Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
108/13.2TBPNH.C1.S1
Nº Convencional: 6ª SECÇÃO
Relator: JOSÉ RAINHO
Descritores: IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
ÓNUS DE ALEGAÇÃO
GRAVAÇÃO DA PROVA
PRIVAÇÃO DO USO DE VEICULO
DANO
CÁLCULO DA INDEMNIZAÇÃO
NULIDADE DA DECISÃO
ERRO DE JULGAMENTO
Data do Acordão: 09/18/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – PROCESSO DE DECLARAÇÃO / RECURSOS / ÓNUS A CARGO DO RECORRENTE QUE IMPUGNE A DECISÃO RELATIVA À MATÉRIA DE FACTO.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGO 640.º, N.º 2, ALÍNEA A).
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


- DE 05-11-2009, PROCESSO N.º 381-2002-S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 28-10-2010, PROCESSO N.º 272/06.7TBMTR.P1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 20-10-2011, PROCESSO N.º 428/07.5TBFAF.G1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 01-06-2014, PROCESSO N.º 1825/09.7TBSTS.P1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 12-03-2015, SUMARIO IN WWW.STJ.PT;
- DE 19-03-2015, SUMARIO IN WWW.STJ.PT;
- DE 14-05-2015, SUMARIO IN WWW.STJ.PT;
- DE 02-07-2015, SUMARIO IN WWW.STJ.PT;
- DE 09-07-2015, PROCESSO N.º 284040/11.0YIPRT.G1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 08-10-2015, SUMARIO IN WWW.STJ.PT;
- DE 22-10-2015, SUMARIO IN WWW.STJ.PT;
- DE 29-10-2015, PROCESSO N.º 233/09.4TBVNC.G1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 10-12-2015, PROCESSO N.º 724/09.7TBAMT.P1.S1, SUMARIO IN WWW.STJ.PT;
- DE 14-07-2016, PROCESSO N.º 111/12.0TBAVV.G1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 27-10-2016, PROCESSO N.º 3176/11.8TBBCL.G1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 26-01-2017, PROCESSO N.º 599/15.7T8CLD.C1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 27-04-2017, PROCESSO N.º 685/03.6TBPRG.G1.S1, IN WWW.DGSI.PT.


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ACÓRDÃOS DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES:


- DE 30-01-2014, PROCESSO N.º 273733/11.1YIPRT.G1.
- DE 10-11-2014, PROCESSO N.º 1258/11.5TBPTL-A.G1;
- DE 17-12-2014, PROCESSO N.º 447/08.4TBAVV.G1, TODOS IN WWW.DGSI.PT.


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ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA:


- DE 10-02-2015, PROCESSO N.º 2466/11.4TBFIG.C1.
Sumário :
I - Não há que confundir entre nulidades de decisão e erros de julgamento (seja em matéria substantiva, seja em matéria processual). As primeiras (errores in procedendo) são vícios de formação ou atividade (referentes à inteligibilidade, à estrutura ou aos limites da decisão, isto é, trata-se de vícios que afetam a regularidade do silogismo judiciário) da peça processual que é a decisão, nada tendo a ver com erros de julgamento (errores in iudicando), seja em matéria de facto seja em matéria de direito.

II - A indicação com exatidão das passagens da gravação em que o recorrente funda o seu recurso (al. a) do n.º 2 do art. 640.º do CPC) tem o seguinte significado: indicação do segmento da gravação onde está contida a informação que o recorrente entende apoiar o seu ponto de vista. Assim, a simples indicação do momento do início e do fim da gravação de um certo depoimento não cumpre a exigência legal.

III - A reparação do dano da privação do uso não pode ser vista em abstrato, aferida pela mera impossibilidade objetiva de utilização da coisa. A mera privação do uso do bem, independentemente da demonstração de factos reveladores de um dano específico emergente ou de um lucro cessante, é insuscetível de fundar a obrigação de indemnização.

IV - Sabendo-se apenas que o veículo do lesado era passível de utilização, e não já que essa utilização estivesse destinada a ser feita nos termos alegados pelo mesmo lesado e do que lhe adviria um prejuízo diário da ordem de € 25, é aceitável a indemnização de € 1 000, tanto mais que se sabe que a seguradora não deixou de lhe oferecer a possibilidade de uso de um veículo de substituição.
Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça (6ª Secção):

I - RELATÓRIO

AA demandou, pelo Tribunal Judicial de ... e em autos de ação declarativa com processo na forma ordinária, BBS.A., peticionando a condenação desta a pagar-lhe as quantias de 4.145,21€ (por danos no veículo), 3.173,40€, acrescidos de 10€ diários até ressarcimento (por parqueamento da viatura), 869,50€ (por despesas de transporte), 6.450€, acrescidos de 25€ diários (privação do uso do veículo), 20.000€ (por danos não patrimoniais), acrescendo sobre tais quantias juros desde a citação. Mais peticionou a condenação da Ré no pagamento de quantia, a título de danos patrimoniais futuros, a calcular posteriormente, após realização de prova pericial.

