Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
39/2000.L1.S1
Nº Convencional: 6ª SECÇÃO
Relator: FONSECA RAMOS
Descritores: CONCESSÃO COMERCIAL
INDEMNIZAÇAO DE CLIENTELA
EQUIDADE
CLAÚSULA EXCLUDENTE DA INDEMNIZAÇÃO
VALIDADE
REGULAMENTOS COMUNITÁRIOS
Data do Acordão: 01/24/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Sumário :

I) - Sendo o contrato de concessão comercial um contrato de cooperação comercial e de distribuição, pressupondo uma integração e conjugação de esforços organizativos com vista à implementação de bens no mercado, assumem especial relevo a estabilidade e permanência – o seu cariz continuado, duradouro – sem o qual a vertente de rentabilização económica dificilmente será alcançável.

II) – A indemnização de clientela tem como pressuposto basilar a cessação do contrato de concessão (por aplicação analógica do regime legal do contrato de agência) e, como requisitos legais cumulativos, os que constam do art. 33º,nº1, als. a), b) e c) do DL.178/86, de 3.7, exigindo-se que o concessionário tenha angariado novos clientes para o concedente ou aumentado substancialmente o volume de negócios com a clientela já existente; o concedente venha a beneficiar consideravelmente, após a cessação do contrato, da actividade desenvolvida pelo concessionário e que o concessionário de receber qualquer retribuição por contrato.

III) – O que está na base da indemnização de clientela é uma ideia de justiça [repare-se que o critério da sua fixação, pese embora o “travão legal”, é o da equidade], assente na consideração de que se o concessionário proporcionou, pela sua actividade, incremento significativo na clientela do concedente, assim o beneficiando “substancialmente” para o futuro, em termos de volume de negócios, deve ser compensado pelo esforço despendido.

IV) No contrato em causa foi acordada a Cláusula 17ª que consagra o direito potestativo de denúncia pelo concedente que, como é inerente a esse instituto, é um direito que pode ser exercido ad nutum, sem prejuízo, todavia, do seu exercício dever salvaguardar a regra da boa-fé, mormente, tratando-se de contrato duradouro, devendo obedecer tal direito a um prazo com pré-aviso razoável. Tal cláusula exclui qualquer indemnização, tendo sido acordado que o prazo de denúncia – dois anos – poderia ser prorrogado por mais um ano, no condicionalismo previsto no seu nº2.

V) - O Regulamento (CE) nº1475/95, da Comissão, de 28.06.95, já substituído pelo Regulamento (CE) nº1400/2002 de 31.07.2002, regulava a aplicação do nº3 do artigo 85º do Tratado CE a certas categorias de acordos de distribuição e de serviço de venda e pós-venda de veículos automóveis, sempre que estejam em causa relações transfronteiriças, prevendo-se, no seu artigo 5º, o direito do fornecedor fazer cessar o contrato mediante um pré-aviso de, pelo menos um ano, em caso de necessidade de reorganizar a totalidade ou uma parte substancial da rede de distribuição.

VI) – Aquelas normas comunitárias sobre o sector da distribuição automóvel, não são aqui aplicáveis, desde logo, porque não se trata de relações comerciais transfronteiriças, mas, antes, de um contrato para valer numa muito restrita área territorial portuguesa. Por outro lado, aquela legislação comunitária visa, essencialmente, regular e disciplinar a concorrência e, acima de tudo, a protecção dos concessionários.

VII) – A Cláusula 17ª do contrato que faculta ao concedente a cessação do contrato, em qualquer caso, e sem nenhuma indemnização, é uma cláusula que acentua a já congénita fragilidade contratual do concessionário, com o gravame de desconsiderar a análise a posteriori duma situação que pode bem ser infractora das regras da boa-fé, pelo que se deve considerar inválida (nula) por violar preceitos cogentes, analogicamente aplicáveis a partir do contrato de agência, e, objectivamente, equivaler a uma renúncia antecipada do direito do concessionário (credor), independentemente de qualquer grau de culpa, violando o art. 809º do Código Civil.

VIII) – Tendo em conta que a indemnização de clientela se faz com recurso à equidade, que é a justiça do caso concreto, haverá que ponderar o longo tempo de cooperação da concessionária na estrutura e organização comercial do concedente, cerca de 18 anos que, como é objectivo, atravessou períodos de maior ou menor fulgor consumista, com a inerente repercussão no nível de vendas de veículos automóveis, nos investimentos feitos pela concessionária para obter os objectivos visados pelo contrato, e, sobretudo, a consideração do incremento económico (clientela) que, cessada a relação contratual, poderá advir para concedente.

Decisão Texto Integral:

Proc. 39/2000.L1.S1.

R-341[1]

Revista.


Acordam no Supremo Tribunal de Justiça


            AA -Sociedade de Automóveis da Maia, Lda, intentou, em 10.4.2000, pelas Varas Cíveis da Comarca de Lisboa – 2ª Vara – acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra:

 Renault Portuguesa – Sociedade Comercial, S.A.

           

Alegou a Autora, em resumo:

           

A Autora dedica-se à comercialização de veículos automóveis, peças e acessórios dos mesmos e ainda à sua reparação e a Ré é fabricante e importadora de veículos automóveis, peças e acessórios daquela marca Renault.

A Autora adquiriu instalações e equipamentos e admitiu pessoal no âmbito de um contrato de concessão celebrado com a Ré;

- depois daquele contrato datado de 1981, outros contratos lhe sucederam, por força dos quais a Autora procedia à comercialização de veículos da marca Renault bem como de peças e acessórios para os mesmos, adquiridos à R., prestando também serviços de assistência aos veículos.

Tinha uma área exclusiva de actuação na zona da Maia, podendo ainda proceder a vendas na zona banalizada do Porto.

O último contrato celebrado entre Autora e Ré era por tempo indeterminado, com possibilidade de resolução a todo o tempo com um ano de antecedência.

Por carta de 30 de Julho de 1997, a Ré comunicou à Autora a cessação do contrato com efeitos a partir de 31 de Julho de 1999 e desde aí a Ré deixou de fornecer peças, veículos e acessórios, tendo cortado o sistema informático que ligava Autora e Ré e retirado a sinalética da marca das suas instalações.

A Autora foi sempre uma empresa agressiva e idónea, cumprindo as suas obrigações para com a Ré, tendo feito investimentos em instalações e equipamentos técnicos, sendo que parte de tais investimentos foram determinados pela própria Ré.

A Autora promoveu e publicitou a marca Renault, tendo angariado e fidelizado clientela e tendo por isso mais de 15.000 clientes obtidos durante todo o tempo de duração das relações comerciais com a Ré, bem como potenciou a angariação de novos clientes.

Face à cessação do contrato com a Ré a actividade comercial da Autora findou, tendo-se limitado a vender os veículos usados que tinha em stock.

A Ré vai continuar a beneficiar da clientela que a Autora angariou até porque tinha acesso aos seus dados de clientes e não se propõe pagar-lhe qualquer vantagem patrimonial, tendo nomeado um novo concessionário para a zona até então atribuída à Autora.

Na vigência dos contratos entre Autora e Ré aquela teve nos últimos cinco anos, uma margem bruta média de 514.115.007$60, a preços de 1998 e proporcionou à Ré um volume de negócios de quase dois milhões de contos; a Ré vai beneficiar do bom nome da Autora.

Assim, a Autora deve ser indemnizada, nos termos do art. 34 do Dec. Lei nº 178/96, de 3 de Junho, pelo valor peticionado e, se assim se não entender a Ré deve ser condenada a pagar-lhe a mesma quantia por enriquecimento sem causa.

            Pediu a Autora a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de 514.115.007$00, acrescida de juros de mora à taxa legal vigente em cada momento, a contar da citação e até integral pagamento por indemnização de clientela, ou a condenação da Ré na mesma quantia por enriquecimento sem causa.

            Na contestação apresentada a Ré, referindo a acção pendente na 6ª Vara Cível de Lisboa, 1ª Secção, com o nº 771/98, invocou a litispendência ou, assim se não entendendo, que aquela acção constituiria causa prejudicial relativamente a esta; impugnou factualidade alegada pela Autora e, face ao enquadramento jurídico que perspectivou, concluiu pela improcedência da acção.

            O processo prosseguiu sendo que na sua sequência a Ré veio deduzir articulado superveniente, alegando, designadamente, que a Autora, uma vez cessada a sua relação comercial com a Ré, transmitiu para a sociedade que se identifica comercialmente como “Carmaia” a sua actividade e a sua clientela, o que bastaria para não dar como provados os pressupostos de uma “indemnização de clientela” se a ela houvesse lugar e pediu a condenação da Autora como litigante de má fé, nomeadamente em multa não inferior a 250.000 Euros.

No saneador foi julgada improcedente a excepção peremptória da litispendência e indeferida a suspensão da instância por pendência de causa prejudicial, bem como admitido o articulado superveniente da Ré.

Do despacho que admitiu o referido articulado agravou a Autora.


***

            A final, foi proferida sentença que julgou improcedentes quer a acção quer o pedido de condenação da A. como litigante de má fé.


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Da sentença apelou a Autora para o Tribunal da Relação de Lisboa que, por Acórdão de 12.5.2011 – fls. 1500 a 1546 –, negou provimento ao agravo, e julgou a apelação procedente, revogando a decisão recorrida, e, em consequência, julgando a acção parcialmente procedente condenando a Ré a pagar à Autora a quantia de € 100.000,00 (cem mil euros), acrescida de juros de mora desde o trânsito em julgado da decisão.

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Inconformadas recorreram a Autora e a Ré.


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A Autora, alegando, formulou as seguintes conclusões (fls. 1595 a 1596):

1. A recorrente iniciou a sua actividade de concessionária da Renault em 1981 tendo sido a primeira concessionária desta marca na área territorial da Maia.

2. Ali se desenvolveu e durante todo o período da relação comercial com a recorrida privilegiou pela publicidade e pela qualidade dos seus serviços.

3. Durante 18 anos singrou e venceu num mercado cuja concorrência é feroz, tendo conseguido fidelizar milhares de clientes o que no mercado automóvel além de fundamental é praticamente impossível.

4. Após a cessação do contrato de concessão ficou a recorrida a beneficiar de uma vasta carteira de clientes que mais não é do que o resultado do empenho e dos esforços da recorrente.

5. Ficou a recorrida a beneficiar daquilo que é essencial no mercado automóvel, uma carteira de clientes fiéis.

6. Demonstra-se portanto indiscutível o direito da recorrente à indemnização de clientela.

7. Na fixação do montante da indemnização, o douto Tribunal da Relação, desvalorizou totalmente a necessidade de ter em consideração a média do rendimento anual líquido auferido pela recorrente durante os últimos cinco anos,

8. Fundamentando a sua decisão única e exclusivamente no vector da equidade e tendo por elemento coadjuvante somente o documento de fls. 360 (declaração de rendimentos modelo 22 da A., referente ao exercício de 1998).

9. Com tal decisão violou o douto tribunal o sentido e alcance daquilo que se encontra consagrado no art. 34 do DL n 178/86 de 3 de Julho, pois 10. Impõe aquele artigo ao julgador o dever de analisar casuisticamente as circunstâncias do caso concreto, devendo na sua ponderação ter em consideração o limite máximo em que aquela indemnização se pode fixar.

11. Deste modo, atenta matéria provada e especialmente a supra citada, deve a recorrente ser indemnizada no máximo legalmente permitido, afigurando-se qualquer quantia inferior violadora do consagrado no art. 34 do DL 178/86 de 3 de Julho, ou seja, deve a recorrente ser indemnizada em quantia não inferior a Esc. 514.115.007$00.

Termos em que deverá o presente recurso ser julgado procedente e por via disso alterado o acórdão posto em crise, condenando-se a recorrida a indemnizar a recorrente em 514.115.007$00, com todas as consequências legais.


