Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
5817/09.8TVLSB.L1.S1
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: SERRA BAPTISTA
Descritores: ADVOGADO
MANDATO FORENSE
RESPONSABILIDADE CONTRATUAL
CULPA
OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAR
NEXO DE CAUSALIDADE
TEORIA DA CAUSALIDADE ADEQUADA
PERDA DE CHANCE
Data do Acordão: 10/18/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA DO AUTOR, NÃO TOMAR CONHECIMENTO DO OBJECTO DO RECURSO DO RÉU
Área Temática: DIREITO CIVIL - RELAÇÕES JURÍDICAS/ NEGÓCIO JURÍDICO - DIREITO DAS OBRIGAÇÕES/ FALTA DE CUMPRIMENTO IMPUTÁVEL AO DEVEDOR/ CONTRATOS EM ESPECIAL
Doutrina: – António Arnault, Iniciação à Advocacia, p. 130.
- Armando Braga, A Reparação do Dano Corporal da Responsabilidade Extracontratual, p. 125.
- A. Reis, CPC Anotado, vol. II, p. 356.
- A. Varela, Manual de Processo Civil, p. 692.
- Carneiro da Frada, Direito Civil, Responsabilidade Civil, Método do Caso.
- Castro Mendes, Manual de Processo Civil, p. 299.
- Cunha Gonçalves, Tratado de Direito Civil, XII, p. 409.
- Galvão Telles, Direito das Obrigações, p. 404 e ss.
- Júlio Gomes, Direito e Justiça (Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa), vol. XIX (2005), T. II, p. 9 e ss, maxime p. 44.
- Moitinho de Almeida, Responsabilidade Civil dos Advogados, p. 8 e ss.
- Mota Pinto, Interesse Contratual Negativo e Interesse Contratual Positivo, I, p. 1103, nota de pé de página.
- M. Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, p.187, 297, 378.
- P. Lima e A. Varela, CCAnotado, vol. I, p. 579.
- Rute Teixeira Pedro, A Responsabilidade Civil do Médico, Reflexões sobre a noção da perda de chance a tutela do doente lesado, pp. 179 e ss., 192.
Legislação Nacional: CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGO 258.º, 262.º, 563.º, 798.º, 1157.º, 1158.º, Nº 1, 1178.º.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 484.º, N.º1, 678.º, Nº 1, 799.º, Nº 1.
ESTATUTO DA ORDEM DOS ADVOGADOS, APROVADO PELO DL 84/84, DE 16-3: - ARTIGOS 76.º, N.º3, 83.º, N.º1, AL. D).
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 25/6/98, BOL. 478, P. 369/370;
-DE 10/5/2001, Pº 01B829, IN WWW.DGSI.PT;
-DE 13/1/2009, Pº 3396/08-1;
-DE 26/10/2010, Pº 1410/04.0TVLSB.L1.S1, IN WWW.DGSI.PT.
-DE 10/3/2011, Pº 9195/03.0TVLSB.L1.S1;
-DE 29/5/2012, Pº 8972/06.5TBBRG.G1.S1.
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA:
-DE 9/11/2004;
-DE 9/3/2010, APELAÇÃO Nº 1712/05.8TVLSB.L1.
Sumário :     1. Tendo o autor pedido a condenação do réu/advogado a pagar-lhe indemnização por incumprimento do mandato com ele celebrado, é contratual a responsabilidade civil assacada (art. 798.º do CC).

      2. Tendo, para se aferir da responsabilidade civil do advogado, que se ter por preenchidos os respectivos pressupostos, nomeadamente, o do nexo de causalidade entre o facto e o dano.

      3. O nosso Código Civil, se bem que de forma não inteiramente correcta, acolheu a doutrina da causalidade adequada, não bastando, assim, que o evento tenha produzido (naturalística ou mecanicamente) certo efeito, para que este sob o ponto de vista jurídico, se possa considerar causado ou provocado por ele; sendo ainda necessário que o evento danoso seja uma causa provável, adequada, desse efeito.

       4. O problema do nexo de causalidade na sua vertente naturalística, envolve somente matéria de facto, escapando, assim, ao controlo deste STJ, como tribunal de revista.

       5. Para que um advogado possa ser responsabilizado pelos danos resultantes da perda de uma acção judicial, torna-se necessária a alegação e prova do nexo causal entre a sua censurável conduta (culposa) e os invocados prejuízos.

       6. Não bastando, para tal, a simples alegação e prova de que a contestação apresentada numa determinada acção judicial foi desentranhada por culpa do advogado, ficando provados os factos pelo aí autor alegados, com a consequente condenação do aí réu.

       7. A doutrina da perda de chance não tem apoio expresso na nossa lei civil, não tendo, em geral, virtualidade para fundamentar uma pretensão indemnizatória. Pelo que só em situações pontuais poderá ser atendida.

         8. Não relevando no caso concreto, por contrariar, em absoluto, o princípio da certeza dos danos e as regras da causalidade adequada.

Decisão Texto Integral:

                ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

                AAveio intentar acção, com processo ordinário, contra BB, pedindo a condenação deste a pagar-lhe a quantia de € 189 343,00, acrescida de juros de mora vencidos desde a citação e vincendos até integral liquidação.

                Alegando, para tanto, e em suma:

                Tendo contratado o réu, na qualidade de mandatário judicial, para o representar numa acção judicial contra si movida, aquele não apresentou contestação em prazo, tendo o autor sido condenado no pedido.

                O réu não alertou o autor para a sentença que em tal acção foi proferida, tendo sido surpreendido com a penhora no seu vencimento, altura em que, deslocando-se ao Tribunal, ficou a saber que havia sido condenado, já com trânsito em julgado, a pagar determinado valor indemnizatório e a restituir um imóvel da sua propriedade,

                Teve, então, que conseguir um acordo na acção executiva, contra o pagamento de € 17 500,00, teve que pagar custas no valor de € 2 325,90 e perdeu o imóvel, no valor de € 125 000,00.

