Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:04730/11
Secção:CT
Data do Acordão:04/18/2018
Relator:ANA PINHOL
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
IRS
ÓNUS DA PROVA
Sumário:I. A declaração de rendimentos sujeitos a tributação compete ao contribuinte, impondo a lei à Administração Tributária o dever de fiscalizar tal declaração e posteriormente o dever de demonstração da ocorrência dos pressupostos legais (vinculativos) da sua actuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável), impendendo, ao invés sobre o administrado apresentar prova bastante da ilegitimidade do acto, quando se mostrem verificados esses pressupostos [cfr.artigo 74º, nº.1, da LGT].
II. Este entendimento, no entanto, tem de ser temperado com o princípio da descoberta da verdade material e, por consequência, também, com o da oficiosidade de investigação e indagação das provas, que rege o procedimento tributário.
III. E desta conjugação resulta que o ónus da prova, nos termos antes referidos, não assume, no caso, uma natureza formal ou adjectiva, mas, antes, natureza substantiva ou material, do que resulta que, apesar de nenhuma das partes ter uma particular incumbência de provar o que quer que seja, a decisão final não pode, no entanto e pela impossibilidade legal de manutenção de um "non liquet", deixar de desfavorecer a parte que se encontrava onerada à prova dos necessários e relevantes factos.
IV. No caso concreto, compete à Administração Tributária demonstrar a ocorrência de circunstancialismo de facto justificativo de uma não aceitação da declaração de rendimentos do contribuinte - no caso traduzida na ausência de declaração das importância aqui em causa como sujeita a tributação em sede de IRS.
IV. O simples depósito de cheques na conta bancária do recorrido não é de molde a concluir que estamos perante um rendimento derivado da simples aplicação de capitais [alínea p) do n.º2 do artigo 5º do CIRS].
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

I. RELATÓRIO
A FAZENDA PÚBLICA, não se conformando com a sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, na parte em que a mesma, lhe foi desfavorável, na impugnação judicial deduzida por VICTOR ....., contra a liquidação adicional de IRS nº 2005 ....., relativa ao ano de 2001, dela vem interpor recurso para este Tribunal Central Administrativo.