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A Ré, alegando, formulou as seguintes conclusões:

1. O presente recurso tem por objecto apenas a parte do douto Acórdão recorrido que condenou a ora Recorrente no pagamento de € 100 mil à Recorrida a título de indemnização de clientela.

lI. O Regulamento (CE) nº1475/95 da Comissão, de 28/06/95 tratava da matéria relativa à indemnização em caso de cessação do contrato e autorizava que as partes regulassem essa questão fixando em alternativa a uma indemnização de clientela o aumento do período de denúncia do contrato de um para dois anos, a título da compensação que seria devida ou como forma alternativa de compensação do concessionário.

III. E não será demais salientar que o Regulamento Comunitário, na hierarquia de normas comunitárias, tem uma força superior que as Directivas Comunitárias (que necessitam de ser transformadas em direito interno e não dispõem da generalidade e obrigatoriedade dos Regulamentos), e o DL. 178/86 é resultado de uma Directiva, devendo conformar-se com o Regulamento de força superior.

IV. Por um lado em causa no presente processo estão potencialmente questões transfronteiriças, pois a Recorrente nada mais é do que a representante em Portugal do fabricante francês RENAULT, havendo um mercado livre de importação e venda de veículos automóveis na União Europeia.

V. E estão em causa efectivamente princípios de defesa da concorrência intra comunitária, pois a necessidade de pagar uma indemnização de clientela por uma firma estabelecida em outro Estado membro a um concessionário local pode por em causa a livre concorrência e a liberdade de estabelecimento e de prestação de serviços.

VI. E, da leitura atenta do Regulamento n°.1475/95, fácil é concluirmos que eles, não só não contêm a previsão de uma “indemnização de clientela” no caso da denúncia ser feita com um pré-aviso de 2 anos, como, em alternativa, vem admitir o pagamento de uma “indemnização adequada” em caso de cessação do acordo, caso o pré-aviso para a denúncia do contrato seja apenas de um ano (art. 5°/2, ponto 2), primeiro travessão).

VII. Assim, fica evidente que a clausula 17ª do contrato não é nula, pois não viola qualquer norma injuntiva do direito português, incluindo do direito comunitário.

VIII. Ora, da economia do contrato resulta que a renúncia a uma indemnização de clientela é lícita quando compensada pela atribuição de mais um ano de vigência do contrato, o que as partes (incluindo o concessionário) consideraram no caso suficiente para repor a sua situação e equilibrar as prestações no contrato.

IX. Mas também não existe qualquer norma expressa no direito português que proíba a renúncia antecipada à indemnização de clientela.

Com efeito, a única norma que os Autores identificam com esse conteúdo é a constante do artigo 19° da Directiva 86/653, transposta para o direito português pelo DL. 178/86 (é claro que o art. 809° Código Civil não pode ser aqui aplicável, por não existir incumprimento contratual, conforme jurisprudência pacífica — cfr. Ac RL 12/05/2009, Proc. 763/05.7TVLSB-7.

X. Ora o DL. 178/86 não incluiu a norma do artigo 19° da Directiva! Nem o fez na sua versão original, antes da Directiva, nem na sua revisão, depois da Directiva, pelo DL 118/93. E isso tem que ter consequências: o legislador tomou a clara opção de não o fazer!

XI. Consequências ainda mais relevantes quando sabemos que o legislador próximo foi Pinto Monteiro, que tanto se tem dedicado a estes assuntos, pelo que não foi uma omissão negligente, mas uma supressão pensada!

XII. Pinto Monteiro admite mesmo um acordo prévio à cessação do contrato a fixar o montante da indemnização de clientela (cfr. Contrato de Agência, 2007, pág. 140).

 A Clausula 17ª do Contrato não é mais do que isso: fixa o valor da indemnização de clientela em mais um ano de contrato.

XIII. E não pode dizer-se que vigora no nosso ordenamento uma norma da Directiva sem que a mesma tenha sido transposta, pois a isso impede o próprio direito comunitário, que impõe a transposição das Directivas para o direito interno (cfr. art. 288° TFUE e a nossa Constituição até impõe que tal seja feito por acto legislativo — art. 112°/8 CRP).

XIV. E não vigora qualquer efeito directo horizontal das normas da Directiva, existindo eventualmente apenas um direito a responsabilidade do Estado por má transposição da Directiva, se for o caso (ANA MARTINS, in “Curso de Direito Constitucional da União Europeia”, págs. 448-449).

XV. Como se pode ver da cláusula 17ª se não for invocado o seu n.°1, a denúncia apenas tem um prazo de pré-aviso de 1 ano (cfr. n° 2), mas já não é excluída a indemnização. Fica bem evidente a vontade das partes em considerar o ano suplementar como compensação alternativa à indemnização de clientela.

XVI. Assim, fica evidente que a situação analisada no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, citado pelo douto Acórdão recorrido, não tem aplicação no presente caso: a Cláusula 17ª do contrato é totalmente diversa da analisada nesse outro douto aresto!

XVII. Veja-se como é a própria lei que afasta a indemnização de clientela nos casos em que o agente se encontra compensado por outra forma (cfr. art. 33°/1. c) DL 178/86).

 Com efeito, diz a norma em causa que não haverá lugar a indemnização de clientela se o agente receber retribuição por contratos negociados ou concluídos com os clientes por si angariados após a cessação do contrato.

XVIII. Daqui se retira que a lei prevê como lícito que a indemnização de clientela possa ser substituída por outra qualquer forma de compensação.

XIX. E a lei nem sequer exige que a compensação alternativa seja em montante equiparável ao da indemnização de clientela, bastando que o agente receba efectivamente uma qualquer compensação — desde que não simbólica (Pinto Monteiro, in “Contrato de Agência”, 2007, pág. 140).

XX. Donde resulta que a protecção feita pela Ordem Jurídica à parte mais frágil da relação económica apenas exige a existência de uma compensação pela cessação da retribuição da sua actividade, não impondo que tal compensação seja a “indemnização de clientela” prevista nos exactos termos dos artigos 33° e 34° DL. 178/86.

XXI. De igual modo se prevê no n.°3 do artigo 33º DL. 178/86 outra forma de compensação para além da indemnização de clientela — a cessão da posição contratual do agente.

XXII. Ou seja, não é de Ordem Pública a imposição de uma indemnização de clientela, tal como prevista no artigo 33° e 34° DL 178/86, mas apenas a imposição de uma compensação à parte mais frágil da relação comercial pela perca de retribuição da sua actividade passada com a cessação do contrato, podendo essa compensação revestir outras formas a definir por acordo das partes antes da cessação do contrato.

XXIII. Ora, assim vistas as coisas — que é como elas na realidade o são — o acordo constante da Clausula 17ª do Contrato dos autos, pelo qual as partes convencionaram, em alternativa à indemnização de clientela, a atribuição de mais um ano de pré-aviso no prazo da denúncia, afigura-se totalmente lícito!

XXIV. Não há uma renúncia antecipada a uma compensação. Há a fixação pelas partes de uma alternativa de compensação à indemnização de clientela prevista na lei.

A parte mais frágil da relação continua a usufruir de uma compensação, em alternativa à indemnização compensatória. Não há violação da ordem Pública!

XXV. Finalmente, não menos relevante, é recordar que, diferentemente do agente, o concessionário é um comerciante profissional em nome próprio, que tem de assumir os riscos do comércio — não se lhe podendo aplicar as normas da mesma forma que se aplicam a um não comerciante.

XXVI. Pelo que a protecção da lei tem de forçosamente ser menor (cfr. semelhantemente no âmbito da defesa do consumidor — Lei 24/96 — ou nas cláusulas contratuais gerais — DL 446/85 — onde a posição do comerciante profissional é excluída ou a protecção é diminuída).

XXVII. Era ónus do Recorrido provar o número de clientes que teve (art. 342° Código Civil) — o que não fez! (cfr. Ac. RP de 18/01/2005, Proc. 0425898; Ac. RP de 11/07/2005, Proc. 0553724).

Pelo contrário e de forma relevantíssima, ficaram provados vários factos que indiciam que a clientela da Recorrida era pouca (cada vez menos) e não fidelizada...

XXVIII. E foi isso, com toda a certeza, que levou a M. Juiz da primeira instância a decidir da forma que o fez — na sua livre apreciação da prova — do conjunto de toda a prova (cfr. art. 655° Código de Processo Civil).

É isso que também terá levado a Relação, apesar de tudo, a fixar o valor da indemnização, como o fez.

XXIX. Não pode deixar ainda de se atender a factos provados como os n.°s 127 e 165 a 166 (baixo nível de fidelização do cliente), 128 a 130, 140 e 141 e 167 (mercado de oficina), 131 a 133 (força da marca), 134 (situação em 1980 da marca), 144 e 146 a 149 (baixa de vendas crescente), 161 a 163 (transferência de clientes), 17 a 36 e 176 (continuação do negócio via terceiro).

XXX. Também, ficou assente que a Recorrida vendia cada vez menos viaturas e peças. Veja-se que baixa de 92% dos objectivos fixados de vendas em 1994 para uns míseros

 54% em 1999 (cfr. FA n.° 147). O que originou inclusivamente cartas sucessivas da Recorrente para a Recorrida a alertar para a situação e a dizer que não podia continuar-se desta forma (cfr. FA n. °146).

XXXI. E esta baixa de vendas não tinha como causa a maior concorrência ou o retraimento do mercado, pois cessaram a sua actividade no mesmo território da Recorrida três concessionários e apenas foi aberto um, o que potenciou mais mercado para a Recorrida, mas que esta não aproveitou... (cfr. FA n° 148).

XXXII. Donde se ter dado obviamente como assente a única conclusão possível — que a Recorrida já não estava a satisfazer os objectivos comerciais de venda de viaturas e peças e que já não se via interesse na manutenção da concessão (cfr. FA n.° 149). A cessação do contrato foi por culpa exclusiva da Recorrida!

XXXIII. Além de que, exige ainda o n°. 3 do art. 33º DL. n°. 178/86 que a cessação do contrato não tenha ocorrido por culpa do agente.

Ora, vimos que a cessação do contrato se deveu exclusivamente à crescente perca de qualidade da Recorrida, designadamente, desde 1995. Como a Ré fez sentir à Autora em variadas cartas desde essa altura. Cada vez a recorrida vendia menos e prestava um pior serviço.

XXXIV. É jurisprudência pacífica que esta norma não exige que se tenha fundamentado a denúncia em incumprimento ou se tenha utilizado o instituto da resolução em vez da denúncia, mas apenas que tenha tido lugar por “razões imputáveis ao agente’. (cfr. Supremo Tribunal de Justiça, 07/03/2006, Proc. 06A027).

De igual modo Pinto Monteiro (cfr. Contrato de Agência, 2007, págs. 140-141).

O que ficou provado que aconteceu!

XXXV. Também a força atractiva da Marca foi essencial na angariação da clientela (cfr. FA n.°131). Pelo que se reforça a fraca capacidade de angariação de clientela da Recorrida, condizente com a sua incapacidade de prova do número de clientes efectivos...

XXXVI. Igualmente foi dado como assente que nunca poderia ser expectável — em qualquer juízo de prognose — que a Recorrente pudesse vir a beneficiar consideravelmente da clientela angariada pela Recorrida.

XXXVII. Ficou provado que o nível de fidelização do cliente na compra de viaturas novas é baixo (cfr. FA n.° 127). E muito menor ainda em peças e oficina, principalmente após o período de garantia (cfr. FA n.°s 128 a 130).

XXXVIII. E, questão essencial, o contrato não previa qualquer obrigatoriedade de transferência do ficheiro de clientes da Recorrida para a Recorrente, findo o contrato (cfr. FA n.° 162).

XXXIX. E a única via que permitia à Recorrente conhecer nomes de clientes da Recorrida era através da matriculação de viaturas novas vendidas, mas sem qualquer actualização no tempo desses dados dos clientes, pelo que era normal as moradas dos clientes já não corresponderem às moradas reais (cfr. FA n.°s 161 a 163).

XL. Finalmente importa ver que a Recorrida teve lucros diminutos nos últimos exercícios da sua actividade como concessionária Renault! Veja-se que no M22 do IRC relativo ao ano de 1998, único apresentado pelo Recorrida nos autos (cfr. Doc. 84 à P1 - embora os peritos tenham tido acesso a mais alguns anos, segundo se depreende do seu relatório), retira-se que o resultado líquido do exercício foi de apenas 20 mil euros!

