Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
196/12.9TTBRR.L2.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: ANA LUÍSA GERALDES
Descritores: REAPRECIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
PODERES DO STJ
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
CÁLCULO DA INDEMNIZAÇÃO
Data do Acordão: 10/26/2017
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADAS AS REVISTAS
Área Temática:
DIREITO DE PROCESSO CIVIL – INCIDENTES DE INSTÂNCIA / SENTENÇA / VÍCIOS E REFORMA DE SENTENÇA – INSTRUÇÃO DO PROCESSO / JULGAMENTO DO RECURSO / RECURSO DE REVISTA.
DIREITO DO TRABALHO – EXERCÍCIO E TUTELA DE DIREITOS / PROVAS – DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / RESPONSABILIDADE CIVIL.
DIREITO DO TRABALHO – CONTRATO DE TRABALHO / DIREITOS, DEVERES E GARANTIAS DAS PARTES / INCUMPRIMENTO DO CONTRATO / ILICITUDE DE DESPEDIMENTO.
Doutrina:
-Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Volume V, 141 e 143;
-Amâncio Ferreira, Manual de Recursos em Processo Civil, 9.ª Edição, Almedina, 56;
-Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, 486 e ss.;
-José Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Volume II, Coimbra Editora, 645 e ss.;
-Menezes Cordeiro, Direito das Obrigações, Volume II, Almedina, 288 e ss.;
-Vaz Serra, Reparação do Dano Não Patrimonial, RLJ, 113.º, 96.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 607.º, N.º 5, 615.º, N.º 1, ALÍNEAS C) E D), 662.º, 674.º, N.ºS 1, ALÍNEA C) E 3, 682.º, N.ºS 1, 2 E 3 E 684.º, N.º 1.
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 342.º, N.ºS 1 E 2, 483.º, 494.º E 496.º, N.ºS 1, 3 E 4.
CÓDIGO DO TRABALHO (CT): - ARTIGOS 15.º, 29.º, 127.º, N.º 1, ALÍNEA C), 128.º, N.ºS 1, ALÍNEA C), E) E H) E 2, 129.º, N.º 1, ALÍNEA B), 387.º, N.ºS 1 E 3, 389.º, N.º 1
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGOS 58.º, N.º 1 E 59.º, N.º 1, ALÍNEAS A) E B).
CÓDIGO DE PROCESSO DO TRABALHO (CPT): - ARTIGO 77.º.
BOLETIM DE TRABALHO E EMPREGO N.º 14, 1.ª SÉRIE, DE 15 DE MARÇO DE 2007.
BOLETIM DE TRABALHO E EMPREGO, N.º 22, 1.ª SÉRIE, DE 15 DE JUNHO DE 2008.
BOLETIM DE TRABALHO E EMPREGO N.º 25, 1.ª SÉRIE, DE 8 DE JULHO DE 2009.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


- DE 27-03-2014, PROCESSO N.º 184/11.2.TTVLG.P1.S1;
- DE 01-10-2014 PROCESSO N.º 292/11.0TTSTR.E1.S1;
- DE 25-11-2014, PROCESSO N.º 81711.6TTFAR. E.S1;
- DE 17-12-2014, PROCESSO N.º 420/06.7TTLSB.L1.S1;
- DE 22-04-2015, PROCESSO N.º 822/08.4TTSNT.L1.S1;
- DE 26-05-2015, PROCESSO N.º 2056/12.4TTLSB.L1.S1;
- DE 28-01-2016, PROCESSO N.º 1403/10.8TTGMR.G1.S1;
- DE 21-04-2016, PROCESSO N.º 79/13.5TTVCT.G1.S1;
- DE 18-05-2017, PROCESSO N.º 5164/07.0TTLSB-B.L1.S1, TODOS IN WWW.DGSI.PT.
Sumário :
I – Compete ao Tribunal da Relação reapreciar todos os elementos probatórios que tenham sido produzidos nos autos e, de acordo com a convicção própria que com base neles forme, consignar os factos materiais que julga provados, coincidam eles, ou não, com o juízo alcançado pela 1.ª instância, pois só assim actuando está, efectivamente, a exercitar os poderes que nesse âmbito lhe são legalmente conferidos pelo Novo Código de Processo Civil.

II – Ao nível da decisão da matéria de facto, a intervenção do Supremo Tribunal de Justiça é limitada à apreciação da observância das regras de direito probatório material (denominada prova vinculada), ficando fora do seu âmbito de competência a reapreciação da matéria de facto fixada pela Relação no domínio da faculdade prevista no art. 662.º do CPC, suportada em prova de livre apreciação e posta em crise apenas no âmbito da percepção e formulação do respectivo juízo de facto.

III – Tendo resultado provado que o Autor, com o processo de despedimento que a empregadora lhe moveu, sofreu emocionalmente, com repercussões no seu bem-estar físico e na sua dignidade, mostra-se ajustada a condenação da Ré, empresa sólida no mercado, a pagar ao Autor pelos danos provocados, uma indemnização por danos não patrimoniais no valor de € 30.000,00 (trinta mil euros).
Decisão Texto Integral:

ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

I – 1. AA

Instaurou a presente acção especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento contra:

- “BB – Comunicações, S.A.”, actualmente

“CC, S.A.”

Realizada a audiência de partes, não foi possível obter a conciliação dos intervenientes processuais, tendo a empregadora, na sequência desta, apresentado articulado no qual invocou, no essencial, que:

O Autor encontrava-se afecto ao Gabinete de Qualidade de Serviço da Rede, o qual tem como uma das missões a verificação da qualidade da rede da DD, informação que se obtém através da realização de medições específicas e testes de cobertura da rede efectuadas no “terreno”.

Para o efeito, foi determinado pela Administração da Ré, com carácter de urgência, a realização de medições a efectuar em toda a área geográfica do País, a fim de obter valores fiáveis da qualidade de transmissão e recepção de telecomunicações.

Tarefa que o Autor se recusou a fazer, alegando o facto de a empresa se recusar disponibilizar-lhe uma viatura para essas deslocações.

Com tal comportamento, entende a empregadora que o Autor acabou por inviabilizar o sucesso do projecto em causa nas zonas que lhe estavam distribuídas e afectas, comprometendo irremediavelmente a relação laboral, pelo que foi despedido pela Ré com alegada justa causa.

2. Devidamente notificado, veio o Autor/trabalhador contestar fazendo-o nos seguintes termos:
1. Por excepção:
 a) Alegou, desde logo, a nulidade do processo disciplinar por violação do dever de ocupação efectiva e por falta de fundamentação quer do relatório final, quer da deliberação de despedimento;
 b) Invocou, ainda, a caducidade do direito de aplicar a sanção;
 
No mais, impugnou os factos alegados pela Ré, concluindo pela inexistência de motivo justificativo do despedimento, com as respectivas consequências legais, pois foi a Ré que adoptou medidas persecutórias contra a sua pessoa, humilhando-o e vexando-o perante todos os seus colegas.

2. Em reconvenção:
Peticionou o reconhecimento da ilicitude do despedimento e, em consequência:
c) O direito à sua reintegração, sem prejuízo da sua categoria profissional e antiguidade, bem como o pagamento das retribuições que deixou de auferir, no montante mensal base de 2.317,90 €, acrescidas de diuturnidades no montante mensal de 200,48 €, e de subsídio de alimentação, no valor mensal de 249,26 €, bem como as vincendas que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão;
d) Valores esses acrescidos de juros de mora, à taxa legal, desde a data do vencimento de cada retribuição até efectivo e integral pagamento, e dos respectivos proporcionais dos subsídios de férias e de Natal, acrescidos de juros de mora;
e) A condenação da Ré a pagar-lhe a indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos, no montante de 50.000,00 €, acrescida de juros de mora à taxa legal, contabilizados desde a data da notificação da reconvenção e até efectivo e integral pagamento.

3. Saneado o processo, a causa foi julgada nos seguintes termos:

(i) Improcedente a alegada nulidade do procedimento disciplinar por violação do dever de ocupação efectiva e por falta de fundamentação;
(ii) Procedente a excepção de caducidade do direito de aplicar a sanção disciplinar, tendo sido declarada a ilicitude do despedimento do Autor e a Ré condenada a reintegrá-lo no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade;
(iii) Mais foi a Ré condenada a pagar ao Autor as quantias que este deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão, deduzindo-se as importâncias que o trabalhador tenha auferido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento e o subsídio de desemprego atribuído ao Autor no período referido, devendo o empregador entregar essa quantia à Segurança Social, tudo a liquidar em incidente;
(iv) No demais peticionado foi a Ré absolvida.

4. Inconformada, a Ré apelou pugnando pela improcedência da excepção de caducidade do direito de aplicar sanção e pelo prosseguimento dos autos para apreciação da licitude do despedimento.

Também o Autor recorreu, pretendendo a condenação da Ré no pagamento da quantia de 50.000 €, a título de danos não patrimoniais.

5. O Tribunal da Relação de Lisboa proferiu Acórdão julgando improcedente a excepção de caducidade do direito da Ré a aplicar a sanção disciplinar de despedimento do Autor e ordenando o prosseguimento dos autos.

6. O Autor interpôs recurso de revista deste Acórdão, na sequência do qual o Supremo Tribunal de Justiça proferiu Acórdão confirmando a decisão da Relação, exarando o entendimento de que a decisão de despedimento era tempestiva.

7. Os autos baixaram à 1.ª Instância, onde foi realizado julgamento com observância do legal formalismo, e após proferida sentença com o seguinte dispositivo:

«Nestes termos, julgo a acção parcialmente procedente e, em consequência:
A) Declaro a ilicitude do despedimento do A. AA e condeno a R. BB, S.A.:
a) A reintegrar o trabalhador no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade;
b) No pagamento ao A. das quantias que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da presente decisão, deduzindo-se as importâncias que o trabalhador aufira com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento e o subsídio de desemprego atribuído ao A. no período referido, devendo o empregador entregar essa quantia à segurança social, a liquidar em incidente;
B. Absolvo a R. do demais peticionado

8. Novamente inconformadas, ambas as partes apelaram impugnando de facto e de direito.

9. Mediante Acórdão proferido em 12/Outubro/2016, o Tribunal da Relação de Lisboa deliberou nos seguintes termos:

«Face a todo o exposto, acorda-se na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa:

1. Em julgar totalmente improcedente o recurso interposto pela Ré, BB, S.A.

2. Em julgar parcialmente procedente o recurso interposto pelo Autor, AA, alterando a matéria de facto provada e condenando a Ré a pagar-lhe a quantia de 30.000 € (trinta mil euros), a título de danos não patrimoniais.»

10. Irresignada, a Ré interpôs recurso de revista principal no qual formulou, em síntese, as seguintes conclusões:


1. O Acórdão da Relação é nulo e de nenhum efeito, ao abrigo do disposto no art. 615.º, n.º 1, al. b), aplicável por via do art. 674º, n.º 1, al. c), do CPC, por clara oposição entre os fundamentos e a decisão;
2. Caso assim não se entenda, o que por mera hipótese académica se coloca, então o Acórdão será ainda passível de objectiva censura por ter feito errónea interpretação e aplicação da lei substantiva, pelo que o presente recurso é apresentado à cautela, por ser convicção de que a nulidade será suprida pelo Tribunal a quo, anulando-se todo o processado;
3. O Acórdão recorrido considerou alguns factos provados aditando-os, e consequentemente a decisão que deles se terá extraído não terá sido resultado da correcta aplicação da lei em vigor no nosso ordenamento jurídico;
4. Os “factos” provados e aditados sob os nºs 94-A) e 94-B), não possuem conteúdo fáctico sendo meras considerações e/ou valorações, pelo que deverão ser expurgadas da Matéria de Facto Provada;
5. O Tribunal a quo deu como provados os factos constantes dos pontos 133-B), 133-C) e 151), que reproduzem a matéria alegada pelo Autor nos arts. 397.º, 403.º e 439.º da Contestação;
6. No art. 397.º, da Contestação, o Autor alegou: «Em consequência dessa conduta o A. viu-se remetido, não raras vezes, para situações de desespero, sentindo-se violentado e frequentemente constrangido, por se encontrar sob a ordem de desempenhar funções que nada têm que ver com a sua formação e categoria profissional, sujeito a andar de transportes públicos e a pé, na rua, pondo em perigo a sua saúde», sendo que se desconhece, pois o Autor não o refere em momento algum, em que é se traduziu concretamente a situação de desespero, como é que se exteriorizou, de que modo consistiu a sua violentação e constrangimento, para já não falar do facto do Autor não ter sido obrigado a andar de transportes públicos, conforme o facto provado sob os pontos 9.º) e 57.º) da Matéria de Facto Provada;
7. No art. 403.º da Contestação o Autor alegou: «O qual, em consequência de tal conduta, ficou abalado psicologicamente, pondo em causa a sua auto-estima e confiança, provocando-lhe ainda humilhação e desgosto». De igual modo não se sabe, até porque o Autor nunca o alegou, em que é que se traduziu o seu abalo psicológico e de concreto modo foi posta em causa a sua auto-estima e confiança, e de que forma se traduziu tal diminuição em humilhação e desgosto, e em que é que estas emoções e sentimentos se traduziram concretamente;
8. O mesmo se repete em relação ao facto provado constante do ponto 151), o qual dispõe: «Tais factos têm provocado no Autor ânimos depressivos e uma angústia que perturbam a sua estabilidade familiar.» Este “facto” é uma transcrição do alegado no art. 439.º da Contestação apresentada pelo Autor, que uma vez mais não tem quaisquer factos que demonstrem a causa e modo de exteriorização dos ânimos depressivos e da angústia que levem à consequência retirada por aquele ponto da Matéria de Facto Provada, pelo que também este “facto” deverá ser expurgado da decisão;
9. Em suma, o Autor limita-se a alegar estados de espírito, situações genéricas, que não estão devidamente concretizados e por via dessa ausência não constituem verdadeira matéria de facto;
10. Não colhendo a opinião sufragada pelo Acórdão sub judice de que tal factualidade resultaria dos depoimentos de EE e FF, por uma simples razão: na verdade para que um facto seja dado como provado é necessário que tenha sido previamente alegado;
11. E em momento algum o Recorrido, em sede de Contestação, alegou factos que levassem a concluir pela verificação das consequências, que agora se afirmam em sede do Acórdão em crise, plenamente verificadas, e alegadamente enformadoras de responsabilidade civil da Recorrente;
12. Pelo que, os “factos” aditados pelo Acórdão recorrido não têm qualquer conteúdo fáctico devendo ser retirados da Matéria de Facto Provada;
13. Afirma, ainda, o referido Acórdão que existiu um comportamento ilícito por parte da Recorrente gerador de responsabilidade civil, por alegada violação do disposto no art. 15.º do CT, fundamentando a verificação de tal violação nos factos ocorridos entre 2006 e 2011, e deste histórico extraiu o Tribunal a quo a existência de uma atitude persecutória da Ré com a violação dos direitos de personalidade do A.;
14. O que é óbvio, dado o espaço temporal compreendido entre as diversas situações, a saber, cinco anos, não sucedeu, pelo que necessariamente foi feita errónea subsunção da factualidade ao Direito, no respeita à violação dos direitos de personalidade do Recorrido, reafirmando-se os factos e conclusões apresentadas em sede de invocação e nulidade do Acórdão;
15. O Acórdão concluiu no sentido, errado, de verificação da violação dos direitos de personalidade do Recorrido pela Recorrente e não levou em consideração o facto de ter sido o comportamento reiterado de recusa do Recorrido em exercer determinadas funções e actividades que levaram à crença por parte da Recorrente da existência de uma infracção disciplinar;
16. Esta decisão do Tribunal da Relação de Lisboa está a coarctar a possibilidade do Recorrente se modificar e/ou optimizar as suas estruturas tecnológicas e pessoais, pois pese embora resultar inequívoco que o Autor, um Engenheiro de Electrónica e Telecomunicações, em vez de fazer o trabalho que podia «(…) ser realizado por um aprendiz…» (sic, Acórdão, pág. 69), … não é suficiente para criar a convicção no Tribunal a quo de que aquele trabalhador se encontrava obsoleto e que a Recorrente tinha de lhe encontrar funções compatíveis com as suas competências e aptidões!
17. Aliás, decidiu-se que o despedimento foi ilícito porque as ordens não executadas pelo Recorrido seriam ilegítimas por emanadas de outra empresa que não a empregadora do Recorrido, contudo, conforme é do conhecimento público e notório as empresas “DD” e “BB”, com a nova designação “CC, S.A.”, são a mesma empresa desde o final de 2014;
18. Resulta ainda da matéria provada que a Recorrente sempre tratou o A. como um trabalhador válido para a empresa, tentando que o mesmo tivesse ocupação e actividade profissional, e com respeito e hombridade;
19. Pelo teor do supra exposto, revela-se surpreendente que a conclusão do Tribunal a quo seja diametralmente oposta ao que resulta dos factos, isto é, decida contrariamente aos fundamentos;
20. Acresce ainda que, na senda da Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, transcrita infra, não deverão considerar-se atendíveis os danos não patrimoniais do Recorrido, na medida em que não se verifica qualquer violação dos direitos de personalidade do Recorrido, anterior ao processo disciplinar, e os posteriores reconduzem-se aos comummente verificados em situações idênticas, sem prejuízo do que anteriormente foi referido acerca da falta de alegação de factos conducentes à verificação desses danos (cf. o Acórdão do STJ, de 25/01/2012, in www.dgsi.pt);
21. Finalmente, também o valor de indemnização que foi fixado, no montante de € 30.000,00, se apresenta como excessivo;
22. Deve, por isso, ser dado provimento ao presente recurso, porquanto o Acórdão recorrido infringiu, entre outros, o disposto nos arts. 483.º, e n.º 1, do art. 496.º, ambos do CC e, em consequência, ser revogada e substituída por outra que absolva a Recorrente de tal pedido, assim se fazendo JUSTIÇA!