Nas alegações que apresentou a recorrente formulou as seguintes conclusões: (Por facilidade de exposição, as notas de rodapé serão transcritas no próprio texto, entre parêntesis rectos.):
«I - As liquidações ora impugnadas resultam da acção de inspecção externa no âmbito da averiguação requerida pela DCICCEF da PJ na sequência de diversos depósitos verificados nas contas bancárias pessoais do impugnante, durante o ano de 2001 revelando a sua real capacidade contributiva cujo rendimento apurado em sede procedimento inspectivo, foi casuisticamente considerado, como “Rendimentos da categoria E- Adiantamento por conta de lucros”, por força da alínea h), do n.º 2 do art.º 5º do CIRS e “Rendimentos da categoria E - Outros rendimentos derivados da aplicação de capitais”, nos termos do n.º 1 e al. p) do n.º 2 do art.º 5º do CIRS.
II - Está em causa a real capacidade contributiva revelada pela ora impugnante cujo conceito a Constituição vem dar um sentido próprio, criando um princípio aplicável à decisão normativa sobre a selecção dos factos tributários: estes deverão ser constituídos por aquelas circunstâncias da vida que revelam a maior ou menor capacidade contributiva de um qualquer sujeito jurídico. Conforme se refere J.L. Saldanha Sanches in Manual de Direito Fiscal, 3ª edição, Coimbra, a págs.229: O princípio da capacidade contributiva revela-se assim como um princípio ordenador jurídico tributário, visando, a diminuição das desigualdades – (artº nº.1 da Constituição da República Portuguesa (CRP),) havendo assim que se considerar como «…rendimento todo o fluxo patrimonial que se entenda revelar adequadamente a capacidade de pagar impostos do seu receptor.» – J.G. Xavier de Basto in IRS: Incidência real e determinação dos rendimentos líquidos – Coimbra Editora, 2007, a págs.40;
III - No âmbito do procedimento inspectivo apenas foram considerados elegíveis como rendimento, e consequentemente tributados, as resultantes do confronto entre os movimentos/lançamentos financeiros a crédito e os movimentos/lançamentos financeiros a débito, apurados relativamente a cada contraparte e/ou entradas (avultadas);
IV - Foram analisadas todas as contas bancárias sob a jurisdição do Banco de Portugal e por este comunicadas, na sequência da derrogação do sigilo bancário e efectuadas diversas notificações via Fax e por carta registada com aviso de recepção, enviadas às entidades bancárias Banco ……, Banco ….. e Banco ….. (cf. ponto 3.2.4 do capítulo II do Relatório de Inspecção e demonstrado nos documentos anexos ao mesmo, e também, nos respectivos Papéis de Trabalho do Processo de Inspecção Tributária) foram realizadas acções de circularização para recolha e cruzamento de informação relativamente aos registos contabilísticos nas subcontas da conta 25-Sócios (Accionistas) do Plano Oficial de Contabilidade (POC) nas várias empresas participadas pelo ora impugnante.
V - Foi consultada e recolhida informação e documentos respeitantes aos diversos procedimentos inspectivos realizados às empresas participadas pelo ora impugnante (conforme consta do ponto 3.2.1 do capítulo II do Relatório) analisadas informações referentes a várias entidades que durante 2001 lhe efectuaram pagamentos e que este depositou na sua conta bancária particular com vista ao esclarecimento preciso das operações económicas realizadas subjacentes aos movimentos financeiros em causa;
VI - Ficou evidenciada a regular e excessiva utilização em quase todas as empresas fiscalizadas, da conta 25 do POC respeitante a Suprimentos de Sócios, o que contraria a função e natureza desta conta cuja utilização tem de ser criteriosa devendo os movimentos nela efectuados ter um carácter ocasional de acordo com os artºs. 243º a 245º do CSC, tendo ficado ainda demonstrado não oferecerem credibilidade os procedimentos em que assentaram os registos contabilísticos das disponibilidades das referidas empresas não identificando os valores pagos, incluindo os pagos com recursos financeiros de terceiros, os meios financeiros das empresas, a identificação desses terceiros, os recebimentos relacionados com os reais proveitos obtidos por aquelas.
VII - “ Ora a lei fiscal fixa, como vimos, certas formalidades contabilísticas que os contribuintes têm que cumprir: a contabilidade tem de estar organizada de certa maneira, tem de reflectir a verdade dos negócios do contribuinte, tem de ser clara. “ Ac STA. 6 de Outubro de 1999, Rec. nº.23817. Contudo tal como tinha já sido constatado em sede de inspecção também em sede de audiência de inquirição de testemunhas ficou provada a efectiva mistura dos patrimónios financeiros das empresas em que o ora impugnante participa como accionista, sócio, gerente, administrador e/ou representante – e, a total ausência de demarcação entre, a actividade pessoal e a esfera patrimonial particular do ora impugnante e, a actividade e esfera patrimonial das empresas de que é sócio, gerente ou administrador.
VIII - Foi efectuada notificação ao ora impugnante, com carta registada e aviso de recepção tendente ao esclarecimento e comprovação dos diversos fluxos financeiros na sua conta bancária particular no Banco ....... Contudo, não foi obtida resposta (cf ponto 3.2.5 do capítulo II do R.I.Contudo, não foi possível obter junto do ora impugnante informação e justificação relativa às transferências e a depósitos reais e efectivos verificados na sua conta bancária particular no Banco ......, por falta de resposta à notificação que lhe foi efectuada, e pelo não exercício de direito de audição prévia.
IX - Ficou patente a falta de colaboração do ora impugnante tanto durante toda a acção inspectiva, como em sede de impugnação, violando o princípio da colaboração a que está vinculado ao abrigo do art. 59° da LGT, traduzido frequentemente em referir elementos incongruentes, sem apresentar a correspondente e necessária prova da alegada inexistência dos factos tributários apurados em sede de Inspecção, quiçá, com o intuito de limitar e condicionar a comprovação da sua ocorrência.
X - E se essa reiterada atitude do ora impugnante, de falta de colaboração põe em crise o principio da boa fé e da verdade declarativa conduz também à inversão do ónus da prova tal como resulta das alíneas a) e b) do nº.2 do artº.75º da LGT e nº.2 do artº.344º do Código Civil; «A inércia probatória do contribuinte impede o funcionamento do disposto no art.º 121.º do CPT quanto à dúvida fundada sobre a existência e quantificação do facto tributário»; Ac. STA de 04/12/2001 (Procº. nº.5 611/01) e ainda: «A dúvida que implica a anulação do acto impugnado não pode considerar-se fundada, se assentar na ausência ou na inércia probatória das partes, sobretudo do impugnante. Este não deve limitar-se a alegar factos que ponham em dúvida a existência e quantificação do facto tributário. Cabe-lhe o ónus da prova de tais factos, sem embargo do juiz, no âmbito do seu poder-dever inquisitório, diligenciar também comprová-los. Só mediante a prova concludente de tais factos é que é possível concluir-se pelo fundamento daquela dúvida.» (sublinhado nosso); Ac. STA de 14/01/2004 (Procº. Nº.1480/03).
XI - Incumbe à AT o ónus da prova da verificação dos requisitos legais das decisões positivas e desfavoráveis ao destinatário, como sejam a existência do facto tributário e a sua quantificação. Ficaram provados os recebimentos, demonstrada a quantificação, qualificados como rendimentos da categoria E. Contudo, na esteira do entendimento defendido pelo douto Ac. de 25/10/2005, do TCA do Sul (Procº. nº. 0544/03) competia, ao ora impugnante, não só alegar mas também provar factos que pudessem por em dúvida (fundada) os pressupostos em que assentou o juízo feito pela AT para prova da existência do facto tributário ou da sua quantificação; determinando-se a inversão do ónus probatório quando a parte contrária tiver culposamente tornado impossível a prova do onerado (nº.2 do artº.344º do C. Civil).
XII - Cabia, pois, ao impugnante a comprovação das justificações que deu quando instado a explicar as entradas monetárias, situações que se questionam no âmbito da sua situação tributária, porquanto estas configuram agora factos positivos alegados, pelo impugnante; Não logrando provar factos susceptíveis de pôr em dúvida a existência e quantificação do facto tributário não poderá, pois, haver lugar à anulação da liquidação impugnada, não tendo ficado demonstrado que os montantes recebidos na conta bancária particular do impugnante constituíam efectivamente reembolsos de suprimentos e que se encontravam contabilizados nas empresas participadas.
XII - Obtidos constituem vantagens patrimoniais decorrentes das suas participações financeiras no universo de empresas em que participa como accionista, sócio, administrador, gerente ou representante em que os respectivos patrimónios financeiros se misturam como se de um único património se tratasse: - O do impugnante obtendo a rentabilidade das sinergias que, do todo podem advir, fazendo reverter habitualmente os ganhos daí advindos para a sua esfera pessoal, (incorporando inclusive aqueles que constituem proveitos concretos das referidas empresas, por omissão de contabilização e a concomitante incorporação dos fluxos financeiros correspondentes nas suas contas bancárias pessoais), expressando, desta forma, a real natureza dos rendimentos que afluíram às suas contas bancárias como de rendimentos de capitais, conforme se encontram tipificados no artigo 5º do CIRS.
XIV - Assim, a AT ao tributar como rendimentos de capitais essas vantagens económicas auferidas e patenteadas que evidenciam, indubitavelmente o brotar de frutos e vantagens económico financeiras que outrora não existiam na esfera pessoal do impugnante mais não fez que obedecer ao comando legal que a vincula a tributar, atendendo à situação particular de cada caso, segundo o conceito do rendimento-acréscimo, tendo em conta o principio da igualdade fiscal, que, por sua vez, contempla o principio da generalidade dos impostos, de que todos os contribuintes, sem excepção, estão sujeitos a tributação, respeitando o principio da capacidade contributiva.
XV - “É neste contexto, que se refere que podem existir situações que, por exigências do principio da igualdade e do respeito pelos direitos fundamentais, impõem o afastamento das soluções legais estandartizadas mediante os tipos elaborados pelo legislador, à partida, formalmente igualitárias. De facto, quando a aplicação dos tipos legais previstos, por meio da técnica de simplificação, conduzir a clamorosas situações de injustiça material, torna-se necessário conceder à Administração a dispensa da sua observância conferindo-lhe antes a possibilidade de proceder segundo a regra da diferenciação que foi apartada pela tipificação.” – in J. Casalta Nabais, O Dever Fundamental de Pagar Impostos: contributo para a compreensão constitucional do estado fiscal contemporâneo, Almedina, Coimbra, 1998, pag. 376.
XVI - É a Constituição que determina como principio ordenador do ordenamento jurídico tributário o princípio da capacidade contributiva, criando um princípio aplicável à decisão normativa sobre a selecção dos factos tributários que deverão ser constituídos por aquelas circunstâncias da vida que revelam a maior ou menor capacidade contributiva de um qualquer sujeito jurídico e considerando como rendimento todo o fluxo patrimonial que se entenda revelar adequadamente a capacidade de pagar impostos do seu receptor. Ver ” J.L. Saldanha Sanches in Manual de Direito Fiscal 3º edição Coimbra – e J.G. Xavier de Basto in IRS: Incidência real e determinação dos rendimentos líquidos – Coimbra Editora, 2007.
XVII - O nº.1 do artº.5º do CIRS, dispõe que: “Consideram-se rendimentos de capitais os frutos e demais vantagens económicas, qualquer que seja a sua natureza ou denominação, sejam pecuniários ou em espécie, procedentes, directa ou indirectamente, de elementos patrimoniais, bens, direitos ou situações jurídicas, de natureza mobiliária, bem como da respectiva modificação, transmissão ou cessação, com excepção dos ganhos e outros rendimentos tributados noutras categorias.” definindo o nº 2 através de um elenco a titulo meramente exemplificativo o que são “os frutos e vantagens económicas”, sem que se vislumbre qualquer condição limitativa.
XVIII - Quanto à natureza mobiliária dos activos patrimoniais implicados nos rendimentos da categoria E tendo em conta o conceito de rendimentos de capitais constante do nº 1 do artº 5º, o legislador limita-se a excepcionar do seu âmbito os ganhos e outros rendimentos tributados noutras categorias, registando contudo um ligeiro desvio da tipologia, acrescentando a alínea p) de contornos residuais que se destina a definir a incidência e a tributar, em nome de uma maior equidade tributária, qualquer vantagem financeira enquadrável como rendimento de capitais, fechando a porta a qualquer forma ou tentativa de evasão fiscal que possa pôr em causa os princípios constitucionais em que assenta a tributação. Neste sentido José Guilherme Xavier de Basto in IRS Incidência Real e Determinação dos Rendimentos Líquidos Coimbra Ed. Pag. 229 ss.
XIX - Assim, tendo em consideração o que foi dito, reportemo-nos, pois, aos pontos da douta sentença, com os quais a Fazenda Pública não pode concordar:
I) Alínea a) do ponto 3 na pág.21 (também referidas nas alíneas a) e b) do ponto 15 na pág.32 e itens (I) e (II) da alínea e) contida na alínea E) dos Factos Provados)
Pela análise da conta bancária particular titulada pelo Sr. Vítor ..... no Banco ...... com o nº...... ficou patente que os montantes a que respeitam os dois cheques nos valores de Esc.:2.424$00 (€12,09) cada e um outro cheque de Esc.:2.358$00 (€11,76), do Sr. Fernando ....., e ainda um cheque no valor de Esc.:60.000$00 (€299,28) do Sr. António ....., aqui em causa afluíram efectivamente à sua esfera patrimonial através do depósito nessa mesma conta, tendo assim gerado um incremento no património financeiro do ora impugnante, traduzindo-se de facto numa vantagem económica, que até então, o contribuinte não dispunha, mas com a qual pode passar a contar desde então, e tendo-se verificado que as referidas verbas não resultaram de outros rendimentos auferidos pelo ora impugnante em sede de outras categorias de IRS nem resultam da devolução de suprimentos das empresas por esse participadas, encontram-se assim, sujeitas a tributação em sede de categoria E de IRS, por força do disposto no nº.1 do artº.5º do CIRS, designadamente, atendendo à previsão da norma contida na alínea p) do nº.2 do mesmo artigo.
Contrariamente ao afirmado na douta Sentença, a Fazenda Pública referiu-se a estas verbas no parágrafo 54º das suas alegações, a que acresce o facto do impugnante não ter contestado a correcção dessas verbas na sua P.I., e assim ter aceite as mesmas, pelo que, ao anular as referidas correcções, a douta Sentença padece do vício de excesso de pronúncia.