XLI. Mas, dos quais até cerca de 12 mil € são resultado de proveitos financeiros e extraordinários do exercício, logo irrepetíveis e excepcionais... Logo, aos 20 mil euros de lucro que a Relação deu relevância para a fixação do quantum indemnizatório deveria antes ter retirado estes 12 mil euros extraordinários, por não corresponderem a actividade normal.

XLII. E outras receitas nada terão a ver com a relação Renault, por se deverem a negócios extra concessão, como a venda de viaturas usadas — confessada pela própria Recorrida!

XLIII. Dando por adquirido tudo quanto se deixou dito, sem conceder, subsidiariamente, sempre se dirá que em todo o caso o valor a fixar por equidade a título de indemnização de clientela, a haver lugar à mesma, terá de ser extremamente reduzido, senão mesmo eliminado. Tudo o que ficou provado nos autos e vem bem evidenciado pela Relação, levam a uma diminuição extrema do valor da indemnização a arbitrar.

XLIV. Nestes termos, dando-se aqui por reproduzido, por economia processual o acima exposto, designadamente quanto à (i) diminuição acentuada e progressiva ao longo dos últimos anos da concessão da venda de veículos, (ii) quanto à especial força atractiva da Marca e (iii) quanto ao não beneficio futuro nem considerável da concedente, entende-se que a indemnização de clientela a ser fixada, terá de forçosamente e por justiça do caso concreto, de o ser em valores meramente simbólicos. ou mesmo em valor zero, o que se requer.

Termos em que, deve o recurso da Recorrente ser totalmente deferido, anulando-se o douto Acórdão recorrido e absolvendo-se integralmente a Recorrente, ou subsidiariamente, se assim não for entendido, diminuindo-se substancialmente e equitativamente a indemnização a pagar a meros valores simbólicos, como é de Lei e de Justiça.

As partes contra-alegaram reciprocamente.


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Colhidos os vistos legais cumpre decidir, tendo em conta que a Relação considerou provados os seguintes factos:

1 – A Autora é uma sociedade comercial por quotas de responsabilidade limitada, constituída em Dezembro de 1980, cujo escopo social é a comercialização e reparação de veículos automóveis, respectivas peças e acessórios – (al. A) da Esp.).

2 – Entre a Autora e a Ré foi celebrado em Janeiro de 1981 o acordo escrito documentado a fls. 32 a 45, denominado de “Contrato de Concessão” que foi celebrado pelo prazo de um ano, renovável por períodos iguais e sucessivos [O contrato referido no art. 4º da petição inicial foi celebrado pelo prazo de um ano, renovável por períodos iguais e sucessivos] – (al. B) da Esp.).

3 – Em 1983 a A. e a R. repetiram o procedimento referido em 2) através do acordo documentado a 59 a 71 dos autos, também denominado de «Contrato de Concessão», destinando-se o contrato a vigorar para o ano de 1983 [Em 1983 Autora e Ré repetem o procedimento referido em 2 -, destinando-se o contrato a vigorar para o ano de 1983, dando-se por reproduzido o teor do documento constante de fls. 59 a 71 dos autos] – (al. C) da Esp.).

4 – Em 1984 Autora e Ré celebram novo contrato de concessão, para vigorar pelo período de dois anos, conforme documento de fls. 72 a 84 dos autos [dando-se por reproduzido o documento constante de fls. 72 a 84 dos autos] – (al. D) da Esp.).

5 – Em 1986 Autora e Ré celebram novo contrato de concessão pelo período de um ano, renovável por períodos iguais e sucessivos, conforme documento de fls. 85 a 97 [dando-se como reproduzido o teor do documento de fls. 85 a 97] – (al. E) da Esp.).

6 – Em 10 de Março de 1987 é celebrado um novo contrato entre Autora e Ré, visando também a distribuição dos produtos desta por parte daquela, por tempo indeterminado, conforme documento de fls. 98 a 111 [dando-se como reproduzido o teor do documento de fls. 98 a 111 dos autos] – (al. F) da Esp.).

7 – Nos termos do contrato celebrado em 1987 (bem como dos contratos anteriormente celebrados) a Ré confere à Autora o direito de proceder à comercialização de veículos automóveis da marca Renault, suas peças, acessórios e prestação dos serviços de reparação e assistência aos mesmos relativos – (al. G) da Esp.).

8 – Em 1993 a Autora leva a cabo obras de renovação da sua imagem, as quais foram aprovadas pela Ré que, entendendo que as mesmas estavam adaptadas à sua imagem de marca e à sua política comercial, em 1995 as comparticipou em cerca de 8.000.000$00, dando-se como reproduzido, para todos os efeitos, o teor do documento constante de fls. 145 a 146 dos autos – (al. H) da Esp.).

9 – A sinalética da Autora tinha obrigatoriamente as cores Renault (amarelo e cinzento), sendo a mesma fabricada por empresa para o efeito incumbida pela Ré – (al. I) da Esp.).

10 – A Autora tinha que ter aposto nas suas instalações o logótipo da Renault, ou seja, tinha que observar as regras de identificação visual constantes do manual fornecido pela Ré – (al. J) da Esp.).

11 – A Autora sempre deu formação periódica ao seu pessoal, tudo na linha da política Renault, isto é, os trabalhadores da Autora recebiam formação, que inicialmente foi ministrada no departamento de formação profissional que a Ré possuía e, posteriormente, no Instituto de Formação Renault, dando-se como reproduzido, para todos os efeitos, o teor dos documentos de fls. 147 a 160 dos autos – (al. L) da Esp.).

12 – A Autora comparticipava tal formação, custeando parte dos cursos e suportando ainda os encargos com os formandos (despesas de deslocação, de alojamento quando necessárias, salariais…) – (al. M) da Esp.).

13 – Os mecânicos da Autora receberam formação especializada, isto é, formação Renault, a qual foi paga pela Autora, que os dispensava do trabalho para a formação, continuando a suportar todas as despesas com os mesmos, designadamente as salariais –  (al. N) da Esp.).

14 – Sempre que a Ré considerava imprescindível um determinado melhoramento apoiava financeiramente a Autora – (al. O) da Esp.).

15 – Já a sinalética e a identificação visual eram pagas pela Ré, razão pela qual retirou todos esses elementos dos estabelecimentos da Autora após a cessação da vigência dos contratos – (al. P) da Esp.).

16 – E as acções de formação do pessoal da Autora eram fortemente comparticipadas pela Ré, pagando os formadores, as instalações e os equipamentos e materiais entregues – (al. Q) da Esp.).

17 – Conforme informação da Conservatória do Registo Comercial a sociedade ora Autora, AA, Lda., passou a ter como gerentes, pelo menos desde 6 de Julho de 1993 (data da apresentação dos registos), os seguintes:

- AA (sócio);

- BB (sócio) e,

- CC (usufrutuário de duas quotas) – (al. R) da Esp.).

18 – Conforme consta na C. R. Comercial referida não se encontra inscrita qualquer alteração à gerência até à data – (al. S) da Esp.).

19 – Conforme informação da C. R. Comercial a sociedade ora denominada A...& A..., Lda. passou a ter como gerentes pelo menos desde 29 de Setembro de 1994 até 4 de Agosto de 1999 (data das apresentações a registo), os seguintes:

- AA (sócio);

- BB (sócio);

- DD (sócia) – (al. T) da Esp.).

20 – DD era, neste período, igualmente sócia da Autora, AA, Lda. – (al. U) da Esp.).

21 – O gerente da Autora, CC, é usufrutuário das quotas cedidas aos sócios da Autora, DD e AA – (al. V) da Esp.).

22 – Os sócios e gerentes das duas referidas sociedades eram as mesmas pessoas nos anos de 1994 a 1999 – (al. X) da Esp.).

23 – Os sócios da A...& N..., Lda., desde 4 de Agosto de 1999, são:

- EE e

- FF – (al. Z) da Esp.).

24 – Os dois actuais sócios desempenharam na Autora, AA, Lda., as duas funções de maior responsabilidade na empresa:

- encarregado geral e,

- chefe de equipa – (al. AA) da Esp.).

25 – A AA e a A...& N... tiveram os mesmos sócios de 1994 a 1999, data em que terminou o contrato de concessão com a ora Ré, tendo a partir dessa data os sócios da última passado a ser os dois principais trabalhadores da primeira – (al. BB) da Esp.).

26 – O objecto da AA, Lda. é: - indústria e comercialização de veículos automóveis e seus afins – (al. CC) da Esp.).

27 – O objecto da ora denominada A...& N..., Lda. é: - compra e venda de automóveis e acessórios – (al. DD) da Esp.).

28 – Os objectos sociais das duas referidas sociedades são idênticos – (al. EE) da Esp.).

29 – A ora denominada A...& N..., Lda., no período de 1994 a 2000, encontrava-se registada sob a denominação de C.V.C Comércio de Viaturas de Circunvalação, Lda. – (al. FF) da Esp.).

30 – Tal denominação foi registada em 15 de Novembro de 1994 e substituída pela actual em 26 de Julho de 2000 – (al. GG) da Esp.).

31 – A referida sociedade usa ao público e identifica-se como “Carmaia” – (al. HH) da Esp.).

32 – As duas sociedades, com os mesmos sócios e com os mesmos gerentes, usam denominações comerciais manifestamente confundíveis – (al. II) da Esp.).

33 – Sendo que a Autora era concessionária Renault – (al. JJ) da Esp.).

34 – E a Carmaia é agente Peugeot – (al. LL) da Esp.).

35 – Conforme os mapas relativos aos quadros de pessoal entregues pelas duas referidas sociedades no IDICT, verifica-se uma identidade significativa de trabalhadores da AA que transitaram para a Carmaia – (Al. MM) da Isp.).

36 – As duas sociedades têm ainda as suas sedes sociais na mesma zona de influência comercial e em directa e vizinha concorrência – (Al. NN) da Esp.).

37 – A sociedade Autora foi constituída face a contactos entre a Ré e os sócios fundadores da mesma, interessados na actividade de concessão de veículos da marca da demandada – (Resp. ao Qtº 1º)).

38 – Dá-se como reproduzido o teor do documento de fls. 19 a 31 dos autos, sendo o objecto da Ré inicialmente a produção de veículos automóveis e peças ou órgãos e outros elementos dos mesmos e sua comercialização em Portugal no quadro do projecto Renault e mais tarde o objecto da mesma passou a ser a comercialização de veículos automóveis, peças e acessórios – (Resp. aos Qtºs. 2º) e 100º)).

39 – Na sequência de a sociedade Autora ter acordado com a Ré que iria ser concessionária da mesma a Autora arranjou instalações e adquiriu equipamentos para o efeito em vista, tendo ainda recrutado técnicos e pessoal e moldou a imagem da mesma aos requisitos de imagem da Ré, tendo sido celebrado o primeiro acordo entre as partes, que o denominaram de concessão, em 27 de Janeiro de 1981 – (Resp. ao Qtº 3º)).

40 – As negociações entre a Ré e os sócios da Autora ter-se-ão iniciado ainda em 1980 – (Resp. ao Qtº 4º) ).

41 – A. e R. celebraram o acordo denominado de «Contrato de Concessão», com o teor do documento de fls. 46 a 58, datado de 16 de Dezembro de 1981 [Dá-se como reproduzido o teor do documento constante de fls. 46 a 58 dos autos] – (Resp. ao Qtº 6º)).

42 – Em cada um dos acordos de concessão celebrados entre as partes foi feita constar uma cláusula, inserta no Anexo I, de acordo com a qual o mesmo era estabelecido tomando-se em consideração, no caso de o concessionário ser uma pessoal colectiva, o tipo e a situação em que a mesma sociedade se encontrasse no momento da assinatura do acordo e a composição dos seus corpos gerentes, personalidade dos mandatários sociais ou gerentes e a composição dos seus associados – (Resp. ao Qtº 7º)).

