Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
567/11.8TVLSB.L1.S2
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: MARIA DA GRAÇA TRIGO
Descritores: CONTRATO DE COMPRA E VENDA
CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
CONTRATO MISTO
CONTRATO DURADOURO
RESOLUÇÃO DO NEGÓCIO
JUSTA CAUSA
INDEMNIZAÇÃO
NEXO DE CAUSALIDADE
INTERESSE CONTRATUAL POSITIVO
INTERESSE CONTRATUAL NEGATIVO
RECONHECIMENTO DA DÍVIDA
ÓNUS DA PROVA
ÓNUS DE ALEGAÇÃO
Data do Acordão: 05/17/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADAS AS REVISTAS
Área Temática:
DIREITO CIVIL – DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / FONTES DAS OBRIGAÇÕES / NEGÓCIOS UNILATERAIS / GESTÃO DE NEGÓCIOS / CUMPRIMENTO E NÃO CUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES / NÃO CUMPRIMENTO / FALTA DE CUMPRIMENTO E MORA IMPUTÁVEIS AO DEVEDOR / MORA DO DEVEDOR.
Doutrina:
- Almeida Costa, Direito das Obrigações, Almedina, 12.ª Edição, 2009, p. 1044-1047;
- Ana Prata, Cláusulas de Exclusão e Limitação da Responsabilidade Contratual, Almedina, 1985, p. 479-495;
- Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Volume II, Almedina, 7.ª Edição, 1997, p. 109-112;
- Baptista Machado, Pressupostos da Resolução por Incumprimento – referência ao “direito à indemnização” cumulável com a resolução, in Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor J. J. Teixeira Ribeiro, II Iuridica, Coimbra, 1979, p. 393-401;
- Baptista Machado, Pressupostos da Resolução por Incumprimento, Obra Dispersa, Volume I, Braga, 1991, p. 187 ; R.L.J. 118, p. 280 ; Anotação ao acórdão do STJ de 8-11-1983, RLJ, Ano 118º, p. 277-278 e 318 ; Pressupostos da Resolução por Incumprimento», Obra Dispersa, Volume I, Braga, 1991, p. 143-144 ; Resolução do Contrato no Direito Civil, Do Enquadramento e do Regime, Coimbra, 1982, p. 199 a 214 ; Lições de Cumprimento e Não Cumprimento das Obrigações, Coimbra Editora, 1.ª Edição de 2011, p. 280-306, 2.ª Edição, Universidade Católica Editora, Porto, de 2017, p. 302, 358-384;
- Calvão da Silva, Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória, Almedina, 1987, p. 323 ; Responsabilidade Civil do Produtor, Almedina, 1990, p. 248;
- Carlos Mota Pinto, Cessão da Posição Contratual, Almedina, 1982, p. 412;
- Cunha Gonçalves, Tratado do Direito Civil, Volume IV, Coimbra Editora, 1932, p. 497;
- Dias Ferreira, Código Civil Português anotado, Volume II, 2.ª edição, Imprensa Nacional, 1895, p. 24;
- Ferreira Pinto, Contratos de Distribuição, Da tutela do distribuidor integrado em face da cessação do vínculo, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2013, p. 105 e ss.;
- Francisco Pereira Coelho, Obrigações – Sumários das Lições ao Curso de 1966-1967, edição policopiada, Coimbra, 1967, p. 230;
- Guilherme Moreira, Instituições do direito civil português, Das Obrigações, II, Coimbra Editora, 1925, p. 566 e ss.;
- Inocêncio Galvão Telles, Impossibilidade superveniente e cumprimento imputáveis ao devedor, BMJ n.º 47 (1955), p. 28 e ss. ; Manual de Direito das Obrigações, Tomo I, 2.ª edição, Coimbra Editora, 1965, p. 248 e ss. ; Direito das Obrigações, ª Edição Coimbra Editora, 1982, p. 368-369 ; 7.ª Edição, 1997, p. 463;
- Joana Farrajota, A Resolução do Contrato sem Fundamento, Almedina, 2015, p. 357-361;
- Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, Direito das Obrigações, IX, Almedina, 3.ª Edição, 2017, p. 937-949;
- Menezes Leitão, Direito das Obrigações, Almedina, Volume I, 5ª edição, p. 136 ; Volume II, Almedina, 10.ª Edição, 2017, p. 259-264;
- Nuno Pinto Oliveira, Princípios de Direito dos Contratos, Coimbra Editora, 1.ª Edição, 2011, p. 882 e ss;
- Parecer sobre Denúncia e Direito da Resolução de Contrato de Locação de Estabelecimento Comercial, Obra Dispersa, Volume I, Scientia Ivridica, Braga, 1991, p. 662 e ss..
- Paulo Mota Pinto, Interesse Contratual Negativo e Interesse Contratual Positivo, Volumes I e II, Coimbra Editora, 2008;
- Pedro Romano Martinez, Da Cessação do Contrato», Almedina, 2005, p. 79-80 ; Direito das Obrigações – Contratos, Almedina, 2ª edição, p. 363;
- Pessoa Jorge, Direito das Obrigações, Volume I, Universidade de Lisboa, 1971/1972, p. 656 ; Ensaio sobre os Pres-supostos da Responsabilidade Civil, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, Lisboa, 1972, p. 380;
- Pinto de Oliveira, Princípios de Direito dos Contratos, Coimbra Editora, 2011, p. 869-874;
- Pinto Monteiro, Cláusula Penal e Indemnização, Almedina, 1990, p. 694;
- Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Volume II, 4.ª Edição, Coimbra Editora, 1997, p. 58;
- Ribeiro de Faria, Direito das Obrigações, Volume II, Almedina, 1990, p. 424-435 ; A Natureza do Direito de Indemnização Cumulável com o Direito de Resolução dos Arts. 801.º e 802.º do Código Civil – texto de 4/3/1993, Revista Direito e Justiça da Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa, Volume, p. 1636 a 1638 ; VIII, Tomo I, 1994, p. 57 a 89 ; A natureza da indemnização no caso de resolução do contrato – Novamente a questão, Estudos em Comemoração dos Cinco Anos da Faculdade de Direito da Universidade do Porto, Coimbra Editora, 2001, p. 11, 30 e 88;
- Romano Martinez, Da Cessação do Contrato, Almedina, 3.ª Edição, 2017, p. 195-204;
- Vasco Lobo xavier, Venda a prestações. Algumas notas sobre os artigos 934.º e 935.º do Código Civil, RDES Ano 21.º, 1977, p. 199-266;
- Vaz Serra, Anotação ao acórdão do STJ, de 30/06/1970, RLJ, Ano 104, p. 204-208 ; anotação ao acórdão do STJ de 05/12/1967, RLJ Ano 101, p. 264 e ss..
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 458.º, 562.º, 563.º, 566.º, N.º 2 E 808.º.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


- DE 08/11/1983, IN RLJ, ANO 118, P. 271-272, 317-320 E 328-332;
- DE 15/11/2007, PROCESSO N.º 07B2998, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 12/02/2009, PROCESSO N.º 08B4052, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 06/05/2010, PROCESSO N.º 11/2002.P1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 01-07-2010, PROCESSO N.º 2164/06.OTVPRT.P1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 21/10/2010, PROCESSO N.º 1285/07.7TJVNF.P1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 15/12/2011, PROCESSO N.º 1807/08.6TVLSB. L1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 12/03/2013, PROCESSO N.º 1097/09.3TBVCT.G1. S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 04/06/2015, PROCESSO N.º 4308/10.9TJVNF.G1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 28/01/2016, PROCESSO N.º 136/12.5TVLSB.L1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 08/09/2016, PROCESSO N.º 21769/10.9T2SNT.L1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 24/01/2017, PROCESSO N.º 1725/13.6TVLSB.C1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 15/02/2018, PROCESSO N.º 7461/11.0TBCSC.L1.S1.


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ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA:


- DE 16/01/1990, IN CJ, ANO XV, TOMO I, P. 138.
Sumário :
I - O acordo dos autos, celebrado entre a autora e o Consórcio constituído pela 1.ª ré e por uma outra sociedade, denominado “Contrato Misto de Fornecimento de Equipamentos e Prestação de Serviços” – tendo por objecto a realização do projecto, fornecimento e construção “chave-na-mão” de uma central termoeléctrica de produção de energia eléctrica, mas também a prestação de serviços constante do caderno de encargos (seguros de transporte, montagem e testes, instrução e formação do pessoal de operação e de manutenção e assessoria técnica ao dono da obra) – corresponde a um contrato misto de empreitada e de prestação de serviços.

II - A natureza das prestações a que o Consórcio se obrigou e o facto de as mesmas se prolongarem no tempo confere ao referido contrato características próximas das relações contratuais duradouras – designadamente as exigências de acrescida confiança recíproca entre as partes – sendo-lhe, portanto, aplicável a doutrina da resolução com fundamento em justa causa.

III - Os pressupostos da resolução por justa causa não se confundem com os pressupostos do regime da transformação da mora em incumprimento definitivo (art. 808.º do CC), posto que o juízo de verificação da justa causa resolutiva assenta na avaliação da ruptura da relação de confiança entre as partes e não na aferição da subsistência ou não do interesse do credor na prestação.

IV - Revelando a factualidade provada que, face aos sucessivos e gravosos incumprimentos do Consórcio, a confiança da autora, na competência e na capacidade do devedor para levar a bom termo a tarefa, ficou irremediavelmente afectada, é de concluir que se tornou inexigível a subsistência do vínculo contratual, o que consubstancia justa causa resolutiva, sem necessidade de recurso prévio à interpelação admonitória exigida pelo regime do art. 808.º do CC.

V - A resolução do contrato é compatível com a indemnização pelo interesse contratual positivo, que só não será admitida quando revele desequilíbrio grave na relação de liquidação ou se traduza em benefício injustificado para o credor, ponderado à luz do princípio da boa fé, hipótese em que se indemnizará antes pelo interesse contratual negativo.

VI – Contudo, a indemnização pelo interesse contratual positivo não é cumulável com a indemnização pelo interesse contratual negativo: a primeira visa colocar o credor/lesado na situação em que estaria se o contrato tivesse sido pontualmente cumprido; ao passo que a segunda visa antes colocá-lo na situação em que estaria se o contrato não tivesse sido celebrado.

VII – Indemnizar pelo interesse contratual positivo, traduz-se, na prática, em reconhecer “o primado do princípio geral da obrigação de indemnizar o credor lesado, consagrado no artigo 562.º do CC, segundo o método da teoria da diferença acolhido pelo artigo 566.º, n.º 2, do mesmo diploma, como escopo fundamental reintegrador dos interesses atingidos pelo incumprimento do contrato”. (cfr. Acórdão do STJ de 15/02/2018, proc. n.º 7461/11.0TBCSC.L1.S1).

VIII - A falta de demonstração do nexo causal entre o cumprimento defeituoso/mora do Consórcio devedor e os custos acrescidos de que a autora pretende ser ressarcida determina, à luz da teoria da causalidade adequada consagrada no nosso direito (art. 563.º do CC), a improcedência dessa pretensão indemnizatória.

IX - Face aos princípios gerais da obrigação de indemnizar – princípio da reparação integral dos danos e princípio da proibição de enriquecimento do lesado – a indemnização pelo interesse contratual positivo não permite duplicar a indemnização por uma mesma categoria de danos, como sucederia se fossem indemnizados os custos de financiamento, de pessoal e administrativos em que a autora incorreu derivados da inactividade da Central e que não tiveram qualquer contrapartida e, simultaneamente, fossem aplicadas as penalidades contratuais pelos atrasos invocados; só assim não seria se a autora tivesse alegado e demonstrado que aquela indemnização e a pena convencional moratória se destinavam a reparar danos distintos.

X - O regime do art. 458.º do CC dispensa o credor do ónus de provar a causa da dívida, mas não o dispensa do ónus de alegar tal causa, a qual integra os factos constitutivos do direito que invoca.

Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça




1. Central Termoelétrica de Biomassa AA, S.A. instaurou a presente acção declarativa, com processo ordinário, contra BB - Instalações industriais, S.A. e CC, SGPS, Lda, peticionando:

“(i) Ser a 1ª Ré condenada a pagar à A. a quantia de € 15.844.338,00 (quinze milhões, oitocentos e quarenta e quatro mil, trezentos e trinta e oito euros) acrescida de juros vincendos calculados à taxa legal supletiva até integral e efectivo pagamento;

(ii) Ser declarada a ineficácia, em relação à Autora, da alienação para a 2ª Ré das participações sociais que até Junho de 2009 eram detidas pela 1ª Ré nas sociedades Parque Eólico de DD, Lda., EE - Produção e Gestão de Enegia, Lda, FF, Lda. e GG Energia, Lda. com o consequente direito de executar os referidos bens no património da 2ª Ré e de praticar sobre os mesmos os actos de conservação da garantia patrimonial autorizados por lei”.

Alegou a A., em síntese, o seguinte:

      - A A. e um Consórcio, em regime de responsabilidade solidária, formado pela 1ª R. e pela sociedade dinamarquesa “HH A/S", celebraram, no dia 9 de Junho de 2006, o contrato intitulado “Contrato Misto de Fornecimento de Equipamento e Prestação de Serviço”, tendo por objecto a realização do projecto, fornecimento e construção “chave-na-mão”, de uma central termoeléctrica de produção de energia eléctrica com uma potência de 10 MW, usando como combustível principal a biomassa, localizada na freguesia de …, concelho de …, distrito de Aveiro, bem como as prestações de serviços referidas no caderno de encargos e em conformidade com a proposta do adjudicatário.

        Todavia, a 1ª R. e a HH violaram os deveres que para si resultavam daquele contrato, realizando tardia e defeituosamente as prestações a que estavam adstritas, de modo que nem em 04/06/2010, data em que a A. resolveu o contrato, a Central se encontrava em condições de ser provisoriamente recepcionada pela A., quando a data inicialmente acordada para o efeito era Outubro de 2008.

O valor dos prejuízos sofridos pela A. em consequência do incumprimento do contrato pela 1ª R. e pela HH é de € 14.022.583,00, valor que engloba as seguintes parcelas:

- Custos com o diagnóstico e execução dos trabalhos para colocar a Central em condições de funcionamento: € 4.473.973,00;

- Custos de financiamento, de pessoal e administrativos que não tiveram qualquer contrapartida, uma vez que a Central deveria ter entrado em funcionamento industrial em Outubro de 2008 e só no final de 2010 ficou em condições de iniciar a sua exploração: € 2.585.058,00;

- Perda de vendas (lucros cessantes) devidos ao atraso no montante de € 4.749.832,00;

- Ineficiências e sobrecustos de carácter permanente no valor de € 2.213.721,00.


Para além destes valores referentes a danos sofridos, reclama a A.:

- A quantia de € 58.685,00 a título de custos debitados ao Consórcio de que este reconheceu ser devedor;

- A quantia de € 1.763.070,00 a título de penalidades contratuais.


Alega também a A. que a 1ª R. detinha participações no capital de várias sociedades, participações que alienou à 2ª R. em Junho de 2009 com a intenção de subtrair esses activos do seu património, quando para si já era evidente que a A. iria reclamar indemnizações pelo incumprimento do contrato. Pede que seja declarada a ineficácia, em relação à A., da alienação para a 2ª Ré de tais participações sociais.

        

      Contestaram as RR. que arguiram a incompetência do tribunal em razão da matéria. Impugnaram as RR. a factualidade alegada pela A., sustentando, em síntese, não ser imputável à 1ª R. ou ao Consórcio, qualquer incumprimento do acordado e que a A. não pagou a totalidade das prestações do preço devido, retendo em seu benefício € 1.763.070,00 ; bem como que a aquisição das participações sociais das empresas do grupo pela 2ª R. se insere numa estratégia desse mesmo grupo.

Em reconvenção pediu a 1ª R. que a A. seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 1.312.700,00, correspondente ao remanescente do preço devido (de acordo com o critério de imputação do direito ao preço a cada uma das empresas do consórcio adoptado no Acordo Tripartido), tendo em conta o incumprimento culposo do contrato, dada a ilícita “rescisão” do mesmo pela A. em 04/06/2010, valor aquele acrescido do valor dos juros à taxa supletiva prevista para créditos de que sejam titulares empresas comerciais, vincendos desde a data da notificação da reconvenção à A. e até integral pagamento.

