Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1474/16.3T8CLD.C1.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: FERREIRA PINTO
Descritores: IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
PROVA GRAVADA
ÓNUS A CARGO DO RECORRENTE
REJEIÇÃO DE RECURSO
Data do Acordão: 06/06/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – PROCESSO DE DECLARAÇÃO / RECURSOS / ÓNUS A CARGO DO RECORRENTE QUE IMPUGNE A DECISÃO RELATIVA À MATÉRIA DE FACTO.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGO 640.º, N.º 1, ALÍNEA C).
Jurisprudência Internacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


-DE 26-05-2015, PROCESSO N.º 1426/08.7TCNT.L1.S1;
-DE 22-09-2015, PROCESSO N.º 29/12.6TBFAF.G1.S1;
-DE 29-10-2015, PROCESSO N.º 233/09.4TBVNG.G1.S1;
-DE 11-02-2016, PROCESSO N.º 157/12.8TUGMR.G1.S1;
-DE 03-03-2016, PROCESSO N.º 861/13.3TTVIS,C1.S1;
-DE 27-10-2016, PROCESSO N.º 3176/11.8TBBCL,G1.S1;
-DE 15-02-2018, PROCESSO N.º 134116/13,2YIPRP.E1.S1, TODOS IN WWW.DGSI.PT.
Sumário :

I - Na verificação do cumprimento dos ónus de alegação previstos no artigo 640º do CPC, os aspetos de ordem formal devem ser modelados em função dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

II - Limitando-se o Recorrente a afirmar, tanto na alegação como nas conclusões, que, face aos concretos meios de prova que indica, “se impunha uma decisão diversa”, relativamente às questões de facto que impugnara, deve o recurso ser rejeitado quanto à impugnação da matéria de facto, por não cumprimento do ónus processual fixado na alínea c), do n.º 1, do artigo 640º, do CPC.
Decisão Texto Integral:
Processo n.º 1474/16.3T8CLD.C1.S1 (Revista) - 4ª Secção[1]


Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça



I

RELATÓRIO[2]:

1). AA, com benefício do Apoio Judiciário, através de requerimento apresentado em formulário próprio, a que aludem os artigos 387º, n.º 2, do Código do Trabalho[3], 98º-C e 98º-D, ambos do Código de Processo do Trabalho[4], intentou, em 08 de setembro de 2016, na Comarca de Leiria, Caldas da Rainha – Instância Central – Juízo do Trabalho, a presente Ação de Impugnação Judicial da Regularidade e Licitude do seu Despedimento, sob a forma de processo especial, contra “BB, S. A.”.
                                                                                                                 Efetuada a audiência de partes, não se conseguiu obter a sua conciliação.  

2). Notificada a Empregadora para motivar o despedimento e apresentar o procedimento disciplinar, apresentou o seu articulado, alegando, em síntese, nos seguintes termos:


- O procedimento disciplinar e a decisão final proferida não padecem de qualquer irregularidade;
- O Trabalhador trata mal os colegas de trabalho e discute com os mesmos, o que ocorreu de forma grave com a trabalhadora CC e o trabalhador DD, criando mau ambiente que levou a primeira a cessar o seu contrato de trabalho e o segundo a deixar a companhia;
- O Trabalhador não cumpre as normas de higiene e segurança a que está obrigado: não usa a luva de malha de aço aquando do corte da carne, cortando-se várias vezes nas mãos e deixando os papéis/panos com que se limpa em cima da bancada onde continua a trabalhar e, algumas vezes o seu sangue caiu para a bancada onde se encontravam peças de carne, o que já levou a que uma cliente se tivesse queixado e referido que tinha perdido a confiança no serviço prestado;
- A falta de utilização da luva de malha de aço também levou a que um cliente tivesse efetuado uma outra reclamação;
- Frequentemente o Trabalhador assoa-se com as mãos, sem recorrer a qualquer lenço, fazendo sair o ranho diretamente para o caixote do lixo e, na maioria das vezes, limpa o nariz à mão e às vezes tem a luva de latex calçada, continuando a trabalhar com as peças de carne sem mudar a luva ou sem ir lavar as mãos, o que faz à vista dos clientes;
- Num outro dia quando estava a proceder à lavagem da secção, o Trabalhador urinou na copa o que referiu ter feito porque estava aflito;
- As atitudes do Trabalhador são causadoras de mau estar entre os colaboradores do ... e contribuem para a criação de um mau ambiente de trabalho e os seus efeitos repercutem-se negativamente no rendimento dos colaboradores e no regular funcionamento do ...;
- O Trabalhador agiu livre e consciente das suas atitudes que, para além de constituírem graves ilícitos disciplinares, pôs em causa o ambiente de trabalho e o bom nome da entidade patronal e violou os deveres de realizar o trabalho com zelo e diligência, de cumprir as ordens e instruções do empregador respeitantes à execução ou disciplina do trabalho, bem como a segurança e saúde no trabalho, de velar pela conservação e boa utilização de bens relacionados com o trabalho e de cumprir as prescrições sobre segurança e saúde no trabalho;
- A conduta do Trabalhador constitui justa causa de despedimento.