43 – A Autora estava vinculada a vender veículos automóveis novos apenas da marca Renault, mais devendo utilizar, nas reparações oficinais relativas a veículos abrangidos pela garantia – a pagar pela Ré – ou outras em cujos custos a Ré incorresse, apenas peças e acessórios de marca Renault, podendo contudo vender veículos usados de outras marcas, devendo a sua actividade ser levada a cabo de acordo com os procedimentos da marca e as tabelas de preços pela mesma indicada e a Autora tinha o direito de comercializar tais produtos, com exclusividade, na zona da Maia, podendo comercializá-los ainda na zona banalizada do Porto, em concorrência com os demais concessionários de tal área geográfica – (Resp. ao Qtº 8º)).

44 – A Ré podia proceder a vendas directas de veículos novos da marca Renault na área geográfica atribuída à Autora nas situações previstas no ponto 2.6 do Anexo 2 dos acordos celebrados entre as partes – (Resp. ao Qtº 9º)).

45 – Em data não apurada de Novembro de 1996 a Ré remeteu à Autora uma carta datada de 4.11.1996 de que fez constar que lhe enviava o novo contrato de concessão a vigorar entre ambas e que substituía o anteriormente celebrado – (Resp. ao Qtº 10º)).

46 – O acordo em causa era muito semelhante aos anteriores, obrigando também a Autora a não prospectar clientela para além desse território e a vender veículos automóveis usados nos moldes constantes do mesmo acordo e do documento de fls. 123 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido – (Resp. ao Qtº 11º).

47 – Quer as ordens de reparação quer a correspondência e outra documentação, além de outros artigos essenciais à actividade desenvolvida pela Autora, devia obedecer aos parâmetros indicados pela Ré, podendo não obstante a Autora adquirir tais produtos a terceiros, desde que de acordo com os mesmos parâmetros ou “ sinaléticas “, não fabricando a Ré nem importando tais produtos – (Resp. aos Qtºs 13º) e 116º)).

48 – Pendia sobre a Autora a obrigação de vender em exclusivo os produtos da marca Renault – (Resp. ao Qtº 14º)).

49 – A venda de produtos e serviços de outras marcas estava, em regra, dependente de autorização da Ré nesse sentido – (Resp. ao Qtº 15º)).

50 – A Autora tinha umas instalações arrendadas – stand de vendas – na freguesia de Milheiros, concelho da Maia e a mesma efectuou aí obras – (Resp. ao Qtº 17º)).

51 – Com vista ao exercício da sua actividade a Autora, em 11 de Maio de 1989, arrendou a CC e mulher, GG, a fracção autónoma designada pela letra A, correspondente a um estabelecimento com entrada pelo nº 32 a 36 e 48 a 52 da freguesia de Ermesinde, concelho de Valongo, arrendamento destinado ao exercício do comércio de veículos automóveis e, em 23 de Julho de 1981, a Autora tomou de arrendamento a HH e mulher, II, parte do R/C do prédio urbano sito na Rua ... da freguesia de Águas Santas, concelho da Maia, local esse arrendado com vista à exposição e venda de viaturas automóveis novas e usadas e à comercialização de peças e acessórios para automóveis e seus afins – (Resp. ao Qtº 18º)).

52 – Os investimentos técnicos e estruturais efectuados pela Autora e ainda activos à data da cessação do contrato, referentes ao imobilizado corpóreo bruto, ascendem a Esc. 180.342.787$00, ajustado pelos valores das reavaliações – (Resp. ao Qtº 19º)).

53 – O total dos investimentos efectuados pela Autora desde 1980 a 1999 – Julho – cifrou-se em Esc. 219.498.884$00, valor ajustado pelo valor das reavaliações – (Resp. ao Qtº 20º)).

54 – A Ré fazia depender a manutenção da relação contratual de certos padrões e níveis de qualidade e imagem, havendo por vezes quer alterações nessa imagem que levavam a alterações da Autora ou das suas instalações e a mesma (a Ré) entendia que era necessário determinado equipamento para a prestação da actividade, levando a que a Autora tivesse de adquirir o mesmo por a Ré o entender necessário – (Resp. ao Qtº 21º)).

55 – A Autora estava contratualmente obrigada a ter uma imagem empresarial, a formar o seu pessoal, a prestar serviços, a adquirir equipamento oficinal (destinado ao serviço pós-venda e ou de assistência), tudo de acordo com os ditames impostos pela Ré, que sempre cumpriu – (Resp. ao Qtº 22º)).

56 – A Ré, no âmbito da sua relação com a Autora, aconselhava ou indicava à mesma determinados equipamentos e procedimentos, o mesmo fazendo relativamente aos demais concessionários – (Resp. ao Qtº 23º)).

57 – E só a título de exemplo indicou à Autora que devia comprar uma estação de diagnóstico “ Óptima “ (o que a Autora fez e igual indicação receberam os restantes concessionários) e nova sinalética (painéis publicitários e identificativos do estabelecimento) – (Resp. ao Qtº 24º)).

58 – A imagem da Autora foi mudando ao longo do tempo de relacionamento entre as partes – (Resp. ao Qtº 25º)).

59 – A Ré comparticipava em despesas relativas à alteração da imagem ou investimentos da Autora – (Resp. ao Qtº 26º)).

60 – A imagem comercial da Autora era fundamentalmente ditada pela Ré e em tudo idêntica à dos restantes concessionários – (Resp. ao Qtº 27º)).

61 – Ao longo dos anos de relacionamento entre Autora e Ré a Autora promoveu e publicitou – por vezes apenas a expensas suas e outras com comparticipação da Ré – a marca Renault e angariou clientes que lhe adquiriram produtos da marca da Ré ou serviços da mesma marca e ou com as suas características – (Resp. ao Qtº 28º)).

62 – A Autora foi a primeira concessionária Renault a explorar o território da Maia – (Resp. ao Qtº 29º)).

63 – A Autora fez publicidade à marca Renault e aos seus produtos e fazia serviço pós-venda, estando os clientes, no geral, satisfeitos com a mesma assistência – (Resp. ao Qtº 31º)).

64 – A Autora também contribuía para a publicidade cooperativa, isto é, para a publicidade levada a cabo pela Ré cujos custos eram suportados por esta e pela rede de concessionários – (Resposta ao Qtº 32º)).

65 – A Autora despendia em publicidade própria e cooperativa a quantia mensal de Esc. 979.145$00 – (Resp. ao Qtº 34º)).

66 – A Autora apenas utilizava no serviço de assistência pós-venda peças e acessórios de marca Renault, apenas podendo utilizar peças ou acessórios de outras marcas desde que a Ré o autorizasse e se a qualidade das mesmas fosse compatível com as da marca da demandada – (Resp. ao Qtº 35º)).

67 – A Autora tentava prestar um serviço de qualidade e que satisfizesse o cliente – (Resp. ao Qtº 36º)).

68 – Assim e no intuito da qualidade do serviço a Autora:

a) dava um prémio variável e mensal aos seus funcionários em função do índice de qualidade do serviço;

b) fazia inquéritos de satisfação ao cliente até ao momento em que a Ré adoptou este procedimento;

c) colocava à disposição dos seus trabalhadores ferramentas, equipamentos e formação que potenciavam a qualidade do serviço;

d) utilizava apenas peças de origem nas reparações efectuadas;

e) quando a Ré enviava os resultados do IQS a gerência da Autora reunia com os seus trabalhadores para abordar as questões menos positivas e corrigi-las, estabelecendo para tanto planos de acção;

f) enorme cuidado com o estado de limpeza das viaturas aquando da sua entrega aos clientes;

g) aquando das reparações e sempre que se mostrava necessário colocar peça de valor elevado o cliente era contactado e de tal facto dado conhecimento com vista a dar o seu consentimento;

h) fazia o controlo gratuito da suspensão e travões dos veículos através de máquinas especializadas;

i) fazia ofertas diversas;

j) as peças substituídas eram sempre entregues aos clientes:

l) empréstimo de veículo de substituição aos clientes cujas viaturas estivessem a ser reparadas, sendo que quanto aos prémios concedidos aos seus funcionários os mesmos eram atribuídos em função do atingir de objectivos e apenas a certos clientes eram emprestados veículos de substituição enquanto o seu se encontrava a reparar – (Resp. ao Qtº 37º)).

69 – A Autora recebeu da Ré alguns prémios ao longo dos anos de relacionamento comercial entre ambas as entidades e normalmente ficava bem posicionada nos inquéritos aos clientes do serviço de assistência e adquirentes de viaturas Renault – (Resp. aos Qtºs. 38º) e 39º)).

70 – Em 1997 a Autora recebeu da Ré um Óscar de melhor penetração de contratos de serviço, ou seja, de contratos de assistência aos veículos por determinado período de tempo ou quilometragem – (Resp. ao Qtº 40º)).

71 – A Autora teve, ao longo dos anos de relação com a Ré, um número não apurado de clientes, aí se considerando quer os adquirentes de veículos novos quer usados, quer a assistência após venda, ainda que a quem não tivesse adquirido o veículo através da mesma e venda de peças, com excepção de pequenas vendas de peças e ou acessórios em que não havia registo do cliente – (Resp. ao Qtº 42º)).

72 – Alguns clientes frotistas que adquiriram veículos novos através da Autora ainda hoje usam veículos da marca da Ré, sendo esse o caso da empresa detida por Carlos Oliveira – (Resp. ao Qtº 43º)).

73 – Alguns dos clientes da Autora, pelo menos no que concerne à assistência, eram frotistas, sendo esse o caso da Panrico, por exemplo e da Hertz – (Resp. ao Qtº 44º)).

74 – A publicidade a um produto de certa marca pode sempre vir a ter o efeito de potenciar futuros clientes e a Autora fazia publicidade aos produtos da Ré – (Resp. ao Qtº 45º)).

75 – As oficinas A eram oficinas que compravam peças da marca da Ré, oficinas (essas) de profissionais independentes – (Resp. ao Qtº 46º)).

76 – Chegou a haver cerca de 15 a 17 oficinas A – (Resp. ao Qtº 47º)).

77 – Sobre tais peças incidia um desconto praticado pela Ré e se a referida oficina A tivesse um nível de compra superior a um determinado montante teria direito a um bónus de uma certa percentagem de desconto na aquisição de mais peças – (Resp. ao Qtº 48º)).

78 – Enquanto durou a relação entre as partes a Autora vendeu bens e serviços da marca Renault – (Resp. ao Qtº 51º)).

79 – Alguns clientes iam à Autora para pedir assistência técnica apesar de não terem adquirido o veículo em causa na mesma – (Resp. ao Qtº 53º)).

80 – A Autora estava integrada na rede de distribuição pois o seu “ modus operandi “ era em tudo idêntico ao dos restantes concessionários – (Resp. ao Qtº 55º)).

81 – Após 31 de Julho de 1999 a Autora não exerceu qualquer actividade além do escoamento dos veículos usados que ainda tinha – (Resp. ao Qtº 56º)).

82 – A Autora não percebe nem perceberá qualquer contrapartida pelos contratos de compra e venda de veículos, peças e acessórios – celebrados ou que o venham a ser após a cessação da relação contratual entre Autora e Ré – com os clientes angariados pela Autora – (Resp. ao Qtº 57º)).

83 – O mesmo se verificando quanto à actividade de reparação – (Resp. ao Qtº 58º).

84 – Desde 1981 até 31 de Julho de 1999 a Autora dedicou-se apenas à actividade de comercialização de veículos novos de marca Renault, de peças e acessórios da mesma marca e prestação de assistência a veículos da mesma marca, retomando veículos usados da marca da Ré e também de outras marcas, que depois vendia ou tentava vender – (Resp. ao Qtº 59º).

85 – A Autora foi ao longo dos anos angariando clientela para si e, por necessária consequência, também para a Ré – (Resp. ao Qtº 60º)).

86 – Alguns dos clientes que a Autora teve ainda hoje utilizam veículos da marca Renault, sendo esse o caso da ou das empresas de Carlos Oliveira e alguns dos clientes que a mesma teve passaram a sê-lo da Autogare, pelo menos – (Resp. ao Qtº 61º)).