Pediram também as RR. a condenação da A. como litigante de má fé em multa e em indemnização de valor não inferior a € 50.000,00.

A A. replicou, pugnando pela improcedência da excepção de incompetência material, assim como pela improcedência do pedido reconvencional, devendo a A. ser absolvida do mesmo.

Mais invocou a improcedência do pedido de condenação da A. como litigante de má fé, pedindo que sejam as RR. condenadas como litigantes de má fé no pagamento de multa e em indemnização não inferior a € 50.000,00 para cada uma das RR.

As RR. treplicaram, pugnando a final pela improcedência do pedido de condenação das RR. em litigância de má fé.

    Por despacho saneador de fls. 432, foi julgada improcedente a excepção da incompetência em razão da matéria; foram fixados os factos assentes e elaborada base instrutória.

     A fls. 1002-1003 a A. reduziu o pedido formulado na alínea (i) do petitório, pedindo que as RR. sejam condenadas a pagar-lhe a quantia de € 11.094.506,00, por haver deduzido a parcela de € 4.749.832,00, peticionada inicialmente a título de perda de vendas (lucros cessantes) devidos ao atraso, quantia aquela acrescida de juros vencidos e vincendos à taxa legal supletiva para os créditos de que sejam titulares as empresas comerciais até pagamento integral e efectivo.

A fls. 1288 foi proferida sentença que, a final, decidiu nos seguintes termos:

“Por todo o exposto, julgo a presente ação declarativa intentada por CENTRAL TERMOELÉTRICA DE BIOMASSA AA, S.A., contra BB - INSTALAÇÕES INDUSTRIAIS, S.A., e CC, SGPS, LDA parcialmente procedente, por parcialmente provada, em consequência do que:

3.1 – condeno a 1ª ré a pagar à autora a quantia que vier a ser liquidada em sede de incidente de liquidação, a título de indemnização correspondente aos custos por esta despendidos com o diagnóstico e a execução dos trabalhos inerentes às reparações e modificações necessárias para que a Central pudesse entrar em funcionamento, até ao limite máximo de € 4.473.973,00 (quatro milhões e quatrocentos e setenta e três euros);

3.2 – condeno a 1ª ré a pagar à autora a quantia que vier a ser liquidada em sede de incidente de liquidação, a título de indemnização correspondente aos custos de financiamento, de pessoal e administrativos em que a autora incorreu desde Outubro de 2008 e até final de 2010, derivados da inatividade da Central e que não tiveram qualquer contrapartida, até ao limite máximo de 2.575.433,00 (dois milhões e quinhentos e setenta e cinco euros);

3.3 – À indemnização global que vier a ser apurada em sede de incidente de liquidação acrescerão juros de mora à taxa supletiva de juros moratórios relativamente aos créditos de que sejam titulares empresas comerciais, contados a partir da data em que a 1ª ré for notificada da sentença que, no âmbito daquele incidente fixar o montante indemnizatório, até efetivo e integral pagamento;

3.4 – no mais, absolvo ambas as rés de tudo o mais que contra elas vem peticionado pela autora.


*


Julgo a reconvenção deduzida pela 1ª ré improcedente, por não provada, em consequência do que absolvo a autora do pedido reconvencional.

*


Absolvo a autora do pedido de condenação em multa e indemnização por litigância de má fé”


     Inconformadas, apelaram a A. e as RR., pedindo ambas as partes a modificação da decisão relativa à matéria de facto e a reapreciação da decisão de direito.

      Por acórdão de fls. 1506 foi alterada pontualmente a decisão relativa à matéria de facto e, a final, proferida a seguinte decisão:

“Face ao exposto acordam os Juízes desta Relação em, sem prejuízo das pontuais alterações da decisão sobre a matéria de facto efectuadas, julgar improcedentes as apelações da A. e das RR., confirmando a sentença recorrida.


2. Veio a R. BB, S.A. interpor revista, por via excepcional, para o Supremo Tribunal de Justiça.

A A. Recorrida contra-alegou, pugnando pela inadmissibilidade do recurso.

Interpôs a A. recurso subordinado de revista.

      A fls. 1876, foi proferido acórdão da formação a que alude o nº 3, do art. 672º, do Código de Processo Civil, admitindo o recurso da R. BB, S.A. e remetendo a decisão quanto à admissibilidade do recurso subordinado da A. para o relator a quem viesse a ser distribuído o processo.

Por despacho de fls. 1892 foi admitido o recurso subordinado.


3. Formulou a R. BB, S.A. as seguintes conclusões quanto ao mérito do recurso:

iv. O douto Acórdão recorrido é nulo, nos termos do art° 195°, n°s 1 e 2, e na alínea d) do n° 1 do art° 615°, ambos do CPC, este último aplicável ex vi artº 666° do mesmo Código, quanto à decisão proferida sobre o ponto 72. dos factos (cfr. págs. 47 e 48) por julgar provado um facto que, embora alegado, não foi sequer selecionado no âmbito da matéria de facto relevante para a decisão da causa e, do mesmo passo, eliminar do processo um facto que foi dado por assente aquando da condensação do processo, incorrendo, consequentemente, em manifesta violação dos termos em que é admissível a aquisição processual de factos na instância recursória, com repercussão e influência no exame e na decisão da causa (cfr. parágrafos 49. a 61. supra).

v. É tendo presente toda a matéria de facto subjacente que deverão ser ponderadas as questões essenciais de Direito elencadas, razão pela qual supra se reproduziram e destacaram os factos que aparentam ter sido desconsiderados pelo douto Acórdão recorrido e que aqui sumariamente expõem: (a) a Autora sempre transmitiu manter o interesse no cumprimento do contrato e, consequentemente, na prestação da Ré/Recorrente (pontos 62. e 146.); (b) as partes firmaram um acordo que diferiu o prazo de execução da obra (ponto 24.); (c) à data da resolução promovida pela Autora a obra estava "praticamente concluída" (ponto 26.); (d) no primeiro semestre de 2009, a Central produziu eletricidade que foi exportada para a rede (ponto 141.) e, por último, (e) a Autora assumiu o compromisso, que não cumpriu, de assinar o "Auto de Fim de Montagem" que permitiria iniciar os testes de funcionamento da Central (pontos 61., 62. e 146.) - cfr. parágrafo 62. supra.

vi. Mesmo a entender-se que existiria uma justa causa de resolução, nos termos expostos no Acórdão recorrido, sempre a vontade manifestada pela Autora de, apesar dessa causa, exigir e receber a prestação da Ré, revelando não ter perdido o interesse nesse cumprimento ainda que atrasado, torna imprescindível a interpelação admonitória prévia à resolução legítima do contrato (cfr. parágrafos 64. a 81. supra).

vii. A cumulação das três indemnizações cuja condenação de pagamento é mantida pelo douto Acórdão recorrido - isto é, uma por mora fixada em cláusula penal, outra também por mora mas fundada em danos a liquidar em execução de sentença, segundo as regras gerais, e pretendendo colocar o credor na situação em que se encontraria se o contrato tivesse sido pontualmente cumprido, e uma terceira indemnização pelo incumprimento definitivo, visando colocar o credor na situação em que se encontraria se o contrato não tivesse sido celebrado -, sem que seja prevista (ou possível) a restituição da prestação efetuada pelo devedor, apresenta graves e incontornáveis incongruências, representando excessivos e injustificados benefícios para o credor que ofendem a melhor aplicação do Direito e o mais elementar sentido de justiça (cfr. parágrafos 82. a 98. supra).

viii. A alegação, a prova e o julgamento, in casu por referência aos alegados danos da Autora, deverão sempre e imprescindivelmente incidir sobre acontecimentos ou factos concretos, desde logo como pressuposto essencial para assegurar o exercício efetivo do contraditório pela contraparte (cfr. parágrafos 99. a 106. supra).

ix. Não tendo ocorrido a conversão da mora em incumprimento definitivo e tendo a Autora promovido a resolução do contrato, conclui-se que só poderá ser assacada à Ré responsabilidade pelos danos advenientes do atraso de cumprimento verificado, evidenciando os elementos constantes dos autos que essa responsabilidade se encontra já devidamente ressarcida por força do acionamento da respetiva cláusula penal prevista contratualmente.

x. Em face de todo o exposto, verifica-se que o douto Acórdão recorrido incorre em violação do disposto nos art°s 804°, 805°, 808°, 810°, 812° e 562° a 566° do Código Civil, bem como do disposto nos art°s 5°, 410°, 411° e 662° do Código de Processo Civil, configurando, neste âmbito, as nulidades previstas no art° 195° e na alínea d) do n° 1 do art° 615°, ambos do CPC, aplicável ex vi art° 666° do mesmo Código.

xi. Em conformidade, deverá o Acórdão recorrido ser revogado e substituído por outro que julgue:

- Nula a decisão sobre o ponto 72. dos factos provados, mantendo-se, nesta questão, a decisão proferida na sentença da 1ª Instância;

- Ilegalmente resolvido o contrato dos autos, por falta de interpelação admonitória ao devedor;

- Ilegal, in casu, a condenação cumulativa nas indemnizações dos danos referentes a atraso no cumprimento (tanto a fixada em cláusula penal como a fundada nas regras gerais) e a incumprimento definitivo;

- Não provados quaisquer acontecimentos ou factos concretos suscetíveis de indemnização, a título de danos e/ou prejuízos; e, consequentemente,

- Improcedentes os pedidos da Autora, absolvendo a Ré/Recorrente.

 

      A A. Recorrida contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso da R. BB, S.A. e, consequentemente, pela manutenção, nesta parte, da decisão do acórdão recorrido.


No recurso subordinado, a A. formulou as seguintes conclusões:

1) A 1ª Ré deve ser condenada a pagar à Autora a quantia de € 58.685,00, a que se alude no ponto 67 dos Factos Provados do Acórdão recorrido, na medida em que reconheceu dever essa quantia à Autora;

2) A admissão, por acordo, da referida factualidade, equivale ao reconhecimento de dívida, nos termos e para os efeitos previstos no art.° 458.°, n.° 1, do Código Civil, sendo certo que, no caso concreto dos autos, consta também do ponto 67 dos factos provados identificados no Acórdão recorrido a causa da mencionada dívida: corresponde a custos que foram debitados pela Autora à 1ª Ré e à HH e que estas reconheceram dever;

3) A 1ª Ré deve ser condenada a pagar à Autora a quantia de € 1.763.070,00 correspondente a penalidades contratuais aplicadas, a que se alude nos pontos 40, 44 e 64 dos Factos Provados do Acórdão recorrido da sentença;

4) Para efeitos de apuramento do âmbito da indemnização devida pela 1ª Ré à Autora, o douto Acórdão recorrido seguiu a orientação no sentido de que a indemnização pela destruição da relação contratual, por efeito da resolução não está limitada ao interesse contratual negativo, podendo ainda abranger, em certos casos, os danos positivos, o interesse contratual positivo, desde que tal não acarrete qualquer situação geradora de desequilíbrios ou benefícios injustificados;

5) O montante das penalidades aplicadas em virtude atraso do Consórcio com a data de entrada em serviço industrial constitui uma rubrica da indemnização que deve ser atendida tendo em consideração a orientação seguida pelo douto Acórdão recorrido a este respeito, na medida em que respeitam a danos positivos, apurados com base em cláusula penal estabelecida por acordo entre a 1ª Ré e a Autora

6) A indemnização cumulada com a resolução contratual, ao abrigo do disposto no art.° 801.°, n.° 2, do Código Civil, deverá abranger todos os danos e prejuízos que a parte não faltosa sofreu em virtude do incumprimento que justificou a resolução contratual;

7) Os sobrecustos de carácter permanente a que se alude no ponto 121 dos Factos Provados do Acórdão recorrido configuram-se como danos subsequentes, relacionados com os defeitos da prestação pela 1ª Ré e pela ICEM a nível da concepção do projecto elaborado pelo Consórcio liderado pela Ré, que devem ser indemnizados à Autora, na medida em que resultam do incumprimento que levou à resolução contratual;

8) A 1ª Ré deve ser condenada a pagar à Autora a quantia que vier a ser liquidada em sede de incidente de liquidação, a título de indemnização correspondente às ineficiências e sobrecustos de carácter permanente, designadamente de mão-de-obra, de combustível, de equipamento, de manutenção do equipamento e de consumo de energia que implicam um sobrecusto adicional durante a vida útil esperada do equipamento da Central, resultante da necessidade de reconfiguração do sistema de alimentação da caldeira para operacionalização da Central, em virtude dos defeitos de concepção do projecto elaborado pelo Consórcio liderado pela 1ª Ré, até ao limite máximo de € 2.213.721,00;

9) A 1ª Ré deve também ser condenada a pagar à Autora os juros de mora que acrescem ao montante indemnizatório que vier a ser apurado relativamente a tais sobrecustos, à taxa supletiva de juros moratórios para os créditos de que sejam titulares empresas comerciais, contados da data em que 1ª Ré for notificada da sentença que, no âmbito do incidente de liquidação, fixar o montante indemnizatório, até efectivo e integral pagamento;

10) A sentença recorrida violou o disposto no art.°s 458.°, n.° 1, e 801.°, n.° 2 do Código Civil.

Termos em que deve o presente recurso de apelação ser julgado procedente, devendo, consequentemente, o Acórdão recorrido ser parcialmente revogado, nas partes ora impugnadas, e parcialmente substituído por douto Acórdão no sentido das conclusões acima expostas.


    A R. Recorrida BB, S.A. contra-alegou, formulando as seguintes conclusões:

A. O Acórdão recorrido não violou o disposto nos artigos 458.°, n.º 1, e 801.°, n.º 2 do Código Civil nos termos invocados pela Autora.

B. No que respeita ao pedido condenatório no montante de € 58.685,00, apesar de a 1ª RÉ ter reconhecido a dívida nos termos ali previstos, não logrou a AUTORA fazer prova dos factos essenciais constitutivos da causa de pedir deste pedido, razão pela qual o mesmo só poderia improceder, carecendo o Tribunal de Recurso de quaisquer elementos para decidir sobre esta matéria. Acresce ainda que mesmo que se entendesse estarem presentes os factos constitutivos essenciais ao reconhecimento da obrigação de pagamento, tal dívida emerge das relações contratuais do consórcio, pelo que não poderá ser exigível à luz de uma relação de liquidação (cfr. § 4 a 19. supra).

C. Quanto ao pedido condenatório no montante de € 1.763.070,00, sempre seria manifestamente ilegal, abusivo e desproporcionado fazer acrescer à condenação da 1ª RÉ a ressarcir danos decorrentes de atraso no cumprimento, a condenação ao pagamento da cláusula penal moratória (cfr. § 20. a 28. supra).

D. Por fim, a AUTORA pretende ainda ser indemnizada pelos custos que terão emergido das opções que tomou quanto "às reparações e às modificações implementadas na Central' e que, deste modo, nunca poderão ser imputadas à 1ª RÉ. Acresce ainda que a fundamentação que apresenta para condenação da 1ª RÉ: no pagamento após a resolução do contrato, apenas vai no mesmo sentido já acolhido na decisão recorrida, não justificando, ou sequer permitindo por nenhuma forma, a imputação à 1ª RÉ das "ineficiências e sobrecustos" (cfr. § 29. a 40. supra).


       Cumpre decidir.


4. Vêm dados como provados os factos seguintes (mantêm-se a identificação e a redacção das instâncias):


1. Em 2 de Março de 2005, a autora lançou um Concurso Público Internacional com vista a adjudicar a construção de uma central de produção de energia elétrica englobando a elaboração do projeto de conceção, os trabalhos de construção civil e o fabrico, fornecimento, transporte, montagem, ensaio e colocação em serviço do conjunto completo dos equipamentos mecânicos e elétricos destinados à produção de energia a partir da queima de resíduos florestais (biomassa) tendo para o efeito divulgado um programa de concurso, respetivo caderno de encargos e condições técnicas especiais;

2. Para efeitos da conceção/construção da Central foram estipulados os seguintes princípios orientadores:

a) Minimização dos impactes ambientais e sociais;

b) Utilização de equipamentos já testados à escala industrial e disponíveis comercialmente;

c) Elevada disponibilidade e fiabilidade de todos os componentes da central;

d) Máxima produção de energia elétrica disponível para venda;

e) Custos mínimos de operação e manutenção;

f) Baixos custos totais de investimento.

