Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1048/17.1BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:11/04/2021
Relator:ANA CRISTINA LAMEIRA
Descritores:ATRASO NA JUSTIÇA
PRAZO RAZOÁVEL
PROCESSO CAUTELAR
Sumário:I - A apreciação e integração do conceito de justiça em “prazo razoável” não tem como pressuposto que a decisão judicial, cujo atraso se discute, tenha de se ser favorável ao autor /requerente, mas sim que seja atempadamente proferida.
II - A convicção do Recorrente, de que o processo cautelar duraria ente 5 dias e 4 semanas, não tem respaldo no quadro legal vigente no CPTA. Sendo inoperante para aferição do “prazo razoável” a expectativa do Recorrente ou os prazos previstos noutro ordenamento jurídico.
III - Em face das circunstâncias do caso concreto, considerando que o processo cautelar passou por duas fases distintas, com intervenção de duas instâncias, com duração total inferior a 10 meses, a conclusão a retirar é que o processo não sofreu qualquer atraso “desrazoável”, mas antes dentro do patamar gizado pelo TEDH e em respeito dos direitos consagrados artigos 6.º, n.º 1 da CEDH e 20.º, n.º 1 e n.º 4 da CRP.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul

I. RELATÓRIO

L… veio intentar acção administrativa contra o Estado Português pedindo a condenação deste no pagamento de indemnização no valor de €244.900,12, a título de danos patrimoniais, não patrimoniais e outros custos despendidos, fundando tal pedido em responsabilidade civil extracontratual do Estado pelo atraso na administração da justiça.
Citado, o Estado Português, representado pelo Ministério Público, apresentou contestação pugnando pela improcedência da presente acção.
Por sentença de 17.11.2020, o TAC de Lisboa julgou a acção improcedente e absolveu o Réu do pedido.
Inconformado, o Recorrente /Autor interpôs o presente recurso, terminando as suas alegações com a formulação das conclusões que seguidamente se transcrevem:
1.- O Tribunal a quo não se pronunciou, sobre uma questão que deveria ter apreciado;
2.- O facto do A., ora Recorrente, ter invocado um dano de perda de rendimento salarial na época de 2015-2016, pelo facto de estar à espera muito tempo pela emissão de uma decisão judicial sobre a sua providência cautelar, não foi dado por provado ou não provado;
3.- Sobre esta questão, o Tribunal a quo não se pronunciou e deveria ter apreciado a mesma, o que constitui nulidade, por omissão de pronúncia do Tribunal, nos termos dos arts.º 608.º e 609.º do C.P.C., aplicáveis ex vi do art.º 1.º do C.P.T.A.;
4.-O ora Recorrente alegou essa matéria na sua petição inicial e peticionou o dano em causa no final da sua petição inicial, pedindo a condenação do R. no pagamento desse dano (“(…) condenação do R. (…)no valor de € 110.000, relativo ao custo de perda de salário anual”);
5.-A matéria de facto e prova produzida em audiência de julgamento, foi vária no sentido de se confirmar que o A. não teria tido necessidade de suportar as despesas e os custos que suportou, caso tivesse um contrato de trabalho desportivo para a época 2015-2016, designadamente, tal juízo de probabilidade assenta, na certeza de terem sido dados por provados, os factos provados WW) (o treinador da equipa do Futebol C…, L…, manifestou interesse em renovar o contrato do A. por mais uma temporada),
FFF) (o A. era um atleta de muito potencial), as declarações do agente do jogador, D…, da Advogada especializada em direito desportivo A… e o facto provado QQQ) (o A. foi contratado em 1.7.2016, pelo F.C. C…, um clube da 1.ª Divisão do Campeonato Alemão, mesmo depois de ter estado 1 ano sem competir);
6.- O ora Recorrente teria um contrato de trabalho desportivo, na época 2015-2016 e a partir do momento em que a providência cautelar lhe fosse deferida (como foi), porquanto, o ora Recorrente era um atleta de grande potencial (Ver, facto provado FFF)) e tinha estado, nos dois anos imediatamente anteriores, em dois clubes desportivos de grande nomeada, nomeadamente, o Futebol C… e o A… de Inglaterra.
7.-O Tribunal a quo deveria ter efectuado um juízo de prognose, com base na probabilidade séria do ora Recorrente poder obter um contrato de trabalho desportivo, nos mesmos moldes (rendimento salarial), que tinha tido até ao momento, que teria efeitos na época desportiva 2015-2016;
8.-Esse juízo de prognose não foi realizado pelo julgador;
9.- A existência de dano de perda de rendimento salarial na época de 2015-2016, pelo facto do A., ora, Recorrente, não ter uma decisão judicial em tempo útil, não consta nalista de factos dados por provados e deveria nela ser incluída, atenta a prova produzida;
10.- Nos termos do art.º 640.º, n.º1, alínea a) e b) do Código de Processo Civil, este concreto ponto de facto foi incorrectamente julgado, porque existem meios probatórios que impunham decisão diversa da sentença ora recorrida, os quais foram dados por provados pelo Tribunal a quo;
11.- O Tribunal a quo decidiu não dar como admitido que tenha existido nexo de causalidade adequada entre os danos sofridos pelo A. (alguns deles dados como provados) e o atraso na prolação de decisão judicial definitiva pelo Tribunal que aprecia a providência cautelar que foi interposta pelo ora Recorrente, então A., todavia, sabia ou não podia desconhecer, que o A., com a apresentação de providência cautelar, estava a defender os seus direitos e a possível ocorrência de prejuízos de difícil reparação;
12.-No caso do A. não ter providência cautelar que lhe fosse favorável (e, por isso, o Recorrente apresentou a providência cautelar), ele perderia, irremediavelmente, a possibilidade de trabalhar durante 1 ano (uma época desportiva), sendo um prejuízo de difícil reparação;
13.-No caso de não ser decretada a providência requerida, já se consumaram as consequências onerosas decorrentes da aplicação da pena disciplinar. Tais consequências resultam não só da supressão da retribuição, mas também do facto de se tratar de um jovem desportista que verá a sua actividade desportiva suspensa por um período longo (1 ano) em virtude de ter sido detectado o consumo de substâncias proibidas;
14.-Existindo prova bastante de que existiria uma forte probabilidade do A. ser contratado por um clube (nesta parte, o juízo de prognose omitido pelo Tribunal a quo), existindo nexo de causalidade, porquanto, existindo danos e atraso na decisão judicial, o A. ficou “parado” à espera da emissão de decisão judicial, que, por tardar, fez com que tivesse de assumir custos que, de outro modo, seriam assumidos pelo clube desportivo que o tivesse contratado, os prejuízos eram de difícil reparação e estariam consumados;
15.-O Tribunal a quo omitiu um juízo de prognose sobre a forte probabilidade do ora recorrente ter rendimento salarial na época desportiva 2015-2016, caso a providência cautelar fosse decidida num espaço de tempo mais reduzido;
16.- Se a decisão sobre a providência cautelar tivesse sido proferida em prazo mais reduzido, sejam os 2 meses para o qual a lei impõe, seja um outro prazo que seja razoável e equilibrado, o A. não teria tido que suportar os danos que suportou, porque, teria sido contratado por um clube desportivo e não teria os custos que teve com a manutenção da sua forma técnica e física;
17.- Quanto mais tempo demorasse, mais custos o A. teria. Uma coisa estava intimamente interligada com a outra;
18.-O A. não procura obter ressarcimento com danos provocados na sua esfera jurídica, logo no mês de Julho de 2015, como faz crer o Tribunal a quo (veja-se, página 45, antepenúltimo parágrafo), o A. apenas procura ressarcimento pelos danos ocorridos, pelo menos, a partir de 2 meses desde a apresentação da sua providência cautelar ou outro prazo fixado por equidade pelo julgador;
19.-Estimando o legislador como prazo de emissão de decisão em providência cautelar, o prazo de 2 meses e estimando-se como provável a emissão de Acordão em regime de recurso pelo tribunal superior em prazo não superior a 1-2 meses, o ora Recorrente obteria uma decisão judicial definitiva sobre a providência cautelar que apresentou, pelo menos, antes do final do ano de 2015 e tal permitiria ao ora Recorrente, ter sido contratado durante o período de transferências desportivas no mercado de Inverno (mês de Janeiro de 2016), por um clube de futebol; 20.-O Tribunal a quo indica que os danos não patrimoniais (morais) do A. foram sofridos apenas porque foi suspenso e não renovou contrato com o F.C… (ver, página 46, 7.º paragrafo), mas, na mesma decisão, o tribunal a quo deu como provado, que o A. sofreu danos morais, psicológicos, angústia, tristeza, com a demora na emissão da decisão judicial (Conferir, facto provado DDD), o que indicia existir um nexo de causalidade entre o atraso na emissão da decisão judicial e os prejuízos sofridos pelo A.;
21.- Os danos sofridos pelo A., não foram decorrência única da existência de uma suspensão da prática desportiva, mas, também, da existência de atraso na emissão de decisão judicial;
22.- Os danos patrimoniais e não patrimoniais invocados pelo A., têm causalidade encontrada na demora na resolução da providência cautelar, quanto mais essa demorasse, mais custos o A. teria, por força de não ter clube desportivo que assegurasse o pagamento dos custos de manutenção da sua forma física e técnica;
23.- Se a providência cautelar tivesse uma decisão judicial definitiva no prazo de 2 anos o A., enquanto jogador de futebol, teria custos com a manutenção da sua forma física e técnica, que, de outro modo, não teria, caso a providência cautelar fosse julgada mais cedo?
Claro que sim. Não seriam previsíveis a ocorrência de custos sucessivos, a suportar pelo A., com o atraso na decisão? O evento danoso não seria uma causa provável e expectável?
Cremos que sim;
24.-A obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão. O que se aplica ao caso do recorrente, efectivando-se o art.º 563.º do Código Civil;
25.- O Tribunal a quo violou o art.º 563.º do Código Civil, não o aplicando devidamente ao caso sob Judice;
26.-O Tribunal a quo decidiu imputar responsabilidade ao A. ora Recorrente pelo atraso na prolação de decisão judicial, de forma leviana e pouco fundamentada;
27.- O princípio da aceleração processual é um poder e não um dever, pelo que, não se pode imputar a uma das partes uma violação de obrigação por não ter feito uso do dispositivo da aceleração processual;
28.- Ocorreu violação do art.º 363 n.º2 do C.P.C., não tendo o Tribunal a quo aplicado devidamente este dispositivo legal;
29.-Dispõe o artigo 20, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa, que “todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objecto de decisão em prazo razoável” e dispõe, ainda, o artigo 6.º, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que “Qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada, equitativa e publicamente, num prazo razoável por um tribunal independente e imparcial…”;
30.-A tempestividade das decisões é fundamental e torna mais credíveis e firmes as decisões judiciais;
31.- Não se pode aceitar um período de 8 meses e 23 dias como prazo razoável para se obter uma decisão judicial definitiva no âmbito de um processo urgente – providência cautelar. É, pois, um prazo não razoável;
32.- No processo da providência cautelar interposta pelo A. ora Recorrente, este nada fez para atrasar o processo, apresentando manobras dilatórias, apresentando requerimentos sem sentido, reclamações ou recursos de decisões interlocutórias;
33.-Atendendo aos critérios sugeridos pela doutrina, o critério da actuação das autoridades competentes (do tribunal que julgou a providência cautelar em 1.ª instância) e o critério de atender àquilo que está em causa para o Autor no litígio, o Tribunal a quo deveria ter reconhecido que a decisão sobre a providência cautelar não foi proferida em prazo razoável, porque, o tribunal de 1.ª instância suscitou, sucessivamente, questões não essenciais, que fizeram atrasar o desfecho da providência cautelar em 1.ª instância e, também, o Tribunal a quo não considerou as questões de urgência na obtenção de uma decisão judicial e cujo atraso poderá prejudicar gravemente a situação pessoal, patrimonial ou profissional do requerente da providência cautelar; 34.- Aplicando estes dois critérios, chegar-se-ia à conclusão de que o prazo necessário para prolação da decisão judicial, no caso da providência cautelar apresentada pelo A. ora Recorrente, não foi um prazo razoável.
Nestes termos e nos melhores de Direito, admitindo a procedência do presente Recurso e revogando a sentença «sub specie», V. Exa., fará inteira justiça perante o caso sob análise, como é habitual”.
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O Recorrido contra-alegou tendo pugnando pela manutenção da decisão recorrida.
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Com dispensa de vistos, mas fornecida cópia do projecto de Acórdão aos Srs. Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o mesmo submetido à conferência desta Secção do Contencioso Administrativo para decisão.
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I.1. DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO/DAS QUESTÕES A DECIDIR