Termina, dizendo que o presente articulado deve ser considerado procedente por provado e, em consequência, ser declarada a licitude e regularidade do procedimento disciplinar realizado e da sanção disciplinar aplicada.

        3). O Trabalhador apresentou, também, o seu articulado, no qual arguiu a nulidade do despedimento porque quem tinha nomeado a instrutora do processo disciplinar não tinha poderes para o efeito, defendeu-se por exceção e por impugnação, sustentando a ilicitude do seu despedimento, e efetuou pedido reconvencional.

        Nele alegou o seguinte:


- O procedimento disciplinar é inválido e, em consequência, o despedimento ilícito;
- Não correspondem à verdade os factos que lhe são imputados, sendo um profissional de reconhecido mérito;
- Solicitou a sua transferência para a loja de ..., local da sua residência, o que não lhe foi concedido;
- Nunca violou os seus deveres enquanto trabalhador da Empregadora;
- O seu despedimento é ilícito;
- Tem direito a uma indemnização por danos não patrimoniais no montante de € 25.000,00, a receber as retribuições que deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão que declare a ilicitude do despedimento, deduzindo-se o subsídio de desemprego e a uma indemnização em substituição da reintegração, por que opta, a ser determinada em 45 dias por cada ano completo ou fração de antiguidade.  

       Termina dizendo que a ação e a reconvenção devem ser julgadas procedentes, por provadas e, em consequência, ser declarada a ilicitude do seu despedimento e a Empregadora/Reconvinda ser condenada a pagar-lhe a quantia de € 429,86, a título de retribuição correspondente a horas de formação; € 25.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais; as retribuições a que deixou de auferir e a indemnização por que optou, nos termos supra mencionados e juros de mora vencidos e vincendos desde a data em que as quantias reclamadas deviam ter sido pagas e até efetivo pagamento.                                                                             

     A Empregadora veio apresentar a sua resposta ao articulado do Trabalhador, concluindo que deverão as alegadas exceções ser julgadas improcedentes por não provadas e a presente resposta ser procedente, por provada e, em consequência, ser absolvida do pedido e o despedimento declarado lícito e regular.

      Foi proferido despacho saneador, julgada improcedente a invalidade do procedimento disciplinar invocada pelo Trabalhador e dispensada a seleção da matéria de facto assente e a base instrutória.

      4). Procedeu-se à realização da audiência de julgamento, e, em 10 de maio de 2017, foi fixada a matéria de facto provada e proferida sentença que julgou.


1) A ação improcedente, por não provada, e, em consequência, se declarou lícito e regular o despedimento do Trabalhador efetuado pela Empregadora;
2) A reconvenção parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, em consequência, a Empregadora condenada a pagar ao Trabalhador a quantia de € 419,22;
- Absolveu a Empregadora do demais peticionado pelo Trabalhador, em sede reconvencional.


II

5). Na sentença consideraram-se provados os seguintes factos [mantidos pelo Tribunal da Relação][5]:


1. Por carta entregue em mão, em 1 de julho de 2016, a R. notificou o A. da decisão de o suspender, de imediato, sem perda de retribuição – fls. 19 PD;
2. Por carta registada, recebida em 31 de agosto de 2016, a R. comunicou ao A. que decidiu aplicar-lhe a sanção disciplinar de despedimento com justa causa sem indemnização ou compensação – fls. 51-52 PD;
3. O A. é trabalhador da R., desde 21 de junho de 2010, e, à data dos factos em apreço, exercia funções no ... da loja da R. sito na ..., com a categoria profissional de oficial de carnes especializado - acordo;
4. O A. implica, muitas vezes, com os seus colegas de trabalho, sendo habitual dizer-lhes que não fazem o trabalho de forma correta e dar-lhes instruções como se só ele soubesse realizar as tarefas desenvolvidas no ...;
5. Acontece muitas vezes o A. entrar ao serviço no horário da tarde e começar a refilar com os colegas por causa da forma como estão expostos os produtos no balcão do ...;
6. Quando essa tarefa é da competência dos trabalhadores que fazem o horário de abertura;
7. Muitas vezes o A. altera a forma como a carne está exposta só porque acha que faz melhor que os colegas;
8. Quando o que se verifica é que a exposição da carne está feita de acordo com as regras da R. e, por isso, não suscita qualquer reparo por parte das chefias do ...;
9. Este comportamento do A. causou várias discussões com os seus colegas de trabalho, em especial com CC;
10. Desde que CC começou a trabalhar para a R., o A. tem, sistematicamente, implicado com ela;
11. Muitas das discussões entre o A. e CC devem-se ao facto deste saber da sua arte e não acatar as instruções que o A. lhe quer dar;
12. Algumas discussões entre os dois têm levado a que seja necessária a intervenção da responsável pela área do ..., EE, e nalguns casos, do diretor da loja, FF;
13. A mais grave das discussões ocorreu em agosto de 2011, e levou a que fosse necessário chamar o INEM que conduziu CC ao hospital de ...;
14. Porque não conseguia aguentar a pressão que o A. lhe causava, CC, em 6/6/2016, entrou de baixa médica e, mais tarde, apresentou pedido de cessação do contrato de trabalho;
15. O A. implicava, também, com outro trabalhador do ..., DD;
16. Era habitual o A. criticar a forma de trabalhar de DD, o que causou várias discussões entre ambos;
17. Numa dessas discussões, o A. disse a DD que lhe batia;
18. Por causa do mau ambiente de trabalho que o A. criava, DD deixou de trabalhar para a R.;
19. O A. não usa luva de malha de aço quando está a realizar operações de corte, desossa ou desmanche de carne;
20. O que leva a que o A. se corte várias vezes nas mãos;
21. Quando tal acontece, às vezes, o A. deixa ficar os papéis/panos com que se limpa em cima da bancada em vez de os deitar logo ao lixo;
22. Mesmo depois de fazer o penso à ferida e de colocar por cima do mesmo uma luva de latex, nem sempre o sangue estanca, pelo que continua a correr;
23. E, nesses casos, o sangue escorre por dentro da luva formando uma pequena bolsa num dos dedos da luva de latex – o que aconteceu, pelo menos, uma vez;
24. E, mesmo assim, o A. continua a trabalhar, ou seja, a cortar ou desmanchar peças de carne;
25. Uma cliente apresentou uma reclamação para o “SAC – Serviço de Apoio ao Cliente” dizendo que, no dia 5 de junho de 2016, o A. estava a atender um cliente, que se tinha cortado e apesar disso tinha continuado o atendimento, tendo a cliente referido que tinha perdido a confiança no serviço prestado;
26. Numa outra reclamação para o “SAC” um cliente referiu que, no dia 2 de junho de 2016, tinha ido ao ... e tinha visto o A. que estava muito magro e com uma cor doentia, a trabalhar sem luva de malha de aço;
27. Frequentemente, o A. assoa-se com a mão, fazendo sair o ranho diretamente para o caixote do lixo, sem recorrer a um lenço ou papel;
28. E, muitas vezes, o A. limpa o nariz à mão quando tem a luva de latex calçada, continuando a trabalhar com as peças de carne sem mudar de luva ou lavar as mãos;
29. Fazendo isso quando está no “atelier” do ..., que está à vista dos clientes, uma vez que tem um grande vidro que dá para o balcão do ...;
30. Em dia não apurado, do mês de maio de 2016, no final do dia, quando o A. e GG procediam à lavagem da secção, o A. foi para a copa, local onde se lava o material do ..., e fechou a porta, e urinou no interior da copa;
31. Após, o A. saiu da copa, GG questionou e repreendeu o A. e este respondeu que estava aflito;
32. O A. frequentou as seguintes ações de formação:
­ 2/2/2014, 30 minutos, "FD Segurança e Higiene no Trabalho – Placa de Vendas e Armazém";
­ 7/10/2013, 4 horas, "HSA ... atualização";
­ 10/10/2013, 30 minutos, “FD Segurança e Higiene Alimentar – ...”, cursam n.º F020314;
­ 10/10/2013, 30 minutos, “FD Segurança e Higiene Alimentar – ...”, cursam n.º F010255;
­ 21/11/2013, 30 minutos, "FD Segurança e Higiene no Trabalho – Geral";
­ 23/3/2013, 30 minutos, "FD Mãos à obra – A mudança para vencer"; - 15/5/2013, 30 minutos, "FD Higiene e Segurança Alimentar – Geral";
­ 30/5/2013, 30 minutos, "FD Mãos à obra – Planogramas";
­ 22/1/2014, 30 minutos, "FD Atendimento – serviço 5 estrelas – formação inicial";
­ 24/2/2014, 1 hora, "FD Mãos à obra – frescos e ...";
­ 20/3/2014, 30 minutos, "Formação operacional de segurança e higiene no trabalho";
­ 24/2/2014, 30 minutos, "FD Mãos à obra – frescos";
33. O A. agiu livre e consciente das suas atitudes;
34. O A. teve avaliação positiva do seu desempenho;
35. O A. não sofreu sanções disciplinares anteriores;
36. Ultimamente, o A. auferia a remuneração base de € 713,00;
37. A suspensão preventiva e o ulterior despedimento causaram ao A. angústia, tristeza, desgosto, ansiedade, inquietação, desassossego e incómodo.
                                                                                                                                                                                     

II
                                                                                                              6). Inconformado, o Trabalhador interpôs recurso de apelação, arguindo a nulidade da sentença e impugnando de facto e de direito.

Na impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto apresentou as seguintes conclusões:


“3º - II) DO RECURSO – REAPRECIAÇÃO DA PROVA GRAVADA: DA IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO QUANTO À MATÉRIA DE FACTO:

A discordância relativamente à decisão dos factos provados e dos factos não provados cujos pontos e alíneas a seguir se indicarão e que, no nosso entender, não se encontram de acordo com a prova produzida em audiência de discussão e julgamento (tendo-se que proceder à reapreciação da prova gravada) e prova documental junto aos autos.

4º - Nessa sequência, impugna-se a decisão sobre a matéria de facto:


Factos Provados:


- Pontos 3) a 17) -


Impunha-se uma decisão diversa tendo em conta os seguintes concretos meios de prova:

a) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada HH – vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta
b) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada – II– vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.
c) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada JJ– vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.
d) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada – II– vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.
e) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada – KK – vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.
f) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada LL– vid. lista de intervenções e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.
g) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada MM – vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.
                                                                                                               Ponto 18) –

a) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada HH – vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.

b) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada – NN – vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.