II) Alínea b) do ponto 3 na pág.21 (também referidas nas alíneas o), p) e q) do ponto 15 nas págs.36 e 37 e item (I) da alínea h) contida na alínea E) dos Factos Provados)
Os montantes Respeitante ao cheque nº...... emitido s/Banco pela 1ªConservatória do Registo Comercial de Lisboa (Esc.:6.831$00) emitido à ordem da empresa ‘Augusto .....’ tendo depois sido endossado ao ora impugnante pelo seu filho – o Sr. Artur ....., depositado na conta bancária particular titulada pelo ora impugnante no Banco ...... com o nº....., afluiram efectivamente à esfera patrimonial do ora impugnante através do depósito nessa mesma conta, tendo assim gerado um incremento no seu património, traduzindo-se igualmente tal como na anterior alínea numa vantagem económica, de que não dispunha não resultante de outros rendimentos de outras categorias de IRS nem da devolução de suprimentos das empresas por esse participadas, encontram-se assim, tributáveis em sede de categoria E de IRS, por força do disposto no nº.1 do artº.5º do CIRS, nos termos da alínea p) do nº.2 do mesmo artigo.
Apesar do afirmado na douta Sentença, a Fazenda Pública referiu-se a esta correcção também no parágrafo 54º das suas alegações.
III) Alínea c) do ponto 3 na pág.21 (também referida na alínea j) do ponto 14 na pág.32 e na alínea r) do ponto 15 na pág.37 e alínea j) contida na alínea E) dos Factos Provados)
Ficou patente nos autos, que o montante respeitante aos depósitos em numerário efectuados na conta bancária particular titulada pelo ora impugnante no Banco ...... com o nº..... (vide anexo-C e quadro-I na pág.12 do anexo-E, juntos ao Relatório de Inspecção), no valor total de Esc.:180.600.000$00 (€900.829,00) afluiu efectivamente à esfera patrimonial do ora impugnante não resultando de saídas por débitos de outras contas bancárias tituladas pelo contribuinte, nem de outros rendimentos por ele auferidos em sede de outras categorias de IRS [Note-se que, por decisão judicial, a Administração Fiscal teve autorização para consultar e analisar a informação conexa com todas as contas bancárias tituladas pelo impugnante sob a jurisdição do Banco de Portugal - vide anexos A a O integrados no Anexo-1 do Relatório de Inspecção], o que denota, que, no momento em que as recebeu e as mesmas passaram a integrar o seu património financeiro, constituíram para si uma vantagem patrimonial que até então, o contribuinte não dispunha, mas com a qual pôde passar a contar desde então. De salientar que, vários talões de depósito continham mesmo a descrição «Resultante da transferência de fundos».
Ainda e, contrariamente ao afirmado na alínea r) do ponto 15 na pág.37 da douta Sentença, o depositante destes montantes em numerário é o próprio impugnante e está perfeitamente identificado, quer no texto do próprio Relatório de Inspecção (no segundo parágrafo do capítulo III, pág.15/25), quer nos respectivos documentos bancários anexos ao Relatório de Inspecção – pela assinatura aposta nos talões de depósito correspondentes (conforme constam do Anexo-2 ao Relatório).
Assim, e conforme já anteriormente foi referido, dado o carácter investidor do impugnante, participante do capital social de muitas empresas – já antes mencionadas ao longo do Relatório de Inspecção e da Informação Administrativa anexa à Contestação da Fazenda – não se lhe conhecendo outra actividade, e não tendo origem, tais verbas em outros rendimentos enquadráveis em sede de outras categorias de IRS, nem de na devolução de suprimentos das empresas participadas pelo ora impugnante, as quantias que assim, afluíram ao património financeiro do impugnante, são tributáveis em sede de categoria E de IRS, por força do disposto no nº.1 do artº.5º do CIRS, designadamente, atendendo à previsão da norma contida na alínea p) do nº.2 do mesmo artigo.
Ao invés do que é afirmado na douta Sentença, a Fazenda Pública pronunciou-se efectivamente sobre esses depósitos em numerário, quer na Informação Administrativa anexa à Contestação da Fazenda – na alínea a) do ponto 2 e respectiva nota de rodapé nº.3 (na pág.2), na alínea i) do ponto 61 e respectiva nota de rodapé nº.13 (na pág.12) e ponto 176 (a págs.27 e 28) – quer no primeiro ponto do parágrafo 54º nas alegações.
Acresce ainda o facto do ora impugnante não ter contestado a correcção desses montantes na sua P.I., e assim ter aceite a tributação das mesmas, pelo que, a anulação das referidas correcções pela douta Sentença constitui vício de excesso de pronúncia.
IV) Alínea a) e b) do ponto 15 na pág.32 e itens (I) e (II) da alínea g) contida na alínea E) dos Factos Provados)
Quanto aos cheques nº...... s/Banco e nº...... s/ Banco, nos valores respectivos de Esc.:10.000.000$00 (€49.879,79) e de Esc.:7.000.000$00 (€34.915,85) é de referir que, não obstante todas as diligências encetadas pela Inspecção Tributária, a instituição bancária que não apresentou em tempo útil todos os elementos sobre estes depósitos e o impugnante apesar de instado colaborar, também não o fez, nem em Direito de audição que não exerceu, nem posteriormente em sede de Impugnação, não veio apresentar quaisquer elementos comprovativos que permitissem afastar a tributação daquelas entradas no património financeiro do contribuinte.
O cheque nº...... de Esc.:7.000.000$00 (€34.915,85) s/ Banco tem apenso um documento bancário com a descrição «Transferências correntes Privadas».
Com efeito, da análise da conta bancária particular titulada pelo ora impugnante no Banco ...... com o nº......, verificou-se que os montantes aqui em causa afluíram à sua esfera patrimonial, através do depósito nessa mesma conta, tendo incrementado o património financeiro do impugnante e traduzindo-se de facto, numa vantagem económica não resultante de outros rendimentos auferidos em sede de outras categorias de IRS nem resultante da devolução de suprimentos das empresas por esse participadas, encontrando-se assim, sujeitos a tributação em sede de categoria-E de IRS, por força do disposto no nº.1 do artº.5º do CIRS, em vista do previsto pela alínea p) do nº.2 do mesmo artigo.
De referir ainda que, esta correcção em nada diverge da efectuada sobre os depósitos em numerário e que impugnante não contestou tendo aceite a respectiva tributação como rendimento enquadrável na cat.-E de IRS.
V) Alíneas a) e b) do ponto 15 na pág.32 e alínea a) do nº.2 da ‘Fundamentação da AF’, também referida nos itens (I) e (II) da alínea c) contida na alínea E) dos Factos Provados)
Ficou patente nos autos que os montantes aqui em causa afluíram efectivamente à esfera patrimonial do impugnante através do depósito na conta bancária de dois cheques emitidos por Roger ..... e André ....., nos valores de Esc.:1.132.500$00 (€5.648,89) e de Esc.:200.000$00 (€997,60) na conta particular titulada pelo impugnante no Banco ...... com o nº....... não se tendo identificado quaisquer movimentos por fluxos financeiros contrários (débitos por cheques emitidos pelo impugnante ou suas ordens de transferência para Roger ..... e André .....) em momentos anteriores, de montantes equivalentes aos aqui em causa já que fora alegado que estes cheques se referiam a meras devoluções de empréstimos. Limitando-se a alegar sem nada comprovar, não logra criar dúvida fundada sobre existência e quantificação do facto tributário.
VI) Alíneas c) e d) do ponto 15 a págs.32 e 33, também descrita na alínea f) contida na alínea E) dos Factos Provados e na alínea c) do nº.2 da ‘Fundamentação da AF’ e também referida na alínea c) do ponto 14 na pág.30)
Através do depósito na sua conta bancária particular no Banco ...... com o nº....., o montante respeitante ao cheque nº...... s/Banco ….., no valor de Esc.:225.250.000$00 (€1.123.542,26) emitido pela empresa ‘..... – Sociedade Imobiliária, Lda. afluiu efectivamente à esfera patrimonial do ora impugnante, tendo assim contribuído para um incremento no património financeiro do impugnante, não tendo a mesma resultado de saídas por débitos de outras contas bancárias tituladas pelo ora impugnante, nem de outros rendimentos por ele auferidos em sede de outras categorias de IRS.
O impugnante alegara ter recebido tal importância em resultado de uma venda de acções (em regime de exclusão de tributação) de uma sociedade que identifica pelo nome de ‘N..... LIMITED’ sustentando essa afirmação apenas com uma declaração por si emitida em simples papel branco, na qual afirma que “Eu, Vitor ....., declaro ter recebido da firma ..... – Investimentos Imobiliários, L.da, a quantia de €1.123.542,26, para pagamento da venda de acções da sociedade N..... LIMITED, com sede na ..... e constituída em 04-11-87” (doc.19), não tendo fornecido qualquer documento com forma legal e elementos externos que lhe pudessem conferir força probatória.
O impugnante invocou o regime de exclusão de tributação pela venda de acções, sem ter identificado o número de acções em causa, a data da transmissão, e o valor porque as teria adquirido. Consultada a Declaração Anual de Informação Contabilística e Fiscal da sociedade “.....” referente ao exercício de 2001, verificou-se que não contém quaisquer registos de aquisição de acções (os campos de investimentos financeiros e títulos negociáveis estão a zeros) nem da respectiva venda no exercício em apreço, ao que acresce o facto do o próprio impugnante não ter mencionado na sua declaração de rendimentos entregue relativamente ao ano de 2001[Não preencheu o anexo G.], qualquer alienação onerosa de partes sociais e outros valores mobiliários (conf. previsão do art. 10º, nº a, al. b) do CIRS).
A obtenção de qualquer tipo de colaboração por parte das mencionadas sociedades foi completamente impossível, por um lado porque a aludida empresa a que alegadamente pertencem as referidas acções tem sede na ....., e, por outro lado, não existir ao tempo da inspecção qualquer número de contacto registado em nome da ..... [Mesmo o número de telefone constante do cadastro do nosso sistema informático estava atribuído a uma sociedade de advogados, com morada diferente da constante do sistema informático]
Mesmo em sede de audição de testemunhas, a testemunha Sr. António ..... – reiterou o que já havia sido alegado, tendo explicado que não teriam reunido ao tempo a documentação necessária para juntar à P.I., mas que lhe tinham conseguido obter uma declaração ajuramentada de um advogado que, alegadamente, teria trabalhado na época para o Banco ...... e tratado da documentação da criação da empresa ‘M..... Limited’, tendo, ainda observado a documentação referente aos termos e condições de venda das referidas acções [Com o devido respeito, uma declaração ajuramentada, não é um contrato em que intervém várias partes, e onde se encontram elencadas todas as condições a cumprir pelos intervenientes nem tem subjacente a intervenção de um organismo externo que confirme pagamentos e/ou outras obrigações decorrentes do mesmo.] . Contudo essa documentação respeitante aos termos e condições da alegada venda das referidas acções a mesma não foi junta aos autos. Não pode a Fazenda Pública concordar com o sentido da decisão da douta Sentença nem com o enquadramento que a mesma defende, uma vez que mais uma vez resultou provado que o depósito em apreço constitui uma vantagem económica enquadrável na alínea p) do nº.2 do artº.5º do CIRS.
VII) Alíneas e), f) e g) do ponto 15 a págs.33 e 34, também referida nos itens (I), (II) e (II) da alínea d) contida na alínea E) dos Factos Provados)
Ora sucedeu que, da análise à documentação bancária recolhida, verificou-se que os montantes respeitante aos cheques nos valores de Esc.:20.000.000$00 (€99.759,58) emitido por José ....., de Esc.:13.000.000$00 (€64.843,73) emitido por Isabel ..... e de Esc.:10.000.000$00 (€49.879,79) emitido por António ..... afluíram efectivamente à esfera patrimonial do ora impugnante, através do depósito na sua conta bancária particular no Banco ...... com o nº....., tendo assim contribuído para um incremento no património financeiro do impugnante e traduzindo-se em vantagens económicas para si tributáveis em sede de categoria E de IRS, por força do disposto no nº.1 do artº.5º do CIRS, nos termos da al p) do nº.2 do mesmo artigo tendo ficado patente nos autos que as mesmas não resultaram de outros rendimentos por ele auferidos em sede de outras categorias de IRS [Note-se que, por decisão judicial, a Administração Fiscal teve autorização para consultar e analisar a informação conexa com todas as contas bancárias tituladas pelo impugnante sob a jurisdição do Banco de Portugal - conforme anexos A a O integrados no Anexo-1 do Relatório de Inspecção
] e tão pouco foi identificada qualquer co-relação com as sociedades participadas pelo sujeito passivo.
É imperioso referir que para se estar perante a devolução de suprimentos (fluxo de saída na esfera patrimonial das empresas) é necessário que estes montantes tivessem sido registados na contabilidade das correspondentes sociedades e sustentados através de documentos de suporte idóneos. Porém, o impugnante não identificou a(s) sociedade(s) a que alegadamente respeitariam os invocados suprimentos, não cumprindo, assim, o disposto no artº.74º da LGT.
VIII) Alíneas h) e i) do ponto 15 na pág.34, também referida no item (IV) da alínea d) contida na alínea E) dos Factos Provados e alínea f) do nº.2 da Fundamentação da AF’ na pág.20
A documentação bancária recolhida permitiu apurar que o montante respeitante ao cheque de Esc.:2.120.000$00 (€10.574,52) emitido pelo Sr. Carlos ..... entrou efectivamente na esfera patrimonial do ora impugnante, através do depósito na sua conta bancária particular no Banco ...... com o nº....., incrementando o seu património financeiro constituindo uma vantagem económica tributável em sede de categoria E de IRS, conforme estipulado no nº.1 do artº.5º do CIRS e alínea p) do nº.2 do mesmo artigo.
O impugnante não identificou a natureza das relações estabelecidas entre si e o Sr. Carlos ..... de que terão resultado os recebimentos e pagamentos na conta do impugnante, não tendo sido aferido qualquer elemento de conexão entre os mesmos.
Face ao historial conhecido entre o ora impugnante e o Sr. ..... desde o exercício de 1998 até 2001 (constatadas no âmbito das acções inspectivas realizadas ao impugnante), pode-se afirmar que, contrariamente ao que este quer fazer crer, durante o ano de 1999 e até Junho de 2000 não existiu qualquer relação de natureza financeira entre os dois.
Relativamente aos exercícios não fiscalizados pela AT não juntou o impugnante qualquer elemento. Contudo, é de notar que no ponto 160º da P.I. o impugnante refere-se à diferença positiva entre depósitos e recebimentos na sua conta pessoal declarando que «…deve entender-se que...não é susceptível de constituir a devolução de valores anteriormente entregues.».