11. O Autor, por seu turno, contra-alegou e simultaneamente interpôs recurso subordinado tendo formulado, em síntese, as seguintes conclusões:


A – Quanto ao Recurso de Revista da Ré:

1. A matéria vertida no Facto Provado n.º 151), alegada pelo Recorrido no artigo 439.º da sua Contestação, foi julgada como provada pelo Tribunal de 1.ª instância, não tendo a Recorrente impugnado tal facto na sua Apelação;
2. E para o que aqui importa cumpre relembrar que os Factos Provados n.os133-B, 133-C e 151 correspondem à matéria alegada pelo A., respectivamente, sob os artigos 397.º, 403.º e 439.º da Contestação, mostrando-se os referidos factos alegados em Reconvenção;
3. Acresce que a R. não deduziu defesa contra a matéria alegada em reconvenção, confessando, por força do disposto no artigo 574.º, n.º 2, do CPC, aplicável ex vi artigo 60.º, n.º 4, do CPT, todos os danos de natureza não patrimonial alegados pelo A. na sua Reconvenção, pelo que a presente “impugnação” do julgamento de facto terá de improceder, porque não deduzida no momento processual próprio;
4. Ainda que assim não fosse, no que tange aos Factos Provados nos 94-A, 94-B, 133-B e 133-C, que se mostram “impugnados”, a Recorrente pretende subverter o facto de a competência jurisdicional do Supremo Tribunal de Justiça cingir-se, por excelência, ao julgamento da matéria de direito;
5. Cumpre relembrar que, na sua Apelação, o Recorrido considerou “que houve vários erros de julgamento, pois face aos documentos existentes nos autos, às regras de experiência comum e à produção de prova testemunhal, os factos alegados sob os artigos 74.º, 94.º, 95.º, 146.º, 147.º, 148.º, 210.º, 217.º, 218.º, 219.º, 228.º, 395.º, 397.º e 403.º da Contestação, essenciais para a boa decisão da causa, deveriam ter sido considerados provados”, tendo sido nessa sequência que o Tribunal a quo aditou os Factos Provados nos 94-A, 94-B (que correspondem aos artigos 94.º e 95.º da Contestação) e 133-B e 133-C (que correspondem aos artigos 94.º e 95.º da Contestação);
6. Tendo a alteração da matéria de facto provada em 1.ª instância sido determinada pelo Tribunal a quo, e resultado expressamente da Apelação interposta pelo A., aqui Recorrido, ao abrigo do disposto no art. 662.º do CPC, e tendo o A. cumprido o ónus de impugnação previsto no art. 640.º do CPC, e a Ré contra-alegado, deverá, pois, considerar-se não sindicável pelo STJ a alteração da matéria de facto decidida pelo Tribunal a quo, e vertida sob os nos 94-A, 94-B, 133-B e 133-C, que corresponde, respectivamente, aos artigos 94.º, 95.º, 397.º e 403.º da Contestação;
7. Ainda que assim não se entenda, o que se admite por mera hipótese académica, sempre se dirá que o Tribunal a quo não violou quaisquer normas adjectivas ou substantivas ao considerar provados os factos vertidos nos pontos 94-A, 94-B, 133-B e 133-C, dos Factos Provados, pelas razões que foram aduzidas e que aqui se salientam;
8. No que respeita aos danos morais considerados como provados pelo Tribunal a quo, sob os nos 133-B e 133-C, note-se que a R., devidamente notificada do articulado do A. de Contestação à Motivação do despedimento com dedução de Reconvenção (arts. 383.º e segts.), não deduziu defesa contra a matéria alegada em reconvenção, confessando, nos termos do disposto no art. 574.º, n.º 2, do CPC, aplicável ex vi art. 60.º, n.º 4, do CPT, todos os danos de natureza não patrimonial alegados pelo A. na sua Reconvenção, em concreto, e que se mostram alegados sob os arts 397.º e 403.º da Contestação, que correspondem, respectivamente, aos Factos Provados nºs 133-B e 133-C;
9. Logo, não se vislumbram razões válidas para alterar a matéria de facto aditada pelo Tribunal a quo;
10. O Recorrido provou em juízo os danos morais advenientes da ilicitude do despedimento (cf. Factos Provados nos 134 a 158) e que determinaram, e bem, a condenação expressa no Acórdão recorrido; Mais, o Recorrido provou o assédio moral ao longo da relação laborar (cf. Factos Provados nos 94-A, 94-B e 106-A);
11. A situação de atribuição de funções ao Autor sem qualquer importância e que podiam ser executadas por qualquer aprendiz (cf. artigo 119.º da contestação, provado sob o n.º 106) causou-lhe danos graves a nível espiritual (cf. Factos Provados nos 153 a 152) daí que a conduta censurável e ilícita da R. foi, e bem, censurada pelo Tribunal a quo através da atribuição de uma compensação pecuniária ao A.;
12. Há, pois, um quadro de vexame, isolamento e de humilhação sofridos pelo A., em resultado da conduta ilícita da Ré Recorrente, que merecem a devida tutela do Direito no Acórdão recorrido;
13. Cumpre relembrar que o A. continua a ser tratado como se fosse um objecto que já não tem préstimo (que é “obsoleto” na hipótese da Recorrida vertida na alegação de revista);
14. Atente-se, ademais, ao valor de mercado da primitiva Ré “BB, S.A.”, que foi vendida, como é do conhecimento geral, à francesa GG, por € 7.000.000.000,00 (sete mil milhões de Euros), sendo, ainda, uma indemnização que não representa mais do que 18 dias do salário que, à data, o Presidente do CA da Ré, Eng.º HH, auferia (sendo do conhecimento público o seu vencimento anual, à data, era de cerca de € 1.000.000,00) – cf. http://www.....pt/ empresas/ detalhe/ salarios_ de_II_e_HH_baixaram_em_2013.html);
15. Logo, a indemnização fixada pelo Tribunal a quo de 30.000,00 €, atendendo ao grau de ilicitude e de culpa da Ré, aos danos produzidos e à capacidade económica da Ré, traduz-se, indubitavelmente, num valor que, a merecer crítica, seria apenas por ser modesto;
16. Termos em que, por tudo o exposto, deverá julgar-se improcedente o recurso, confirmando-se o douto Acórdão recorrido.

B – Do Recurso Subordinado interposto pelo Autor:

17. In casu, mostra-se demonstrado o assédio moral da R. ao A. (cf. Factos Provados nos 106-A, 133-B e 133-C);
18. Mostra-se inexplicável que a R. não tenha facultado ao A. um computador capaz de executar as tarefas que lhe foram designadas, sendo certo que o poderia fazer sem qualquer delonga, não sendo crível, face ao seu objecto social e ao seu publicitado cariz tecnológico inovador, que não detivesse um computador capaz de executar as tarefas atribuídas ao A.;
19. Os factos provados evidenciam comportamentos da Ré não só decorrentes do processo disciplinar e do despedimento ilícito, mas também antecedentes que: (i) lhe perturbaram o ânimo e a psique; (ii) lhe tiraram qualidade dos cuidados de saúde prestados a si e à esposa; (iii) e lhe provocaram o abalo perante terceiros da sua credibilidade, enquanto profissional zeloso e diligente, afectando-o perante os seus colegas de trabalho e seus familiares;
20. Ora, estes danos são graves, porque atentatórios da saúde psicológica do A., enquanto pessoa e trabalhador, e lesivos da sua personalidade e integridade moral, para além do seu bem-estar psíquico e, por conseguinte, com reflexos no plano de realização pessoal de trabalhador;
21. Deste modo, face à gravidade da conduta humilhante e vexatória relatada, violadora dos deveres gerais do empregador e das garantias do A., seu trabalhador técnico qualificado, e atendendo às consequências na esfera jurídica deste, ao nível da sua dignidade e integridade moral, mediante o desgaste psicológico e humilhação a que o mesmo foi sujeito, entende o A. que se mostra ajustada e equitativa uma indemnização por danos não patrimoniais no valor de € 50.000,00 e não de 30.000,00;
22. Valor esse que corresponde ao montante indemnizatório determinado por esse STJ, no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 21/Abril/2016, no processo n.º 79/13.5TTVCT.G1.S1, in www.dgsi.pt, em situação análoga, em que também a mesma R. determinou a um trabalhador, com a mesma qualificação do aqui A. (Engenharia Electrónica e Telecomunicações) e mesma categoria profissional (Técnico Superior – Nível V) a prática de tarefas que não são, de todo, destinadas a Engenheiros Electrotécnicos da Área de Telecomunicações, como é o caso do A.;
23. Sendo que, no caso dos autos, verifica-se uma agravante em relação à matéria provada no aresto supra citado: de facto, in casu, após o A. não ter aceitado o assédio para se desvincular da R., foram-lhe por esta adstritas tarefas de aprendiz (cf. Facto Provado n.º 106), ao passo que o trabalhador Autor na acção laboral referida supra, foi “colocado na prateleira” durante cerca de 4 anos;
24. Nestes termos, atendendo-se ao elenco dos Factos Provados que, essencialmente, se traduzem no assédio e nos danos daí decorrentes e na ilicitude do despedimento e suas consequências, designadamente o temor provocado ao R. por perder o seu emprego, na angústia por si sofrida, no sentimento de injustiça, no ânimo depressivo sentido e na humilhação sofrida, tudo em resultado da ilicitude do despedimento, deverá revogar-se o Acórdão recorrido no que tange ao montante da indemnização fixado e, em consequência, deverá ser proferida decisão que condene a R. no pagamento ao A. da quantia de € 50.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora contabilizados desde a data da notificação da Reconvenção até efectivo e integral pagamento;
25. Violou, pois, o Acórdão recorrido, o disposto no art. 496.º do CC.

12. Pelo Tribunal da Relação de Lisboa foi proferido novo Acórdão, datado de 8/Fevereiro/2017, julgando improcedente a arguição da nulidade suscitada pela Ré.

 

13. Cumprido o contraditório, foi decidido pela presente Relatora admitir o recurso subordinado interposto pelo Autor, por despacho de 22/Maio/2017, a fls. 1.444 e segts, do 5º Vol., porquanto se entendeu que:
       (…)
“Por conseguinte, tendo o Tribunal da Relação reapreciado a matéria de facto nos termos que antecedem, não existe, in casu, dupla conforme.
Isto porque, na medida em que o Autor procedeu à impugnação da decisão de facto e a Relação reapreciou essa matéria fáctica, não se pode considerar, pelas razões explicitadas em pontos anteriores, que, no presente caso, as decisões das instâncias relativamente à indemnização por danos não patrimoniais está abarcada pela situação de dupla conformidade.
12. Em Conclusão: inexistindo, no caso concreto, uma situação de dupla conforme em relação ao Acórdão recorrido, o recurso subordinado interposto pelo Autor é legalmente admissível.
III – DECISÃO:
- Razão pela qual se decide admitir o recurso de revista subordinado interposto pelo Autor, por, in casu, não se verificar dupla conformidade de julgados”.

14. Mostram-se, assim, interpostos e admitidos 2 recursos:
 1) Um, de revista principal interposto pela Ré (cf. fls. 1.306 e segts., do 5º Vol.);
 2) Outro, o recurso subordinado interposto pelo Autor (cf. fls. 1.321 e segts., do 5º Vol.).

15. A Exmª Procuradora-Geral Adjunta emitiu Parecer no sentido de que deve ser julgada improcedente a invocada nulidade, bem como os recursos de revista, mantendo-se a decisão recorrida.