Pontos 19) a 24) e 33) -

                                                                                

a) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada HH – vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.

b) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada – OO – vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.

c) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada – II– vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.

d) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada – KK – vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.

e) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada LL– vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.

f) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada PP– vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.

g) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada MM– vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.


Pontos 27), 28) e 29) –

a) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada HH – vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.

b) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada PP– vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.
             
              Pontos 30), 31) e 32) –

a) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada GG – vid. Lista de Intervenções e Tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.

b) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada HH – vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.

c) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada QQ – vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.

d) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada PP[6] – vid. lista de intervenções e tempo e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.

e) Repetição da alínea anterior].

5º - Também se impugna a decisão sobre a matéria de facto:


   Factos Não Provados:


   Ponto H) –



Impunha-se uma decisão diversa tendo em conta os seguintes concretos meios de prova:

a). O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada HH – vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.


Ponto I) -

Impunha-se uma decisão diversa tendo em conta os seguintes concretos meios de prova:

a) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada HH – vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.

b) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada II – vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.

c) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada PP – vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.


   Ponto N) -

     Impunha-se uma decisão diversa tendo em conta os seguintes concretos meios de prova:

a) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada HH – vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.

b) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada PP – vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso[7].

c) [Repetição da alínea anterior].


    Ponto Q) -

a) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada LL – vid. lista de intervenções e tempo e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.

b) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada JJ – vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.
                                                                                                                                                                                     

Pontos R), S) e T) –
                                                                                                                                                                                     Impunha-se uma decisão diversa tendo em conta os seguintes concretos meios de prova:

a) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada RR – vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.

b) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada SS – vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.

c) O depoimento (prova gravada) da testemunha arrolada TT – vid. lista de intervenções e tempos e ainda as passagens concretas em que se fundamenta o seu recurso.

6º - III) ENQUADRAMENTO JURÍDICO:

[…].”

