Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
2028/12.9TBVCT.G1.S1
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: MARIA DA GRAÇA TRIGO
Descritores: RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL
ACIDENTE DE VIAÇÃO
DANOS FUTUROS
DANO BIOLÓGICO
DANOS PATRIMONIAIS
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
PERDA DE CAPACIDADE DE GANHO
CÁLCULO DA INDEMNIZAÇÃO
EQUIDADE
PROVA PERICIAL
PROVA TESTEMUNHAL
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA
PODERES DO TRIBUNAL
PODERES DA RELAÇÃO
Nº do Documento: SJ
Data do Acordão: 05/25/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL - RELAÇÕES JURÍDICAS / EXERCÍCIO E TUTELA DE DIREITOS / PROVAS - DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / FONTES DAS OBRIGAÇÕES / RESPONSABILIDADE CIVIL / MODALIDADES DAS OBRIGAÇÕES / OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAÇÃO.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PROCESSO DE DECLARAÇÃO / SENTENÇA / RECURSOS / ALTERAÇÃO DA DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO.
Doutrina:
- Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código do Processo Civil, 3.ª edição, Almedina, 2016, 244 e ss..
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 389.º, 396.º, 566.º, N.º 3.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 607.º, N.º 5, 635.º, N.º 4, 662.º, 663.º, N.º 2.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

-DE 20/10/2011, PROC. N.º 428/07.5TBFAF.G1.S1, DE 10/10/2012, PROC. N.º 632/2001.G1.S1, DE 07/05/2014, PROC. N.º 436/11.1TBRGR.L1.S1, DE 19/02/2015, PROC. N.º 99/12.7TCGMR.G1.S1, DE 04/06/2015, PROC. N.º 1166/10.7TBVCD.P1.S1, DE 07/04/2016, PROC. N.º 237/13.2TCGMR.G1.S1, DE 14/12/2016, PROC. N.º 37/13.0TBMTR.G1.S1, E DE 16/03/2017, PROC. N.º 294/07.0TBPCV.C1.S1, TODOS CONSULTÁVEIS EM WWW.DGSI.PT .
-DE 06/04/2015, PROC. Nº 1166/10.7TBVCD.P1.S1, COM REMISSÃO PARA O ACÓRDÃO DE 28/10/2010, PROC. Nº 272/06.7TBMTR.P1.S1, E PARA O ACÓRDÃO DE 05/11/2009, PROC. Nº 381/2002.S1, TODOS CONSULTÁVEIS EM WWW.DGSI.PT .
-DE 28/01/2016, PROC. N.º 7793/09.8T2SNT.L1.S1, IN WWW.DGSI.PT , RETOMADAS NOS ACÓRDÃOS DE 07/04/2016, PROC. N.º 237/13.2TCGMR.G1.S1, E DE 14/12/2016, PROC. N.º 37/13.0TBMTR.G1.S1, IN WWW.DGSI.PT .
-DE 14/12/2016, PROC. Nº 37/13.0TBMTR.G1.S1, E DE 16/03/2017, PROC. Nº 294/07.0TBPCV.C1.S1, IN WWW.DGSI.PT .
-DE 16/03/2017, PROC. Nº 294/07.0TBPCV.C1.S1, CONSULTÁVEL IN WWW.DSGI.PT .
Sumário :
I - Tanto a prova pericial (art. 389º do CC) como a prova testemunhal (art. 396º do CC) são apreciadas livremente pelo tribunal, o que implica que este possa fazer prevalecer uma sobre a outra. Este poder cabe tanto ao tribunal da 1ª instância como à Relação, à qual se aplica o regime do art. 607º, nº 5, do CPC, por remissão do art. 663º, nº 2, do mesmo Código.

II - A afectação da integridade físico-psíquica (em si mesma um dano evento, que, na senda do direito italiano, tem vindo a ser denominado “dano biológico”) pode ter como consequência danos de natureza patrimonial e danos de natureza não patrimonial. Na primeira categoria não se compreende apenas a perda de rendimentos pela incapacidade laboral para a profissão habitual, mas também as consequências da afectação, em maior ou menor grau, da capacidade para o exercício de outras actividades profissionais ou económicas, susceptíveis de ganhos materiais.

III - Consideram-se reparáveis como danos patrimoniais as consequências danosas resultantes da incapacidade geral permanente (ou dano biológico), ainda que esta incapacidade não tenha tido repercussão directa no exercício da profissão habitual. Considera-se ainda que o aumento da penosidade e esforço pode ser atendido nesse mesmo âmbito (danos patrimoniais) – e não apenas no âmbito dos danos não patrimoniais –, desde que seja provado que tal aumento de penosidade e esforço tem como consequência provável a redução da capacidade genérica de obtenção de proventos, no exercício de actividade profissional ou de outras actividades económicas

IV - No domínio dos danos patrimoniais indetermináveis a reparação deve ser fixada segundo juízos de equidade (cfr. art. 566º, nº 3, do Código Civil), dentro dos limites que o tribunal tiver como provados.

V - A atribuição de indemnização por perda de capacidade geral de ganho, segundo um juízo equitativo, tem variado, essencialmente, em função dos seguintes factores: a idade do lesado; o seu grau de incapacidade geral permanente; as suas potencialidades de aumento de ganho – antes da lesão -, tanto na profissão habitual do lesado, assim como em actividades profissionais ou económicas alternativas, aferidas, em regra, pelas suas qualificações e competências. A estes acresce um outro factor: a conexão entre as lesões físico-psíquicas sofridas e as exigências próprias da actividade profissional habitual do lesado, assim como das actividades profissionais alternativas (tendo em conta as qualificações e competências do lesado).

VI - Resultando da factualidade provada que o autor: (i) tinha 41 anos à data do acidente; (ii) ficou a padecer de Défice Funcional Permanente da Integridade Físico Psíquica fixado em 29 pontos; (iii) exercia profissão (trolha na construção civil) que exige elevados níveis de força e destreza físicas, tendo as lesões sofridas determinado que: “O Autor ficou ainda com dificuldade de marcha, não consegue “acelerar” o passo, correr, agachar-se ou mesmo colocar-se de joelhos.”; “Ficou com dor no joelho direito, tal como na região lombar, tipo “moedeira”, permanente, agudizada com esforços de carga e marcha, que o obrigam a tomar diariamente analgésicos; ficou com a sensação de “perna pesada”.”; “Em consequência do acidente de viação, das lesões e respectivas sequelas, o A. ficou a padecer ao nível do membro inferior direito de limitação da flexão do joelho a 110º.”; “Todas as sequelas que o A. sofreu com o relatado acidente não só o acompanham até à data da sua reforma laboral, como o acompanharão até ao termo da sua vida activa.”, afigura-se justo e adequado fixar, a partir da data da consolidação médico-legal das lesões, em € 170.000 a indemnização por perda geral de ganho/dano biológico.

Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça




1. AA propôs, em 29-06-2012, acção declarativa ordinária, em processo comum, contra Companhia de Seguros BB, S.A., pedindo, inicialmente, a condenação desta a pagar-lhe:

A) A quantia de 56.704,01€ proveniente dos danos patrimoniais e não patrimoniais que lhe advieram do infra relatado acidente e apenas até à data da instauração da presente acção, acrescida dos juros de mora que se vencerem após a citação, à taxa legal, até efectivo e integral pagamento;

B) A quantia que vier a apurar-se em execução de sentença relativamente aos factos mencionados nos itens 130º a 133º, 135º, 136º, 150º, 157º, 158º, 163º, 164º e 167º, também acrescida de juros legais a contar da citação e até integral pagamento.

Alegou, em síntese, que foi vítima de acidente de viação, em 29-08-2009, quando seguia conduzindo o seu motociclo de Viana para Ponte de Lima, tendo sido embatido pelo veículo automóvel ...-GC-..., seguro na R., exclusivamente por causa e por culpa do respectivo condutor, tendo sofrido lesões e ficando com sequelas e consequentes danos patrimoniais e não patrimoniais, cuja indemnização pretende.

Contestou a R. confessando os factos inerentes à dinâmica do acidente, aceitando a responsabilidade decorrente do mesmo, impugnando contudo os factos referentes à extensão e valor dos danos alegados.

Conforme requerimento de fls. 273 e segs., o A. requereu a ampliação da causa de pedir e do pedido, peticionando, a título de danos patrimoniais, para além do já peticionado, o montante de € 241.560,59, e, a título de danos não patrimoniais, o montante de € 60.000,00; quantias estas acrescidas dos juros legais que se vencerem após notificação do pedido; e por último a quantia que vier a apurar-se em liquidação de sentença relativamente aos factos alegados nos artigos 5º, 70º a 74º, 95º a 98º do requerimento.

A R. respondeu impugnando a factualidade aduzida.

A fls. 631 relegou-se para a sentença a decisão sobre a sua admissibilidade.

Nos termos de fls. 474-vº e segs. veio novamente o A. requerer a ampliação da causa de pedir e do pedido, peticionando, a mais, e conforme melhor discriminado a fls. 489-vº e 490, a quantia de € 48.894,26, acrescida dos juros legais que se vencerem após a notificação do pedido; relegar-se para execução de sentença a determinação das sequelas físico-motoras que para o autor advirão, melhor explanadas no artigo 26º do requerimento; relegar-se para execução de sentença o pagamento dos salários do A. até à data da sua alta clínica, contados a partir daquela data (Junho de 2015, inclusive), por se desconhecer quando o mesmo poderá regressar ao trabalho; relegar-se para execução de sentença o pagamento de todas as despesas que, a partir da data de tal ampliação, o A. suporte por causa das relatadas sequelas do acidente.

A R. respondeu impugnando a factualidade aduzida.

Por despacho de fls. 610 foi admitida apenas, e em parte, a ampliação do pedido.

Após duas perícias médico-legais (incluindo-se na segunda a de psiquiatria) e uma vez realizada a audiência final foi proferida a sentença (fls. 650 a 669), que culminou na seguinte decisão:

“Pelo exposto, decide-se julgar a acção parcialmente procedente e, em consequência, condena-se a R:

a) a pagar ao A. a quantia de € 308.941,80 (trezentos e oito mil, novecentos e quarenta e um euros e oitenta cêntimos) (€300.000,00 + €470,00 + €8.471,80), a título de danos patrimoniais, devendo à quantia de €3000.000,00 serem deduzidos os montantes entretanto pagos pela Ré ao A. a título de perdas salariais, e de €50.000,00 (cinquenta mil euros) a título de danos não patrimoniais;

b) a pagar à A. os juros de mora à taxa de 4% (Portaria 291/03, de 8 Abr):

• desde a citação até integral pagamento, sobre o montante relativo aos danos patrimoniais;

• desde o trânsito em julgado da presente decisão até integral pagamento, sobre o montante relativo aos danos não patrimoniais.

c) a pagar à A. a quantia a apurar em sede de liquidação de sentença relativamente à indemnização pelo danos futuros descritos em 1.167. dos factos provados da presente sentença.

d) No mais, julga-se a acção improcedente, absolvendo a R. do restante peticionado.”


Inconformada, a R. interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Guimarães, pedindo a reapreciação da decisão relativa à matéria de facto e impugnando a decisão de direito.

O A. interpôs recurso subordinado.

Por acórdão de fls. 712 foi alterada a decisão relativa à matéria de facto e, em consequência, foi, a final, proferida a seguinte decisão:


“Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes desta Relação em julgar procedente o recurso da ré e, em consequência, dando, nos apontados termos, provimento à apelação, alteram a decisão recorrida, fixando a indemnização, quanto ao dano patrimonial futuro considerado a partir da data da consolidação médico-legal das lesões – 31-12-2012 – no montante de 140.000,00€, neste apenas se descontando as quantias pela ré pagas ao autor, a título de salários perdidos depois dessa data, e não as pagas antes, com idêntico fundamento, em compensação da incapacidade para o trabalho até ali arbitrada. E em julgar improcedente o recurso subordinado do autor, negando-lhe provimento, assim, no mais, confirmando a decisão.”


2. Vem o A. interpor recurso para este Supremo Tribunal de Justiça, formulando as seguintes conclusões:

1º - O tribunal "a quo" sobrevalorizou excessivamente a prova pericial constantes dos relatórios médico-legais de fls.      e datados 10.10.2013 e de 22.10.2014, em detrimento da prova testemunhal e, essencialmente, do depoimento do Sr. Dr. CC, Médico de Família do Autor - como expressamente resulta de fls. 31 do acórdão recorrido - contribuindo, dessa forma, para a alteração da matéria fáctica da decisão da 1ª instância, relativamente às repercussões das sequelas físicas no exercício da sua actividade profissional de trolha da construção civil, resultantes para o Autor do acidente de viação de que foi vítima em 29.09.2009, violando, dessa forma, o disposto no art.607º, n.º5, do CPC.

2º - Todavia, face à douta jurisprudência deste Venerando Tribunal, "o valor da prova pericial civil não vincula o critério do julgador, que a pode rejeitar, independentemente de sobre ela fazer incidir uma crítica material da mesma natureza, ou seja, dito de outro modo, os dados de facto que servem de base ao parecer estão sujeitos ao princípio da livre apreciação da prova, e o juízo científico ou parecer, propriamente dito, também, não requer uma crítica material e científica" (sublinhado nosso): Acórdão STJ de 06.07.2011-1ª Secção - proferido no proc. 3612/07.6TBLRA.C2.S1, acessível em www.dgsi.pt

3.º - Deveria o tribunal recorrido dar prevalência ao depoimento testemunhal do Pr. CC, Médico de Família do Autor, tal como à demais prova testemunhal, em detrimento da sobrevalorização dos relatórios periciais como, de resto, assim fez o tribunal da 1.ª instância, tanto mais que o acompanha mensalmente há mais de 6 anos, ou seja, após o relatado acidente, concedendo-lhe, desde então e até esta data "baixa médica" para o trabalho, como resulta do Facto Provado sob o n.º 1.130. pelo que entende o Recorrente ocorrer in casu incorrecto julgamento da matéria de facto face a essa prova testemunhal carreada para os autos.