87 – Quando havia uma venda de veículos novos a Autora emitia o modelo 2, com a identificação do cliente que adquiria o veículo, declaração que entregava à Ré para a matrícula do veículo em nome do mesmo cliente, modelo 2 que continha os dados, à data, do cliente e tal sucedia assim por o veículo estar registado em nome da Ré, passando a demandada a ter a identificação do cliente – (Resp. ao Qtº 62º)).

88 – Os dados do cliente constavam também das ordens de reparação dos veículos, quanto à assistência técnica e de algumas facturas de compra e venda de peças e ou de acessórios – (Resp. ao Qtº 63º)).

89 – Na sequência da cessação da concessão a Ré ficou com acesso aos elementos que à data constavam dos dados da Autora relativos aos clientes face ao referido – (Resp. ao Qtº 64º)).

90 – A Autora tinha instalações destinadas ao exercício da sua actividade, quer para a venda de veículos, peças e acessórios quer para a prestação de assistência técnica e tinha ao seu serviço cerca de 60 funcionários, além de equipamento e tinha despesas com electricidade, água, telefone, limpeza, remunerações a funcionários, encargos sociais e outras despesas em média de 303.607.776$00 anuais, pelo menos nos anos de 1994 a 1997 – (Resp. ao Qtº 65º)).

91 – A partir de 31 de Julho de 1999 a Ré não pagou nem pagará à Autora qualquer compensação pelas vendas que directamente venha a fazer de veículos, peças ou acessórios nem pelas que venham a ser feitas por concessionários da marca – (Resp. ao Qtº 66º)).

92 – Com a cessação do contrato viu-se a Autora privada das remunerações correspondentes à actividade que vinha exercendo – (Resp. ao Qtº 67º)).

93 – A Autora promoveu os veículos, peças e acessórios da marca Renault pelo menos na zona da Maia – (Resp. ao Qtº 69º)).

94 – Ainda não tinham cessado as relações entre Autora e Ré e já esta havia nomeado um concessionário para explorar o território da Maia – (Resp. ao Qtº 70º)).

95 – O concessionário nomeado pela Ré para a área da Maia preparou instalações para exercer a sua actividade e, em momento não apurado, a Ré enviou um mail a alguns clientes que eram da Autora a comunicar a identidade do seu novo concessionário para a zona e a convidá-los a visitarem o mesmo e a utilizar os seus serviços – (Resp. ao Qtº 72º).

96 – A Autogare teve contactos com alguns dos funcionários da Autora no sentido de os mesmos integrarem os seus quadros de pessoal e os que aceitaram tal proposta tiveram contactos com alguns dos clientes da Autora, comunicando-lhes que iam trabalhar para a nova concessionária Renault da zona – (Resp. ao Qtº 73º)).

97 – A Autora tirava rendimentos dos seus clientes, quer habituais quer não habituais – (Resp. ao Qtº 75º)).

98 – Alguns dos então clientes da Autora continuam a ser clientes de veículos, peças e acessórios da marca Renault e a utilizar o serviço de assistência através dos seus concessionários – (Resp. ao Qtº 76º)).

99 – Ao longo do tempo que durou a relação comercial entre Autora e Ré a Autora procedeu à venda de milhares de veículos, peças e acessórios da marca Renault, em quantidade não concretamente apurada e prestou serviços de assistência – (Resp. ao Qtº 77º)).

100 – A margem bruta média anual da Autora – considerando-a como a diferença entre as vendas de mercadorias e prestação de serviços deduzidas do respectivo custo directo cifrou-se, nos anos de 1995 a 1998, inclusive, em Esc. 251.501.683$00 – (Resp. ao Qtº 78º).

101 – No período compreendido entre 1994 e 1999 o volume de compras proporcionado pela Autora à Ré foi de Esc. 778.484.000$00 – (Resp. ao Qtº 79º)).

102 – A Autora fazia publicidade regional da marca e participava na publicidade nacional levada a cabo pela Ré – (Resp. ao Qtº 83º)).

103 – A Ré ou os seus concessionários e, em especial a Autogare, nomeada para a zona da Maia, poderão vir a retirar benefícios da celebração de contratos de compra e venda de veículos, peças e acessórios de marca Renault feitos pela Autora com então clientes da mesma e dos serviços de assistência pela mesma prestados aos mesmos por poderem celebrar novos contratos com os mesmos clientes – (Resp. ao Qtº 86º)).

104 – A Autora, no exercício da sua actividade, actuava em seu nome e por conta própria – (Resp. ao Qtº 90º)).

105 – Quanto aos contratos celebrados até 1996 as partes negociaram-nos entre si e quanto ao de fls. 112 a 123 a Ré enviou o respectivo texto à Autora com a carta de 4.11.1996, tendo a Autora recebido o mesmo, contendo algumas alterações aos anteriores, tendo as partes regido a sua relação pelo mesmo desde finais de 1996 até 31.7.1999 – (Resp. ao Qtº 98º)).

106 – O fabricante (dos veículos de marca Renault) é a Usines Renault, sociedade francesa – (Resp. ao Qtº 101º)).

107 – Foi a Autora, no uso da sua total liberdade, que adquiriu ou arrendou instalações, equipamentos e recrutou pessoal, nada lhe tendo sido imposto pela Ré – (Resp. ao Qtº 102º)).

108 – Inicialmente, o território onde a Autora exercia os seus direitos de venda exclusiva era apenas o concelho da Maia e a partir do contrato celebrado em 16 de Dezembro de 1981 o território da mesma passou a abranger a zona banalizada do Porto, onde concorria com os demais concessionários Renault – (Resp. ao Qtº 103º)).

109 – A partir do contrato de 1996 o próprio concelho da Maia foi integrado na zona banalizada do Porto, o que decorre do aditamento de fls. 470 a 471 dos autos, cujo conteúdo se dá por reproduzido – (Resp. aos Qtºs 104º) e 105º).

110 – A Ré enviou o aditamento referido, de fls. 470 a 471 dos autos, à Autora, juntamente com o teor do documento de fls. 112 a 123 dos autos – (Resp. ao Qtº 106º)).

111 – Apesar do exclusivo todos os contratos previam que a Ré pudesse vender no concelho da Maia determinados veículos automóveis – (Resp. ao Qtº 107º)).

112 – A tabela de preços era entregue pela Ré à Autora e esta podia aplicar descontos sobre tais preços – (Resp. aos Qtºs 109º) e 110º)).

113 – A Autora era comerciante por conta própria – (Resp. ao Qtº 111º)).

114 – O documento constante de fls. 123 dos autos foi remetido à Autora, pela Ré, juntamente com o acordo referido em 108 – (Resp. aos Qtºs 112º) a 114º)).

115 – A Autora tinha de utilizar peças e acessórios Renault – (Resp. ao Qtº 115º)).

116 – Dá-se como reproduzido, para todos os efeitos, o teor dos documentos de fls. 32 a 123 e 470 a 471 dos autos – (Resp. ao Qtº 117º)).

117 – A Autora estava obrigada contratualmente a efectuar os serviços de assistência a veículos Renault de acordo com os procedimentos ditados pela Ré – (Resp. ao Qtº 118º)).

118 – A Autora ficou integrada na rede de distribuição Renault apenas e tão só por efeito dos contratos de concessão celebrados e nos seus termos – (Resp. ao Qtº 120º)).

119 – As obrigações de participação da Autora na publicidade cooperativa, na formação do pessoal, na rede informática Piramid e outras decorriam dos acordos referidos em 116 – (Resp. ao Qtº 122º)).

120 – Muitas das obrigações decorrentes dos acordos referidos em 116 – derivavam da necessidade, pela Ré, de salvaguarda da qualidade dos serviços a prestar pela Autora face à sua ligação à Ré – (Resp. ao Qtº 123º)).

121 – A Autora era livre de adoptar os procedimentos que entendesse nas suas relações com terceiros – (Resp. ao Qtº 124º)).

122 – Quanto aos veículos retomados a Autora tinha total liberdade quanto ao preço – (Resp. ao Qtº 125º)).

123 – Não podendo, no entanto, proceder a reparação nos veículos Renault a não ser de acordo com os procedimentos da Ré – (Resp. ao Qtº 126º)).

124 – A Ré apenas sugeriu melhoramentos genéricos, nunca tendo imposto a compra ou arrendamento de instalações específicas – (Resp. ao Qtº 127º)).

125 – As instalações da Autora teriam, de acordo com a Ré, de ter determinadas características, designadamente a nível de cores e sinalética, que se prendiam com a imagem da própria Ré e quanto a outras sugestões da Ré relativas às instalações da demandante ou à sua imagem esta podia ou não acatá-las ou segui-las – (Resp. ao Qtº 128º)).

126 – Os funcionários da Autora aprendiam nas acções de formação dadas pela Ré os procedimentos que esta entendia necessários à actividade desenvolvida, quer a nível comercial quer a nível de assistência técnica – (Resp. ao Qtº 129º)).

127 – No mercado automóvel o nível de fidelização do cliente é baixo uma vez que é frequente que a saída de um novo modelo de outra marca leve o consumidor a procurar comprá-lo, com a consequente passagem de uma marca para outra – (Resp. aos Qtºs 130º) e 131º)).

128 – Quanto ao mercado de peças há um mercado de peças não de marca que é substancialmente mais barato – (Resp. ao Qtº 132º)).

129 – São muitas as oficinas pequenas espalhadas pelo país que utilizam peças sem marca na assistência ou reparação e que, por terem menos custos de estrutura e usarem produtos mais baratos, podem fazer preços totais mais baratos do que os praticados pelas oficinas da marca – (Resp. ao Qtº 133º)).

130 – A maior parte e talvez cerca de 90% dos compradores de veículos procede a revisões e reparações em oficinas da marca apenas e enquanto o veículo se encontra abrangido pela garantia e, após o decurso da mesma, recorre a oficinas não da marca, onde os custos são mais baratos – (Resp. ao Qtº 134º)).

131 – A escolha dos consumidores, a nível do mercado automóvel, decorre essencialmente da marca e da circunstância de a mesma e os respectivos produtos ser considerada de boa qualidade ou não e de a assistência ser fácil de encontrar para os adquirentes dos veículos, o que depende da rede de assistência ser maior ou menor, com mais ou menos pontos da mesma acessíveis com facilidade ao consumidor e, apesar de o consumidor optar pela compra ou assistência também de acordo com a simpatia de quem vende e a qualidade do serviço prestado, faz tal escolha dentro da marca pretendida – (Resp. aos Qtºs 135º) e 136º)).

132 – A marca Renault é uma das mais conhecidas internacionalmente, até pela circunstância de os seus veículos cobrirem vário tipo de interesses e possibilidades económicas dos consumidores enquanto certas marcas se direccionam essencialmente a certos segmentos de consumidores, em resultado dos preços – (Resp. ao Qtº 137º)).

133 – Dentro do mercado do sector automóvel há sempre quem gostaria de ser concessionário de certas marcas – (Resp. ao Qtº 138º)).

134 – Em 1980 já circulavam em Portugal muitos veículos automóveis de marca Renault e, designadamente, os modelos Renault 4, Renault 12 e Break – (Resp. ao Qtº 139º)).

135 – A publicidade levada a efeito pela Autora era comparticipada pela Ré – (Resp. ao Qtº 141º)).

136 – A publicidade cooperativa traduzia-se em parte do valor da compra de cada carro adquirido pelos concessionários à Ré ir para um fundo que podia ser usado pelos mesmos concessionários até ao limite da sua participação no mesmo fundo – (Resp. ao Qtº 142º)).

137 – A Autora podia ou não utilizar os valores do fundo para publicidade – (Resp. ao Qtº143º)).

138 – A Ré comparticipava ainda com 40% dos custos até um plafond acordado – (Resp. ao Qtº 144º)).

139 – As oficinas da Autora eram oficinas multimarcas – (Resp. ao Qtº 146º)).

140 – Como oficinas multimarcas menos garantias havia da colocação de peças de origem Renault – (Resp. ao Qtº 147º)).

141 – Nas oficinas multimarcas há peças sem marca, mais baratas – (Resp. ao Qtº 148º)).

142 – Parte da satisfação dos clientes pelo serviço prestado pela Autora, designadamente a nível de assistência técnica, devia-se às exigências e recomendações da Ré quanto a tal matéria – (Resp. ao Qtº 149º)).