16. Notificado o mencionado Parecer às partes, nada foi aduzido por qualquer uma delas.

17. Preparada a deliberação, cumpre apreciar as questões suscitadas nas conclusões da alegação do Recorrente, exceptuadas aquelas cuja decisão se mostre prejudicada pela solução entretanto dada a outras, nos termos preceituados nos arts. 608.º, n.º 2, e 679º, ambos do CPC.

Salienta-se, contudo, que não se confundem com tais questões todos os argumentos invocados pelas partes, aos quais o Tribunal não está obrigado a responder.[1]

II – QUESTÕES A DECIDIR:

- Em sede recursória, as questões suscitadas consistem em saber se:

1. Recurso de revista principal:
a) Existe clara oposição entre os fundamentos e a decisão proferida pela Relação, nos termos do disposto no art. 615.º, n.º 1, al. c), do CPC;
b) A Relação procedeu a uma errada apreciação da matéria de facto e, consequentemente, a uma incorrecta interpretação e aplicação do Direito;
c) Não é devida ao Autor indemnização por danos não patrimoniais e, em caso afirmativo, se o montante de € 30.000,00 que lhe foi arbitrado a esse título é, ou não, excessivo.

2. Recurso de revista subordinado:
- Face à gravidade dos factos, a compensação devida ao Autor por danos não patrimoniais deve ser aumentada para € 50.000,00.

Analisando e Decidindo.

III – FUNDAMENTAÇÃO:

I – DE FACTO

- As Instâncias deram como provado o seguinte circunstancialismo fáctico:

1. No exercício da sua prestação laboral para a Ré, o Autor encontrava-se afecto ao ... – Gabinete de Qualidade de Serviço da Rede (doravante denominado "..."), desde o dia 16 de Maio de 2011.

2. O Autor encontrava-se abrangido e vinculado pelo Acordo de Empresa da BB, S.A., publicado no Boletim de Trabalho e Emprego n.º 14, 1.ª Série, de 15 de Março de 2007, com as alterações introduzidas pelos A.E. publicados no BTE, n.º 22, 1.ª Série, de 15 de Junho de 2008 e n.º 25, 1.ª Série, de 8 de Julho de 2009.

3. Dentro do ..., foi implementado o "Projecto ...".

4. O departamento onde o Autor se encontrava inserido – "..." –, tem como uma das missões a verificação da qualidade da rede da "DD", informação que se obtém através da realização de medições específicas e testes de cobertura da rede efectuadas no "terreno".

5. Para o efeito, foi determinada pela Administração da Ré a realização de medições a efectuar em toda a área geográfica do País, a fim de obter valores fiáveis da qualidade de transmissão e recepção de telecomunicações.

6. Para efeitos da execução das funções que lhe foram adstritas, o Autor teve formação específica nos dias 16 e 17 de Maio de 2011.

7. No dia 17/Maio/2011, da parte da tarde, e quando a formação já se encontrava na fase final de esclarecimento de eventuais dúvidas, o Eng.º JJ – Director – foi peremptório em esclarecer que um dos pressupostos para a realização daquele projecto era que a performance da rede DD fosse medida utilizando a rede de transportes públicos.

8. Não obstante tal esclarecimento efectuado pelo Director, o Autor perguntou se poderia realizar o trabalho utilizando viatura própria, tendo-lhe sido respondido no sentido de que tal não era possível, até porque o referido projecto não tinha valor orçamentado para aluguer de viaturas.

9. Na sequência, o Autor disse que não andaria em transportes públicos e que só faria as medições se a empresa lhe disponibilizasse uma viatura.

10. No dia 19 de Maio de 2011, pelas 13h25m, o Coordenador do "…", KK, mandou uma mensagem de correio electrónico à equipa com a informação sobre o trabalho a realizar, sendo que a que foi destinada ao Autor é a que consta do artigo seguinte.

11. Pelo que o Autor recepcionou uma mensagem de correio electrónico com o seguinte teor:
"Boa tarde AA,
Conforme combinado envio-lhe a divisão do mapa da sua área de actuação (em anexo), desde já informo-lhe que os Concelhos que lhe ficaram atribuídos são os seguintes:
Alcochete;
Montijo;
Moita;
...;
Seixal;
Almada;
Sesimbra.
Mais informo que os levantamentos a fazer nesta 1.ª Fase são:
1 - Capital de Distrito;
2 - Capitais de Concelhos.
Levantamentos esses que são conforme as directrizes que foram apresentadas e estão no manual:
- Definir locais, rotas e respectivos timings;
- Levantamento de custos;
- Passes;
- Bilhetes de transporte (onde o passe não alcance).
Até onde se pode chegar (poderá haver zonas onde não haja transportes, mas que exista locais para serem visitados) devem mencionar também.
Aguardo então, até ao dia 27/05/2011, pelo seu levantamento.
Ao seu dispor,
Atentamente
KK".

12. No dia 19 de Maio de 2011, pelas 15h17m, o Autor respondeu à mensagem de correio electrónico que antecede, nos seguintes termos:
"Caro KK, boa tarde.
Encontro-me de férias na semana de 23 a 27 de Maio.
(Como informação adicional - embora o assunto não se relacione directamente com o Colega - por uma questão de ética, respeito e relacionamento profissionais, dou-lhe conhecimento de que aguardo, ainda, posição/decisão dos RH sobre a minha situação departamental na Empresa. Posição/decisão que estará (segundo a colega LL, em divulgação pública no dia 17 pp) no domínio dos Serviços Jurídicos da Empresa).
Cordiais cumprimentos,
AA."

13. As férias gozadas pelo Autor, no período compreendido entre 23 e 27 de Maio de 2011 haviam sido marcadas e autorizadas pelas chefias em Março de 2011.

14. No dia 17 de Junho de 2011, pelas 15h17m, o Autor enviou para o seu Coordenador, KK, o levantamento "indoor" dos 5 concelhos que lhe tinham sido distribuídos para realizar.

15. Contudo, a informação que foi entregue não se encontrava completa porque faltava o preenchimento dos formulários relativos ao levantamento "GPS".

16. Assim, em 20 de Junho de 2011, o Coordenador solicitou ao Autor que completasse a informação com o levantamento "GPS", informando que tal aspecto seria muito importante para efeitos do planeamento de distribuição das campanhas a realizar, fixando o dia 24 de Junho de 2011 para o Autor entregar tais informações.

17. Faltava o referido levantamento estar acompanhado do preenchimento dos templates relativos à recolha dos dados de GPS.

18. O Autor só pôde enviar o levantamento em causa em tal data, ainda que desprovido das coordenadas GPS, após o KK lhe ter enviado, em 8 de Junho, os ficheiros template para esse efeito, em resposta à reclamação do Autor de que não tinha recebido os mesmos atempadamente.

19. À data, o Autor não tinha o Google Earth instalado no seu computador.

20. Nem o Autor tinha recebido as instruções da necessidade de instalar o Google Earth no seu computador, ou do modo como poderia recolher as coordenadas GPS.

21. Em 29 de Junho de 2011, o Autor enviou para o Coordenador o levantamento "GPS" dos cinco concelhos.

22. Todavia, faltavam as coordenadas "GPS" dos locais, sem as quais o levantamento era relativamente inútil.

23. Na sequência daquela falta de informações, no dia 1 de Julho de 2011, o Coordenador solicitou ao Autor as coordenadas "GPS" dos locais.

24. No dia 04 de Julho de 2011, o Autor solicitou instruções de como obter as coordenadas "GPS", tendo as dúvidas sido esclarecidas, telefonicamente, pelo Coordenador.

25. Em resposta, KK referiu que o Autor já o deveria ter instalado, tal como constava do “Guia de Levantamentos GPS”, o qual, segundo o mesmo, lhe havia sido enviado.

26. O Autor afirmou desconhecer tal “Guia”.

27. Neste seguimento, em tal conversa, foi marcada uma reunião para o dia 8 de Julho de 2011.

28. O KK em tal conversa telefónica aconselhou o Autor a instalar desde logo o Google Earth no seu computador. 

29. O que o Autor acatou desde logo, solicitando a instalação ao Help Desk da PT, já que aquele não tem permissões de administração do seu computador.

30. Após a instalação do Google Earth o Autor informou o KK da mesma.

31. No entanto, e porque o Autor mantinha algumas dúvidas, no dia 08 de Julho de 2011, realizou-se uma reunião entre o responsável do "..." pela equipa “...”, o Coordenador e o Autor, onde foram esclarecidas todas as dúvidas relativas ao modo de funcionamento do equipamento e à forma de preenchimento dos dados.

32. No dia seguinte, em 8 de Julho de 2011, realizou-se a sobredita reunião entre o Autor, KK e Eng.º MM, os quais encontravam-se a realizar um périplo por todas as equipas que integravam o Projecto “...” a fim de esclarecem dúvidas e acompanharem a sua implementação.

33. De seguida, o Autor expôs as suas dificuldades em obter as coordenadas GPS pretendidas.

34. Confrontados com tal exposição, KK e Eng.º MM responderam que o Autor deveria seguir as instruções do “Guia de Levantamentos GPS”, que, segundo aqueles, lhe havia sido enviado no início de Junho de 2011.

35. O Autor reiterou que não tinha recebido qualquer “guia” para levantamento das coordenadas GPS.

36. Tendo o Autor referido que escasseavam inúmeros consumíveis de escritório, vulgo economato.

37. KK referiu que o Autor deveria requisitar-lhe por escrito quais os consumíveis de escritório em falta.

38. KK referiu que as queixas com os computadores tinham sido frequentes durante o périplo que realizou às equipas do programa “...”.

39. Tendo dito ao Autor que iria tentar promover a substituição do seu computador para um melhor desempenho do trabalho do Autor.

40. No dia 11 de Julho de 2011, o Autor requereu consumíveis de escritório em falta e, primordialmente, a documentação relativa ao Google Earth em falta.

41. No dia seguinte, o Eng.º MM reconheceu que a sobredita documentação, i.e., o “Guia de Levantamentos GPS”, indispensável para o levantamento das coordenadas, GPS, não lhe havia sido enviado.

42. Em 02 de Agosto de 2011, o Coordenador enviou uma mensagem de correio electrónico ao Autor a solicitar o trabalho pedido, em 1 de Julho de 2011, designadamente, as coordenadas GPS dos locais anteriormente identificados.

43. Em 05 de Agosto de 2011, o Autor justificou o atraso no envio do trabalho devido à lentidão do seu computador.

44. O que foi motivado pela lentidão do computador do Autor.

45. O computador do Autor tem 504 MB de memória RAM e um processador de 2.4 GHz.

46. O programa Google Earth, essencial para a elaboração dos trabalhos em causa, para ser correctamente executado carece de um computador com, pelo menos, 512 MB de memória RAM.

47. Tal lentidão do computador do Autor tem vindo a ser relatada diversas vezes pelo mesmo junto do Help Desk da Ré.

48. Sem que, contudo, tais problemas se tenham resolvido definitivamente.

49. No dia 30 de Agosto de 2011, pelas 11h32m, o Coordenador enviou ao Autor uma mensagem de correio electrónico com o seguinte teor:
"Bom dia AA,
Envio-lhe a Planificação dos percursos para a semana de 31/08 a 02/09/2011
Atenção: Os locais que estão na planificação diária não quer dizer que os tenha que seguir por essa ordem, o que tem que fazer é esse número total da planificação nessa semana, fica ao vosso critério o dia e hora de o fazer.
Atentamente."

50. No dia 01 de Setembro de 2011, pelas 11h34m, o Coordenador enviou ao Autor uma mensagem de correio electrónico com o seguinte teor:
"Bom dia AA,
Até ao momento não verifiquei nenhuns dados na nossa aplicação referente aos testes solicitados na Planificação enviada a 30/08/2011, solicito resposta urgente visto que a data limite de término desses testes é dia 02/09/2011.
Atentamente

51. No dia 1 de Setembro de 2011, pelas 12h51m, o Autor respondeu à mensagem de correio electrónico, pelo mesmo meio, do seguinte modo:
"Caro KK, boa tarde.
Para a realização dos testes solicitados (assim como da realização de outros testes posteriores noutros locais) aguardo disponibilização de viatura devidamente autorizada pela Empresa, alugada ou pertencente à BB.”

52. No dia seguinte, o Coordenador enviou ao Autor uma mensagem de correio electrónico com o seguinte teor:
"Bom dia AA,
Como foi explicitado desde o início deste projecto, nesta fase não está contemplada a utilização de viaturas para deslocação nos vários pontos de testes, portanto aguardamos o resultado do trabalho que lhe foi solicitado para a cidade do ….
Atentamente".

53. O A. respondeu:
"Viva KK,
Possivelmente não fui muito claro no último e-mail que lhe enviei ontem. As minhas desculpas.
Com toda a consideração, respeito e educação – que peço humildemente sejam recíprocos – torno a referir o texto do e-mail de ontem.
"Para a realização dos testes solicitados (assim como a realização de outros testes posteriores noutros locais) aguardo disponibilização de viatura devidamente autorizada pela Empresa, alugada ou pertencente à BB."
Espero e pretendo, para o normal funcionamento e cumprimento das funções que me foram atribuídas, que a resolução deste assunto esteja terminada no próximo dia 12 de Setembro, altura em que regressarei de uma semana de férias.
Acrescento que sobre este assunto mantive ontem, com o MM, por telefone, elucidativa e elevada troca de impressões, não compreendendo o conteúdo do seu e-mail de sexta-feira, 2 de Setembro de 2011, 9:59.
Cordiais cumprimentos,
AA."

54. No dia 12 de Setembro de 2011, o Coordenador mandou nova mensagem de correio electrónico para o Autor com o seguinte teor.
"Bom dia AA,
Espero que tenha tido umas boas férias.
O último e-mail que lhe enviei está explícito e confirmo que nesta fase do projecto o único meio de transporte disponível é por via de transportes públicos nas zonas urbanas onde as medições são necessárias. No ... e periferia aguardamos pelas suas medições recorrendo a este meio de transportes, aliás como o resto da equipa já o fez noutras cidades. Não estão disponíveis viaturas da empresa para este projecto, uma vez que é necessário também verificar a qualidade de serviço nos transportes públicos nas várias zonas urbanas enquanto se desloca.
Com todo o respeito pela sua pessoa, nesta fase do projecto não havendo abertura da sua parte para andar de transportes públicos terei que colocar este assunto para decisão superior.
Atentamente."