4.º - Tanto mais que constitui jurisprudência deste Venerando Tribunal que "... a gravação da prova e a sua reapreciação (pela Relação) não garantem, em absoluto, as mesmas condições que se verificavam aquando da prolação da decisão da matéria de facto pelo tribunal de 1ª instância, cujo juiz presidiu ao julgamento. Ademais, por muito esforço que tenha sido feito por este na exteriorização dos motivos em que assentou a sua decisão da matéria de facto, sempre existirão factores difíceis ou impossíveis de concretizar ou de verbalizar": Acórdão de 11.02.2016, proferido no proc. 907/13.5TBPTG.E1.SI, da 2ª Secção, acessível em www.dgsi.pt

5.º - De resto, a prevalência que o Tribunal "a quo" deu à prova pericial em detrimento da prova testemunhal, concretamente do Dr. CC, Médico de Família do Autor há vários anos, e consequente Motivação da M.ma Juiz da 1ª instância, não nos parece minimamente sustentável precisamente pelo facto dos Srs. Peritos apenas terem estado um ÚNICA VEZ com o ora Recorrente, aquando da realização do respectivo exame médico, ao contrário do seu Médico de Família que o acompanha permanentemente ao longo dos anos (semanas e meses, como resulta dos vários documentos juntos aos autos) que, neste caso, já vão em mais de 6 anos ...

6.º - Por outro lado, é jurisprudência igualmente assente que uma das grandes limitações do tribunal de recurso, quando é chamado a pronunciar-se sobre uma impugnação de decisão relativa a matéria de facto, sobretudo quando tem que se debruçar sobre a valoração, efectuada na primeira instância, da prova testemunhal, tal julgamento é dificultado pela falta do contacto directo com essa prova, da ausência de oralidade e, particularmente, de imediação, constituindo já um "chavão" a velha máxima de que "não pode esquecer-se tudo aquilo que a imediação em 1.ª instância dá e o julgamento da Relação não permite".

7.º - Salvo melhor e douta opinião de Vossas Excelências, entendemos que essa ausência de oralidade e imediação, que não é suprida pela audição da gravação áudio, levou (mal) o tribunal "a quo" a optar pela prova pericial em detrimento da testemunhal

8.º - Neste sentido, seja-nos permitido fazer alusão ao douto acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 04.02.2014, proferido no processo n.º 982/10.4TYLSB.L1-1, cujo Sumário, Ponto III, reza assim: "Não (se) encontra razões bastantes para alterar a factualidade apurada pelo tribunal a quo se o Senhor Juiz do Tribunal a quo tiver feito a sua valoração da prova produzida, com apresentação da respectiva motivação de facto, na qual explicitou minuciosamente, não apenas os vários meios de prova (depoimentos testemunhais, Relatório pericial e documentos) que concorreram para a formação da sua convicção, como os critérios racionais que conduziram a que a sua convicção acerca dos diferentes factos controvertidos se tivesse formado em determinado sentido e não noutro, (sublinhado nosso)

9.º - Mutatis mutandis, salvo melhor e douta opinião de Vossas Excelências, idêntica situação ocorre nos presentes autos, porquanto a M.ma Juiz da 1ª instância justificou minuciosamente na Motivação da sentença os factores que contribuíram para a sua convicção e quais as razões que a determinaram a optar pelo depoimento do Médico de Família e demais prova testemunhal, em detrimento da prova pericial, como melhor resulta da referida Motivação, parcialmente supra transcrita e que aqui se dá como reproduzida.

10.º - De resto, importa ter-se presente que a livre apreciação da prova é indissociável da oralidade com que decorre o julgamento em primeira instância, pois como ensinava o Prof. Alberto do Reis, citando Chiovenda: "ao juiz que haja de julgar segundo o princípio da livre convicção é tão indispensável a oralidade, como o ar é necessário para respirar." - C.C. Anotado, vol. IV, págs. 566 e segs.

11.º - Ao optar pela prevalência da prova pericial em detrimento da prova pericial [quis escrever “testemunhal”], o tribunal "a quo" incorreu, de facto, num erro ostensivo na apreciação da prova, ignorando ou afrontando directamente as mais elementares regras da experiência, em termos de se poder dizer que existe uma flagrante desconformidade entre os elementos probatórios disponíveis e a decisão do tribunal recorrido sobre matéria de facto.

12.º. Pelo que a decisão recorrida violou o disposto no art. 607º, n.º5, do CPC, quanto à Matéria de Facto sob os n.º 1.129,1.130,1.134, 1.139, 1.168, 1.175 e 1.184.

13.º. Consequentemente, impõe-se a sua revogação e, em sua substituição, deve ficar a constar, nessa vertente, o que foi decidido na 1ª instância, sob o n.ºs 1.129, 1.130, 1.134, 1.139, 1.168, 1.175. e 1.184, tal como, nessa conformidade, o montante indemnizatório atribuído de 300.000 €uros.

14.º. Com efeito, o art. 674º, n.º 2 do CPC, permite tal alteração quando ocorre erro na apreciação das provas e na fixação da matéria de facto, com expressa ofensa do disposto no art.607º, n.º 5, do CPC, o que, in casu, se entende ocorrer - salvo melhor e douta opinião de Vossas Excelências - pois nela é atribuída valor "absoluto" à prova pericial, em detrimento da demais prova, designadamente testemunhal, com manifesto reflexo na decisão que ora se impugna.

15.º - Sem prescindir, e para o caso de ser julgado improcedente o supra peticionado - o que se não concebe, nem concede - impugna-se igualmente a indemnização arbitrada no acórdão recorrido, de 140.000 €uros, do qual há a descontar-se as quantias pagas pela Ré ao Autor, a título de salários perdidos depois de 31.12.2012 que, na data de 31.12.2016, ascendem ao montante de 72.000 €uros (1.500 €/mês x 48 meses), uma vez que é manifestamente baixa, injusta e inadequada à situação factual dos autos.

16.º. Na verdade, na modesta opinião do Recorrente, face à factualidade dada como provada pelo tribunal recorrido, aquele montante de 140.000,00 €uros configura uma indemnização profundamente desadequada e injusta para a devida compensação que se pretende alcançar de forma judicial, tanto mais que, auferindo o Recorrente, à data do acidente, em França, o salário mensal de 1.753,77 €uros - Facto Provado sob o n.º 1.81. - por conta do qual recebia da Recorrida a quantia mensal de 1.500 €uros - ao ser-lhe descontado, como ordena a decisão recorrida, as prestações pagas desde 31.12.2012 até ao momento actual - que ascendem, nesta data, a 72.000,00 €uros (1.500 € x 48 meses) - apenas receberia, de modo efectivo, a título de indemnização pela IPG de 29 Pontos, que lhe exige esforços suplementares para o trabalho, como decorre da alteração da Matéria de Facto, apesar de, à data do acidente, ter somente 41 anos de idade - Facto Provado sob o n.º1.177. - o montante de 68.000,00 €uros!

17.º. Ora, receber agora 68.000 €uros apenas para o compensar de tão penosas sequelas para o trabalho, que lhe determinaram uma IPG de 29 Pontos, com esforços suplementares e em idade tão jovem, traduz uma profunda injustiça!

18.º - Como também já se escreveu no douto Acórdão deste Venerando Tribunal de 23 de Setembro de 2008 (www.dgsi.pt, proc. nº 07B2469):

"Baseando-se em mera culpa a responsabilidade em que incorreu o causador do acidente e estando agora em causa a determinação do montante a pagar para ressarcimento de danos futuros, como, aliás, o Supremo Tribunal de Justiça tem repetidamente afirmado (cfr., a título de exemplo, os acórdãos de 28 de Outubro de 1999, proc. nº 99B717, de 2 de Fevereiro de 2002, proc. nº 01B985, de 25 de Junho de 2002, proc. nº 02A1321, de 27 de Novembro de 2003, proc. nº 03B3064, de 15 de Janeiro de 2004, proc. nº 03B926, de 8 de Março de 2007, proc. nº 06B4320 ou de 14 de Fevereiro de 2008, proc. º 07B508, disponíveis em www.dgsi.pt), a equidade desempenha um papel corrector e de adequação da indemnização decretada às circunstâncias do caso..."

19.º. Em face do exposto e tendo em conta a taxa de juro actual líquida inferior a 0.3% (CGD), a fixação da IPG de 29 Pontos, os esforços suplementares no desempenho da sua profissão de pedreiro da construção civil, a idade provável de vida do sinistrado, o qual, à data do acidente, tinha 41 anos de idade (nasceu em 16.08.1968) e que tais lesões o acompanharão até ao termo da sua existência, a circunstância de, à data do acidente, estar emigrado em F..., onde auferia o salário mensal de 1.753.77 €uros (Facto 1.178), a necessidade de tomar medicação, tal como a claudicação de marcha, dever-lhe-á ser atribuído, na nossa modesta opinião, uma indemnização não inferior a 250.000,00 €uros.

20.º. Entendemos, salvo melhor e douta opinião de Vossas Excelências, que é este o valor justo e adequado a atribuir a título de indemnização pela IPG em causa nos autos e não o que o Tribunal da Relação atribuiu, por manifestamente baixo e não indemnizar, com equidade, os danos patrimoniais sofridos pelo Recorrente.

21.º. De resto, o montante atribuído NÃO CONTEMPLA devidamente os ESFORÇOS SUPLEMENTARES que o Recorrente tem que suportar para poder trabalhar - se conseguir - aliada à circunstância de que o mesmo PADECE (de acordo com o Factos Provados pelo Tribunal da Relação): 1.139. As limitações físicas descritas e o défice funcional permanente da integridade física pela perícia médico-legal fixado em 29 pontos em razão das sequelas de que o autor ficou portador são compatíveis com o exercício da sua referida profissão, mas implicam esforços suplementares acrescidos, designadamente para, no exercício dela, levantar objectos pesados, para se baixar ou para se ajoelhar.

22.º. A este propósito, se nos é permitido, tenha-se presente o sábio ensinamento do Senhor Conselheiro Lopes do Rego: "... para quem não está irremediavelmente afastado do ciclo laboral, a perda relevante de capacidades funcionais - embora não imediatamente reflectida nos rendimentos salariais auferidos na profissão exercida - constitui uma verdadeira «capitis deminutio» do lesado num mercado laboral em permanente mutação e turbulência, condicionando-lhe, de forma relevante e substancial, as possibilidades de mudança ou reconversão de emprego e o leque de oportunidades profissionais à sua disposição, constituindo, deste modo, fonte actual de possíveis e futuros lucros   cessantes, a compensar como verdadeiros danos patrimoniais." Acórdão STJ de 20.05.2010

23.º. Deste modo, os valores atribuídos pelo acórdão recorrido não traduzem uma reparação justa, equilibrada, ponderada e com sentido de equidade ao Recorrente.

24.º. Entendemos que a justa indemnização para os danos patrimoniais em causa devem ser quantificada em montante não inferior a 250.000,00 €uros, ao qual deverão ser descontadas as prestações mensais de 1.500 €uros pagas desde 01.01.2013, até à data em que tais pagamentos cessarem.

25.º - Ao decidir de modo diverso, o tribunal recorrido violou o disposto nos art.496º, 562º e 564º, todos do Código Civil.

26.º - Pelo que deve o acórdão recorrido ser revogado e substituído por outro, nessa parte, que arbitre ao Recorrente a indemnização supra peticionada.


      A Recorrida contra-alegou, formulando as seguintes conclusões:

A - O recurso interposto pelo recorrente na parte em que defende a alteração da matéria de facto fixada pelo Tribunal recorrido, não é amissível.

B - Não se encontra alegada e muito menos demonstrada qualquer ofensa de uma disposição expressa da lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova, pelo que, nos termos do disposto no art.º 674.º, n.º 5 [nº 3], o recurso de revista é inadmissível.

C - A indemnização fixada a título de dano patrimonial, pelo Tribunal recorrido é adequada a indemnizar o recorrente por todos os danos a esse título sofridos e mostra-se perfeitamente conforme à equidade e ao Direito.

D - Deve o recurso interposto ser julgado não provado e improcedente.

E - O acórdão recorrido deve ser integralmente mantido, pois está elaborado de acordo com a prova produzida e corresponde à melhor e mais correcta aplicação do Direito, sem violação de qualquer dispositivo legal.


3. Invoca a Recorrida não ser o presente recurso admissível na parte em que defende a alteração da matéria de facto fixada pelo acórdão recorrido por não se encontrar alegada qualquer ofensa de uma disposição expressa da lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova (cfr. art. 674º, nº 3, do Código de Processo Civil).

    Não tem razão. Por um lado, porque o Recorrente invoca efectivamente (conclusões 12ª e 14ª) violação de norma processual, em concreto da norma do art. 607º, nº 5, do CPC. Por outro lado, porque se entende que os pressupostos do recurso de revista se encontram previstos no art. 671º do CPC, cuja falta determina a não admissibilidade do recurso, enquanto no art. 674º do CPC se delimita o objecto da revista, cuja não verificação, a ser evidente, determina antes a decisão de manifesta improcedência do recurso.

    Assim, o presente recurso é admissível, incluindo na parte relativa à decisão da matéria de facto, ainda que, eventualmente, se venha a concluir pela sua manifesta improcedência.


4. Vem provado o seguinte (mantém-se a identificação da Relação):

1.1. No dia 29 de Agosto de 2009, pelas 16 horas e 45 minutos, o motociclo com a matrícula …-BZ-…, propriedade do A. e por si conduzido, circulava pela Estrada Nacional n.º202, no sentido Viana do Castelo – Ponte de Lima, o que fazia pela sua mão de trânsito e a baixa velocidade - inferior a 40 Km/h – observando todas as regras do direito estradal.

1.2. Ao Km 4,4 daquela Estrada Nacional n.º202, na freguesia de Santa Marta de Portuzelo, nesta comarca, existe uma rua que, de forma perpendicular, entronca nesta Estrada Nacional n.º202, a qual provém do interior daquela freguesia, mais propriamente do lugar de ... e de F....

1.3. Para quem circula na Estrada Nacional n.º202, no sentido de marcha Viana do Castelo – Ponte de Lima, como era o caso do motociclo BZ, a citada rua fica à sua direita.

1.4. No entroncamento formado pela referida rua interior e a E.N. 202, mais concretamente, no termo daquela, na confluência com esta, existe o sinal vertical n.º53 de paragem obrigatória, denominado STOP.

1.5. Nesse dia e hora, pela citada rua interior circulava no sentido Sul – Norte, ou seja, em direcção à Estrada Nacional 202, o veículo ligeiro de mercadorias com a matrícula …- GC-…, propriedade da empresa DD - Engenharia e Construções, Lda. e conduzido por EE.

1.6. Sucede que o condutor do GC, ao chegar ao entroncamento formado pela rua interior por onde circulava, com a E.N. 202, não imobilizou a sua viatura no termo da mesma, como estava obrigado em obediência ao sinal Stop aí existente.