3. Exigiu-se também que a tecnologia a propor pelos concorrentes já tivesse sido aplicada com sucesso numa instalação em operação há mais de um ano e com uma capacidade mínima e características similares àquelas definidas para o projeto em questão;

4. As condições técnicas especiais exigiam que a Central a projetar fosse constituída pelos seguintes elementos:

a) Um sistema de alimentação de combustível;

b) Uma caldeira e seus equipamentos auxiliares onde viria a ser queimada a biomassa e produzido o vapor;

c) Uma turbina;

d) Um alternador;

e) Respetiva instalação elétrica e equipamento de controlo;

f) Um condensador por aeroarrefecedores;

g) Unidade de tratamento de água;

h) Unidade de tratamento de gases;

i) Chaminé;

j) Um sistema central de comando e controlo;

k) Um sistema para permitir o aproveitamento de efluentes térmicos quer sob a forma de vapor, quer sob a forma de água quente; e ainda;

l) Um dispositivo de descarga de cinzas e transporte das mesmas para contentores colocados em áreas separadas;

5. Tudo para seguir o seguinte esquema funcional previsto no ponto 2.1.3 das Condições Técnicas Especiais:

a) Os resíduos provenientes da limpeza das matas deveriam ser adquiridos a empresas ou particulares que os entregariam na Central ou em centros de receção localizados nos concelhos próximos e os resíduos de fábricas deveriam ser adquiridos às empresas da zona que laboram naquela área e que produzem esses resíduos, sendo transportados para a Central em viaturas adequadas;

b) As viaturas de transporte que chegariam à Central, deveriam passar por um sistema de pesagem, após o qual seriam encaminhados pelos operadores da Central para o parque de armazenagem/pavilhão de stocagem.

c) O depósito de armazenagem de combustível deveria ser suficiente para o armazenamento da biomassa necessária ao funcionamento da Central durante uma semana;

d) As viaturas de transporte, à saída da Central (descarregadas), deveriam passar novamente pelo sistema de pesagem, para permitir determinar a carga de biomassa efetivamente entregue;

e) Alguns resíduos necessitariam de ser sujeitos a operações de estilhaçar, moer, secar e/ou mistura;

f) Outros resíduos deveriam chegar à Central já preparados de modo que necessitariam apenas de armazenamento;

g) A biomassa (combustível) deveria ser transportada, através de transportadores, para o sistema de alimentação, que consistiria num silo e num transportador que alimentaria a caldeira, onde seria queimada a biomassa;

h) O sistema de alimentação deveria controlar a todo o momento a quantidade de combustível que se introduziria na caldeira, por meio de um tapete transportador de doseamento e alimentação automática;

i) Os produtos de combustão, sob a forma de gases quentes, deveriam ser arrefecidos por radiação e convecção na caldeira, [nos sobreaquecedores] no economizador, passando posteriormente ao sistema depuração de gases, antes de serem expulsos pela chaminé;

j) A caldeira produziria vapor que deveria ser sobreaquecido no sobreaquecedor da caldeira;

k) O vapor produzido na caldeira deveria ser usado para acionar a turbina a vapor, que por sua vez, acionaria o gerador elétrico;

l) O vapor saído da turbina deveria ir ao condensador onde passaria ao estado líquido por ação do sistema de arrefecimento constituído por aeroarrefecedores;

m) Os condensados deveriam ir ao sistema de tratamento de água e daqui voltariam à caldeira através da bomba de água de alimentação à caldeira;

n) A Central deveria ter um princípio de funcionamento em tudo similar a qualquer outra Central de ciclo a vapor produzindo energia elétrica;

o) Apenas o Combustível utilizado seria biomassa, pelo que seriam diferentes unicamente os órgãos e equipamentos que lidariam com as fases iniciais do processo de preparação, manuseamento e queima de combustível;

p) Em termos gerais, deveria ser assegurado que os materiais inertes, como sejam o vidro, as pedras, os metais sejam separados em subsistemas do sistema global;

q) As cinzas, resultantes do processo da queima, deveriam ser transportadas para contentores, colocados em área separada e especialmente preparada para permitir o acesso aos camiões que as iriam transportar para serem devolvidos à floresta os nutrientes que compõem as cinzas;

r) A instalação de exaustão deveria ser composta por um ventilador que extrairia os fumos da combustão e, depois de passar por um sistema depurador de fumos, os descarregaria para a atmosfera através de uma chaminé;

s) O sistema depurador de fumos seria constituído por um conjunto de ciclones em série com um conjunto de filtros de mangas ou electrofiltros;

t) Admitindo que seriam exploradas ao limite as capacidades da Central, quanto ao fornecimento de vapor a terceiros e que não houvesse retorno de condensados, haveria necessidade de água de reposição se, de facto, se viessem a concretizar os aproveitamentos térmicos admitidos;

u) A água, de alimentação da caldeira, deveria passar por uma unidade de Tratamento de água formada por uma unidade de osmose inversa preferencialmente ou por um grupo de desmineralização, em alternativa;

v) A Unidade de Tratamento de água deveria funcionar de forma totalmente automática e dispor de capacidade suficiente para abastecer o processo com água com as características pretendidas;

w) Deveria existir um tanque de armazenamento de água desmineralizada;

x) Quando a Central estivesse a funcionar à sua potência nominal a chaminé deveria lançar na atmosfera cerca de 200 toneladas por hora de gases que terão contaminantes principais: Partículas, NOx e CO;

y) Os gases conteriam também dióxido de carbono, mas a emissão deste gás não é de considerar nestas Centrais, uma vez que o CO2 libertado é equivalente ao absorvido pelo processo da fotossíntese na formação da Biomassa.

6. E para assegurar que através do descrito processo, a Central viesse a ser capaz de produzir 10MW de energia elétrica útil, como solução base, e 15MW de energia elétrica como variante;

7. A 1ª ré e a sociedade dinamarquesa "HH A/S" associaram-se em consórcio com regime de responsabilidade solidária e apresentaram no referido concurso a proposta que se encontra a fls. 181 a 305 do apenso A), cujo teor se dá por reproduzido, sendo o preço global constante de tal proposta de € 16.725.500;

8. À data da apresentação da proposta aludida, eram sócios da autora, então sociedade por quotas e entretanto convertida em sociedade anónima, II, Lda. (atualmente II, S.A.) e JJ;

9. E na mesma data era sócio da 1ª ré, também entretanto convertida em sociedade Anónima, KK;

10. No dia 14 de Março de 2006, carecendo a autora de capital para desenvolver os seus negócios, os seus sócios na altura e o KK celebraram entre si um acordo de parceria para o licenciamento, construção e exploração de uma central de produção de energia através da biomassa;

11. Tal parceria viria a concretizar-se através de um aumento de capital realizado em dinheiro por acionistas e não acionistas, tendo tal aumento de capital sido registado no dia 7 de Junho de 2006;

12. No dia 9 de Junho de 2006, a autora e o consórcio em regime de responsabilidade solidária constituído pela 1ª ré e pela HH celebraram o contrato que se encontra junto de fls. 328 a 334 do apenso A), cujo teor se reproduz, intitulado «Contrato Misto de Fornecimento de Equipamento e Prestação de Serviço»;

13. A cláusula 1ª do Contrato («Objecto»), contém, além do mais, os seguintes dizeres: «A obra é constituída pela realização do Projeto, Fornecimento e Construção "chave-na-mão" de uma central termoeléctrica de produção de energia elétrica com uma potência de 10 MW, usando como combustível principal a biomassa (...), localizada na freguesia de …, concelho de …, distrito de Aveiro, bem como pelas prestações de serviços referidas no caderno de encargos e em conformidade com a proposta do adjudicatário (…)»;

14. A cláusula 2ª do Contrato tem a seguinte redação: «Pelo presente contrato, o dono da obra confia ao adjudicatário a responsabilidade de executar a obra definida na cláusula anterior e o adjudicatário declara aceitar essa responsabilidade, o que fará de acordo com todas as condições especificadas nos documentos e obrigações contratuais definidas na cláusula 4ª»;

15. A cláusula 4ª do Contrato tem a seguinte redação:

«1. As obrigações do dono da obra e do adjudicatário decorrentes do contrato de obra regem-se pelo presente instrumento contratual e pelos seguintes documentos, pela ordem apresentada, e que fazem parte integrante deste contrato:

a) Proposta final, que se mantém válida e eficaz na presente data, e que constitui, para todos os efeitos, parte integrante do presente contrato.

b) Caderno de encargos, composto de programa de concurso, caderno de encargos e condições técnicas especiais»;

16. A cláusula 5ª do Contrato, sob a epígrafe «Prazo de conclusão», contém, além do mais, os seguintes dizeres:

«A obra a realizar no âmbito do presente contrato deverá ser integralmente executada de acordo com o estipulado nos documentos contratuais e de acordo com as datas seguintes:

a) Aprovação do plano de trabalhos definitivo: até 1/09/2006 ou até 90 dias depois da assinatura do presente contrato;

(…)

m) Receção provisória: até 1/3/2008 ou até 15 dias da entrada em Serviço Industrial;

n) Receção definitiva: para todos os equipamentos e instalações excetuando a turbina a vapor até 1/03/2010 ou dois anos após a data da receção provisória e para construção civil, estruturas metálicas e a turbina a vapor até 1/03/2013 ou cinco anos após a data da receção provisória»;

17. A cláusula 6ª do Contrato tem a seguinte redação:

«O preço total da Obra objeto do presente contrato é de 17.630.700,00 Euros, dos quais 8.942.200,00 Euros são pagáveis à BB – Instalações Industriais, Lda., e estão sujeitos a IVA à taxa legal em vigor, e 8.688.500,00, relativos a material importado, são pagáveis à HH A/S e não sujeitos a pagamento de IVA.

Os preços unitários são os indicados na lista de preços unitários anexa ao presente contrato como anexo I)»;

18. Nos termos da cláusula 10ª do Contrato, a 1ª Ré e a HH garantiram, sem qualquer encargo para a autora, na qualidade de dona de obra, a reparação da turbina a vapor, dos trabalhos de construção civil e das estruturas metálicas pelo prazo de 5 (cinco) anos, relativamente a defeitos originados por deficiente conceção, fabrico, construção ou montagem, sem prejuízo das garantias decorrentes das disposições legais aplicáveis;

19. (…) o mesmo acontecendo com as restantes instalações e equipamentos singulares, estes pelo prazo de 2 (dois) anos, sendo que tanto o início deste prazo, como o do prazo em 18., se contaria a partir da data da assinatura do auto de receção provisória da obra;

20. A cláusula 11ª do Contrato tem, além do mais, os seguintes dizeres:

«1. Caso o Adjudicatário se atrase com a data do início do serviço industrial, o Dono da Obra poderá aplicar uma penalidade de 0.25% do montante do contrato, por cada semana completa de atraso, nas primeiras quatro semanas de atraso contadas a partir da terceira semana de atraso, sendo as duas primeiras semanas de período de graça. Caso o atraso seja superior a seis semanas a penalidade será de 0,5% do montante do contrato por cada semana adicional de atraso»;

(…)

6. Cada uma das penalidades acima indicadas será limitada, individualmente a 10% do montante total do contrato, sendo o total das penalidades aplicáveis no âmbito do presente contrato 10% do montante total do mesmo»;

21. O nº 1 da cláusula 14ª do Contrato, sob a epígrafe «Rescisão do Contrato», tem a seguinte redação:

«1. O incumprimento, por qualquer das partes, dos deveres resultantes do Presente Contrato confere à outra parte, nos termos gerais do Direito, o direito de rescindir o contrato com justa causa e a ser indemnizado pelos prejuízos sofridos»;

22. Para efeitos de financiamento da obra, a autora, no dia 28 de Julho de 2006, contraiu junto do BANCO LL um empréstimo no montante de € 21.712.548,00, em regime de Project Finance, nos termos que constam do documento junto aos autos de fls. 353 a 359 do apenso A), cujo teor por reproduzido;

23. Para esse mesmo efeito, e na mesma data, a 1ª ré e a HH assinaram um Contrato Direto com o BANCO LL, o qual esse que se encontra junto de fls. 354 a 359 do apenso A) e cujo teor aqui se dá por reproduzido;

24. No dia 14 de Setembro de 2009 entre o BANCO LL, a autora, e o consórcio formado pela 1ª ré e pela HH, foi celebrado um acordo, denominado «Acordo Tripartido», constante de fls. 398-412 do apenso A) e traduzido a fls. 382-397 dos presentes autos; [alterado pela Relação]

25. A al. e) dos considerandos do acordo tripartido tem a seguinte redação: «A conclusão da construção e instalação da central de biomassa tem vindo a sofrer atrasos significativos, não tendo, ainda sido feita a respetiva receção provisória»;

26. A al. f) dos considerandos do acordo tripartido tem a seguinte redação: «Não obstante ainda não ter sido feita a receção provisória dos trabalhos, a construção da central já se encontra praticamente concluída, estando apenas em falta a conclusão de alguns equipamentos por forma a que se possa iniciar as operações comerciais»;

27. A cláusula 3. do acordo tripartido («PLANO DA OBRA») tem a seguinte redação:

«(a) O Dono da Obra e o Empreiteiro acordam entre si que a Recepção Provisória da Obra será feita parcelarmente, em duas fases, uma correspondente a todas as obras e equipamentos da Central de Biomassa, com excepção daqueles relativos ao sistema de pó de cortiça, cuja recepção provisória só ocorrerá à posteriori, numa segunda fase.

(b) O Dono da Obra e o Empreiteiro acordam entre si o calendário da obra e respectivo cronograma em anexo (Anexo I), tendo em vista as Recepções Provisórias parcelares da Obra, o qual compreende, para cada uma delas, as seguintes fases: (i) Auto de Fim de Montagem: (ii) Serviço Industrial; e (iii) Recepção Provisória»;

28. A cláusula 4.1 («Auto de Fim de Montagem») do acordo tripartido tem a seguinte redação:

«(a) Previamente ao Serviço Industrial da Central de Biomassa (excluindo o sistema de pó de cortiça), o Adjudicatário deverá concluir a remodelação e/ou reparação dos seguintes equipamentos:

(i) Sistema de controlo das gruas de alimentação, do sistema de alimentação e da caldeira;

(ii) Garras das gruas de alimentação à biomassa à caldeira e respectiva programação;

(iii) Sistema de alimentação da caldeira;

(iv) Queimador Diesel para arranque da caldeira;

(v) Sistema da grelha;

(vi) Sistema de remoção de cinzas;

(vii) Sistema de supervisão da central;

(viii) Sistema de tratamento de águas;

(ix) Sistema hidráulico;

(x) Funcionalidade de linha dos sopradores de fuligem e respectiva linha;

(xi) Tanque de alimentação de água/desgaseificador;

(xii) Compressor de ar;

(xiii) Cortina de água;

(xiv) Chaminé (escadas de segurança e plataformas para tomas de amostragem), se aplicável;

(xv) Equipamento de monitorização ambiental; e,

(xvi) Aplicação informática

(b) Para cumprir os requisitos da Directiva de Equipamentos sob Pressão (PED), terão que ser realizados testes de pressão a frio e de verificação das válvulas de segurança por forma a que seja obtido o respectivo certificado ele operação pela Entidade Certificadora»;

29. Posteriormente, a autora, a 1ª ré e a HH realizaram uma inspeção à Central;

30. A cláusula 4.3.1 do acordo tripartido tem a seguinte redação:

«Previamente ao início do Serviço Industrial da Central de Biomassa (excluindo o sistema de pó de cortiça), o Empreiteiro deverá entregar ao Dono da Obra os seguintes documentos, relativos à instalação, na sua versão original ou cópia certificada:

(i) Certificado de aprovação de construção ou documento de avaliação de conformidade;

(ii) Projecto da instalação actualizado, em duplicado;

(iii) Boletim de verificação do manómetro;

(iv) Certificado de ensaio e ajuste da válvula de segurança;

(v) Relatório de prova de pressão realizada há menos de 60 dias;

(vi) Relatório de inspecção técnica realizada ao equipamento e à instalação;

(vii) Plano detalhado da Recepção Provisória;

(viii) Telas finais/Desenhos, P&I D´s, PFD´s;

(ix) Manuais de operação e manutenção;

(x) Plano de formação dos trabalhadores do Dono da Obra;

(xi) Descrição do programa de controle;

(xii) Documentos relativos às especificações técnicas e à proposta nº2004281- § 8 “Services”»;

31. A cláusula 4.3.2 («Início de Serviço Industrial») do acordo tripartido tem a seguinte redação:

(a) O período de Serviço Industrial, destinado à verificação da operacionalidade da Central, terá a duração de 15 dias consecutivos durante o qual serão feitos Testes de Operacionalidade dos equipamentos (com exceção do sistema de pó de cortiça).