No que concerne aos anos de 1998 e 2000 foram as mesmas apreciadas nos respectivos processos de impugnação judicial dos anos correspondentes, não cabendo por isso qualquer decisão no âmbito do presente processo, porque até o erro de quantificação invocado pelo impugnante no ponto 164º da sua P.I. foi atendido no âmbito do processo administrativo de impugnação judicial interposto sobre o IRS/2000 (n/ nº 081/05-ECA), dado o mesmo respeitar a valores do ano 2000, relacionados com uma transferência a favor do Sr. Carlos ....., em 08/11/2000, no montante de Esc.:4.457.088$00, o que, mais uma vez, denota a cautela e o respeito pelo princípio da verdade material observados por parte da AT.
Não pode, pois, a Fazenda Pública concordar com a conclusão da Douta Sentença, no que concerne a este depósito.
IX) Alínea j), k) e l) [Aquela que surge indicada primeiro na pág.35 da Sentença, visto que nessa mesma página são indicadas, certamente por lapso, duas alíneas com a letra “l”][Aquela que surge indicada primeiro na pág.35 da Sentença, visto que nessa mesma página são indicadas, certamente por lapso, duas alíneas com a letra “] do ponto 15 a págs.34 e 35, também referida no item (II) da alínea h) contida na alínea E) dos Factos Provados e alínea g) do nº.2 da Fundamentação da AF’ na pág.20
Relativamente ao cheque nº...... no valor de Esc.:100.000.000$00 (€498.797,90) emitido em 14/03/2001 pelo Sr. Ricardo ..... à ordem da empresa ‘..... – Sociedade de Investimentos Dominiais, S.A.’[Apesar do impugnante contestar o valor de €997.628,47/ 200.006.831$00 (ponto 170º da P.I.), a correcção efectuada pela AF apenas foi de €498.831,97/ 100.006.831$00 (vide pág.19/25 do Relatório de Inspecção); Para além deste montante foi indicado no relatório de fiscalização outro cheque no valor de €498.797,90 (100.000.000$00), identificado como cheque nº ..... s/ conta nº ..... do Banco ...... de Leiria, emitido por Jacob ..... à ordem de Mário ..... que o endossou para depósito na conta do impugnante. Todavia, o mesmo não foi corrigido pela Inspecção Tributária (parcela abatida no 3º apuramento) – fls.164, 173 e 176.] , importa desde já salientar que o capital social da empresa ‘.....’ é detido exclusivamente pelas empresas ‘....., S.A.’ e ‘..... – Administração de Propriedades, S.A.’, O ora impugnante não é accionista da ‘.....’, está-se pois, perante pessoas distintas com personalidades jurídicas distintas. Mais até 30/Nov/2001, o ora impugnante não tinha direitos de crédito s/ a ‘.....’, pois o pagamento deste montante ao Sr. Vítor ..... não consta dos registos contabilísticos da ‘.....’ (conforme Relatório de Inspecção (a págs.19/25 e anexo-E -pág.4 do 1º apuramento).
Através do depósito do referido cheque na sua conta bancária particular no Banco ...... com o nº....., o correspondente montante afluiu efectivamente à esfera patrimonial do ora impugnante, tendo assim contribuído para um incremento no património financeiro deste, traduzindo-se também numa vantagem económica para o mesmo e que até então, não dispunha mas com a qual pôde passar a contar, tendo também ficado patente nos autos que a importância em causa não resultou de outros rendimentos auferidos pelo ora impugnante em sede de outras categorias de IRS nem da devolução de suprimentos das empresas por esse participadas, e tanto mais que a empresa ora referenciada tão pouco era ao tempo, participada pelo ora impugnante.
Face ao verificado e que aqui se descreve, a afluência daquele montante ao património financeiro do impugnante, consubstanciado através do respectivo depósito na sua conta bancária particular, constitui rendimento tributável em sede de categoria E de IRS, por força do disposto no nº.1 do artº.5º do CIRS e alínea p) do nº.2 do mesmo artigo.
A douta Sentença defende que a fundamentação invocada pela AT é inadequada, por admitir que a operação em apreço é susceptível de traduzir transferências sem contrapartidas de partes dos patrimónios das sociedades detidas pelo impugnante, considerando-a subsumível às regras de incidência contidas na alínea h) do nº.2 do artº.5º do CIRS, e não, à alínea p) do mesmo número e artigo.
Porém, verificou-se que uma vez mais, o ora impugnante limitou-se a invocar a devolução de suprimentos para justificar o depósitos na sua conta particular, apesar do cheque aqui em crise e respectivo valor não constam de quaisquer registos contabilísticos da ‘.....’ e o impugnante não ser accionista dessa empresa.
Acresce ainda, que se o referido cheque correspondesse à devolução de suprimentos pela empresa ‘.....’, o mesmo teria sido emitido à ordem de uma das sociedades suas accionistas - ‘....., S.A.’ e ‘..... - Administração de Propriedades, S.A.’, ou pelo menos, entregue àquelas e nunca ao ora impugnante.
Se ao cheque aqui em causa tivesse subjacente uma operação de adiantamento por conta de lucros da ‘.....’ às empresas accionistas, a empresa beneficiária do adiantamento, teria direito ao Crédito de Imposto relativo à dupla tributação económica de lucros distribuídos que ao tempo estava previsto no artº.84º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC) aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-B/88 de 30 de Novembro, com as alterações subsequentes – actualmente contemplado no artº.51º do CIRC). Já em sede de IRS, à distribuição ou adiantamento de lucros às pessoas singulares, estava previsto o direito ao Crédito de imposto nos termos do artº.80º e nº.6 do CIRS.
X) Alínea l), m) e n) do ponto 15 a págs.35 e 36, também referida nas alíneas b) e i) contidas na alínea E) dos Factos Provados e alíneas h) e i) do nº.2 do anterior número 2 da Fundamentação da AF’ na pág.20
Relativamente ao cheque no valor de Esc.:1.000.000$00 (€4.987,98) [O impugnante não se pronunciou sobre este cheque nem explicou a que titulo o sr. Evaristo ..... intervém na conta do sr. S....., bem como das eventuais ligações com o sr. Vitor ......] emitido s/ a conta do Sr. S..... mas assinado por Evaristo ....., e ainda ao valor de Esc.:5.238.662.758$00 (€26.130.339,67) referente ao saldo resultante dos movimentos bancários durante todo o ano 2001, registados a débito da conta bancária (nº.....) do impugnante no Banco ...... por transferências para a conta bancária (nº......) do Sr. S..... no valor de Esc.: 300.000.000$00 (€1.496.393,69), e, dos movimentos bancários registados a crédito da mesma conta bancária do impugnante no Banco ...... por transferências provenientes da referida conta bancária do Sr. S..... no valor de Esc.: 5.538.662.758$00 (€27.626733,36) – conforme anexo-F e página 12 do anexo-E, juntos ao Relatório de Inspecção), tudo no total de €26.135.327,67 (Esc.:5.239.662.758$00).
Pela análise da documentação bancária recolhida, ficou patente, nos autos que, os referidos montantes afluíram efectivamente à esfera patrimonial do ora impugnante, através do depósito na sua conta bancária particular no Banco ...... com o nº....., tendo ficado patente nos autos que as mesmas não resultaram de outros rendimentos por ele auferidos em sede de outras categorias de IRS [Note-se que, por decisão judicial, a Administração Fiscal teve autorização para consultar e analisar a informação conexa com todas as contas bancárias tituladas pelo impugnante sob a jurisdição do Banco de Portugal - conforme anexos A a O integrados no Anexo-1 do Relatório de Inspecção] e tão pouco foi identificada qualquer co-relação com as sociedades participadas pelo sujeito passivo.
Acresce que, além da notificação efectuada e não respondida durante o Procedimento de Inspecção, o contribuinte nem sequer exerceu o Direito de Audição do Projecto de Conclusões de Relatório, não obstante o contribuinte ter acusado a sua recepção e no texto do mesmo se ter chamado a sua especial atenção para apresentar os esclarecimentos acerca da natureza e proveniência das quantias em causa. Incorreu assim, o ora impugnante na violação do dever de cooperação e impossibilitado à Administração Fiscal a obtenção de outra prova além da constante nos autos (a este respeito, atenda-se ao disposto nas alíneas a) e b) do nº.2 do artº.75º da LGT e nº.2 do artº.344º do Código Civil). À Administração Tributária cabe-lhe comprovar a existência e quantificação do rendimento e isso foi feito.
Posteriormente, já em sede de impugnação, relativamente à correcção tributária no valor de Esc.:5.238.662.758$00 (€26.130.339,67), o impugnante justificou aqueles movimentos bancários com base na relação de amizade com o Sr. S....., residente há muito tempo no Brasil, tendo em vista concorrer à privatização da sociedade comercial que ao tempo explorava a rede de metropolitano e das barcas no Estado do ....., no Brasil. O ora impugnante e seus filhos (Artur e José .....) realizaram diversos depósitos nessa conta bancária de valores (liquidez) resultantes da alienação de diverso património imobiliário e mobiliário.
O impugnante veio referir a título exemplificativo, uma operação de venda de três prédios urbanos, propriedade da “..... – Áudio Visão Ibérica, SA”, à E..... pelo montante de 4.400.000.000$00, que após passagem pela conta particular do impugnante, foi a importância depositada na conta bancária do Sr. S...... No entanto, tal exemplo não tem correspondência na situação aqui em apreço, tanto mais que, o impugnante não refere um facto importante – que a AT se absteve de tributar esta importância na esfera do impugnante aquando do recebimento proveniente da ....., por se ter comprovado que o mesmo foi pago a título de reembolso de suprimentos anteriormente efectuados àquela sociedade.
Acresce que, do levantamento efectuado pela AT às relações existentes entre o impugnante e o Sr. S..... ao longo dos anos objecto de fiscalização, apurou-se que, desde 1998 [Ano em que se iniciou a análise inspectiva às contas bancárias do impugnante, e consequentemente do sr. S.....] até 2003, o saldo das entregas do impugnante ao Sr. S..... com, os recebimentos do ora impugnante provenientes do Sr. S....., reverte a favor do impugnante no valor total de € 43.500.723,83 e, que em momento algum o saldo acumulado se traduziu num débito na conta pessoal do impugnante [Vejam-se pontos 212. 1 a 212.3 da Informação anexa à Contestação da Fazenda Pública]
Importa aqui salientar que, se a AT atendesse a pretensão do impugnante de que para não apreciar estes movimentos no espartilho de cada ano económico (conforme ponto 199º da P.I.) a correcção tributária não seria de apenas €26.135.327,65 (5.239.662.758$00), mas ascenderia a €38.751.501,24 (7.768.978.471$00) [Referente aos anos de 1998, 1999, 2000 e 2001 (€ 2.111.586,42 + €20.641.958,38 - € 10.137.371,21 + € 26.135.327,65 = €38.751.501,24)]. Mais, se não tivesse em conta os fluxos do impugnante para o Sr. S..... as correcções teriam atingido o valor de € 92.065.324,23, o que denota a razoabilidade, prudência e respeito pelo princípio da legalidade, tidos em consideração pelos serviços da AT ao ter-se cingido à tributação dos movimentos bancários verificados apenas no ano de 2001 e ao saldo dos mesmos, verificados a débito e a crédito da conta bancária do impugnante.
Por outro lado, há a salientar a falta de sustentação das explicações apresentadas pelo ora impugnante, dado que este não apresentou qualquer documento que comprove a alegada intenção de investimento de negócios no Brasil, ou das eventuais diligências que por ventura poderia ter realizado ao longo do processo de concurso à aludida privatização da empresa brasileira [Note-se que um processo de privatização há que obedecer a requisitos específicos, pelo que facilmente o impugnante conseguiria efectuar prova da sua candidatura, quanto mais não fosse)].
O Impugnante nem sequer explicou, nem ficou provado em sede de audiência de inquirição de testemunhas, quais os moldes concretos em que alegadamente tencionaria intervir no aludido negócio, se a título pessoal ou mediante alguma das empresas de que é sócio, nem a relação negocial que mantinha com o Sr. S....., e tão pouco, a razão da invocada necessidade dos movimentos por si realizados, com vista à obtenção de um expressivo conjunto de meios financeiros visando o investimento no ....., integrarem a conta bancária do Sr. S..... (não residente), sediada num balcão em território nacional e de uma instituição bancária nacional (Banco ......), ao invés de terem sido mantidos em conta pessoal do ora impugnante, transferindo apenas as verbas em momento próximo da concretização do negócio para uma conta que nesse momento se justificaria criar para a pretensa entidade concorrente à aludida privatização.
O Sr. Dr. António ....., ao testemunhar em tribunal, referiu durante o seu depoimento que, o dinheiro ia para lá e vinha para cá, e que, 1996 foi o ano da abertura da conta bancária em nome do Sr. S....., num balcão do Banco ......, para mostrar movimentos bancários, onde o impugnante refere que foi depositando verbas suas. Acrescentou ainda esta testemunha que, foram 116 milhões para lá e vieram 118 milhões [Não tendo especificado se se referia a escudos ou euros] e que a diferença se devia provavelmente a resultados financeiros – porém, a análise feita pelos serviços da AT às contas bancárias do impugnante e dos movimentos com o Sr. S..... desde 1998 através da sua conta bancária no Banco ...... com o nº......, demonstra que as contas bancárias em causa estão sediadas no território nacional e inserem-se numa instituição bancária nacional – o Banco .......
Referiu a testemunha que, em 1996 e 1997 foi para lá muito mais dinheiro do que em qualquer dos outros anos, de acordo com o trabalho de análise que, alegadamente, terá feito. Contudo esse trabalho que eventualmente poderia vir a esclarecer alguns ou até todos os movimentos bancários efectuados não foi disponibilizado.
É incontornável o facto dos montantes envolvidos serem bastante avultados, aos quais se associa a dilação temporal invocada pelo impugnante para a concretização do alegado negócio.
Acresce ainda que, não colhe o alegado pelo impugnante, de que ele e os seus filhos utilizaram parte das verbas provenientes da conta do Sr. S....., em suprimentos efectuados à medida das necessidades das suas empresas, mas sem perder de vista a alegada operação de investimento no ....., Brasil (pontos 194º e 196º da P.I.), porquanto, no nosso sistema tributário, e para a situação em concreto, a tributação, ou não, do rendimento não depende do fim que lhe é dado pelo beneficiário.
Em suma, nem o impugnante nem as suas testemunhas lograram provar o que foi invocado em sede de impugnação.
Assim, face ao exposto, a Fazenda Pública não pode de forma alguma concordar com as conclusões da douta Sentença por esta ter desconsiderado como acréscimos patrimoniais, os montantes aqui em apreço e que afluíram à conta bancária do impugnante durante todo o ano de 2001, e, tanto mais que, a douta Sentença, não teve em conta os factos descritos no Relatório de Inspecção e confirmados pela Fazenda, quer na sua contestação, quer nas alegações apresentadas antes da decisão, pelo que, deverá manter-se a correcção tributária aqui em apreço (de €26.135.327,67 (Esc.:5.239.662.758$00) por força do disposto no nº.1 do artº.5º do CIRS e alínea p) do nº.2 do mesmo artigo.