                Para alem dos danos patrimoniais aludidos, sofreu danos não patrimoniais que melhor descreve, no valor de € 60 000,00.

                Tendo, ainda, pago ao réu a quantia de € 2 000,00 com vista à propositura de uma outra acção, que nunca deu entrada em Tribunal.

                Citado o réu, veio contestar, alegando, também em síntese:

                O desentranhamento da contestação apresentada, deveu-se a falta de provisão do autor.

                Deu conhecimento da sentença à mãe do autor, que pediu para nada dizer a este.

                Os questionados € 2 000,00 destinaram-se ao pagamento de honorários que lhe eram já devidos.

                Pede a condenação do autor como litigante de má fé.

                Respondeu o autor, peticionando, ainda, por seu turno, também a condenação do réu como litigante de má fé.

                Foi proferido o despacho saneador, tendo sido fixados os factos tidos por assentes e organizada a base instrutória.

                Realizado o julgamento, foi decidida a matéria de facto da base instrutória pela forma que do despacho junto de fls 239 a 244 consta.

                Foi proferida a sentença que, na parcial procedência da acção, condenou o réu a pagar ao autor a quantia de € 43 825,90 (€ 20 000,00 + € 2 000,00 + € 2 325,90 + € 17 500,00 + € 2 000,00), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação e até integral liquidação.

                Inconformado, veio o réu interpor recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa, onde, por acórdão de fls 379 e ss, na sua parcial procedência, foi absolvido da quantia relativa às custas em que o apelado foi condenado (exceptuando o montante relativo a custas decorrentes do desentranhamento da contestação que deverá ser da responsabilidade do apelante), bem como no valor de € 17 500,00 pago pelo apelado na acção executiva e dos montantes de € 2 000,00 e de € 20 000,00 fixados na sentença a título de danos patrimoniais. Ficando o apelante condenado, a título de danos patrimoniais, na quantia de € 8 050,00. No mais confirmando a sentença, tendo em consideração que nos juros de mora a taxa é a devida e em vigor à data da decisão.

                Agora irresignado, veio o autor pedir revista para este Supremo Tribunal de Justiça, pedindo a condenação do réu no pagamento de € 2 000,00 relativo às acções que não foram interpostas pelo recorrente, o valor das custas no valor de € 2 325,90 e o valor pago a título de indemnização na acção, fixado em € 17 500,00, mais o valor do imóvel objecto da acção em causa.

                Formulando, na sua alegação, as seguintes conclusões:

                1ª - Foi considerado assente, pela sentença e pelo Acórdão recorridos, que o advogado não cumpriu as suas obrigações profissionais, com culpa.

                2ª - Existem "in casu" todos os elementos cumulativos que condicionam a obrigação de indemnizar imposta ao réu, quais sejam, a culpa de quem prestou o serviço, o dano de quem o recebeu e o nexo de causalidade entre a culpa e o dano.

                3ª - Como se refere no Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa de 9/03/2010, não publicado e proferido no âmbito de uma acção que correu termos na vara dos presentes autos e secção sob o nº 1712/05.8TVLSB, em situação similar à dos autos, o « (...) dano consiste não no que resulta da perda da acção mas sim do que se designa por "perda de chance", quer dizer, perda pelo autor, ao dar instruções ao seu advogado ( ... )” neste caso, para contestar, da oportunidade de concretização da expectativa de a decisão apreciar o seu direito, direito esse que contrapunha o direito de reivindicação do imóvel peticionado pelos AA. nessa acção e de que o R. também se arrogava proprietário.

                4ª - Em relação á prova do direito invocado pelo Recorrente nessa acção haverá que considerar que o mesmo beneficiava desde logo da presunção do registo de propriedade do imóvel a seu favor. Mas também em relação a esse facto e face às acções que o Recorrente pretendia propor contra o alegado proprietário, A. naquela outra acção, a questão do registo se encontrava posto em causa pelo AA, ora Recorrente, registo esse que também se pedia o cancelamento.

                5ª - No que toca à prova da causalidade, não se trata, contudo, de um julgamento sobre as pretensões das partes, desde logo por ser impossível garantir o contraditório entre os sujeitos processuais envolvidos na disputa, mas apenas de uma análise da posição da parte “prejudicada”, para poder concluir-se (ou não) pela viabilidade «razoável e séria)) da procedência da sua pretensão.

                6ª - Tendo por base a teoria da causalidade adequada é de considerar que existe nexo causal entre o dano, ou seja não ver a sua posição de reivindicação da propriedade ser apreciada pelo tribunal, com a consequente perda do imóvel, e a conduta do Recorrido, conduta essa que determinou o desentranhamento da contestação.

                7ª - Face ao exposto, o Recorrido deverá ser condenado no pagamento dos 2.000 € relativo às acções que não foram interpostas pelo Recorrente, o valor das custas pagas pelo Recorrente no valor de 2.325,90 €, bem como o valor pago a titulo de indemnização na acção em causa, valor esse que após acordo na acção executiva se fixou em 17.500 €.

                8ª - Mais se dirá que, o Recorrido deverá ainda ser condenado no valor do imóvel objecto da acção em causa.

                9ª - Face ao exposto, o douto Acórdão recorrido não fez a melhor interpretação dos artigos 798° e 799°, ambos do Código Civil.

                10ª-      Face ao exposto, deverá conceder-se provimento ao presente recurso, substituindo-se o douto acórdão recorrido por outro que condene os Recorrido nos termos requeridos.

                Interpôs o réu recurso subordinado, tendo, por seu turno, na sua alegação, formulado as seguintes conclusões:

                1ª – O douto acórdão recorrido condenou o réu a pagar ao autor a quantia que este teve de pagar pela ocupação do imóvel entre Janeiro de 2004 e Junho de 2007, à razão de € 350,00 mensais, no total de € 8 050,00;

                2ª – Consta dos autos que essa quantia foi reduzida por acordo das partes para € 6 492,33.