                                                                                                                                                  

~~~~~~~

7). Por acórdão proferido em 2017.11.10, o Tribunal da Relação de Coimbra, rejeitou o recurso quanto à impugnação da decisão proferida na 1ª instância sobre a matéria de facto, por não ter sido dado cumprimento ao ónus estabelecido na alínea c), do n.º 1, do artigo 640º, do CPC.

III

8). Novamente inconformado, recorreu, agora, de revista, mas tão só sobre a rejeição pela Relação da reapreciação da matéria de facto.

Termina a sua alegação com as seguintes conclusões:


1. “O presente recurso de revista prende-se com a questão de saber qual a correta interpretação jurídica dos n.ºs 1 e 2 do artigo 640° do Código de Processo Civil e, nessa conformidade, a questão principal que está em causa no presente recurso consiste em saber se o recorrente cumpriu ou não os ónus definidos pelos n.ºs 1 e 2 do artigo 640° do Código de Processo Civil quando impugnou parte significativa da decisão sobre a matéria de facto (factos provados e factos não provados), no recurso de apelação.
2. O Tribunal da Relação de Coimbra decidiu não reapreciar a matéria de facto, rejeitando o recurso nessa parte.
3. Entendeu, que o recorrente não cumpriu na totalidade o ónus que sobre si impendia, uma vez que considerou que nem no corpo das alegações nem nas conclusões procedeu à indicação de uma decisão alternativa, sendo que não existe qualquer fundamento legal para que aquele tribunal presumisse tal decisão.
4. Sucede, porém, que o ora recorrente apresentou uma outra alternativa decisória, razão pela qual estruturou a sua discordância, separadamente; por um lado, relativamente à decisão dos factos provados indicando os concretos meios de prova que deveriam ter conduzido a um resultado probatório oposto, ou seja, resultado probatório diverso ao que foi decidido pelo Tribunal da primeira instância; e, por outro lado, relativamente apreciação dos factos não provados indicando os concretos meios de prova que deveriam ter conduzido a um resultado probatório oposto, ou seja, resultado probatório diverso ao que foi decidido pelo Tribunal da primeira instância.
5. Seguidamente o recorrente efetuou o enquadramento jurídico tendo precisamente em atenção a decisão por si tomada quanto aos concretos pontos impugnados dos factos provados e quanto aos concretos pontos impugnados dos factos não provados, dando-se aqui por integralmente reproduzidas para todos os devidos e legais as conclusões no âmbito do recurso de apelação (pontos a º a 44°).
6. Neste contexto, não se evidencia qualquer falha de cumprimento do ónus de especificar previsto no artigo 640° do CPC.
7. Com efeito, não é legítimo que se faça do regime vigente uma interpretação excessiva, como a que se recolhe do acórdão recorrido, da qual resulta uma inaceitável sobreposição de natureza ou ordem formal numa situação em que se mostra, pelo menos razoavelmente, cumprido o ónus de especificar previsto no artigo 640° do CPC.
8. Importa que não se sacrifique o direito das partes no altar de uma jurisprudência formal a um ponto extremo que seja denegada a reapreciação da decisão da matéria de facto.
9. É necessário que a verificação do cumprimento do ónus de especificar regulado no artigo 640° do CPC seja compaginada com os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. É imprescindível que da interpretação e aplicação de tal normativo não resulte a ideia de que existe uma tendência para a rejeição dos recursos de apelação quando está em causa a reapreciação da decisão da matéria de facto.
10. O STJ insistentemente questionado sobre o modo como é interpretado o ónus de especificar previsto no artigo 640° do CPC vem revelando uma tendência consolidada no sentido de não se exponenciarem os efeitos cominatórios previstos no artigo 640° do CPC.
11. Normas Jurídicas violadas: n.ºs 1 e 2 do artigo 640° e artigo 662°, ambos do Código de Processo Civil.

Pelo que, concedendo-se a revista e se anule o acórdão recorrido, na parte que não apreciou a impugnação da decisão proferida na 1ª instância sobre a matéria de facto, e que se determine que o processo volte ao Tribunal da Relação para conhecimento do recurso do Trabalhador sobre a reapreciação da matéria de facto nos pontos impugnados e que, após, se decida sobre o mérito da causa, conforma a matéria de facto que resultar dessa sua reapreciação.

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10). A Empregadora, “BB, S.A.”, contra-alegou invocando a inadmissibilidade do recurso por haver dupla conforme.

IV

Parecer do Ministério Púbico:

Neste Supremo Tribunal de Justiça, o Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto, ao abrigo do disposto no artigo 87º, n.º 3, do CPT, emitiu parecer no sentido de não se conceder a revista, por o recorrente não ter dado cumprimento ao disposto na alínea c), do n.º 1, artigo 640.º, do CPC.

Notificado às partes, não houve qualquer pronúncia sobre ele.

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Questão prévia levantada pela Empregadora:

Diz a recorrida que o recurso é inadmissível por existir dupla conforme, dado que a Relação confirmou sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente a decisão da 1ª instância.

No caso concreto inexiste dupla conforme.
 
Ora, “a decisão ora recorrida é uma decisão sem qualquer paralelo, afinidade ou contiguidade com a decisão produzida na 1ª instância.
[…]
E por isso o acórdão recorrido é normalmente recorrível (revista normal) no segmento em causa (rejeição da impugnação da matéria de facto), estando aqui em causa a violação ou errada aplicação da lei de processo […]”.

Dentro desta linha, este Supremo Tribunal tem reiteradamente afirmado, designadamente no contexto da revista excecional (valendo para o caso vertente “mutatis mutandis” a mesma ordem de argumentação), que quando se trata de recurso contra a decisão da Relação proferida quanto ao cumprimento dos requisitos do artigo 640º do CPC se está perante uma decisão nova que, verificados os requisitos gerais da admissibilidade dos recursos, admite por si só recurso normal de revista, não havendo assim que falar em qualquer dupla conformidade decisória das instâncias quanto à mesma questão fundamental de direito (v., por exemplo, os acórdãos de 19.3.2015, 14.5.2015, 2.6.2015, 2.7.2015, 8.10.2015 e 22.10.2015, todos sumariados em www.stj/jurisprudência/revista excecional, e o acórdão de 14.7.2016 (processo nº 111/12.0TBAVV.G1.S1), este disponível em www.dgsi.pt[8]).

Consequentemente, e como já referido em despacho anterior, a presente revista é admissível na parte ora em análise, porque a decisão da Relação confirma a decisão sobre a matéria de direito, mas quanto à matéria de facto configura uma decisão nova, pelo que não se pode falar aqui de dupla conformidade.

Sendo admissível esta revista, improcede esta questão prévia.

~~~~~

DO RECURSO:

Tendo a ação sido proposta em 08 de setembro de 2017 e o acórdão recorrido sido proferido em 10 de novembro de 2017, é aqui aplicável o Código de Processo Civil (CPC), anexo e aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, e o Código de Processo do Trabalho (CPT) na versão aprovada pelo Decreto-Lei n.º 480/99, de 9 de novembro.

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O objeto do recurso:

Saber se o Recorrente deu cumprimento ao ónus estabelecido no artigo 640º, n.º 1, alínea c), do CPC.


Cumpre, assim, decidir.

                                                                                                             
V

2). Fundamentação:


Do direito:


Cumpre, pois, apreciar as questões suscitadas nas conclusões da alegação da Recorrente, excetuadas aquelas cuja decisão se mostre prejudicada pela solução, entretanto dada a outras, nos termos preceituados nos artigos 608º, n.º 2, e 679º, ambos do CPC.

Dispõe o artigo 640º do CPC (ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto):

1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:


a. Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b. Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c.  A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

2.- No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a. Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b. b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.

Por sua vez, determina o artigo 639º do CPC (ónus de alegar e formular conclusões):

1 - O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.

2 - Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar:
a. As normas jurídicas violadas;
b. O sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas;
c. Invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada.

3 - Quando as conclusões sejam deficientes, obscuras, complexas ou nelas se não tenha procedido às especificações a que alude o número anterior, o relator deve convidar o recorrente a completá-las, esclarecê-las ou sintetizá-las, no prazo de cinco dias, sob pena de se não conhecer do recurso, na parte afetada.