Assim, face ao enquadramento legal expendido não pode, pois, a Fazenda Pública concordar com a douta decisão recorrida, que ao julgar parcialmente procedente a presente impugnação ignorou o regime decorrente das normas legais constantes do artº.104º da CRP e do artº.5º nºs.1 e 2 alíneas h) e p) do Código do IRS, pelo que fez errada interpretação dos factos, e consequentemente, errónea aplicação do direito, pelo que, sofre dos vícios de excesso de pronuncia no que se refere às alíneas a) e c) do ponto 3 (Ponto XIX alínea I) e III) das presentes alegações) e de erro sobre os pressupostos de facto e de direito, por violação em concreto das referidas normas,

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão recorrida na parte em que decide como procedente ser revogada e substituída por acórdão que declare a impugnação totalmente improcedente.

PORÉM V.EXAS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA.”


Não houve contra-alegações.
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Recebidos os autos neste Tribunal Central Administrativo Sul, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso.
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir em conferência.
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II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
De harmonia com o disposto nos artigos 635.º, nº 4 e 639.º, nºs 1 e 3, todos do Código de Processo Civil (CPC) é pelas conclusões da alegação da recorrente que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, que aqui se não detectam.
Em face ao teor das conclusões formuladas, a solução a alcançar pressupõe a análise das seguintes questões:
(i) Nulidade da sentença ao abrigo do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º do CPC;

(ii) Erro de julgamento por errada interpretação e aplicação da alínea p) do n.º 2 do artigo 5.º do CIRS.


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III. FUNDAMENTAÇÃO
A. OS FACTOS
Na sentença recorrida fixou-se a matéria de facto e indicou-se a respectiva fundamentação nos seguintes termos (negrito nas alíneas e Itálico de nossa autoria):

A) Na sequência da acção de inspecção realizada aos valores declarados para efeitos de IRS, com referência ao ano de 2001, pelo contribuinte ora impugnante, foi o conjunto dos rendimentos que o mesmo havia declarado por €19.766,06, alterado para €30.024.106,32, em resultado das correcções que vieram a ser propostas pelo Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Lisboa (vide fls. 131 e ss. do PAT anexo aos autos);


B) Para a determinação das respectivas correcções foram considerados rendimentos de capitais derivados de situações tipificadas como “adiantamentos por conta de lucros”, previstas no disposto na alínea h) do nº 2 do artº 5º do CIRS (no montante de €598.201,55), rendimentos de capitais provenientes de situações tipificadas como “outros rendimentos derivados da simples aplicações de capitais”, previstas no disposto na alínea p) do nº 2 do artº 5º do CIRS (no montante de €29.237.234,74) e, bem assim, o crédito de imposto calculado de acordo com o disposto nos artºs 80º e 22º, nº 6 do CIRS (no montante de €168.903,96) – vide fls. 131 a 159 do PAT anexo aos autos e 79 dos autos;


C) Como resultado das alterações atrás indicadas, a liquidação inicial que havia apurado um valor a pagar de €982,67 (vide fls. 337 do PAT anexo aos autos) foi corrigida para um valor a pagar de €13.783.586,63, valor que inclui juros compensatórios no montante de €1.951.133,38 (vide fls. 79 a 81 dos autos);


D) A AF veio assim considerar como rendimentos de capitais, tipificadas como “adiantamento por conta de lucros”, as importâncias que se indicam, correspondentes a cheques que vieram a ser depositados na conta bancária do ora impugnante, provenientes de adquirentes ou intervenientes na aquisição de imóveis ou fracções de imóveis a sociedades por aquele detidas:

a) – Incluídos no depósito de Esc:18.000.000$00 (€89.783,62), efectuado em 30/01/2001 no Banco ...... (.....) - vide fls. 162 do PAT:
(I) - o cheque de Esc:15.000.000$00 emitido por Maria ....., por conta da aquisição às sociedades G..... e L..... da fracção correspondente ao 1º andar frente do imóvel sito no nº ..... da Rua ....., em Lisboa;
(II) - o cheque de Esc:3.000.000$00 emitido por António ....., por conta da aquisição à sociedade L..... da fracção correspondente ao 6º andar esquerdo do imóvel sito no nº ..... da Rua ....., em Lisboa;
b) - Incluído no depósito de Esc:1.000.000$00 (€4.987,98), efectuado em 13/02/2001 no Banco ...... (.....), valor do cheque emitido por José ....., por conta da aquisição feita à sociedade Fronteira da fracção correspondente ao 4º andar esquerdo do nº ..... da Rua ....., em Lisboa - vide fls. 163 do PAT;
c) - Incluído no depósito de Esc:10.000.000$00 (€49.879,79), efectuado em 15/02/2001 no Banco ...... (.....), valor do cheque emitido por Marília ....., por conta da aquisição feita à sociedade L..... da fracção correspondente ao 1º andar C do nº ..... da Rua ....., em Lisboa - vide fls. 163 do PAT;
d) - Incluído no depósito de Esc:33.500.000$00 (€167.097,30), efectuado em 19/03/2001 no Banco ...... (.....), valor do cheque emitido por Karl ....., por conta da aquisição feita à sociedade L..... da fracção correspondente ao 5º andar esquerdo do lote ….. da Rua ..... – Parede - Cascais Lisboa - vide fls. 165 do PAT;
e) – Incluído no depósito de Esc:1.600.000$00 (€7.980,70), efectuado em 24/04/2001 no Banco ...... (.....), valor dos cheques de Esc:1.500.000$00 e Esc:100.000$00, emitido por Judite ..... por conta da aquisição feita à sociedade L..... da fracção correspondente ao 2º andar frente do nº ..... da Rua ....., em Lisboa - vide fls. 167 do PAT;
f) - Incluído no depósito de Esc:5.000.000$00 (€24.939,89), efectuado em 25/06/2001 no Banco ...... (.....), valor do cheque de emitido por Judite ..... por conta da aquisição feita à sociedade L..... da fracção correspondente ao 2º andar frente do nº ..... da Rua ....., em Lisboa - vide fls. 167 do PAT;
g) - Incluído no depósito de Esc:25.000.000$00 (€124.699,47), efectuado em 23/04/2001 no Banco ...... (.....), valor do cheque de emitido por Capitão Tenente ....., por conta da aquisição feita à sociedade L..... da fracção correspondente ao 2º andar frente do nº ..... da Rua ....., em Lisboa - vide fls. 168 do PAT;
h) - Incluído no depósito de Esc:10.000.000$00 (€49.879,79), efectuado em 11/06/2001 no Banco ...... (.....), valor do cheque de emitido por Engª Maria ....., por conta da aquisição feita à sociedade L..... da fracção correspondente ao 2º andar G do nº ..... da Rua ....., em Lisboa - vide fls. 169 do PAT;
i) - Incluído no depósito de Esc:9.800.000$00 (€48.882,19), efectuado em 20/06/2001 no Banco ...... (.....), valor do cheque de emitido por José ....., por conta da aquisição feita à sociedade L..... da fracção correspondente ao 3º andar C do nº ..... da Rua ....., em Lisboa - vide fls. 169 do PAT;
j) - Incluído no depósito de Esc:6.000.000$00 (€29.927,80), efectuado em 27/06/2001 no Banco ...... (.....), valor do cheque de emitido por João ....., por conta da aquisição feita à sociedade L..... da fracção correspondente ao 3º andar E do nº ..... da Rua ....., em Lisboa - vide fls. 169 do PAT;
k) – Incluído no depósito de Esc:5.945.850$00, efectuado em 17/09/2001 no Banco ...... (.....), quanto ao valor de Esc:28.644$00 (€142,88) respeitante ao cheque emitido por Henrique ....., por conta da aquisição feita à sociedade ..... das fracções correspondentes ao 6ºandar e dois lugares de estacionamento do nº ..... da Rua ....., em Lisboa – vide fls. 170 e 171 do PAT;