Alegou para o efeito, em síntese, que quando conduzia o seu veículo automóvel matrícula NC... veio este a ser embatido pelo veículo automóvel matrícula ...FB. O acidente ficou a dever-se à forma distraída e negligente como o condutor deste último veículo circulava. Por efeito do embate o Autor sofreu e irá sofrer os danos patrimoniais e não patrimoniais que descreve ou que irão ser apurados. O dono do veículo ...FB havia transferido para a Ré a responsabilidade civil decorrente do respetivo uso e circulação, razão pela qual esta está vinculada a reparar os danos advindos ao Autor.

Contestou a Ré, aceitando que o acidente se ficou a dever a culpas do condutor do veículo ...FB e declarando assumir a responsabilidade pela reparação dos danos.

Impugnou, porém, a existência de parte dos danos e seus valores.

Seguindo a ação seus termos, veio, a final, a ser proferida sentença que julgou a ação parcialmente procedente, sendo a Ré condenada a pagar ao Autor:

- a) A quantia de 3.262,58 €, pelos danos sofridos no veículo;

- b) A quantia de 1.000 €, a título de danos não patrimoniais pela privação do uso do veículo;

- c) A quantia de 869,50 €, a título de dano patrimonial pelas despesas efetuadas com transportes para consultas e fisioterapia;

- d) A quantia de 5.000 €, a título de danos não patrimoniais;

- e) Juros de mora sobre os referidos montantes desde a citação até integral pagamento.

No mais foi a Ré absolvida do pedido.

Parcialmente inconformado com o assim decidido, apelou o Autor.

Pretendia a modificação, convocando para o efeito a prova testemunhal, de parte dos factos considerados não provados, bem como pretendia a condenação da Ré em indemnização a título de despesas com o parqueamento da viatura e em indemnização mais elevada a título de privação do uso da viatura.

A Relação de Coimbra rejeitou a impugnação da matéria de facto enquanto baseada em prova testemunhal, isto por incumprimento do ónus processual de indicação com exatidão das passagens da gravação em que o apelante se fundava. Porém, recorrendo a presunções judiciais, o tribunal decidiu modificar em parte os factos em causa. E assim, dando parcial provimento à apelação, mais condenou a Ré a pagar ao Autor a quantia, a liquidar posteriormente, correspondente ao parqueamento da viatura desde 31.12.2012 até efetiva reparação, acrescida de juros de mora a partir da citação até integral pagamento.

Mantendo-se insatisfeito com o assim decidido, interpôs o Autor revista, que qualificou como revista excecional.

Da respetiva alegação extrai o Recorrente as seguintes conclusões:

I

a) O Recorrente cumpriu, nas suas alegações de apelação para o Tribunal da Relação de Coimbra, para a reapreciação da prova gravada, com o ónus estabelecido no artigo 640°, n.ºs 1 e 2, do CPC; nas alegações o Recorrente referiu, de forma inequívoca, quais os pontos de facto que considerou incorretamente julgados, e também indicou os meios probatórios concretos e constantes das gravações.

b) A Recorrida compreendeu perfeitamente o objecto do recurso, respondendo a estas alegações sem suscitar a existência de qualquer vício, contrapondo os depoimentos que, em seu entender, sustentavam as respostas impugnadas.

c) O acórdão recorrido rejeitou a impugnação da decisão da matéria de facto deduzida pelo Recorrente, não a apreciando, com base de que não foram invocados com exatidão as passagens da gravação em que funda a sua impugnação, especificando, em relação a cada um dos pontos de facto impugnados, os fundamentos e os meios probatórios que, em seu entender, impunham uma decisão diferente da que foi proferida pela 1.a instância.

d) Sendo a impugnação da matéria de facto, em via de recurso de apelação, uma autêntica questão, deve ser incluída nas conclusões das alegações do Recorrente de forma sintética mas com indicação precisa dos concretos pontos de facto impugnados, embora sem necessidade de referência a números, sendo suficiente que a contraparte e o julgador possam apurar ao certo o que é que o Recorrente impugna,

e) A especificação dos concretos meios probatórios não integra uma autêntica questão, mas simples indicação dos elementos suscetíveis de conduzir à procedência da impugnação da matéria de facto, pelo que, não tem de ser transcritas os excertos como parecer resultar de algum dos segmentos do acórdão ora posto em crise, bastando que conste da fundamentação e das conclusões das alegações o sentido da resposta que deveria ter sido dada- em seu entendimento - às concretas questões da matéria de facto.