55. Ao que o A. respondeu:
"Caro KK, bom dia.
Compreendo perfeitamente a sua posição e concordo totalmente consigo. Eu no seu lugar procederia rigorosamente do mesmo modo.
Faça, então, o que tem a fazer.
Pretendo reforçar – e que fique muito bem claro – que não estou, digamos, a esquivar-me ao trabalho (somente quem não me conhece poderia fazer tal juízo da minha pessoa).
Apenas pretendo defender a dignidade da função e, sobretudo, a dignidade de um Cidadão que é Colaborador da BB, a qual, como todos reconhecem, não é uma Empresa qualquer.
Evidentemente que, aqui e neste momento, não entrei noutros pormenores relacionados com o facto de não utilizar os transportes públicos. Porque ultrapassam as meras relações laborais Colaborador – Chefia.
Creia que foi um prazer conhecê-lo.
Cordiais cumprimentos,
AA."

56. Em 12 de Setembro de 2011, o Coordenador enviou informação ao responsável pela equipa do "Projecto ...", com conhecimento ao Director, com o seguinte teor:
"Bom dia MM,
Face ao exposto não consigo pôr este colaborador a fazer o seu trabalho no âmbito do Projecto ... QoS.
Atentamente."

57. Motivo pelo qual o Autor não procedeu à recolha das medições específicas e testes de cobertura da rede nos concelhos que lhe foram atribuídos.

58. O trabalho realizado pelo Autor até à propalada recolha das coordenadas GPS foi elogiado pelo KK, que o catalogou como um bom trabalho.

59. O Autor foi admitido ao serviço da Ré, sob sua autoridade e direcção, em 20 de Maio de 1974.

60. À data da deliberação de despedimento o Autor tinha a categoria profissional de “Técnico Superior, Nível 5”.

61. Tinha um horário de trabalho das 9h00 às 17h06. 

62. Sendo o seu local de trabalho na Central da R. de ..., sita em ..., ..., ....

63. O Autor tem como habilitações académicas o bacharelato em ....

64. À data do despedimento, o Autor auferia a retribuição mensal base de € 2.317,90, acrescida de diuturnidades no montante mensal de € 200,48, e de € 11,33, a título de subsídio de alimentação, por cada dia efectivo de trabalho.

65. Para além do vencimento, o Autor e esposa tinham direito aos benefícios da “BB – …”, adiante apenas designada por PT ACS.

66. A PT ACS tem por objecto a promoção e protecção da saúde, nomeadamente através da prestação, directa ou indirecta, de cuidados de medicina preventiva, curativa e de reabilitação.

67. A PT ACS é um sistema de saúde aplicável aos trabalhadores das empresas do grupo BB, bem como a parte significativa dos respectivos familiares, assegurando o acesso dos mesmos à promoção de saúde e protecção na doença, através do recurso à prestação de cuidados preventivos, curativos e de reabilitação.

68. Em cerca de 38 anos de trabalho, o Autor nunca foi sujeito a qualquer processo disciplinar nem, consequentemente, lhe foi aplicada qualquer sanção.

69. Há vários anos que o Autor prestava funções no departamento de “Suportes Físicos”, também denominado ..., da Ré.

70. No seio do ... o Autor trabalhava na dependência da sua chefia directa, o Eng.º NN.

71. Dando o Autor apoio directo à chefia do departamento ..., mormente verificando e registando o trabalho executado pelas equipas de trabalho exterior que efectuavam a reparação de todas as anomalias que ocorressem nas redes de cabos de cobre e de fibra óptica da Ré.

72. Bem como, até determinada altura, monitorizava o número de anomalias que ocorriam diariamente nas redes de cabos de cobre e de fibra óptica da Ré, na área geográfica correspondente aos concelhos de …, …, …, ..., …, …, … e ….

73. O Autor deu formação a equipas de trabalho.

74. Em Novembro de 2006, a Ré enviou ao Autor uma comunicação propondo a “rescisão do contrato de trabalho por mútuo acordo”.

75. Fê-lo, dizendo que se o Autor não aceitasse a Ré teria “de recorrer a outros meios que a lei prevê, objectivamente menos favoráveis do que aqueles aqui propostos”.

76. O Autor nunca aceitou as propostas de revogação do contrato de trabalho.

77. Tendo ainda recusado uma proposta de suspensão do contrato de trabalho que lhe foi, pela primeira vez, dada a conhecer em 20 de Junho de 2007.

78. Voltando a recusar nova proposta de suspensão de contrato de trabalho que lhe foi apresentada pela Ré, em 30 de Abril 2008.

79. Após o que a Ré, pela primeira vez, em pelo menos 10 anos, avaliou o desempenho do Autor.

80. E fê-lo por três vezes num espaço temporal de cerca de 2 meses.

81. Tendo, na 1.ª avaliação, a “hierarquia” do Autor concluído que “a avaliação global do colaborador na componente interesse desempenho não está conducente com os objectivos do grupo de trabalho. Revela inadaptação ao posto de trabalho. Está em avaliação no departamento por 30 dias”.

82. Na 2.ª avaliação concluiu que “a avaliação global do colaborador na componente interesse desempenho não está conducente com os objectivos do grupo de trabalho. Revela inadaptação ao posto de trabalho. Está em avaliação no departamento”.

83. E na 3.ª avaliação concluiu que “a avaliação global do colaborador nas componentes interesse, progressão, disponibilidade e receptividade, não é conducente com os objectivos do grupo de trabalho. Requer acompanhamento específico ao nível técnico e de enfoque nos objectivos para melhoria da sua performance”.

84. Estarrecido com tais avaliações, por não concordar com o seu teor, o Autor, em 20 de Março de 2009, questionou OO, funcionário do Departamento ... da Ré, acerca da justificação para tais conclusões.

85. Porém, uma vez que não obteve qualquer resposta escrita até então, o Autor insistiu, em 24 de Março de 2009, pelo seu pedido de justificação.

86. Em resposta, na mesma data, OO remeteu o Autor para a sua chefia.

87. Tendo, de imediato, o Autor abordado a sua chefia directa perguntando-lhe os motivos pelos quais havia sido avaliado em tais termos.

88. Nesse seguimento, o Autor, em 25 de Março de 2009, insistiu com a sua pretensão junto de OO, referindo que a sua “chefia directa diz-se impotente para (…) esclarecer sobre a parte do texto “ Revela inadaptação ao posto de trabalho”.

89. Em resposta, de 27 de Março de 2009, OO remeteu o Autor novamente para a sua chefia, não lhe dando quaisquer esclarecimentos.

90. Pelo que, nesse seguimento, o Autor questionou novamente a sua chefia, ainda que por email, quando já o havia feito verbalmente.

91. A resposta é-lhe remetida por PP, remetendo o Autor para as conclusões acima transcritas.

92. O Autor requereu a explicação de tais conclusões.

93. Que então não lhe foram prestadas.

94. Desde tal data o Autor não foi sujeito a quaisquer outras avaliações.

94-A. Tais avaliações não tiveram qualquer sustentabilidade e tinham como único objectivo diminuir a auto-estima do Autor, tentando que o mesmo, face a essa redução da auto-estima, aceitasse a cessação do vínculo laboral – (Aditado pela Relação).

94-B. Como o Autor não cedeu aos objectivos da Ré, esta passou, a partir do início de 2011, a procurar por todos os meios retirar o Autor das funções que o mesmo exercia na área dos suportes físicos, funções essas que estavam de acordo com as habilitações académicas e experiência profissional do Autor, tentando transferi-lo para outras funções, não compatíveis com as suas habilitações académicas e experiência profissional – (Aditado pela Relação).

95. Por e-mail, datado de 10 de Março de 2011, o Autor foi informado que, “na sequência de processo de redimensionamento e optimização ... que a BB S.A., tem em curso nas suas Direcções, foi decidido proceder à (…) afectação [do A.] ao Centro de Desenvolvimento de Competências ... (DRH/CED)”, implicando “a sua transferência temporária para a Rua ..., nºs … a …, em Lisboa”.

96. Em resposta, o Autor solicitou mais informações sobre o referido processo de redimensionamento e optimização ....

97. Nesse seguimento, realizou-se uma reunião entre o Autor e QQ, em 28 de Março de 2011, onde o Autor explicitou que não poderia deslocar-se diariamente para Lisboa por motivos de saúde, e também referiu que tal eventual transferência prejudicaria a assistência à sua esposa que padece de cancro da mama. Tendo juntado documentação médica suportando o que alegava.

98. Em tal reunião, QQ informou o Autor de que iria reencaminhar os documentos entregues para o seu colega da Direcção ..., OO.

99. Dois dias depois, em 30 de Março de 2011, e após ter sido analisada a documentação médica entregue pelo Autor, QQ informou-o telefonicamente de que já não teria de integrar a Direcção ... dado o estado de saúde da sua esposa.

100. Em 10 de Maio de 2011, foi o Autor convocado por escrito para uma formação específica subordinada ao tema “verificação da cobertura de rede móvel BB ”, com o objectivo de serem transmitidos conhecimentos “para verificação da cobertura de rede através de equipamento a disponibilizar ”.

101. O Autor estranhou essa acção de formação, porquanto a actividade principal da Ré não se reporta à rede móvel, mas sim à rede fixa.

102. Apesar disso, o Autor participou na referida formação específica, nos dias 16 e 17 de Maio de 2011.

103. A partir de tal data, todos os e-mails que são destinados ao Autor provenientes do seio da empresa, nomeadamente de KK e do Eng.º MM, passam a identificar o Autor como estando integrado no “... – Gabinete de …”, mormente como fazendo parte do afamado “Projecto ...”.

104. O “... – Gabinete …” foi criado através de deliberação do Conselho de Administração da Ré, em 18 de Julho de 2011.

105. Ocupando-se o “... – Gabinete …” da execução do “Projecto ...”.

106. Os trabalhos solicitados ao Autor no âmbito do “Projecto ...” cingiam-se, numa primeira fase, ao levantamento de custos de transporte, de passes sociais, de bilhetes de transporte, de coordenadas GPS de restaurantes, etc., tarefas sem qualquer importância e que podiam ser executadas por qualquer aprendiz.

106-A. A imposição de realização de medições em transportes públicos e a pé visou tão só o rebaixamento do Autor – (Aditado pela Relação).

107. Nos sete meses seguintes ao despedimento do Autor, a Ré não tinha colocado outro trabalhador a executar as tarefas que queria que este executasse.

108. O processo disciplinar movido pela Ré ao Autor é o 4.º processo instaurado pela Ré aos trabalhadores por si escolhidos unilateralmente para integrarem o “Projecto ...”.

109. Sendo que todos esses processos foram movidos com intenção de despedimento dos trabalhadores envolvidos.

110. A Ré tem como actividade principal as comunicações fixas, sendo que as comunicações móveis, no grupo BB, são da responsabilidade da DD.

111. O Autor tem vastos conhecimentos da rede fixa, sendo Técnico Especialista nessa área, não tendo conhecimentos da rede móvel.

112. A única formação que foi dada ao Autor, respeitante a rede móvel, cingiu-se àquela que foi descrita pela Ré, no artigo 6.º da Motivação, subordinada ao tema “verificação da qualidade da rede da DD”.

113. A Ré colocou o Autor ao serviço de uma outra empresa, a DD – …, S.A.

114. O que foi feito sem o consentimento do Autor.

115. Algum tempo após o despedimento do Autor, a Ré concedeu aos trabalhadores do “Projecto ...” viaturas automóveis para recolha das medidas.

116. O Autor frisou junto de KK, por e-mail de 20/Maio/2011, entender que permanecia no ....

117. Tal acção de formação foi ministrada pela “Direcção ...–…” da empregadora.

118. Após o decurso da formação, o Autor, conjuntamente com dois colegas formandos, foi, inclusivamente, entrevistado pelos órgãos de comunicação da empresa, cujos conteúdos se encontram alojados no portal electrónico na Ré, com o endereço http://ept.BB.pt/Empresa/EmFoco/Noticias/2011/Pages/....

119. O A. tem insuficiências funcionais e respiratórias que tornam inconveniente o trabalho em locais poluídos.

120. O que era do conhecimento da Ré.

121. Os seus serviços médicos concluíram que o Autor não poderia estar exposto a poeiras, radiações e saídas de ar condicionado.

121-A. As deslocações a pé, na rua e em sítios públicos, bem como as esperas em paragens de autocarros, barcos ou meios ferroviários, envolvem o contacto com poeiras – (Aditado pela Relação).

121-B. O Autor tem insuficiências funcionais e respiratórias que tornam inconveniente o trabalho em locais poluídos e/ou fechados e limitados, como o são, nomeadamente, os transportes públicos – (Aditado pela Relação).

122. Já em 22 de Agosto de 2006, os serviços médicos da Ré consideravam que o Autor deveria trabalhar em ritmo moderado, bem como não deveria estar exposto a saídas de ar condicionado.

122-A. A realização de medições a pé ou em transportes públicos numa extensão correspondente a 5 concelhos, como os de …, …, ..., … e …, não se compadece com a recomendação de o Autor trabalhar a um ritmo moderado, constante do relatório médico emitido pelos serviços da Ré, em 22 de Agosto de 2006 – (Aditado pela Relação).

123. Pelo menos desde 2003, o Autor tem uma insuficiência respiratória, designadamente asma brônquica intrínseca, que lhe dificulta a respiração em ambientes poluídos e que se tem vindo a agravar.

124. O Autor é portador de deficiência que confere uma incapacidade permanente global de 65,3 %, susceptível de variação futura.

125. O grau de incapacidade global sofreu um aumento de 10 % face à última avaliação de 2006.

125-A. A Ré tinha conhecimento dos problemas de saúde do Autor descritos nos pontos 119) a 124) – (Aditado pela Relação).

126. Na área territorial atribuída ao Autor, há diversos serviços de transportes rodoviário e ferroviário que não se encontram ligados entre si, o que obrigaria o Autor a ter de realizar transbordos, andar a pé e a esperar pelos transportes públicos.

127. Um trajecto de transportes públicos entre …, … de …ou … – as três freguesias do município de … que constituem o enclave situado a leste da porção principal do Município – e o ... ou … – as duas freguesias no extremo Oeste da área designada ao Autor, demoraria um dia inteiro do horário de trabalho do Autor, impedindo-o de realizar quaisquer medições a pé em locais públicos.

128. O mesmo sucederia num trajecto entre a ... – freguesia no extremo Sul da área designada ao A. – e o ....

129. O Eng.º JJ é o Director do “Gabinete ...”.

130. O Eng.º JJ é trabalhador da DD. 

131. Trata-se de duas empresas distintas, com personalidades jurídicas autónomas, com diferentes objectos sociais, com órgãos de gestão e de fiscalização díspares.

132. Inexiste qualquer acordo de cedência ocasional celebrado entre a Ré e a DD relativo ao desempenho de funções por parte do Autor.

133. Motivado por queixa do Autor quanto às condições do seu local de trabalho, foi elaborado parecer técnico pelos serviços da Ré onde se considerou recomendável, face ao estado de saúde do Autor, “promover uma limpeza mais cuidada da sala e retirar todo o material/equipamento/papel que se encontra depositado em cima dos armários, de modo a evitar a acumulação de pó”.