Na fase de recurso o que importa é apreciar se a decisão (sentença) proferida deve ser mantida, alterada ou revogada, circunscrevendo-se as questões a apreciar em sede de recurso, à luz das disposições conjugadas dos artigos 144º nº 2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do Código de Processo Civil (CPC) ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA, às que integram o objecto do recurso tal como o mesmo foi delimitado pelo recorrente nas suas alegações, mais concretamente nas suas respetivas conclusões (sem prejuízo das que sejam de conhecimento oficioso) e simultaneamente balizadas pelas questões que haviam já sido submetidas ao Tribunal a quo (vide, neste sentido António Santos Abrantes Geraldes, inRecursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 5ª edição, págs. 119 e 156).
Em face dos termos em que foram formuladas as respectivas conclusões de recurso, as questões essenciais a decidir residem em saber se ocorre:
- nulidade da sentença por omissão de pronúncia;
- erro de julgamento da decisão de facto;
- erro de julgamento quanto ao prazo razoável para emissão de decisão judicial;
- erro de julgamento quanto ao nexo de causalidade.
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II. FUNDAMENTAÇÃO
II.1 DE FACTO
Na decisão recorrida foi tida em conta a seguinte factualidade, que se transcreve integralmente:

A) O Autor nasceu em 25 de Outubro de 1995 e é jogador de futebol. (Cfr. documento 1 junto com a Petição Inicial)
B) No ano de 2002 o Autor foi diagnosticado com Transtorno do Défice de Atenção com Hiperactividade (TDAH), tendo, posteriormente, passado a ser medicado com o fármaco “Vigil”, com a substância activa “modafinil”. (Acordo)

C) Em data não apurada foi lavrado pelo médico J… um relatório médico sobre o Autor, no qual era atestada a sua condição mental no que se refere à doença da qual padecia (TDAH). (Cfr. tradução do documento 3 junto com a Petição Inicial, junto aos autos em suporte físico sem numeração)

D) Em 7 de Agosto de 2014, o Autor celebrou um contrato de trabalho desportivo com o Futebol C…, para prestar o seu trabalho como jogador de futebol na equipa B do referido clube, no âmbito do qual auferia o valor de € 7.334,00 acrescido de € 750,00 de subsídio de alojamento e refeição. (Cfr. Acordo e depoimento de J…)

E) Em 20 de Janeiro de 2015 o Conselho de Disciplina – Secção Não Profissional – da Federação Portuguesa de Futebol instaurou processo disciplinar contra o Autor, tendo-o suspendido preventivamente, de treinar e jogar, pelo facto de ter tido uma análise positiva resultante do controlo antidopagem realizado no dia 22 de Outubro de 2014. (Acordo)

F) Em 20 de Janeiro de 2015, o Autor solicitou autorização junto da ADOP para utilizar o medicamento “Vigil”. (Cfr. Acordo e cfr. documento 7 junto com a Petição Inicial)

G) Na sequência do requerimento mencionado na alínea anterior, a Comissão de Autorização de Utilização Terapêutica da Autoridade Antidopagem de Portugal autorizou a utilização da substância “modafinil” pelo Autor. (Cfr. Acordo e documento 7 junto com a Petição Inicial)

H) Em 2 de Abril de 2015, o Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol, na sequência do processo disciplinar instaurado referido na alínea E) deste probatório, aplicou uma pena de suspensão por um ano ao Autor, à qual a FIFA veio estender efeitos a nível mundial. (Cfr. Acordo e documento a fls. 124 a 143 do processo instrutor junto aos autos)
I) Em 26 de Junho de 2015, o Autor apresentou Requerimento Inicial contra a Federação Portuguesa de Futebol de providência cautelar de suspensão de eficácia do acto mencionado na alínea anterior junto do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, que correu termos sob o n.º 1473/15.2BELSB. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 1 a 48 dos referidos autos no SITAF)

J) Em 30 de Junho de 2015, o Autor apresentou requerimento, juntando aos autos procuração. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 57 e 58 dos referidos autos no SITAF)

K) Em 1 de Julho de 2015, o Autor juntou aos autos documentação à qual se referia no Requerimento Inicial apresentado. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 62 a 221 dos referidos autos no SITAF)

L) Em 2 de Julho de 2015 foi aberta conclusão, tendo sido proferido despacho, no mesmo dia, ordenando-se a citação da entidade requerida para deduzir Oposição. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 222 a 225 dos referidos autos no SITAF)

M) A Oposição referida na alínea anterior deu entrada neste Tribunal em 15 de Julho de 2015. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 233 a 258 dos referidos autos no SITAF)

N) Em 17 de Julho de 2015, na sequência de despacho proferida na mesma data, foi remetido ao Autor nota de notificação com o teor da oposição apresentada. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 263 a 264 dos referidos autos no SITAF)

O) Em 31 de Julho de 2015, o Autor veio pronunciar-se sobre o teor da oposição. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 265 a 271 dos referidos autos no SITAF)

P) Na sequência da pronúncia mencionada na alínea anterior, o processo foi concluso em 4 de Agosto de 2015, e na mesma data foi proferido despacho pela Sra. Juiz de turno, ordenando ao Autor que juntasse comprovativo de notificação à contraparte da pronúncia referida na alínea anterior. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 272 e 274 a 275 dos referidos autos no SITAF)
Q) Após o envio da respectiva notificação, em 05/08/2015, o Autor, em 7 de Agosto de 2015, juntou o documento referido na alínea anterior (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 287 dos referidos autos no SITAF)

R) Em 14 de Agosto de 2015 a Federação Portuguesa de Futebol (FPF) apresentou resposta ao requerimento apresentado pelo Autor em 31 de Julho de 2015, mencionado na alínea O) deste probatório. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 288 a 290 dos referidos autos no SITAF)

S) Em 25 de Agosto de 2015 o Autor apresentou requerimento pronunciando-se sobre o requerimento constante na alínea R) supra. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 291 dos referidos autos no SITAF)

T) Tendo sido aberta conclusão em 8 de Setembro de 2015, no mesmo dia, foi ordenada a notificação da FPF para que juntasse aos autos o processo administrativo. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 295 a 296 dos referidos autos no SITAF)

U) Em 22 de Setembro de 2015, a FPF cumpriu o despacho mencionado na alínea anterior. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 300 dos referidos autos no SITAF)

V) Tendo sido aberta conclusão em 23 de Setembro de 2015, no dia 24 de Setembro de 2015 foi ordenada a notificação do Autor acerca da junção do processo administrativo. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 303 a 306 dos referidos autos no SITAF)

W) Em 28 de Setembro de 2015 foi remetida notificação ao Autor conforme ordenado no despacho referido na alínea anterior. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 307 dos referidos autos no SITAF)

X) Em 19 de Outubro de 2015 foi aberta conclusão no processo para o dia seguinte (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 309 dos referidos autos no SITAF)

Y) Em 21 de Outubro de 2015 a Mm.ª Juiz titular do processo n.º 1473/15.2BELSB ordenou à Unidade Orgânica que lhe fizesse presente o processo administrativo instrutor, tendo sido aberta conclusão do mesmo em 26 de Outubro de 2015 com apresentação do mesmo, composto por 2 volumes. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 311 a 312 dos referidos autos no SITAF)

Z) Em 30 de Outubro de 2015 a Mm.ª. Juiz titular dos autos cautelares ora em apreço, proferiu despacho ordenando a notificação das partes para que viessem aos autos informar se acordavam que a providência cautelar fosse julgada pelo Tribunal Arbitral do Desporto, tendo concedido o prazo de cinco dias para se pronunciarem. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 315 a 317 dos referidos autos no SITAF)

AA) Em 2 de Novembro de 2015 foi remetida notificação às partes nos termos do despacho referido na alínea anterior. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 318 e 320 dos referidos autos no SITAF)