143 – Entre 1994 e 1999 foi vendido em Portugal um número não concretamente apurado de veículos de marca Renault que pode ter chegado ao de 40.000 veículos ano, em média, tendo em atenção as vendas feitas ao Estado e a grandes empresas – (Resp. ao Qtº 150º)).

144 – Segundo a Ré a venda de veículos pela Autora baixou desde 1995 em diante – (Resp. ao Qtº 152º)).

145 – A escolha por um ou outro concessionário de certa marca tem a ver quer com a proximidade do local de trabalho e de residência quer com a simpatia dos funcionários respectivos – (Resp. ao Qtº 153º)).

146 – A partir de finais de 1995 e até finais de 1996 a Ré dirigiu várias cartas à Autora a chamar-lhe a atenção para a não consecução dos objectivos pela mesma, com poucas vendas de veículos – (Resp. aos Qtºs 154º) e 155º)).

147 – Segundo a Ré a Autora foi, desde 1994, baixando o atingir dos seus objectivos comerciais, sendo que a percentagem de realização dos mesmos terá sido, de acordo com a mesma, de cerca de 92% em 1994, de cerca de 82% em 1995, de cerca de 75% em 1996, de cerca de 70% em 1997, de cerca de 74% em 1998 e de cerca de 54% relativamente à parte do ano de 1999 em que o contrato celebrado entre as partes esteve em vigor – (Resp. ao Qtº 156º)).

148 – Na zona banalizada do Porto houve três concessionários Renault que fecharam por volta de 1992 a 1993/1994 e apenas abriu um em substituição desses - (Resp. ao Qtº 157º).

149 – Para a Ré a Autora já não estava a satisfazer os objectivos comerciais e, por isso, já não via interesse na sua manutenção como concessionária – (Resp. ao Qtº 158º)).

150 – Após 31.7.1999 a Autora não obteve a concessão de qualquer outra marca de veículos automóveis – (Resp. ao Qtº 160º)).

151 – Outros concessionários Renault ao verem os contratos com a Ré cessados passam a ser concessionários de outras marcas de veículos automóveis – (Resp. ao Qtº 161º)).

152 – Parte não concretamente apurada de ex-concessionários Renault são hoje concessionários de outras marcas ou oficinas de reparação de veículos automóveis – (Resp. ao Qtº 163º)).

153 – Após 31.7.1999 a Autora poderia ter continuado a usar o seu ficheiro de clientes – (Resp. ao Qtº 165º)).

154 – Por norma, quanto maior é a qualidade de um produto ou serviço maior é o seu preço e o consumidor nem sempre está disposto ou pode pagar o preço consequente – (Resp. ao Qtº 169º)).

155 – Os dados de todos os clientes da rede Renault estavam ao dispor de todos os concessionários – (Resp. ao Qtº 170º)).

156 – O sistema Piramid foi concebido para permitir encontrar mais fácil e rapidamente o veículo pretendido por um cliente – (Resp. ao Qtº 171º)).

157 – Qualquer cliente tinha o direito de ser assistido junto de qualquer concessionário, independentemente de lhe ter adquirido a viatura – (Resp. ao Qtº 172º)).

158 – Para efeitos de utilização da garantia de reparação os dados dos clientes estavam à disposição de qualquer concessionário – (Resp. ao Qtº 173º)).

159 – Após 31.7.1999 a Autora podia ter ficado com os dados de todos os clientes da rede Renault devido ao sistema Piramid – (Resp. ao Qtº 174º)).

160 – A Autora poderia ter usado tais dados ou cedê-los a terceiros – (Resp. ao Qtº 175º)).

161 – A Autora não era obrigada a actualizar os dados – (Resp. ao Qtº 176º)).

162 – Nem contratualmente estava obrigada a transferir os dados para a Ré findo o contrato – (Resp. ao Qtº 177º)).

163 – Muitas vezes as moradas dos clientes ou contactos já não eram os que constavam dos dados da Autora devido, por exemplo, a mudanças de residência e ou de local de trabalho – (Resp. ao Qtº 178º)).

164 – A Ré não obrigou a Autora a deter nenhuma instalação precisa nem um número determinado de empregados ou equipamentos – (Resp. ao Qtº 179º)).

165 – Dentro do sector automóvel a escolha do consumidor é, face à semelhança dos veículos entre si de marca para marca, inclusivamente, resultado do preço e da novidade do veículo – (Resp. ao Qtº 180º)).

166 – Em alguns casos as estratégias de venda comerciais passam por sugerir a venda a preços mais baixos para melhorar os resultados das vendas, aumentando-os, sendo frequente a atribuição de prémios pelo cumprimento de objectivos – (Resp. ao Qtº 181º)).

167 – Actualmente há peças multimarcas no mercado a preços muito mais baixos que os das marcas dos veículos – (Resp. ao Qtº 182º)).

168 – A Ré nunca perdeu o interesse pela zona da Maia para exploração da sua actividade – (Resp. ao Qtº 183º)).

169 – A Ré nomeou sua concessionária, na Maia, a Autogare e esta já era, antes, concessionária Renault – (Resp. aos Qtºs 186º) e 187º)).

170 - A Renault Gest – Sociedade de Comércio de Automóveis, S. A. é uma sociedade distinta da Ré, dando-se como reproduzido o teor do documento de 336 a 349 dos autos – (Resp. aos Qtºs 189º) a 191º)).

171 – O documento de fls. 470 a 471 dos autos não se mostra assinado, tendo o mesmo sido remetido à Autora juntamente com o contrato de fls. 112 a 123 dos autos – (Resp. ao Qtº 198º)).

172 – A Ré fixava objectivos à Autora e esta deles tinha conhecimento – (Resp. aos Qtºs 199º) a 201º)).

173 – A partir de 1998 a Autora retomou o seu peso relativo na rede de concessionários – (Resp. ao Qtº 203º)).

174 – Em 1995 abriu, na zona da Boavista, Porto, a Renault Boavista, directamente criada pela Ré – (Resp. ao Qtº 204º)).

175 – As empresas de rent-a-car tinham descontos superiores às margens da Autora devido ao facto de as mesmas comprarem, de cada vez, um número elevado de veículos, sendo esse o caso, por exemplo, da Hertz e outras – (Resp. ao Qtº 205º)).

176 – Os sócios da A...& N... eram antigos funcionários da Autora que agiam no interesse dos próprios – (Resp. aos Qtºs 207º) a 209º)).

Fundamentação:

Sendo pelo teor das conclusões das alegações do recorrente que, em regra, se delimita o objecto do recurso – afora as questões de conhecimento oficioso – importa saber se, no caso, há lugar ao pagamento pela Ré de indemnização de clientela ao Autor que reclama um valor bastante superior ao que lhe foi arbitrado (é esse o objecto do seu recurso), ao passo que   a Ré sustenta que nenhuma indemnização de clientela lhe é devida, desde logo, pelo acordado na Cláusula 17ª do contrato e, por outro lado, por a atribuição de tal clientela violar Regulamentos Comunitários.

Por óbvia razão de precedência, na lógica das colidentes pretensões recursivas, impõe-se que consideremos, em primeiro lugar, o recurso da Ré pois que, se proceder ou seja se este Tribunal considerar que no caso não há indemnização de clientela, prejudicado fica o recurso da Autora/recorrente que apenas pretende ver alterado o valor de € 100.000,00 que, com base na equidade lhe foi atribuído, pugnando agora por estoutro de 514.115.007$00 na velha moeda.

Vejamos.

Não dissentem os pleiteantes, nem as instâncias que, entre a Autora e a Ré, foram celebrados vários contratos de concessão comercial – perduraram por cerca de 19 anos – tendo cessado a relação contratual por iniciativa da Ré, ao abrigo da Cláusula 17ª.

As partes apelidaram o contrato como de concessão comercial que, como é sabido, é um contrato atípico e inominado, modalidade dos contratos de cooperação comercial, mormente, na vertente de contratos de distribuição.

De todo o modo, faremos um breve excurso sobre o enquadramento legal do contrato que, segundo a melhor doutrina e reiterada jurisprudência, apela integradoramente, em aspectos vários, ao regime jurídico do contrato de agência – DL. 178/86, de Julho – mormente, na vertente que os recursos convocam – a indemnização de clientela.

 O contrato de concessão comercial é um contrato consensual, art. 219º do Código Civil, oneroso, as mais das vezes com cariz intuitu personae, podendo assumir as características de contrato de adesão (que não ocorrem no caso dos autos).

Menezes Cordeiro, in “Manual de Direito Comercial”, 2007, pág. 678, acerca do regime da concessão, ensina:

 “ O contrato de concessão não tem base legal directa. Estamos perante uma figura assente na autonomia privada. À partida, trata-se de um contrato que não está sujeito a qualquer forma solene.

 Pode ser meramente verbal ou pode resultar de condutas concludentes.

Para além disso, o seu regime resultará, antes de mais, da interpretação e da integração do texto que tenha sido subscrito pelas partes.

No que as partes tenham deixado em aberto, haverá que recorrer à analogia. O Direito comparado há muito estabelece, neste domínio, o recurso ao regime da agência”. (sublinhámos).

Engrácia Antunes, in “Direito dos Contratos Comerciais” – Almedina-Setembro de 2009 – define-o – pág. 446 – como o “Contrato pelo qual um empresário – o concedente – se obriga a vender a outro – o concessionário —, ficando este último, em contrapartida, obrigado a comprar ao primeiro, certos produtos, para revenda em nome e por conta próprios numa determinada zona geográfica, bem assim como a observar determinados deveres emergentes da sua integração na rede de distribuição do concedente”.

E mais adiante – pág. 447 – “Antes do mais, o contrato de concessão comercial constitui um contrato-quadro (“Rahmenvertrag”, “contrat-quadre”) no sentido em que visa criar e disciplinar uma relação jurídica de colaboração estável e duradoura entre as partes, cuja execução se traduz na celebração futura entre estas de sucessivos contratos de compra e venda”

Definição semelhante é a dada por António Pinto Monteiro – “Contrato de Agência, 4ª edição, 2000, pág. 49:

 “ É a concessão um contrato-quadro (“Rahmenvertrag”/”contrat cadre”), que faz surgir entre as partes uma relação obrigacional complexa, por força do qual uma delas, o concedente, se obriga a vender à outra, o concessionário, e esta a comprar-lhe, para revenda, determinada quota de bens, aceitando certas obrigações (mormente no que concerne à sua organização, à política comercial e à assistência a prestar aos clientes) e sujeitando-se a um certo controlo fiscalização do concedente.

Como contrato-quadro, o contrato de concessão comercial funda uma relação de entre as partes, pelos quais o concedente vende ao concessionário, para revenda, nos termos previamente fixados, os bens que este se obrigou a distribuir”.

Sendo como é um contrato de cooperação comercial e de distribuição, pressupondo uma integração e conjugação de esforços organizativos com vista à implementação de bens no mercado, assumem especial relevo a estabilidade e permanência – o seu cariz continuado, duradouro[2] – sem o qual a vertente de rentabilização económica dificilmente será alcançável.

Abílio Neto, in “Código Comercial e Contratos Comerciais Anotado” – Setembro /2008, pág.583, escreve:

“O Contrato de concessão comercial tem como elementos caracterizadores:

 (a) o carácter duradouro do contrato (a estabilidade do vínculo);

 (b) actuação autónoma do concessionário, em nome próprio e por conta própria (transferindo-se o risco do produtor para o distribuidor);

(c) objecto mediato: bens produzidos ou distribuídos pelo concedente;

(d) obrigação do concedente celebrar, no futuro, sucessivos contratos de venda (o dever de venda dos produtos a cargo do concedente);

 (e) obrigação do concessionário de celebrar — no futuro — sucessivos contratos de compra (o dever de aquisição impendente sobre o concessionário);

 (f) o dever de revenda por parte do concessionário dos produtos que constituem o objecto do contrato, na zona geográfica ou humana a que o mesmo se refere;

 (g) obrigação do concessionário orientar a sua actividade empresarial em função das finalidades do contrato e do concedente fornecer ao concessionário os meios necessários ao exercício da sua actividade;

(h) exclusividade (na maioria dos casos) (Maria Helena Brito, “O Contrato de Concessão…”, págs. 179 a 184; José Alberto Coelho Vieira, “O Contrato de Concessão Comercial”, AAFDL, 1991, pág. 15).