133-A. Recomendações que, ainda assim, não foram atendidas pela Ré – (Aditado pela Relação).

133-B. Em consequência dessa conduta, o Autor viu-se remetido, não raras vezes, para situações de desespero, sentindo-se violentado e frequentemente constrangido, por se encontrar sob a ordem de desempenhar funções que nada têm que ver com a sua formação e categoria profissional, sujeito a andar em transportes públicos e a pé, na rua, pondo em perigo a sua saúde – (Aditado pela Relação).

133-C. Em consequência de tal conduta, o Autor ficou abalado psicologicamente, pondo em causa a sua auto-estima e confiança, provocando-lhe ainda humilhação e desgosto – (Aditado pela Relação).

134. Desde a notificação da suspensão preventiva, o Autor viveu com o temor de vir a ser despedido.

135. O seu agregado familiar é composto por si e pela sua esposa, doente oncológica.

136. A esposa do Autor, por força do vínculo laboral deste, era beneficiária da PT ACS.

137. A qual é uma associação sem fins lucrativos, legalmente equiparada a Instituição Particular de Solidariedade Social.

138. A PT ACS tem por objecto a promoção e protecção da saúde, nomeadamente através da prestação, directa ou indirecta, de cuidados de medicina preventiva, curativa e de reabilitação.

139. A doença oncológica da esposa do Autor tem vindo a ser acompanhada pelos médicos e serviços da BB ACS, ou por si comparticipados, há pelo menos três anos.

140. Do mesmo modo, tem o Autor usufruído dos mesmos serviços, no que tange aos seus múltiplos problemas de saúde.

141. Após a deliberação de despedimento, o Autor e a esposa deixaram de ser beneficiários da BB ACS. 

142. Tendo sido registado o despedimento do Autor nos seus serviços.

143. Deixando o Autor e esposa num profundo temor de terem de recorrer a novos serviços médicos para acompanharem o cancro da mama da esposa e os problemas de saúde do Autor.

144. Ambos terão de recorrer à medicina privada ou ao SNS para acompanhar tais problemas de saúde, cujas demoras na marcação de consultas e sujeição a longos tempos de espera são superiores aos dos serviços da BB ACS, ou naqueloutros por si comparticipados.

145. O Autor e respectiva esposa conheciam e confiavam na equipa médica respectiva.

146. O Autor, por ter perdido a qualidade de beneficiário da BB ACS, terá de suportar custos de saúde exponencialmente superiores àqueles que vem suportando como beneficiário da BB ACS.

147. Em simultâneo, ocorrerá a diminuição do seu rendimento mensal, sendo que a quantia mensal que o Autor irá auferir a título de subsídio de desemprego, ainda assim de forma efémera, será de € 1.048,05.

148. É praticamente impossível vir a encontrar trabalho remunerado, dada a sua idade e o seu nível de incapacidade.

149. Também por força da idade e do nível de incapacidade do Autor, e da doença oncológica da esposa, tanto àquele como a esta não será permitido subscrever quaisquer seguros de saúde.

150. Tendo por isso de se sujeitarem ao SNS e, neste caso, a novos médicos, ou à medicina privada.

151. Tais factos têm provocado no Autor ânimos depressivos e uma angústia que perturbaram a sua estabilidade familiar.

152. Fazendo, inclusivamente, temer pela possibilidade de o Autor continuar a custear os seus tratamentos, bem como os da sua esposa.

153. O que tem provocado acessos de raiva, preocupação, ansiedade e angústia no Autor.

154. A credibilidade do Autor, enquanto profissional zeloso e diligente, foi afectada perante os seus colegas de trabalho e seus familiares. 

155. O Autor viu abalada, perante terceiros, a sua reputação de funcionário zeloso e diligente, já que colegas de profissão, familiares e amigos do Autor, a partir de tal data, tomaram conhecimento que o mesmo estava sujeito a um procedimento de “despedimento com justa causa”.

156. O Autor sofreu a angústia e a revolta de ver vedado o acesso ao seu local de trabalho por um elemento da segurança privada da Ré.

157. O Autor sentiu-se vexado e humilhado perante os presentes quando foi obrigado a abandonar o seu local de trabalho.

158. O Autor sentiu-se diminuído e deprimido.

II – DE DIREITO

1. Conforme ressalta do que antecede foram interpostos dois recursos de revista: um pela Ré e outro, subordinado, pelo Autor.

A Ré/Recorrente não se conforma com o facto de o Tribunal da Relação de Lisboa ter julgado improcedente a apelação que interpusera, tendo procedido à alteração da matéria de facto e condenado a Ré a pagar ao Autor uma indemnização por danos não patrimoniais no valor de € 30.000,00. E o Autor, por sua vez, em recurso subordinado, pretende ver aumentado o montante dessa indemnização por a considerar desajustada face à gravidade dos danos sofridos, em consequência do comportamento da Ré.

São vários os vícios que a Ré alinhou e atribui ao Acórdão da Relação tendente a obter uma decisão favorável em sede de revista.

Apreciando as questões suscitadas.

A) A revista principal interposta pela Ré:

2. A contradição entre os fundamentos e a decisão proferida pela Relação:

2.1. Invoca a Ré que o Acórdão recorrido padece de nulidade ao abrigo do disposto no art. 615.º, n.º 1, alínea c), do CPC, por clara oposição entre os fundamentos e a decisão.

Para tanto, e em síntese, aduziu que:
- Os factos aditados pela Relação sob os nºs 106-A e 133-B estão em contradição com os factos descritos sob os nºs 7 e 9;
- Ao fazer-se referência no Acórdão, a fls. 71, nomeadamente que “Relativamente aos factos ocorridos antes da suspensão do Autor, não podemos deixar de considerar a atitude hostil da Ré, traduzida em factos que constituem verdadeira humilhação do seu trabalhador”, está igualmente em contradição com o ponto 57) dos factos provados.

Conclusão que, contudo, não podemos sufragar.

2.2. Com efeito, a lei apenas culmina com a nulidade da sentença as situações elencadas no art. 615º, nº 1, do CPC, com aplicação em sede de revista por força do preceituado na alínea c), do nº 1, do art. 674º, do mesmo Código.

Nos termos do art. 615º, nº 1, alínea c), do CPC, a sentença é nula quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão, o que acontece quando os fundamentos invocados na decisão devessem, logicamente, conduzir a uma decisão diferente da que o Acórdão ou sentença em si expressa.[2]

Aliás, é doutrina assente que se a decisão obtida se mostrar em consonância com a qualificação jurídica dos factos dados como provados, inexiste a nulidade prevista na alínea c), do nº 1, do art. 615º, do CPC.

O referido vício só ocorre quando os fundamentos de facto e de direito invocados na decisão conduzirem logicamente ao resultado oposto àquele que a integra ou ao respectivo segmento decisório.

Essa oposição terá, pois, de se verificar entre os fundamentos e a decisão e não entre os factos e a decisão, caso em que ocorrerá erro de julgamento e não nulidade da sentença.
Ou seja, a referida nulidade apontada pela Recorrente ao Acórdão recorrido teria de incidir relativamente aos fundamentos do Acórdão desde que este conduzisse lógica e necessariamente a uma decisão de mérito diversa da que foi expressa no segmento dispositivo da sentença/Acórdão, ou seja, quando os fundamentos invocados se apresentam em contradição com a respectiva decisão de mérito.

A este propósito refere Amâncio Ferreira que:

“A oposição entre os fundamentos e a decisão não se reconduz a uma errada subsunção dos factos à norma jurídica nem, tão pouco, a uma errada interpretação dela. Situações destas configuram-se como erro de julgamento”.

A contradição geradora de nulidade verifica-se, isso sim, quando “a construção da sentença é viciosa, uma vez que os fundamentos referidos pelo Juiz conduziriam necessariamente a uma decisão de sentido oposto ou, pelo menos, de sentido diferente”.[3]

2.3. No caso em apreço, e conforme se referiu supra, a Recorrente invoca a existência de contradição dos fundamentos com a decisão alegando que os factos aditados, sob os nºs 106-A e 133-B, estão em contradição, respectivamente, com os factos descritos sob os nºs 7 e 9, para além de que o referido na pág. 71 do Acórdão, na parte supra citada, estaria em contradição com o ponto 57) dos factos provados.

Contradição essa que não ressalta de tais factos porquanto:

- Em primeiro lugar, o referido na pág. 71 do Acórdão – “Relativamente aos factos ocorridos antes da suspensão do Autor, não podemos deixar de considerar a atitude hostil da Ré, traduzida em factos que constituem verdadeira humilhação do seu trabalhador” – não está em contradição com o ponto 57) dos factos provados, onde se consignou: “Motivo pelo qual o Autor não procedeu à recolha das medições específicas e testes de cobertura da rede nos concelhos que lhe foram atribuídos.”

É que, como se constata, o Tribunal recorrido não considerou, na sua fundamentação, que o Autor tivesse executado as referidas funções, mas apenas que a Ré lhe impôs “funções abaixo da sua categoria profissional e qualificações, sem que lhe tenham sido dadas condições logísticas para o efeito, mas insistindo a Ré constantemente pela sua realização, funções essas que demandavam percorrer a pé e de transportes públicos vastas áreas do território, quando a Ré sabia que o Autor tinha limitações físicas que o impediam de cumprir tais ordens, ordens que eram ilegais por colocarem o Autor ao serviço de outra empresa, sem o seu consentimento.”

- Em segundo lugar, a invocada contradição entre os factos aditados sob os nºs 106-A e 133-B, com os factos descritos sob os nºs 7 e 9, respectivamente, também não ocorre.

Senão, vejamos:

2.4. Os referidos factos provados têm o seguinte conteúdo:


Ponto 7. No dia 17 de Maio de 2011, da parte da tarde, e quando a formação já se encontrava na fase final de esclarecimento de eventuais dúvidas, o Eng.º JJ – Director – foi peremptório em esclarecer que um dos pressupostos para a realização daquele projecto, era que a performance da rede DD fosse medida utilizando a rede de transportes públicos.
Ponto 9. Na sequência, o Autor disse que não andaria em transportes públicos e que só faria as medições se a empresa lhe disponibilizasse uma viatura.

Ponto 106-A. A imposição de realização de medições em transportes públicos e a pé visou tão só o rebaixamento do Autor (Aditado pela Relação).
Ponto 133-B. Em consequência dessa conduta, o Autor viu-se remetido, não raras vezes, para situações de desespero, sentindo-se violentado e frequentemente constrangido, por se encontrar sob a ordem de desempenhar funções que nada têm que ver com a sua formação e categoria profissional, sujeito a andar em transportes públicos e a pé, na rua, pondo em perigo a sua saúde (Aditado pela Relação).

Ora, os factos aditados (106-A e 133-B) não só explicitam o conteúdo dos identificados pela Ré (nºs 7 e 9, respectivamente), como de resto não estão em contradição com a solução jurídica encontrada pela Relação, porquanto nem da análise de tais factos, nem do teor do Acórdão se vislumbra qualquer contradição.

O que resulta da matéria factual aditada e inserida nos pontos 106-A e 133-B são as enunciadas razões que levaram a Ré a impor ao Autor a utilização dos referidos transportes públicos.

Ao invés da pretendida contradição o que se extrai do seu teor é a explicitação do que ocorreu e que levou, por um lado, a Ré a exigir a utilização dos transportes públicos – sendo convicção do Tribunal da Relação que a Ré o fez para vexar e humilhar o Autor – e, por outro, as razões que conduziram o Autor a referir que não andaria nos transportes públicos, embora se tivesse prontificado a efectuar o seu trabalho desde que lhe fosse disponibilizada uma viatura para esse efeito.

Tal como igualmente não se percepciona nenhuma contradição entre os fundamentos e a decisão da matéria de facto considerada provada com a decisão proferida quanto à aplicação do direito.

No caso dos autos a decisão recorrida apresenta-se como corolário lógico de todo o circunstancialismo fáctico provado, tal como a fundamentação aduzida pelo Tribunal da Relação não enferma da alegada contradição, pois as conclusões extraídas por aquele Tribunal são consequência lógica dos factos que considerou provados, contendo-se nas respectivas premissas do silogismo judiciário.

Não se mostra, pois, defensável, à luz do normativo legal citado e da forma como o Acórdão recorrido está redigido que este enferme de tal vício, mostrando-se devidamente fundamentado e sem a referida oposição, com o segmento decisório a apresentar-se como a consequência lógica dos argumentos expendidos ao longo da decisão, nos precisos termos que a compõem.

O facto de a Ré não concordar com a decisão – direito que lhe assiste – não possui, porém, a virtualidade de gerar a invocada nulidade.

Improcede, assim, a revista nesta parte.

3. A matéria de facto e a reapreciação pelo Tribunal da Relação:

3.1. A Ré Recorrente veio também invocar que o Tribunal da Relação procedeu a uma errada apreciação da matéria de facto e, consequentemente, a uma incorrecta interpretação e aplicação do Direito.

Insurge-se, nomeadamente, contra o aditamento dos factos dados como provados sob os pontos 94-A e 94-B, por considerar que os mesmos não possuem conteúdo fáctico algum, sendo meras considerações e/ou valorações, pelo que deverão ser expurgados da matéria de facto provada.

E acrescenta que o Tribunal da Relação deu como provados os factos constantes dos pontos 133-B, 133-C e 151, dessa forma reproduzindo a matéria alegada pelo Autor nos arts. 397.º, 403.º e 439.º da contestação, mas nos quais o Autor se limitou a alegar estados de espírito e situações genéricas, que não estão devidamente concretizadas e, nessa medida, não constituem verdadeira matéria de facto.

Analisando.

3.2. De acordo com o disposto no art. 682.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, «aos factos materiais fixados pelo Tribunal recorrido, o Supremo aplica definitivamente o regime jurídico que julgue adequado», sendo que «a decisão proferida pelo Tribunal recorrido quanto à matéria de facto não pode ser alterada, a não ser no caso excepcional previsto no n.º 3 do art. 674.º».

Nos termos desta disposição, «o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto de recurso de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de Lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova».

Deste modo, o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa só pode ser objecto do recurso de revista quando haja ofensa de «disposição expressa da lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força probatória de determinado meio de prova».

Acresce que, por força do disposto no n.º 3, do art. 682.º do Código de Processo Civil, «o processo só volta ao Tribunal recorrido quando o Supremo entenda que a decisão de facto pode e deve ser ampliada, em ordem a constituir base suficiente para a decisão de Direito, ou quando ocorram contradições na decisão sobre a matéria de facto que inviabilizam a decisão jurídica do pleito».