BB) Em 4 de Novembro de 2015 o Autor, respondendo ao despacho mencionado na alínea anterior, veio informar que não pretendia que fosse o Tribunal Arbitral do Desporto a decidir, juntando, para o efeito, comprovativo da notificação à parte contrária. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 322 a 324 dos referidos autos no SITAF)

CC) Em 18 de Novembro de 2015 foi aberta conclusão do processo. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 325 e 326 dos referidos autos no SITAF)

DD) Em 30 de Novembro de 2015 foi proferida sentença por este Tribunal, tendo julgado a providência cautelar improcedente. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 327 a 352 dos referidos autos no SITAF)

EE) Em 1 de Dezembro de 2015 foi remetida notificação às partes da sentença proferida. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 355 a 357 dos referidos autos no SITAF)

FF) Em 17 de Dezembro de 2015, o Autor apresentou requerimento de interposição de recurso acerca da decisão referida na alínea anterior e as respectivas alegações. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 361 dos referidos autos no SITAF)
GG) Em 18 de Dezembro de 2015, o Autor juntou aos autos comprovativo de notificação do requerimento referido na alínea anterior à parte contrária. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 465 dos referidos autos no SITAF)

HH) Conclusos os autos em 21/12/2015, em 22 de Dezembro de 2015 a Mm.ª. Juiz titular dos autos cautelares proferiu despacho de admissão de recurso. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 467 a 468 dos referidos autos no SITAF)

II) Em 23 de Dezembro de 2015 foi remetida notificação às partes do despacho referido na alínea anterior. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 469 a 471 dos referidos autos no SITAF)

JJ) Em 10 de Janeiro de 2016 a FPF apresentou as contra-alegações ao recurso interposto e referido a alínea EE) deste probatório. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 473 a 484 dos referidos autos no SITAF)

KK) Aberta conclusão em 26 de Janeiro de 2016, em 28/01/2016 a Mm.ª Juiz titular proferiu despacho ordenando a subida dos autos os Tribunal Central Administrativo Sul em 28 de Janeiro de 2016. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 487 a 490 dos referidos autos no SITAF)

LL) Em 2 de Fevereiro de 2016 foram os autos remetidos ao TCA Sul. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 497 a 498 dos referidos autos no SITAF)

MM) Em 5 de Fevereiro de 2016 foram remetidas notas de notificação aos mandatários do Autor e da Federação Portuguesa de Futebol da distribuição dos autos no Tribunal Central Administrativo Sul. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 499 e 500 dos referidos autos no SITAF)

NN) Em 5 de Fevereiro de 2016 foi remetida notificação à Magistrada do Ministério Público, para se pronunciar sobre o mérito do recurso referido na alínea EE) supra. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 501 dos referidos autos no SITAF)
OO) Em 15 de Fevereiro de 2016 a Digna Magistrada do Ministério Público junto do TCA Sul emitiu o seu Parecer. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 504 a 507 dos referidos autos no SITAF)

PP) Em 17 de Fevereiro de 2016 aos Ilustres mandatários do Autor e da Federação Portuguesa de Futebol foi remetida nota de notificação para que se pronunciassem sobre o Parecer constante da alínea anterior. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 511 a 512 dos referidos autos no SITAF)

QQ) Tendo o processo sido concluso em 8 de Março de 2016, a Mm.ª. Juiz Desembargadora proferiu despacho para inscrição na tabela em 12 de Abril de 2016. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 514 dos referidos autos no SITAF)

RR) Em 21 de Abril de 2016 foi proferido acórdão pelo TCA Sul, concedendo provimento ao recurso e revogando a decisão recorrida. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 515 a 537 dos referidos autos no SITAF)

SS) Em 22 de Abri de 2016 foi remetida aos Ilustres mandatários do Autor e da Federação Portuguesa de Futebol nota de notificação do acórdão referido na alínea anterior. (Cfr. Acordo e processo 1473/15.2BELSB físico, junto aos autos, sem numeração e a fls. 539 e 540 dos referidos autos no SITAF)

TT) O Autor não requereu a aceleração processual do processo registado sob o n.º 1473/15.2BELSB. (Cfr. Acordo)

UU) O Autor tinha a expectativa de que a decisão sobre a providência cautelar demoraria entre 5 dias a 4 semanas. (Cfr. depoimento de A… e A…)

VV) Após a suspensão, o FC… não utilizava o Autor nos seus jogos por se encontrar impedido de o fazer face à suspensão em vigor. (Cfr. depoimentos de A…)

WW) O treinador da equipa do FC…, L…, manifestou interesse em renovar o contrato referido na alínea D) deste probatório por mais uma temporada. (Cfr. depoimento de J…)

XX) Desde Maio de 2015 que o Autor tinha consciência que haveria a possibilidade de o contrato referido na alínea D) supra, não ser renovado. (Cfr. depoimento de D…;)

YY) O contrato do Autor com o FC… terminava em 30 de Junho de 2015, não tendo o mesmo sido renovado. (Acordo)

ZZ) Na sequência da análise positiva relativa ao controlo antidopagem, referida na al. E), o contrato referido na alínea anterior não foi renovado. (Cfr. depoimento de J… e D…;)

AAA) O período de transferências de jogadores de futebol profissionais no ano de 2015 ocorreu entre 1 de Julho a 31 de Agosto do referido ano. (Acordo)

BBB) O Autor não foi contratado por qualquer clube de futebol profissional desde o final do contrato referido na alínea D) deste probatório até 1 de Julho de 2016. (Cfr. depoimento de J…; D…;)

CCC) O Autor sofreu angústia, tristeza e depressão enquanto esteve suspenso de treinar e jogar futebol e, posteriormente, quando o seu contrato de trabalho com o FC… não foi renovado e, ainda, quando não conseguiu ser contratado por qualquer clube a partir de Junho de 2015. (Cfr. depoimentos de A…, J…, D…;)

DDD) O Autor sofreu angústia, tristeza e preocupação enquanto aguardava pela prolação de sentença no âmbito do processo n.º 1473/15.2BELSB. (Cfr. depoimentos de A… J…, D…; A… e F…)

EEE) O Autor enquanto esteve integrado numa equipa de futebol profissional beneficiou de treino ministrado por treinador de futebol profissional, tratamentos médicos e fisioterapia, serviços estes totalmente custeados pelo clube que integrou. (Cfr. depoimentos de A… e J…)

FFF) O Autor era um jogador de futebol com muito potencial, tendo jogado pelo A…, em Inglaterra. (Cfr. depoimento de D…; F… e A…)

GGG) O Autor contratou serviços de profissional de treino de futebol durante um ano, desde Julho de 2015, com os quais despendeu o valor de € 28.180,00, de modo a manter a forma física que tinha enquanto jogador profissional. (Cfr. documento junto com requerimento de 4 de Maio de 2017 e depoimento de F…)

HHH) O Autor despendeu com acompanhamento de advogados, decorrente da defesa dos seus direitos, o valor de € 6.947,00, referente aos anos de 2015 e 2016. (Cfr. documentos juntos aos autos com requerimento de 4 de Maio de 2017)

III) Entre Janeiro de 2015 e Janeiro de 2016, o Autor suportou despesas e honorários do seu agente desportivo no período em que esteve suspenso da prática desportiva, no valor de € 30.000,00. (Cfr. documento junto com requerimento de 4 de Maio de 2017 e depoimento de D…)

JJJ) Entre Janeiro de 2015 e Janeiro de 2016, o Autor despendeu em tratamentos de medicina desportiva o valor de € 12.000,00. (Cfr. documento junto com requerimento de 4 de Maio de 2017 e depoimento de J…)

KKK) Entre 25 de Novembro de 2015 e 31 de Maio de 2016 o Autor despendeu com tratamentos físicos, fisioterapia e relaxamento muscular o valor de € 7.200,00. (Cfr. documento junto aos autos com requerimento de 4 de Maio de 2017)

LLL) O Autor, entre Dezembro de 2015 e Agosto de 2016, incorreu em despesas com custos de tradução de documentos judiciais no valor de € 780,10. (Cfr. documento junto com requerimento de 4 de Maio de 2017)

MMM) O Autor incorreu em despesas com custos de contratação dos serviços jurídicos de A… o valor de € 30.000,00. (Cfr. depoimento de A…)

NNN) A doença do Autor agravou-se em virtude da suspensão da prática de actividade desportiva. (Cfr. depoimento de A…)

OOO) Em 12 de Junho de 2015, o Autor recebeu comunicação com a decisão da FIFA, na qual esta emitiu uma extensão dos efeitos da decisão de suspensão a nível mundial. (Cfr. documento junto aos autos em suporte físico sem numeração)

PPP) A suspensão mundial imposta pela FIFA apenas seria levantada com uma decisão judicial definitiva que julgasse a suspensão do Autor ilegal. (Cfr. depoimento de A…)

QQQ) O Autor apenas voltou a jogar profissionalmente após a suspensão, quando contratado por novo clube, o que sucedeu em 1 de Julho de 2016, passando a jogar para o FC… . (Cfr. depoimento de J…. e A…)

RRR) Actualmente o Autor não toma o medicamento “Modafinil”, pelo facto de considerar que o mesmo é mal visto no âmbito desportivo futebolístico. (Cfr. depoimento de A…)

SSS) A presente acção deu entrada neste Tribunal em 2 de Maio de 2017. (Cfr. comprovativo de entrega da Petição Inicial a fls. 48 e 49 dos autos)

TTT) O Autor não foi contratado por um clube de futebol durante o mercado europeu de transferências entre 1 de Julho a 31 de Agosto de 2015. (Cfr. depoimentos de A… J… D…, F… e A…);

UUU) Em 31/10/2017 foi proferida sentença no âmbito dos autos principais, registados sob o n.º 1574/15.7 BELSB, de que os autos n.º 1473/15.2 BELSB dependeram, julgando improcedente aquela acção (cfr. SITAF);

VVV) Em 06/12/2017, o A. interpôs recurso jurisdicional da sentença proferida nos autos n.º 1574/15.7 BELSB (cfr. SITAF).