(b) Durante o período de Serviço Industrial, a Central de Biomassa será operada pelos trabalhadores do Dono da Obra, mas sobre a supervisão e responsabilidade do Empreiteiro, que se obriga a manter, a todo o tempo, técnicos qualificados na Central.

(c) Sem prejuízo da responsabilidade do Empreiteiro pela operação da Central de Biomassa durante o período de Serviço Industrial, o Dono da Obra disponibiliza dois operadores da caldeira em simultâneo, um dos quais deverá estar devidamente licenciado para operar uma central de biomassa de 10 MW, sob a supervisão e responsabilidade elo Empreiteiro.

(d) Durante o período de Serviço Industrial, o Empreiteiro apenas poderá proceder à interrupção da operação da Central de Biomassa no máximo por 3 (três) vezes e por um período máximo e acumulado de 72 horas, a fim de efectuar as reparações e correções que lhe sejam imputáveis.

(e) Caso os limites supramencionados, de horas (mais de 72 horas) ou número de vezes (mais de três vezes) sejam excedidos, os testes de verificação da operacionalidade da Central de Biomassa serão considerados insatisfatórios devendo o Empreiteiro proceder à imediata correção e/ou reparação necessárias para que se possa dar início, o mais rápido possível, a um novo período de testes.

(f) Não obstante o supra referido, o Empreiteiro terá um máximo de 2 (dois) meses, a contar da data da emissão do Auto do Fim de Montagem, para completar o Serviço Industrial e para a conclusão dos testes de operacionalidade.

(g) Caso o Empreiteiro, não esteja apto a concluir o Serviço Industrial como previsto nos parágrafos anteriores, sendo o período máximo previsto descrito na alínea (f) supra, os testes de verificação da operacionalidade da Central de Biomassa serão considerados insatisfatórios, podendo o Dono da Obra aplicar as penalidades previstas na Cláusula 11ª do Contrato de Fornecimento e Instalação de Equipamento e/ou optar pela resolução do mesmo, nos termos nele previstos, sujeito, em qualquer caso, à prévia autorização do Banco.

(h) O Empreiteiro realizará o Serviço Industrial com a Biomassa cujas características estão especificadas na Cláusula 4.4. (a) infra (biomassa essa que o Dono da Obra se obriga a fornecer em quantidades suficientes), mas sempre limitada a uma quantidade máxima de alimentação de Biomassa de 15 tons/h.

(i) Com exceção do sistema de alimentação de biomassa (o qual foi redesenhado para o tipo de Biomassa disponível), interrupções resultantes de sobrecargas no equipamento devidas exclusivamente à circunstância da Biomassa apresentar parâmetros fora daqueles que se indicam na Cláusula 4.4(b), não serão consideradas imputáveis ao Empreiteiro e, como tal, não serão tidas em consideração para efeitos do disposto nas Cláusulas 4.3.2 (a). (d) e (e), nomeadamente:

(1) Pressão de vapor demasiado baixa;

(2) Caudal mássico de gazes de exaustão demasiado elevado;

(3) Pressão de vapor demasiado baixa em resultado da utilização de Biomassa seca com uma humidade inferior a 30%;

(4) Temperatura demasiado alta no sistema de alimentação, cm resultado da utilização de biomassa seca com uma humidade inferior a 30%;

(5) Capacidade da grua em resultado de uma densidade baixa, inferior a 225 Kg/m3;

(6) Nível instável de água no barrilete cm resultado de uma variação substancial da percentagem de humidade da Biomassa (menos de 30% ou mais de 40%) ou do poder calorífico "LHV" «9.000KJ/Kg ou >14.000KJ/Kg);

(7) Obstrução do sistema de alimentação devido à utilização ele fragmentos de Biomassa superiores a 400x200x200 mm;

(8) Existência de pedras ou de metais com qualquer dimensão superior a 3 cm.

(j) Em caso de divergência entre as partes quanto à natureza das interrupções referidas na alínea (i) supra, as mesmas serão resolvidas pelo Consultor Técnico (HHA), cuja opinião será definitiva e vinculativa para ambas as partes;

(k) Sempre que, nos termos dos parágrafos anteriores, as interrupções não sejam imputáveis ao Empreiteiro, os testes serão retomados imediatamente após a interrupção e o período de testes já ocorrido será considerado para efeitos do período de 15 dias especificado na alínea (a) supra.;

32. A cláusula 4.4 («Características da Biomassa») tem a seguinte redação:

(a) A biomassa a utilizar nos Testes Operacionais a realizar durante o período de Serviço Industrial deverá ser exclusivamente de eucalipto (rolaria de eucalipto) processada na Central de Biomassa, por máquinas de trituração a martelo, a qual deverá ler as seguintes características:

(i) Densidade: a densidade da biomassa armazenada deverá ser entre 200Kg/m3 e 400Kg/m3;

(ii) Humidade: a humidade da biomassa deverá ser entre 25% e 50%;

(iii) Percentagem de cinzas: entre 0% e 8%;

(iv) Tamanho máximo dos fragmentos da biomassa: 400x200x200mm;

(b) As partes acordam que se a biomassa utilizada nos Testes Operacionais a realizar durante o período de Serviço Industrial estiver dentro dos parâmetros a seguir indicados, nenhuma interrupção será atribuída à Biomassa utilizada.

(i) 100% de eucalipto (rolaria de eucalipto), processada, na Central de Biomassa, por máquinas de trituração a martelo;

(ii) Densidade: a densidade da biomassa armazenada deverá ser igual ou superior a 225 kg/m3;

(iii) Humidade: a humidade da biomassa deverá ser entre 30% e 40%:

(iv) Percentagem de cinzas: entre 0% e 8%;

(v) Tamanho máximo dos fragmentos da Biomassa: 400x200x200mm.

(c) Durante o período de Serviço Industrial, o Dono da Obra compromete-se a realizar análises a cada lote de biomassa que dê entrada na Central, utilizando o seu próprio laboratório, por forma a confirmar que as características da mesma correspondem àquelas enunciadas na alínea (a) supra e avaliar se estão ou não dentro dos valores identificados na alínea (b) supra. As análises deverão ser feitas duas vezes por dia, após a trituração da matéria prima para o armazém de biomassa, e deverão ser imediatamente disponibilizadas ao Empreiteiro.

(d) Análises aleatórias do combustível armazenado no Depósito de combustível ou diretamente do funil do combustível, deverão ser realizadas durante o período de Serviço Industrial conforme especificado na alínea (e) infra.

(e) Durante o período de Serviço Industrial, o Dono da Obra e o Empreiteiro selecionarão, em conjunto, 5 (cinco) amostras da Biomassa armazenada, as quais serão guardadas e seladas em sacos de plástico e enviadas para análise laboratorial dos seguintes parâmetros:

(i) Percentagem de cinzas:

(ii) Poder calorífero "LHV".

33. Em 9 de Março de 2009, a autora enviou ao Consórcio a carta que se encontra a fls. 444 a 446 do apenso A), sob o assunto «Funcionamento da Central Receção Provisória», cujo teor se dá por integralmente reproduzido, na qual a autora refere, além do mais, que «(…) a central de Biomassa continua a sofrer de diversos problemas continuados e sem fim à vista, que não permitem colocar em funcionamento e a operar em boas condições uma unidade industrial de elevado valor. Ainda hoje fomos alertados para mais um problema cuja cópia anexamos do Director da Central. (…)»;

34. Com data de 18 de Março de 2009, a 1ª ré e a HH responderam através da carta que se encontra junta a fls. 449 e 450, traduzida de fls. 766 a 768, do apenso A), cujo teor se dá reproduzido, na qual se refere além do mais que «garantimos que o sistema por nós construído e entregue é seguro e encontra-se equipado com os necessários dispositivos de segurança»;

35. (…) e «não podemos aceitar que nos seja exigido o cumprimento com as datas inicialmente contratadas depois de o local da central ter sido mudado. Isto numa altura em que tínhamos concluído o projeto de construção e que estávamos na iminência de iniciar as nossas atividades no local. Por outro lado, a ligação à eletricidade necessária para testar o equipamento só nos foi disponibilizada em meados de Setembro de 2008. Além disso, temos que realçar novamente que a qualidade do combustível está a tornar todo o processo de arranque difícil e demorado. (…)»;

36. Em resposta, a 30 de Março de 2009, a autora enviou à 1ª ré e à HH a carta que se encontra junta de fls. 451 a 454 do apenso A), cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, na qual se alude além do mais que «(…) mesmo considerando as prorrogações concedidas (…) existe neste momento um atraso de cerca de 6 meses na conclusão da obra (…). Acresce que na presente data não se vislumbra uma data de conclusão para a obra (…). Em anexo à presente carta juntamos nova lista meramente indicativa de problemas já detetados e que terão de ser solucionados por V. Exas sob pena de não ser possível rececionar provisoriamente os trabalhos. Basta olhar para esta lista para confirmar que a questão da biomassa que V. Exas mencionam novamente na carta em epígrafe, é uma falsa questão (…) não nos resta outra alternativa senão notificar-vos formalmente para que terminem a obra em condições de ser rececionada no prazo de um mês e meio a contar da receção da presente carta»;

37. A 9 de Abril de 2009, a HH enviou à autora a carta que se encontra junta a fls. 457-458, traduzida a fls. 772-775 do apenso A), cujo teor aqui se dá por reproduzido, e na qual a mesma responde à carta anterior evidenciando que «não podemos continuar a tentar pôr a central em funcionamento com o combustível errado, sobretudo nesta fase critica (…)», referindo ainda que «necessitaremos que durante o período de ensaios exigidos para a assinatura do ARP o combustível possua as características contratualmente definidas como combustível de ensaio; conforme discutido na última reunião o Consórcio aceitou um desvio ao Contrato ao aceitar que esse combustível de ensaio tenha uma densidade entre 225 e 300 kg/m3 (…)»;

38. A 13 de abril de 2009 a 1ª ré enviou à autora a carta que constitui o documento de fls. 460-469 do apenso A), cujo teor aqui se dá por inteiramente reproduzido;

39. Em resposta, a 21 de Abril de 2009 a autora enviou à 1ª ré e à HH a carta que se encontra junta de fls. 470-478 do apenso A), cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, na qual conclui, além do mais, que «(…) a Central de Biomassa aguarda com expectativa o envio da documentação supra solicitada bem como a conclusão da obra com todo o equipamento instalado e operacional até 15 de Maio, de forma a que seja possível iniciar logo de seguida os ensaios de operacionalidade e rececionar provisoriamente a obra (…)», e anexa uma «lista de trabalhos em falta mais importantes (15 de Maio de 2009)»;

40. Por e-mail de 18 de Maio de 2009, que constitui o documento de fls. 488, cujo teor aqui se dá por reproduzido, a autora comunicou ao BANCO LL a sua intenção de aplicar penalidades à 1ª ré e à HH, nos termos que constam do documento de fls. 489-490, sob a epígrafe «Auto de Aplicação de Penalidades», concluindo pela aplicação da penalidade total de 10%»;

41. O Banco BANCO LL não permitiu à autora resolver os contratos que mantinha com a 1ª ré e a HH, tendo solicitado à autora que elaborasse um plano de viabilização da Central sustentado num diagnóstico de uma entidade independente;

42. A autora contratou a Universidade de Aveiro para a elaboração desse plano; [alterado pela Relação]

43. A autora enviou à lª Ré e à HH a carta datada de 1 de Junho de 2009, que constitui o documento de fls. 510-511 do apenso A) e cujo teor aqui se dá por reproduzido, na qual solicitou que lhe fosse enviado um plano de trabalhos devidamente calendarizado para conclusão de todos os trabalhos contratuais e a resolução dos diversos problemas de conceção e funcionamento da Central até então identificados;

44. No dia 8 de Junho de 2009 a autora remeteu à 1ª Ré e à HH a carta que constitui o documento de fls. 512-513 do apenso A), cujo teor aqui se dá por reproduzido, e na qual aplica a penalidade de 10% referida no auto anexo a essa carta;

45. A ré respondeu através da carta enviada à autora, datada de 18/06/2009, que se encontra junta a fls. 514 do apenso A), cujo teor aqui se dá por reproduzido e da qual consta, além do mais, que «como é do vosso conhecimento os atrasos mencionados são quase na totalidade atribuíveis ao não cumprimento dos parâmetros estabelecidos no contrato no que se refere à Biomassa fornecida por vocês e como tal não imputáveis ao consórcio»;

46. Por carta datada de 25 de Junho de 2009, que se encontra a fls. 515-516 do apenso A), cujo teor aqui se dá por reproduzido, a autora respondeu à 1ª ré e à HH, informando-as de que continuava a considerar válidas e aplicáveis todas as razões e circunstâncias que haviam justificado a aplicação das penalidades em apreço e que naquela data ainda se mantinham, e pediu às mesmas que lhe enviassem um plano de trabalhos devidamente calendarizado;

47. Por e-mail de 25 de Junho de 2009, enviado pela 1ª Ré e pela HH à autora, que se encontra a fls. 781-782 do apenso A), cujo teor aqui se dá por reproduzido, foi designado o dia 27 de Junho de 2009, para início dos testes da nova mesa de alimentação de biomassa, enunciando-se, além do mais a necessidade de a biomassa estar em conformidade com o acordado;

48. Em 26 de Junho de 2009, a autora enviou à 1ª ré e à HH a carta que se encontra junta a fls. 519 e 520, cujo teor aqui se dá por reproduzido;

49. A cláusula 5ª do acordo referido em 10., tem a seguinte redação:

«As partes acordam, com o aumento de capital da CENTRAL DE BIOMASSA, S.A, e a simultânea entrada da AE como accionista, nas seguintes linhas de orientação:

a) O Conselho de Administração será composto por três membros, sendo o presidente designado pela CA e os vogais AE. Após o pagamento pela CA dos 375.000 € que se prevê constituir devedora à AE, o Conselho de Administração será reeleito, cabendo à CA a nomeação de dois administradores, entre eles o presidente do Conselho de Administração:

b) Vinculação da sociedade com a assinatura conjunta de dois dos administradores, com a obrigatoriedade de um desses administradores representar a CA e o outro a AE, tudo sem prejuízo da faculdade de delegação de poderes e da constituição de procuradores nos termos da lei;

c) Fiscalização da sociedade a cargo de fiscal único, com um único suplente;

d) Mesa da Assembleia Geral composta por presidente e secretário»;

50. KK assinou, em representação da autora, o «Contrato de Empréstimo» com o BANCO LL, o «Acordo Directo com o Fornecedor de Equipamento» e o «Acordo Tripartido»;

51. Desde 27 de Abril de 2006 e ao longo do período dos contratos "sub judice", até á resolução aludida, eram acionistas da autora: II, S.A. titular de 50,00032% do capital social, e KK titular de 49,99968% do capital social;

52. Nesse mesmo período de tempo eram administradores da autora, entre outros concomitantemente nomeados e substituídos, e com mandatos fixados até ao final de 2010 de acordo com o artigo vigésimo dos respetivos estatutos: JJ e KK;

53. Enquanto administrador da autora, KK participou nos respetivos conselhos de administração, tendo o último conselho de administração da Autora para o qual foi convocado ocorrido no dia 04 de junho de 2010;

54. No dia 8 de junho de 2010, a autora publicou uma convocatória para realização de Assembleia Geral com, entre outros, os seguintes pontos na ordem de trabalhos:

«(…)

4 - Deliberar sobre a eleição dos membros dos órgãos sociais para o mandato quadrienal 2010/2013;

5 - Deliberar sobre o aumento de capital social através (i) de novas entradas em dinheiro ou por (ii) conversão de prestações suplementares, se as houver até ao montante máximo de € 1.000.000,00, com a emissão de até 200.000 acções com o valor nominal de € 5 cada uma, a serem subscritas até 23 de Julho de 2010»;