1.7. Pelo que transpôs, com a dianteira do GC, o passeio que separa a E.N. 202 da rua interior donde provinha.

1.8. Nesse preciso momento e local, circulava em frente ao aludido entroncamento, pela sua hemi-faixa de rodagem, atento o sentido Viana do Castelo – Ponte de Lima, o motociclo BZ.

1.9. Pelo que, face à circulação de ambas as viaturas pela forma acima descrita, isto é, com o GC a sair da rua interior para a E.N. 202, sem imobilizar a sua viatura no termo da mesma, e com o motociclo a surgir do lado esquerdo do GC, atento o sentido Viana - Ponte de Lima, acabaram ambas as viaturas por colidir violentamente.

1.10. Já que, dada a forma inopinada como surgiu naquele entroncamento, a viatura GC foi embater com a sua frente, na parte lateral direita do motociclo BZ, mais concretamente na zona do motor.

1.11. E sensivelmente no eixo da via que divide as hemi-faixas de rodagem na Estrada Nacional 202.

1.12. O condutor do veículo GC conduzia-o sob as ordens, direcção e interesse da sua proprietária, DD – Engenharia e Construções, L.ª.

1.13. À data do acidente, o A. tinha 41 anos de idade, pois nasceu em 16.08.1968.

1.14. O Autor reclamou da R. o pagamento do valor igual ao que recebia mensalmente a título de salário em F....

1.15. A ré aceitou.

1.16. Assim, em 2009, a R. pagou ao A. a quantia de 7.015,08 €uros referente ao salário dos meses de Setembro, Outubro, Novembro e Dezembro do ano de 2009.

1.17. O mesmo sucedendo em 2010, quanto aos meses de Janeiro, Fevereiro, Março, Abril, Maio, Junho, Julho, Agosto, Setembro, Outubro, Novembro e Dezembro do ano de 2010 no montante de 21.045,24 €uros.

1.18. No dia 1110/2010, o A., por intermédio do seu Advogado, remeteu à ora Ré a comunicação constante de fls. 121 e 122 dos autos, cujo teor se dá aqui por reproduzido para os devidos efeitos legais, através da qual interpelava a Ré para a regularização da situação da sua viatura de matrícula francesa.

1.19. Tendo a Ré respondido nos termos da comunicação constante igualmente de fls. 121, informando o A. que a legalização da sua viatura estaria isenta de imposto ao abrigo do disposto no artigo 58º e ss do Código do Imposto sobre Veículos.

1.20. A Ré informou o A. que não assumia as despesas inerentes ao processo de legalização dessa viatura em território nacional.

1.21. A esposa do A., FF, também ficou afectada no seu estado de saúde com o supra descrito acidente, cujo processo se encontra a correr termos neste Tribunal com o nº 130711.3TBVCT do 4º Juízo Cível, sendo que a mesma padece das lesões que se mostram plasmadas no relatório médico-legal junto como doc. 84 com a p.i.

1.22. A responsabilidade civil emergente de acidente de viação com a circulação do veículo ...-GC-... encontrava-se transferida, na data do acidente, para companhia de seguros, ora Ré, mediante contrato de seguro, válido e eficaz, titulado pela apólice nº 010….

1.23. Face ao embate no motociclo que conduzia, o A. foi projectado para a hemi-faixa de rodagem oposta a que seguia e a uma distância de 3 metros do ponto de embate, de rastos.

1.24. Dessa queda adveio para o A., como consequência directa, necessária e imediata do referido acidente, as seguintes lesões: fractura exposta da diáfise do fémur direito; fractura dos ossos da perna direita; fractura conminutiva do hallux direito; esfacelo do halux direito; edemas e muitas escoriações.

1.25. De imediato foi transportado de ambulância para o Hospital Distrital de V…, actualmente designado por U… – Unidade Local de Saúde ..., tendo logo aí ficado internado no Serviço de Ortopedia, para ser submetido a uma intervenção cirúrgica ao fémur e tíbia da perna direita e à fractura e esfacelo do halux direito, que ocorreu no dia 29.08.2009, com “encavilhamento”.

1.26. Teve “alta clínica” no dia 16.09.2009, mas com a perna direita envolvida em ligaduras, e com a obrigação de realizar tratamento de substituição de “pensos” duas vezes por semana, com a indicação expressa para permanecer deitado no leito.

1.27. E quando dele se levantasse, para utilizar somente a cadeira de rodas que foi obrigado, então a adquirir.

1.28. Sendo que o A. andou de cadeira de rodas durante 6 meses consecutivos por prescrição médica, ou seja, até finais de Março de 2010.

1.29. Entre os dias 16.09.2009 e 05.10.2009, o A. submeteu-se ao tratamento e substituição de pensos nos termos constantes da denominada “folha de tratamento”.

1.30. Quando teve “alta clínica”, o A. viu-se obrigado a ter que ir residir para a casa de seus pais, também na freguesia de ..., nesta comarca – e não para a sua, sita na mesma freguesia.

1.31. Sendo que o A. e a sua esposa permaneceram na casa de seus pais durante 4 meses, por estarem totalmente dependente da ajuda de terceiros e não terem outras pessoas com disponibilidade que os pudessem ajudar que não os pais daquele.

1.32. No dia 30 de Setembro de 2009, o A. voltou a ser internado no U… para ser submetido a cirurgia plástica ao pé direito, uma vez que teve necessidade de reconstrução plástica do borde medial do pé e hallux à direita, pelo facto de ter ocorrido “necrose dos tecidos moles no pé e hallux direitos”, cuja intervenção ocorreu no dia 02.10.2009.

1.33. Realizando, concretamente, “plastia com enxerto de pele após remoção de material de osteossíntese do 1º raio” e reconstrução do bordo medial e hallux.

1.34. Permaneceu lá durante 9 dias, tendo “alta” clínica ao 7º dia após esta cirurgia, mas com necessidade de cuidados de penso e de seguimento em consulta externa de Cirurgia Plástica.

1.35. Sendo que, nessa data, o A. apresentava ainda “edema muito acentuado do pé e dificuldade em mobilizá-lo”, com indicação de Ortopedia para “não fazer carga sobre o pé.

1.36. A partir de 22.10.2009, foi prescrito ao A. o uso contínuo de “meia branca” de compressão durante o dia e “meia castanha” sobre a branca.

1.37. Nessa data, o A. mantinha “pequena região cruenta na área de carga na face plantar do pé direito”, com necessidade de “evitar carga nessa área e de realizar penso 2 vezes por semana”.

1.38. No dia 22.10.2009, o A. teve de se deslocar à U… para estar presente, como esteve, na consulta de Cirurgia Plástica.

1.39. No dia 22.10.2009, o A. estava a ser medicado nos termos constantes do Relatório do Médico de Família, junto a fls. 54 (doc.14 com a p.i.), e cujo conteúdo se dá aqui reproduzido.

1.40. No dia 23.10.2009, o médico ortopedista que tratava do A., Sr. Dr. GG, ordenou que ele iniciasse recuperação funcional da perna direita.

1.41. No dia 04.11.2009, o A. foi observado em consulta de Fisiatria na U… e orientado para tratamentos de fisiatria.

1.42. No dia 12.11.2009, o A. iniciou a sua reabilitação física com recurso a fisioterapia na U….

1.43. Nessa data, o A. apresentava: “edema e empastamento do pé direito”; “ rigidez do hallux direito”; “rigidez da tíbio- társica e do joelho direito”; “amiotrofia do MID”; “fazia marcha com 2 canadianas com dor mecânica”.

1.44. No dia 17.11.2009, o A. teve necessidade de ser submetido a tratamento cirúrgico pelo Serviço de Enfermagem.

1.45. À data de 03.12.2009, o A. tomava a medicação constante do Relatório do Médico de Família.

1.46. No dia 03.12.2009, o A. reiniciou tratamento de enfermagem e substituição de pensos, 2 vezes por semana, nos termos constantes do Boletim de Enfermagem que se prolongaram até 03.03.2010.

1.47. No dia 8/1/2010, após observação médica foi constatado que “ as fracturas estavam em fase de consolidação, enxerto de pele está bem, (mas) o paciente (ora A.) marcha com claudicação e com apoio de canadiana, necessitando de continuar a realizar fisioterapia para fortalecimento muscular da coxa e perna direita”.

1.48. Por outro lado, o A. foi convocado no dia 10.03.2010 pela U… para estar presente em consulta de cirurgia plástica.

1.49. Em Março de 2010, o Serviço de Ortopedia da U… diagnosticou ao A.“atraso da consolidação da fractura do fémur e falência do material de OS.

1.50. Nessa data, propôs-lhe “tratamento cirúrgico”, sendo que para tal fim, o A. foi internado na U… no dia 11.07.2010 para cirurgia por pseudartorse.

1.51. No dia 17.07.2010, o A. teve “alta” dos tratamentos cirúrgicos.

1.52. Mas manteve: rigidez do hallux e com supuração pela cicatriz; deficit dos eversores da tíbio-társica; joelho direito com amplitudes conservadas; atrofia da coxa.

1.53. Sendo que, até essa data, o A. mantinha marcha com 2 canadianas.

1.54. Acresce que o A. fez fisioterapia na U… de forma diária e permanente até ao dia 16.06.2010, ou seja, durante 7 meses consecutivos, sendo que em Abril de 2010 deixou de utilizar a cadeira de rodas para passar a utilizar duas canadianas, que utilizou diária e permanentemente até à data da instauração da presente acção e assim continuará por tempo indeterminado. [ ]

1.55. No dia 11.07.2010, o A. foi internado na U… para ser submetido a nova intervenção cirúrgica, com diagnóstico de: pseudartrose do fémur direito; atraso de consolidação da tíbia direita; calosidade por fragmento ósseo no hallux direito.

1.56. Nessa cirurgia o A. foi submetido a: enxerto ósseo retirado da crista ilíaca; substituição de 2 parafusos no fémur; extracção do parafuso da tíbia; exerese de fragmentos ósseos no hallux, que ocorreu no dia 12.07.2010.

1.57. Tendo lá o A. permanecido durante 5 dias, dado que lhe foi concedido “alta” clínica em 17.07.2010.

1.58. O Autor regressou a sua casa, continuando apenas a deslocar-se mediante a utilização de duas canadianas, regresso esse com a obrigação de efectuar tratamentos de enfermagem e substituição de pensos de 3 em 3 dias, com remoção do material de sutura em 29.07.2010.

1.59. Sendo que entre o dia 19.07.2010 a 08.09.2010, o A. realizou os tratamentos de enfermagem.

1.60. Tendo-se deslocado da sua residência à Policlínica HH, Lda., para tal fim, nas datas seguintes: Agosto de 2010: 2, 4, 6, 8, 10, 12, 14, 16, 18, 20, 21, 23, 25, 27, 30; Setembro de 2010: 1, 3, 6 e 8.

1.61. No dia 10.09.2010, o A. foi, uma vez mais, presente a consulta de Ortopedia na U….

1.62. No dia 13.09.2010, o A. retomou a fisioterapia na U…, o que fez de forma diária e permanente em todos os dias úteis até 26.01.2011, data em que terminou a realização da fisioterapia na U….

1.63. Entre os dias 11.02.2011 e 24.02.2011, o A. sofreu uma lesão em cima do enxerto ósseo, que o obrigou a tratamento cirúrgico.

1.64. O Autor retomou a fisioterapia, por indicação dos Serviços Médicos da Ré, no dia 18.02.2011 no Centro Médico denominado II, em Viana do Castelo, que fez diária e consecutivamente em todos os dias úteis até 20.05.2011, data em que a suspendeu durante cerca de 2 meses, pois no dia 25.07.2011 reiniciou a fisioterapia na U…, o que fez diária e consecutivamente até ao dia 05.09.2011, altura em que a suspendeu, por indicação médica.

1.65. No entanto, retomou-a, por não apresentar melhoras do seu estado físico, no dia 04.10.2011, tendo-a terminado em 06.12.2011 por prescrição médica, uma vez que o seu médico ortopedista entendeu que o A. deveria ser submetido a nova intervenção cirúrgica para efectuar a extracção de material do fémur e tíbia e ainda para fixação do hallux.

1.66. Razão pela qual no dia 29.01.2012 deu entrada na U… para tal fim, tendo sido operado em 30.01.2012, e tido “alta clínica no dia 02.02.2012.

1.67. Porém, no dia 04.02.2012 o A. foi novamente internado na U… pelo facto de ter contraído uma infecção no pé direito, uma vez que sentia dor acentuada no tornozelo e pé direito e ainda edema, o que determinou que lá tivesse permanecido internado durante 17 dias. Uma vez que apenas teve “alta” clínica no dia 21.02.2012.

1.68. Por causa da referida infecção, o A. teve necessidade de se deslocar da sua residência à Policlínica HH, Lda., para efectuar tratamentos de enfermagem, nas datas seguintes: Fevereiro de 2012: 23, 25, 27, 28, 29; Março de 2012: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 11, 13, 28; Abril de 2012:15, 17, 22, 26, 29; Maio: 2, 7,10, 13, 15, 17, 21, 25, 28; Junho: 4, 7, 10, 13, 15, 18, e 22.

1.69. Para além de, também nessa altura, realizar tratamentos de enfermagem na U… nas datas seguintes: 23.02.2012, 30.03.2012, 02.04.2012, 05.04.2012, 10.04.2012, 13.04.2012, 20.04.2012.

1.70. Pelo que no dia 15.03.2012, o A. foi submetido a nova cirurgia na U… para enxerto de pele no Hallux direito.

1.71. Tendo tido necessidade de se apresentar no dia 23.03.2012 na Consulta Externa da U….

1.72. De resto, no dia 01.03.2012, o A. apresentava na Consulta Ortopédica da U… as seguintes limitações físicas: joelho direito globoso; ligeiro derrame; rigidez articular (0-45); atrofia da coxa; claudicação na marcha, tendo sido “orientado para tratamentos de fisioterapia” na U….

1.73. O que determinou que no dia 06.03.2012 reiniciasse todas as terças e quinta-feira as sessões de fisioterapia na U….

1.74. Continuando, à data da instauração da presente acção, com a sua frequência de 2 dias por semana e por tempo ainda indeterminado.

1.75. Por causa da relatada infecção que sofreu no pé direito, o A. teve necessidade de realizar tratamento ambulatório na Policlínica HH, nesta cidade, nos dias 23.02.2012, 28.03.2012, 15.04.2012, 25.04.2012 e 04.06.2012.