f) Não tendo o Tribunal da Relação conhecido da impugnação feita pela apelante sobre a decisão da matéria de facto, com base na circunstância de aquela não ter especificado com exatidão os pontos de facto impugnados, os fundamentos e os meios probatórios que entendia imporem uma decisão diferente da que foi proferida pela 1ª instância, o acórdão recorrido cometeu uma nulidade por omissão de pronúncia, prevista na alínea d), do n° 1, do artigo 615.°, do CPC, porquanto, de facto o Recorrente especificou as passagens do depoimento das testemunhas que mereciam decisão diversa da proferida.

g) A decisão Recorrida está em manifesta contradição com o decidido, por unanimidade, no Acórdão desse Supremo Tribunal de Justiça, de 24.05.2005, no Processo 05A 1334, que se junta como acórdão-fundamento do presente recurso de revista excecional - Doc. nº 1.

h) Pelo que, conclui-se que deve ser declarado nulo o acórdão recorrido, ordenando-se que o processo volte ao Tribunal da Relação para reapreciação da matéria de facto.

II

1. O Recorrente não se conforma com o valor da indemnização pela privação do uso do veículo - 1.000,00€ após 5 anos já decorridos, pecando este valor pela sua exiguidade, reduzido a singela marca jurídica-decorativa.

2. Assim, e conforme António Santos Abrantes Geraldes, in “Indemnização do Dano da Privação do Uso” pág. 33 «Pelo contrário, a recomposição da situação danosa reclama que, pela única via possível, ou seja, pela atribuição de um equivalente pecuniário, o lesado consiga ser reintegrado».

3. Por outro lado, exigir no plano simplesmente teorético, que o lesado invariavelmente fizesse prova de danos imputáveis a essa privação, mostra-se claramente desfavorável e injusto, pois frequentemente é inviável demonstrar danos de natureza material.

4. Nunca é demais referir o douto entendimento, a este propósito, de António Santos Abrantes Geraldes, ob. cit., pág. 35 «Assim, a opção por um outro entendimento mais rigorista, a pressupor sempre a certificação de consequências negativas, designadamente correspondentes à realização de despesas acrescidas ou à perda de receitas, traduzir-se-ia, na maior parte das vezes, na decadência da pretensão ou mesmo numa verdadeira denegação de justiça. Acresce que um tal entendimento não consegue afastar resultados que, a posteriori, se verifica serem discriminatórios para certos lesados: sempre encontrariam eco nas decisões judiciais as pretensões daqueles que, sendo detentores de suficiente capacidade económica, resolvessem agir directamente, através do aluguer de veículos substitutivos e do consequente rebatimento ou repercussão na esfera jurídica do responsável, enquanto os restantes, a maioria, ou seja, os que não dispusessem de numerário suficiente para impulsionar esta forma de autotutela ou não pretendessem suportar a álea inerente aos processos de natureza contenciosa, veriam recusada qualquer compensação monetária».

5. Ou seja, o ordenamento assim interpretado, exigindo a prova das consequências negativas, aproveitaria aos conhecedores dos meandros legais, ao passo que os outros - a maioria - sem recursos para contratar aluguer de veículo de substituição, veriam retidos pela malha apertada dos argumentos formais os seus fundamentos.

6. Juízos dessa estirpe, apesar de compreensíveis sob a cútis de uma análise formal, com uma boa dose de farisaísmo, redondariam num tratamento diferenciado, provocando situações de contornos perfeitamente negativos, onde os mais abonados seriam sempre ressarcidos e os mais modestos e carecidos cotejados do seu direito.

7. Acresce ainda que em matéria tão sensível quanto a da responsabilidade civil, em que os fatores de ordem subjetiva são tão importantes, nem sempre se torna fácil o cumprimento do ónus probatório por parte do lesado quando se trata de demonstrar a existência de danos efetivos diretamente provocados pela privação de um bem, fatores que exigem dos tribunais, em vez da simples adesão a um fraseado vazio de conteúdo, um maior esforço na qualificação e valoração dos factos.

8. Deverá assim recorrer-se às circunstâncias apuradas em cada caso concreto, com especial relevância, no caso dos autos, que o Autor tem vários terrenos agrícolas, que os cultiva, sendo por isso necessário transportar mercadorias, artefactos e alfaias agrícolas, e em épocas diversas, pessoas para os diversos trabalhos agrícolas.

9. Deste modo, no presente caso não poderá a avaliação diária do dano ser inferior a 25,00 euros diários, ao contrário do fixado na douta sentença a quo, que na prática determinou a pretérita atribuição decorativa de 0,54€ por dia ao Autor.

                                                           +

A Ré contra-alegou, concluindo pela improcedência do recurso.