                3ª – Nos termos do art. 483.º, nº 1 do CC, o R. tem de indemnizar pelos danos resultantes dessa violação. Esses danos estão determinados e são de € 6 492,33, pelo que deve ser essa a quantia a pagar pelo réu ao autor.

                4ª – Deve, assim, corrigir-se o douto acórdão recorrido na parte em que condena o réu a pagar ao A. a quantia de € 8 050,00, substituindo-se essa quantia pela de € 6 492,33.

                Veio, ainda, o mesmo réu, ora também recorrido, contra-alegar, pugnando pela manutenção do decidido.

                Tendo o recorrente       respondido ao recurso subordinado do réu, pedindo a improcedência do recurso.

                Corridos os vistos legais, cumpre, agora, apreciar e decidir.

                Vem dado como PROVADO:

                1. O R. exerce a profissão de Advogado, e no exercício da sua profissão o A. contratou o R. para o representar em processo judicial que correu os seus termos pelo 3º Juízo do Tribunal Judicial de Torres Vedras, sob o n.º37/04.0 TBTVD, proposto por CC contra o ora A.;

                                2. No referido processo, o R., ora A., requereu que lhe fosse concedido o benefício do apoio judiciário na modalidade de dispensa total do pagamento da taxa de justiça e demais encargos com o processo, de nomeação de patrono e pagamento dos respectivos honorários, tendo tal pedido sido indeferido;

                3. Notificado o R., enquanto mandatário do A., do indeferimento, o mesmo efectuou o pagamento fora de prazo da taxa de justiça inicial e devida aquando da apresentação da contestação do seu Cliente, ora A., e, consequentemente, foi notificado para o pagamento da multa prevista nos nºs 3 e 4 do artigo 486º-A do Código de Processo Civil conforme despacho de fls. 81 a 82 do processo referido (cf. doc. de fls. 17 e 18);

                 4. Notificado do despacho referido no artigo anterior, o R. não pagou as guias que lhe foram remetidas para o escritório, tendo por isso sido condenado no pagamento da multa prevista nos n.º 5 e 6 do artigo 486º-A do Código de Processo Civil;

                5. Por requerimento que deu entrada em juízo, via fax, a 29 de Setembro de 2004, o ora R., alegando justo impedimento para a prática do acto requereu autorização para que o pagamento da referida multa, sem acréscimo da multa prevista nos n.ºs 5 e 6 do artigo 486-A do Código de Processo Civil, o que foi indeferido nos termos do despacho de fls.20 a 25 cujo teor se reproduz, datado de 05/07/2005, e foi o requerente ora R. notificado para proceder ao pagamento das duas multas em falta sob pena de ser determinado o desentranhamento da contestação já junta aos autos, bem como condenado em custas do incidente;

                6. O R. não procedeu ao pagamento das multas aludidas e por despacho datado de 24-10-2005, foi ordenado o desentranhamento da Contestação e foram considerados confessados os factos alegados pelo A. nessa acção;

                7. Por sentença proferida a 15-01-2007, e tendo por base os factos alegados e confessados pelo R. nessa acção, ora A., foi o mesmo condenado a reconhecer o direito de propriedade do A. nessa acção, do prédio urbano, designado pela letra “Q”, correspondente ao 3º andar, segundo a contar da entrada do lado sul, sito na Rua ................., Santa Cruz, Torres Vedras, inscrito na matriz sob o nº 0000 e inscrito na CRP sob o nº 595, condenando-o ainda a restituir tal imóvel, bem como ao pagamento da quantia de 13.650 €, bem como o valor de 350 € mensais até entrega efectiva da fracção (cf. sentença junta a fls. 27 a 32 cujo teor se reproduz);

                8. O R. foi notificado da sentença;

                9. Em Maio de 2007, o R. informou o seu Cliente, ora A., que teriam de propor uma acção contra CC e mulher, DD e EE tendo inclusivamente facultado cópia de acção declarativa de condenação a propor, mais facultou cópia ao ora A. de providência cautelar que, no seu entender, igualmente deveria ser interposta contra CC e mulher, DD (Documento de fls. 35 a 55);

                10. Tais acções não deram entrada no tribunal;

                11. Em Agosto de 2007, o A. foi notificado da penhora de 1/3 do seu vencimento enquanto trabalhador da empresa “A Bola - Sociedade Vicra Desportiva, S.A.”, decorrente da condenação referida supra;

                12. Em reunião agendada entre A. e R. este informou que iria elaborar requerimento judicial de oposição à penhora e disponibilizou-se ainda para remeter à entidade patronal e-mail esclarecedor de toda a situação, o que efectivamente fez (cf. doc. de fls. 57);

                13. No âmbito da acção aludida o A. foi condenado no pagamento das custas do processo e que ascenderam, a € 2.325,90 (dois mil trezentos e vinte cinco euros e noventa cêntimos), tendo o mesmo solicitado o pagamento das mesmas em 12 prestações mensais iguais e sucessivas, o que foi deferido (cf. docs de fls. 65 a 70 cujo teor se reproduz);

                14. O R. não informou o A. do despacho referido em 5., nem solicitou qualquer provisão para despesas, para além das já entregues pelo ora A.;

                15. O R. notificado da sentença proferida nos autos referidos não informou ou facultou cópia da mesma ao A.;

                   16. O A. concordou com as interposições das acções referidas em 9.  e com data de 28/05/2007 foi entregue ao R. o valor de € 2.000,00;

                17. O R., em Junho de 2007, sem dar conhecimento da sentença ao A., diligenciou no sentido da entrega, por parte do ora A., da fracção autónoma objecto dos referidos autos;

                18. O A. no âmbito da acção executiva referida conseguiu efectuar transacção tendo sido reduzido o pedido para o valor total de € 17.500,00;