Factos não provados

Não se provou que:
1. O Autor tenha custeado o arrendamento do espaço para treinar enquanto não tinha clube. (Ausência de documento)

2. O Autor tenha entrado em depressão em virtude de aguardar pela prolação da decisão definitiva sobre o processo n.º 1473/15.2BELSB. (Ausência de documento ou depoimento)

3. O FC… pretendesse renovar o contrato do Autor por mais uma temporada. (Ausência de documento e depoimento)

4. Na sequência do agravamento da doença, o Autor tenha despendido em medicação e acompanhamento médico o montante de € 18.500,00. (Ausência de documentos)


*
II. 2. De DIREITO

Conforme delimitado em I.1. cumpre apreciar e decidir as seguintes questões:

i) Da nulidade da sentença (omissão de pronúncia) / do erro de julgamento de facto

Segundo o preceituado no artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC, é nula a sentença quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não poderia tomar conhecimento.
Decorre de tal norma que o vício que afecta a decisão advém de uma omissão (1.º segmento da norma) ou de um excesso de pronúncia (2.º segmento da norma).
Na verdade, é sabido que essa causa de nulidade se traduz no incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever prescrito no artigo 608.º do CPC, o qual consiste, por um lado, em resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e, por outro, de só conhecer de questões que tenham sido suscitadas pelas partes, salvo aquelas de que a lei lhe permite conhecer oficiosamente.
Posto isto, integrando “a sentença tanto a decisão sobre a matéria de facto como a fundamentação dessa decisão (art. 607.º, n.ºs 3 e 4 do CPC), “deve considerar-se que a nulidade consagrada na alínea b), do n.º 1 (falta de especificação dos fundamentos de facto que justificam a decisão) apenas se reporta à primeira, sendo à segunda, diversamente, aplicável o regime do art. 662.º, nºs 2, al. d) e 3, alíneas b) e d) – ac. do TRP de 5.3.15, Aristides Rodrigues de Almeida, www.dgsi.pt, proc.1644/11, ac. do TRP de 29.6.15, Paula Leal de Carvalho, www.dgsi.pt, proc. 839/13)” cf. Lebre de Freitas / Isabel Alexandre, anotação ao art. 615.º, in Código de Processo Civil anotado, vol. II, 3.ª ed., Livraria Almedina, Coimbra, 2018 (reimpressão), pp. 733-740 (736).
Alude o Recorrente que o Tribunal a quo não se pronunciou quanto ao facto de que teria um rendimento anual de Setembro de 2015 a Julho de 2016, de valor nunca inferior a €110.000 (cento e dez mil euros), valor que auferira nas épocas anteriores, designadamente no Futebol Clube do Porto”.
O Recorrente não identifica os artigos da p.i. em que tal alegação foi feita.
Em todo o caso, o Tribunal a quo no julgamento de facto da matéria não provada indicou que não se provou que o FC… tivesse intenção de renovar o contrato com o Autor por mais um ano (ponto 3).
Logo, a ocorrer, seria erro de julgamento e não omissão de pronúncia.
Sendo que dos relatos invocados pelo Recorrente nenhuma testemunha indicou um clube que o teria contratado ou o valor certo que pagaria pela sua contratação, tendo sido apenas emitidas meras opiniões.
Acresce que, conforme se desenvolverá, a inclusão ou não de tal factualidade é irrelevante para o desfecho da presente acção.
Pelo que, nesta parte, improcede.

ii) Do erro de julgamento de direito (do prazo razoável para emissão de decisão judicial)

Discorda o Recorrente com o juízo formulado pelo Tribunal a quo a respeito do conceito de “prazo razoável”, para efeitos de apreciação do pressuposto relativo à ilicitude, em sede de responsabilidade civil extracontratual do Estado na administração da justiça. Centrando o seu argumentário de que “não se pode aceitar um período de 8 meses e 23 dias, como prazo razoável para se obter uma decisão judicial definitiva no âmbito de um processo urgente – providência cautelar”.