1.76. O A. obteve consolidação médico-legal das lesões no dia 31/12/2012.

1.77. Tendo necessidade de realizar tratamentos médicos regulares para evitar retrocesso ou agravamento das sequelas, concretamente consultas regulares de ortopedia, psiquiatria e Medicina Física de Reabilitação.

1.78. À data da instauração da presente acção, o A. ainda não se encontrava clinicamente curado, uma vez que: “apresenta como antecedentes clínicos fractura da dáfise do fémur direito e tíbia direita para além de múltiplas escoriações e feridas cortantes e abrasivas que foram resultantes de acidente de viação sofrido em 29.08.2009. À data e após seguimento em consulta de ortopedia no …, que ainda se mantém, há que referir a realização de cinco intervenções cirúrgicas de modo a corrigir as facturas. Teve um tempo de evolução demorado dado o não crescimento dos topos ósseos. Acessoriamente, desenvolveu quadro depressivo reactivo que ainda se encontra em fase de tratamento. Do ponto de vista funcional, apresenta défice de locomoção ligeiro a moderado, necessitando da utilização de ortótese (vulgo canadianas) de modo a conseguir deslocar-se pelos seus próprios meios sem ajuda de terceiros. Clinicamente ainda não se encontra curado dado que apresenta dor crónica ao nível do membro inferior direito que consegue controlar na esmagadora maioria das vezes com recurso a medicação, pelo que apresenta um carácter imprescindível e dificuldade na locomoção e em todas as tarefas de vida diária em que a deslocação livre seja necessária.”.

1.79. O A., antes do presente acidente, não sofria de qualquer tipo de lesão ou limitação física, sendo uma pessoa totalmente saudável, cheia de força e pujança.

1.80. À data do acidente, o A. era emigrante em F..., país para onde emigrou no ano de 1991.

1.81. Em F..., o A. exerce a actividade profissional de “...”, ou seja, ..., auferindo 1.753,77 €uros/ mês.

1.82. Acontece que, por causa do relatado acidente, o A. viu-se impedido de regressar a F..., tendo ficado retido em Portugal desde o acidente, até esta data, para se curar das lesões que do mesmo advieram.

1.83. Sendo que ainda claudica a marcha.

1.84. Aquando do acidente, o A. teve necessidade de participar o ocorrido à Segurança Social de França, bem como à sua entidade patronal, a Empresa … BTP, com sede em 9, Rue …, 92… V.. D´Avray, França.

1.85. O A. encontra-se de “baixa médica” concedida pela Administração Regional de Saúde de V... desde o dia do acidente – 29.08.2009 – até à data da instauração da presente acção.

1.86. O A. suportou as seguintes despesas, em consequência do acidente de viação, não reembolsadas até à data pela Ré: A) notificações para a Entidade Patronal em França: 29 cartas registadas para a Empresa … BTP, a dar conhecimento da sua situação física, nas quais despendeu o montante total de 154,82 €uros, cujo reembolso reclama; B) – Fotocópias de documentação: o Autor despendeu a quantia de 53,12 €uros em fotocópias dos documentos entregues à própria Ré, em sede extrajudicial; C) aluguer de Cadeira de Rodas e Aquisição de Luvas 25 €uros + 22,90 €uros.

1.87. Por causa do acidente de que foi vítima, o A. ficou com os seguintes objectos danificados e, consequentemente, inutilizados, a saber: - um capacete, no valor de 270 €euros; uma camisola, um par de calças, um par de sapatos, uma camisola, um saco tira-colo, de valores não concretamente apurados.

1.88. À data do acidente o Autor era proprietário da viatura com a matrícula francesa … FXR 92, marca Volkswagen, Modelo Touron, fabricada no ano de 2004.

1.89. Uma vez que a adquiriu no Stand D…. P.., sito em 42 R… P… E…, 93… Saint Denis, França, totalmente nova e em 1ª mão.

1.90. Após o acidente, e em consequência do mesmo, o A. tinha duas alternativas para a resolução da situação em que se encontra aquela viatura em Portugal: ou a legalizava no nosso país, cujo montante de impostos, segundo então apurou, rondavam entre 9.000 e 10.000 €uros; ou a reenviava para França e aí procedia à sua venda, uma vez que se encontrava, então, como agora, impossibilitado de a conduzir durante largo período de tempo, sendo que a sua imobilização a faria perder valor comercial.

1.91. O A. não conseguiu obter a isenção no termos referidos supra em 1.19. da MFA.

1.92. Por outro lado, o A. viu-se impossibilitado de a reenviar para França e aí proceder à sua venda, uma vez que estava a residir em Portugal há mais de 1 ano, havia entregue a sua casa de habitação em França ao senhorio, nem dispunha de comprovativos de aí residir, tais como facturas em seu nome do consumo de água, de energia eléctrica, etc.

1.93. Pelo que o A. decidiu proceder à sua legalização em Portugal, no que despendeu o montante de 5.349,83 €uros, nos termos constantes do documento n.º 75 junto com a p.i., tendo em conta o ano de fabrico e a respectiva cilindrada.

1.94. O Autor não dispunha dessa quantia, tendo contraído para o efeito um crédito pessoal, conjuntamente com a sua então esposa FF, na Caixa Geral de Depósitos no montante de 5.000 €uros (3.000€ + 2.000 €, pelo prazo de 24 meses, reembolsável em prestações mensais, iguais e sucessivas de 142,42 €uros cada as 10 primeiras, e as demais 16 no montante de 141,28 €uros.

1.95. Assim, obtido o empréstimo de 5.000 €uros, emitiu o cheque visado no montante de 5.349,83 €uros a favor da I.G.T.C.P – I.P..

1.96. Sendo que despendeu ainda a quantia de 30 €uros a visar aquele cheque.

1.97. Para além disso, o A. teve necessidade de despender a quantia de 45,00 €uros no Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, I.P., com vista à atribuição de matrícula nacional.

1.98. Acresce que, por causa dessa legalização o A. teve necessidade ainda de despender mais 50 €uros no pagamento do Registo de Propriedade a seu favor, em Portugal, na Conservatória do Registo Automóvel e ainda 25 €uros pela aquisição da respectiva chapa de matrícula com identificação nacional.

1.99. O A. teve também necessidade de submeter a inspecção técnica aquela viatura, antes da atribuição de matrícula nacional, por imposição legal, onde despendeu a quantia de 70,34 €uros.

1.100. O descrito acidente originou fortes e insuportáveis dores ao Autor.

1.101. A utilização de cadeiras de rodas durante 6 meses deixou o A. profundamente condicionado na sua movimentação, o que lhe causou exasperação fácil e inconformismo perante tal realidade, que o deixavam triste e aborrecido.

1.102. Por outro lado, a necessidade do A. ter que utilizar 2 canadianas para se movimentar em casa e na rua há já cerca de 3 anos, igualmente o deixam abalado e transtornado, pois que lhe exigem maior esforço físico para se locomover, obriga-o a andar em ritmo lento.

1.103. Com o calor, causam-lhe transpiração e cansaço.

1.104. Com o tempo de chuva, não pode sair de casa, pois não consegue segurar no guarda-chuva para se abrigar.

1.105. Estes factos causam-lhe também irritação fácil, aborrecimentos e profunda angústia por não saber quando vai deixar de utilizar as 2 canadianas e ser um homem normal como era antes do acidente.

1.106. O facto de ter tido necessidade de solicitar apoio aos seus pais, em cuja casa residiu durante 4 meses, afectou muito o A. em termos psíquicos e o aborreceu pelo facto dos seus pais serem já pessoas muito idosas, com cerca de 80 anos de idade, e lhes ter ido perturbar o seu modo repousante de vida e alterar-lhes, como alterou, as suas rotinas diárias.

1.107. Desde o acidente, até à data da propositura da acção o A. não pode lidar com as tarefas domésticas, já que não tem autonomia para as realizar.

1.108. O Autor e a sua esposa, até à data do divórcio, viviam sozinhos, o que os obrigava, com o seu descrito estado de saúde, a ter de socorrerem-se da ajuda de terceiros, sejam familiares e/ou vizinhos, o que os aborrece por terem de ficar a “dever-lhes” favores ou mesmo pelo facto de terem que lhes pagar o tempo por eles “perdido”, seja em dinheiro ou através da compra de “presentes”.

1.109. Para confeccionar as refeições, tratar da roupa, arrumar a casa, fazer compras, etc., o A. tem de socorrer-se de pessoas amigas e familiares.

1.110. Por outro lado, por causa do relatado acidente, o A. teve e tem necessidade de recuperação funcional do membro inferior direito através de fisioterapia, principalmente na U… e também na Policlínica HH, Lda.

1.111. Assim, para além das dores que sofre pelo seu estado de saúde, o A. teve e tem que esperar diariamente, ao longo de mais de 24 meses, pela sua vez de tratamento.

1.112. O que o deixava e deixa profundamente perturbado e ansioso

1.113. Para além de que tinha e tem de sair de casa, em P..., a cerca de 7 km de distância da cidade de V... e onde se localiza a U… e a Policlínica, L.ª, em condições adversas, não só pelo uso de canadianas, mas também sujeitando-se às agruras do tempo e à espera do táxi

1.114. Os factos descritos causaram-lhe e causam-lhe tristeza, exasperação, angústia e stress.

1.115. O A. tem um filho, o qual, a data da instauração da acção, tinha 20 anos, e estudava em F..., de seu nome JJ, que após o acidente teve que regressar e ir viver para casa de familiares, dado não ter ninguém em sua casa para dele cuidar.

1.116. Este facto “mexeu” profundamente com o A., que nunca tinha tido o seu filho ausente de si.

1.117. Também muito afectou psiquicamente o A. o facto de ter que restituir a sua casa de habitação em F..., pela circunstância de não poder suportar o custo da renda mensal, permanecendo em Portugal, e não conseguir durante todo este tempo obter emprego compatível para fazer face aos encargos em França.

1.118. Depois do acidente jamais o A. recuperou a estabilidade emocional que antes era portador.

1.119. Chorou e chora frequentemente por causa de tudo o que lhe aconteceu e por ver que a sua vida física está condicionada às lesões de que é portador.

1.120. Desde o acidente que nunca mais estabilizou o sono, tendo muita dificuldade em adormecer e não consegue agora dormir mais de 4 a 5 horas.

1.121. Estes factos deixam-no muito exasperado e até revoltado com o que lhe aconteceu.

1.122. Acresce ainda que, por causa do acidente, a A. teve que recorrer várias vezes ao seu médico assistente, quer por questões do foro psíquico, quer físico.

1.123. Desde o acidente que o A. passou a ser medicado com tranquilizantes, o que antes não sucedia.

1.124. O A., antes deste acidente, era uma pessoa totalmente cheia de saúde e sem qualquer lesão e/ou limitação física.

1.125. Após o acidente tornou-se numa pessoa triste, apagada, sem alegria de viver e apática.

1.126. Sente-se profundamente desgostoso por não poder voltar a trabalhar como antes do acidente o fazia.

1.127. Temendo pelo seu futuro profissional em F... ou em qualquer outro país, já que na sua profissão de trolha na construção civil está sujeito a vários trabalhos que lhe exigem força e pujança física, que agora não tem.

1.128. O A. obteve a consolidação médico-legal das lesões no dia 31.12.2012; sofreu um período de Défice Funcional Temporário Total de 133 dias; um período de Défice Funcional Temporário Parcial de 1365 dias; um período de repercussão temporária na actividade profissional total de 1498 dias e a final ficou a padecer de um défice funcional permanente da integridade física de 29 pontos.

1.129. Desde a data do acidente (29-08-2009) até à data em que lhe foi, pela peritagem, fixada a consolidação médico-legal das lesões (31-12-2012), o autor, em consequência das lesões naquele sofridas e respectivas sequelas físicas e psíquicas de que ficou a padecer, esteve totalmente incapacitado para o trabalho. A partir de então, tais sequelas, em termos de repercussão permanente na actividade profissional, são compatíveis com o exercício da sua referida profissão, mas implicam esforços suplementares. (alterado pela Relação)

1.130. Não obstante a avaliação médico-legal referida em 1.129, desde a data do acidente e continuadamente, o seu Médico de Família do Centro de Saúde de S... de P... (Administração Regional de Saúde de Viana do Castelo) onde é assistido, tem-lhe dado “baixa médica”, passando-lhe os respectivos Certificados de Incapacidade para o Trabalho. (alterado pela Relação)

1.131. Do acidente resultaram para o Autor fracturas diafisárias do fémur e tíbia direitas, para além de feridas incisas e escoriações várias noutras partes do corpo.

1.132. A fractura tibial direita consolidou dentro dos prazos previstos, mas, infelizmente, a fractura da diáfise femural teve atraso da recuperação por não crescimento dos topos ósseos.

1.133. Por tal motivo, acabou o A. por ter necessidade de se submeter a várias intervenções cirúrgicas de carácter ortopédico para estabilização óssea e para correcção de parafuso ortopédico de estabilização com implantação deficitária.

1.134. Como resultado das lesões e sequelas descritas, o autor teve de usar, para caminhar sozinho, duas canadianas, ficando impedido de exercer a sua actividade profissional nos termos de 1.128 e 1.129. (alterado pela Relação)

1.135. Após este longo período, verifica-se que do ponto de vista funcional o A. apresenta claudicação da marcha, cuja instabilidade não lhe permite ter a mobilidade anterior ao acidente, mesmo após tratamento intensivo de fisioterapia a que se submeteu.

1.136. Das lesões resultaram ainda queixas álgicas com carácter recorrente e permanente.

1.137. Actualmente o agravamento das dores são na maioria das vezes controladas com recurso a analgesia administrada por via oral, mas continua a verificar-se a necessidade de ser portador de analgésicos para possibilitar o debelar do sofrimento.

1.138. São também aparentes pequenos défices neuro-sensitivos referentes ao membro inferior direito que constituam factor de limitação da qualidade de vida do A., sendo minimizado porque recorre à medicação instituída de caracter crónico e permanente.

1.139. As limitações físicas descritas e o défice funcional permanente da integridade física pela perícia médico-legal fixado em 29 pontos em razão das sequelas de que o autor ficou portador são compatíveis com o exercício da sua referida profissão, mas implicam esforços suplementares acrescidos, designadamente para, no exercício dela, levantar objectos pesados, para se baixar ou para se ajoelhar.

1.140. Em consequência do acidente o A. ficou a padecer, a nível psiquiátrico de uma perturbação persistente de humor com repercussão moderada na autonomia pessoal, social e profissional, nas actividades da vida diária, relevando para o défice funcional permanente referido em 1.128. em 14 pontos, necessitando de tratamento e acompanhamento em consulta de psiquiatria de periodicidade trimestral.