                19. A perda pelo A. da fracção autónoma em causa causou-lhe sofrimento;

                20. E o A. perante a penhora de parte do seu salário passou pela “vergonha” de, no seu emprego, os seus colegas de trabalho terem conhecimento da situação em que se encontrava envolvido e ser consequentemente tema de conversa;

                21. E face à dificuldade financeira que passou a atravessar teve que retirar o seu filho, menor com 6 anos de idade, do colégio particular que frequentava desde os 3 anos e matriculá-lo numa escola de ensino oficial;

                22. Nas relações tidas entre A. e R. normalmente os assuntos eram tratados através da mãe do A.

                23. A mãe do A. entregou ao réu um cheque no valor de 480 €, com data de 19/05/04 e o mesmo apresentado a pagamento a 24/05/2004, foi devolvido por falta de provisão;

                24. A mãe do A. encarregou-se de retirar os móveis e objectos da fracção sita em Santa Cruz aludida supra, a pedido do R. e por forma a entregar livre e devoluta a mesma aos mandatários da outra parte.

             As conclusões da alegação dos recorrentes, como é bem sabido, delimitam o objecto do recurso – arts 684º, nº 3 e 690º, nº 1 e 4 do CPC, bem como jurisprudência firme deste

Supremo Tribunal.

Sendo, pois, as questões atrás enunciadas e que pelos recorrentes nos são colocadas que cumpre apreciar e decidir.

I - Recurso independente do autor:

Pretende o autor, no fundo, haver ficado definida a responsabilidade civil do réu, com a consequente obrigação do mesmo de o indemnizar, por preenchidos se deverem ter os respectivos pressupostos: a culpa, o dano e o nexo de causalidade entre aquela e este, já que outros não estão em causa.

Vejamos:

Vem das instâncias dado como assente, sem censura das partes, na configuração do negócio jurídico entre elas celebrado, estar-se perante um contrato de mandato oneroso e com representação (arts 1157.º, 1158.º, nº 1, 1178.º, 258.º e 262.º, do CC[1])[2]/[3].

Assumindo o advogado uma obrigação de meios e não de resultado.

Competindo-lhe representar o cliente em Juízo, defendendo pela melhor forma possível os interesses que este lhe confiou.

Sempre se dizendo que o pedido que o autor formula na acção que intentou é o de indemnização por incumprimento do mandato que terá celebrado com o réu, advogado, para o representar na acção que lhe havia sido movida por CC, em Torres Vedras, não tendo o mesmo, por sua conduta negligente, contestado[4], pelo que foram considerados confessados os factos articulados pelo aí autor. Tendo, por via disso, sido condenado nos pedidos da acção.

E, assim, a responsabilidade civil que ao réu é assacada é a contratual, nos termos do art. 798.º e ss, já que advirá do não cumprimento de uma obrigação pelo réu contraída por força do aludido mandato forense: a de defender o ora autor, ali réu, da condenação que na acção era pedida. Contestando, desde logo, a mesma, para assim evitar os efeitos da revelia consignados no art. 484.º, nº 1 do CPC[5]/[6].

Sendo dever do advogado, na sua relação com o cliente, alem de outros, “(…) tratar com zelo a questão de que seja incumbido, utilizando, para o efeito, todos os recursos da sua experiência, saber e actividade – art. 83.º, nº 1, al. d) do Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pelo DL 84/84, de 16 de Março, então em vigor[7].

Devendo o advogado cumprir pontual e escrupulosamente, e alem do mais, todos os deveres consignados no Estatuto – seu art. 76.º, nº 3.

Tendo a Relação entendido, na esteira do já decidido a propósito, na 1ª instância, que o réu agiu com culpa, sendo-lhe imputável, desde logo, o desentranhamento da contestação, com as suas imediatas e legais consequências.

Sendo certo que a mesma, se provada não ficasse, sempre se presumiria, já que, na responsabilidade contratual em apreço, e nos termos do prescrito no art. 799.º, nº 1, incumbe ao devedor provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procede de culpa sua.

Não se mostrando nos autos tal presunção ilidida.

E, assim, assente que está, sem censura nossa, que o advogado, ora réu/recorrido, não cumpriu as suas obrigações para com o mandante, levando a que, com a sua omissão, fosse desentranhada a contestação que antes apresentara, com as faladas consequências imediatas e resultantes da lei, há que saber, desde já – e dessa respectiva decisão da Relação diverge o ora recorrente – se está estabelecida a relação de causalidade entre os danos alegados e comprovados e a conduta culposa do réu.

Sendo certo ser necessária a alegação e prova, por banda do autor, do nexo de causalidade entre o facto (a conduta omissiva do réu) e os invocados danos.

Sabendo-se também que o problema do nexo de causalidade, na sua vertente naturalística, envolve somente matéria de facto, assim escapando ao controlo deste STJ, como Tribunal de revista.

Não bastando, com efeito, qualquer acto ou omissão no exercício do mandato para que surja, por banda do advogado, e sem mais, obrigação de indemnizar os invocados e até comprovados prejuízos.

Tendo a actuação (ou omissão) do causídico, mesmo que culposa, que ser adequada a produzir tais danos.

Pois, como já dito, o nexo de causalidade entre o facto e o dano é um dos requisitos da obrigação de indemnizar.

Prescrevendo o art. 563.º, sob a epígrafe de “nexo de causalidade”, que “A obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”.

Acolhendo o nosso Código Civil, se bem que de forma não inteiramente correcta, a doutrina da causalidade adequada[8] que, de resto, já vinha sendo a dominante em Portugal, resultando dos trabalhos preparatórios de tal diploma (de 1966) o propósito de a aceitar[9].