55. Em resultado das deliberações tomadas na Assembleia Geral da autora realizada no dia 8 de julho de 2010, KK foi removido do cargo de administrador da autora, através da nomeação de novos órgãos sociais, na designação dos quais aquele não interveio, tendo a posição acionista do mesmo ficado reduzida a 30.392%, ou seja, a menos de 1/3 do capital social, mediante um aumento de capital por conversão de prestações suplementares realizadas no dia 1 de junho de 2010;

56. Durante o mês de Julho de 2009, a pedido do BANCO LL, ocorreram as primeiras visitas à Central dos técnicos da sociedade “HHA”, especialistas em Centrais Termoeléctricas, e esta entidade elaborou o relatório “Technical Assesment Central de Biomassa …” de 9 de Setembro de 2009, constante de fls. 521 a 677 do apenso A), cujo teor aqui se dá por reproduzido;

57. Procurando encontrar soluções consensuais para os problemas identificados no relatório da HHA e viabilizar o projeto sem rutura com o consórcio liderado pela 1ª Ré (responsável pela conceção da Central, respetiva construção e fornecimento e montagem dos equipamentos), foi elaborado e assinado entre o BANCO LL, a Autora e o Consórcio composto pela 1.º Ré e HH, o Acordo Tripartido referido em 24.;

58. A 27 de Outubro de 2009, a 1ª ré e a HH apresentaram dois desenhos e uma memória descritiva do sistema de pó de cortiça proposto para a instalação;

59. Em 11 de Dezembro de 2009, a autora enviou à 1ª ré e à HH o e-mail que se encontra junto a fls. 596 e 597, traduzido de fls. 786 a 788 do apenso A), cujo aqui se dá por reproduzido, e em resposta a uma proposta formulada pela 1ª ré e pela HH, a Autora declarou que aceitaria assinar um «Provisional Construction Completion Certificate» (CCC) sob condição de ser elaborada e acordada pelas partes uma «punch list» - resultante da inspeção levada a cabo pela HHA nos dias 30 de Novembro a 2 de Dezembro, e de que a 1ª Ré e a HH tomaram conhecimento - com as tarefas, trabalhos e documentos em falta, incompletos ou ainda por entregar;

60. No dia 24 de Dezembro de 2009 foi enviada à 1ª Ré e à HH, por e-mail, traduzido a fls. 793 a 798 do apenso A), uma lista de trabalhos incompletos («punch list») actualizada em conformidade com o segundo relatório da HHA que continha as medidas a implementar para resolução dos defeitos/problemas da instalação existentes à data;

61. No dia 29 de Abril de 2010 a 1ª ré e a HH escreveram à autora solicitando que o certificado de conclusão da obra fosse assinado em conformidade com o acordado em Dezembro de 2009, nos termos que constam do documento traduzido a fls. 806 e 807, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

62. Em resposta, a autora enviou à 1ª ré e à HH uma carta datada de 12 de Maio de 2010, que constitui o documento traduzido a fls. 810 a 813, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

63. Através de carta datada de 4 de Junho de 2010, a autora, autorizada para esse efeito por parte do BANCO LL, declarou a resolução do Contrato nos termos que constam do documento junto a fls. 440-441 do apenso A), cujo teor aqui se dá por reproduzido;

64. Nesse mesmo dia 4 de junho de 2010, a autora enviou à 1ª ré e à HH a carta que constitui o documento junto de fls. 690-692 do apenso A), cujo interior aqui se dá por integralmente referido, no qual refere, além do mais, a aplicação de penalidades correspondentes a 10%, no valor de 1.770.774,50 €, enviando-lhe um auto relativo às mesmas;

65. À carta da autora responderam a 1ª Ré e a HH, em 18 de Junho de 2010, nos termos do documento de fls. 693 a 695 do apenso A), cujo teor aqui se dá por inteiramente reproduzido, no qual, além do mais, negaram que a Central se encontrava ainda por concluir e rejeitaram as razões segundo as quais haveria fundamento para aplicação de penalidades;

66. No dia 13 de Dezembro de 2009, representantes da autora, da 1ª ré e da HH determinaram a densidade de amostras da biomassa a utilizar e verificaram que os valores dessas amostras estavam dentro das especificações vertidas no acordo tripartido;

67. A Autora tem a receber da 1ª ré e da HH a quantia de € 58.685,00 a título de custos que lhes foram debitados e que estas reconheceram dever;

68. Por ato registado em Junho de 2009, a 1ª ré transmitiu à 2ª ré a quota de € 255.450,00, que detinha na sociedade Parque Eólico de DD, Lda.;

69. Por ato registado em 26 de junho de 2009 e em 3 de julho de 2009, a 1ª ré transmitiu à 2ª ré uma quota de € 2.500,00, que detinha na sociedade EE - Produção e Gestão de Energia, Lda.;

70. Por ato registado em 26 de Junho de 2009 e em 3 de julho de 2009, a 1ª ré transmitiu à 2ª ré uma quota de € 2.500,00, que detinha na sociedade FF – Produção e Gestão de Energia, Lda.;

71. Por ato registado em 26 de Junho de 2009 e 3 de julho de 2009, a 1ª ré transmitiu à 2ª ré uma quota de € 2.500,00 que detinha na sociedade GG Energia, Lda.;

72. Do preço fixado no Contrato de Fornecimento e Instalação de Equipamento a A. não pagou o montante de 1.737.700,00 €, tendo ficado acordado no âmbito do Acordo Tripartido que desse montante o valor a ser pago pela A. à 1ª R. seria de 1.312.700,00 €. [alterado pela Relação]

73. A 2ª ré encontra-se registada na Conservatória do Registo Comercial nos termos constantes da certidão de fls. 734-735 do apenso A);

74. A tarifa de remuneração garantida atribuída à autora pela EDP vigora pelo período de 25 anos, contados da data do fornecimento de eletricidade à rede;

75. Ao longo do ano de 2008, verificaram-se sucessivos problemas no sistema de alimentação da caldeira, na manutenção de estabilidade da combustão na grelha, na extração, sem paragens, dos produtos resultantes da combustão da biomassa (cinzas e gases de combustão) e ainda problemas na estação de tratamento de águas, sistema hidráulico, sistema de cinzas de fundo, instrumentação e na programação informática da instalação;

76. Tais problemas inviabilizavam a conclusão dos trabalhos e a entrada em funcionamento da Central;

77. Ocorreu um erro de projeto ao nível da instalação das gruas de biomassa, as quais não conseguiam entrar na tremonha de descarga de biomassa que alimentava a caldeira;

78. Em Março de 2009, as obras registavam atrasos e as instalações revelavam constantemente defeitos e problemas graves, o que foi comunicado ao Consórcio 1ª Ré/HH através da carta referida em 33.;

79. Em Abril de 2009, estavam ainda por realizar vários trabalhos, havia equipamentos pendentes de entrega e problemas identificados que necessitavam de solução para que a Central pudesse entrar em funcionamento;

80. A 20 e a 27 desse mesmo mês de Abril de 2009, respetivamente, MM e NN deslocaram-se às instalações da HH na Dinamarca, para verificarem o novo Sistema de Alimentação de Biomassa que deveria ser instalado na Central até ao dia 30 de Abril de 2009;

81. Em ambas as visitas se verificou que os trabalhos estavam muito atrasados e que, em função disso, seria impossível cumprir o referido prazo acordado para a respetiva instalação;

82. A primeira entrega de material relativo a esse sistema acabou por ser feita no dia 8 de Junho de 2009;

83. Esse sistema fracassou quando submetido a um teste a frio no dia 29 de Junho de 2009;

84. No dia 15 de Maio de 2009 a Central não se encontrava pronta para início dos testes conducentes à receção provisória;

85. No relatório efetuado por técnicos da Universidade de … contratados para vistoriarem a obra, conclui-se pela existência dos seguintes problemas:

(i) Especificação incorreta das características da biomassa tendo em conta o material disponível para queima neste tipo de unidades em Portugal;

(ii) Sistema de movimentação e transporte de biomassa no silo de armazenamento com capacidade deficitária;

(iii) Sistema de alimentação à caldeira inadequado ao tipo de biomassa disponível; e,

(iv) Conceção da chaminé no que se refere a infraestruturas de recolha e amostra de gases;

86. Mais consta desse relatório que os erros de dimensionamento que em alguns casos poderiam confundir-se com falhas ou omissões de construção, eram transversais a toda a instalação, com especial destaque a ser dado ao sistema hidráulico, sistema de cinzas secas, sistema de instrumentação monitorização e controlo, e planeamento geral da obra;

87. No dia 21 de Maio de 2009, a 1ª ré e a HH decidiram dispensar o seu subempreiteiro OO, Lda.7;

88. O número insuficiente de pessoas em obra, aliado às sucessivas deslocações de PP, supervisor da HH na obra, à Dinamarca e à falta de disponibilidade do programador do sistema de comando e controlo da caldeira e seus auxiliares (um freelancer que trabalhava em horário pós laboral a partir da Dinamarca), contribuiu para atrasar ainda mais os trabalhos em curso;

89. No dia 29 de Junho de 2009 foram levados a cabo os referidos testes com um tipo de biomassa (estilha de madeira) especificamente solicitado pela 1ª ré e pela HH;

90. Nesse dia, como em diversas outras ocasiões no passado, a mesa de alimentação de biomassa não funcionou de forma contínua nem de forma controlada;

91. (…) encravou várias vezes;

92. (…) não dispunha da potência hidráulica necessária para transportar a biomassa;

93. (…) não forneceu nem recebeu sinais do sistema informático de controlo e monitorização da instalação;

94. (...) o que levou a que em 29 de Setembro de 2009 tal mesa de alimentação fosse desmembrada e reconfigurada pela 1ª Ré e pela HH;

95. Naquele mesmo dia 29 de Junho de 2009 a HH informou a autora que iria interromper os trabalhos na Central, tendo o seu supervisor abandonado a obra no dia seguinte para gozo férias;

96. (…) e não deixou qualquer programa de trabalhos para os dias/semanas seguintes, nem informou a Autora da data em que regressaria à obra;

97. A HH só voltou a trabalhar em obra depois do dia 28 de Setembro de 2009, para dar início aos trabalhos previstos no acordo tripartido referido em 24.;

98. Nesse acordo tripartido ficou estabelecido que ficaram sem efeito as penalidades previstas no Anexo 6 do Contrato, caso os termos e disposições daquele acordo viessem a ser cumpridos;

99. No dia 25 de Setembro de 2009 realizou-se uma reunião entre os representantes do BANCO LL, da HHA, da autora, da 1ª ré e da HH, que teve por finalidade discutir a implementação dos pontos 4.1. e 4.3.1 do acordo tripartido, designadamente os prazos para realização dos concretos trabalhos concretos pendentes de conclusão ou reparação por parte da 1ª ré e da HH;

100. A 30 de Setembro de 2009, chegaram à Central as novas garras para as gruas as quais não estavam completas nem correspondiam ao que havia sido prometido pela HH;

101. A 6 de Outubro de 2009 realizou-se nova reunião entre os representantes do BANCO LL, HHA, Autora e 1ª Ré, convocada com o propósito de verificar o progresso das medidas acordadas na reunião realizada a 25 de Setembro de 2009 e o cumprimento dos respetivos prazos;

102. Nessa mesma reunião foi elaborada nova «action list» nos termos do documento que consta de fls. 584 a 591;

103. A 12 de Outubro de 2009, a autora retirou toda a biomassa ainda presente no depósito de combustível da Central, de forma a cumprir com o disposto no acordo tripartido e evitar qualquer dúvida em relação ao tipo de biomassa que iria ser utilizada nos testes a efetuar no âmbito daquele acordo;

104. Após análise dos desenhos referidos em 58., tanto a autora como a HHA rejeitaram a solução apresentada por esta ser tecnicamente inviável;

105. Ao longo dos meses de outubro e novembro de 2009, a autora e a HHA foram alertando a 1ª ré e a HH para os sucessivos atrasos verificados no cumprimento das obrigações enumeradas no acordo tripartido;

106. Devido a atrasos, erros e lacunas por parte da 1ª Ré e da HH na entrega da documentação de sua responsabilidade, só a 11 de Novembro de 2009 é que foi possível à Autora reunir toda a documentação necessária para o registo e autorização prévia de instalação da caldeira e entregá-la na DRE-N (Direcção Regional de Energia – Norte);

107. Nos dias 30 de Novembro a 2 de Dezembro de 2009 foi realizada nova inspeção à obra por parte da HHA, da qual resultou uma nova lista de trabalhos incompletos («punch list») com soluções a implementar, nos termos do documento de fls. 592-595;

108. No período compreendido entre os dias 18 de Dezembro de 2009 e 4 de Janeiro de 2010 não se encontravam em obra quaisquer funcionários da 1ª Ré ou da HH, designadamente PPh;

109. (…) ausência que se repetiu nos períodos entre 9 e 22 de Fevereiro de 2010, 4 de Março e 6 de Abril de 2010 e novamente entre 19 e 26 de Abril de 2010;

110. Em Abril de 2010 e apesar da carta de 29 de abril de 2010, referida em 61., a 1ª ré e a HH não enviaram o certificado de conclusão de obra à autora para assinatura, nem foi designada data para esse efeito;

111. E nessa data estavam por concluir os seguintes trabalhos mencionados no ponto 4.1. do Acordo Tripartido:

(a) Queimador a diesel para arranque da caldeira;

(b) Sistema de monitorização da Central

(c) Sistema de tratamento de águas

(d) Sistema hidráulico

(e) Aquecimento do tanque de alimentação de água/desgaseificador

(f) Software PLC/Scad;

112. Sem tais equipamentos a Central não podia funcionar;

113. No dia 6 de Julho de 2006, a Portucel enviou à HH, a pedido da autora, uma amostra de 300 kg da biomassa do tipo que seria utilizado na Central;

114. Tendo sido recebida essa amostra de biomassa, que era composta por folhas e bicadas de jardins e parques, ramagens de pomares e casca de eucalipto, tudo material de baixa densidade, nem a 1ª Ré nem a HH suscitaram qualquer questão;

115. A 1ª ré e a HH aceitaram essa biomassa, tendo inclusivamente tomado a decisão de alterar ligeiramente o modelo de grelha previsto para se adaptar à mesma;

116. Nos meses subsequentes à assinatura do Contrato, representantes da 1ª ré e da HH efetuaram diversas visitas ao centro logístico do principal fornecedor de biomassa da autora, a QQ, em …, onde puderam contactar diretamente com a biomassa florestal residual que iria ser utilizada na Central, bem como com todo o processo de «stockagem», carregamento e transporte da mesma, sem que nunca tenham manifestado preocupação em relação às características da biomassa em causa;

117. E na visita efetuada pela autora à «work-shop» da HH, na Dinamarca, entre os dias 28 e 30 de Maio de 2007, constatou-se que os testes e ensaios da grelha da caldeira, entretanto fabricada pela HH, estavam a ser executados com a biomassa florestal residual fornecida pela Autora em 2006 e 2007;

118. Os atrasos e defeitos descritos impediram a que a Central pudesse ser posta em funcionamento na data prevista, ou seja, em Outubro de 2008;

119. A autora, com recurso a fornecedores especializados, procedeu às reparações e às modificações necessárias para que a Central pudesse entrar em funcionamento, incorrendo em custos com o diagnóstico e execução dos trabalhos necessários;

120. Desde Outubro de 2008 e até final de 2010, a autora incorreu em custos de financiamento, de pessoal e administrativos derivados da inatividade da Central e que não tiveram qualquer contrapartida;

121. Fruto dos defeitos de conceção do projeto elaborado pelo Consórcio liderado pela 1ª ré, a operacionalização da Central implicou a reconfiguração do sistema de alimentação da caldeira, que implica ineficiências e sobrecustos de carácter permanente, designadamente de mão-de-obra, de combustível, de equipamento, de manutenção do equipamento e de consumo de energia que implicam um sobrecusto adicional durante a vida útil esperada do equipamento da Central;

122. II, em representação da autora, foi quem definiu o tipo e as características da Central a construir nos termos do concurso referido em 1., tendo para esse efeito visitado outras centrais de produção de energia elétrica, algumas delas projetadas e construídas pela HH A/S;

123. O projeto desenvolvido pelo consórcio previu ainda um sistema de pesagem cujo fornecimento ficou a cargo da autora;

124. Nem a proposta nem o Contrato estipulam a realização de operações de estilhaçar, moer, secar ou misturar na Central, sendo que, conforme referido em 5. e) e f) supra, e decorre do ponto 2.1.3 das Condições Técnicas Especiais, alguns resíduos necessitariam de ser sujeitos a operações de estilhaçar, moer, secar e/ou mistura e outros resíduos deveriam chegar à Central já preparados de modo que necessitariam apenas de armazenamento;