E) A AF veio também considerar como rendimentos de capitais, agora tipificadas como “outros rendimentos derivados da aplicação de capitais”, as importâncias que se indicam, correspondentes a cheques e montantes em numerário que vieram a ser depositados na conta bancária do ora impugnante, durante o ano de 2001:
a) – Incluídos no depósito de Esc:52.500.000$00 (€261.868,90), efectuado em 19/01/2001 no Banco ...... (.....), valor de dois cheques emitidos por Dr. Osvaldo ....., que é sócio do ora impugnante, nas sociedades G..... e ..... – vide fls. 281 do PAT;
b) - Incluído no depósito de Esc:3.000.000$00, efectuado em 16/04/2001 no Banco ...... (.....), quanto ao valor de Esc:1.000.000$00 (€4.987,98) respeitante ao cheque emitido por S....., mas assinado por procuração por Evaristo ..... – vide fls. 286 do PAT;
c) - Incluídos no depósito de Esc:1.332.500$00, efectuado em 18/04/2001 no Banco ...... (.....), valor dos cheques – vide fls. 286 do PAT:
(I) - de Esc:1.132.500$00 (€5.648,89), emitido por Roger .....;
(II) - de Esc:200.000$00 (€997,60), emitido por André .....;
d) - Incluídos nos seguintes depósitos, efectuados no Banco ...... (.....):
(I) – de Esc:20.000.000$00 (€99.759,58), efectuado em 22/01/2001, valor do cheque emitido por José ..... – vide fls. 282 do PAT;
(II) – de Esc:13.000.000$00 (€64.843,73), efectuado em 11/06/2001, valor do cheque emitido por Isabel ..... – vide fls. 289 do PAT;
(III) – de Esc:10.000.000$00 (€49.879,79), efectuado em 28/06/2001, valor do cheque emitido por António ..... – vide fls. 290 do PAT;
(IV) – de Esc:2.120.000$00 (€10.574,52), efectuado em 27/07/2001, valor do cheque emitido por Carlos ..... – vide fls. 290 do PAT;
e) – Incluídos no depósito de Esc:5.945.850$00, efectuado em 17/09/2001 no Banco ...... (.....), quanto aos valores seguintes:
(I) – de, duas vezes Esc:2.424$00 (2 x €12,09) e Esc:2.358$00 (€11,76), valores dos cheques emitidos por Fernando ..... – vide fls. 290 do PAT;
(II) – de Esc:60.000$00 (€299,28), valor do cheque emitido por António ..... – vide fls. 291 do PAT;
f) – Incluído no depósito de Esc:233.798.260$00, efectuado em 26/02/2001 no Banco ...... (.....), quanto ao valor de Esc:225.250.000$00 (€1.123.542,26), valor do cheque emitido por ..... – Sociedade Imobiliária, Lda – vide fls. 283 do PAT;
g) - Incluídos nos seguintes depósitos, efectuados no Banco ...... (.....):
(I) – de Esc:7.000.000$00 (€34.915,85), efectuado em 15/03/2001, valor de cheque emitido sobre o Banco ....., com o contra-valor de FRF 229.033,00 – vide fls. 284 do PAT;
(II) – de Esc:10.000.000$00 (€49.879,79), efectuado em 14/08/2001, valor de cheque emitido sobre o Banco – vide fls. 290 do PAT;
h) - Incluídos no depósito de Esc:100.006.831$00, efectuado em 16/03/2001 no Banco ...... (.....), quanto aos valores seguintes – vide fls. 284 do PAT:
(I) – de Esc:6.831$00 (€34,07), valor do cheque emitido pela Conservatória do Registo Comercial de Lisboa à ordem de Augusto ..... e que acabou endossado ao ora impugnante por Artur .....;
(II) – de Esc:100.000.000$00 (€498.797,90), valor do cheque emitido por Ricardo ..... à ordem da sociedade ....., mas não registado nas contas desta sociedade que é pertença de outras duas sociedades detidas pelo ora impugnante (Soc. de Construções Atlântico e .....);
i) – Saldo a favor do ora impugnante (Esc:5.238.662.758$00 ou €26.130.339,67), dos movimentos bancários havidos entre débitos (Esc:300.000.000$00) e créditos (Esc:5.538.662.758$00) na conta bancária deste, tendo, respectivamente, como destino e como proveniência uma conta bancária em nome de S....., mas possível de ser movimentada sob procuração outorgada ao ora impugnante – vide fls. 292 e 298 do PAT;
j) – Conjunto de 11 depósitos em numerário, efectuados ao longo de 2001, no montante global de Esc:180.600.000$00 (€900.829,00), simplesmente identificados como transferências de fundos – vide fls. 269 e 292 do PAT.

F) A AF, em parecer e despacho proferidos sobre o conteúdo da informação produzida pela Direcção de Finanças de Lisboa – área de Justiça – sobre o processo de impugnação agora sub judice, veio a considerar ser de anular a correcção que se encontra descrita na alínea a) da alínea E) dos Factos Provados, com o fundamento de que, permanecendo inconclusivo o conteúdo da relação entre o impugnante e o emitente do cheque, foi entendido existir fundada dúvida sobre o facto tributário – vide fls. 146-verso e 173 dos autos;

G) Em 14/03/2006, deu entrada na 2ª Repartição de Finanças de Lisboa a presente impugnação (cfr.carimbo de entrada aposto a fls.4 dos presentes autos).

Factos não provados
Inexistem factos não provados com interesse para a decisão da causa.
Motivação da Decisão de Facto
A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos constantes dos autos, conforme referido a propósito de cada item do probatório e depoimento testemunhal.».

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B. DO DIREITO
Da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa na impugnação contra a liquidação de IRS do ano de 2001, efectuada ao contribuinte Vitor ....., e que a julgou parcialmente procedente, recorre a Fazenda Pública quanto às correcções técnicas enunciadas na conclusão XIX das conclusões de recurso.

A primeira questão resultante da delimitação do objecto do recurso incide sobre a alegada existência de nulidade da sentença, por violação do nº 1, alínea d) do artigo 668.º do CPC (actual 615º do mesmo diploma).