E, assim, não basta que o evento tenha produzido (naturalística ou mecanicamente) certo efeito, para que este, sob o ponto de vista jurídico, se possa considerar causado ou provocado por ele: sendo ainda necessário que o evento danoso seja uma causa provável, adequada desse efeito. Não bastando, pois, a relação de condicionalidade concreta entre o facto e o dano, sendo, ainda, preciso que, em abstracto, o facto seja uma causa adequada do dano[10].

Sendo antes necessário, para que um facto seja causa de um dano, que, por um lado, no plano naturalístico, ele seja condição (directa ou indirecta) sem a qual o dano se não teria verificado, e, por outro, que em abstracto ou em geral, seja causa adequada do mesmo.

Afirmando Vaz Serra, a propósito: “Não podendo considerar-se como causa em sentido jurídico toda e qualquer condição, há que restringir a causa àquela ou àquelas condições que se encontrem para com o resultado numa relação mais estreita, isto é, numa relação tal que seja razoável impor ao agente responsabilidade por esse resultado”[11]

Ora, vem dado como assente da Relação que o facto de o réu/advogado não ter pago a taxa de justiça atempadamente, não tendo ainda pago a subsequente multa, originou, de forma a ele culposamente imputável[12], o desentranhamento da contestação, com a confissão dos factos pelo autor na dita acção judicial alegados, com a condenação do ora autor nos pedidos.

Seguindo-se a acção executiva, da qual o ora autor apenas teve conhecimento quando foi notificado da penhora no seu ordenado.

Com a consequente censura de tal comportamento do réu. Que não terá agido de forma adequada à eventual defesa dos interesses do seu cliente, ora autor.

Não se tendo, porem, apurado que, se a contestação tivesse sido apresentada, o ora recorrente, nesta acção autor e na outra réu, teria saído vencedor, sem o reconhecimento do direito de propriedade sobre a fracção naquela dita acção em apreço, que já se encontrava registada no registo predial em nome do então demandante[13], que assim beneficiava da respectiva presunção (art. 7.º do CdRP).

Devendo o recorrente, para ficar apurado o adequado nexo causal da sua conduta/omissão em relação aos danos que lhe teriam sido provocados pelo reconhecimento do direito de propriedade da dita fracção, em causa na outra acção, e à restituição da mesma ao aí autor, ter demonstrado que a contestação a apresentar teria possibilidade de êxito.

Alegando factos, à data verificados, que permitissem concluir ser ele o dono da fracção, mau grado o registo predial em nome do então autor, ou, pelo menos, ter o mesmo algum título que lhe permitisse a legal ocupação.

Sendo da experiência comum que as acções judiciais, mesmo que contestadas, podem não lograr vencimento. Assim sucedendo em inúmeras ocasiões.

Pois, se a falta de contestação pode equivaler à confissão dos factos alegados, a apresentação de tal articulado não equivale, sem mais, ao vencimento ou ao não decaimento do réu.

Todos sabemos isso.

Não se podendo, assim, na parte aqui em apreço - e sem prejuízo de não se obrigar o ora recorrente a comprovar que não teria seguramente decaído na aludida acção de reivindicação contra ele antes proposta[14] - dar, sem mais, como apurado o nexo de causa/efeito entre o facto e o dano, sob o ponto de vista da causalidade adequada de que ora curamos[15]. Sendo o desentranhamento da contestação, sem outros factos provados a respeito[16], e, assim, desde logo, sem outros factos a propósito apurados, segundo as regras da experiência, condição do prejuízo[17].

E, se dizemos não constar da matéria de facto apurada base suficiente para se aferir da aludida casualidade adequada, sucede que tal matéria não está minimamente alegada pelo ora autor, o qual, a propósito, apenas conclui que o desentranhamento da contestação, por via da conduta do seu então advogado, ora réu, permitiu a sua condenação nos pedidos da acção.

Trata-se, como dito, de uma mera conclusão, que deveria ter sido espraiada em factos que a permitissem afirmar[18].

O aqui autor, ora recorrente, não alegou, pois, nem consequentemente provou, factos donde se possa inferir que o aludido desentranhamento da contestação foi condição adequada dos danos sofridos.

Sendo certo que o princípio dispositivo, ainda hoje, embora de forma mitigada, básico na nossa processualística civil, tem como reverso da medalha o princípio da auto-responsabilidade das partes[19].

Suportando cada uma delas, como resultado de tal princípio, um ónus de afirmação (alegação).

E, decidir que tal ónus pertence a uma das partes – o ónus de alegar factos donde se possa inferir o aludido e adequado nexo causal pertence ao autor que invoca a responsabilidade contratual (ou extra-contratual, vai dar ao mesmo) do réu – significa que será julgado o pleito contra si se os factos não alegados forem indispensáveis à sua pretensão.

Sendo certo que o problema do ónus de afirmação – o de saber quem corre o risco da falta de alegação de factos indispensáveis para se decidir o pleito em certo sentido – não deixa de ser idêntico ao do ónus de prova – o de saber quem corre o risco de não provar o respectivo facto alegado – tudo isto significando que os critérios gerais em sede de ónus de prova valem, de igual modo, para o ónus de afirmação[20].

Mais se podendo dizer, e como também é bem sabido, estar consagrado no nosso ordenamento jurídico o princípio da substanciação, segundo o qual não basta a indicação genérica do direito que se pretende fazer valer, sendo antes necessária a indicação especificada dos factos constitutivos desse direito[21].

Competindo, assim, ao autor, articular os factos essenciais e concretos que se inserem na previsão da norma ou normas jurídicas que acolhem o seu arrogado direito, como meio, desde logo, de satisfazer o contraditório, porquanto só dessa maneira o réu se poderá cabalmente defender.

O que in casu, não sucedeu.

Mas, diz, ainda, o ora recorrente: o dano não resultará da perda da acção em si mesma, mas sim do que se designa por “perda de chance”, ou seja, da perda pelo autor da oportunidade de se concretizar a expectativa da decisão apreciar o seu direito, que contrapunha o direito de reivindicação do imóvel naquela outra acção peticionado ao direito de propriedade sobre o mesmo prédio de que o ora autor/recorrente, ali réu, também se arrogava proprietário.