125. Nem na proposta apresentada pelo Consórcio, nem no Contrato, se encontra estipulado que a biomassa a utilizar já chegaria à Central pronta a ser consumida e que as operações de separação de materiais inertes, a existir, ficariam a cargo da autora ou dos seus fornecedores, sendo que, conforme referido em 5. e) e f) supra, e decorre do ponto 2.1.3 das Condições Técnicas Especiais, alguns resíduos necessitariam de ser sujeitos a operações de estilhaçar, moer, secar e/ou mistura e outros resíduos deveriam chegar à Central já preparados de modo que necessitariam apenas de armazenamento;

126. Não havendo, na zona onde a Central foi construída, terceiros interessados no consumo do vapor ali produzido, a mesma foi projetada, por acordo com a autora, sem prever esta possibilidade;

127. A execução de alguns trabalhos integrantes da Central foi assumida pela autora, designadamente, o edifício de escritórios e a subestação de eletricidade;

128. Em junho de 2006, após a assinatura do Contrato, a autora enviou à HH uma amostra de biomassa com as características referidas a fls. 702 do apenso A), ou seja, com 272 kgs/m3, diferente da biomassa com as características referidas na p. 5 da proposta que se encontra a fls. 181 a 305 do apenso A), ou seja, 700 kgs/m3;

129. (…) na sequência do que a HH procedeu à alteração da grelha da caldeira para melhor combustão da biomassa;

130. A amostra de biomassa utilizada em 6 de julho de 2006, apresentava uma densidade de 272 kg/m3, prevendo-se no contrato uma densidade mínima de 500 kg/m3;

131. Após a conclusão do projeto de construção da Central, a autora alterou a localização inicialmente prevista para a mesma, o que determinou a introdução de alterações naquele projeto;

132. (...) o que determinou a introdução de alterações naquele projeto da obra;

133. O fornecimento de eletricidade da subestação elétrica à qual a Central deveria estar ligada na fase de ensaios apenas ocorreu em 1 de outubro de 2008, o que sempre inviabilizaria a receção provisória da obra no dia 1 de março de 2008;

134. A construção dessa subestação, pela qual o Consórcio não foi responsável, estava concluída em meados de setembro de 2008;

135. Em abril de 2009 continuavam a ser realizados trabalhos para adaptação do sistema de alimentação da Central à biomassa com as características referidas a fls. 702 do apenso A), ou seja, com 272 kgs/m3;

136. O consórcio procurou adaptar o equipamento à biomassa apresentada;

137. No dia 9 de abril de 2009 o Consórcio informou a autora das condições necessárias à realização dos testes de receção provisória, entre as quais que a densidade do combustível de teste a utilizar se situasse entre 225 e 300 kg/m3;

138. O sistema de armazenagem, alimentação e queima do pó de cortiça não impede, nem limita, o funcionamento da Central e corresponde a menos de 1% do valor total da obra, tendo sido acordado entre as partes que seria concluído em último lugar;

139. No teste realizado a 29 de Junho de 2009 verificou-se que o sistema de alimentação tinha dificuldade em fazer deslocar a biomassa que então utilizada;

140. O acordo tripartido foi apenas celebrado em inglês e só foi assinado pela HH no dia 25 de Setembro de 2009;

141. Entre fevereiro e abril de 2009 a Central produziu pontualmente alguma eletricidade que foi exportada para a rede;

142. Nesse período a Central funcionou com biomassa fornecida pela autora;

143. Em 12 de junho de 2009, o Consórcio remeteu à autora a minuta do pedido dirigido à DRE-N e os anexos que constam de fls. 1062 a 1065 do apenso A);

144. Em 16 de outubro de 2009, com o e-mail que consta da 1ª parte do documento de fls. 1067 vº, a HH, através de RR, enviou às pessoas nele identificadas, o documento de fls. 1069-1070, intitulado «Relatório de Ensaio nº 125421 – Ensaios Físico-Químicos», com o timbre do Laboratório SS», requisitado por BB - Instalações industriais, S.A.., do qual consta a referência a uma biomassa que lhe foi entregue por amostragem no dia 21 de setembro de 2009, com uma densidade de 130 Kg./m3;

145. No dia 16 de outubro de 2009, a HH, através de RR, enviou ao Consórcio, o e-mail cuja cópia consta de fls. 1067, 1ª parte, do apenso A), ao qual anexou o documento cuja cópia se encontra a fls. 1069 do mesmo apenso, intitulado “Relatório de Ensaio nº 125421 – Ensaios Físico-Químicos”, com o timbre do laboratório SS, do qual resulta que:

- a BB - Instalações industriais, S.A.., solicitou a SS a análise a uma amostra de biomassa que foi entregue a este laboratório no dia 21 de setembro de 2009, em recipiente da requisitante;

- nos dias 21 de setembro de 2009 e 1 de outubro de 2009 foram realizados ensaios a essa amostra de biomassa;

- o resultado desses ensaios indicou uma “densidade aparente” da amostra da biomassa de 130 Kg/m3;

146. No dia 11 de dezembro de 2009 a autora enviou ao Consórcio o e-mail cuja cópia consta de fls. 596, 1ª parte, do apenso A), no qual declara que aceita assinar um “Auto de Fim de Montagem” que permitiria iniciar os testes de funcionamento da Central, sob a condição de aceitação, pelas partes, de uma lista de trabalhos incompletos a realizar pelo Consórcio e não previstas no acordo tripartido;

147. A referida lista de trabalhos incompletos, elaborada na sequência da inspeção da HHA realizada na semana anterior ao e-mail de 11 de Dezembro de 2009, e aludida em 60., foi remetida ao Consórcio a 24 de dezembro de 2009; (79º)

148. No dia 8 de Janeiro de 2010, a HH apresentou à Autora um novo calendário de testes a realizar entre 11 e 19 de Janeiro de 2010;

149. Desde a constituição da 2ª ré, em 2007, que foi estratégia do Grupo onde se inserem as rés concentrar todas as participações financeiras nesta holding, deixando cada uma das suas participadas exclusivamente focada no exercício do seu objeto social;

150. (…) o que era e é do pleno conhecimento da autora, cujo presidente do conselho de administração, JJ, através da sociedade II, S.A., é também sócio da sociedade Parque Eólico de DD, Lda.;

151. Em 2007, a 2ª ré procedeu à aquisição a terceiros de quotas correspondentes a 50% do capital social das empresas EE – Produção e Gestão de Energia, Lda., FF – Produção e Gestão de Energia, Lda., e GG Energia, Lda.;

152. (…) e ainda à aquisição de uma quota correspondente a 35% do capital social da sociedade Parque Eólico de DD, Lda., empresas nas quais a 1ª ré também detinha participações;

153. Tendo a 2ª ré adquirido 88% do capital social da 1ª ré em Outubro de 2008, ficou, desde logo, decidido que a concretização dessa aquisição importaria também a aquisição das participações detidas pela 1ª ré naqueloutras empresas do Grupo, o que veio a ficar estabelecido na ata da assembleia geral da 2ª ré, realizada em 16 de Fevereiro de 2009;

154. Pela venda das participações referidas em 68. a 71., a 1ª ré recebeu o preço de 910.000,00 €;

155. A 1ª ré apenas é detentora de um gabinete que presta serviços de engenharia, não sendo dona de qualquer bem imóvel, equipamento ou maquinaria;

156. O engenheiro KK não foi pessoalmente informado da convocatória referida em 54., como havia sido em relação a outras convocatórias para reuniões da assembleia geral da autora;

157. (...) nem foi notificado da deliberações tomadas na assembleia geral da autora, realizada no dia 8 de julho de 2010, da qual só veio a ter conhecimento na sequência da citação da 1ª ré para os termos do procedimento cautelar que constitui o apenso A), e da análise da certidão do registo comercial da autora junta com esse procedimento;

158. O momento relevante de início do fornecimento de eletricidade à rede pela autora só veio a ocorrer em 18 de janeiro de 2011, com o início da exploração da Central sob licença provisória emitida pela Direção Geral de Energia e Geologia, com efeitos a partir dessa data;

159. Os factos respeitantes ao período de tarifa garantida para venda da eletricidade por si produzida à EDP e à data do início da contagem desse período eram do conhecimento da autora, que deles foi informada pela Direção Geral de Energia e Geologia, antes da instauração da presente ação.


*


Vêm dados como não provados os seguintes factos:

1. Os custos referidos em 2.1.1.119 ascenderam a um montante global de € 4.473.973,00;

2. Os custos referidos em 2.1.1.120 ascenderam a € 2.575.433,00;

3. O montante global do sobrecusto adicional referido em 2.1.1.121 é de € 2.213.721,00;

4. As alienações referidas em 2.1.1.68. a 71., as quais constituíam os únicos activos da 1ª ré em favor de uma sociedade detida pelo mesmo dono, determinou a diminuição da garantia patrimonial do crédito da autora, e agrava a impossibilidade desta obter a satisfação integral do seu crédito;

5. O facto de KK ser presidente do conselho de administração da 1ª Ré e gerente da 2.ª ré, determina que esta última não ignorava que a descrita alienação de ativos dificultaria ou mesmo impossibilitaria a satisfação do crédito reclamado pela Autor;

6. E essa alienação foi feita intencionalmente com o fito de subtrair tais ativos do património da 1ª ré numa altura em que já era evidente para esta que a aqui autora iria reclamar indemnizações pelo incumprimento do Contrato;

7. II verificou, nas visitas que fez às centrais de biomassa da HH, que o combustível a utilizar seria do tipo “aparas de madeira” (wood chips), o que foi igualmente determinante na escolha, também por si efetuada, do sistema de alimentação da caldeira;

8. Aquando da celebração do contrato em causa era intenção e foi acordado pelas partes que a biomassa adequada seria a descrita na Proposta referida, a qual prevaleceria sobre o Caderno de Encargos;

9. Em Março de 2009 as obras de construção da Central estavam concluídas e os problemas verificados na fábrica reportavam-se à inferior qualidade da biomassa fornecida pela Autora que não permitia a realização dos ensaios adequados à regulação do equipamento;

10. O Consórcio continuou a insistir pelo fornecimento de combustível adequado apesar de adaptar o sistema de alimentação da Central à biomassa apresentada;

11. Para o funcionamento da caldeira entre Fevereiro e Maio de 2009, foi necessário que a 1ª Ré mantivesse dois trabalhadores 24 horas por dia distribuídos por três turnos, num total de seis trabalhadores, com as tarefas, entre outras, de separar a biomassa com dimensões desadequadas (ramos, troncos, etc.) e de compactar os materiais, de modo a que a biomassa disponibilizada pela Autora pudesse ser usada no sistema expressamente desenhado para outro tipo de biomassa;

12. As quatro amostras de biomassa analisadas em 08 de Julho de 2009 apresentavam uma densidade entre os 60 kg/m3 e os 170 kg/m3;

13. Em Maio de 2009, não havia qualquer trabalho de construção em curso que justificasse a continuação da OO em obra;

14. A 25 de Junho de 2009, a Central estava concluída, à exceção do sistema de armazenagem, alimentação e queima do pó de cortiça, razão pela qual o consórcio solicitou o fornecimento de combustível para testes;

15. A 25 de Junho de 2009, a Central estava concluída à exceção do sistema de armazenagem, alimentação e queima do pó de cortiça, razão pela qual o consórcio solicitou o fornecimento de combustível para testes;

16. E a biomassa fornecida pela A. continuava a ser de densidade inferior ao acordado pelas partes;

17. A minuta de pedido dirigido à DRE-N e respetivos anexos, que o Consórcio remeteu à autora no dia 12 de junho de 2009, continham todos os elementos necessários ao registo da caldeira;

18. A “Lista de Trabalhos Incompletos” não era do conhecimento da autora antes de 24 de dezembro de 2009;

19. O custo de equipamento não fornecido pelo consórcio relativamente ao sistema de pó de cortiça, complementar ao implementado, tinha o valor contratado de € 13.500,00.


5. Tendo em conta o disposto no nº 4, do art. 635º, do Código de Processo Civil, o objecto do recurso delimita-se pelas conclusões do mesmo.

Assim, nos presentes recursos, estão em causa as seguintes questões:

Recurso da R. BB, S.A.:

- Nulidade do acórdão recorrido, com fundamento nos arts. 195º, nº 1 e 2, e 615º, nº 1, alínea d), do CPC, por ter alterado o ponto 72 da matéria de facto;

- Inadmissibilidade da resolução do contrato pela A. por falta de interpelação admonitória do devedor;

- Inadmissibilidade da condenação em indemnização que cumula as penalidades contratuais previstas para a mora com uma indemnização pelo interesse contratual positivo e uma indemnização pelo interesse contratual negativo;

- Inadmissibilidade de condenação genérica e ilíquida de indemnização por danos não concretizados.


Recurso da A.:

- Condenação da 1ª R. a pagar à A. a quantia de € 58.685,00, a que alude o facto provado 67;

- Condenação da 1ª R. a pagar à A. a quantia de € 1.763.070,00, a título de penalidades contratuais a que aludem os factos provados 40, 44 e 64;

- Condenação da 1ª R. a pagar à A. os sobrecustos de carácter permanente a que alude o facto provado 121, até ao limite máximo de € 2.213.731,00, assim como os juros de mora vincendos que incidam sobre a quantia apurada, contados da data da notificação da sentença de liquidação.


6. Antes de mais, importa proceder ao enquadramento das questões, considerando – na parte que releva para o objecto dos recursos de revista – os termos em que a 1ª instância fundamentou a decisão, assim como os fundamentos da apelação que a pôs em causa e, por último, a fundamentação da decisão da Relação que apreciou a apelação, confirmando a decisão da 1ª instância.

Na sentença:

- Por carta datada de 04/06/2010, a A. declarou a resolução do contrato dos autos que vigorava entre ela e o Consórcio integrado pela 1ª R.;

- A cláusula 14ª, nº 1, do mesmo contrato, invocada na carta de resolução, não é em rigor uma cláusula resolutiva, mas apenas uma cláusula de estilo, não dispondo, por isso, de valor próprio;

- À data da declaração de resolução, o Consórcio encontrava-se em situação de incumprimento da execução do contrato; a existência de justa causa de resolução exclui – em relação contratual duradoura – a necessidade de recurso ao mecanismo da interpelação admonitória, e, no caso dos autos, resulta evidente a demonstração da perda de interesse por parte da A. na manutenção do vínculo contratual, ocorrendo, assim, uma situação de incumprimento definitivo;  

- O não cumprimento definitivo converte a relação de cumprimento em relação de liquidação;

- A indemnização pela destruição da relação contratual por efeito da resolução não está limitada ao interesse contratual negativo, podendo ainda abranger, em certos casos, o interesse contratual positivo, desde que isso não acarrete qualquer situação geradora de desequilíbrios ou benefícios injustificados;

- São indemnizáveis pela 1ª R. os custos despendidos pela A. com o diagnóstico e a execução dos trabalhos inerentes às reparações e modificações necessárias para que a Central pudesse entrar em funcionamento, bem como os custos de financiamento, de pessoal e administrativos em que a A. incorreu, desde Outubro de 2008 até final de 2010, derivados da inactividade da Central e que não tiveram qualquer contrapartida.


         Também no que aqui importa, em sede de apelação, a A. suscitou as seguintes questões:

- Nulidade da sentença por omissão de pronúncia quanto ao pedido de condenação da 1ª R. no pagamento da quantia de € 58.685,00, a que alude o facto provado 67;

- Nulidade da sentença por omissão de pronúncia quanto ao pedido de condenação da 1ª R. no pagamento da quantia de € 1.763.070,00, correspondente a penalidades contratuais aplicadas pela A.;

- Impugnação do facto provado 72;

- Condenação da 1ª R. a pagar os sobrecustos de carácter permanente, até ao limite máximo de € 2.213.721,00, e respectivos juros de mora.