                                                           +

Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

                                                           +

Questão prévia

O presente recurso vem interposto como revista excecional, dizendo o Recorrente que o acórdão recorrido está em oposição com o acórdão deste Supremo Tribunal de que juntou uma cópia. A suposta contradição residiria na circunstância do acórdão recorrido ter rejeitado a apreciação da impugnação da matéria de facto com base na prova testemunhal, isto por incumprimento do ónus processual de indicação com exatidão das passagens da gravação em que o apelante se fundava, enquanto o acórdão deste Supremo de que fez juntar cópia teria decidido de modo contrário quanto a esse mesmo assunto (o que, diga-se de passagem, não é exato, pois que o dito acórdão decidiu sobre realidade processual diferente).

Mas há aqui um equívoco do Recorrente quanto à interposição de revista excecional. É que, como decorre do n.º 1 do art. 672º do CPCivil, a revista excecional pressupõe a inadmissibilidade de interposição de revista ordinária pelo facto de estar formada uma dupla conformidade decisória das instâncias. A dupla conformidade supõe necessariamente a reapreciação pela Relação da mesma questão de direito que a 1ª instância já tinha apreciado. Se essa dupla conformidade não existe, a revista é admissível nos termos normais.

Ora, o Recorrente insurge-se contra a circunstância da Relação ter rejeitado, por incumprimento de ónus processual, a apreciação da prova testemunhal. Porém, essa suposta ineficiência processual nada tem a ver com o decidido previamente no tribunal da 1ª instância, pelo que não se pode falar de qualquer dupla conforme.

Como já houve oportunidade de se deixar dito no acórdão deste Supremo de 27 de Outubro de 2016 (processo nº 3176/11.8TBBCL.G1.S1, disponível em www.dgsi.pt), em caso de rejeição do recurso em matéria de facto estamos perante uma decisão criada ex novo no próprio tribunal da Relação, sem qualquer paralelo, afinidade ou contiguidade com a decisão produzida na 1ª instância, pelo que nunca se poderá formar, por natureza, uma dupla conformidade decisória. No mesmo sentido, e entre muitos outros[1], cite-se o acórdão ainda deste Supremo de 14 de Julho de 2016 (processo nº 111/12.0TBAVV.G1.S1, também disponível em www.dgsi.pt).

In casu, não ocorrendo pois uma situação inserível ao pressuposto da dupla conformidade decisória das instâncias, e verificados que estão os requisitos legais gerais de admissibilidade dos recursos (valor, sucumbência, legitimidade, tempestividade), segue-se que é à partida admissível a revista ordinária, não fazendo por isso sentido vir-se falar em revista excecional.

Importa pois conhecer do recurso, precisamente porque este é admissível independentemente dos requisitos da revista excecional.

II - ÂMBITO DO RECURSO

Importa ter presentes as seguintes coordenadas:

- O teor das conclusões define o âmbito do conhecimento do tribunal ad quem, sem prejuízo para as questões de oficioso conhecimento, posto que ainda não decididas;

- Há que conhecer de questões, e não das razões ou fundamentos que às questões subjazam;

- Os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do ato recorrido.

                                                           +

São questões a conhecer:

- Nulidade do acórdão recorrido;

- Montante da indemnização devida pela privação do veículo.

                                                           +

III - FUNDAMENTAÇÃO

Quanto à matéria das conclusões a) a h):

Nestas conclusões argui o Recorrente a nulidade do acórdão recorrido, com fundamento em omissão de pronúncia.

Diz o Recorrente, a propósito e em síntese, que “Não tendo o Tribunal da Relação conhecido da impugnação feita pela apelante sobre a decisão da matéria de facto, com base na circunstância de aquela não ter especificado com exatidão os pontos de facto impugnados, os fundamentos e os meios probatórios que entendia imporem uma decisão diferente da que foi proferida pela 1ª instância, o acórdão recorrido cometeu uma nulidade por omissão de pronúncia, prevista na alínea d), do n° 1, do artigo 615.°, do CPC, porquanto, de facto o Recorrente especificou as passagens do depoimento das testemunhas que mereciam decisão diversa da proferida.”

Ora, como tem sido reiteradamente afirmado na doutrina e na jurisprudência, não há que confundir entre nulidades de decisão e erros de julgamento (seja em matéria substantiva, seja em matéria processual). As primeiras (errores in procedendo) são vícios de formação ou atividade (referentes à inteligibilidade, à estrutura ou aos limites da decisão, isto é, trata-se de vícios que afetam a regularidade do silogismo judiciário) da peça processual que é a decisão, nada tendo a ver com erros de julgamento (errores in iudicando), seja em matéria de facto seja em matéria de direito. As nulidades ditam a anulação da decisão, as ilegalidades ditam a revogação da decisão.