Estamos, agora, perante a problemática da denominada “perda de chance”, ou de oportunidade, muito actual no campo da responsabilidade civil, mormente no da responsabilidade civil dos médicos e dos advogados.

Tendo tal doutrina surgido em França, nos anos sessenta do século passado, sem grande acolhimento na nossa doutrina e na jurisprudência deste Supremo Tribunal[22]/[23].

Acolhendo-se aqui, pela sua bondade, e na generalidade, a apreciação doutrinal a que a teoria da perda de chance, ora em apreço, foi esquematicamente sujeita no acórdão deste STJ de 26/10/2010, da autoria, como relator, do Conselheiro Azevedo Ramos[24], o qual, com a vénia devida, se segue de perto.

Segundo Armando Braga[25], consiste tal dano na perda da probabilidade de obter uma futura vantagem, sendo, contudo, a perda de chance uma realidade actual e não futura.

Reportando-se o mesmo dano ao valor da oportunidade perdida (estatisticamente comprovável) e não ao benefício esperado.

Devendo ser avaliado em termos hábeis, de verosimilhança, e não segundo critérios matemáticos, sendo o quantum indemnizatório fixado atendendo às probabilidades de o lesado obter o benefício que poderia resultar da chance perdida.

Carneiro da Frada[26], estudando também o problema, em foco na responsabilidade médica (o atraso do diagnóstico que diminui em 40% as possibilidades de cura do doente) e na exclusão (indevida) de um sujeito a concurso, privando-o da hipótese de o ganhar, conclui que uma das formas de resolver este género de problemas é o de considerar a perda de oportunidade como um dano em si, como que antecipando o prejuízo relevante em relação ao dano (apenas hipotético, v.g., ausência de cura, perda de concurso), para cuja ocorrência se não pode asseverar um nexo causal suficiente.

Havendo que se consubstanciar como um bem jurídico tutelável a mera possibilidade de uma pessoa se curar, de se apresentar a um concurso (…).

E, se no plano contratual, a perda de oportunidade pode desencadear responsabilidade de acordo com a vontade das partes, no campo delitual tal caminho é bem mais difícil de trilhar.

Afigurando-se indispensável na quantificação do dano, e nos problemas que daí advirão, um juízo de probabilidade.

Rute Pedro[27] refere que a perda de chance, enquanto tal, está ausente no nosso direito, poucos sendo os autores que a ela aludem, sendo certo que, quando o fazem, dedicam-lhe uma atenção lateral e pouco desenvolvida.

Erigindo a chance à categoria de entidade autónoma, sendo o dano que resultará da sua frustração também dotado de autonomia e substancialmente diverso do dano decorrente da perda do resultado por ela propiciado.

Pressupondo a aceitação do ressarcimento do dano derivado da frustração de uma chance a prova inequívoca da sua existência.[28]

Para Júlio Gomes[29] afigura-se-lhe que a mera perda de uma chance não terá, em geral, entre nós, virtualidades para fundamentar uma pretensão indemnizatória.

E, na medida em que a doutrina ora em questão seja invocada para introduzir uma noção de causalidade probabilística, parece-lhe que a mesma, pelo menos de jure condito, deverá ser rejeitada entre nós[30].

Admitindo, contudo, um espaço ou dimensão residual da perda de chance no nosso direito vigente: no caso de situações pontuais, como a situação em que ocorre a perda de um bilhete de lotaria, ou em que se é ilicitamente afastado de um concurso. Tratando-se de situações em que a chance já se densificou o suficiente para, sem se cair no arbítrio do juiz, se poder falar no que Tony Weir apelidou de “uma quase propriedade”, de “um bem”.

Também Mota Pinto[31] nos diz que não parece que exista, para já entre nós, base jurídico-positiva para apoiar a indemnização baseada na perda de chance.

Também aqui se concluindo não relevar a teoria em apreço, a da perda de chance, por esta, desde logo, não estar, in casu, suficientemente densificada, contrariando em absoluto, a ser agora seguida, as regras da causalidade adequada atrás enunciadas e a devida certeza dos danos.

Caindo-se, se acolhida fosse, nas presentes circunstâncias, no puro arbítrio do Tribunal, desconhecendo-se de todo em todo se a censurável conduta do réu, descurando, é certo, em abstracto os interesses do ora autor, foi condição adequada ou até bem provável do dano arrogado. Não se sabendo, desde logo por falta de alegação do autor a propósito, e como já dito, se havia alguma hipótese de, contestada que fosse a acção, a tese do mesmo poder lograr vencimento, com a improcedência da acção reivindicatória[32].

Pelo que também não pode proceder esta pretensão do autor/recorrente.

Na 1ª instância foi o réu condenado a pagar as seguintes quantias:

a) € 20 000,00 – valor do imóvel;

b) € 2 000,00 – relativo às acções que não foram propostas;

c) € 3 325,90 – montante relativo a custas pagas pelo autor;

d) € 17 500,00 – valor fixado na acção executiva a título de indemnização;

e) € 2 000,00 – valor fixado a título de danos não patrimoniais.

                A Relação, no acórdão ora recorrido, absolveu o réu dos montantes aludidos em a), b), c) (com excepção do montante relativo a custas devidas pelo desentranhamento da contestação) e d), mantendo a condenação do mesmo na quantia reportada aos danos não patrimoniais (€ 2 000,00), mais o condenando, ao invés dos € 17 500,00, na quantia de € 8 050,00, respeitante à indemnização pela ocupação que o ora autor teve que pagar, desde 5/7/2005 (data do despacho que ordenou o pagamento da multa que, uma vez não liquidada, deu lugar ao desentranhamento da contestação e a que fossem considerados os factos pelo então autor (na tal acção de Torres Vedras) alegados) e a entrega da fracção (Junho de 2007). Entendendo que, não tendo o réu advogado transmitido tal situação ao então réu, aqui autor - antevendo-se, com normalidade a sua condenação nos pedidos – não permitiu que o mesmo pudesse tomar a atitude adequada, desde logo, entregando a fracção[33].