Pela sua relevância e assertividade, no que aqui releva, infra se transcreve o essencial do discorrido a este propósito pelo Tribunal a quo:
“ (…) Do facto ilícito
No que concerne ao facto, o mesmo corresponde à actividade e sua omissão, do Réu, Estado Português, no exercício do poder jurisdicional, na tramitação e na emissão de decisão do processo cautelar em prazo razoável.
Assim, a análise deste pressuposto deve ser realizada concomitantemente à análise do pressuposto ilicitude, uma vez que se exige que a tramitação e prolação de decisão tenha violado normas legais e/ou regulamentares, princípios gerais aplicáveis, e regras de ordem técnica ou de prudência comum que devam ser consideradas, conforme decorre dos artigos 7.º e 12.º da Lei 67/2007 de 31 de Dezembro.
Sendo certo que, nesta perspectiva, é irrelevante saber se e em que medida os prazos processuais foram incumpridos.
Neste sentido, cfr. doutamente decidido no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo referente ao processo n.º 0319/08 de 9 de Outubro de 2008, cujo entendimento se acolhe, “Deve em seguida passar a analisar-se na globalidade o tempo de duração da acção e o seu estado e, se a conclusão que se recolher deste conspecto for clara e seguramente no sentido de que foi ultrapassado o prazo razoável não deveremos perder-nos na floresta dos meandros processuais à procura de saber se foi ou não cumprido religiosamente cada um dos prazos dos actos daquele percurso. Uma situação deste tipo pressupõe evidentemente uma opinião praticamente unânime de um universo de apreciadores que o julgador pode prefigurar e portanto ocorre apenas quando a demora processual seja chocante, inaceitável, para os critérios do homem comum e das suas expectativas ponderadas sobre o andamento da máquina da administração da justiça.”.
Consequentemente, temos por assente que a ilicitude se refere sempre à duração global do processo e não decorre de uma consideração analítica dos actos de processo e respectivos prazos.
Da tramitação adoptada no processo cautelar ora em apreço, que a selecção da matéria de facto provada revela, extrai-se, com relevo, o seguinte:
A providência cautelar deu entrada neste Tribunal em 26 de Junho de 2015, tendo a Entidade Requerida apresentado a sua oposição em 15 de Julho de 2015, conforme alíneas I) e M) do probatório.
Após a oposição, o Autor veio pronunciar-se sobre a mesma em 31 de Julho de 2015, sendo que a FPF (Federação Portuguesa de Futebol) apresentou resposta à mencionada pronúncia, conforme alíneas O) e R) do probatório.
No âmbito do referido processo foi ainda ordenada a junção de comprovativo de notificação à parte contrária da pronúncia do Autor, uma vez que o ora A. não havia procedido à referida junção, conforme legalmente lhe competia (alínea F) da matéria de facto provada).
Posteriormente, foi ordenado pela Mm.ª. Juiz titular do processo, que a Entidade Requerida juntasse aos autos o processo instrutor administrativo, o que veio a ocorrer em 22 de Setembro de 2015, tendo o mesmo sido notificado ao Autor em 24 de Setembro de 2015, conforme alíneas T) a W) do probatório.
Sendo que em 28 de Setembro de 2015 foi remetida notificação ao Autor conforme ordenado no despacho referido na alínea anterior, cujo prazo supletivo de 10 dias (por não ter sido fixado outro inferior) para eventual pronúncia/contraditório terminou no dia 15 de Outubro, contado nos termos das disposições conjugadas dos artigos mencionados infra.
E, em 19 de Outubro de 2015 foi aberta conclusão no processo para o dia seguinte.
Após, em 21 de Outubro de 2015 a Mm.ª Juiz titular do processo n.º 1473/15.2BELSB ordenou à Unidade Orgânica que lhe fizesse presente o processo administrativo instrutor, tendo sido aberta conclusão naqueles autos cautelares em 26 de Outubro de 2015 com apresentação do mesmo, composto por 2 volumes.
Em 30 de Outubro de 2015 a Mm.ª. Juiz titular indagou as partes sobre se acordavam que a providência fosse julgada pelo Tribunal Arbitral do Desporto, tendo apenas o Autor emitido pronúncia, opondo-se ao mesmo, mediante requerimento de 4 de Novembro de 2015, conforme alíneas Z) a BB) da matéria de facto provada.
Tendo sido aberta conclusão em 18 de Novembro de 2015 a sentença foi proferida em 30 de Novembro de 2015, conforme alíneas CC) e DD) do probatório.
Ora, no propósito de lhes imprimir uma especial celeridade, estabelece o art.º 113º n.º 2 do C.P.T.A que os processos cautelares são processos urgentes (cfr. também o artigo 36.º, n.º 1, alínea e) do C.P.T.A. - aqui sempre entendido, salvo menção em contrário- na redacção anterior ao DL 214-G/2015, de 2 de Outubro, aplicável aos factos em apreço, por força do art.º 15º do seu preâmbulo).
Como explicitam Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2017, 4ª edição, pág. 931, “Resulta daqui que os prazos processuais relativos a estes processos correm seguidamente, mesmo durante as férias judiciais (artigo 36.2, n.º 2). Quando os prazos terminem em dia em que o tribunal esteja encerrado, o seu termo transfere-se, contudo, para o primeiro dia útil seguinte (cfr. artigo 138.º, n.º 2, do CPC, ex vi artigo 1.2). Por outro lado, os processos cautelares correm com dispensa de vistos prévios, mesmo em fase de recurso jurisdicional, e os atos da secretaria que a eles respeitem são praticados no próprio dia, com precedência sobre quaisquer outros (artigo 36.º, n.º 2). Os recursos jurisdicionais das decisões tomadas em primeira instância no âmbito destes processos são, entretanto, interpostos no prazo de 15 dias e sobem imediatamente, no apenso, sendo os prazos a observar durante o recurso reduzidos a metade e o julgamento marcado, com prioridade sobre os demais, para a sessão imediata à conclusão do processo para decisão (artigo 147.º). Na mesma linha de celeridade se orienta, por seu turno, a estrutura simplificada da tramitação desenhada nos artigos 114.v e segs., assim como o prazo de cinco dias para a decisão, previsto no artigo 119. n.º 2. Parece, no entanto, admissível a junção de articulados supervenientes, quando seja indispensável à tutela efetiva da situação jurídica em risco trazer factos novos ao processo.”
Donde, do n.º 1 do artigo 119.º do C.P.T.A., a decisão sobre a providência cautelar deve ocorrer no prazo de cinco dias contada da apresentação da última contestação ou do decurso do respectivo prazo, ou da produção de prova, quando esta tenha tido lugar.
Sucede, porém, que no caso vertente, após a apresentação da Oposição por parte da então Entidade Requerida, ainda foram juntos aos autos as respectivas pronúncias das partes, bem como, houve lugar a despacho a ordenar notificação à parte contrária e ainda foi ordenada a junção do processo administrativo instrutor, que se mostrou importante para a selecção da matéria de facto indiciariamente provada nos autos cautelares ora em apreço.
Ademais o Tribunal proferiu ainda despacho, questionando as partes se se opunham a que a providência fosse decidida pelo Tribunal Arbitral do Desporto, concedendo, para o efeito, o prazo de cinco dias, a que o A. se opôs mediante requerimento de 04/11/2015.
Naturalmente que o referido prazo de cinco dias, bem como, o prazo geral do contraditório previsto no art.º 3º n.º 3 do C.P.C., apenas poderá iniciar a sua contagem após a notificação às partes, a qual se presume efectuada no terceiro dia posterior ao do registo, ou no primeiro dia útil quando o não seja (cfr. o disposto no nº 1 do artigo 247º, na parte final do artigo 248º - por o disposto sobre a notificação e tramitação electrónica, prevista e regulada na Portaria n.º 280/2013, de 26 de Agosto, não ser aplicável à jurisdição administrativa – atento o previsto no nº 1 do artigo 131º e no nº 1 do artigo 132º, todos do CPC, ex vi artigo 25º do CPTA e, à data da prática dos factos, ainda não ter sido publicada a Portaria n.º 380/17, de 19 de Dezembro.
Ora, considerando que o referido despacho foi proferido em 30 de Outubro de 2015, e que foi notificação às partes foi remetida em 2 de Novembro de 2015, as mesmas apenas se consideraram notificadas ao terceiro dia útil posterior, nos termos do artigo 248.º do C.P.C.,
Para cômputo do final do prazo ter-se-á ainda que considerar o disposto no n.º 5 do artigo 139.º do C.P.C., quando refere a possibilidade da prática do acto, mediante pagamento de multa nos três primeiros dias úteis subsequentes ao final do prazo.
Assim sendo, o prazo terminou a 13 de Novembro de 2015 (sexta feira).
Conforme resulta da alínea CC) do probatório a conclusão foi aberta em 18 de Novembro de 2015, iniciando-se nesta data o prazo supra referido de cinco dias para que a decisão fosse proferida.
Note-se que não se poderá considerar a ultrapassagem de qualquer prazo processual, quer na abertura da conclusão em 19/10/2015, quer na abertura da conclusão em 18/11/2015, porquanto, à data dos factos, uma vez que ainda não havia sido legalmente instituída nos Tribunais Administrativos a obrigatoriedade de apresentação das peças processuais, documentos e processo instrutor via electrónica (o que veio a ocorrer com a Portaria n.º 380/17, de 19 de Dezembro), era prática corrente, por uma questão de cautela, aguardar por mais dois ou três dias para além do prazo previsto no art.º 139º n.º 5 do C.P.C. a eventual remessa de qualquer peça processual pelo correio.
A sentença foi proferida em 30 de Novembro, conforme dispõe a alínea DD) do probatório, ou seja, 12 dias depois da abertura da conclusão, em 18/11/2015.
Daqui se retira que, efectivamente, o prazo de cinco dias para que fosse proferida a decisão em 1.ª instância foi ultrapassado em 7 dias.
Assim, verifica-se que a decisão em 1.ª instância foi proferida decorridos que foram 5 meses e 4 dias sobre a propositura da acção registada sob o n.º 1473/15.2 BELSB.
Após, o Autor interpôs recurso da referida decisão em 17 de Dezembro de 2015, tendo a Entidade Requerida apresentado as contra-alegações em 10 de Janeiro de 2016.
Conclusos os autos no TCA Sul em 8 de Março de 2016, a Mm.ª. Juiz Desembargadora proferiu despacho para inscrição na tabela em 12 de Abril de 2016.
A este respeito, prescreve o art.º 657º n.º 1 do C.P.C. que, “decididas as questões que devam ser apreciadas antes do julgamento do objecto do recurso, (…) o relator elabora o projecto de acórdão no prazo de trinta dias”, sendo o processo inscrito em tabela logo que se mostre decorrido o prazo para o relator elaborar o projecto de acórdão (cfr. art.º 659º n.º 1 do C.P.C.).
De igual modo, na sessão anterior ao julgamento do recurso, o processo acompanhado com o projecto de acórdão, vai com vista simultânea, por meios electrónicos, aos dois juízes-adjuntos, pelo prazo de cinco dias (cfr. art.º 657º n.º 2 do C.P.C.).
Por seu turno, prescrevia o art.º 147º n.º 2 do C.P.T.A., na redacção anterior ao DL 214-G/2015, de 2 de Outubro) que “Os prazos a observar durante o recurso são reduzidos a metade e o julgamento pelo Tribunal superior tem lugar, com prioridade sobe os demais processos, na sessão imediata à conclusão do processo para decisão”.
Da conjugação das disposições legais supra citadas, verificamos, assim que, uma vez conclusos os autos, a Mm.ª Juiz Desembargadora dispunha do prazo de 15 dias para inscrever o processo em tabela, prazo esse que, no caso vertente, terminaria no dia 23 de Março de 2016. Considerando que o processo foi inscrito em tabela no dia 12 de Abril de 2016, ou seja, um mês e quatro dias após o mesmo ser concluso, forçoso será de concluir que o prazo de 15 dias foi ultrapassado, verificando-se, assim, um atraso de 20 dias.
Em 21 de Abril de 2016 (5.ª feira) foi proferido acórdão pelo TCA Sul, concedendo provimento ao recurso e revogando a decisão recorrida, conforme alíneas QQ) e RR) do probatório, deixando-se aqui consignado, como é facto notório e, consequentemente, não carecido de alegação ou prova, que o TCA Sul reúne quinzenalmente, às 5.ªs feiras, para sessão.
Do que antecede, resulta assim, numa primeira análise, que desde a propositura da providência cautelar intentada neste Tribunal e registada sob o n.º 1473/15.2 BELSB, até à prolação do Acórdão do TCA Sul que lhe pôs termo decorreram 9 meses e 26 dias, verificando-se um atraso processual de 7 dias na 1.ª instância e de de 20 dias na 2.ª instância, num total de 27 dias.
Mas desta asserção poder-se-á concluir que se verificou a violação do direito do A. a obter uma decisão em prazo razoável?
Afigura-se-nos que a resposta só poderá ser negativa.
Desde logo, cumpre referir que “O conceito de “prazo razoável” pressupõe o reporte a um standard ou padrão médio de funcionamento tido como tal em cada época concreta, fundamentado em graus de eficiência do serviço público da administração da justiça.
Segundo a sentença proferida pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem/1ª Secção, procº nº 30273/07 de 11.02.2010, caso Leonardo da Silva c. Luxemburgo, “(..) a razoabilidade da duração de um processo aprecia-se de acordo com as circunstâncias do caso concreto e segundo os critérios consagrados pela jurisprudência, particularmente a complexidade da causa, o comportamento do Autor e das autoridades competentes, bem como o desenrolar da litigância pelas partes interessadas (..)” (cfr. Ac. do TCA Sul, de 21/03/2019, proferido no âmbito do proc. 1379/07.9 BELSB).
Sendo que “ (…) a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem vem evoluindo no sentido de qualificar como prazo razoável a duração média do processo, apontando para 3 anos de duração média, na primeira instância, para a generalidade das matérias e para 4 a 6 anos de duração global da lide, da mesma parecendo resultar uma via de solução articulada em três fases, a saber,
(i) apurar a duração média da categoria de processo,

(ii) apurar os casos de claro de afastamento inaceitável desse padrão médio, salvo culpa do próprio lesado e

(iii) em via de análise mais fina, apurara os restantes casos, com apoio nos critérios orientadores enunciados na jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.