DA NULIDADE DA SENTENÇA por excesso de pronúncia.
Invoca a recorrente a nulidade da sentença por excesso de pronúncia à luz do previsto na alínea d) do artigo 668.º do CPC (actual 615º do mesmo diploma), porque conhece das correcções respeitantes às seguintes verbas: dois cheques nos valores de € 12,09 cada e outro cheque de € 11,76, emitidos por Fernando ..... e outro cheque no valor de 299,98€ emitido por António .....; depósitos bancários em numerário efectuados na conta particular do impugnante no Banco ...... com o n.º ....., no valor de € 900.829,00,as quais afirma não terem sido impugnadas pelo Impugnante (doravante recorrido).
A nulidade imputada à sentença reconduz-se a um vício de conteúdo, na enumeração de J. CASTRO MENDES, Direito Processual Civil, III, 1980, 302 a 306, ou seja, vício que enferma a própria decisão judicial em si, nos fundamentos, na decisão, ou nos raciocínios lógicos que os ligam.
No processo judicial tributário o vício de excesso de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artigo 125.º, nº.1, do CPPT no último segmento da norma.
Este normativo tem de ser equacionado com o disposto no artigo 660.º, nº 2, 2ª parte, CPC, que proíbe ao juiz ocupar-se de questões que as partes não tenham suscitado, sendo estas questões os pontos de facto ou de direito relativos à causa de pedir e ao pedido, que centram o objecto do litígio.
À luz do princípio do dispositivo, «há excesso de pronúncia sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido» (cfr. Ac. STJ de 6.2.92, Bol. 414.º - 413), resultando uma limitação do juiz ao princípio do dispositivo, que exprime a liberdade com que as partes definem o objecto do litígio, não podendo o julgador condenar, além do pedido, nem considerar a causa de pedir que não tenha sido invocada.
Como se infere do que já deixámos expresso, o excesso de pronúncia pressupõe que o julgador vai além do conhecimento que lhe foi pedido pelas partes.
Com efeito o aludido vicio de conteúdo (pronúncia indevida) consiste em o juiz conhecer de questão de que não podia tomar conhecimento (2.ª parte da al. d) do n.º1 do artigo 668.º do CPC), pelo que o seu excesso configura nulidade relacionada com a 2.ª parte do n.º 2 do artigo 660.º do CPC, que proíbe ao juiz ocupar-se de questões que as partes não tenham suscitado, sendo estas questões os pontos de facto ou de direito relativos à causa de pedir e ao pedido, que centram o objecto do litígio (vide entre outros – acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 06.08.2014, proferido no processo n.º 584/14, disponível em texto integral em www.dgsi.pt).
Podemos também afirmar que o objecto da impugnação judicial é o acto tributário da liquidação (sendo o respectivo pedido, o de anulação do acto tributário e sendo a causa de pedir consubstanciada nos vários vícios imputados à mesma liquidação).
Ora, no caso vertente, o pedido dirigido ao Tribunal Tributário de Lisboa abrangeu a anulação integral da liquidação sindicada apresentando como causa de pedir, para o que aqui releva, a violação do artigo 5º. n.º2 alínea p) do CIRS.
Desde modo fica afastada a invocada nulidade.
Por todos estes motivos, se conclui pelo não acolhimento da pretensão a que vimos aludindo e, correspondentemente, das conclusões que a sustentam.
Saber se o Tribunal decidiu, ou não com acerto, já é outra questão que oportunamente apreciaremos, como de resto pediu a recorrente.
DO MÉRITO DO RECURSO
Na 1ª instância foi proferida sentença que julgou a impugnação parcialmente procedente quanto ao segmento decorrente da correcção de proveitos tributáveis efectuada a coberto do disposto na alínea p) do nº 2 do artigo 5º do CIRS (“quaisquer outros rendimentos derivados da simples aplicação de capitais”), considerando que a fundamentação utilizada pela Administração Tributária se mostra « (…) inadequada por lhe faltar a fixação do principal requisito, concretamente o pressuposto de que houve aplicações de capitais, tidas como geradoras dos rendimentos que se pretende tributar.».
Na sentença recorrida não ficou por aqui e consignou ainda que «(…) não se encontram reunidos os requisitos conducentes à tributação operada, uma vez que não resultou apurado que os valores questionados constituam acréscimos patrimoniais (rendimentos) resultantes (derivados) da mera (simples) utilização numa qualquer função (aplicação) de disponibilidades ou outras coisas fungíveis capitais), tal como vem exigido a norma legal que suportou as correcções (alínea p) do nº 2 do artigo 5.º do CIRS).».
A Fazenda Pública inconformada com o decidido, vem reagir (como já demos nota) contra a sentença na parte em que apreciou e decidiu as correcções identificadas no ponto 45 das alegações de recurso e posteriormente enunciadas na conclusão XX.
Em primeiro lugar, há a ter em conta que o tribunal tem de quedar-se pela formulação do juízo sobre a legalidade do acto sindicado tal como ele ocorreu, apreciando a respectiva legalidade em face da fundamentação contextual.
Neste sentido, o Supremo Tribunal Administrativo tem reconhecido que « (…) no domínio do contencioso de mera legalidade, que é o da impugnação judicial prevista no processo tributário, o tribunal só pode formular o seu juízo sobre a validade do acto à luz da fundamentação contextual integrante do próprio acto, sendo totalmente irrelevantes para esse efeito outros fundamentos que não os que foram oportunamente externados.» (acórdão de 26.02.2014, proferido no processo n.º 0951/11, disponível em texto integral em www.dgsi.pt).
E, segundo lugar, aplicando a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo mencionada ao caso em apreço, impõe-se, assim, chamar à colação a fundamentação externada pela Administração Tributária enquanto suporte das correcções referentes às verbas supra enunciadas, a qual, como melhor se acolhe do Relatório de Inspecção Tributária (RIT) foi a seguinte: « (…) Pela sua natureza, todos estes elementos preenchem os pressupostos de incidência previstos na alínea p) do nº2 do art.5º do CIRS em vigor à data da ocorrência dos factos relatados.» (fls.18/20 do RIT).
Dito isto, estamos em condições de apreciar a questão substantiva colocada à apreciação deste Tribunal.
A Lei Geral Tributária (LGT) no seu artigo 4.º, n.º 1, esclareceu o sentido da CRP ao estabelecer que «Os impostos assentam essencialmente na capacidade contributiva revelada, nos termos da lei, através do rendimento ou da sua utilização e do património.».
O Tribunal Constitucional nas diversas vezes que tem sido convocado a pronunciar-se sobre o princípio da capacidade contributiva (por todos, o Acórdão n.º 602/12 de 9.4.2013), tem entendido que este princípio «(…) opera tanto como condição ou pressuposto quanto como critério ou parâmetro da tributação (cfr. o Acórdão n.º 601/04, disponível em www.tribunalconstitucional.pt). Opera como pressuposto ou condição visto que impede que a tributação atinja uma riqueza ou um rendimento que não existe; vale como critério ou parâmetro porque determina que a exação do património dos contribuintes se faça de acordo com a sua “capacidade de gastar” (ability to pay).» (disponível em texto integral em http://www.pgdlisboa.pt/jurel/cst_busca_palavras.php?buscajur=crp&ficha=287&pagina=10&exacta=&nid=11103).
E, como é sabido, no regime legal vigente, a declaração de rendimentos sujeitos a tributação compete ao contribuinte, impondo a lei à Administração Tributária o dever de fiscalizar tal declaração e posteriormente o dever de demonstração da ocorrência dos pressupostos legais (vinculativos) da sua actuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável), impendendo, ao invés sobre o administrado apresentar prova bastante da ilegitimidade do acto, quando se mostrem verificados esses pressupostos (cfr.artigo 74º, nº.1, da LGT).
Este entendimento, no entanto, tem de ser temperado com o princípio da descoberta da verdade material e, por consequência, também, com o da oficiosidade de investigação e indagação das provas, que rege o procedimento tributário.
E desta conjugação resulta que o ónus da prova, nos termos antes referidos, não assume, no caso, uma natureza formal ou adjectiva, mas, antes, natureza substantiva ou material, do que resulta que, apesar de nenhuma das partes ter uma particular incumbência de provar o que quer que seja, a decisão final não pode, no entanto e pela impossibilidade legal de manutenção de um "non liquet", deixar de desfavorecer a parte que se encontrava onerada à prova dos necessários e relevantes factos.
Posto isto, vejamos agora, o que diz o artigo 5.° n°s 1 e 2, alínea p), do CIRS, isto porque, constitui o normativo central (e único) da liquidação na aparte aqui sindicada.
Dispunha-se no artigo 5° n°s 1 e 2, alínea p), do CIRS, sob a epígrafe «Rendimentos da Categoria E" (na redacção vigente à data):
«1 - Consideram-se rendimentos de capital os frutos e demais vantagens económicas, qualquer que seja a sua natureza ou denominação, sejam pecuniários ou em espécie, procedentes, directa ou indirectamente, de elementos patrimoniais, bens, direitos ou situações jurídicas, de natureza mobiliária, bem como da respectiva modificação, transmissão ou cessação, com excepção dos ganhos e outros rendimentos tributados noutras categorias.(…)
2 - Os frutos e vantagens económicas referidas no número anterior compreendem, designadamente:
(…)
p) Quaisquer outros rendimentos derivados da simples aplicação de capitais;» (sublinhado da nossa autoria).
Como escreve JOSÉ GUILHERME XAVIER DE BASTOS do preceito transcrito resulta, pois, desde logo, que se « Tratam-se os rendimentos de capital], em geral, de rendimentos típicos de “sleeping partner”, do capitalista passivo, cujo paradigma são os juros e os lucros distribuídos. Também as mais-valias, como veremos depois, são tipicamente rendimentos com este carácter passivo que atribuímos a juros e lucros distribuídos, deles se diferenciando, todavia, pela forma que assumem que é a do aumento inesperado de valor de um activo patrimonial.» (In: IRS Incidência Real e determinação dos Rendimentos Líquidos, Coimbra Editora 2007, pág. 2007, p. 226).
O mesmo Autor escreve ainda: « (…) percebe-se a cautela do legislador ao definir a incidência em matéria de rendimentos de capitais, atendendo à já referida acelerada evolução do domínio dos produtos financeiros, com o frequente lançamento no mercado de novas fórmulas e combinações, cujo enquadramento nos diferentes “ descritores” nem sempre é evidente.» (ob. cit. pág.230).
Relativamente ao normativo que nos ocupa já teve este Tribunal Central Administrativo o ensejo de sobre ele se debruçar. Fê-lo no Acórdão nº 20.12.2012, proferido no processo n.º 341/09, onde se pode ler:
«A definição de “rendimentos de capitais” implantada (4) no art. 5.º n.º 1 CIRS traduz e incorpora uma regra de incidência tão ampla, distendida, que é capaz de englobar qualquer situação, envolvente de valores mobiliários, que não seja tributada noutra das categorias, em que opera o IRS.
Por outras palavras, este normativo traduz a preocupação do legislador em satisfazer a necessidade de estabelecer a incidência real da forma mais abrangente possível, objetivando prevenir a endémica evasão fiscal e assegurar o pagamento de imposto, quanto a todo o tipo de rendimentos, surgidos da operação dos mais diversos instrumentos financeiros, com a condição de não ser inquestionável a sua sujeição no âmbito de outra típica categoria de ganhos. Assim, além de outros, são susceptíveis de integrar a versada previsão legal, “vantagens económicas”, independentemente da natureza ou denominação, pecuniárias ou em espécie, provenientes, direta ou indiretamente, de elementos patrimoniais, bens, direitos ou situações jurídicas, bem como, da respectiva modificação, transmissão ou cessação; atente-se que nas diversas alíneas do seu n.º2 são fornecidos exemplos das “vantagens económicas” mais frequentes, comuns.» (disponível em texto integral em www.dgsi.pt).
Retornando à situação concreta que se vem analisando, ter-se-á de concluir que é à Administração Tributária que compete demonstrar a ocorrência de circunstancialismo de facto justificativo de uma não aceitação da declaração de rendimentos do contribuinte - no caso traduzida na ausência de declaração das importância aqui em causa como sujeita a tributação em sede de IRS.
É neste quadro legal, doutrinal e jurisprudencial, que há-de decidir-se a procedência ou não do invocado erro de julgamento imputado à sentença sob recurso.
Retomando, de novo, o caso concreto, sem nunca perder de vista o discurso que sustenta as correcções:
I - Dois cheques nos valores de 2.424$00 (2 x €12,09) - cada e um outro cheque de 2.358$00 (€11,76),emitidos por Fernando .....; e cheque no valor de 60.000$00 (€299,28), emitido por António ......
II - Esc:6.831$00 (€34,07), valor do cheque emitido pela Conservatória do Registo Comercial de Lisboa à ordem de Augusto ..... e que acabou endossado ao ora impugnante por Artur .....;
Para a recorrente os montantes em causa entraram na esfera patrimonial do recorrido «tendo assim gerado um incremento no seu património, traduzindo-se igualmente tal como na anterior alínea numa vantagem económica, de que não dispunha não resultante de outros rendimentos de outras categorias de IRS nem da devolução de suprimentos das empresas por esse participadas, encontram-se assim, tributáveis em sede de categoria E de IRS, por força do disposto no nº.1 do artº.5º do CIRS, nos termos da alínea p) do nº.2 do mesmo artigo.».
Desde logo, na linha do acima referido, entendemos nós que o simples depósito de cheques na conta bancária do recorrido não é de molde a concluir que estamos perante um rendimento derivado da simples aplicação de capitais, por outra banda, a Administração Tributária tão pouco o alega ou demonstra (e era seu ónus provar os pressupostos de facto necessários ao enquadramento dos montantes em causa no artigo 5.°, n.° 2, alínea p), do CIRS) a alegada vantagem económica do recorrido, pois limita-se a considerar o montantes causa como, vantagem económica.
Improcede nesta parte o recurso.
III - Conjunto de 11 depósitos em numerário, efectuados ao longo de 2001, no montante global de Esc:180.600.000$00 (€900.829,00).