Ora, percorrendo as conclusões em destaque bem se vê que do que se queixa o Recorrente é unicamente de um suposto erro de julgamento em matéria processual, isto é, que o Tribunal recorrido decidiu mal (violação ou errada aplicação da lei de processo) ao ter decidido que foi incumprido o ónus a que se reporta a alínea a) do n.º 2 do art. 640.º do CPCivil. Não se trata, assim, de qualquer omissão de conhecimento, mas sim de um suposto erro de decisão. O que, portanto, nada tem a ver com a temática das nulidades de decisão.

O que, consequentemente, implica a imediata e fatal improcedência da arguição.

Ex abundanti sempre se dirá que o Recorrente não tem qualquer razão na censura que, neste particular, dirige ao acórdão recorrido.

Efetivamente, a alínea a) do n.º 2 do art. 640.º do CPCivil é muito clara ao exigir que o recorrente indique com exatidão as passagens da gravação em que funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes. Compreende-se que assim seja. Como já houve oportunidade de se escrever no acórdão deste Supremo de 10.12.2015 (processo n.º 724/09.7TBAMT.P1.S1, cujo sumário pode ser acedido em www. stj/jurisprudência/sumários), “a lei, cooptando o recorrente para a colaboração com o tribunal e para a autorresponsabilização, visa agilizar a intervenção da Relação na reapreciação (que é pontual, no sentido de circunscrita a certos factos e a certas provas) da matéria de facto, dispensando-a da compulsão de ter de ir à procura da concreta informação que o recorrente julga ser interessante. Deste modo, a Relação passa à avaliação da informação tida por relevante sem ter de dissipar tempo a localizá-la em todo um acervo desinteressante no mais e, por vezes, extensíssimo.

A indicação com exatidão das passagens tem o seguinte significado: indicação do segmento da gravação onde está contida a informação que o recorrente entende apoiar o seu ponto de vista.

Donde, a simples indicação do momento do início e do fim da gravação de um certo depoimento não cumpre só por si a exigência legal”.

Neste sentido se tem pronunciado a jurisprudência das Relações (v. entre outros, os acórdãos da RC de 10.2.2015, processo nº 2466/11.4TBFIG.C1; da RG de 17.12.2014, processo 447/08.4TBAVV.G1; da RG de 10.11.2014, processo nº 1258/11.5TBPTL-A.G1; da RG de 30.1.2014, processo nº 273733/11.1YIPRT.G1, todos disponíveis em www.dgsi.pt) e deste Supremo (entre outros, v. o acórdão de 26.1.2017, processo n.º 599/15.7T8CLD.C1.S1, disponível em www.dgsi.pt).

Concordantemente, observa-se neste último acórdão que “… o que o preceito determina, é que o recorrente indique o início e o fim das passagens da gravação ou seja, as passagens do depoimento e não o início e o fim do depoimento. Se bastasse esta indicação do início e do fim do depoimento, a exigência legal careceria totalmente de fundamento, pois que a localização do início e do fim do depoimento não apresenta quaisquer dificuldades, ela consta da ata e é fornecida pelo próprio sistema de gravação. A indicação precisa do início e termo das concretas (…) passagens da gravação destina-se a simplificar a tarefa da Relação na reapreciação da prova gravada, não só chamando a atenção para aquela parte do depoimento, como tornando mais fácil e célere a respetiva localização na gravação, sabido como é que, em regra, cada testemunha depõe sobre mais do que um facto. De outra forma bastaria que o recorrente impugnasse a decisão sobre a matéria de facto cumprindo todos os ónus estabelecidos no art. 640º do CPC, com exceção do determinado na al. a) do nº 2, e requeresse a audição e reapreciação integral de todos ou de alguns os depoimentos o que significaria a repetição do julgamento, desiderato que não foi visado pelo legislador”.

Note-se que, contrariamente ao que parece pretender o Recorrente, este assunto nada tem a ver com uma outra temática conexa, que é a de saber se a indicação com exatidão das passagens pode ser colmatada pela transcrição na alegação dos excertos que o recorrente entenda serem relevantes, ou se são suficientes indicações e transcrições que constem do corpo da alegação. Sobre estas matérias já se pronunciou este Supremo[2], mas não é disto que aqui tratamos.

Na realidade, percorrendo a alegação que o Autor produziu na sua apelação vemos que não indicou com exatidão as passagens da gravação dos depoimentos das testemunhas que convocou para o efeito da pretendida modificação da matéria de facto (pontos 4 e 5 dos factos não provados), limitando-se, ao invés, a indicar os tempos do início e do fim de cada um dos depoimentos. Ou seja, limitou-se a indicar o que consta da ata da audiência, o que em si mesmo é um ato inútil e que nada esclarecia o tribunal de recurso quanto aos momentos das concretas passagens que o Autor entendia justificarem uma decisão diferente.