A vertente duradoura do contrato de concessão comercial é deveras relevante, não só para protecção económica dos contraentes forçados a fazer investimentos em bens e numa estrutura que, normalmente, tem como fito apenas o particular objecto da concessão, como também a incutir no público consumidor – sobretudo em caso de exclusividade – maior confiança, precisamente porque entre concedente e concessionário existe uma organização que dará resposta não só ao aspecto primordial da aquisição dos bens, como à assistência de que careçam. Assim acontece, sobremaneira, do domínio da concessão de veículos automóveis.

“Embora socialmente típico, o contrato de concessão comercial é um contrato atípico, sendo regulado pelas cláusulas que lhe são próprias, pelas disposições reguladoras dos contratos em geral e pelas dos contratos nominados que com ele apresentem forte analogia, como é o caso do contrato de agência regulado pelo DL. nº178/86, de 3.7, alterado pelo DL nº118/93, de 13.4”. – Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 8.3.2007, Proc. 07B131, in www.dgsi.pt.

            “O regime do contrato de agência, sobretudo na parte relativa à cessação do contrato, está vocacionado para ser aplicado, analogicamente, ao contrato de concessão comercial” – Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 13.9.2007, Proc. 07B1958, in www.dgsi.pt.

Nos termos do art. 29º do DL. 178/86, de 3.7 (regime jurídico do contrato de agência):

“1. Quem denunciar o contrato sem respeitar os prazos referidos no artigo anterior é obrigado a indemnizar o outro contraente pelos danos causados pela falta de pré-aviso.

            2. O agente poderá exigir, em vez desta indemnização, uma quantia calculada com base na remuneração média mensal auferida no decurso do ano precedente, multiplicada pelo tempo em falta; se o contrato durar há menos de um ano, atender-se-á à remuneração média mensal auferida na vigência do contrato”.

Quanto à indemnização de clientela.

A indemnização de clientela tem como pressuposto básico a cessação do contrato de concessão (por aplicação analógica do contrato de agência) e, como requisitos legais cumulativos, os que constam do art. 33º,nº1, als. a), b) e c) do DL.178/86, de 3.7.

A referida indemnização postula que:

  “O agente tenha angariado novos clientes para a outra parte ou aumentado substancialmente o volume de negócios com a clientela já existente (a); a outra parte venha a beneficiar consideravelmente, após a cessação do contrato, da actividade desenvolvida pelo agente (b); o agente deixe de receber qualquer retribuição por contrato, com os clientes referidos na alínea a) (c)”.

Obviamente que, no caso, do que se trata é que em relação ao concessionário se verifiquem aqueles requisitos.

Nos termos do art. 34º do referido diploma legal, tal indemnização:

 “É fixada em termos equitativos, mas não pode exceder um valor equivalente a uma indemnização anual, calculada a partir da média anual das remunerações recebidas pelo agente durante os últimos cinco anos; tendo o contrato durado menos tempo, atender-se-á à média do período em que esteve em vigor”. 

            O que está na base da indemnização de clientela é uma ideia de justiça [repare-se que o critério da sua fixação, pese embora o “travão legal”, é o da equidade], assente na consideração de que se o concessionário proporcionou, pela sua actividade, incremento significativo na clientela do concedente, assim o beneficiando “substancialmente” para o futuro, em termos de volume de negócios, deve ser compensado pelo esforço despendido.

            Como ensina Pinto Monteiro, in “Contrato de Agência-Anotação ao Decreto-Lei 178/86” – 2ª edição, págs. 103 e 104:

            “Trata-se, no fundo, de uma compensação devida ao agente, após a cessação do contrato – seja qual for a forma por que se lhe põe termo ou o tempo por que o contrato foi celebrado (por tempo determinado ou por tempo indeterminado) e que acresce a qualquer outra indemnização a que haja lugar –, pelos benefícios de que o principal continua a auferir com a clientela angariada ou desenvolvida pelo agente.

 É como que uma compensação pela “mais-valia” que este lhe proporciona, graças à actividade por si desenvolvida, na medida em que o principal continue a aproveitar-se dos frutos dessa actividade, após o termo do contrato de agência”.

              O mesmo tratadista, na RLJ 133-274, sobre a razão de ser e finalidade de tal indemnização[3], escreve:

  “…Na verdade, é necessário que o agente tenha angariado novos clientes ou aumentado substancialmente o volume de negócios com a clientela já existente [art. 33°, n.° l, al. a)]; que o principal continue a beneficiar, mesmo após a cessação do contrato, da actividade do seu ex-agente [al. b)]; e que este fique privado de qualquer retribuição pelos negócios que venham a ter lugar com os clientes por si anteriormente angariados [al. c)]”.

Também Maria Helena Brito defende que a indemnização de clientela é uma compensação pela vantagem conseguida pelo principal, e da perda sofrida pelo agente, não tendo natureza de reparação patrimonial (indemnização) em sentido estrito:

 – “No direito português, a “indemnização de clientela” devida ao agente, não tendo função reparadora, não é, em sentido próprio, indemnização; também não parece configurar uma pretensão fundada no injustificado enriquecimento de outrem (o principal); não é igualmente adequado pensar em protecção social do agente.

 Pelo contrário, trata-se de um direito à retribuição por serviços prestados: o originário direito à comissão transforma-se, por efeito da cessação do contrato, em direito a uma compensação, que tem em conta as retribuições esperadas pelo agente se o contrato não fosse interrompido.

Em conclusão, pois, trata-se de uma remuneração pela clientela angariada pelo agente e de que vem a beneficiar o principal”. – “O Contrato de Concessão Comercial”, 1990, pág. 100.

Quanto à natureza jurídica do direito à indemnização, no contrato de agência, mas aplicável ao contrato de concessão, Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, in “A indemnização de Clientela no Contrato de Agência”, página 100, escreve:

“Fica-nos assim a tese do enriquecimento por prestação. Esta parece ser a melhor configuração dogmática desta situação, que se pode reconduzir a uma hipótese de condictio ob causam finitam. Efectivamente, o que ocorre na indemnização de clientela é que o agente efectuou uma prestação para o principal (a angariação de clientes ou o aumento do volume de negócios), que gera benefícios patrimoniais duradouros para ele (a celebração de contratos pelos clientes), os quais se podem prolongar para além da extinção do contrato, mas que, enquanto este vigora, têm o seu correspectivo nas comissões auferidas pelo agente. A extinção, em determinado momento, do contrato de agência vai levar a que esses benefícios patrimoniais, que eram proporcionados pelo contrato a ambas as partes, venham apenas a resultar em benefício de uma, tendo a indemnização a função de compensar, em termos de valor, o desequilíbrio patrimonial correspondente".

  A compensação/“indemnização” de clientela não decorre “ipso facto” da cessação do contrato, já que tendo ela uma função compensatória, a que preside uma ideia de justiça, importa que o concessionário prove, cumulativamente, os requisitos das alíneas a), b) e c) do nº1 art. 33º do DL178/86, de 3.7.

 “É necessário que o agente tenha angariado novos clientes ou aumentado substancialmente o volume de negócios com a clientela já existente; é necessário que o principal continue a beneficiar, mesmo após a cessação do contrato, da actividade do seu ex-agente; é preciso que o ex-agente fique privado de qualquer retribuição pelos negócios que vierem a ter lugar com os clientes por si anteriormente angariados”.- cfr. Ac. do Supremo Tribunal, de 9.11.1999, in BMJ-491-293.

            Através da celebração de sucessivos contratos, desde 1981 a 1996, perdurou a relação contratual de concessão entre a Autora/concessionária e a Ré/concedente através do qual aquela vendia, em exclusivo, na área da Maia, veículos Renault.

Tal contrato foi cessado por iniciativa da concedente, ao abrigo da Cláusula 17ª (cfr. 121 verso, sob a epítome Denúncia).

“1. O presente CONTRATO pode ser rescindido, por qualquer das partes, a todo o tempo, mediante denúncia, constante de carta registada com aviso de recepção, expedida pela denunciante à outra parte, com, pelo menos, vinte e quatro meses de antecedência, denúncia essa que não carece de ser fundamentada e a qual não dará azo a qualquer indemnização ou outra compensação.

2. Porém, o pré-aviso para a denúncia do CONTRATO pela CONCEDENTE será de doze meses, no caso de esta ter necessidade de reorganizar o conjunto ou uma parte substancial da sua rede de distribuição e que envolva a celebração de novos acordos ou a criação de novas estruturas distribuição de produtos e serviços contratuais, para o Território atribuído, a modificação desse Território ou a supressão do CONCESSIONÁRIO e não seja obtido deste o necessário acordo”. 

A Ré enviou à Autora, que a recebeu, a carta de fls. 124, datada de 30.7.97 afirmando – “Ao abrigo da faculdade prevista na Cláusula 17ª, nº1, do Contrato de Concessão Renault, entre nós celebrado, somos a proceder à denúncia do mesmo, assim determinando a cessação da respectiva vigência, por rescisão, para o termo do 24º mês da recepção da presente.”

Aquela Cláusula 17ª consagra o direito potestativo de denúncia que, como é inerente a esse instituto, é um direito que pode ser exercido ad nutum, sem prejuízo, todavia do seu exercício salvaguardar as regras da boa-fé, mormente, tratando-se de contrato duradouro, deve obedecer a prazo de pré-aviso razoável.

 Mas o que a cláusula tem de controverso é a exclusão de qualquer indemnização, acenando a Ré que o prazo concedido – dois anos – poderia ser prorrogado por mais um ano, no condicionalismo previsto no seu nº2.

Por outro lado, a Ré afirma que, tal cláusula excludente da indemnização de clientela, está em conformidade com Regulamentos e Directivas Comunitárias sobre o sector automóvel, pelo que não há que recorrer analogicamente ao contrato de agência e ao que estipula sobre tal indemnização, que, como vimos, tem cariz mais de compensação, que, muito embora balizada por um valor máximo deve, sem o exceder, ser fixada com recurso ao critério de equidade.

O Regulamento (CE) nº1475/95, da Comissão, de 28.06.95, já substituído pelo Regulamento (CE) nº1400/2002 de 31.07.2002, regulava a aplicação do nº3 do artigo 85º do Tratado CE a certas categorias de acordos de distribuição e de serviço de venda e pós-venda de veículos automóveis, sempre que estejam em causa relações transfronteiriças, prevendo-se, no seu artigo 5º, o direito do fornecedor fazer cessar o contrato mediante um pré-aviso de, pelo menos, um ano, em caso de necessidade de reorganizar a totalidade ou uma parte substancial da rede de distribuição.

As normas comunitárias sobre o sector da distribuição automóvel, não são aqui aplicáveis, desde logo, porque não se trata de relações comerciais transfronteiriças, mas de um contrato para valer numa muito restrita área territorial portuguesa, a Maia (Porto).

Por outro lado, a leitura da legislação comunitária sobre o tema visa essencialmente regular e disciplinar a concorrência e, acima de tudo, a protecção dos concessionários.

No Regulamento (CE) nº1475/95 da Comissão, de 28 de Junho de 1995, relativo à aplicação do nº3 do artigo 85º do Tratado CE a certas categorias de acordos de distribuição e de serviço de venda e pós-venda de veículos automóveis, essa preocupação de salvaguarda dos direitos dos concessionários luz no ponto (8), quando consigna:

 “ […] As cláusulas de não concorrência não podem, contudo, ser sempre consideradas indispensáveis a uma distribuição eficaz.