1.141. Este quadro clínico motivou o seu acompanhamento por psiquiatria, assim como períodos de internamento de psiquiatria, quer no Centro Hospitalar do A... quer no Hospital Psiquiátrico de … em B....

1.142. O quadro depressivo encontra-se nesta data controlado com recurso a medicação antidepressiva.

1.143. O A. encontrou-se a receber da R. a quantia de 1.500 €uros mensais, por conta do seu salário mensal, desde Maio de 2013 a Maio de 2015, ou seja, durante 24 meses.

1.144. O quadro depressivo de que o A. ficou a padecer manifesta-se em estados de ansiedade; reacção de ajustamento emocional; reacção depressiva prolongada; transtornos de personalidade.

1.145. O A. frequenta as consultas externas do Serviço de Psiquiatria da U…, com peridiocidade, tal como de outras especialidades no Centro de Saúde de V..., Extensão de Santa Marta, a saber:

2013

09.05.2013 – consulta de podologia

31.05.2013 – consulta de fisiatria

13.06.2013 – consulta de psiquiatria

28.06.2013 – consulta de podologia

19.07.2013 – consulta de ortopedia

18.09.2013 – consulta de reabilitação física no II

2014

22.01.2014 – consulta de Medicina Física e Reabilitação

25.08.2014 – consulta de Medicina Física e Reabilitação

1, 4, 5, 6, 7, 8, 11, 13, 14, 25, 26, 27, 28 e 29 de Agosto fez tratamentos de Fisioterapia no II

05.09.2014 – consulta de Medicina Física e Reabilitação

17.09.2013 – consulta de reabilitação física no II

2, 3, 4, 5, 9, 10, 11, 12, 15, 16, 17, 18, 19, 22 e 23 de Setembro fez tratamentos de Fisioterapia no II

2015

14.01.2015 – consulta de Medicina Física e Reabilitação

28.01.2015 – consulta de reabilitação física no II

8, 12, 14, 16, 19, 21, 23, 26, 27, 28, 29 e 30 de Janeiro fez tratamentos de Fisioterapia no II

03.02.2015 – consulta de Medicina Física e Reabilitação

05.03.2014 – consulta de Medicina Física e Reabilitação

27.03.2015 – consulta de fisioterapia

21.05.2015 – consulta U… – exames complementantes

22.05.2015 – consulta U… – exames complementantes

25.05.2015 – consulta U… – exames complementantes

26.05.2015 – consulta U… – exames complementantes (cfr. doc. 74 a 95).

1.146. Antes do relatado acidente, o A. era uma pessoa completamente saudável e cheia de pujança física, jamais tendo sofrido de depressões e/ou problemas mentais.

1.147. As sequelas de que ficou portador e a padecer causam ao A. uma perturbação persistente do humor, que afecta a sua autonomia pessoal e social.

1.148. Por causa destas sequelas, o A. tem necessidade de tomar permanentemente medicação do foro psiquiátrico.

1.149. O A. divorciou-se no dia 30.04.2014, na Conservatória do Registo Civil de V....

1.150. O Autor ficou ainda com dificuldade de marcha, não consegue “acelerar” o passo, correr, agachar-se ou mesmo colocar-se de joelhos.

1.151. Ficou com tendência de isolamento, rejeita o convívio social e/ou familiar.

1.152. Ficou com dor intensa no hallux direito, sempre que há movimentos, toques e/ou pressão moderada.

1.153. Ficou com dor no joelho direito, tal como na região lombar, tipo “moedeira”, permanente, agudizada com esforços de carga e marcha, que o obrigam a tomar diariamente analgésicos; ficou com a sensação de “perna pesada”.

1.154. O Autor sente-se profundamente triste e desmotivado pela vida, chora convulsivamente por tudo e por nada, sendo que antes do acidente dos autos de nada sofria, nem padecia.

1.155. A R. encontrava-se a pagar ao A., à data da instauração da presente acção – Junho de 2012 - o seu salário mensal que auferia em F..., desde o dia do acidente, tendo-o feito até ao mês de Abril de 2013, inclusive.

1.156. Desde a data do acidente, até 30.04.2013, a Ré pagou ao A. o salário mensal de 1.753,77 €uros, tanto quanto este auferia naquele país.

1.157. Todavia, em Maio de 2013, a Ré deixou de pagar ao A. aquele seu salário mensal.

1.158. Em consequência, o A. instaurou contra a Ré o Procedimento Cautelar de Arbitramento de Reparação Provisória em 01.07.2013, por via do qual lhe reclamou a continuidade do pagamento do seu salário mensal.

1.159. Em 22.08.2013, o A. e a R. transigiram naqueles autos por forma a que esta pagasse aquele o montante de 1.500 €uros mensais por conta do seu salário, tendo fixado tal pagamento durante o período de 24 meses, isto é, de Maio de 2013 a Abril de 2015.

1.160. Ao cabo daqueles 2 anos, a Ré terminou aquele pagamento, o que originou a instauração de novo processo de Procedimento Cautelar de Arbitramento de Reparação Provisória contra a Ré, já que o A. não dispõe de qualquer outra fonte de rendimento, que não o seu salário.

1.161. Desde 13.04.2013 até Maio de 2015, o A. realizou ainda as seguintes despesas, motivadas pelas sequelas resultantes do acidente de viação:

Ano de 2013

Maio:

- 29,00 €uros do dia 03.05.2013 – Hospital de Braga;

- 5,00 €uros do dia 06.05.2013 – Centro de Saúde de … de P…;

- 20,47 €uros do dia 07.05.2013 – Farmácia;

-13,00 €uros do dia 09.05.2013 – exames J… G… S.A.

-5,15 €uros do dia 09.05.2013 – Consulta Externa U…

- 5,00 €uros do dia 10.05.2013 – Centro de Saúde de … de P…

- 4,75 €uros do dia 13.05.2013 – Correios

- 2,66 €uros do dia 15.05.2013 – Correios

- 3,00 €uros do dia 22.05.2013 – Centro de Saúde de …. de P…

- 75,00 €uros do dia 24.05.2013 – Clinica Saúde do Pé

- 31,76 €uros do dia 24.05.2013 – Farmácia

- 7,75 €uros do dia 31.05.2013 – Consulta Externa U... Cfr. doc. 96 a 107TOTAL: 202,54 €uros

Junho

-7,75 €uros do dia 05.06.2013 – Centro II

- 4,20 €uros do dia 06.06.2013 – Centro II

- 4,20 €uros do dia 11.06.2013 – Centro II

-0,59 €uros do dia 11.06.2013 – Farmácia

- 11,45 €uros do dia 11.06.2013 – Farmácia

- 5,00 €uros do dia 12.06.2013 – Centro de Saúde de S… de P…

- 4,20 €uros do dia 13.06.2013 – Centro II

- 9,16 €uros do dia 14.06.2013 – Farmácia

- 4,20 €uros do dia 19.06.2013 – Centro II

- 6,62 €uros do dia 12.06.2013 – Farmácia

- 6,62 €uros do dia 12.06.2013 – Farmácia

- 6,62 €uros do dia 12.06.2013 – Farmácia

- 5,85 €uros do dia 12.06.2013 – Correios

- 5,22 €uros do dia 18.06.2013 – Farmácia

- 4,20 €uros do dia 21.06.2013 – Centro II

- 4,20 €uros do dia 25.06.2013 – Centro II

- 4,20 €uros do dia 27.06.2013 – Centro II

- 5,15 €uros do dia 28.06.2013 – Consulta Externa U… Cfr. doc. 108 a 125 Total: 99,43 €uros

Julho

-5,85 €uros do dia 19.07.2013 – Correios

- 5,00 €uros do dia 19.07.2013 – Centro de Saúde de S… de P…

- 3,00 €uros do dia 23.07.2013 - Centro de Saúde de S… de P…

- 7,75 €uros do dia 19.07.2013 – Consulta Externa U…

- 54,91 €uros do dia 26.07.2013 – Farmácia

- 4,20 €uros do dia 23.07.2013 – Centro II

- 4,20 €uros do dia 26.07.2013 – Centro II

- 4,20 €uros do dia 30.07.2013 – Centro II Cfr. doc. 126 a 132 Total: 89,11 €uros

Agosto

- 4,20 €uros do dia 01.08.2013 – Centro II

- 4,20 €uros do dia 06.08.2013 – Centro II

- 4,20 €uros do dia 08.08.2013 – Centro II

- 5,00 €uros do dia 09.08.2013 – Centro de Saúde de S… de P…

- 5,30 €uros do dia 13.08.2013 – Correios

- 4,20 €uros do dia 13.08.2013 – Centro II

- 4,20 €uros do dia 16.08.2013 – Centro II

- 4,20 €uros do dia 19.08.2013 – Centro II

- 4,20 €uros do dia 21.08.2013 – Centro II

- 0,90 €uros do dia 22.08.2013 – Fotocópias

- 4,20 €uros do dia 27.08.2013 – Centro II

- 4,20 €uros do dia 29.08.2013 – Centro II Total: 49,00 €uros

Setembro

- 4,20 €uros do dia 04.09.2013 – Centro II

- 5,22 €uros do dia 09.09.2013 – Farmácia

- 4,20 €uros do dia 10.09.2013 – Centro II

- 5,10 €uros do dia 11.09.2013 – Correios

- 4,06 €uros do dia 20.09.2013 – Farmácia

- 43,21 €uros do dia 20.09.2013 – Farmácia

- 7,75 €uros do dia 26.09.2013 – Consulta Externa U…

- 3,00 €uros do dia 27.09.2013 – Centro de Saúde de S… de P… Cfr. doc. 145 a 152 Total: 76,74 €uros

Outubro

- 1,20 €uros do dia 09.10.2013 – Centro de Saúde de S… de P…

- 5,00 €uros do dia 11.10.2013 – Centro de Saúde de S… de P…

- 1,50 €uros do dia 14.10.2013 – Exames J… G…, S.A.

- 1,20 €uros do dia 14.10.2013 – Centro de Saúde de S… de P…

- 54,25 €uros do dia 14.10.2013 – Farmácia

- 5,65 €uros do dia 14.10.2013 – Correios

- 7,75 €uros do dia 25.10.2013 – Consulta Externa U…

- 5,00 €uros do dia 30.10.2013 – Centro de Saúde de S… de P…

Cfr. doc. 153 a 160

Total: 81,55 €uros

Novembro

- 5,85 €uros do dia 06.11.2013 – Correios

- 29,65 €uros do dia 06.11.2013 – Farmácia

- 4,45 €uros do dia 13.11.2013 – Correios

- 69,80 €uros do dia 18.11.2013 – Farmácia Cfr. doc. 161 a 164 Total: 109,75 €uros

Dezembro

- 5,00 €uros do dia 06.12.2013 – Centro de Saúde de S… de P…

- 5,85 €uros do dia 10.12.2013 – Correios Cfr. doc. 165 e 166 Total: 10,85 €uros

Ano de 2014

Janeiro

- 5,85 €uros do dia 13.01.2014 – Correios

- 5,00 €uros do dia 13.01.2014 – Centro de Saúde de S… de P…

- 3,00 €uros do dia 22.01.2014 – Centro de Saúde de S… de P…

- 58,55 €uros do dia 20.01.2014 – Farmácia

- 1,00 €uros do dia 27.01.2014 – Análises

- 10,13 €uros do dia 27.01.2014 – Farmácia

- 9,35 €uros do dia 30.01.2014 – Farmácia

- 1,50 €uros do dia 30.01.2014 – Exames J… G…, S.A.

- 9,90 €uros do dia 30.01.2014 – Análises Cfr. doc. 167 a 173

Total: 104,80 €uros

Fevereiro

- 13,10 €uros do dia 03.02.2014 – Farmácia

- 5,85 €uros do dia 07.02.2014 – Correios

Cfr. doc. 174 e 175

Total: 18,95 €uros

Março

- 5,85 €uros do dia 12.03.2014 – Correios

- 3,50 €uros do dia 12.03.2014 – Farmácia

- 10,12 €uros do dia 25.03.2014 – Farmácia

- 14,44 €uros do dia 27.03.2014 – Farmácia

Cfr. doc. 176 a 179

Total: 33,41 €uros

Abril

- 5,75 €uros do dia 08.04.2013 – Correios

Cfr. doc. 180

Maio

- 6,10 €uros do dia 09.05.2014 – Correios

Cfr. doc. 181

Junho

- 7,30 €uros do dia 11.06.2014 – Farmácia

- 5,95 €uros do dia 11.06.2014 – Correios

Cfr. doc. 182 e 183

Total: 13,25 €uros

Julho

- 5,75 €uros do dia 08.07.2014 – Correios

- 15,29 €uros do dia 08.07.2014 – Farmácia

Cfr. doc. 184 e 185

Total: 21.04 €uros

Agosto

- 0,75 €uros do dia 05.08.2014 – Farmácia

- 5,95 €uros do dia 08.08.2014 – Correios

- 5,53 €uros do dia 14.08.2014 – Farmácia

- 20,71 €uros do dia 25.08.2014 – Farmácia

Cfr. doc. 186 a 189

Total: 32,94 €uros

Setembro

- 5,95 €uros do dia 05.09.2014 – Correios

Cfr. doc. 190

Outubro

- 5,95 €uros do dia 24.10.2014 – Correios

Cfr. doc. 191

Novembro

- 5,85 €uros do dia 10.11.2014 – Correios Cfr. doc. 192

Dezembro

- 5,35 €uros do dia 04.12.2014 – Farmácia

- 5,12 €uros do dia 04.12.2014 – Farmácia

- 5,12 €uros do dia 04.12.2014 – Farmácia

- 6,10 €uros do dia 04.12.2014 – Correios

Cfr. doc. 193 a 196

Total: 21,69 €uros

Ano de 2015

Janeiro

- 5,95 €uros do dia 08.01.2015 - Correios

Cfr. doc. 197

Fevereiro

- 5,95 €uros do dia 03.02.2015 – Correios

- 11,27 €uros do dia 04.02.2015 – Farmácia

- 3,50 €uros do dia 23.02.2015 – Fotocópias Cfr. doc. 198 a 200

Total: 20,72 €uros

Março

- 11,04 €uros do dia 09.03.2015 – Farmácia

- 6,15 €uros do dia 04.03.2015 – Correios

- 11,50 €uros do dia 13.03.2015 – fotocópias Cfr. doc. 201 a 203

Total: 28,69 €uros

Total (anos 2013, 2014 e Janeiro 2015) 1.050,01 €uros

Cfr.doc.96 a 203).