Consequentemente, temos por assente que a ilicitude se refere sempre à duração global do processo e não decorre de uma consideração analítica dos actos de processo e respectivos prazos.” (cfr. o douto aresto supra citado).
Porém, o caso em apreço apresenta desde logo a particularidade de se tratar de uma providência cautelar, e por isso um processo urgente, pelo que naturalmente o prazo erigido pelo TEDH no âmbito de uma acção judicial, não pode ser idêntico ao que se possa considerar para um processo urgente.
E, na ausência de critério qual o prazo a atender como razoável para a prolação de decisão final no âmbito dos procedimentos cautelares?
Poderemos socorrer-nos, para o efeito, do disposto na lei processual civil, ínsito no art.º 363º n.º 2 do C.P.C. nos termos do qual “Os procedimentos instaurados perante o tribunal competente devem ser decididos em 1.ª instância, no prazo máximo de dois meses ou, se o requerido não tiver sido citado, de 15 dias” ?
Também vislumbramos que a resposta será negativa.
Senão vejamos:
Como é consabido, na actividade interpretativa, a letra da lei constitui o primeiro patamar na tarefa da interpretação, constituindo simultaneamente seu ponto de partida e seu limite - cfr. artigo 9º do Código Civil.
Porém, o intérprete não pode limitar-se ao sentido aparente e imediato, ao seu sentido literal, antes tendo que perscrutar a sua finalidade, em suma, o seu sentido e força normativa, pelo que, para se fixar o sentido e alcance da norma jurídica, intervêm, para além, desde logo, do elemento gramatical (o texto ou letra da lei) elementos vários que a doutrina vem considerando, concretamente de ordem sistemática, histórica e racional ou teleológica, consistindo, este último, na razão de ser da lei (ratio legis), no fim visado pelo legislador ao criar a norma.
Conforme escreve Baptista Machado, in Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, págs. 182/183, o conhecimento desse fim, sobretudo quando acompanhado da clara noção das circunstâncias (políticas, sociais, económicas, morais, etc.) em que a norma foi elaborada ou da conjuntura político-económico-social que motivou a decisão legislativa (ocasio legis), constitui um elemento da maior importância para determinar o sentido da norma.
Basta lembrar que o esclarecimento da “ratio legis” revela a valoração ou a ponderação de diversos interesses que a norma regula e, portanto, o peso relativo desses interesses, a opção entre eles traduzida pela solução que a norma exprime. Sem esquecer, ainda, que, pela descoberta daquela racionalidade que norteou o legislador na fixação de determinado regime jurídico particular, o intérprete apodera-se de um ponto de referência que ao mesmo tempo o habilita a definir o exacto alcance da norma e a adivinhar outras situações típicas com o mesmo ou diferente recorte.
Toda a norma assenta, pois, num certo fundamento ou razão de ser que é a finalidade a que se dirige, sendo a ratio legis reveladora da valoração ou ponderação dos diversos interesses que a norma jurídica visa disciplinar.
Por sua vez, o elemento sistemático funda-se na circunstância de que um preceito jurídico não existe por si só, isoladamente, antes encontrando-se ligado a vários outros de modo a constituírem todos eles um sistema, podendo a sua confrontação vir a revelar um nexo de subordinação, uma relação de analogia ou paralelismo ou ainda um certo grau de conexão, vide neste sentido o Acórdão da Secção do STA de 13/10/04, in rec. nº 950/04, consultável em www.dgsi.pt ).
Aqui chegados, desde logo cumpre referir que, pese embora no âmbito do CPTA, o legislador processual administrativo tenha “bebido” da influência do legislador processual civil em matéria de processos cautelares, instituiu-lhe, no entanto uma tramitação própria, com especificidades inerentes aos litígios que opõem os particulares à Administração Pública no âmbito de uma relação jurídica administrativa, definida como “ aquela que confere poderes de autoridade ou impõe restrições de interesse público à Administração perante os particulares ou que atribui direitos ou impõe deveres públicos aos particulares perante a administração” (Freitas do Amaral, Direito Administrativo, vol. III, pág. 439), sendo pacífico que pelo menos um dos sujeitos tem de actuar nas vestes de autoridade pública, investido de ius imperium, com vista à realização do interesse público (cfr. José Eduardo Figueiredo Dias e Fernanda Paula Oliveira, Noções Fundamentais de Direito Administrativo, pág. 239).
Disso constituem exemplo:
i) A notificação do Requerente para, no prazo de cinco dias, aperfeiçoar o eu Requerimento Inicial, quando o mesmo não indique qualquer dos elementos elencados no art.º 114º n.º 3 do CPTA;

ii) A possibilidade de apresentação de novo requerimento, quando o R.I. tenha sido liminarmente rejeitado com os fundamentos ínsitos na al. a) a c) do ar.º 116º nº 2 do CPTA;

iii) A existência de Contra-Interessados, cuja identidade e residência o Requerente pode desconhecer, devendo, para o efeito, solicitar previamente à Autoridade Administrativa certidão de que constem os referidos elementos e, caso a mesma não a emita no prazo de 24h, a possibilidade do Tribunal a intimar a visada Entidade a remetê-la no prazo de dois dias (cfr. art.º 115º do CPTA);

iv) O facto de, em princípio, no contencioso administrativo e, contrariamente ao que sucede no processo civil, os Requeridos serem sempre ouvidos, no prazo de dez dias, procedendo-se, para o efeito, à respectiva citação (cfr. art.º 117º n.º 1 do CPTA) ou notificação, no caso de já terem sido citados no processo principal (cfr. art.º 117º n.º 5 do CPTA);

v) O diferimento da citação dos contra-interessados para o momento posterior à junção da resposta da autoridade administrativa ou ao decurso do respectivo prazo, constituindo uma excepção ao princípio da simultaneidade das citações (cfr. art.º 117º n.º 2 do CPTA);

vi) A possibilidade de citação dos contra-interessados por anúncio quando estes sejam incertos ou de residência desconhecida (cfr. art.º 117º n.º 3 do CPTA)

vii) A possibilidade de, uma vez requerida a suspensão de eficácia de um acto administrativo, como a dos autos objecto da presente acção, a Autoridade Administrativa poder apresentar Resolução Fundamentada no prazo de 15
dias, nos termos do art.º 128º n.º 1 do CPTA, por forma a iniciar ou prosseguir o acto suspendendo;

viii) A possibilidade de o Requerente deduzir o incidente de declaração de ineficácia de actos de execução indevida, para o qual deverá a Autoridade Administrativa ser ouvida, no prazo de cinco dias;

ix) Uma vez deduzida a Oposição por parte da Autoridade Requerida ou dos Contra-Interessados, a faculdade do Requerente se pronunciar quanto à matéria de excepção deduzida;

x) O recurso à colegialidade em sede cautelar (cfr. art.º 119º n.º 2 e 3 do CPTA);