No acórdão da Relação, no que importa para o objecto dos recursos de revista:

- Não se verificam as alegadas nulidades porque a linha de fundamentação da sentença quanto ao âmbito da indemnização a que a A. tem direito afastou a consideração daqueles dois valores peticionados (€ 58.685,00 e € 1.763.070,00);

- Alteração do facto 72;

- Admitindo a não cumulação de indemnização pelo interesse contratual positivo e pelo interesse contratual negativo, considera-se, porém, que, como afirma Paulo Mota Pinto, “existem rubricas do dano que podem ser comuns à indemnização correspondente ao interesse contratual negativo e ao interesse contratual positivo”;

- Entende-se que assim é, designadamente, quando estão em causa “danos especiais” resultantes do cumprimento defeituoso;

- No caso dos autos, os custos em que a A. incorreu com o diagnóstico e a execução dos trabalhos inerentes às reparações e modificações necessárias para que a Central pudesse entrar em funcionamento (em valor não apurado e até ao montante de € 4.473.973,00) incluem-se naquela classe de danos, pelo que não se verifica qualquer incompatibilidade com a consideração dos mesmos em simultâneo com os custos de financiamento, de pessoal e administrativos em que a A. incorreu desde Outubro de 2008 e até final de 2010, derivados da inactividade da Central e que não tiveram qualquer contrapartida (também em valor não apurado e até ao montante de € 2.575.433,00);

- Nega-se a pretensão da A. de condenação da 1ª R. a pagar os sobrecustos de carácter permanente até ao limite máximo de € 2.213.721,00, e respectivos juros de mora, por não estar provado o nexo de causalidade entre o incumprimento do Consórcio e tais danos;

- Nega-se a pretensão da A. de condenação da 1ª R. no pagamento da quantia de € 58.685,00, a que alude o facto provado 67;

- Nega-se também a pretensão da A. de condenação da 1ª R. no pagamento da quantia de € 1.763.070,00, correspondente a penalidades contratuais aplicadas pela A., considerando que tais penalidades por atraso no cumprimento são incompatíveis com a decisão de resolução do contrato e consequente relação de liquidação.


7. Como enunciado, tanto a 1ª R. como a A. impugnaram a decisão da Relação, devendo as questões suscitadas ser conhecidas pela seguinte ordem de precedência:

- Nulidade do acórdão recorrido, com fundamento no regime dos arts. 195º, nº 1 e 2, e 615º, nº 1, alínea d), do CPC, por ter alterado o ponto 72 da matéria de facto;

- (In)admissibilidade da resolução do contrato pela A. por falta de interpelação admonitória do devedor;

- Determinação das parcelas da indemnização a que a A. tem direito (aqui se incluem as demais questões objecto do recurso da R. e todas as questões objecto do recurso da A.).


8. Quanto à questão da alegada nulidade do acórdão recorrido por ter alterado o ponto 72 da matéria de facto, invoca a R. Recorrente como fundamento o regime dos arts. 195º, nº 1 e 2, e 615º, nº 1, alínea d), do CPC.

      Esclareça-se que as possíveis nulidades do acórdão se circunscrevem às hipóteses previstas nas diferentes alíneas do nº 1, do art. 615º, do CPC. Outras nulidades processuais só poderão ser apreciadas enquanto violação de norma processual (cfr. art. 674º, nº 1, alínea b), do CPC).

Compulsada a apelação da A., verifica-se ter esta impugnado o ponto 72 da matéria de facto pelo que, ao conhecer da questão, não incorreu o acórdão recorrido em excesso de pronúncia (art. 615º, nº 1, alínea d), do CPC). Conclui-se, assim, não existir nulidade do acórdão, reconduzindo-se a questão a apreciar se a decisão de alteração do facto 72 incorreu ou não em violação de norma processual.

       Vejamos o teor da fundamentação do acórdão recorrido, no que aqui releva:

“Como vimos, sustenta a apelante A. que o facto constante do ponto 2.1.1.72 dos factos provados foi incorrectamente julgado provado.

      Tal facto tem o seguinte teor: «Do preço fixado no Contrato a autora reteve em seu benefício o montante total de € 1.763.070,00, correspondente a 10% do valor do Contrato, tendo ficado acordado no âmbito do acordo tripartido que o valor a ser pago pela autora à 1ª ré seria de 1.312.700,00 €».

       O mesmo já constava dos factos considerados assentes quando da condensação (ponto BR, a fls. 456), tendo a A. reclamado pretendendo que o mesmo transitasse para a base instrutória (fls. 486-487).

      Tal como agora (conclusão 8) dizia a A. que aquele facto se encontra em oposição com o alegado nos art.ºs 145.º a 148.º da réplica, foi impugnado no art.º 195.º da réplica e, por isso, não podia ter sido considerado como assente.

      Nos arts. 145 a 148 da réplica a A. admite que não pagou a quantia de 1.737.700,00 € (e não de 1.763.070,00 €) que diz corresponder à soma das duas últimas parcelas previstas no Contrato de Fornecimento de Equipamento e que as penalidades por ela aplicadas ao Consórcio equivalem a 1.763.070,00 €, não se confundindo com aquela falta de pagamento.

       Neste contexto, tendo em consideração o teor da cláusula 12) do Acordo Tripartido assinado pelas partes (fls. 381 e seguintes), entende-se estar assente a seguinte factualidade:

- «Do preço fixado no Contrato de Fornecimento e Instalação de Equipamento a A. não pagou o montante de 1.737.700,00 €, tendo ficado acordado no âmbito do Acordo Tripartido que desse montante o valor a ser pago pela A. à 1ª R. seria de 1.312.700,00 €».

Alterando-se o ponto 72) dos factos provados que passará a ter a referida redacção.”


Compulsado todo o processado, verifica-se serem inteiramente válidas as razões nas quais a Relação fundou a modificação do facto 72, entendendo (i) que tal facto fora mal levado aos Factos Assentes por, em face das alegações da réplica, não se poderem considerar não eficazmente impugnados os factos alegados na contestação (à luz do regime do ónus da impugnação especificada dos arts. 490º e 505º do CPC antigo); (ii) sustentando-se no documento de fls. 381 e segs. proceder à sua alteração.

Conclui-se, assim, não ter o acórdão recorrido incorrido em violação de norma processual ao modificar o facto provado 72.


De qualquer forma, assinale-se que esta alteração não teve consequências na decisão de direito, que confirmou a decisão da 1ª instância sem fundamentação essencialmente diferente.

Além disso, e diversamente do alegado pela R. Recorrente, tanto a redacção do facto dada pela sentença como a sua redacção alterada pela Relação, não permite qualificar a retenção pela A. de parte do preço como tendo sido feita a título de penalidades contratuais por atrasos.


9. A questão da (in)admissibilidade da resolução do contrato pela A. por falta de interpelação admonitória do devedor foi objecto de desenvolvida e circunstanciada apreciação pela Relação, em termos que importa ter presentes:


“Por uma questão de sequência lógica comecemos pela questão colocada pelas RR. apelantes relativa à ilegitimidade da resolução contratual e à inexistência de interpelação admonitória.

Como vimos, entre a A. e o consórcio constituído pela 1ª R. e pela HH, no dia 9-6-2006, foi celebrado o acordo documentado a fls. 328 a 334 do apenso A, denominado «Contrato Misto de Fornecimento de Equipamento e Prestação de Serviço». Referindo-se no texto do dito acordo que a «obra é constituída pela realização do Projecto, Fornecimento e Construção "chave-na-mão" de uma central termoeléctrica de produção de energia elétrica com uma potência de 10 MW, usando como combustível principal a biomassa (...), localizada na freguesia de …, concelho de …, distrito de Aveiro, bem como pelas prestações de serviços referidas no caderno de encargos e em conformidade com a proposta do adjudicatário».

Por outro lado, através de carta datada de 4-6-2010, a A. (autorizada para esse efeito por parte do BANCO LL) fez cessar o contrato, conforme fls. 440-441 do apenso A) – ali referindo que «apesar de todas as oportunidades e prorrogações de prazo concedidas pela CTBAA na qualidade de dono da obra ao Consórcio no sentido deste reparar os continuados e sucessivos incumprimentos dos Contratos e recuperar dos atrasos substanciais na execução dos trabalhos previstos… o Consórcio nunca conseguiu cumprir nenhuma das prorrogações dos prazos e datas limites concedidos pela CTBAA nem das responsabilidades e obrigações que para o Consórcio resultam dos Contratos». Pelo que, «com fundamento na violação e incumprimento definitivo dos Contratos por parte do Consórcio» declarou a A. exercer o seu direito de rescisão dos contratos, nos termos e para os efeitos da cláusula 14ª do Contrato Misto de Fornecimento de Equipamento e Prestação de Serviço.

Aquela cláusula 14ª do Contrato, no seu nº 1 dispõe que o incumprimento por qualquer uma das partes dos deveres resultantes do contrato confere à outra parte, nos termos gerais do Direito, o direito de rescindir o contrato com justa causa, acrescentando-se no nº 2 várias condições em que o contrato poderia ser rescindido, entre as quais quando se «verifique falta ou omissão grave na execução do Contrato, designadamente atrasos imputáveis ao Adjudicatário…».

Não se porá em causa que aqui “rescisão” significará “resolução”, como foi apontado na sentença recorrida.

A resolução convencional assenta na liberdade contratual, podendo apresentar-se com distintos conteúdos, sendo também os respectivos pressupostos livremente conformáveis pela vontade das partes. As cláusulas de resolução baseiam-se no princípio da autonomia privada, tanto quanto à inclusão da cláusula como à determinação do respectivo conteúdo, razão pela qual as partes poderão estabelecer diferentes acordos de resolução, com pressupostos e efeitos diversos [7 Ver Romano Martinez, «Da Cessação do Contrato», Almedina, 2005, pags. 79-80].

    Como salienta Calvão da Silva [8 «Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória», Almedina, 1987, pag. 323] a inadimplência da específica obrigação prevista é fundamento e pressuposto indispensável da resolução, dela emergindo um direito potestativo que confere à parte adimplente (ou não inadimplente) o poder jurídico de «por um simples acto livre de vontade e só por si produzir a resolução que, inelutavelmente, se impõe à contraparte inadimplente». Dizendo-se “só por si” porque pode resolver o contrato, mediante declaração à outra parte «sem necessidade de intervenção do juiz e sem ter de recorrer ao art. 808º, nº 1», operando a resolução no momento em que a declaração chega ao poder ou é conhecida da parte contrária.

     Todavia, consoante referido por Baptista Machado [9 Em «Pressupostos da Resolução por Incumprimento», «Obra Dispersa», vol. I, Braga, 1991, pag. 187, nota 7] a chamada cláusula resolutiva expressa deve referir-se a prestações e a modalidades de adimplemento determinadas com precisão: as partes não podem ligar a resolução a uma previsão genérica e indeterminada do tipo “em caso de inadimplemento de qualquer obrigação surgida do presente contrato este considera-se resolvido” – uma cláusula destas seria uma simples “cláusula de estilo” devendo entender-se que ela se limita a remeter para a regulamentação legal da resolução por incumprimento.

       Ora, o nº 1 da cláusula 14ª mencionando «o incumprimento por qualquer uma das partes dos deveres resultantes do contrato» conteria, tão só, uma previsão genérica e indeterminada – remetendo, aliás, para os “termos gerais do Direito”; interessante, contudo, como veremos infra, será a expressa menção à “justa causa”.

      Já no nº 2 releva a explícita alusão, entre as várias condições em que o contrato poderia ser rescindido, à «falta ou omissão grave na execução do Contrato, designadamente atrasos imputáveis ao Adjudicatário…».


*


IV – 9 - Em termos gerais decorre do art. 432 do CC que é admitida a resolução do contrato fundada na lei ou em convenção. Este direito de resolução do contrato será um direito potestativo, extintivo e dependente de um fundamento – terá de verificar-se o facto ou situação a que a lei, ou o contrato, liga como consequência surgir esse direito potestativo.

Face à lei a simples mora do devedor não conferirá ao credor o direito a resolver o contrato – tal resolução apenas seria consentida quando houvesse incumprimento definitivo imputável ao devedor.

     A regra do CC é a de que a mora do devedor não faculta imediatamente ao credor a resolução do contrato de onde nasce a obrigação que não foi pontualmente cumprida. Para que, tendo a obrigação não cumprida por fonte um contrato bilateral, o credor possa resolver o contrato desonerando-se da sua contraprestação, torna-se necessário, em princípio, que a prestação da outra parte se tenha tornado impossível, por causa imputável ao devedor (art. 801º, nº 1, do Cod. Civil). Em outras duas situações a mora culposa do devedor é equiparada pela lei ao não cumprimento definitivo: ter o credor, em consequência da mora, perdido o interesse que tinha na prestação, perda de interesse essa a ser apreciada objectivamente; não ser a prestação efectuada dentro do prazo razoavelmente fixado pelo credor (art. 808 do CC).

Todavia, vem-se alertando para a circunstância de o regime de resolução por incumprimento constante do CC se encontrar desenhado com base no paradigma do contrato de execução instantânea, sendo que as especificidades das relações duradouras decorrentes da sua natureza prolongada no tempo não permitem o enquadramento automático das mesmas naquele paradigma, impondo, ainda que apenas em determinadas matérias, a aplicação de regras diferenciadas ajustadas às respectivas características [10Ver Joana Farrajota, «A Resolução do Contrato sem Fundamento», Almedina, 2015, pags. 357-359].

No acórdão da Relação de Lisboa de 16-1-1990 [11Publicado na Colectânea de Jurisprudência, ano XV, tomo 1, pag. 138] entendeu-se que «como observa Baptista Machado, R.L.J. 118, pag. 280, o mecanismo do art. 808 do C.C. não se ajusta directamente às relações contratuais duradouras, não sendo necessário o recurso a ele quando existe justa causa de resolução. Ora, sendo de execução prolongada o contrato de empreitada (cfr. Rubino, ob. cit. pag. 79) a observação daquele mestre tem aqui cabimento».

Não sendo pacífico o entendimento de que na empreitada estamos perante um contrato de execução prolongada [12Ver, assim, Menezes Leitão - em «Direito das Obrigações», Almedina, vol. I, 5ª edição, pag. 136 e nota 293 - que considera que a prestação do empreiteiro, apesar de se poder prolongar por algum tempo, não deixa de ser uma prestação instantânea] explica, a propósito, Pedro Romano Martinez [13 Em «Direito das Obrigações – Contratos», Almedina, 2ª edição, pag. 363] que a «empreitada é um contrato do qual, por via de regra, para uma das partes emergem prestações de execução prolongada» e que se trata de «uma categoria intermédia entre a tradicional bipartição de prestações instantâneas e permanentes».

O contrato a que se reportam os autos foi denominado pelas partes de «Contrato Misto de Fornecimento de Equipamento e Prestação de Serviço». Reporta-se à realização do projecto, fornecimento e construção "chave-na-mão" de uma central termoeléctrica de produção de energia elétrica usando como combustível principal a biomassa mas também às prestações de serviços referidas no caderno de encargos, nomeadamente as mencionadas na cláusula 1ª – assim, exemplificativamente, «seguros de transporte, montagem e testes», «instrução e formação do pessoal de operação e manutenção durante o período de Comissionamento de cada uma das partes da empreitada», «Assessoria Técnica ao Dono da Obra até à Recepção Definitiva».

Teremos, assim, um contrato que não se contem inteiramente na definição de um simples contrato de empreitada, tal como ele resulta previsto no art. 1207 do CC, sendo que a prestação de serviços acordada extravasará a realização de uma “certa obra”.

Seguindo Baptista Machado [14 Na «Anotação» ao acórdão do STJ de 8-11-1983, RLJ, ano 118º, pags. 277-278] dir-se-á que as prestações em causa no contrato a que nos reportamos embora não sejam propriamente de execução duradoira, também não são de cumprimento diferido no tempo apenas por vontade das partes, mas pela natureza das próprias prestações. Singularizando-se o contrato por criar uma relação complexa que abrange várias prestações a realizar escalonadamente no tempo, a relação jurídica por ele criada está sujeita ao regime de resolução por justa causa.  


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IV – 10 - Defende Joana Farrajota [15 Obra citada, pag. 360-361] que nos «contratos de execução duradoura a apreciação da admissibilidade do exercício da faculdade resolutória deve ser realizada noutros moldes. O inadimplemento não deve ser valorado em função apenas do seu efeito isoladamente considerado, mas atendendo ao seu impacto na relação enquanto um todo. O que está em causa, em regra, num contrato de execução duradoura, não é a perda de interesse do credor numa concreta prestação, mas sim a perda de interesse na manutenção da relação. O juízo de avaliação do incumprimento, para efeitos do exercício do direito de resolução nos contratos de execução duradoura transcende a mera apreciação do respectivo impacte no interesse do credor na prestação incumprida, incidindo igualmente sobre o efeito daquele no interesse do credor em manter-se vinculado ao contrato.