1.162. Em consequência do acidente de viação, das lesões e respectivas sequelas, o A. ficou a padecer ao nível do membro inferior direito de limitação da flexão do joelho a 110º, sem limitação da coxo femoral direita, rotações preservadas indolores; cicatriz irregular de 6 x6cm na região plantar, outra semelhante na região mediana prolongando-se para o dorso do pé, cicatriz de 6 cm oblíqua na face lateral tibiotársica, cicatriz de 18 cm lateral da coxa; cicatriz de 4 x 4cm e outra de 6x4 cm na face anterior da coxa, sequela do enxerto, cicatriz de 15 cm na face anterior do joelho direito, cicatriz de 8 cm na face lateral do joelho e atrofia muscular da coxa de 1 cm, Hallux rígido com encurtamento do dedo e com hiperpressão plantar com hiperqueratose na cabeça dos metatarsianos; ao nível do crânio ficou a padecer de insónia e sintomas depressivos, com labilidade de humor e ansiedade, medicado com paroxetina, serenal, bromalex e ibuprofeno.

1.163. O Autor apresenta as seguintes queixas:

A) - a nível Funcional: limitação da marcha prolongada por dor e parestesias do membro e perturbação persistente do humor com repercussão moderada na autonomia pessoal, social e profissional.

B) - a nível situacional

- Actos da vida diária: limitação da marcha prolongada, em subir e descer escadas por dor e parestesias do membro.

1.164. O A. sofreu um quantum doloris fixado no grau 5 numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta as lesões resultantes, o período de recuperação funcional, o tipo de traumatismo e os tratamentos efectuados.

1.165. O A. ficou a padecer, como dano permanente, de um Défice Funcional Permanente da Integridade Físico Psíquica de 29 pontos.

1.166. Um Dano Estético fixável no grau 5 numa escala de sete graus de gravidade crescente.

1.167. Ficou igualmente a padecer ao nível de Dependência Permanentes de Ajudas: dependência de ajudas medicamentosas tais com analgésicos, anti-inflamatórios e medicação psiquiátrica; tratamentos médicos regulares como consultas regulares de ortopedia, psiquiatria e medicina física de reabilitação e fisioterapia; e de ajudas técnicas de ortóteses plantares (palmilha e/ou sapato adaptado).

1.168. O A., em consequência das descritas lesões e de ter estado totalmente incapacitado para o trabalho conforme 1.129 permaneceu quase sempre em casa, apenas dela saindo para realizar fisioterapia, tratamentos, consultas e viagens, como as referidas em 1.191 e 1.192. (alterado pela Relação)

1.169. Por causa das descritas lesões, tornou-se apático e até indiferente à realização de serviços domésticos ou mesmo de ocupação lúdica, tal como tratar do jardim da sua casa, de plantas, etc.

1.170. Passou, desde então, a fechar-se sobre si próprio, a não se relacionar com amigos e familiares, a não sair de casa, a não conviver com quem quer que seja, etc.

1.171. Passou a fixar-se na ideia do que teria a sido a sua vida profissional e familiar caso não tivesse sido vítima do acidente de viação que sofreu, que a mesma lhe teria sido mais vantajosa quer em termos patrimoniais, pois estaria a ganhar mais dinheiro do que o salário que então auferia, quer em termos gerais, uma vez que não estava dependente de uma cadeira de rodas e/ou canadianas para sair de casa e conviver.

1.172. Tais pensamentos negativos sobre a sua vida actual acabaram por contribuir que o mesmo entrasse em depressão, tornando-se indiferente a tudo e a todos, o que motivou o seu internamento no Hospital Psiquiátrico …, em B..., por “descompensação grave do seu estado depressivo”, entre os dia 15 e o dia 27 de Novembro de 2012, tendo regressado a sua casa nessa data, mas estando sob efeitos de medicação.

1.173. Sendo que desde Dezembro de 2012 é acompanhado pelo Departamento de Psiquiatria da U…, por apresentar doença compatível com diagnóstico de reacção depressiva (309. CID-9) e estados ansiosos (300.0 CID9).

1.174. O A. passou a recorrer aos serviços de Consulta Externa da U… (em Psiquiatria) também por apresentar problemática familiar relacional que o tem mantido instável emocionalmente e com dificuldades em recuperar o seu equilíbrio”.

1.175. O Autor, em consequência do acidente, ficou a padecer das relatadas sequelas e limitações para o exercício da sua profissão, as quais não existiam antes de aquele acontecer, já que, até então, era um homem saudável, cheio de força e pujança, sem qualquer tipo de limitação física. (alterado pela Relação)

1.176. Todas as sequelas que o A. sofreu com o relatado acidente não só o acompanham até à data da sua reforma laboral, como o acompanharão até ao termo da sua vida activa.

1.177. À data do acidente, o A. tinha 41 anos de idade (nasceu em 16.08.1968).

1.178. A profissão do A. é de trolha na construção civil, auferindo o salário mensal de 1.753,77 €uros à data do acidente.

1.179. O A. ficou a padecer, por causa das lesões físicas que directamente o atingiram, de intensas e indescritíveis dores físicas e profundo abalo psicológico.

1.180. Tais dores deixam-no amargurado e inconsolável; além de ter de as suportar, não consegue trabalhar como anteriormente o fazia, não se conformando com tal realidade.

1.181. Também por causa das dores no seu corpo, passou a dormir mal de noite, a ter dificuldade de estar deitado durante mais de 4 ou 5 horas, sendo que ao sentar-se sente igualmente fortes e intensas dores.

1.182. Também sofre muito com a irritabilidade fácil e impulsividade que lhe surgem perante as situações da vida, o que anteriormente não sucedia.

1.183. O Autor ficou a padecer do relatado estado depressivo por causa do presente acidente, o qual não existia antes do mesmo.

1.184.E que tem as consequências, designadamente a nível profissional, referidas em 1.140. (alterado pela Relação)

1.185. Esta sua situação psiquiátrica deixa-o também profundamente abalado e preocupado perante a vida, pelo que se tornou numa pessoa inquietante e profundamente angustiante.

1.186. Desde 29.06.2012, até esta data, o A. suportou as seguintes despesas, por causa do relatado acidente e sequelas dele resultantes, a saber:

Correios e fotocópias de documentos enviados para França:

- 4,97€, do dia 28.09.2009;

- 5,27€, do dia 22.10.2009;

- 1,00€, do dia 18.11.2009;

- 3,00€, do dia 12.01.2010;

- 0,70€, do dia 22.01.2010;

- 3,07€, do dia 29.01.2010;

- 0,10€, do dia 29.01.2010;

- 1,90€, do dia 29.01.2010;

- 5,65€, do dia 18.03.2010;

- 4,97€, do dia 30.03.2010;

- 5,07€, do dia 19.04.2010;

- 4,97€, do dia 19.05.2010;

- 5,07€, do dia 01.06.2010;

- 5,65€, do dia 18.06.2010;

- 4,97€, do dia 29.06.2010;

- 5,07€, do dia 26.07.2010;

- 5,07€, do dia 23.09.2010;

- 5,07€, do dia 25.10.2010;

- 5,40€, do dia 29.11.2010;

- 0,40€, do dia 23.11.2010;

- 7,50€, do dia 16.12.2010;

- 1,90€, do dia 23.12.2010;

- 4,97€, do dia 24.01.2011;

- 4,97€, do dia 22.02.2011;

- 4,97€, do dia 24.03.2011;

- 5,75€, do dia 15.06.2012;

- 2,00€, do dia 16.07.2012;

- 5,60€, do dia 20.07.2012;

- 2,05€, do dia 03.08.2012;

- 5,60€, do dia 14.08.2012;

- 1,50€, do dia 06.09.2012;

- 5,40€, do dia 14.09.2012;

- 1,35€, do dia 09.10.2012;

- 5,60€, do dia 15.10.2012;

- 1,80€, do dia 28.11.2012;

- 5,85€, do dia 13.11.2012;

- 5,75€, do dia 13.12.2012;

- 0,45€, do dia 13.12.2012;

- 5,60€, do dia 17.12.2012;

- 7,63€, do dia 17.12.2012;

- 7,73€, do dia 17.12.2012;

- 1,85€, do dia 14.01.2013;

- 5,75€, do dia 14.01.2013;

- 1,55€, do dia 28.01.2013;

- 1,90€, do dia 07.02.2013;

- 3,65€, do dia 08.02.2013;

- 1,00€, do dia 18.02.2013;

- 5,85€, do dia 18.02.2013.

Cfr.doc. 1 a 43

Despesas não pagas pela R., apesar lhe terem sido reclamadas

- 129€, referente ao mês de Março de 2012

- 29€, referente ao mês de Dezembro de 2012

- 13,66€, referente ao mês de Janeiro de 2013

Facturas de táxi de viagens ao P...:

- 61,30€, do dia 04.07.2011;

- 80,00€, do dia 10.11.2012;

- 80,00€, do dia 25.10.2012;

- 80,00€, do dia 24.06.2012;

- 75,00€, do dia 11.02.2012;

- 75,00€, do dia 15.02.2012 Cfr.doc. 44 a 49

Análises clinicas:

- 10,00€, do dia 10.07.2012;

- 2,00€, do dia 10.07.2012;

- 2,00€, do dia 17.08.2012;

- 2,00€, do dia 21.08.2012

Cfr.doc. 50 a 53

Consultas Centro de Saúde de V…:

- 5,00€, do dia 08.06.2012;

- 10,00€, do dia 16.06.2012;

- 5,00€, do dia 20.06.2012;

- 5,00€, do dia 17.08.2012

Cfr.doc. 54 a 57

Consultas Hospital de V… C…:

- 9,45€, do dia 06.06.2012;

- 17,50€, do dia 06.06.2012

Farmácia

- 9,58€, do dia 20.06.2012;

- 0,26€, do dia 18.07.2012;

- 1,29€, do dia 18.07.2012;

- 14,52€, do dia 18.07.2012

Cfr.doc. 60 a 63

Despesas de saúde em F…:

- 199,59€, do dia 10.11.2012

Cfr.doc. 64

Relatórios Clínicos

- 300,00€ do dia 19.02.2013

Cfr.doc. 65

No total de 1.209,32 €uros.

1.187. Devido ao presente acidente, o A. teve que ficar retido no nosso país desde 29.08.2009 até esta data.

1.188. Sendo que, à data do acidente e nos meses subsequentes, desconhecia o A. quanto tempo é que as sequelas dele resultantes o reteriam no nosso país, pelo que ainda manteve o respectivo contrato de arrendamento em França, na esperança, então, de brevemente regressar aquele país.

1.189. Contudo, a longa permanência em Portugal acabou por ditar que o A. denunciasse o contrato de arrendamento dessa habitação e a restituísse ao seu proprietário no mês de Julho de 2010.

1.190. Após o acidente, o A. pagou durante vários meses aquela renda de casa, sem que dela obtivesse partido, pois a não habitou, até que denunciou o arrendamento, a saber: 450€ relativos aos meses de Outubro de 2009 (inclusive) a Agosto de 2010, no total de 4.950,00 €uros.

1.191. Por outro lado, o A. teve necessidade de se deslocar a F..., após a ocorrência do presente acidente, quer para denunciar o aludido contrato de arrendamento, quer para tratar da sua situação laboral, como também da sua incapacidade médica.

1.192. Para o efeito, viajou de avião, tendo pago os seguintes montantes, cujo reembolso reclama: 154,26€ em Julho de 2011; 71,98€ em Outubro de 2011; 67,48€ em Outubro de 2012; 92,74€ em Janeiro de 2013 Cfr. doc. 77 a 80 No total de 386,46 €uros.”


Foram dados como não provados os seguintes factos:

2.1. Por causa das lesões físicas e psíquicas que lhe advieram daquele acidente, o A. e a sua esposa - igualmente sinistrada naquele acidente e ainda não curada das lesões que do mesmo lhe resultaram – acabaram por se incompatibilizar, por falta de capacidade de sofrimento e tolerância à dor física decorrente daquelas lesões, que ditaram o divórcio entre ambos, ocorrido.

2.2. O que muito magoado e transtornado deixou o A., pois tinha a sua união com a sua esposa para toda a sua vida.

2.3. Sendo que, antes deste acidente, eram considerados um casal “exemplar”, que reciprocamente se admiravam e respeitavam, retribuindo a cada um deles o afecto e ternura que do outro recebiam.

2.4. O A. Perdeu o desejo sexual, pese embora tivesse 41 anos de idade aquando o acidente de viação.

2.5. O A., em consequência das sequelas de que ficou portador, ficou a padecer, de uma Repercussão Permanente nas Actividades Desportivas e de Lazer (anteriormente designado de prejuízo de afirmação pessoal correspondente à impossibilidade estrita e específica para a vítima de se dedicar a certas actividades culturais, desportivas ou de lazer, praticadas previamente ao evento responsável pelas sequelas e que representavam, para esta, um amplo espaço de realização pessoal), fixável no grau 3 em 5.”


5. Tendo em conta o disposto no nº 4, do art. 635º, do Código de Processo Civil, estão em causa neste recurso as seguintes questões:

- Alteração da decisão relativa à matéria de facto, de modo a retomar “o que foi decidido na 1ª instância, sob o n.ºs 1.129, 1.130, 1.134, 1.139, 1.168, 1.175. e 1.184”;

- Em consequência, alteração da decisão de direito, recuperando o valor indemnizatório fixado pela sentença (€ 300.000);

- Subsidiariamente, mantendo-se a decisão relativa à matéria de facto, reapreciação do montante da indemnização por danos patrimoniais resultantes do “dano biológico”, elevando-o de € 140.000 para € 250.000.


6. Quanto à questão da alteração da decisão relativa à matéria de facto, de modo a retomar “o que foi decidido na 1ª instância, sob o n.ºs 1.129, 1.130, 1.134, 1.139, 1.168, 1.175. e 1.184”, invoca o Recorrente ter o acórdão recorrido incorrido em erro na aplicação do direito probatório por ter modificado a decisão da matéria de facto com base na prevalência da prova pericial sobre a prova testemunhal.

      Tanto a prova pericial (art. 389º do Código Civil) como a prova testemunhal (art. 396º do CC) são apreciadas livremente pelo tribunal, o que implica que este possa fazer prevalecer uma sobre a outra. Este poder cabe tanto ao tribunal da 1ª instância como à Relação, à qual se aplica o regime do art. 607º, nº 5, do CPC, por remissão do art. 663º, nº 2, do mesmo Código.