xi) A suspensão de um acto já executado (cfr. art.º 129º do CPTA).
Do supra exposto decorre que, não obstante, tal como em processo civil, a celeridade indispensável à efectividade da tutela cautelar aconselha a que a decisão seja tomada o mais depressa possível, não é possível, no entanto, determinar, no contencioso administrativo, um prazo máximo para a pendência e decisão em 1.ª instância dos processos cautelares, designadamente, o prazo de dois meses, previsto no art.º 363º n.º 2 do CPC.
Para o efeito, basta atentar na tramitação e prazos supra referidos ou, na eventualidade de não se conseguir proceder à citação pessoal de algum Contra-Interessado ou, ainda, na de este apenas ser citado após a apresentação da Resposta da Autoridade Requerida, para que o visado prazo de dois meses seja ultrapassado, por motivos alheios a qualquer das partes ou ao Tribunal.
Ademais, o CPTA no art.º 112º n.º 2 apenas prevê a adopção de providências especificadas no Código de Processo Civil (previstas nos art.ºs 377º e seguintes do CPC), com as necessárias adaptações, sendo certo que o prazo de dois meses previsto no art.º 363º n.º 2 do CPC se reporta ao Procedimento Cautelar Comum.
Pelo que, não foi a despropósito que, no âmbito do contencioso administrativo, o legislador não instituiu um prazo máximo para a pendência e decisão de um processo cautelar em 1ª instância.
E tanto assim é que, no âmbito da revisão do CPTA, operada quer pelo DL 214-G/2015, de 2 de Outubro, quer pela Lei n.º 118/2019, de 17 de Setembro, podendo fazê-lo, o legislador optou apenas por determinar que as providências se regem pela tramitação e são adoptadas segundo os critérios previstos no Título IV (ínsitos nos art.º 112º a 134º, ex vi art.º 112º n.º 2, todos do CPTA) e que “o julgamento dos processos urgentes tem lugar, com prioridade sobre os demais, logo que o processo esteja pronto para decisão.” (cfr. art.º 36º n.º 3 do CPTA).
Sendo certo que a lei processual civil apenas tem aplicação quando as matérias não se encontrem especialmente reguladas na lei processual administrativa, conforme decorre do artigo 1.º do C.P.T.A
Daí que, aqui chegados, perante a inexistência de um prazo a atender como razoável para a prolação da decisão final no âmbito do processo cautelar sub judice, relacionado com uma matéria muito específica, para a qual foi criado, inclusivamente, um Tribunal Arbitral especializado e processo judicial esse complementado com um processo administrativo composto por dois volumes, não pode, na perspectiva deste Tribunal, ser reconduzido, sem mais, ao primeiro critério enunciado pelo STA para aferir a razoabilidade do prazo para prolação de decisão, o qual tem por referência a “análise global, de conjunto da situação processual dos autos em que o demandante se queixa do atraso”.
Cumpre, então, perscrutar se o processo sub judice é subsumível aos restantes crivos gizados pelo TEDH - o comportamento das partes; a actuação das autoridades competentes no processo e o assunto que é discutido no processo e a importância que o mesmo reveste para o respectivo autor, por forma a determinar se o R. terá ou não violado o direito do A. à obtenção de uma decisão em prazo razoável.
Sem prejuízo do já aflorado, sempre se dirá que, o ora A., Requerente nos autos ora em análise, pese embora venha agora imputar a violação do prazo razoável, durante a pendência do visado processo, entendendo que o mesmo se encontrava atrasado, não cuidou de utilizar o mecanismo da aceleração processual.
Com efeito, o Estado colocou à disposição dos sujeitos processuais, na qualidade de interessados, a faculdade de poderem, quando mostrassem legitimidade e de uma forma fundamentada, acelerar o processo (seja ele principal ou cautelar), através de uma exposição aos Conselhos Superiores, devendo estes, fundamentadamente, requerer a aceleração processual.
Ora, o Autor não logrou demonstrar qualquer interesse nessa aceleração processual, pelo que a sua inércia apenas a si é imputável, considerando-se por isso que não entendia que o seu direito de obter uma decisão em prazo razoável estivesse a ser colocado em questão.
O que, por outra banda, nos reconduz ao critério da importância do objecto do litígio para o mesmo, que, tal como supra expendido, constitui um critério para aferir da razoabilidade da duração de um processo (vide, neste sentido, a título exemplificativo, os acórdãos proferidos pelo TEDH em 06.04.2000, processo n.º 35382/97, COMINGERSOLL S.A. v. PORTUGAL, ou em 08.06.2006, processo n.º 75529/01, SÜRMELI v. GERMANY, disponíveis para consulta online em http://hudoc.echr.coe.int/eng#).
E, nesse conspecto, concedendo que o objecto do litígio era da mais elevada importância para o A. e para a sua carreira de futebolista, não só pelo seu potencial, como pela sua tenra idade e, bem assim, pelo facto de se reconhecer que a profissão de futebolista é curta e de desgaste rápido, o mesmo sempre poderia ter requerido o decretamento provisório da providência cautelar de suspensão de eficácia da decisão do Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol (cfr. art.º 131º do CPTA), ou formulado um pedido cumulativo de Autorização provisória para prosseguir a actividade desportiva (cfr. art.º 112º n.º 2, al. d) do CPTA) ou de intimação da FPF à adopção de uma conduta (cfr. art.º 112º n.º 2, al. i) do CPTA), ou ainda, em última análise, poderia ter requerido a antecipação do juízo sobre a causa principal (cfr. art.º 121º do CPTA). O que não fez.
Com efeito, de acordo com o depoimento da testemunha A…, a FIFA só levantaria a suspensão disciplinar com uma decisão definitiva, não se bastando com uma admissão liminar ou decisão provisória, como a ínsita às providências cautelares, que podem caducar, ser alteradas ou revogadas (cfr. art.º 123º e 124º do CPTA).
E, nessa medida, o A. só logrou obter uma decisão na acção principal em 31/10/2017, cujo recurso jurisdicional, por si interposto, ainda se encontra pendente. Pelo que, sempre o Requerente poderia ter lançado mãos de mecanismos legalmente previstos que lhe permitiam obter uma decisão final mais cedo e, consequentemente, lhe permitissem retomar a sua actividade desportiva, em caso de procedência.
Cumpre ainda salientar que, independentemente dos motivos que estiveram subjacentes a tal decisão ou da sua bondade, o A. apenas interpôs a Providência Cautelar sub judice quatro dias antes de terminar o seu contrato com o FC….
E, nessa medida, se o Autor não lançou mão dos mecanismos legais acima referidos, por ter criado a expectativa de que a decisão sobre a providência cautelar demoraria entre 5 dias a 4 semanas, fê-lo por ignorância ou má interpretação da lei, não o isentando, no entanto, das consequências advenientes da sua inércia (cfr. art.º 6º do Código Civil).
Aliás, nesta sede, a própria testemunha A…, sua advogada, especialista em Direito do Desporto, na área da Dopagem reconheceu desconhecer os prazos legais do contencioso administrativo português, referindo, para o efeito que, na Alemanha, os prazos rondam os 4 ou cinco dias
Ainda quanto à actuação das partes durante a tramitação processual refira-se que após a dedução da Oposição por parte da então Entidade Requerida, o A. apresentou a sua pronúncia à mesma em 31/07/2015, não juntando, para o efeito, o documento comprovativo da notificação à parte contrária, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 221º e 255º do CPC, ex vi art.º 25º do C.P.T.A., o que obrigou à prolação de despacho em 04/08/2015, ordenando a notificação do mesmo para proceder à sua junção.
A respectiva notificação foi enviada em 05/08/2015 e o A. deu cumprimento ao ordenado pelo Tribunal em 07/08/2015, data em que a Entidade Requerida apresentou requerimento solicitando o desentranhamento parcial do requerimento de 31/07/2015 junto pelo A., tendo este emitido a sua pronúncia em 25/08/2015, o que obrigou a que a Secretaria aguardasse o contraditório do mesmo, sendo os autos novamente conclusos a 08/09/2015 (cfr. als. O) a T) da factualidade assente).
Ora, prescreve o art.º 3º n.º 3 do C.P.C. ex vi art.º 1º do C.P.T.A. que o juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem.
Contudo, tal não significa a possibilidade ilimitada de as partes apresentarem um rol infindável de “respostas” às “respostas”, quer, porque processualmente inadmissíveis, quer, porque, a serem admitidas desvirtuariam o cunho de celeridade característico das providências cautelares, como a dos autos sub judice.
E, nessa medida, é seguro afirmar que se verificou uma delonga no processo imputável às partes desde 31/07/2015 (desde a falta de junção do documento comprovativo da notificação à parte contrária) até ao decurso do prazo do contraditório do requerimento de 25/08/2015, ou seja, até 3 de Setembro (cinco dias acrescidos dos três dias aludidos no art.º 139º n.º 5 do CPC), que se estima, assim, em um mês e três dias.
Donde, os atrasos no processo que resultem do comportamento processual das partes não poderão ser relevados para efeitos da apreciação da razoabilidade do prazo da decisão judicial nem, por conseguinte, imputados ao R., Estado Português.
O período a atender, para efeitos da apreciação da responsabilidade do R. pela alegada violação do direito do A. à obtenção de decisão em prazo razoável deverá, assim, ser deduzido do período que não é imputável ao R., nos termos acabados de expender.
Teremos, assim, que deduzir o período de um mês e três dias, ao prazo de 9 meses e 26 dias supra referido, o que perfaz um total de 8 meses e 23 dias, período esse em que os autos sub judice estiveram pendentes em duas instâncias até ser proferida a decisão (Acórdão) que lhe pôs termo e a ter em consideração para o que ora nos ocupa.
No que à actuação das autoridades judiciárias competentes concerne, para lá do que foi expendido acerca da prolação da sentença em 1ª instância e da inscrição na tabela, nada há a apontar; ao invés resulta da al. EE) que, em 1 de Dezembro de 2015, dia de feriado nacional, foi remetida notificação às partes da sentença proferida, o que revela o zelo e a diligência dos agentes envolvidos.
No que respeita à complexidade do caso, a questão em apreço incidia sobre matéria altamente especializada, para a qual foi criado o Tribunal Arbitral do Desporto (TAD), pela Lei 74/2013, de 06/09, com competência específica para administrar a justiça relativamente a litígios que relevam do ordenamento jurídico desportivo ou relacionados com a prática do desporto (cfr. art.º 1º n.º 2 da Lei 74/2013)
Competindo ainda ao TAD conhecer dos recursos das deliberações tomadas por órgãos disciplinares das federações desportivas ou pela Autoridade Antidopagem de Portugal em matéria de violação das normas antidopagem, nos termos da Lei n.º 38/2012, de 28 de agosto, que aprova a lei antidopagem no desporto (cfr. art.º 5º)
E, nessa medida, podendo usar da faculdade de ver o seu litígio apreciado por um Tribunal Arbitral especializado em matéria desportiva, ainda assim o A. preferiu que fosse o TAC a dirimir o conflito que o opôs à FPF.
Por essa razão, atenta a especificidade da matéria em causa, o processo apresentou alguma complexidade, tendo sido necessário analisar todo o processo instrutor junto aos autos, composto por dois volumes, para além dos articulados iniciais das partes se apresentarem extensos.
Ante o exposto, não obstante a natural dificuldade inerente à tarefa de indicar, em termos absolutos, qual o prazo razoável a para a prolação de decisão judicial, em particular porque inexiste definição por parte do TEDH daquilo que se deve considerar um prazo razoável no âmbito de uma providência cautelar, considera este Tribunal, em face dos circunstancialismos do caso concreto, que o prazo de 8 meses e 23 dias que mediou entre a data da propositura dos autos cautelares n.º 1473/15.2 BELSB, neste TAC, em 1.ª instância e o Acórdão proferido em 2.ª instância, que pôs termo ao processo, não poderá ser apelidado de desrazoável.
Não ocorre, assim, violação direito à justiça em prazo razoável.
Em face do que antecede, urge concluir que não se encontra preenchido o pressuposto da ilicitude.”

O assim decidido é de manter.
Desde logo, a apreciação e integração do conceito de justiça em “prazo razoável” não tem como pressuposto que a decisão judicial, cujo atraso se discute, tenha de se ser favorável ao autor /impugnante, mas sim que seja atempadamente proferida.
Sabendo-se que o direito a uma decisão judicial em prazo razoável foi consagrado no art.º 20.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa (CRP), na versão introduzida pela Lei Constitucional n.º 1/97, de 20-09.
Antes disso encontrava já consagração nos art.ºs. 6.º e 13.º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos (CEDH), de 04-11-1950 (aprovada para ratificação pela Lei n.º 65/78, de 13-10, com depósito em 09-11-1978 e desde essa data aplicável na ordem jurídica interna – cf. aviso no DR, 1.ª Série, n.º 1/79, de 21-01-1979), assim como nos art.ºs 8.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 10-12-1948 (publicada no DR de 09-03-1978) e 14.º do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos (aprovado para ratificação pela Lei n.º 29/78, de 12-06, com depósito em 15-06-1978 e desde essa data aplicável na ordem jurídica interna – cf. aviso no DR, 1.ª Série, n.º 187/78, de 16-08-1978).
Com efeito, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos tem entendido que a razoabilidade da duração de um processo é avaliada segundo as circunstâncias da causa e tendo em atenção os critérios consagrados pela jurisprudência, em particular, a complexidade do processo, o comportamento das partes e aquele que é atribuído às autoridades competentes, bem como, a importância do caso para os interessados (ver, entre muitos outros, Frydlender c. França [GC], n.º 30979/96, § 43, CEDH 2000-VII).
Sobre a apreciação do pressuposto da ilicitude por quebra do direito à justiça em prazo razoável, para além do acórdão do STA, no Ac. n.º 0319/08, de 09-10-2008, vide, entre outros, os Acs. do STA n.ºs. 122/09, de 08-07-2009, 090/12, de 10-09-2010, 122/10, de 05-05-2010, 144/13, de 27-11-2013 ou 72/14, de 21-05-2015. Entre a jurisprudência do TEDH remete-se para os Acs. n.ºs. 53615/08, de 25-09-2012, Novo e Silva c. Portugal, 75529/01, de 08-06-.2006, Sürmeli c. Alemanha, 35382/97, de 06-04-.2000, Comingersoll SA c. Portugal, 33729/06, de 10-06-2008, Martins Castro e Alves Correio de Castro c. Portugal, 39297/98, de 08-03-2001, Pinto de Oliveira C. Portugal, 12986/87, de 24-08-1993, Scuderi c. Itália ou 12598/86, de 19-02-1992, Viezzer c. Itália).
Como foi decidido no Ac. do STA de 07.10.2021, Proc. n.º 1427/19.0BELSB consultável in www.dgsi.pt :
“ (…) [T]em-se entendido que a razoabilidade da duração de um processo é avaliada segundo as circunstâncias concretas da causa e tendo em atenção os critérios consagrados pela jurisprudência, em particular, a complexidade do processo, o comportamento das partes e aquele que é atribuído às autoridades competentes, bem como, a importância do caso para os interessados.
Por referência ao nº 1, do artº 6º, da CEDH, tem-se enunciado 4 parâmetros definidores para aferir da razoabilidade da duração de um processo [cfr. entre muitos outros os acórdãos proferidos pelo TEDH em 06/04/2000, Proc. nº 35382/97, COMINGERSOLL S.A. v. PORTUGAL e em 08/06/2006, Proc. nº 75529/01, SÜRMELI v. GERMANY, in http://hudoc.echr.coe.int/eng].
São eles:

(a) A complexidade do processo;
(b) O comportamento das partes;
(c) A actuação das autoridades competentes no processo;
(d) O assunto que é discutido no processo e a importância que o mesmo reveste para o respectivo autor.
E como tem vindo a ser referido por este Supremo Tribunal Administrativo (cfr., entre outros, o Acórdão do STA, de 28.11.2007, P. 308/07), a apreciação destes pressupostos implica sempre a densificação de conceitos como o de “prazo razoável”, de “indemnização razoável” e de “danos morais indemnizáveis”, a qual não pode deixar de implicar uma interpretação do direito interno em conformidade com a Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH) e com a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH), sob pena de “divergência entre a aplicação tida por apropriada na ordem nacional e a interpretação dada pelo Tribunal de Estrasburgo”, o que implica a adopção de uma “metodologia dialogante, que tem subjacente a ´relação fisiológica´ existente entre a jurisdição nacional e a europeia” – cfr. ainda, os Acs. deste Supremo Tribunal de 28.11.2007, proc. nº 0308/07, de 09.10.2008, proc. nº 0319/08, e de 11.05.2017, proc. nº 01004/16.
Em resultado da jurisprudência do TEDH e deste STA, é de considerar-se que um processo decorreu para além do “prazo razoável” quando o mesmo foi decidido [decisão final de mérito] para além do momento em que, em circunstâncias normais, deveria ter sido decidido e que esse atraso se ficou a dever ao deficiente e culposo funcionamento da “máquina judicial” (“lato sensu”).