Os distribuidores devem ser livres de adquirir a terceiros, de utilizar e de revender peças da mesma qualidade que as peças propostas pelo fornecedor […]

[…] Os distribuidores devem, além disso, conservar a sua liberdade de escolher peças utilizáveis em veículos da gama abrangida pelo acordo que atinjam ou ultrapassem o nível de qualidade exigido. Esta delimitação da cláusula de não concorrência tem em conta o interesse tanto da segurança do veículo, como manutenção de uma concorrência efectiva (ponto 5 do artigo 3º, e nº1, pontos 6 e 7 do artigo 4º)”. [4]

 Acerca do contrato de concessão comercial relativo ao sector da distribuição de automóveis, com projecção para além das fronteiras nacionais, no Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 21 de Abril de 2005, Proc.04B3868, in www.dgsi.pt, pode ler-se, a certo trecho, em caso de contornos afins à espécie em recurso:

  “O aludido Regulamento (CE) n.º 1475/95 da Comissão, de 28 de Junho de 1995, várias vezes invocado pela ré/recorrente em abono da sua tese da tipicidade do contrato de concessão (construção jurídica operante apenas na área económica da distribuição de veículos automóveis), não tem aplicabilidade no caso versado nos autos, como sobejamente demonstrado pela autora/recorrida nas suas peças processuais (réplica, alegação de direito - na 1ª instância - e alegações para ambos os tribunais superiores).

Por um lado, aqui tudo se passa entre empresas de direito português e exclusivamente em território nacional, sem projecção de quaisquer efeitos imediatos para além das fronteiras nacionais, não estando, portanto, em causa actos de comércio entre agentes de dois ou mais Estados-Membros ou qualquer elemento de conexão objectiva de carácter transfronteiriço relativo à relação jurídica em discussão.

Por outro lado, a vocação de aplicabilidade do dito Regulamento (CE) n.º 1475/95, que ressalta logo dos primeiros considerandos ali incluídos, respeita (somente) à isenção de proibição de determinadas regras e procedimentos, em princípio não admitidos, em nome da defesa da concorrência no mercado comum (os mencionados no n.º 1 do art. 85º - agora art.º 81º - do Tratado da União Europeia); isenção programada por aquele Regulamento para "certas categorias de acordos de distribuição e de serviço de venda e pós-venda de veículos automóveis" – objectivo expressamente enunciado logo no primeiro parágrafo deste instrumento legislativo”.

A indemnização de clientela, decorrente da cessação do contrato de concessão comercial, visa compensar o concessionário pelo incremento de clientela que beneficiará o concedente.

A cláusula do contrato que faculta ao concedente a cessação do contrato, em qualquer caso e sem nenhuma indemnização, é uma cláusula que acentua a já congénita fragilidade contratual do concessionário, com o gravame de desconsiderar a análise a posteriori duma situação que pode bem ser infractora das regras da boa-fé, pelo que se deve considerar inválida (nula) por violar preceitos cogentes analogicamente aplicáveis e, objectivamente, equivaler a uma renúncia antecipada do direito do concessionário (credor), independentemente de qualquer grau de culpa, violando o art. 809º do Código Civil.

Carolina Cunha, in “Do Contrato de Concessão Comercial”, na Revista da Ordem dos Advogados, ano 60, Abril de 2000, pág. 613 (estudo citado no Acórdão recorrido) afirma:

 “… As normas dos artigos 33º e 34º do diploma da agência, que consagram e disciplinam a figura da indemnização de clientela, não poderão deixar de ser tidas por inderrogáveis, na medida em que sejam de reconduzir (como nos parece) a um princípio de ordem pública de protecção.

 Queremos com isto aludir àquela dimensão de ordem pública que se destina a fornecer o necessário enquadramento jurídico para um conjunto de soluções de protecção dos sujeitos económica e socialmente mais débeis”.

 Assim, concluímos que não tem aplicação ao caso a legislação comunitária citada pela Ré, porque não estão em causa regras de concorrência e a indemnização de clientela não poder ser previamente excluída, por virtualmente poder afectar a parte contratualmente mais débil, e, por tal, ter potencial lesivo das regras da boa-fé e do equilíbrio contratual, do ponto em que poderia proporcionar ao concedente um enriquecimento sem causa.

Nesta perspectiva soçobra o recurso da Ré.

No que respeita ao recurso da Autora.

Pugna pelo substancial aumento da compensação pela clientela que considera ter beneficiado, findo o contrato que perdurou por cerca de 19 anos.

É aplicável ao seu cálculo, analogicamente, como antes dissemos, o art. 34º do DL. 178/86, de 3.7 – “A indemnização de clientela é fixada em termos equitativos, mas não pode exceder um valor equivalente a uma indemnização anual, calculada a partir da média anual das remunerações recebidas pelo agente durante os últimos cinco anos; tendo o contrato durado menos atender-se-á à média do período em que esteve em vigor”.

No Acórdão recorrido para justificar a compensação de € 100.000,00 ponderou-se:

 “ A Autora calculou a compensação por si peticionada em 514.000.000$00, alegando que nos últimos cinco anos efectuou um volume de negócios que lhe permitiu obter uma margem bruta na ordem dos 514.000.000$00 anuais.

Provou-se que a margem bruta média anual da Autora – considerando-a como a diferença entre as vendas de mercadorias e prestação de serviços, deduzidas do respectivo custo directo cifrou-se, nos anos de 1995 a 1998, inclusive, em 251.501.683$00.

Seria de ponderar o “lucro líquido” o qual, grosso modo, corresponderá ao lucro bruto (ou seja ao total das receitas subtraído dos custos/despesas) diminuído de impostos e taxas – elemento de que não dispomos nos autos.

Todavia, aquele valor funcionará fundamentalmente para efeitos de limite máximo a considerar, uma vez que o vector fundamental do cálculo se encontra na equidade.

Sabemos, também que nos anos de 1994 a 1997 a Autora teve, em média, um valor anual de despesas de 303.607.776$00 (incluindo, designadamente, despesas com instalações, equipamento, funcionários, encargos sociais).

Neste contexto, tendo em conta todos os elementos apurados nos autos e já aludidos – e não desprezando os outros, nomeadamente, as circunstâncias consideradas provadas de no mercado automóvel o nível de fidelização do cliente ser baixo, haver um mercado de peças não de marca substancialmente mais barato, a escolha dos consumidores a nível do mercado automóvel decorrer essencialmente da marca e da circunstância de a mesma e os respectivos produtos ser considerada de boa qualidade ou não e de a assistência ser fácil de encontrar para os adquirentes dos veículos, dentro do sector automóvel a escolha do consumidor ser resultado do preço e da novidade do veículo, a marca “B” ser uma das mais conhecidas internacionalmente – afigura-se adequada uma indemnização no valor de € 100.000,00”.

Segundo a equidade, que é a justiça do caso concreto, haverá que ponderar o longo tempo de cooperação da Ré na estrutura e organização comercial desta, que, como é objectivo atravessou períodos de maior ou menor fulgor consumista, com a inerente repercussão no nível de vendas de veículos automóveis, nos investimentos feitos pela concessionária para obter os objectivos visados pelo contrato, e, sobretudo, a consideração do incremento económico (clientela) que, cessada a relação contratual advirá para a Ré.

 Desde logo, a cifra pedida pela Autora, não encontraria no limite legal do art. 34º do DL. 178/86, de 3.7 (contrato de agência comercial), apoio factual. Com efeito, nenhuma prova fez que o montante que agora pede possa advir de cálculo “a partir da média anual das remunerações recebidas pelo agente durante os últimos cinco anos”.

Um dos requisitos essenciais de tal compensação resulta da “transferência de clientela” –[cfr. Carlos Barata, Sobre o contrato, pág. 91], e de a ex-concedente ter, previsivelmente, um aumento substancial do seu volume de negócios, ainda por via da actuação proficiente da ex-concessionária.

No caso, e sem escamotear o facto de a marca, porque reputada no sector automóvel, só por si ser alvo de procura, não se demonstram factos que indiciem que, após o termo do contrato, a Ré possa ver aumentado substancialmente o seu volume de negócios, já que durante o tempo por que perdurou a ligação contratual foi irregular o nível de negócios realizados pela Autora, e essa constatação não prognostica que a Ré possa beneficiar de maneira que deva considerar-se desequilibrada do esforço/investimento que a Autora votou à relação contratual, a qual, naturalmente, postulava dado o objecto da concessão, uma certa margem de aleatoriedade.

Assim, à luz da equidade – tendo em conta as várias variantes da componente da indemnização de clientela – temos por ajustado o valor atribuído pela Relação.

A pretensão recursiva da Autora soçobra.

Decisão:

Negam-se as revistas.

Custas dos recursos pelas sucumbentes.

                                     Supremo Tribunal de Justiça,  24 de Janeiro de 2012

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[1] Fonseca Ramos (Relator)
Salazar Casanova
Fernandes do Vale
[2] “Carácter duradouro do contrato – O método de distribuição correspondente ao contrato de concessão comercial só pode ser realizado através de uma relação contratual duradoura entre o produtor e o distribuidor. O fim pretendido não pode alcançar-se mediante a realização de um único acto, antes pressupõe a existência de sucessivos actos entre as partes e entre o concessionário e terceiros” – “O Contrato de Concessão Comercial”, 1990, pág.179 – Maria Helena Pinto.
[3]  O Professor António Pinto Monteiro, enfatiza este aspecto de protecção após a cessação do contrato (no caso de agência mas com igualdade de razão quanto à concessão comercial, in “ Sobre a Protecção do Agente Comercial no Direito Português e Europeu”, publicado na Separata do Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, Volume LXXI, evidenciando que tal protecção constituiu um dos objectivos fulcrais da Directiva da Comunidade Europeia de 18 de Dezembro de 1986.
[4] Cfr. a decisão tomada no Pedido de decisão prejudicial – Handelsgericht Wien – Interpretação do artigo 5.°, n.°3, primeiro parágrafo, primeiro travessão, do Regulamento (CE) n.°1475/95 da Comissão, de 28 de Junho de 1995, relativo à aplicação do n.°3 do artigo 85.° do Tratado CE a certas categorias de acordos de distribuição e de serviço de venda e pós-venda de veículos automóveis (JO L 145, p. 25) e do Regulamento (CE) n.°1400/2002 da Comissão, de 31 de Julho de 2002, relativo à aplicação do nº3 do artigo 81. ° do Tratado a certas categorias de acordos verticais e práticas concertadas no sector automóvel (JO 203, p.30) – Resolução de um acordo de distribuição pelo fornecedor com um pré‑aviso de um ano motivada pela necessidade de reorganizar a totalidade ou uma parte substancial da rede de distribuição devido à entrada em vigor do Regulamento (CE) n. ° 1400/2002.
 1) A entrada em vigor do Regulamento (CE) n.°1400/2002 da Comissão, de 31 de Julho de 2002, relativo à aplicação do n.° 3 do artigo 81.° do Tratado a certas categorias de acordos verticais e práticas concertadas no sector automóvel não tornou, por si só, necessária a reorganização da rede de distribuição de um fornecedor, na acepção do artigo 5.°, n.°3, primeiro parágrafo, primeiro travessão, do Regulamento (CE) n.°1475/95 da Comissão, de 28 de Junho de 1995, relativo à aplicação do n.°3 do artigo [81.°] do Tratado a certas categorias de acordos de distribuição e de serviço de venda e pós-venda de veículos automóveis. Todavia, essa entrada em vigor pode ter tornado necessária, em função da organização específica da rede de distribuição de cada fornecedor, a introdução de alterações de tal modo significativas que constituam uma verdadeira reorganização da referida rede, na acepção dessa disposição.”
2) A criação por um fornecedor, após a entrada em vigor do Regulamento n.° 1400/2002, de um sistema de distribuição selectiva no âmbito do qual, por um lado, já não se impõe aos distribuidores uma restrição do território no qual podem vender os produtos contratuais e, por outro, as oficinas de reparação autorizadas podem limitar as suas actividades unicamente à prestação de serviços de reparação e manutenção, é susceptível de constituir uma reorganização da rede de distribuição na acepção do artigo 5. ° n.° 3, primeiro parágrafo, primeiro travessão do Regulamento n° 1475/95. Compete aos órgãos jurisdicionais nacionais e às instâncias arbitrais apreciar se é este o caso, em função de todos os elementos concretos do litígio que lhes foi submetido, e, em particular, das provas apresentadas a este respeito pelo fornecedor.