Tão pouco procedeu o Autor a quaisquer transcrições, limitando-se a produzir afirmações conclusivas acerca daquilo que, no seu modo de ver, deveria inferir-se ou retirar-se dos depoimentos em questão. Ocorre, porém, que o que conta é a avaliação do tribunal em face dos próprios depoimentos, a que tem mandatoriamente de aceder, e não as conclusões a que, a seu critério, chega a parte.

Improcedem pois as conclusões em destaque.

Quanto à matéria das conclusões 1 a 9:

Nestas conclusões insurge-se o Recorrente contra o acórdão recorrido por não ter revogado (mas sim mantido) a sentença da 1ª instância, entendendo que o acórdão devia ter fixado em pelo menos €25,00 por dia o prejuízo inerente à privação do veículo.

Embora neste particular o acórdão recorrido tenha mantido a sentença da 1ª instância, fê-lo por razões bem diversas das desta. Na realidade, embora o acórdão não o diga expressamente, resulta implícito da respetiva fundamentação - páginas 16 a 19 - que tal manutenção foi ditada simplesmente em decorrência do disposto no nº 5 do art. 635º do CPCivil, e não em decorrência de qualquer juízo confirmatório. Deste modo, não se formou neste segmento uma dupla conforme (pelo contrário, revela-se até um caso de “decisões desconformes” entre si).

Discordamos assim do que, a propósito (inadmissibilidade do recurso), diz a Ré na sua contra-alegação, de modo que nada impede o conhecimento do recurso na parte em presença.

Isto posto, recuperemos aqui os factos que estão provados (com a modificação feita operar pelo tribunal ora recorrido), e que são os seguintes:

1. No dia 31 de outubro de 2012, pelas 12h30, na rotunda existente entre a Av. … e a Av. …, em …, os veículos ...FB e NC... (de ora em diante, FB e NC, respetivamente) colidiram entre si;

2. O local do acidente caracteriza-se como sendo uma reta com duas vias de circulação em cada sentido, as quais, neste ponto da via, vão culminar numa rotunda, que separa as duas artérias (Av. … e Av. …), dando ainda acesso à Rua … e à Rua …;

3. Era dia, o tempo estava bom e seco, o piso é asfaltado e em bom estado de conservação;

4. Existia sinalização horizontal em ambas as vias (Av. … e Av. …) assinalando linha de cedência de passagem com símbolo triangular – marca M9a do Reg. Sinalização do Trânsito;

5. Existia sinalização vertical na rotunda realizada através do sinal de obrigação D4;

6. Na hora e local referidos, o NC, conduzido pelo autor, circulava na Av. …, percorrendo a via até ao seu fim, tendo passado a circular na rotunda ali existente, de forma a sair na 3ª artéria à sua direita, a fim de continuar a sua marcha na Rua …;

7. A dado momento, quando o NC já circulava via de circulação mais à direita, em plena rotunda, em posição transversal à Av. …, súbita e inopinadamente, foi embatido, do seu lado direito pela frente do FB;

8. Por força do embate, o autor perdeu o controlo do NC, conseguindo apenas imobiliza-lo já na Rua …;

9. O condutor do FB, pretendendo entrar na rotunda, conduzia de forma distraída sem atentar ao tráfego rodoviário, não abrandou a sua marcha e não cumpriu a sinalização horizontal de cedência de passagem e perda de prioridade;

10. O autor, como manobra de recurso, ainda tentou desviar o NC, o que se revelou impossível;

11. O NC circulava a uma velocidade não superior a 40 km/h;

12. O FB é propriedade de CC, que o tripulava nas circunstâncias de tempo e lugar descritas no ponto 1 dos factos provados;

13. CC celebrou com a ré, em 08/10/2012, um contrato de seguro automóvel obrigatório, titulado pela apólice n.º …, a fls. 104 a 105, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, em vigor por um ano e seguintes;

14. Como consequência direta e necessária do embate, o NC sofreu estragos nos componentes descritos no documento a fls. 107 a 110, necessitando de ver os mesmos substituídos ou reparados;

15. Tal reparação e substituição importa um custo de € 3.262,58 (três mil duzentos e sessenta e dois euros e cinquenta e oito cêntimos);

16. Por força do embate, o NC deixou de poder circular pelos próprios meios;

17. À data da contestação, a ré, mediante buscas feitas em sites de vendas de veículos usados, logrou localizar um … do ano de 1990, à venda por € 1.200 (mil e duzentos euros);

18. O NC, no seu atual estado sinistrado, tem o valor venal de € 250 (duzentos e cinquenta euros);

19. O autor comunicou o sinistro à ré em 31/10/2012;

20. O autor mandou transportar o NC para a oficina “DD Lda., em 31/10/2017;

21. O aluguer diário dum veículo ligeiro de mercadorias custa, pelo menos € 43,01 (quarenta e três euros e um cêntimo por dia);