E tal apreciação há-de ser concreta e global. Concreta na medida em que sempre haverá que atender às específicas características do processo, v.g.: a natureza do processo, a sua complexidade, a quantidade de intervenientes, o comportamento das partes, os seus incidentes e ocorrências especiais que possam ter influenciado a marcha do processo. Global porque, regra geral, tem-se em consideração a duração global do processo em causa, e não o que sucedeu em cada prazo em concreto – não obstante o TEDH ser sensível à duração manifestamente excessiva de uma das suas fases num determinado processo em que, apreciado o mesmo na sua globalidade, se tenha verificado um atraso desrazoável”.
(…)

Refira-se, ainda, o constante no Ac. deste STA de 21/5/2015, proc. nº 072/14:
«(…) Sustentou-se ainda no acórdão deste Supremo de 10.09.2009 [Proc. nº 083/09 (…) que “a definição do que seja um prazo razoável não só não é meramente objetiva como também essa qualificação não pode ser atribuída em abstrato antes havendo de ter em consideração as circunstâncias concretas de cada caso, designadamente as relacionadas com natureza e complexidade do processo, a conduta do requerente e o comportamento das autoridades competentes (magistrados, órgãos de polícia e agentes dos serviços de justiça). O que quer dizer que o facto da conclusão do processo ter excedido o prazo legal, pode não ser qualificado como ilícito e culposo - Vd., entre outros, Acórdãos deste STA de 15/10/98 (rec. 36.811) e de 17/03/2005 (rec. 230/03). Ou seja, a violação do direito a uma decisão num prazo razoável só pode gerar a obrigação de indemnizar se as circunstâncias concretas do caso ditarem que ela podia ter sido alcançada num prazo inferior ao que efetivamente foi e que tal só aconteceu por incúria ou negligência dos operadores judiciários”».
(…)
Por outro lado, dispõe o artigo 9º do RRCEE, aprovado pela Lei nº 67/2007, de 31/12, ex vi do seu artigo 12º:
«1 - Consideram-se ilícitas as acções ou omissões dos titulares de órgãos, funcionários e agentes que violem disposições ou princípios constitucionais, legais ou regulamentares ou infrinjam regras de ordem técnica ou deveres objectivos de cuidado e de que resulte a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos.
2 - Também existe ilicitude quando a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos resulte do funcionamento anormal do serviço, segundo o disposto no nº 3 do artigo 7º”.
E constitui, jurisprudência reiterada deste Supremo Tribunal no sentido de que «o atraso na decisão de processos judiciais, quando puser em causa o direito a uma decisão em prazo razoável, garantido pelo art. 20º, nº 4, da CRP, em sintonia com o art. 6º, § 1.º, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, pode gerar uma obrigação de indemnizar» [cfr., entre outros, os Acs. de 17.03.2005, proc. nº 0230/03, de 17.01.2007, proc. nº 01164/06, de 28.11.2007, proc. nº 0308/07, de 09.10.2008, proc. nº 0319/08, de 10.09.2014, proc. nº 090/12, de 13.07.2016, proc. nº 0783/14, e de 11.05.2017, proc. nº 01004/16].

Atento este enquadramento jurídico, importa agora proceder à sua subsunção aos factos dados como provados, nos presentes autos.
E como se vem referindo, a definição de que seja, em cada processo, o prazo razoável para a prolação da respectiva decisão, não se obtém, como pretendem os recorrentes, pela verificação e soma dos tempos relativos aos actos que foram praticados, nas diversas fases, por motivos imputáveis ao Estado, para além dos prazos que a lei fixa, que são meramente ordenadores e disciplinadores [cfr. Ac. deste STA de 08.03.2018, in proc. nº 0350/17], mas sim pela duração do processo, numa perspectiva global”.

Argumenta o Recorrente que se trata de um processo urgente em que reclama uma tutela cautelar.
Não tendo sido possível identificar outros processos em que a questão da definição do prazo razoável se tenha colocado de forma autónoma e de modo isolado (desconexa do processo principal de que é instrumental), o certo é que, o prazo global de 8 meses e 23 dias para obter uma decisão final (não definitiva uma vez que a decisão cautelar depende do sucesso ou insucesso do processo principal), se mostra perfeitamente aceitável com a prolação de decisão em 2 instâncias e em menos de 1 ano.
Com efeito, para prolação de uma decisão em prazo razoável, conforme previsto nos artigos 6.º, n.º 1 da CEDH e 20.º, n.º 1 e n.º 4 da CRP, independentemente do cumprimento ou incumprimento escrupuloso dos prazos processuais ordenadores estabelecidos para a prática de actos pela Secretaria ou pelos Juízes, tal como bem referem os acórdãos suprarreferidos, releva a observância dos prazos entendidos jurisprudencialmente como razoáveis para a prolação de decisão final nos autos.
Nesse sentido, e sopesada a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Humanos (TEDH) e dos Tribunais superiores nacionais verifica-se que, tal como referido no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no processo n.º 090/12, de 10/09/2014 [disponível em www.dgsi.pt ], cujo teor, n9essa parte sufragamos: “(…) [De acordo com a jurisprudência do TEDH, a duração média – que corresponde à duração razoável – de um processo em 1ª. instância é de cerca de 3 anos e a duração média de todo o processo deve corresponder, em princípio, a um período que vai de 4 a 6 anos, salvo casos especiais (cf. Isabel Celeste Fonseca, in CJA, nº. 72, págs., 45 e 46). (…)”
Termos nos quais, de acordo com a jurisprudência do TEDH, a duração média – que corresponde à duração razoável – de um processo em 1ª. instância é de cerca de 3 anos e a duração média de todo o processo deve corresponder, em princípio, a um período que vai de 4 a 6 anos, salvo casos especiais.
Na situação sub iudice impõe-se concluir que, em face das aludidas circunstâncias do caso concreto, ademais considerando que o processo passou por duas fases distintas, com intervenção de duas instâncias, afigura-se razoável equacionar a duração inferior a 10 meses, para as duas instâncias, ou seja, inferior a 1/3 do prazo considerado como média de duração só na 1ª instância, sempre dentro do patamar gizado pelo TEDH.
A convicção do Recorrente - vide alínea UU do probatório - de que o processo cautelar duraria ente 5 dias e 4 semanas não tem respaldo no quadro legal vigente no CPTA.
Sendo inoperante para aferição de tal prazo a expectativa do Recorrente ou os prazos previstos noutro ordenamento jurídico.
Como se expendeu detalhadamente na sentença recorrida, o processo não teve momentos de paragem longos ou injustificados, sendo a gestão do processo e dos trâmites processuais um dos poderes conferidos pela lei ao juiz na instrução do respectivo processo (vide arts. 118.º, n.º 1 e 7.º-A do CPTA).
Assim, o processo cautelar n.º 1473/05.2BELSB não sofreu qualquer atraso desrazoável.
Inexiste, pois, o facto ilícito.
Logo, sendo os pressupostos legais da responsabilidade civil extracontratual do Estado de verificação cumulativa, estava, desde logo, a presente acção votada ao insucesso, independentemente da indagação quanto à culpa, dano e nexo de causalidade entre facto e dano.
Em todo o caso, o Tribunal a quo fez também a apreciação dos demais requisitos, designadamente do relativo ao nexo de causalidade. Ainda que desnecessária, foi a correcta de acordo com a situação de facto e o regime legal aplicável, na medida em que considerando que, desde Maio de 2015, o Recorrente sabia que o contrato com o FC… terminaria em 30.06.2015 (vide factos XX) e YY do probatório) e que não seria renovado. Então, à data da interposição do processo cautelar, em 30.06.2015 (facto J) do probatório), o tal prazo de 5 dias a 4 semanas, que o Recorrente entendia como o “normal”, já estaria esgotado.
Por outro lado, o período de transferência dos jogadores ocorreu entre Julho e Agosto desse ano (facto AAA do probatório). Antes disso seria inviável a prolação de decisão final (considerando a fase de recurso jurisdicional) atentos os prazos processuais previstos no CPTA.
Por último, ainda que tivesse sido decretada a providência cautelar, tal seria irrelevante, na medida em que a suspensão mundial imposta pela FIFA somente seria levantada com uma decisão judicial definitiva que julgasse a suspensão ilegal – cf. alínea PPP do probatório.
O que revela que os danos alegadamente sofridos pelo Recorrente não decorreram da demora do processo cautelar mas antes da pena disciplinar aplicada pela FIFA.
Em suma, é de negar provimento ao recurso.

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III. DECISÃO

Pelo exposto, acordam os Juízes Desembargadores deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e, em consequência, confirmar a sentença recorrida.
Custas a cargo do Recorrente (cf. art.ºs. 527.º n.ºs 1 e 2 do CPC, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2, do RCP e 189.º, n.º 2 do CPTA).
Registe e notifique.

Lisboa, 4 de Novembro de 2021
Ana Cristina Lameira (relatora)
Catarina Vasconcelos
Rui Belfo Pereira