processual correcta, ou seja, em regra a convolação é obrigatória para o Tribunal que constata o erro na forma do processo ou perante o qual é arguido mas para que se opere não podem ter já decorrido os prazos para propositura da acção que é a própria, matéria que obsta à referida convolação.
No caso presente, a convolação não foi possível na medida em que a acção em apreço era o meio adequado para analisar o vício de incompetência apontado à decisão do recurso hierárquico, pois que, no caso de haver erro na forma de processo quanto a alguns dos fundamentos, mas não quanto a outros, tem de se afastar a convolação, ou seja, a correcção do erro na forma de processo só é possível quando todo o processo passe a seguir a tramitação adequada.
Em todo o caso, não pode deixar de se considerar que a matéria em apreço envolve uma situação de erro na forma de processo que se traduz como que numa absolvição da instância parcial, em relação à questão abrangida, sendo que, não sendo viável a convolação, tudo se traduziu no prosseguimento da acção para conhecimento da causa de pedir e pedido compatíveis com a forma processual utilizada.
Ora, o art. 37º nº 4 do CPPT dispõe que “no caso de o tribunal vier a reconhecer como estando errado o meio de reacção contra o acto notificado indicado na notificação, poderá o meio de reacção adequado ser ainda exercido no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado da decisão judicial”.
Com referência a esta norma, o Cons. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, 6ª edição, vol. I, pág. 362 refere que “no n.º 4 deste art. 37.º pressupõe-se que o uso de um meio de reacção inadequado justifica uma decisão de rejeição. Porém, quando não é caso disso, por se tratar de situação em que o acto impugnado é susceptível de impugnação contenciosa, mas não foi utilizada a forma processual adequada [por exemplo, utilização do processo de impugnação judicial em situação em que deve ser utilizada a acção administrativa especial, nos termos do art. 97.º, n.º 1, alíneas d) e p), do CPPT], estar-se-á perante um mero erro na forma de processo judicial, que deve ser corrigido, através da convolação do processo para a forma adequada, como impõem os arts 97.º, n.º 3, da LGT e 98.º, n.º 4, do CPPT, desde que a petição possa ser aproveitada para esse fim.
Porém, se a petição não poder ser aproveitada para o meio processual adequado, deverá aplicar-se também a regra deste n.º 4 do art. 37.º, permitindo ao interessado a correcção do erro, pois, desde há muito que se vem adoptando o entendimento de que os interessados não devem ser prejudicados por erros de entidades públicas competentes, princípio este que tem afloramentos explícitos no n.º 6 do art. 161.º e no n.º 3 do art. 198.º do CPC.”.
Na verdade, e como é de elementar justiça, o contribuinte não pode ser prejudicado por uma errada indicação dos meios de reacção, quando esse erro é da inteira responsabilidade da Administração, sob pena de total frustração da confiança que os administrados devem depositar nas informações emanadas da própria Administração, já que se trata de expectativas e confiança que merecem ser tuteladas.
Essa informação foi determinante da actuação do ora Recorrente que, dentro da convicção em que actuou, apresentou a referida acção administração especial, não lhe sendo exigível comportamento diferente do que teve, sendo que agiu em estado ou situação de boa fé, juridicamente relevante, estando em causa exigências evidentes de justiça e que, por isso, devem ser consideradas de aplicação generalizada, não só por imperativo constitucional decorrente do princípio da justiça que decorre da ideia de Estado de Direito democrático consignada no artigo 2º da Constituição, mas também por serem postuladas pelo próprio princípio do acesso aos tribunais e à justiça (arts. 20º nº 1 e 268.º, n.º 4, da Constituição), que não pode deixar de exigir para sua concretização a concessão de uma possibilidade efectiva e não apenas teórica de utilização dos meios contenciosos de defesa de direitos e interesses legalmente protegidos.
Em suma, o princípio de boa-fé, que funciona como cláusula geral de valoração dos comportamentos dos intervenientes, impõe que o ora Recorrente não possa ser prejudicado pelo erro contido na notificação, da responsabilidade de Administração.
Assim sendo, existindo uma situação susceptível de induzir o notificado em erro, tal traduz-se num caso de erro na indicação meio de reacção contencioso indicado na notificação, matéria em que se impõe, na impossibilidade de convolação, observar a norma contida no n.º 4 do artigo 37.º do CPPT, facultando ao contribuinte a possibilidade de utilizar o meio de reacção adequado no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado da decisão, tem de atender-se ao exposto pelo Recorrente neste domínio, na medida em que tendo exercido em devido tempo o seu direito, em termos essenciais, através do meio processual que lhe foi indicado pela AT, as suas legítimas expectativas seriam totalmente defraudadas, caso não fosse possível o exercício desse direito pelo meio processual considerado adequado pelo tribunal.
Assim, e na medida em que a decisão recorrida desconsiderou este elemento, tem de concluir-se no sentido de que o despacho recorrido procedeu a uma incorrecta aplicação do direito à factualidade apurada, pelo que incorreu em erro de julgamento devendo ser revogada por via da procedência do presente recurso.

4. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em conceder provimento ao recurso, revogando-se a decisão recorrida, ordenando-se a devolução do processo ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria para prosseguimento da lide, com proferimento de outro despacho que não seja de rejeição liminar da impugnação com fundamento na sua extemporaneidade.
Sem custas.
Notifique-se. D.N..
Lisboa, 05 de Março de 2013
PEDRO VERGUEIRO
PEREIRA GAMEIRO
JOAQUIM CONDESSO