22. Em 22/11/2012, a ré remeteu à mandatária do autor a comunicação a fls. 113, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, assumindo a responsabilidade pelo sinistro, disponibilizando os seus serviços clínicos, comunicando que considerava a perda total do veículo e disponibilizando um veículo de substituição;

23. Em 03/12/2012, a mandatária do autor remeteu à ré a comunicação a fls. 114 e 115, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

24. Como consequência direta e necessária do embate descrito no ponto 7:

a. O autor sofreu um agravamento transitório da sintomatologia álgica de que vinha sofrendo fruto de fibrose epidural e lesão crónica da raiz lombar esquerda L5 secundária a intervenção cirúrgica a que foi submetido em 2003;

b. Tal agravamento decorreu entre 03/11/2012 e 19/03/2013;

c. Tal agravamento é fixável no grau 3 duma escala de 7 valores;

d. Desenvolveu um quadro de stresse pós-traumático entre dezembro de 2012 e dezembro de 2013;

e. Não ficou a sofrer de nenhum Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica;

25. Para diagnóstico das lesões sofridas, o autor deslocou-se de ... a consulta médica no Porto, em clínica contratada pela ré, em 22/01/2013, tendo gasto, para o efeito, € 209,62 (duzentos e nove euros e sessenta e dois cêntimos) em táxi;

26. Para receber tratamentos de fisioterapia às lesões sofridas, o autor deslocou-se de ... à guarda, nos dias 29 de janeiro, 4, 19, 20 a 22, 25 a 28 de fevereiro, 4, 7, 8, e 11 a 15 de março de 2013, a clínica contratada pela ré, tendo gasto, para o efeito, € 659,88 (seiscentos e cinquenta e nove euros e oitenta e oito cêntimos) em táxi.

27. A oficina DD, Lda., cobrará quantia diária, não concretamente apurada, a título de parqueamento da viatura NC..., devida pelo menos desde 31.12.2012 até efetiva reparação da mesma.

Pugna o Autor por uma indemnização pela privação do veículo superior à que foi estabelecida.

Mas fá-lo sem razão.

Desde logo, observe-se que a indemnização em causa e cujo montante o Recorrente contesta - €1.000,00 – foi estabelecida segundo a equidade, nos termos do nº 3 do art. 566º do CCivil. E assim, parafraseando o que se escreveu no acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 20 de Outubro de 2011 (processo n.º 428/07.5TBFAF.G1.S1, disponível em www.dgsi.pt), podemos dizer que “… porque se trata de uma indemnização fixada segundo a equidade, de acordo com o (…) nº 3 do artigo 566º do Código Civil e, como o Supremo Tribunal da Justiça observou em outras ocasiões (cfr., por exemplo, o acórdão de 28 de Outubro de 2010 (www.dgsi.pt, proc. nº272/06.7TBMTR.P1.S1, em parte por remissão para o acórdão de 5 de Novembro de 2009, www.dgsi.pt, proc. nº 381-2002-S1), “a aplicação de puros juízos de equidade não traduz, em bom rigor, a resolução de uma «questão de direito»”; se o Supremo Tribunal da Justiça é chamado a pronunciar-se sobre “o cálculo da indemnização” que “haja assentado decisivamente em juízos de equidade”, não lhe “compete a determinação exacta do valor pecuniário a arbitrar (…), mas tão somente a verificação acerca dos limites e pressupostos dentro dos quais se situou o referido juízo equitativo, formulado pelas instâncias face à ponderação casuística da individualidade do caso concreto «sub iudicio»”. Nesta medida, parece que está fora dos nossos poderes dissentir do juízo indemnizatório que foi emitido, o que levaria à imediata improcedência da pretensão recursiva em apreciação.

Mas para o caso de assim se não entender, é de dizer que o Recorrente parte, para efeitos da pretendida quantificação do prejuízo diário inerente à privação do seu veículo, de factos que não estão provados. Efetivamente, invoca, como substrato do prejuízo (necessidade do uso da viatura), o cultivo de vários terrenos agrícolas, a necessidade de transportar mercadorias, artefactos e alfaias agrícolas e, em épocas diversas, a necessidade de transporte de pessoas para os diversos trabalhos agrícolas. Porém, tudo isto se reporta a factualidade que não vem provada. Ao invés até, foi dado como não provado que o Autor explorasse qualquer empresa e que tenha incorrido em quaisquer custos com a utilização de outros veículos (pontos 1 e 4 dos factos não provados, tal como descritos na sentença da 1ª instância). Note-se, a propósito, que este Supremo Tribunal está vinculado aos factos apurados nas instâncias, sendo sua incumbência aplicar o direito a esses factos e não discuti-los (v. art.s 674.º, n.º 3 e 682.º, n.ºs 1 e 2 do CPCivil).