4 - O recorrido pode responder ao aditamento ou esclarecimento no prazo de cinco dias.

5 - O disposto nos números anteriores não é aplicável aos recursos interpostos pelo Ministério Público, quando recorra por imposição da lei.

~~~~~~~~

A exigência que o legislador consagrou no artigo 607º, n.º 4, do CPC, quanto à decisão da matéria de facto, impondo ao Tribunal o dever de fundamentação e de análise crítica da prova, tem como contraponto a exigência imposta às partes, que pretendam impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto, de cumprirem os ónus estabelecidos nos artigos 639º e 640º, ambos do CPC.

Com efeito, de acordo com o disposto no artigo 639º, n.º 1, do CPC, interposto um recurso em processo civil e, consequentemente, em processo do trabalho,” ex vi” do artigo 81, n-º 5, do CPT, impõe-se ao recorrente, desde logo, o ónus de alegar e de concluir, devendo indicar, nas conclusões, de forma sintética, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.

Exige-se que a alegação contenha conclusões para, através delas, se delimitar o objeto do recurso [artigos 635º, n.ºs 3 a 5, e 639º, n.ºs 1 e 2, ambos do CPC], fazendo-se o levantamento das questões controversas, evitando-se, assim, uma impugnação geral, vaga, indefinida e abstrata da decisão.

Por outro lado, têm, também, como objetivo facilitar o exercício do contraditório, de modo a não criar dificuldades acrescidas para a outra parte, privando-a de elementos importantes para organizar a sua defesa, em sede de contra-alegações.

                                                                                                                         

Ora, a este ónus – de alegar e formular conclusões nos termos impostos pelo artigo 639º do CPC – acrescem os ónus previstos no artigo 640º, que foram estabelecidos especificamente para os casos em que seja impugnada a decisão proferida sobre a matéria de facto.


De acordo com a norma do artigo 640º, do CPC, o Recorrente, que impugne a matéria de facto, tem que dar cumprimento a um triplo ónus, consistindo no dever de obrigatoriamente:


1. Circunscrever ou delimitar o âmbito do recurso, indicando claramente os segmentos da decisão que considera viciados por erro de julgamento;
2. Fundamentar, em termos concludentes, as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa,
3. Enunciar qual a decisão que, em seu entender, deve ter lugar relativamente às questões de facto impugnadas.

Ónus tripartido que encontra a sua razão nos princípios estruturantes da cooperação, da lealdade e da boa-fé processuais e que procura garantir, em última análise, a seriedade do próprio recurso instaurado, afastando eventuais manobras dilatórias de protelamento do trânsito em julgado da decisão.

                                                                    

Por outro lado, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, acresce mais um ónus, nos termos do artigo 640º, n.º 2, alínea a), do CPC.

Neste caso, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.


Ora, mais recentemente, a jurisprudência[9] deste Supremo Tribunal tornou-se mais flexível e mais maleável, no que respeita ao cumprimento dos mencionados ónus, principalmente em relação aos de natureza essencialmente formal ou secundária, como é o caso da especificação exata dos pontos da gravação [artigo 640º, n.º 2, alínea a)].
Com efeito, tem vindo a consolidar-se a jurisprudência que acentua a prevalência do mérito e da substância sobre os requisitos ou exigências formais, constantes do artigo 640º, n.ºs 1 e 2, do CPC.

Há, pois, que fazer uma interpretação desta norma mais consentânea com as exigências dos princípios da proporcionalidade e da adequação.
 

Sobre estes ónus e sobre as consequências do seu não cumprimento total ou parcial, no acórdão proferido, em 29.10.2015, no Processo n.º 233/09.4TVNG.G1.S1[10], consta o seguinte[11]:


1. “Face aos regimes processuais que têm vigorado quanto aos pressupostos do exercício do duplo grau de jurisdição sobre a matéria de facto, é possível distinguir um ónus primário ou fundamental de delimitação do objeto e de fundamentação concludente da impugnação - que tem subsistido sem alterações relevantes e consta atualmente do n.º 1, do artigo 640º do CPC; e um ónus secundáriotendente, não propriamente a fundamentar e delimitar o recurso, mas a possibilitar um acesso mais ou menos facilitado pela Relação aos meios de prova gravados relevantes, que tem oscilado, no seu conteúdo prático, ao longo dos anos e das várias reformas – indo desde a transcrição obrigatória dos depoimentos até uma mera indicação e localização exata das passagens da gravação relevantes (e que consta atualmente do artigo 640º, n.º 2, alínea a), do CPC).

2. “Este ónus de indicação exata” das passagens relevantes dos depoimentos gravados deve ser interpretado em termos funcionalmente adequados e em conformidade com o princípio da proporcionalidade, não sendo justificada a imediata e liminar rejeição do recurso quando – apesar de a indicação do recorrente não ser, porventura, totalmente exata e precisa, não exista dificuldade relevante na localização pelo Tribunal dos excertos da gravação em que a parte se haja fundado para demonstrar o invocado erro de julgamento - como ocorre nos casos em que, para além de o apelante referenciar, em função do conteúdo da ata, os momentos temporais em que foi prestado o depoimento, complemente tal indicação […] com uma extensa transcrição, em escrito dactilografado, dos depoimentos relevantes para o julgamento do objeto do recurso.”

Ainda no mesmo acórdão refere-se que, “[n]a interpretação da norma que consagra este ónus de indicação exata a cargo do recorrente que impugna prova gravada, não pode deixar de se ter em consideração a filosofia subjacente ao atual CPC, acentuando a prevalência do mérito e da substância sobre os requisitos ou exigências puramente formais, carecidos de uma interpretação funcionalmente adequada e compaginável com as exigências resultantes do princípio da proporcionalidade e da adequação - evitando que deficiências ou irregularidades puramente adjetivas impeçam a composição do litígio ou acabem por distorcer o conteúdo da sentença de mérito, condicionado pelo funcionamento de desproporcionadas cominações ou preclusões processuais.

[…]

Por outro lado, esta ideia base, segundo a qual não deve adotar-se uma interpretação rígida e desproporcionadamente exigente de ónus ou cominações de natureza essencialmente formal ou secundáriadevendo adotar-se interpretação conciliável com as exigências de um princípio fundamental de proporcionalidade e adequaçãovem encontrando acolhimento claro na jurisprudência recente deste Supremo, nomeadamente a propósito do grau de exigência e intensidade do ónus do recorrente que presentemente nos ocupa.”



Em idêntico sentido, decidiu o Acórdão de 22.09.2015, Processo n.º 29/12.6TBFAF.G1.S1[12]:

[…]

II Na impugnação da decisão de facto, recai sobre o Recorrente “um especial ónus de alegação”, quer quanto à delimitação do objeto do recurso, quer no que respeita à respetiva fundamentação.