Dentro dos poderes que lhe são concedidos pelo art. 662º do CPC, deve a Relação declarar – como fez no caso dos autos – “os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas” (art. 607º, nº 5, do CPC), sem que – como defende o Recorrente – “a livre apreciação da prova” seja “indissociável da oralidade com que decorre o julgamento em primeira instância”.

Vejamos, a respeito da intervenção da Relação em matéria de facto, a exposição de Abrantes Geraldes (Recursos no Novo Código do Processo Civil, 3ª edição, Almedina, 2016, págs. 244 e seg.):

“Com a nova redacção do art. 662º pretendeu-se que ficasse claro que, sem embargo da correcção, mesmo a título oficioso, de determinadas patologias que afectam a decisão da matéria de facto e também sem prejuízo do ónus de impugnação que recai sobre o recorrente e que está concretizado nos termos previstos no art. 640º, quando esteja em causa a impugnação de determinados factos cuja prova tenha sido sustentada em meios de prova submetidos a livre apreciação, a Relação deve alterar a decisão da matéria de facto sempre que, no seu juízo autónomo, os elementos de prova que se mostrem acessíveis determinem uma solução diversa, designadamente em resultado da reponderação dos documentos, depoimentos e relatórios periciais, completados ou não pelas regras da experiência.

(…)

Igualmente se mantém, agora com mais vigor e clareza, a possibilidade de sindicar a decisão quando assente em prova que foi oralmente produzida e tenha ficado gravada, afastando definitivamente o argumento de que a modificação da decisão da matéria de facto deveria ser reservada para os casos de “erro manifesto” ou de que não é permitido à Relação contrariar o juízo formulado pela 1ª instância relativamente a meios de prova que foram objecto de livre apreciação. Sem embargo de ponderação dessas ou de outras circunstâncias, a Relação deve assumir-se como verdadeiro tribunal de instância e, por isso, desde que, dentro dos seus poderes de livre apreciação dos meios de prova, encontre motivo para tal, deve introduzir as modificações que se justificarem na matéria provada e não provada.” (bold nosso)

 

      Conclui-se pela não verificação de errada aplicação da disciplina probatória ou desrespeito pelos poderes da Relação, sendo manifestamente improcedente o recurso na parte respeitante à decisão relativa à matéria de facto.

Fica assim prejudicado o conhecimento da questão da alteração da decisão de direito, no sentido de retomar o valor indemnizatório (€ 300.000) fixado pela sentença.


7. Mantendo-se a decisão relativa à matéria de facto, passa-se a apreciar a questão subsidiária relativa ao montante da indemnização por danos patrimoniais, designadamente a pretensão do Recorrente de que seja elevado de € 140.000 para € 250.000.

    Recorde-se que a sentença, tendo dado como provada a incapacidade laboral permanente do A., fixou a indemnização por danos patrimoniais correspondentes a perda de rendimentos em € 300.000, aos quais devem ser deduzidos os montantes já pagos pela R. ao A. a título de perdas salariais. Fixou, além disso, indemnização por danos não patrimoniais em € 50.000.

      A Relação, tendo dado como provado que o A. - apesar de lhe ter sido fixada Incapacidade Geral Permanente em 29 pontos - não ficou afectado por incapacidade laboral permanente, reponderou a indemnização “quanto ao dano patrimonial futuro considerado a partir da data da consolidação médico-legal das lesões – 31-12-2012”, fixando-a “no montante de 140.000,00€, neste apenas se descontando as quantias pela ré pagas ao autor, a título de salários perdidos depois dessa data, e não as pagas antes, com idêntico fundamento, em compensação da incapacidade para o trabalho até ali arbitrada.” Quanto à indemnização por danos não patrimoniais manteve o valor de € 50.000 fixado pela sentença.

     Vem o Recorrente impugnar a decisão de atribuição da indemnização de € 140.000, com os seguintes fundamentos: 16.º. Na verdade, na modesta opinião do Recorrente, face à factualidade dada como provada pelo tribunal recorrido, aquele montante de 140.000,00 €uros configura uma indemnização profundamente desadequada e injusta para a devida compensação que se pretende alcançar de forma judicial, tanto mais que, auferindo o Recorrente, à data do acidente, em F…, o salário mensal de 1.753,77 €uros - Facto Provado sob o n.º 1.81. - por conta do qual recebia da Recorrida a quantia mensal de 1.500 €uros - ao ser-lhe descontado, como ordena a decisão recorrida, as prestações pagas desde 31.12.2012 até ao momento actual - que ascendem, nesta data, a 72.000,00 €uros (1.500 € x 48 meses) - apenas receberia, de modo efectivo, a título de indemnização pela IPG de 29 Pontos, que lhe exige esforços suplementares para o trabalho, como decorre da alteração da Matéria de Facto, apesar de, à data do acidente, ter somente 41 anos de idade - Facto Provado sob o n.º1.177. - o montante de 68.000,00 €uros! 17.º. Ora, receber agora 68.000 €uros apenas para o compensar de tão penosas sequelas para o trabalho, que lhe determinaram uma IPG de 29 Pontos, com esforços suplementares e em idade tão jovem, traduz uma profunda injustiça! 19.º. Em face do exposto e tendo em conta a taxa de juro actual líquida inferior a 0.3% (CGD), a fixação da IPG de 29 Pontos, os esforços suplementares no desempenho da sua profissão de pedreiro da construção civil, a idade provável de vida do sinistrado, o qual, à data do acidente, tinha 41 anos de idade (nasceu em 16.08.1968) e que tais lesões o acompanharão até ao termo da sua existência, a circunstância de, à data do acidente, estar emigrado em F…, onde auferia o salário mensal de 1.753.77 €uros (Facto 1.178), a necessidade de tomar medicação, tal como a claudicação de marcha, dever-lhe-á ser atribuído, na nossa modesta opinião, uma indemnização não inferior a 250.000,00 €uros.”

      Assinale-se, antes de mais, ser inteiramente improcedente o argumento do Recorrente quanto ao valor, que entende diminuto, da quantia a receber efectivamente. Pois as deduções a operar mais não são que um acerto de contas com as quantias que a R. foi pagando ao A. ao longo do tempo, a título de perdas salariais. Importa sim apreciar se o valor global de € 140.000 permite reparar de forma justa e adequada a perda de capacidade geral de ganho (“dano biológico”) do A. lesado.

      Antes de proceder à reponderação do caso dos autos, recordam-se em seguida os critérios gerais de reparabilidade desta categoria de dano.


8. Nas palavras do acórdão deste Supremo Tribunal de 28/01/2016 (proc. nº 7793/09.8T2SNT.L1.S1), in www.dgsi.pt, retomadas nos acórdãos de 07/04/2016 (proc. nº 237/13.2TCGMR.G1.S1), e de 14/12/2016 (proc. nº 37/13.0TBMTR.G1.S1), in www.dgsi.pt, “A afectação da integridade físico-psíquica (em si mesma um dano evento, que, na senda do direito italiano, tem vindo a ser denominado “dano biológico”) pode ter como consequência danos de natureza patrimonial e danos de natureza não patrimonial. Na primeira categoria não se compreende apenas a perda de rendimentos pela incapacidade laboral para a profissão habitual, mas também as consequências da afectação, em maior ou menor grau, da capacidade para o exercício de outras actividades profissionais ou económicas, susceptíveis de ganhos materiais (neste sentido, decidiram os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de Junho de 2015 (proc. nº 1166/10.7TBVCD.P1.S1), de 19 de Fevereiro de 2015 (proc. nº 99/12.7TCGMR.G1.S1), de 7 de Maio de 2014 (proc. nº 436/11.1TBRGR.L1.S1), de 10 de Outubro de 2012 (proc. nº 632/2001.G1.S1), e de 20 de Outubro de 2011 (proc. nº 428/07.5TBFAF.G1.S1), todos em www.dgsi.pt.)”.

      Afirma-se, mais à frente, no acórdão de 28/01/2016, que vimos citando:

“Para além dos danos patrimoniais consistentes em perda de rendimentos laborais da profissão habitual, segue-se a orientação deste Supremo Tribunal, supra referida, de procurar ressarcir as consequências da afectação, em maior ou menor grau, da capacidade laboral para o exercício de outras actividades profissionais ou económicas, susceptíveis de ganhos materiais. Trata-se das consequências patrimoniais do denominado “dano biológico”, expressão que tem sido utilizada na lei, na doutrina e na jurisprudência nacionais com sentidos nem sempre coincidentes. Na verdade, a lesão físico-psíquica é o dano-evento, que pode gerar danos-consequência, os quais se distinguem na tradicional dicotomia de danos patrimoniais e danos não patrimoniais (cfr. tratamento mais desenvolvido pela relatora do presente acórdão, Responsabilidade Civil – Temas Especiais, 2015, págs. 69 e segs.). Com esta precisão, a indemnização pela perda da capacidade de ganho, tem a seguinte justificação, nas palavras do acórdão do Supremo Tribunal de 10 de Outubro de 2012, cit.: “a compensação do dano biológico [dentro das consequências patrimoniais da lesão físico-psíquica] tem como base e fundamento, quer a relevante e substancial restrição às possibilidades de exercício de uma profissão e de futura mudança, desenvolvimento ou reconversão de emprego pelo lesado, implicando flagrante perda de oportunidades, geradoras de possíveis e futuros acréscimos patrimoniais, frustrados irremediavelmente pelo grau de incapacidade que definitivamente o vai afectar; quer a acrescida penosidade e esforço no exercício da sua actividade diária e corrente, de modo a compensar e ultrapassar as graves deficiências funcionais que constituem sequela irreversível das lesões sofridas.”

     Entende-se que o aumento da penosidade e esforço para realizar as tarefas diárias pode ser atendido no âmbito dos danos patrimoniais (e não apenas dos danos não patrimoniais), na medida em que se prove ter como consequência provável a redução da capacidade de obtenção de proventos, no exercício de actividade profissional ou de outras actividades económicas.

“A perda relevante de capacidades funcionais – mesmo que não imediata e totalmente reflectida no valor dos rendimentos pecuniários auferidos pelo lesado – constitui uma verdadeira «capitis deminutio» num mercado laboral exigente, em permanente mutação e turbulência, condicionando-lhe [ao lesado], de forma relevante e substancial, as possibilidades de exercício profissional e de escolha e evolução na profissão, eliminando ou restringindo seriamente a carreira profissional expectável - e, nessa medida, o leque de oportunidades profissionais à sua disposição, - erigindo-se, deste modo, em fonte actual de possíveis e futuramente acrescidos lucros cessantes, a compensar, desde logo, como verdadeiros danos patrimoniais” (acórdão do Supremo Tribunal de 10 de Outubro de 2012, cit.).”

Nestes termos, consideram-se reparáveis como danos patrimoniais as consequências danosas resultantes da incapacidade geral permanente (ou dano biológico), ainda que esta incapacidade não tenha tido repercussão directa no exercício da profissão habitual.

Estamos no domínio dos danos patrimoniais indetermináveis, cuja reparação deve ser fixada segundo juízos de equidade (cfr. art. 566º, nº 3, do Código Civil). Ora, como tem sido considerado pelo Supremo Tribunal de Justiça (cfr., por exemplo, o acórdão de 6 de Abril de 2015, proc. nº 1166/10.7TBVCD.P1.S1, com remissão para o acórdão de 28 de Outubro de 2010, proc. nº 272/06.7TBMTR.P1.S1, e para o acórdão de 5 de Novembro de 2009, proc. nº 381/2002.S1, todos consultáveis em www.dgsi.pt), em princípio, “a aplicação de puros juízos de equidade não traduz, em bom rigor, a resolução de uma «questão de direito»”; se é chamado a pronunciar-se sobre “o cálculo da indemnização” que “haja assentado decisivamente em juízos de equidade”, não compete ao Supremo Tribunal de Justiça “a determinação exacta do valor pecuniário a arbitrar (…), mas tão somente a verificação acerca dos limites e pressupostos dentro dos quais se situou o referido juízo equitativo, formulado pelas instâncias face à ponderação casuística da individualidade do caso concreto «sub iudicio»”. Para além disso, a sindicância do juízo equitativo não afasta a necessidade de ponderar as exigências do princípio da igualdade (ao abrigo do regime do art. 13º da Constituição e do art. 8º, nº 3, do Código Civil), o que aponta para uma tendencial uniformização de parâmetros na fixação judicial das indemnizações, sem prejuízo da consideração das circunstâncias do caso concreto.

Tendo presentes estes critérios gerais, passemos a apreciar o caso dos autos.


9. De entre a discriminadíssima matéria de facto relativa aos danos do A. relevam, em especial, para a questão em apreciação, os seguintes factos provados:

1.79. O A., antes do presente acidente, não sofria de qualquer tipo de lesão ou limitação física, sendo uma pessoa totalmente saudável, cheia de força e pujança.

1.80. À data do acidente, o A. era emigrante em F..., país para onde emigrou no ano de 1991.

1.82. Acontece que, por causa do relatado acidente, o A. viu-se impedido de regressar a F..., tendo ficado retido em Portugal desde o acidente, até esta data, para se curar das lesões que do mesmo advieram.

1.83. Sendo que ainda claudica a marcha.

1.124. O A., antes deste acidente, era uma pessoa totalmente cheia de saúde e sem qualquer lesão e/ou limitação física.

1.128. O A. obteve a consolidação médico-legal das lesões no dia 31.12.2012; sofreu um período de Défice Funcional Temporário Total de 133 dias; um período de Défice Funcional Temporário Parcial de 1365 dias; um período de repercussão temporária na actividade profissional total de 1498 dias e a final ficou a padecer de um défice funcional permanente da integridade física de 29 pontos.

1.129. Desde a data do acidente (29-08-2009) até à data em que lhe foi, pela peritagem, fixada a consolidação médico-legal das lesões (31-12-2012), o autor, em consequência das lesões naquele sofridas e respectivas sequelas físicas e psíquicas de que ficou a padecer, esteve totalmente incapacitado para o trabalho. A partir de então, tais sequelas, em termos de repercussão permanente na actividade profissional, são compatíveis com o exercício da sua referida profissão, mas implicam esforços suplementares. (alterado pela Relação)

1.135. Após este longo período, verifica-se que do ponto de vista funcional o A. apresenta claudicação da marcha, cuja instabilidade não lhe permite ter a mobilidade anterior ao acidente, mesmo após tratamento intensivo de fisioterapia a que se submeteu.