Neste ponto escreveu-se na sentença: «Quanto aos valores em numerário, depositados na conta pessoal do impugnante, se bem que atendendo às respectivas grandezas possam ser consideradas como não resultantes da mera movimentação de valores afectos à vida pessoal, porque a AF não logrou identificar os depositantes e bem assim quais as operações geradoras dos valores em causa, haverá que considerar não estarem reunidos os pressupostos para a respectiva subsunção como rendimentos de capitais no âmbito do disposto no artº 5º do CIRS;».
A discordância da recorrente deriva de em seu entender, contrariamente ao decidido, «o depositante destes montantes em numerário é o próprio impugnante e está perfeitamente identificado, quer no texto do próprio Relatório de Inspecção (no segundo parágrafo do capítulo III, pág.15/25), quer nos respectivos documentos bancários anexos ao Relatório de Inspecção – pela assinatura aposta nos talões de depósito correspondentes (conforme constam do Anexo-2 ao Relatório) » e por outro lado « o carácter investidor do impugnante, participante do capital social de muitas empresas – já antes mencionadas ao longo do Relatório de Inspecção e da Informação Administrativa anexa à Contestação da Fazenda – não se lhe conhecendo outra actividade, e não tendo origem, tais verbas em outros rendimentos enquadráveis em sede de outras categorias de IRS, nem de na devolução de suprimentos das empresas participadas pelo ora impugnante».
Ora, como é sabido, a impugnação, em sede de recurso, da decisão de facto proferida pela 1ª instância, deve obedecer, sob pena de rejeição, aos ónus que se acham enumerados no artigo 640º, nº 1, do C.P.C..
A parte recorrente deve assim especificar quais os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados (al. a), quias os concretos meios probatórios que impunham decisão sobre os pontos impugnados diversa da recorrida (al. b), e ainda qual a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas (al. c). Para além disso, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, também sob pena rejeição do recurso nessa parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o recurso (nº 2, al. a), do mesmo art.º 640º) .
Significa isto, que a mera remissão para o Relatório de Inspecção e respectivos anexos não satisfaz a exigência da indicação dos meios probatórios. Por outro lado, e ainda que assim não fosse, sempre se mostra irrelevante as alegações da recorrente por se tratar de fundamentação a posteriori. E, como já afirmamos, a correcção cuja legalidade é questionada é apreciada tal como foi praticada.
Também nesta parte este Tribunal adere ao sentido pugnado em 1ª Instância.
IV. Esc:7.000.000$00 (€34.915,85), efectuado em 15/03/2001, valor de cheque emitido sobre o Banco ....., com o contra-valor de FRF 229.033,00 e Esc:10.000.000$00 (€49.879,79), efectuado em 14/08/2001, valor de cheque emitido sobre o BANCO.
Neste ponto, considerou o Tribunal a quo « (…) não pode, a fundamentação aduzida pela AF, radicada numa alegada manifesta insuficiência de elementos apresentados pelo ora impugnante, servir de elementos substitutivo das evidências requeridas pelo que dispõe o nº 1 do artigo 5º do CIRS, nem a abrangência residualmente contida no disposto na alínea p) do nº 2 do mesmo artigo é susceptível de permitir uma extensão para além do que expressamente aí vem referido, isto é, que sejam acréscimos patrimoniais (rendimentos) e que sejam resultantes (derivados) da mera (simples) utilização numa qualquer função (aplicação) de disponibilidades ou outras coisas fungíveis (capitais).».
O assim decidido não merece censura, nem o mesmo é abalado pela alegação recursoria produzida pela recorrida. Com efeito, ainda que tivesse demonstrado ter procedido a tais diligências, é ponto assente, na linha que vimos seguindo, que lhe competia fazer prova dos pressupostos do seu agir (cfr. artigo 74.º, n.º 1, da LGT) , ou seja, que se encontravam reunidos os factos índice que lhe permitiam fazer o enquadramento dos valores recebidos como rendimentos da categoria E, nos termos previstos no artigo 5.º, nº 2, alínea p) do CIRS, o que não foi feito.
V. Incluídos no depósito de Esc:1.332.500$00, efectuado em 18/04/2001 no Banco ...... (.....), valor dos cheques-de Esc:1.132.500$00 (€5.648,89), emitido por Roger ..... e Esc:200.000$00 (€997,60), emitido por André ......
Segundo, a recorrente não resultando provado que «os depósitos em apreço resultassem a da devolução de suprimentos nem de outros rendimentos auferidos pelo Impugnante nem de outras categorias de IRS, pelo que, constituem vantagens económicas para o mesmo, enquadráveis na alínea p) do n.º2 do art.º5º do CIRS».
Ora, a nosso ver, e como sabemos as normas de incidência dos tributos bem como as que concedem isenções ou exclusões de tributação, devem ser interpretadas nos seus exactos termos, sem o recurso à analogia, tornando prevalente a certeza e a segurança na sua aplicação. Neste ponto, a recorrente continua a sustentar a legalidade da correcção num discurso meramente conclusivo, como de resto, já havia feito, quer no campo da fundamentação da correcção quer junto do tribunal de 1ª instância.
Desde modo, perante a inexistência do fio condutor determinante da correcção, é por demais evidente que a Administração Tributária não cumpriu com o ónus que sobre si recai.
VI. Incluído no depósito de Esc:233.798.260$00, efectuado em 26/02/2001 no Banco ...... (.....), quanto ao valor de Esc:225.250.000$00 (€1.123.542,26), valor do cheque emitido por ..... – Sociedade Imobiliária, Lda
Como já afirmamos, perante a fundamentação determinante da correcção, também neste segmento não acompanhamos a argumentação descrita nas alegações de recurso, na medida em que não pode exigir-se ao recorrido prova dos factos constitutivos da sua pretensão de anulação (desde logo, e por exemplo, a prova da não verificação dos pressupostos legais da prática do acto), de modo a caber à Administração Tributária apenas provar as excreções invocadas – tal equivaleria na prática à pura e simples invocação da “presunção da legalidade do ato administrativo”, fazendo recair sobre o particular o ónus da prova (subjetivo) da ilegalidade do acto impugnado.
Em apoio deste entendimento, deve avocar-se o acórdão deste TCA Sul de 13.12.2005, proferido no processo n.º 00287/04, diga-se, não pode exigir-se ao recorrido «(…) prova dos factos constitutivos da sua pretensão de anulação (desde logo, e por exemplo, a prova da não verificação dos pressupostos legais da prática do ato), de modo a caber à Administração apenas provar as exceções invocadas – tal equivaleria na prática à pura e simples invocação da “presunção da legalidade do ato administrativo”, fazendo recair sobre o particular o ónus da prova (subjetivo) da ilegalidade do ato impugnado.(…) Por outras palavras ainda, deve ser a Administração a suportar a desvantagem de não ter sido feita a prova (de o juiz não se ter convencido) da verificação dos pressupostos legais que permitem à Administração agir com autoridade (pelo menos, quando produza efeitos desfavoráveis para os particulares (…). Assim, atualmente, em princípio, à AT cabe o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua atuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável) e, em contrapartida, cabe ao administrado apresentar prova bastante da ilegitimidade do ato, quando se mostrem verificados esses pressupostos, solução que corresponde à regra geral do art. 342.º do Código Civil, de que quem invoca um direito tem o ónus da prova dos factos constitutivos, cabendo à contraparte a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos (Já não será assim se não for a AT que está a afirmar a existência e dimensão do facto tributário, mas o Contribuinte) e que foi acolhida no art. 121.º, n.º 1, do CPT), no art. 100.º, n.º 1, do CPPT, disposição legal que reproduz aquela, e no art. 74.º da Lei Geral Tributária.».(disponível em texto integral em www.dgsi.pt).
Assim sendo, numa hipótese como a dos autos, não têm cabimento a argumentação da recorrente visto que cabe à Administração Tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua actuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável); em contrapartida caberá ao administrado apresentar prova bastante da ilegitimidade do ato, quando se mostrem verificados esses pressupostos.
Dito isto, e regressando ao caso sub judice, a prova produzida nos autos não permite concluir pela existência de facto tributário, ou seja, que as quantias em causa constituem rendimentos enquadráveis no artigo 5º, n.º 2º, al.p) do CIRS, como bem decidiu a 1ª Instância.
(vii) Esc:20.000.000$00 (€99.759,58), efectuado em 22/01/2001, valor do cheque emitido por José ..... – Esc:13.000.000$00 (€64.843,73), efectuado em 11/06/2001, valor do cheque emitido por Isabel ..... e Esc:10.000.000$00 (€49.879,79), efectuado em 28/06/2001, valor do cheque emitido por António ......
(viii) Esc:2.120.000$00 (€10.574,52), efectuado em 27/07/2001, valor do cheque emitido por Carlos .....
Tem aqui perfeita aplicação tudo o que vem dito, impondo-se acrescentar, que embora a recorrente alegue que a sentença recorrida «não teve em conta os factos apurados pela AT», o certo é que, não ensaiou minimamente quais os factos que no seu entender impunham decisão diversa da proferida em 1ª instância.
(ix) Esc:100.000.000$00 (€498.797,90), valor do cheque emitido por Ricardo ..... à ordem da sociedade ..... – Sociedade de Investimentos Dominais, S.A., mas não registado nas contas desta sociedade que é pertença de outras duas sociedades detidas pelo ora impugnante (Soc. de Construções Atlântico e .....).
É, também aqui incontornável o acerto a sentença recorrida, visto que, tendo a Administração Tributaria invocado para a correcção a respectiva subsunção ao disposto na alínea p) do n.º2 do artigo 5º do CIRS, é manifesto que a fundamentação utilizada é inadequada por lhe faltar o principal requisito, ou seja, o pressuposto de que houve uma aplicação de capitais, tida como geradora dos rendimentos que se pretende tributar.
(x) Esc:1.000.000$00 (€4.987,98), respeitante ao cheque emitido por S....., mas assinado por procuração por Evaristo ..... e Esc:5.238.662.758$00 ou €26.130.339,67), referente ao saldo resultante dos movimentos bancários durante o ano de 2001.
A única inovação expendida pela recorrente quanto à reacção que dirige á sentença sob recurso, no que aqui importa, prende-se, com um “ alegado “ erro na apreciação da prova testemunhal produzida, em concreto o depoimento prestado pela testemunha Manuel ......
Quando é certo que, nenhum facto passou para o probatório em resultado da produção de prova testemunhal. Ou dito de outro modo, não há um único facto – provado ou não provado – que resulta do depoimento daquela testemunha nem das demais indicadas na Acta de Inquerição de fls. 516 a 519. A isto deve acrescentar-se que no recurso jurisdicional interposto não foi impugnada a matéria de facto, pelo que a mesma corresponde, sem alterações, ao que vem da 1ª instância.
Em consequência bem se decidiu na sentença recorrida, que nenhuma censura merece.
Da dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça.
Estabelece o artigo 6º, nº 7 do RCP, que «nas causas de valor superior a € 275 000 o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento».
Conforme entendimento expresso no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 07.05.2014, proferido no processo n.º 01953/13 a que aderimos, «A norma constante do nº7 do art. 6º do RCP deve ser interpretada em termos de ao juiz, ser lícito, mesmo a título oficioso, dispensar o pagamento, quer da totalidade, quer de uma fracção ou percentagem do remanescente da taxa de justiça devida a final, pelo facto de o valor da causa exceder o patamar de €275.000, consoante o resultado da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade do processado e comportamento das partes),iluminada pelos princípios da proporcionalidade e da igualdade.» (disponível em texto integral em www.dgsi.pt) .
No caso em apreço, considerando que o valor da presente causa ultrapassa o patamar de 275.000€ (valor da causa no presente processo fixou-se em 13.783.586,63 € e que a mesma não assumiu especial complexidade nem a conduta assumida por qualquer uma das partes, em recurso, pode considerar-se num nível reprovável.
Nestes termos e pelos fundamentos apontados, determina-se a dispensa do pagamento do aludido remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º7, do RCP.
IV. CONCLUSÕES
I. A declaração de rendimentos sujeitos a tributação compete ao contribuinte, impondo a lei à Administração Tributária o dever de fiscalizar tal declaração e posteriormente o dever de demonstração da ocorrência dos pressupostos legais (vinculativos) da sua actuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável), impendendo, ao invés sobre o administrado apresentar prova bastante da ilegitimidade do acto, quando se mostrem verificados esses pressupostos [cfr.artigo 74º, nº.1, da LGT].
II. Este entendimento, no entanto, tem de ser temperado com o princípio da descoberta da verdade material e, por consequência, também, com o da oficiosidade de investigação e indagação das provas, que rege o procedimento tributário.
III. E desta conjugação resulta que o ónus da prova, nos termos antes referidos, não assume, no caso, uma natureza formal ou adjectiva, mas, antes, natureza substantiva ou material, do que resulta que, apesar de nenhuma das partes ter uma particular incumbência de provar o que quer que seja, a decisão final não pode, no entanto e pela impossibilidade legal de manutenção de um "non liquet", deixar de desfavorecer a parte que se encontrava onerada à prova dos necessários e relevantes factos.
IV. No caso concreto, compete à Administração Tributária demonstrar a ocorrência de circunstancialismo de facto justificativo de uma não aceitação da declaração de rendimentos do contribuinte - no caso traduzida na ausência de declaração das importância aqui em causa como sujeita a tributação em sede de IRS.
IV. O simples depósito de cheques na conta bancária do recorrido não é de molde a concluir que estamos perante um rendimento derivado da simples aplicação de capitais [alínea p) do n.º2 do artigo 5º do CIRS].


V. DECISÃO
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente, com dispensada pelas partes do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida a final.

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Após trânsito em julgado, remeta-se certidão do presente acórdão com nota de trânsito ao DIAP - Inquérito n.º8870/03.4TDLSB- satisfazendo-se o solicitado a fls. 988.

Lisboa, 18 de Abril de 2018.


[Ana Pinhol

[Jorge Cortês]

[Cristina Flora]