Acresce dizer que, embora haja alguma tergiversação jurisprudencial em torno do dano da privação do uso, parece ser de subscrever o entendimento do acórdão deste Supremo Tribunal de 27 de Abril de 2017 (processo n.º 685/03.6TBPRG.G1.S1, disponível em www.dgsi.pt), que preconiza que “a questão da ressarcibilidade da «privação do uso» não pode ser apreciada e decidida em abstrato, aferida pela mera impossibilidade objetiva de utilização da coisa, porquanto a privação do uso é uma realidade conceitual distinta e não coincide, necessariamente, com a privação da possibilidade do uso, sendo certo que a pessoa só se encontra, de facto, privada do uso de uma coisa, sofrendo, com isso, um prejuízo, se, realmente, a pretender usar e a utilizasse, caso não fosse a impossibilitada de dispor da mesma, enquanto que se não pretender usá-la, ainda que, também, o não possa fazer, já se está perante a mera privação da possibilidade de uso, sem repercussão económica no património do titular, e que, só por si, não revela qualquer dano patrimonial indemnizável”.

Ora, tudo o que sabemos é que o veículo em questão era passível de utilização pelo Autor, e não já que essa utilização estivesse destinada a ser feita nos termos alegados pelo mesmo Autor, advindo-lhe assim, da privação do veículo, um prejuízo diário da ordem daquele que invoca.

Deste modo, e na melhor das hipóteses para o Autor, compreende-se e aceita-se a indemnização fixada na sentença da 1ª instância, tanto mais que se sabe que a Ré não deixou de lhe oferecer a possibilidade de uso de um veículo de substituição.

E daqui que nada há a censurar ao acórdão recorrido por não se ter decidido por outra indemnização superior.

Improcedem pois as conclusões em destaque.

IV. DECISÃO

Pelo exposto acordam os juízes neste Supremo Tribunal de Justiça em negar a revista.

Regime de custas:

O Recorrente é condenado nas custas do recurso.

                                                           ++

Sumário:

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Lisboa, 18 de Setembro de 2018

José Rainho (Relator)

Graça Amaral

Henrique Araújo

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[1] Por exemplo os acórdãos (da formação de juízes a que alude o n.º 3 do art. 672º do CPCivil) de 19 de Março de 2015, de 12 de Março de 2015, de 14 de Maio de 2015, de 2 de Julho de 2015, de 8 de Outubro de 2015 e de 22 de Outubro de 2015, todos sumariados em www.stj/jurisprudência/sumários (da formação).
[2] Assim, e para citar apenas um exemplo, no acórdão de 10.12.2015 (processo n.º 724/09.7TBAMT.P1.S1, cujo sumário pode ser acedido em www. stj/jurisprudência/sumários) decidiu-se que a alínea a) do nº 2 do art. 640º do Código de Processo Civil deve ser interpretada no sentido de que a impugnação da matéria de facto com base em prova gravada tanto se pode fazer mediante a indicação dos concretos segmentos da gravação como mediante a transcrição deles; no acórdão de 1 de julho de 2014 (processo nº 1825/09.7TBSTS.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt) sustentou-se que se se extrai da alegação que é feita uma resenha dos depoimentos das testemunhas e se faz menção das gravações em que os depoimentos se encontravam inseridos, o recorrente não deixa de cumprir, no essencial, as exigências legais, pelo que a 2ª instância deve proceder à reapreciação da decisão de facto; no acórdão de 9 de julho de 2015 (processo nº 284040/11.0YIPRT.G1.S1, disponível em www.dgsi.pt) decidiu-se que se o recorrente identificou os pontos de facto que considerava mal julgados, se indicou o depoimento das testemunhas que entendeu mal valorados, se forneceu a indicação da sessão na qual foram prestados e do início e termo dos mesmos e se apresentou a sua transcrição, tanto bastava para que a Relação tivesse procedido à reapreciação da matéria de facto, ao invés de a rejeitar; no acórdão de 29 de outubro de 2015 (processo nº 233/09.4TBVNC.G1.S1, disponível em www.dgsi.pt) afirma-se que “o ónus de indicação exacta das passagens relevantes dos depoimentos gravados deve ser interpretado em termos funcionalmente adequados e em conformidade com o princípio da proporcionalidade, não sendo justificada a imediata e liminar rejeição do recurso quando – apesar de a indicação do recorrente não ser, porventura, totalmente exacta e precisa - não exista dificuldade relevante na localização pelo Tribunal dos excertos da gravação em que a parte se haja fundado para demonstrar o invocado erro de julgamento, como ocorre nos casos em que, para além de o apelante referenciar, em função do conteúdo da acta, os momentos temporais em que foi prestado o depoimento complemente tal indicação com uma extensa transcrição, em escrito dactilografado, dos depoimentos relevantes para o julgamento do objecto do recurso”.