Daqui resulta que a decisão proferida pelo Tribunal da Relação quanto à matéria de facto não pode ser alterada pelo Supremo Tribunal de Justiça, salvo nas situações acima excepcionadas, em caso de erro sobre a aplicação de regras de direito probatório material ou quando seja insuficiente e deva ser ampliada «em ordem a constituir base suficiente para a decisão de direito».

Sobre tal temática esta Secção Social, e o restante STJ, já se pronunciaram por diversas vezes nesse sentido e a aqui Relatora teve igual oportunidade de se debruçar sobre essa matéria vertendo o referido entendimento, nomeadamente, nos seguintes arestos:

- Acórdão do STJ, de 28/01/2016, proferido no âmbito do processo nº 1403/10.8TTGMR.G1.S1 (4ª Secção), disponível em www.dgsi.pt., em cujo sumário se pode ler o seguinte:

(…)
“II – O princípio da livre apreciação da prova, plasmado no n.º 5 do art. 607.º do CPC, vigora para a 1.ª instância e, de igual modo, para a Relação, quando é chamada a reapreciar a decisão proferida sobre a matéria de facto.
III – Em tal circunstância, compete ao Tribunal da Relação reapreciar todos os elementos probatórios que tenham sido produzidos nos autos e, de acordo com a convicção própria que com base neles forme, consignar os factos que julga provados, coincidam eles, ou não, com o juízo alcançado pela 1.ª instância, pois só assim actuando está, efectivamente, a exercitar os poderes que nesse âmbito lhe são legalmente conferidos – (sublinhado nosso). 

- Acórdão do STJ, datado de 18-05-2017, proferido no âmbito do processo n.º 5164/07.0TTLSB-B.L1.S1 (4.ª Secção), disponível em www.dgsi.pt., onde se concluiu que:

“I – Em sede de revista, o Supremo Tribunal de Justiça pode, no uso dos poderes que lhe são conferidos pelo art. 674.º, nº 3, segunda parte, do Novo CPC, apreciar o erro na fixação dos factos provados quando se verifique ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto.

II – Não sendo o caso, por inexistência de violação do direito probatório material, prevalece a apreciação e modificação da matéria de facto efectuada pelo Tribunal da Relação no uso do princípio da livre apreciação da prova, plasmado no nº 5, do art. 607.º, do Novo CPC, e dos amplos poderes que lhe são conferidos pelo art. 662.º do mesmo Código – (sublinhado nosso).

E conforme se firmou no Acórdão desta Secção, de 27-3-2014,[4] «com a ressalva do condicionalismo exceptivo decorrente da ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova, o Supremo Tribunal de Justiça, enquanto Tribunal de revista, não pode alterar a matéria de facto fixada nas instâncias recorridas».

Jurisprudência consolidada nesta Secção e STJ.

Destarte, no que concerne à modificabilidade da decisão de facto, a intervenção do Supremo reconduz-se à verificação da conformidade da decisão de facto com o direito probatório material, nos estritos termos dos normativos citados.
Isto é, ao nível da decisão da matéria de facto, a intervenção do Supremo Tribunal de Justiça é limitada à apreciação da observância das regras de direito probatório material (denominada prova vinculada), ficando excluída do seu âmbito de competência a reapreciação da matéria de facto fixada pela Relação no domínio da faculdade prevista no art. 662.º do CPC, suportada em prova de livre apreciação e posta em crise apenas no âmbito da percepção e formulação do respectivo juízo de facto.
Caso contrário tem-se por fixada definitivamente a matéria de facto provada pelas Instâncias, nos precisos termos que constarem das respectivas decisões.

3.3. Ora, no caso em apreço, a Ré Recorrente insurge-se por o Tribunal da Relação ter dado como provada os factos elencados sob os nºs 94-A e 94-B, 133-B, 133-C e 151.

Porém, da leitura do Acórdão recorrido, em particular dos excertos citados, resulta evidente que o Tribunal da Relação reapreciou as provas produzidas no processo em relação aos factos objecto da impugnação, procedeu ao confronto entre elas, explicitou as conclusões da prova que reavaliou e, a final, procedeu à modificação da decisão de facto de acordo com a convicção que formou acerca dos factos em discussão.

E ao proceder à alteração da decisão de facto proferida pela 1.ª instância, depois de ter reapreciado a prova testemunhal produzida e de a conjugar com outros elementos fácticos resultante dos depoimentos recolhidos em audiência de julgamento, o Tribunal da Relação mais não fez do que usar os poderes que a lei lhe confere nesta matéria, com vista a alcançar a verdade material.

E no alargado âmbito de actuação que legalmente lhe é concedido, colocado na mesma posição do Julgador da 1ª Instância, nada impede, como se disse, que o Tribunal da Relação forme a sua própria convicção sobre os pontos da matéria de facto impugnados, tal como o Tribunal da 1ª instância, e proceda às modificações que levou a efeito.

3.4. Acresce que, quanto ao facto descrito sob o ponto 151 (art. 439.º, da contestação), o mesmo foi fixado pela 1.ª instância e não foi objecto de impugnação na apelação, pelo que a Relação não se debruçou sobre o mesmo mantendo-o por isso inalterado.

Assim sendo, não pode agora a Ré insurgir-se em relação a esse facto.

No que concerne aos restantes, importa salientar que o aditamento efectuado pela Relação resultou do exercício do duplo grau de jurisdição sobre a matéria de facto, uma vez que esta foi objecto de impugnação na apelação, e não da estrita aplicação de um critério normativo extraído do n.º 3, do art. 607.º, do CPC, pelo que, de tal matéria, não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, nos termos do n.º 4, do art. 662.º, do CPC.

Ademais, e ao contrário do que a Ré pretende, os aludidos pontos de facto além de não poderem ser considerados como conclusivos, pois não se reconduzem ao uso de conceitos meramente normativos, antes comportam substrato factual consistente, resultante da prova produzida em audiência e que, uma vez interpretada em conexão com os restantes segmentos que integram o acervo factual provado, permitem concluir que o Autor sofreu, de facto, com a conduta da Ré e viu, dessa forma, atingida a sua a sua auto-estima e confiança, tendo sofrido humilhação e desgosto.

Estão em causa sentimentos descritos e que foram produzidos em consequência de actos praticados pela Ré que atingiram o Autor e o colocaram em desespero, dado que a Ré procurou que o Autor desempenhasse funções que não se coadunavam com as suas habilitações académicas e experiência profissional.

É o que ressalta claramente do conteúdo dos pontos factuais provados e aqui em causa, do seguinte teor:

Ponto 94-A. Tais avaliações não tiveram qualquer sustentabilidade e tinham como único objectivo diminuir a auto-estima do Autor, tentando que o mesmo, face a essa redução da auto-estima, aceitasse a cessação do vínculo laboral(Aditado pela Relação).
Ponto 94-B. Como o Autor não cedeu aos objectivos da Ré, esta passou, a partir do início de 2011, a procurar por todos os meios retirar o Autor das funções que o mesmo exercia na área dos suportes físicos, funções essas que estavam de acordo com as habilitações académicas e experiência profissional do Autor, tentando transferi-lo para outras funções, não compatíveis com as suas habilitações académicas e experiência profissional(Aditado pela Relação).
Ponto 133-B. Em consequência dessa conduta, o Autor viu-se remetido, não raras vezes, para situações de desespero, sentindo-se violentado e frequentemente constrangido, por se encontrar sob a ordem de desempenhar funções que nada têm que ver com a sua formação e categoria profissional, sujeito a andar em transportes públicos e a pé, na rua, pondo em perigo a sua saúde (Aditado pela Relação).
133-C. Em consequência de tal conduta, o Autor ficou abalado psicologicamente, pondo em causa a sua auto-estima e confiança, provocando-lhe ainda humilhação e desgosto (Aditado pela Relação).

Tendo sido exarado pela Relação, a fls. 1.413 e segts, a fundamentação sobre as razões que conduziram aquele Tribunal a dar como provados tais factos contra os quais a Ré se insurge.

Podendo ler-se aí, a este propósito, o seguinte:
Relativamente ao facto descrito no artigo 146º da contestação, não temos dúvidas em considerá-lo provado. De facto, não podemos desligar esta actuação da Ré, do caminho pela mesma encetado em 2006 ao propor ao Autor a rescisão amigável do contrato de trabalho sob pena de “ter de recorrer a outros meios que a lei prevê, objectivamente menos favoráveis do que aqueles aqui propostos” (sic). É certo que a formação e integração na ... não visou apenas o Autor, mas é relativamente a este que nos temos de pronunciar, sendo certo que não está em causa uma discriminação deste relativamente a outros trabalhadores. A Ré estava bem ciente das limitações físicas do Autor, que tem uma incapacidade permanente global de 65,3 %, com insuficiências funcionais e respiratórias que tornam inconveniente o trabalho em locais poluídos. De facto, o Autor tem uma insuficiência respiratória, designadamente asma brônquica intrínseca, que dificulta a respiração do Autor em ambientes poluídos e que se tem vindo a agravar. Na área territorial atribuída ao Autor, há diversos serviços de transporte rodoviário e ferroviário que não se encontram ligados entre si, o que o obrigaria a ter de realizar transbordos, andar a pé e a esperar pelos transportes públicos, um trajecto de transportes públicos entre …, … ou … – as três freguesias do município de … que constituem o enclave situado a leste da porção principal do município – e o ... ou … – as duas freguesias no extremo Oeste da área que lhe foi designada – demoraria um dia inteiro do horário de trabalho do Autor, impedindo-o de realizar quaisquer medições a pé em locais públicos, e o mesmo sucederia num trajecto entre a ... – freguesia no extremo Sul da área designada – e o .... Perante este circunstancialismo pessoal, e mesmo quando foi reclamada a situação, a Ré continuou a impor ao Autor a realização de medições em transportes públicos e a pé, recusando a cedência de veículo para o efeito, o que, meses mais tarde, viria a acontecer, cedendo viaturas. Tudo visto, e na sequência das avaliações inopinadas, sem explicação, entendemos que o facto em causa está provado, com procedência do recurso nesta parte” – (sublinhado nosso).

A restante fundamentação em que se ancorou o Tribunal da Relação mostra-se devidamente desenvolvida no Acórdão exarado, a fls. 1.285 e segts dos autos, e não suscitam dúvidas sobre a legalidade da análise da prova produzida, estando, por isso, afastada da ressalva do nº 3, do art. 674º, do CPC.
O mesmo é dizer que não assume foros de sindicabilidade por este STJ.

Fundamentação assaz esclarecedora sobre os motivos que levaram a Relação a considerar como provados tais factos e que, ao contrário do que a Ré invoca, foram alegados pelo Autor na sua contestação, nos arts. 146º e segts, 210º e segts, 395º e segts, e 403º (com especial enfoque nos arts. 74º, 94º, 95º, 119º a 124º, 146º a 148º, 210º, 217º a 219º, 228º, 395º, 397º e 403º).

Não se está, pois, perante “meras considerações e/ou valorações” desprovidas de suporte fáctico, sendo perfeitamente apreensível, em termos objectivos e factuais, a atitude persecutória da R. durante o referido período e as consequências daí resultantes para o Autor a nível psicológico e físico, com reflexos na sua saúde, auto-estima e confiança, provocando-lhe os citados sentimentos de humilhação e desgosto.

3.5. Destarte, pelo exposto, não subsistem razões que permitam a integração do presente caso na excepção prevista na lei como fundamentos e objecto do recurso de revista com o consequente exercício excepcional dos poderes do STJ, em matéria de apreciação, julgamento e fixação da matéria de facto, uma vez que o Tribunal da Relação não violou quaisquer normas adjectivas ou substantivas ao considerar provados os factos vertidos nos pontos 94-A, 94-B, 133-B, 133-C e 151.

Pelo que, tais pontos factuais devem subsistir no elenco da matéria de facto provada, nos precisos termos decididos pela Relação.

4. A incorrecta aplicação do Direito:

4.1. Provados tais factos não se suscitam dúvidas sobre a aplicação do direito nos termos que constam do Acórdão recorrido.

Aliás, nem a Ré esclarece em que se funda para, no âmbito da aplicação do direito, obter uma decisão jurídica diversa daquela a que chegou o Tribunal da Relação para o presente pleito. Limitando-se a divergir da sua condenação no pagamento de uma indemnização ao Autor por danos não patrimoniais, por entender que tal factualidade não se provou e que os danos sofridos pelo Autor não são suficientes para merecer a tutela do direito. Matéria esta que será analisada no ponto subsequente.

Ora, provada que se mostra a factualidade que os autos documentam, as consequências jurídicas a extrair são precisamente as que o Acórdão recorrido contempla: o despedimento do Autor, levado a cabo pela Ré, é ilícito por inexistência de justa causa.

4.2. Com efeito, a este propósito pode ler-se, no Acórdão aqui em causa, que:

(…) O Autor,

“Tinha a categoria profissional de “Técnico – Superior – Nível 5”, cujo conteúdo funcional vem descrito no Anexo I do AE aplicável, publicado no BTE nº 25 de 8 de Julho de 2009, à qual correspondem o seguinte descritivo “Profissional que desenvolve funções orientadas para a concepção, estudo, operacionalização e gestão nas várias áreas e domínios de actividade”, tem de ter formação superior. Quanto ao Know-how técnico, tem de ter “Conhecimentos técnicos complexos e variados que requerem um domínio teórico e prático adquirido normalmente através de formação superior e/ou de ampla experiência profissional”. Quanto à iniciativa, tem de ter um “nível de autonomia elevado, garantindo a realização dos objectivos fixados”, e quanto á “exigência dos problemas”, “Resolução de problemas complexos, capacidade para elaborar estudos, pareceres, análises, projectos e propostas de resolução de problemas para decisão pelo órgão Executivo da Empresa.”

Ora, resulta claro dos factos provados que as funções que a Ré pretendia que o Autor exercesse podiam ser executadas por qualquer aprendiz, pelo que não exigiam os requisitos previstos no referido Anexo I, entre os quais os supra elencados.

(…)

“Ora, as funções adstritas ao Autor, em Maio de 2012, não têm qualquer enquadramento na sua categoria profissional, não só no respectivo descritivo, como na exigência de requisitos, donde se conclui, tal como a primeira instância, que a Ré baixou ilegitimamente a categoria do trabalhador.

A Ré entende existir justa causa para o despedimento do A., por o mesmo, com a sua conduta, ter violado os deveres a que se refere o disposto no art. 128º, nº 1, c), e) e h) e nº 2 do CT”. (…)

No presente caso, como acabamos de verificar, as ordens emanadas da Ré de colocar o Autor ao serviço de outra empresa, são ilegais. Por outro lado, ainda que o não fossem, é ilegítimo o abaixamento de categoria do Autor.