III - Na delimitação do objeto do recurso, deve especificar os pontos de facto impugnados; na fundamentação, deve especificar os concretos meios probatórios que, na sua perspetiva, impunham decisão diversa da recorrida (artigo 640.º, n.º 1, do CPC) e, sendo caso disso (prova gravada), indicando com exatidão as passagens da gravação em que se funda (artigo 640.º, n.º 2, al. a), do CPC).
IV - A inobservância do referido em III é sancionada com a rejeição imediata do recurso na parte afetada.
V - Se essa cominação se afigura indiscutível relativamente aos requisitos previstos no n.º 1, dada a sua indispensabilidade, já quanto ao requisito previsto no n.º 2, al. a), justifica-se alguma maleabilidade, em função das especificidades do caso, da maior ou menor dificuldade que ofereça, com relevo, designadamente, para a extensão dos depoimentos e das matérias em discussão.
VI - Se a falta de indicação exata das passagens da gravação não dificulta, de forma substancial e relevante, o exercício do contraditório, nem o exame pelo tribunal, a rejeição do recurso, com este fundamento, afigura-se uma solução excessivamente formal, rigorosa e sem justificação razoável.

No que respeita aos ónus constantes nas alíneas do n.º 1, do artigo 640º, do CPC, ou seja, quando não for cumprido o ónus “primário” ou “fundamental” de delimitação do objeto e de fundamentação concludente da impugnação há lugar à rejeição do recurso, total ou parcial.

Todavia, para que a impugnação da decisão sobre a matéria de facto seja admitida, não se mostra necessário que todos os ónus estabelecidos no artigo 640º, do CPC, constem obrigatoriamente da síntese conclusiva.

Nesta conformidade, enquanto a especificação dos concretos pontos de facto considerados incorretamente julgados deve constar obrigatoriamente da alegação e das conclusões recursivas, já não se torna forçoso que constem da síntese conclusiva a especificação dos meios de prova, e muito menos, a indicação das passagens das gravações.

Quanto a elas, basta que figurem no corpo da alegação, desde que nas conclusões se identifique, com clareza, os concretos pontos de facto que se impugnam.


VI

              No caso concreto, lidas as conclusões e a alegação do recurso de apelação, verifica-se que o Recorrente não deu cumprimento ao ónus estabelecido na alínea c), do n.º 1, do artigo 640º, pois, em ambas, não enunciou a decisão que, no seu entender, devia ser proferida sobre todas as questões de facto que impugnou - pontos 3) a 17), 18), 19) a 24), 33), 27), 28), 29), 30), 31) e 32, da matéria de facto provada [29 pontos], e os pontos H), I), N), O), R), S) e T), da matéria de facto não provada [07 pontos].

Ora, apesar de ter impugnado, praticamente, toda a matéria de facto, o Recorrente não indicou o sentido da decisão pretendida para cada um desses pontos, ou seja, não enunciou qualquer alteração que, no seu entender, devia ser feita sobre a factualidade que pôs em causa.

E não o fez relativamente a todos os factos impugnados.

Na verdade, quer na alegação quer nas conclusões do recurso de apelação, limitou-se a afirmar relativamente a todos os pontos impugnados, que, tendo em conta os concretos meios probatórios que enunciara, “se impunha uma decisão diversa”.

Aliás, a diferença que existe, a respeito da impugnação da matéria de facto, na motivação e nas conclusões é, unicamente, a transcrição dos trechos dos depoimentos gravados, que consta naquela e nestas não.

Acresce que, também, não se consegue extrair das transcrições efetuadas qual o sentido da decisão que, para o Recorrente, devia ter cada facto, até porque a transcrição é feita sem mais, sendo desacompanhada de qualquer comentário, razão ou fundamento.

                                                                                 

Igualmente do “enquadramento jurídico” não resulta qualquer enunciação pretendida, pois o recurso de apelação é uma impugnação geral, vaga e abstrata da sentença.

Com efeito, nele o Recorrente faz, quase somente, uma resenha do seu ambiente de trabalho, das relações existentes entre os trabalhadores e entre estes e as chefias, concluindo que “o Tribunal tem que ter em atenção de que o trabalhador AA é uma vítima digamos de um sistema em que privilegia a produtividade, privilegia o rendimento em detrimento de todas as regras, não venham cá com coisas porque enquanto ninguém sabia cá de fora, ou seja, enquanto só estava na Loja BB podia-se violar as regras todas … Na Loja da ... do BB o trabalhador podia trabalhar sem a luva de aço, a partir do momento que aparecem as 2 reclamações para Lisboa é que de repente a situação muda … E foi isto que aconteceu” [sic], que “as chefias (o gerente, os 3 adjuntos de loja, a chefe e a subchefe da secção do trabalho) não souberam educar o trabalhador AA, quanto ao uso da luva de aço, nem tomaram qualquer decisão para o afastar da secção do ... (…)” e que “(…) permitiram que a situação se arrastasse no tempo, por anos, em benefício da própria liderança (…), pois os seus chefes são responsáveis pelos bons ou maus resultados da Loja que lideram e quando os resultados são bons são reconhecidos por isso, ou seja, temos aqui um interesse também pessoal das próprias chefias)[13]”.  

 Por fim, o Trabalhador afirma, na alegação e nas conclusões, deste recurso de revista, que indica, no recurso de apelação, “a decisão que, no seu entender, deveria ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, precisamente a decisão oposta, ou seja, a decisão diversa àquela que foi decidida pelo Tribunal de primeira instância. Por um lado, nos concretos pontos que indicou relativamente aos factos provados e por outro lado, nos concretos pontos que indicou relativamente aos factos não provados (…)”.

Apesar do afirmado, o Recorrente na apelação apenas refere que, face aos concretos meios de prova que indicara, “se impunha uma decisão diversa”.

Significando diversa o mesmo que diferente, não concretiza, pois, qual a decisão que, em seu entender, devia ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

Aliás, a decisão da matéria de facto e toda a estrutura do recurso, como se verifica da parte que se transcreveu das conclusões, não se compadece com uma resposta de “provado” e “não provado” por inexistir base instrutória porque dispensada.

                                                                                                                               

Assim, não merece qualquer censura a decisão do Tribunal da Relação ao rejeitar a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, por o Recorrente ter omitido o cumprimento do ónus processual fixado na alínea c), do n.º 1, do artigo 640º, do CPC, não constando quer da motivação quer das conclusões o sentido da decisão que, em seu entender, devia ser proferido sobre as questões de facto que impugnara


VII

DECISÃO:

Face ao exposto, acorda-se em negar a revista e, consequentemente, em manter o acórdão recorrido na parte em que foi impugnado.
Custas da revista pelo Recorrente, sem prejuízo do Apoio Judiciário na modalidade que lhe foi concedida.
Anexa-se sumário do acórdão.