                Cremos que a Relação, face à posição tomada quanto à problemática do necessário nexo da causalidade adequada, que aqui, no essencial, acolhemos, decidiu com acerto.

            

                Não tendo ficado apurado tal nexo em relação à “perda” da casa, nem em relação à quantia de € 2 000,00 entregue pelo ora autor ao aqui réu em 28/5/2007.

                E, não tendo ficado demonstrado o adequado nexo causal entre a perda da acção e a censurável conduta do senhor advogado, ora réu, razão não há, salvo a ressalva feita, para imputar ao mesmo, sem mais, as custas da acção.

                II – Recurso subordinado do réu:

                Se bem entendemos o ora recorrente, discorda o mesmo da sua condenação no montante de € 8 050,00, devendo tal condenação limitar-se à quantia de € 6 492,33 (resultante da redução da quantia indemnizatória em que o réu da dita acção, aqui autor, foi também condenado).

                Havendo, assim, uma diferença a seu favor na ordem dos € 1 557,67.

                Ora, o recurso ordinário só é admissível, fora excepções que aqui não importam, quando a causa tenha valor que seja superior à alçada do Tribunal[34]e a decisão impugnada seja desfavorável para o recorrente em valor superior a metade dessa alçada – art. 678.º, nº 1 do CPC.

                Fácil é ver que o valor ora em causa é bem inferior a tal montante,

                Pelo que o recurso interposto subordinadamente, tendo em conta o seu objecto, não é admissível.

                   Não se tomando, consequentemente, do mesmo conhecimento.

                Face a todo o exposto, acorda-se neste Supremo Tribunal de Justiça em se negar a revista do autor e em não se tomar conhecimento do objecto do recurso subordinado do réu.

                Custas, em ambos os recursos, pelos respectivos recorrentes.

Lisboa, 18 de Outubro de 2012

Serra Baptista (Relator)