De acordo com o disposto no artigo 128º, nº1, e), do CT, o trabalhador tem obrigação de “cumprir ordens e instruções do empregador respeitantes a execução ou disciplina no trabalho … que não sejam contrárias aos seus direitos e garantias.” (sic)

As ordens emanadas da Ré sendo manifestamente contrárias aos direitos e garantias do Autor, não tinham de ser por este acatadas, ficando prejudicado o conhecimento da alegada violação do disposto na alínea c) – obrigação de realizar o trabalho com zelo e diligência – e h) – promover ou executar os actos tendentes à melhoria da produtividade da empresa.

Mas mesmo que nada disto se entendesse e que as ordens emanadas da Ré fossem válidas, cumpre atentar, por um lado, que o Autor cumpriu parcialmente as designadas funções. Por outro lado, que o Autor padece de problemas de saúde, devidamente descritos na matéria de facto, que desaconselham o exercício das funções a que se referem os autos, as quais exigem que o Autor se desloque a pé e de transportes públicos numa grande área geográfica. Finalmente cumpre atentar que o Autor tinha 38 anos de casa, sem qualquer mácula disciplinar.

Ainda que se entendesse que o Autor violara as legítimas ordens e instruções da Ré, não saindo para o terreno para executar as tarefas que lhe tinham sido destinadas, o contexto em que essa violação ocorreu, e a antiguidade do trabalhador sempre nos levariam a concluir pela desproporcionalidade da sanção de despedimento em relação à gravidade da infracção. Note-se, aliás, que a Ré nos sete meses seguintes ao despedimento do Autor, não tinha ainda colocado outro trabalhador a executar as tarefas que queria que este executasse.

Em face do exposto, soçobra, pois, integralmente o recurso da Ré, entendendo o Tribunal que o despedimento do Autor é ilícito.

       

Entendimento que merece o nosso acolhimento.

Por outro lado, neste tipo de acções em que está em causa a licitude de um despedimento, com fundamento na inexistência de justa causa, é sabido que o ónus probatório compete ao trabalhador quanto à existência do contrato de trabalho e ao despedimento, recaindo sobre a entidade empregadora a verificação da justa causa de despedimento, e incumbindo-lhe essa prova.

Por sua vez “o empregador apenas pode invocar factos e fundamentos constantes de decisão de despedimento comunicada ao trabalhador”, por força do preceituado no artigo 387º, nºs 1 e 3, do Código do Trabalho, conjugado com o art. 342º, nºs 1 e 2, do Código Civil.

Nesta medida, era à Ré que incumbia a prova dos factos descritos no seu articulado motivador do despedimento, o que não logrou obter, sendo certo, porém, que o Autor, ao invés, fez a prova de todos os factos que conduziram à declaração da ilicitude do despedimento, por falta de justa causa, bem como prova de todos os danos por si sofridos, em consequência da conduta da Ré.  

Improcede, assim, a revista nesta parte.

5. Quanto à indemnização por danos não patrimoniais:

5.1. Pretende a Recorrente que seja revogada a decisão na parte em que foi condenada a pagar ao Autor uma indemnização por danos não patrimoniais, por entender que não é devida qualquer indemnização. Mas acrescenta: e se acaso se considerar o contrário sempre deverá ser alterado o montante de € 30.000,00, que foi arbitrado a esse título pela Relação, por se mostrar excessivo e desajustado.

Entendimento que, relativamente à natureza dos danos e à sua não tutela pelo direito, não podemos sufragar, porquanto, ao contrário do que alega a Ré, os danos sofridos pelo Autor não deixam de relevar, não sendo defensável a não aplicação do preceituado no nº 1, do art. 496º, do Código Civil, com o argumento de que tais danos não estão abrangidos por este normativo.

Para tal concorrem as circunstâncias que culminaram no despedimento do Autor e que resultam provadas nos autos.

A actuação culposa da Ré e os reflexos directos e prejudiciais sofridos pelo Autor, na sua saúde física, em consequência daquela conduta, vão muito para além da ruptura da relação contratual no contexto de despedimento individual julgado ilícito, conforme o próprio MP reconhece no seu Parecer.

Sendo ainda de realçar que é dominante o entendimento doutrinário e jurisprudencial de que são ressarcíveis os danos provocados no âmbito de relações contratuais, nas quais se inclui o contrato de trabalho, apesar de o artigo 496.º se encontrar sistematicamente inserido no capítulo da responsabilidade civil por factos ilícitos, consagrando um princípio de carácter geral.[5]

Princípio que o Código do Trabalho de 2009 consagrou no seu art. 389º, nº 1, como um dos efeitos passíveis de ser produzidos em consequência da ilicitude do despedimento, no âmbito das relações laborais, pondo fim a quaisquer dúvidas sobre tal matéria.

Ponto é que se provem esses danos não patrimoniais, nos termos estipulados no nº 1, do art. 496º, do CC.

5.2. Com efeito, tendo o nosso Código Civil consagrado nesse normativo (art. 496º) a tese da ressarcibilidade dos danos não patrimoniais, limitou-os, porém, àqueles que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.

Sendo indiscutível que os danos que lesem a integridade física e moral de um trabalhador ou que lesem a reputação de um indivíduo constituem, pela sua gravidade, danos não patrimoniais, a justificar, por isso, uma indemnização (cf. art. 15º do Código do Trabalho).

Gravidade que deve medir-se por um padrão objectivo e não à luz de factores subjectivos, embora estes, resultantes das circunstâncias concretas em que a ofensa se verificou, temperem necessariamente aquele.[6]

Importa, por isso, sopesar as circunstâncias concretas do caso, para se averiguar em que medida o dano justifica a concessão de uma satisfação de natureza pecuniária ao lesado, não sendo indiferente nesse juízo o referido apuramento da gravidade do dano para efeitos de dar ao Julgador a justa medida que possibilite ao lesado a consequente valoração indemnizatória (ou compensatória) pelos danos causados à sua integridade física e moral, concretizando-a.

Concretização que é feita em consonância com os preceitos legais aplicáveis, com a avaliação da severidade do dano e a correspondente satisfação pecuniária ao lesado, e que deve ser efectuada, por um lado, à luz de um padrão objectivo, em função dos factos provados e, por outro, também em função da tutela do Direito.[7]

Fixando-se, pelo Tribunal, o respectivo montante de acordo com um juízo de equidade, nos termos preceituados no nº 4, do 496º, do CC.

5.3. Ora, no caso sub judice, ponderando o quadro factual traçado em juízo, em particular os factos descritos sob os pontos 74 e 75, 78 a 94-B, 106-A e 107, 119 a 128, 133 a 158, o disposto nos arts. 15.º e 389º, nº 1, do Código do Trabalho e nos arts 483.º e 496.º, do Código Civil, não pode deixar de se considerar que, atendendo às consequências produzidas na esfera jurídica do Autor, ao nível da sua saúde física e psicológica, bem andou o Tribunal da Relação quando arbitrou uma indemnização por danos não patrimoniais ao Autor, condenando a Ré no seu pagamento.

Acresce que o Autor exercia funções ao serviço da Ré, sob a sua autoridade e direcção, desde 20 de Maio de 1974 (cf. facto provado nº 59), à data da deliberação do despedimento possuía a categoria profissional de “Técnico – Superior – Nível 5 (facto provado nº 60), tem como habilitações académicas o bacharelato em ... (facto provado nº 63) e em cerca de 38 anos de trabalho nunca fora sujeito a qualquer processo disciplinar nem, consequentemente, lhe foi aplicada qualquer sanção (facto provado nº 68).

Ora, sendo a factualidade provada expressiva, não permite, de forma alguma, considerar que o Autor sofreu apenas “meros incómodos”.

Estamos perante danos não patrimoniais que devem ser indemnizados pela Ré e que lesaram a saúde, o bem-estar físico e psíquico e a tranquilidade do Autor.[8]

5.4. Tratando-se de bens inquantificáveis economicamente, a indemnização devida pelos mesmos tem em vista proporcionar ao Autor uma compensação pela lesão sofrida, já que esta não pode ser reposta em valor equivalente.

Devendo ser fixada pelo Tribunal de acordo com regras de equidade, nos termos do art. 496º do CC, tendo em atenção o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e as demais circunstâncias do caso, que o justifiquem, por força do disposto no art. 496º, nº 3, do CC.

Assim sendo, a conclusão que se impõe é a de que se mostra devida ao Autor uma indemnização por danos não patrimoniais.

O quantum a arbitrar é matéria que será decidida no ponto subsequente.

B) A revista subordinada (do Autor):

Defende o Autor, como fundamento da revista subordinada por si interposta, que face à gravidade dos factos provados a compensação por danos não patrimoniais que lhe foi arbitrada, no valor de € 30.000,00, deve ser aumentada para € 50.000,00 acrescida dos respectivos juros moratórios.

Está assim em causa saber se:


a) Tais juros são devidos, e em que termos;
b) Se a indemnização por danos não patrimoniais fixada em € 30.000,00, deve, ou não, ser aumentada.

Vejamos.

6. Quanto aos juros:

6.1. Consta dos autos que o Autor, na sua Reconvenção, deduzida no articulado de Contestação e Motivação do Despedimento, formulou o seguinte pedido de condenação da Ré, no que concerne aos juros:

- Deve a “Ré pagar ao Autor a indemnização pelos danos não patrimoniais no montante de € 50.000,00, acrescida de juros de mora à taxa sucessiva legal, contabilizados desde a data da notificação da Reconvenção até efectivo e integral pagamento” – cf. alínea d), do pedido.

A sentença proferida em 1ª instância julgou a presente acção parcialmente procedente, dando razão ao Autor quanto à ilicitude do despedimento e condenando a Ré na sua reintegração, mas julgou-a improcedente na parte relativa ao pedido deduzido pelo Autor de condenação da Ré na indemnização dos danos não patrimoniais, o que, consequentemente, se reflectiu na inexistência desses juros.

Interposto recurso de Apelação para o Tribunal da Relação por ambas as partes, quer da decisão de facto, quer do direito aplicado, veio o Autor novamente deduzir igual pedido: deve a Ré “ser condenada no pagamento ao Apelante da quantia de € 50.000,00, a titulo de indemnização de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora contabilizados desde a data da notificação da Reconvenção até efectivo e integral pagamento.

Contudo, e conforme se referiu supra, no ponto 9), a fls. 4, do relatório deste Acórdão, o Tribunal da Relação de Lisboa, em 12/Outubro/2016, proferiu Acórdão no qual julgou a presente acção nos seguintes termos:

«Face a todo o exposto, acorda-se na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa:

1. Em julgar totalmente improcedente o recurso interposto pela Ré, BB, S.A.

2. Em julgar parcialmente procedente o recurso interposto pelo Autor, AA, alterando a matéria de facto provada e condenando a Ré a pagar-lhe a quantia de 30.000 € (trinta mil euros), a título de danos não patrimoniais.» - (sublinhado nosso).

Ou seja, o Tribunal da Relação de Lisboa confirmou a declaração de ilicitude do despedimento do Autor, com a consequente condenação da Ré na reintegração daquele e condenou a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 30.000,00, a título de indemnização por danos morais.

Nada dizendo sobre os juros peticionados.

E cotejado o referido Acórdão, e ao contrário do que o Autor alega no seu requerimento de 2/Outubro/2017, apresentado depois de ter sido notificado nos termos que os autos documentam e em sede de revista para cumprimento do princípio do contraditório, em parte alguma do Acórdão da Relação aparece qualquer referência aos juros peticionados

Podendo ler-se, nesta matéria, a seguinte fundamentação exarada pelo Tribunal da Relação:

«Ponderando as circunstâncias do caso, espelhadas no manancial fáctico provado, e as consequências que os factos tiveram na pessoa do Autor, e ainda a situação económica da Ré – uma grande empresa - e do Autor, afigura-se-nos que a quantia de 30.000€, é adequada a ressarcir os danos não patrimoniais que resultaram provados, procedendo parcialmente o recurso. Esta quantia considera-se actualizada à presente data.» - cf. fls. 75 do Acórdão da Relação de Lisboa (sublinhado nosso).

E a mera referência, na parte final, a que “Esta quantia considera-se actualizada à presente data”, não tem o alcance que o Autor lhe pretende atribuir.

Refere-se aí tão só que “essa quantia” “se considera actualizada”, ou seja, tendo a presente acção sido interposta em 2012, a Relação entendeu que mesmo assim não se justificava fixar um valor mais elevado a título de indemnização por danos morais.

Em parte alguma se fala em juros. Nem antes, nem depois do segmento decisório.

Trata-se de uma omissão que para ser conhecida em sede de revista teria de ser suscitada expressamente pelo Autor – cf. os arts. 615º, nº 1, alínea d), 674º, nº 1, alínea c), e 684º, nº 1, 1ª parte, todos do Novo CPC, conjugado com o art. 77º do CPT.

Não o tendo sido, transitada se mostra a matéria relativa aos juros, pelo que não temos de a conhecer.

6.2. Resta-nos, assim, aferir do quantum devido ao Autor a título de indemnização por danos não patrimoniais, assente que se mostra, pelas razões por nós aduzidas nos pontos anteriores, que essa indemnização é devida.


Estriba-se o Autor para obter o aumento do valor indemnizatório no Acórdão desta Secção do STJ, datado de 21 de Abril de 2016[9], e que decidiu uma acção que fora também interposta contra a então “BB” (“BB – …, S.A.”) por um seu trabalhador, e na qual aquela Ré acabou por ser condenada a pagar ao ali Autor uma indemnização por danos morais no valor que ora se reclama: € 50.000,00.
Invoca, para tal, a similitude da situação decidida por aquele Acórdão do STJ, quando comparada com a sua, para concluir que deve ser fixado montante igual de indemnização.

Similitude que, contudo, é inexistente.
Vejamos porquê.

6.3. Conforme se expressou supra, em ponto anterior, atendendo ao art. 496º, nº 3, do CC, o montante da indemnização há-de ser fixado equitativamente.

O objectivo final, de acordo com este normativo, é o da obtenção de um resultado que possa considerar-se substancialmente adequado e justo.

O quantum indemnizatório será, pois, fixado com base num juízo de equidade, com consagração legal, tendo em atenção os factores apontados e todo o circunstancialismo fáctico provado, em que se procurará que o valor arbitrado pelo Tribunal seja proporcional à gravidade dos danos, devendo, para esse efeito, ter-se em conta todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, da justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida.[10]

6.4. A tal propósito, no Acórdão do STJ, de 21 de Abril de 2016, citado pelo Autor, como versando uma situação análoga, no que concerne aos danos não patrimoniais em que a Ré (então “BB”) foi condenada, pode ler-se, nomeadamente, o seguinte:

(…)

“Danos esses imputáveis necessariamente à Ré, a título de culpa, por ter violado o dever de proporcionar ao A. boas condições de trabalho, do ponto de vista físico e moral, previsto no art. 127.º, n.º 1, al. c), do Código do Trabalho, assim como violou as garantias legais e convencionais do A., seu trabalhador, designadamente as que proíbem o empregador de obstar injustificadamente à prestação efectiva de trabalho – art. 129.º, n.º 1, al. b), do mesmo Código – e as que proíbem o assédio moral definido no art. 29.º, do CT citado.