~~~~~~~~~~
                                                                                                       
Lisboa, 2018.06.06
Ferreira Pinto (Relator)
 Chambel Mourisco
Pinto Hespanhol

__________________
[1] - 014/2018 – (FP) – CM/PH
Nossos Negrito e sublinhado.
[2] - Relatório elaborado com base no das instâncias.
[3] - Doravante CT.
[4] - Doravante CPT.
[5] - Consta Autor em vez de Trabalhador e Ré em vez de Empregadora.
[6]  - No ponto N), a alínea c) é a repetição da alínea d).
[7] - A alínea c) do ponto N) é igual à alínea b).
[8] - Acórdão do Supremo de Justiça de 2013.10.27, Processo n.º 3176/11.8TBBG1.S1.
http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/959874c26195e3d780258059004a3541?OpenDocument
[9] - Acórdãos de 29.10.2015, de 27.10.2016, de 15.02.2018, de 11.02.2016, de 03.03.2016, e de 26.05.2015, proferidos, respetivamente, nos Processos n.ºs 233/09.4TBVNG.G1.S1, 3176/11.8TBBCL,G1.S1, 134116/13,2YIPRP.E1.S1, 157/12.8TUGMR.G1.S1, 861/13.3TTVIS,C1.S1, e 1426/08.7TCNT.L1.S1, todos in www.dgsi,pt.
[10] - Este acórdão bem como todos os que não tiverem menção de origem são do Supremo Tribunal de Justiça.
[11] - www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/71730dbf9a0f062780257eed005712c6?OpenDocument
[12] - Da 6ª Secção - Relator: Pinto de Almeida – Sumários de Acórdãos Cíveis, ano de 2015.
https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2018/01/Civel2015.pdf.
[13] - Texto conforme o original.