Álvaro Rodrigues

Fernando Bento

__________________________

            
[1] Sendo deste diploma legal todas as disposições a seguir citadas sem referência expressa.
[2] Tem-se discutido se a responsabilidade civil profissional do advogado é de natureza contratual, extracontratual ou mista. Defendendo-se, na primeira tese, que ela resulta do contrato de mandato, ou de contrato sui generis, atípico ou inominado; na segunda, o carácter público da actividade forense e a violação dos deveres que legalmente lhe são exigíveis; na terceira, adoptando-se a concorrência de ambas as responsabilidades, podendo o acto ou omissão do advogado constituir responsabilidade contratual ou extracontratual, havendo que fixar em concreto o respectivo regime jurídico – António Arnault, Iniciação à Advocacia, p. 130, com menção de doutrina a respeito.
[3] Segundo a chamada doutrina do cúmulo ou da opção, o lesado tanto pode beneficiar das regras de um ou do outro tipo de responsabilidade (da contratual ou da extracontratual ou aquiliana), invocando aquelas que melhor lhe convierem desde que não se socorra, na mesma acção, das regras privativas de uma ou de outra espécie de responsabilidade. Sendo certo que em ambas terão que ser sempre preenchidos os seguintes elementos cumulativos – (i) culpa de quem presta o serviço, (ii) dano daquele para quem o serviço é prestado, e (iii) nexo de causalidade entre a culpa e o dano – Moitinho de Almeida, Responsabilidade Civil dos Advogados, p. 8 e ss.
[4] Se bem que tivesse sido apresentada contestação, a mesma foi mandada desentranhar por culpa do aqui réu. O que vai dar ao mesmo.
[5] No sentido de que a responsabilidade civil profissional que resulta de inexecução ou má execução do mandato forense, é a contratual, cf. Acs deste STJ de 26/10/2010 (Azevedo Ramos), com menção de outros arestos de idêntico teor e de 10/3/11 (Távora Vítor), Pº 9195/03.0TVLSB.L1.S1.
[6] No Ac. da RL de 9/11/2004 (Maria do Rosário Morgado), depois de se referir que o advogado tanto pode ter estabelecido com o demandante uma relação contratual, como pode suceder que preste serviços em virtude de uma relação de amizade ou por exigências legais e dever de ofício, conclui que existindo uma relação contratual entre o profissional e o cliente, a responsabilidade derivada do incumprimento das suas obrigações (dele, advogado), por negligência ou imperícia, assume natureza contratual. Devendo o advogado, na relação contratual que o une ao cliente, executar a actividade para a qual foram contratados os seus serviços, orientada para proteger os interesses do cliente e alcançar determinado resultado, embora não esteja vinculado à obtenção desse resultado.
[7] Sendo comummente entendido que a omissão dos deveres profissionais do advogado, alem da responsabilidade disciplinar em que o fará incorrer, também os faz incorrer em responsabilidade civil – Cunha Gonçalves, Tratado de Direito Civil, XII, p. 409.
[8] Que Galvão Telles também assim formulou: “Como causa adequada deve considerar-se, em princípio, toda e qualquer condição do prejuízo. Mas uma condição deixará de ser causa adequada, tornando-se, pois, juridicamente indiferente, desde que seja irrelevante para a produção do dano segundo as regras da experiência, dada a sua natureza e atentas as circunstâncias conhecidas do agente, ou susceptíveis de ser conhecidas por uma pessoa normal, no momento da prática da acção. E dir-se-á que existe aquela irrelevância quando, dentro deste condicionalismo, a acção não se apresenta de molde a agravar o risco de verificação do dano – Direito das Obrigações, p. 405.
[9] Galvão Telles, ob. cit., p. 404 e ss.
[10] P. Lima e A. Varela, CCAnotado, vol. I, p. 579 e Acs do STJ de 25/6/98 (Miranda Gusmão), Bol. 478, p. 369/370 e de 10/5/2001 (Óscar Catrola), Pº 01B829, in www.dgsi.pt, entre outros.
[11] Ac. do STJ de 26/10/2010, já antes citado.
[12] Pois o ora réu, dizem ainda as senhoras Desembargadoras, não agiu de acordo com as regras estatutárias e deontológicas da sua profissão, violando, desde logo, o dever de agir de forma a defender os interesses legítimos do cliente, não tendo, assim, cumprido o mandato ou cumprindo-o de forma deficiente, sendo-lhe imputável tal incumprimento e de forma culposa, que não ilidiu.
[13] Não constando da sentença proferida na dita acção de reivindicação, contrariamente ao ora alegado pelo recorrente, que o mesmo aí beneficiava da presunção de registo da propriedade do imóvel a seu favor, desconhecendo-se porque não foram intentadas as acções que se pretendiam propor contra o alegado proprietário (conclusão 4ª).
[14] Ou até que teria vencido eventual pedido reconvencional deduzido, havendo factos que, por certo, a tal levariam.
[15] Acs do STJ de 10/5/2001, já citado, embora a propósito de um caso de falta de alegação neste Tribunal, com perda da causa, de 13/1/2009 (Garcia Calejo), Pº 3396/08-1, crendo-se que não publicado, de 29/5/2012 (João Camilo), Pº 8972/06.5TBBRG.G1.S1 e da RL de 9/3/2010 (Antas de Barros), apelação nº 1712/05.8TVLSB.L1.
[16] Que apontassem para uma forte probabilidade do ora autor, réu na aludida acção de reivindicação, ocupar a fracção predial de forma lícita.
[17] Ao invés, diz-nos a experiência que a presunção do registo, em regra, não é ilidida. Não se querendo com isto afirmar que o não seja, por vezes. Ou que o réu, numa acção de reivindicação, não provando, embora, a propriedade do prédio em causa, não tenha título bastante para a sua ocupação (cf. art. 1311.º).
[18] Não se exigindo ao aqui autor, com este nosso entendimento, um esforço hercúleo, desproporcionado ao exercício do seu arrogado direito, pois bastar-lhe-ia alegar (e provar) os factos que terá levado ao conhecimento do então seu advogado, ora réu, que lhe permitissem não decair na acção que contra ele foi proposta, designadamente os que pudessem consubstanciar a aquisição do prédio (já que o ali autor, face ao registo a seu favor, beneficiava da presunção legal da titularidade do direito, que haveria de ser ilidida) ou qualquer título legítimo de ocupação. Podendo (devendo) até procurar juntar a contestação a seu tempo desentranhada, socorrendo-se, se necessário, no preceituado no art. 528.º do CPC, para se aquilatar dos factos nela insertos, podendo daí resultar (da sua prova) como bem provável, com foros de verosimilhança, o seu não decaimento na acção.
[19] M. Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, p. 378.
[20] M. Andrade, ob. cit., p. 187.
[21] A. Reis, CPC Anotado, vol. II, p. 356, M. Andrade, ob. cit., p. 297, Castro Mendes, Manual de Processo Civil, p. 299 e A. Varela, Manual de Processo Civil, p. 692.
[22] Citado Ac. deste STJ de 29/5/2012.
[23] Rute Teixeira Pedro, A Responsabilidade Civil do Médico, Reflexões sobre a noção da perda de chance a tutela do doente lesado, p. 192, dá-nos conta que as primeiras aplicações desta figura, em França, remontam ao fim do século XIX.
[24] Pº 1410/04.0TVLSB.L1.S1, in www.dgsi.pt.
[25] A Reparação do Dano Corporal da Responsabilidade Extracontratual, p. 125.
[26] Direito Civil, Responsabilidade Civil, Método do Caso.
[27] Ob. cit., p. 179 e ss.
[28] Esta autora, na mencionada obra, falando-nos dos diferentes núcleos respeitantes à doutrina em questão, refere-se, de forma expressa, à perda de chance processual, dando como exemplo, entre outros, o do advogado que não contesta a acção ou que o faz depois de decorrido o prazo (p. 190). Reconhecendo, a seguir, que na efectivação da responsabilidade civil do advogado se encontra um obstáculo de grande monta no que tange à afirmação e apreciação do nexo causal entre a conduta culposa do jurista e o dano de que o seu cliente se lamenta. Sendo certo que o êxito judicial é função de múltiplos elementos que são estranhos ao cumprimento ou incumprimento do advogado.
[29] Direito e Justiça (Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa), vol. XIX (2005), T. II, p. 9 e ss, maxime p. 44.
[30] Concluindo o referido autor, lançando a questão, se a melhor forma de resolver os problemas que se querem apoiar na teoria da perda de chance não será antes motivo para rever as regras em matéria de “causalidade”, ou reconhecendo a relevância da chamada “causalidade probabilística” ou revendo as regras sobre a causalidade alternativa (p. 47).
[31] Interesse Contratual Negativo e Interesse Contratual Positivo, I,  p. 1103, nota de pé de página.
[32] No sentido da mera perda de chance não ter, em geral, virtualidade jurídico-positiva para fundamentar uma pretensão indemnizatória, citados acórdãos deste STJ de 26/10/2010 e de 29/5/2012. O Ac. do STJ de 10/3/2011 também já referido, sustenta que a perda de chance só poderá ser valorada em termos de uma “possibilidade real” de êxito que se frustrou.
[33] Assim deixando de pagar indemnização pela ocupação do prédio.
[34] Nos termos do art. 24.º da LOFTJ, na redacção do DL 303/2007, de 24 de Agosto, a alçada dos tribunais da relação é de € 30 000.