Não podendo deixar de se atender, na fixação do montante indemnizatório, ao grau de culpa do agente, à situação económica deste e à do lesado, a que o art. 494º do Código Civil faz apelo.

Para esse efeito dir-se-á que a R. assumiu, em relação ao Autor, um comportamento culposo, e revestido de uma considerável ilicitude, porquanto, quer a prestação efectiva do trabalho e a sua organização, devem, não só ser exercidas em condições socialmente dignificantes no que concerne ao trabalhador, como também desenvolver-se pautando-se pelo respeito pela honra e a dignidade deste, não o expondo a situações humilhantes e vexatórios.

Atento o quadro descrito não pode deixar de se considerar que a falta de condições de laboralidade a que o Autor foi sujeito, viola, objectiva e subjectivamente, direitos e deveres económicos com foros de dignidade constitucional, conforme decorre da CRP, v.g., nos seus arts. 58º, n.º 1 e 59º, n.º 1, alíneas a) e b).

Deste modo, face à gravidade da conduta humilhante e vexatória relatada, violadora dos deveres gerais do empregador e das garantias do A., seu trabalhador técnico – qualificado, e atendendo às consequências na esfera jurídica deste, ao nível da sua dignidade e integridade moral, mediante o desgaste psicológico e humilhação a que o mesmo foi sujeito, afigura-se-nos que se mostra ajustada e equitativa uma indemnização por danos não patrimoniais no valor de € 50.000,00. – (sublinhado nosso).

Considerações que, em nosso entender, não podem ser transpostas para o caso sub judice, uma vez que a factualidade provada no presente caso diverge bastante da que se provou na referida acção onde se fixou a indemnização por danos não patrimoniais em € 50.000,00.

6.5. Com efeito, no caso ali versado, no Acórdão de 21/04/2016, em que foi arbitrada a quantia de € 50.000,00, as razões jurídicas que motivaram tal valor são diferentes das relatadas nos presentes autos.

Estava, então, em causa, a violação reiterada do dever de ocupação efectiva do Autor pela Ré. Com o ostracizar daquele trabalhador de forma reiterada e até desumana pela Ré.

Tendo ficado provado, nomeadamente que:

(…)

Desde Dezembro de 2007, a R. tem mantido o A. em situação de absoluta inactividade, transferindo-o sucessivamente de gabinete, sendo que apenas em Outubro de 2012 lhe atribuiu a realização de uma tarefa consistente em aferir se os contadores/sensores térmicos das lojas da R. contavam correctamente ou não o movimento de entrada de clientes nessas lojas.

Tarefa para cuja execução se exigia que o A. se colocasse num local fora da loja e com linha de vista para a sua entrada, para verificar o número de clientes que aí entravam, devendo accionar manualmente, através da pressão de um manípulo, um equipamento mecânico que lhe foi entregue (hand tally counter) sempre que um cliente entrasse na loja auditada.

O A. executou esta tarefa durante dois meses, das 10,00 às 12,30 horas e das 14,30 às 17,00 horas, permanecendo no exterior da loja e elaborando no final do dia um relatório com a respectiva contagem que enviava por email.

De igual modo se apurou que o A. se sentiu humilhado e vexado com esta tarefa, e com o ter que explicar o que fazia aos colegas e conhecidos que o viam naquela situação.

Findos esses dois meses, o A. regressou à situação de inactividade em que previamente se encontrava, tendo-se demonstrado que todo este circunstancialismo lhe provocou intenso e profundo sofrimento emocional, com transtorno do comportamento e reflexos no seu relacionamento familiar e afectivo.

Com efeito, ficou provado que, desde Dezembro de 2007, a R. tem mantido o A. em situação de absoluta inactividade, transferindo-o sucessivamente de gabinete, sendo que apenas em Outubro de 2012 lhe atribuiu a realização de uma tarefa consistente em aferir se os contadores/sensores térmicos das lojas da R. contavam correctamente ou não o movimento de entrada de clientes nessas lojas.

Tarefa para cuja execução se exigia que o A. se colocasse num local fora da loja e com linha de vista para a sua entrada, para verificar o número de clientes que aí entravam, devendo accionar manualmente, através da pressão de um manípulo, um equipamento mecânico que lhe foi entregue (hand tally counter) sempre que um cliente entrasse na loja auditada.

O A. executou esta tarefa durante dois meses, das 10,00 às 12,30 horas e das 14,30 às 17,00 horas, permanecendo no exterior da loja e elaborando no final do dia um relatório com a respectiva contagem que enviava por email.

De igual modo se apurou que o A. se sentiu humilhado e vexado com esta tarefa, e com o ter que explicar o que fazia aos colegas e conhecidos que o viam naquela situação.

Findos esses dois meses, o A. regressou à situação de inactividade em que previamente se encontrava, tendo-se demonstrado que todo este circunstancialismo lhe provocou intenso e profundo sofrimento emocional, com transtorno do comportamento e reflexos no seu relacionamento familiar e afectivo”.

É neste contexto factual e jurídico que lhe foi arbitrada indemnização no montante de € 50.000,00.

No presente caso, pese embora os danos morais sofridos pelo A., a verdade é que não se está perante tal violação do dever de ocupação efectiva. O Autor teve actividade distribuída, ainda que no quadro apurado, pois de início a Ré queria que o Autor fizesse o trabalho, usando, para esse efeito, os transportes públicos, e o Autor alegou que não podia utilizar os transportes públicos pois isso afectava a sua saúde e tudo o mais que depois os autos retratam. Diferença que ressalta também do facto de o Autor manter o seu lugar na empresa, tendo sido reintegrado nesta.

Não são, pois, comparáveis as situações factuais vividas por ambos os Autores: o daquela e o desta acção. Nem tão pouco a sua subsunção jurídica.

Tanto assim que o objecto do recurso no âmbito do mencionado Acórdão de 21/04/2016, proferido na revista nº 79/13.5TTVCT.G1.S1, circunscrevia-se a:


“1. - Estão em causa, em sede recursória, as seguintes questões:
1. Da violação do dever de ocupação efectiva do A.;
2. Do direito do A. a ser promovido à categoria profissional de “Consultor” e da perda de ganho pela não promoção à referida categoria;
3. Da caducidade do direito da R. a aplicar ao A. a sanção disciplinar de 30 dias com perda de retribuição;
4. Do carácter abusivo da referida sanção;
5. Da adequação do montante de 100.000,00 € (cem mil euros), fixado a título de danos não patrimoniais, resultantes de assédio moral;
6. Do pedido de condenação da Ré como litigante de má-fé- (sublinhado nosso).

Ao passo que nestes autos as questões suscitadas centram-se em saber se:

“1. Recurso de revista principal (interposto pela Ré):
a) Existe clara oposição entre os fundamentos e a decisão proferida pela Relação, nos termos do disposto no art. 615.º, n.º 1, al. c), do CPC;
b) A Relação procedeu a uma errada apreciação da matéria de facto e, consequentemente, a uma incorrecta interpretação e aplicação do Direito;
c) Não é devida ao Autor indemnização por danos não patrimoniais e, em caso afirmativo, se o montante de € 30.000,00 que lhe foi arbitrado a esse título é, ou não, excessivo.

  2. Recurso de revista subordinado (interposto pelo Autor):
- Face à gravidade dos factos, a compensação devida ao Autor por danos não patrimoniais deve ser aumentada para € 50.000,00” – (sublinhado nosso).

A este propósito escreveu-se, na presente acção, no Acórdão recorrido e proferido pela Relação de Lisboa:

“No presente caso, não foi alegado pelo Autor que o assédio de que foi alvo se traduzisse factor de discriminação em relação a outros trabalhadores, não logrando a tutela potenciada pelo disposto nos artigos 23º e seguintes do CT, o que não significa que não mereça tutela por via do disposto no artigo 15º do mesmo diploma legal, com reporte à tutela dos direitos de personalidade”.

Por conseguinte, não pode ser invocado o referido Acórdão do STJ como um “precedente”, porquanto, repete-se, não se verifica no caso sub judice a mesma realidade fáctica e jurídica, pelo que o valor a arbitrar a título de danos não patrimoniais não tem de ser igual aos citados € 50.000,00.

É certo que, conforme se exarou em ponto anterior, o Autor sofreu com tudo o que se passou, e não pode deixar de se considerar que a Ré, com o seu comportamento, provocou danos morais no Autor lesando a sua saúde física e psicológica, despoletando neste sentimentos de humilhação, tristeza, angústia e ansiedade, com projecção directa na sua vida familiar.

Não podendo, por isso, deixar de se considerar que tais danos não patrimoniais merecem a tutela do Direito e consequentemente terão de ser valorados.

Mas sê-lo-ão de acordo com o citado juízo de equidade a que a lei faz apelo e que terá necessariamente de se repercutir na fixação do respectivo montante indemnizatório desses danos.

Entendemos, porém, como valor adequado e equitativo, para o caso sub judice, a quantia de € 30.000,00 (trinta mil euros). Ou seja: o mesmo montante que foi arbitrado pelo Acórdão recorrido.

Consequentemente, vai a Ré condenada a pagar ao Autor pelos danos não patrimoniais provocados uma indemnização no valor de € 30.000,00 (trinta mil euros), mantendo-se, pois, o valor de indemnização fixado pelo Tribunal da Relação de Lisboa ao Autor, a esse título.

7. Nestes termos improcede a revista principal interposta pela Ré e improcede, igualmente, a revista subordinada do Autor.

III – DECISÃO:

- Face ao exposto acorda-se em manter o Acórdão recorrido e, consequentemente:

a) Julgar improcedente a revista principal interposta pela Ré;

b) Não conhecer da questão relativa aos juros moratórios;

c) Julgar improcedente a revista subordinada do Autor.


- Custas da revista principal a cargo da Ré;

- Custas da revista subordinada a cargo do Autor.

- Anexa-se sumário do presente Acórdão.

Lisboa, 26 de Outubro de 2017.


Ana Luísa Geraldes (Relatora)

Ferreira Pinto

Ribeiro Cardoso (vencido).

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VOTO DE VENCIDO

Votei vencido no que tange ao montante da indemnização arbitrada.
Efetivamente tendo por bussola a equidade e sem perder de vista os factos provados e as indemnizações por danos não patrimoniais arbitradas por esta secção em anteriores decisões, a indemnização deveria, a meu ver, ter sido fixada em montante não superior a € 20.000,00.
Como flui dos autos os danos a serem indemnizados são os decorrentes do despedimento ilícito.
Por conseguinte, não devem ser considerados os factos anteriores à instauração do procedimento disciplinar.
Ora, os danos provocados pela instauração do processo e consequente despedimento são apenas os consignados sob os números 133-B a 158. Acresce que a parte mais significativa dos danos foi decorrente do receio do A. perder os benefícios do sistema de saúde BB ACS, receio que não se concretizou pelo facto do despedimento ter sido declarado ilícito.
Importa ainda ter em consideração que, pese embora o despedimento tenha sido declarado ilícito por decisão transitada, o mesmo teve por fundamento atos praticados pelo A., que se recusou a cumprir as ordens recebidas, pelo facto de não lhe ter sido facultado veículo automóvel para o efeito e ter que utilizar os transportes públicos, apesar de lhe ter sido comunicado que uma das razões da utilização daquele meio era a necessidade “de verificar a qualidade de serviço nos transportes públicos nas várias zonas urbanas enquanto se desloca[va]” (facto 54).
Finalmente, não vem provado que o A. tenha invocado perante a hierarquia razões de saúde como motivo para a recusa da utilização dos transportes públicos, mas que “apenas pretend[ia] defender a dignidade da função e, sobretudo, a dignidade de um Cidadão que é Colaborador da BB, a qual, como todos reconhecem, não é uma Empresa qualquer” (facto 55).
Por estas razões fixaria a indemnização no montante de € 20.000,00.


(António Manuel Ribeiro Cardoso)

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[1] Cf. neste sentido, por todos, José Lebre de Freitas, Montalvão Machado e KK Pinto, in “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. 2º, Coimbra Editora, págs. 645 e segts., reiterando a posição anteriormente expressa por Alberto dos Reis, in “CPC Anotado”, Vol. V, pág. 143, e que se mantém perfeitamente actual nesta parte, em face dos preceitos correspondentes e que integram o Novo CPC.
[2] Neste sentido cf. Alberto dos Reis, in “Código de Processo Civil Anotado”, V Vol., pág. 141, perfeitamente actual face ao idêntico teor da norma analisada.
[3] Neste sentido, cf. Amâncio Ferreira, in “Manual de Recursos em Processo Civil”, 9ª Edição, Almedina, pág. 56.
[4] Acórdão proferido no âmbito do Proc. 184/11.2.TTVLG.P1.S1, Relatado por Melo Lima, e disponível em www.dgsi.pt.
[5] Neste sentido, cf., por todos, Menezes Cordeiro, in “Direito das Obrigações”, 2.º Vol., Almedina, pág. 288 e segts.
[6] Neste sentido, cf., Vaz Serra, in “Reparação do Dano Não Patrimonial”, in RLJ, 113º, pág.96.
[7] Neste sentido, cf. tb o Acórdão desta Secção do STJ, de 25/11/2014, proferido no âmbito do Proc. nº 81711.6TTFAR. E.S1, Relatado por Fernandes da Silva, e disponível em www.dgsi.pt.
[8] No sentido de que danos dessa natureza devem ser indemnizados, cf. os Acórdãos desta Secção do STJ, de 01/10/2014 e de 17/12/2014, proferidos no âmbito dos processos nº 292/11.0TTSTR.E1.S1 e nº 420/06.7TTLSB.L1.S1, respectivamente, ambos Relatados por Mário Morgado, de 22/04/2015, no processo nº 822/08.4TTSNT.L1.S1, Relatado por Melo Lima, e de 26/05/2015, no processo nº 2056/12.4TTLSB.L1.S1, relatado por Leones Dantas, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
[9] Acórdão proferido no âmbito do Proc. nº 79/13.5TTVCT.G1.S1, Relatado por Ana Luísa Geraldes, e disponível em www.dgsi.pt.
[10] Cf., nesta matéria, Antunes Varela, in “Das Obrigações em Geral”, pág. 486 e segts.