1.136. Das lesões resultaram ainda queixas álgicas com carácter recorrente e permanente.

1.137. Actualmente o agravamento das dores são na maioria das vezes controladas com recurso a analgesia administrada por via oral, mas continua a verificar-se a necessidade de ser portador de analgésicos para possibilitar o debelar do sofrimento.

1.138. São também aparentes pequenos défices neuro-sensitivos referentes ao membro inferior direito que constituam factor de limitação da qualidade de vida do A., sendo minimizado porque recorre à medicação instituída de caracter crónico e permanente.

1.139. As limitações físicas descritas e o défice funcional permanente da integridade física pela perícia médico-legal fixado em 29 pontos em razão das sequelas de que o autor ficou portador são compatíveis com o exercício da sua referida profissão, mas implicam esforços suplementares acrescidos, designadamente para, no exercício dela, levantar objectos pesados, para se baixar ou para se ajoelhar.

1.140. Em consequência do acidente o A. ficou a padecer, a nível psiquiátrico de uma perturbação persistente de humor com repercussão moderada na autonomia pessoal, social e profissional, nas actividades da vida diária, relevando para o défice funcional permanente referido em 1.128. em 14 pontos, necessitando de tratamento e acompanhamento em consulta de psiquiatria de periodicidade trimestral.

1.150. O Autor ficou ainda com dificuldade de marcha, não consegue “acelerar” o passo, correr, agachar-se ou mesmo colocar-se de joelhos.

1.153. Ficou com dor no joelho direito, tal como na região lombar, tipo “moedeira”, permanente, agudizada com esforços de carga e marcha, que o obrigam a tomar diariamente analgésicos; ficou com a sensação de “perna pesada”.

1.162. Em consequência do acidente de viação, das lesões e respectivas sequelas, o A. ficou a padecer ao nível do membro inferior direito de limitação da flexão do joelho a 110º, sem limitação da coxo femoral direita, rotações preservadas indolores; cicatriz irregular de 6 x 6cm na região plantar, outra semelhante na região mediana prolongando-se para o dorso do pé, cicatriz de 6 cm oblíqua na face lateral tibiotársica, cicatriz de 18 cm lateral da coxa; cicatriz de 4 x4cm e outra de 6x4 cm na face anterior da coxa, sequela do enxerto, cicatriz de 15 cm na face anterior do joelho direito, cicatriz de 8 cm na face lateral do joelho e atrofia muscular da coxa de 1 cm, Hallux rígido com encurtamento do dedo e com hiperpressão plantar com hiperqueratose na cabeça dos metatarsianos; ao nível do crânio ficou a padecer de insónia e sintomas depressivos, com labilidade de humor e ansiedade, medicado com paroxetina, serenal, bromalex e ibuprofeno.

1.163. O Autor apresenta as seguintes queixas:

A) - a nível Funcional: limitação da marcha prolongada por dor e parestesias do membro e perturbação persistente do humor com repercussão moderada na autonomia pessoal, social e profissional.

B) - a nível situacional

- Actos da vida diária: limitação da marcha prolongada, em subir e descer escadas por dor e parestesias do membro.

1.165. O A. ficou a padecer, como dano permanente, de um Défice Funcional Permanente da Integridade Físico Psíquica de 29 pontos.

1.175. O Autor, em consequência do acidente, ficou a padecer das relatadas sequelas e limitações para o exercício da sua profissão, as quais não existiam antes de aquele acontecer, já que, até então, era um homem saudável, cheio de força e pujança, sem qualquer tipo de limitação física. (alterado pela Relação)

1.176. Todas as sequelas que o A. sofreu com o relatado acidente não só o acompanham até à data da sua reforma laboral, como o acompanharão até ao termo da sua vida activa.

1.177. À data do acidente, o A. tinha 41 anos de idade (nasceu em 16.08.1968).

1.178. A profissão do A. é de trolha na construção civil, auferindo o salário mensal de 1.753,77 €uros à data do acidente.


      Perante este quadro fáctico, a perda da capacidade de ganho (ou consequências patrimoniais do “dano biológico”) foi atendida pela Relação nos seguintes termos:

“Assim, considerando, por um lado, a data do acidente, a idade do autor, a esperança média de vida, o rendimento mensal provado, o défice ou incapacidade atribuído nas perícias médico-legais e a natureza, localização e extensão das sequelas permanentes, apesar das várias cirurgias a que o autor foi submetido, implicantes de esforços complementares no exercício da sua actividade profissional, tudo balanceado em função do resultado a que se chegaria pelos diversos métodos de cálculo usuais – referidos repetidamente na jurisprudência – e temperado pela equidade; e, por outro, as circunstâncias do acidente, grau de culpa do lesante, tipo de lesões sofridas (de que se destacam as lesões no membro inferior direito), assistência hospitalar requerida, tratamentos, internamentos, fisioterapia, cirurgias, quantum doloris arbitrado pelas dores sofridas, dano estético resultante das sequelas, particularmente a repercussão no exercício da respectiva actividade profissional (cujos esforços suplementares obviamente se perspectivam e valorizam como elevados, atento o tipo de tarefas naquela exigido) – tudo à luz de casos análogos encontrados na jurisprudência, afigura-se-nos que o valor alcançado pelo tribunal recorrido não se conforma justamente aos critérios legais, como salienta a apelante, não se encontrando – nem verdadeiramente o apelado mostrando – razões para o manter.

Sem necessidade de mais considerações, concluímos, portanto, que a apelação tem merecimento (embora não nos seus precisos termos e valor) e que a sentença deve ser, nesta parte alterada, quanto ao dano patrimonial futuro considerado a partir da data da consolidação médico-legal das lesões – 31-12-2012 – para o montante de 140.000,00€, mas neste, por isso mesmo, apenas se descontando, as quantias pela ré pagas pelo autor depois dessa data, a título de salários perdidos, e não as pagas antes em compensação da incapacidade total para o trabalho até ali arbitrada.”


      Na sindicância do juízo equitativo da Relação que cabe a este Supremo Tribunal, verifica-se antes de mais que, ao enunciar os factores a ter em conta, o acórdão recorrido parece ter incluído dados (em especial, o quantum doloris e o dano estético) que integram antes a categoria dos danos não patrimoniais, cuja indemnização as instâncias fixaram em € 50.000, quantia que não foi impugnada no presente recurso.

Não podendo admitir-se uma duplicação da indemnização pelos mesmos danos – a título de danos patrimoniais e a título de danos não patrimoniais – compreende-se porém que, no caso sub judice, a fronteira seja especialmente difícil de traçar, uma vez que parte significativa (14 pontos em 29 pontos no total) do Défice Funcional Permanente da Integridade Físico Psíquica fixado ao A. lesado se deve à prova de que Em consequência do acidente o A. ficou a padecer, a nível psiquiátrico de uma perturbação persistente de humor com repercussão moderada na autonomia pessoal, social e profissional…”. Assim, e uma vez que, na fixação da indemnização por danos não patrimoniais, as instâncias tiveram em conta “que o quadro depressivo de que o A. passou a padecer em consequência do acidente, foi já tido em conta na atribuição do défice funcional permanente da integridade física com 14 pontos, e portanto já objecto de indemnização no âmbito da perda de ganho futuro”, não existe duplicação da indemnização pelos mesmos danos

       Esclarecida esta dúvida suscitada pela fundamentação do acórdão recorrido, constata-se que, no mais, o juízo da Relação enuncia múltiplos factores – “a data do acidente, a idade do autor, a esperança média de vida, o rendimento mensal provado, o défice ou incapacidade atribuído nas perícias médico-legais e a natureza, localização e extensão das sequelas permanentes, apesar das várias cirurgias a que o autor foi submetido, implicantes de esforços complementares no exercício da sua actividade profissional, tudo balanceado em função do resultado a que se chegaria pelos diversos métodos de cálculo usuais – referidos repetidamente na jurisprudência – e temperado pela equidade” – entre os quais se destaca o do “rendimento mensal provado”, assim como a referência ao “resultado a que se chegaria pelos diversos métodos de cálculo usuais” – que apenas seriam relevantes se tivesse sido provado que o A. ficou a padecer de incapacidade permanente para o exercício da profissão habitual. Ora, recorde-se, a Relação alterou a matéria de facto dando como provado que “As limitações físicas descritas e o défice funcional permanente da integridade física pela perícia médico-legal fixado em 29 pontos em razão das sequelas de que o autor ficou portador são compatíveis com o exercício da sua referida profissão, mas implicam esforços suplementares acrescidos, designadamente para, no exercício dela, levantar objectos pesados, para se baixar ou para se ajoelhar.”

      Nos termos do art. 566º, nº 3, do Código Civil, a indemnização por danos patrimoniais indetermináveis deve ser fixada segundo juízos de equidade, dentro dos limites que o tribunal tiver como provados. Não existindo, no caso sub judice, limites de danos que o tribunal tenha dado como provados, a equidade é o único critério legalmente previsto e não um plus que apenas viria temperar ou completar o resultado obtido pela aplicação de fórmula financeira criada em função da verificação de situação de incapacidade parcial permanente para o exercício da profissão habitual que aqui não tem aplicação (no mesmo sentido, cfr. os acórdãos deste Supremo Tribunal de 14/12/2016, proc. nº 37/13.0TBMTR.G1.S1, e de 16/03/2017, proc. nº 294/07.0TBPCV.C1.S1, in www.dgsi.pt).

         Vejamos.

Na jurisprudência deste Supremo Tribunal (cfr. acórdãos de 20/10/2011, proc. nº 428/07.5TBFAF.G1.S1, de 10/10/2012, proc. nº 632/2001.G1.S1, de 07/05/2014, proc. nº 436/11.1TBRGR.L1.S1, de 19/02/2015, proc. nº 99/12.7TCGMR.G1.S1, de 04/06/2015, proc. nº 1166/10.7TBVCD.P1.S1, de 07/04/2016, proc. nº 237/13.2TCGMR.G1.S1, de 14/12/2016, proc. nº 37/13.0TBMTR.G1.S1, e de 16/03/2017, proc. nº 294/07.0TBPCV.C1.S1, todos consultáveis em www.dgsi.pt), a atribuição de indemnização por perda de capacidade geral de ganho, segundo um juízo equitativo, tem variado, essencialmente, em função dos seguintes factores: a idade do lesado; o seu grau de incapacidade geral permanente; as suas potencialidades de aumento de ganho - antes da lesão -, tanto na profissão habitual, como em profissão ou actividade económica alternativas, aferidas, em regra, pelas suas qualificações e competências. A que acresce um outro factor: a conexão entre as lesões físico-psíquicas sofridas e as exigências próprias da actividade profissional habitual do lesado, assim como de actividades profissionais ou económicas alternativas (tendo em conta as qualificações e competências do lesado).

      No caso dos autos, ficou provado que o A. lesado: (i) tinha 41 anos à data do acidente; (ii) ficou a padecer de Défice Funcional Permanente da Integridade Físico Psíquica fixado em 29 pontos; (iii) exercia profissão (trolha na construção civil) que exige elevados níveis de força e destreza físicas, tendo as lesões sofridas determinado que: “O Autor ficou ainda com dificuldade de marcha, não consegue “acelerar” o passo, correr, agachar-se ou mesmo colocar-se de joelhos.”; “Ficou com dor no joelho direito, tal como na região lombar, tipo “moedeira”, permanente, agudizada com esforços de carga e marcha, que o obrigam a tomar diariamente analgésicos; ficou com a sensação de “perna pesada”.”; “Em consequência do acidente de viação, das lesões e respectivas sequelas, o A. ficou a padecer ao nível do membro inferior direito de limitação da flexão do joelho a 110º”; “Todas as sequelas que o A. sofreu com o relatado acidente não só o acompanham até à data da sua reforma laboral, como o acompanharão até ao termo da sua vida activa.”

      Neste quadro fáctico, o critério da conexão entre as lesões físico-psíquicas sofridas e as exigências próprias da actividade profissional habitual do lesado, assim como de actividades profissionais ou económicas alternativas (tendo em conta que tudo indica que as qualificações do lesado não são elevadas) assume uma especial importância; a sua ponderação, juntamente com a idade do lesado, permite concluir que se encontram limitadas, de forma acentuada, as possibilidades de progredir (e até, a médio prazo, de prosseguir) no exercício da profissão habitual. Num mercado de trabalho particularmente exigente, a incapacidade geral de que o lesado ficou a padecer (com uma componente física e outra psíquica) limita igualmente as possibilidades de mudança para profissão alternativa compatível com a sua idade, qualificações e competências, assim como diminui as possibilidades de exercício de outras actividades económicas. Tudo isto integra a perda de capacidade de ganho por incapacidade geral permanente, devendo ser tido em conta na indemnização a atribuir ao A.

       Pretende o A. Recorrente que tal indemnização seja aumentada para € 250.000. Tendo presente a necessidade de ponderar as exigências do princípio da igualdade e, consequentemente, de nos orientarmos no sentido de uma tendencial uniformização de parâmetros na fixação judicial das indemnizações, refira-se que, em caso decidido em recente acórdão deste Supremo Tribunal, relatado pela relatora do presente acórdão (acórdão de 16/03/2017, proc. nº 294/07.0TBPCV.C1.S1, consultável in www.dsgi.pt), se fixou precisamente em € 250.000 a indemnização por perda de capacidade de ganho/dano biológico de lesado de 19 anos, trabalhador da construção civil, afectado por incapacidade geral fixada em 41 pontos. Trata-se, sem dúvida, de um caso de gravidade superior à do caso dos autos pelo que está excluída a hipótese de, neste último, se fixar a mesma indemnização.

     Tendo aquela decisão como referência, considera-se que, proporcionalmente, será justo e adequado fixar em € 170.000 a indemnização por perda geral de ganho/dano biológico do lesado dos autos, no qual se devem descontar as quantias pagas pela R. a título de salários perdidos após a data da consolidação médico-legal das lesões (31/12/2012).


10. Pelo exposto, julga-se o recurso parcialmente procedente, decidindo:

a) Condenar a R. a pagar ao A. indemnização por danos patrimoniais futuros correspondentes à perda de capacidade geral de ganho/“dano biológico”, no montante de € 170.000 (cento e setenta mil euros), no qual se devem descontar as quantias pagas pela R. a título de salários perdidos após a data da consolidação médico-legal das lesões (31/12/2012);

b) Manter o mais decidido no acórdão recorrido.


Custas pelas partes, na acção e no recurso, na proporção do decaimento.


Lisboa, 25 de Maio de 2017


Maria da Graça Trigo (Relator)

João Bernardo

Oliveira Vasconcelos