Atenta-se, para além da gravidade do incumprimento em si mesmo considerado, aos efeitos daquele na viabilidade da relação. Trata-se, pois, a final, de realizar um juízo quanto à exigibilidade da manutenção do contrato.

O contrato de execução duradoura deve poder ser resolvido sempre que de acordo com as concepções vigentes na sociedade e à luz do princípio da boa fé, em face de determinado facto ou circunstâncias, a respectiva execução se torne inexigível».

Concluindo, adiante, que das «regras particulares sobre a resolução por justa causa em contratos de execução duradoura retira-se um princípio geral de resolução com fundamento em justa causa, aplicável a todas as relações de execução duradoura».

O «conceito de “justa causa” é um conceito indeterminado cuja aplicação exige necessariamente uma apreciação valorativa do caso concreto. Será uma “justa causa” ou um “fundamento importante” qualquer circunstância, facto ou situação em face da qual e segundo a boa fé, não seja exigível a uma das partes a continuação da relação contratual; todo o facto capaz de fazer perigar o fim do contrato ou de dificultar a obtenção desse fim, qualquer conduta que possa fazer desaparecer pressupostos, pessoais ou reais, essenciais ao desenvolvimento da relação… A “justa causa” representará, em regra, uma violação dos deveres contratuais (e, portanto, um “incumprimento”): será aquela violação contratual que dificulta, torna insuportável ou inexigível para a parte não inadimplente a continuação da relação contratual» [16 Baptista Machado, «Pressupostos da Resolução por Incumprimento», «Obra Dispersa», vol. I, Braga, 1991, pags. 143-144].

Esclarecendo Baptista Machado [Citada «Anotação», pag. 318] poder inferir-se que havendo uma justa causa para a resolução não há necessidade de recorrer ao processo de intimação com fixação de um prazo suplementar, nos termos do nº 1 do art. 808 e que embora a lei só fale de resolução por justa causa ao regular os contratos com prestações duradouras, o seu regime deve ser alargado por analogia às relações contratuais que não tendo, embora, por objecto prestações duradouras, perduram no tempo, pelo facto de as respectivas obrigações terem um prazo para o cumprimento.


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IV – 11 - Assentemos, pois, em que no caso dos autos estamos perante um contrato com prestações de execução prolongada, existindo uma relação complexa que abrange várias prestações a realizar escalonadamente no tempo.

De acordo com o considerado supra, a relação jurídica criada pelo contrato dos autos está sujeita ao regime de resolução por justa causa.

“Justa causa” aquela que as partes no Contrato Misto de Fornecimento de Equipamento e Prestação de Serviço expressamente associaram à resolução como resulta do nº 1 da Cláusula 14ª.

O juízo de avaliação do incumprimento, para efeitos do exercício do direito de resolução, incidirá sobre o interesse do credor em manter-se vinculado ao contrato, para tal havendo que realizar um juízo quanto à exigibilidade da manutenção do contrato, podendo este ser resolvido se face às circunstâncias, à luz do princípio da boa fé, a manutenção do mesmo se torne inexigível.

Haverá que ponderar se ocorreu uma violação dos deveres contratuais por parte do Consórcio criando um condicionalismo incompatível com a exacta e correcta execução do contrato.

Na sentença de 1ª instância são salientadas as seguintes circunstâncias:

«- no dia 9 de março de 2009, através de carta de fls. 444-446, a autora fez sentir ao Consórcio que «(…) a central de Biomassa continua a sofrer de diversos problemas continuados e sem fim à vista, que não permitem colocar em funcionamento e a operar em boas condições uma unidade industrial de elevado valor. Ainda hoje fomos alertados para mais um problema cuja cópia anexamos do Director da Central. (…)»;

- no dia 30 de Março de 2009, a autora enviou ao Consórcio a carta que se encontra a fls. 451-454 do apenso A), na qual lhe faz sentir que «(…) mesmo considerando as prorrogações concedidas (…) existe neste momento um atraso de cerca de 6 meses na conclusão da obra (…). Acresce que na presente data não se vislumbra uma data de conclusão para a obra (…). Em anexo à presente carta juntamos nova lista meramente indicativa de problemas já detetados e que terão de ser solucionados por V. Exas sob pena de não ser possível rececionar provisoriamente os trabalhos. Basta olhar para esta lista para confirmar que a questão da biomassa que V. Exas mencionam novamente na carta em epígrafe, é uma falsa questão (…) não nos resta outra alternativa senão notificar-vos formalmente para que terminem a obra em condições de ser rececionada no prazo de um mês e meio a contar da receção da presente carta»;

- no dia 13 de abril de 2009, através da carta que consta de fls. 460-469, o Consórcio informa a autora que «está a desenvolver os esforços necessários para implementar as acções necessárias para cumprir com a solicitação (...) de prazo de conclusão da central, sendo que informaremos assim que possível quando começarão a chegar à centra os equipamentos actualmente em fabricação»;

- no dia 21 de Abril de 2009, a autora, através da carta que se encontra junta de fls. 470-478 do apenso A), faz sentir ao Consórcio que «(…) a Central de Biomassa aguarda com expectativa o envio da documentação supra solicitada bem como a conclusão da obra com todo o equipamento instalado e operacional até 15 de Maio, de forma a que seja possível iniciar logo de seguida os ensaios de operacionalidade e rececionar provisoriamente a obra (…)», e anexa uma «lista de trabalhos em falta mais importantes (15 de Maio de 2009)»;

- ao longo do ano de 2008, verificaram-se sucessivos problemas no sistema de alimentação da caldeira, na manutenção de estabilidade da combustão na grelha, na extração, sem paragens, dos produtos resultantes da combustão da biomassa (cinzas e gases de combustão) e ainda problemas na estação de tratamento de águas, sistema hidráulico, sistema de cinzas de fundo, instrumentação e na programação informática da instalação;

- tais problemas inviabilizavam a conclusão dos trabalhos e a entrada em funcionamento da Central;

- ocorreu um erro de projeto ao nível da instalação das gruas de biomassa, as quais não conseguiam entrar na tremonha de descarga de biomassa que alimentava a caldeira;

- em Março de 2009, as obras registavam atrasos e as instalações revelavam constantemente defeitos e problemas graves, o que foi comunicado ao Consórcio 1ª Ré/HH através da carta referida em 2.1.1.33.;

- em Abril de 2009, estavam ainda por realizar vários trabalhos, havia equipamentos pendentes de entrega e problemas identificados que necessitavam de solução para que a Central pudesse entrar em funcionamento;

- a 20 e a 27 desse mesmo mês de Abril de 2009, respetivamente, MM e NN deslocaram-se às instalações da HH na Dinamarca, para verificarem o novo Sistema de Alimentação de Biomassa que deveria ser instalado na Central até ao dia 30 de Abril de 2009 e em ambas as visitas se verificou que os trabalhos estavam muito atrasados e que, em função disso, seria impossível cumprir o referido prazo acordado para a respetiva instalação;

- a primeira entrega de material relativo a esse sistema acabou por ser feita no dia 8 de Junho de 2009;

- esse sistema fracassou quando submetido a um teste a frio no dia 29 de Junho de 2009;

- no dia 15 de Maio de 2009 a Central não se encontrava pronta para início dos testes conducentes à receção provisória:

- no relatório efetuado por técnicos da Universidade de Aveiro contratados para vistoriarem a obra, conclui-se pela existência dos seguintes problemas:

(i) Especificação incorreta das características da biomassa tendo em conta o material disponível para queima neste tipo de unidades em Portugal;

(ii) Sistema de movimentação e transporte de biomassa no silo de armazenamento com capacidade deficitária;

(iii) Sistema de alimentação à caldeira inadequado ao tipo de biomassa disponível; e,

(iv) Conceção da chaminé no que se refere a infraestruturas de recolha e amostra de gases;

- mais consta desse relatório que os erros de dimensionamento que em alguns casos poderiam confundir-se com falhas ou omissões de construção, eram transversais a toda a instalação, com especial destaque a ser dado ao sistema hidráulico, sistema de cinzas secas, sistema de instrumentação monitorização e controlo, e planeamento geral da obra;

- no dia 21 de Maio de 2009, a 1ª ré e a HH decidiram dispensar o seu subempreiteiro OO, Lda.;

- o número insuficiente de pessoas em obra, aliado às sucessivas deslocações de PP, supervisor da HH na obra, à Dinamarca e à falta de disponibilidade do programador do sistema de comando e controlo da caldeira e seus auxiliares (um freelancer que trabalhava em horário pós laboral a partir da Dinamarca), contribuiu para atrasar ainda mais os trabalhos em curso;

- no dia 29 de Junho de 2009 foram levados a cabo os referidos testes com um tipo de biomassa (estilha de madeira) especificamente solicitado pelo Consórcio;

- nesse dia, como em diversas outras ocasiões no passado, a mesa de alimentação de biomassa não funcionou de forma contínua nem de forma controlada, encravou várias vezes, não dispunha da potência hidráulica necessária para transportar a biomassa, não forneceu nem recebeu sinais do sistema informático de controlo e monitorização da instalação, o que levou a que em 29 de Setembro de 2009 tal mesa de alimentação fosse desmembrada e reconfigurada pelo Consórcio;

- naquele mesmo dia 29 de Junho de 2009 a HH informou a autora que iria interromper os trabalhos na Central, tendo o seu supervisor abandonado a obra no dia seguinte para gozo férias, sem deixar qualquer programa de trabalhos para os dias/semanas seguintes, nem informado a autora da data em que regressaria à obra;

- a HH só voltou a trabalhar em obra depois do dia 28 de Setembro de 2009, para dar início aos trabalhos previstos no acordo tripartido referido em 2.1.1.24

Do mencionado acordo tripartido consta:

Cláusula 3ª («PLANO DA OBRA»):

«(a) O Dono da Obra e o Empreiteiro acordam entre si que a Recepção Provisória da Obra será feita parcelarmente, em duas fases, uma correspondente a todas as obras e equipamentos da Central de Biomassa, com excepção daqueles relativos ao sistema de pó de cortiça, cuja recepção provisória só ocorrerá à posteriori, numa segunda fase.

(b) O Dono da Obra c o Empreiteiro acordam entre si o calendário da obra e respectivo cronograma em anexo (Anexo I), tendo em vista as Recepções Provisórias parcelares da Obra, o qual compreende, para cada uma delas, as seguintes fases: (i) Auto de Fim de Montagem: (ii) Serviço Industrial; e (iii) Recepção Provisória»;

Cláusula 4.1 («Auto de Fim de Montagem»):

«(a) Previamente ao Serviço Industrial da Central de Biomassa (excluindo o sistema de pó de cortiça), o Adjudicatário deverá concluir a remodelação e/ou reparação dos seguintes equipamentos:

(i) Sistema de controlo das gruas de alimentação, do sistema de alimentação e da caldeira;

(ii) Garras das gruas de alimentação à biomassa à caldeira e respectiva programação;

(iii) Sistema de alimentação da caldeira;

(iv) Queimador Diesel para arranque da caldeira;

(v) Sistema da grelha;

(vi) Sistema de remoção de cinzas;

(vii) Sistema de supervisão da central;

(viii) Sistema de tratamento de águas;

(ix) Sistema hidráulico;

(x) Funcionalidade de linha dos sopradores de fuligem e respectiva linha;

(xi) Tanque de alimentação de água/desgaseificador;

(xii) Compressor de ar;

(xiii) Cortina de água;

(xiv) Chaminé (escadas de segurança e plataformas para tomas de amostragem), se aplicável;

(xv) Equipamento de monitorização ambiental; e,

(xvi) Aplicação informática

(b) Para cumprir os requisitos da Directiva de Equipamentos sob Pressão (PED), terão que ser realizados testes de pressão a frio e de verificação das válvulas de segurança por forma a que seja obtido o respectivo certificado ele operação pela Entidade Certificadora».

Cláusula 4.4 («Características da Biomassa»):

(a) A biomassa a utilizar nos Testes Operacionais a realizar durante o período de Serviço Industrial deverá ser exclusivamente de eucalipto (rolaria de eucalipto) processada. na Central de Biomassa, por máquinas de trituração a martelo, a qual deverá ler as seguintes características:

(i) Densidade: a densidade da biomassa armazenada deverá ser entre 200Kg/m3 e 400Kg/m3;

(ii) Humidade: a humidade da biomassa deverá ser entre 25% e 50%;

(iii) Percentagem de cinzas: entre 0% e 8%;

(iv) Tamanho máximo dos fragmentos da biomassa: 400x200x200mm;

(b) As partes acordam que se a biomassa utilizada nos Testes Operacionais a realizar durante o período de Serviço Industrial estiver dentro dos parâmetros a seguir indicados, nenhuma interrupção será atribuída à Biomassa utilizada.

(i) 100% de eucalipto (rolaria de eucalipto), processada, na Central de Biomassa, por máquinas de trituração a martelo;

(ii) Densidade: a densidade da biomassa armazenada deverá ser igual ou superior a 225 kg/m3;

(iii) Humidade: a humidade da biomassa deverá ser entre 30% e 40%:

(iv) Percentagem de cinzas: entre 0% e 8%;

(v) Tamanho máximo dos fragmentos da Biomassa: 400x200x200mm.

(c) Durante o período de Serviço Industrial, o Dono da Obra compromete-se a realizar análises a cada lote de biomassa que dê entrada na Central, utilizando o seu próprio laboratório, por forma a confirmar que as características da mesma correspondem àquelas enunciadas na alínea (a) supra e avaliar se estão ou não dentro dos valores identificados na alínea (b) supra. As análises deverão ser feitas duas vezes por dia, após a trituração da matéria prima para o armazém de biomassa, e deverão ser imediatamente disponibilizadas ao Empreiteiro.

(d) Análises aleatórias do combustível armazenado no Depósito de combustível ou diretamente do funil do combustível, deverão ser realizadas durante o período de Serviço Industrial conforme especificado na alínea (e) infra.

(e) Durante o período de Serviço Industrial, o Dono da Obra e o Empreiteiro selecionarão, em conjunto, 5 (cinco) amostras da Biomassa armazenada, as quais serão guardadas e seladas em sacos de plástico e enviadas para análise laboratorial dos seguintes parâmetros:

(i) Percentagem de cinzas:

(ii) Poder calorífero "LHV".

Continuando a seguir a sentença recorrida temos que:

«Após a celebração deste acordo tripartido:

- em 11 de Dezembro de 2009, a autora enviou ao Consórcio o e-mail que se encontra junto a fls. 596 e 597, traduzido de fls. 786 a 788 do apenso A), cujo aqui se dá por reproduzido, e em resposta a uma proposta formulada pelo Consórcio, declarou que aceitaria assinar um «Provisional Construction Completion Certificate» (CCC) sob condição de ser elaborada e acordada pelas partes uma «punch list» - resultante da inspeção levada a cabo pela HHA nos dias 30 de Novembro a 2 de Dezembro, e de que a 1ª Ré e a HH tomaram conhecimento - com as tarefas, trabalhos e documentos em falta, incompletos ou ainda por entregar;

- no dia 24 de Dezembro de 2009 foi enviada à 1ª Ré e à HH, por e-mail, traduzido a fls. 793 a 798 do apenso A), uma lista de trabalhos incompletos («punch list») actualizada em conformidade com o segundo relatório da HHA que continha as medidas a implementar para resolução dos defeitos/problemas da instalação existentes à data;

- no dia 25 de Setembro de 2009 realizou-se uma reunião entre os representantes do BANCO LL, da HHA, da autora, da 1ª ré e da HH, que teve por finalidade discutir a implementação dos pontos 4.1. e 4.3.1 do acordo tripartido, designadamente os prazos para realização dos concretos trabalhos concretos pendentes de conclusão ou reparação por parte do Consórcio;

- a 30 de Setembro de 2009, chegaram à Central as novas garras para as gruas as quais não estavam completas nem correspondiam ao que havia sido prometido pela HH;

- a 6 de Outubro de 2009 realizou-se nova reunião entre os representantes do BANCO LL, HHA, Autora e 1ª Ré, convocada com o propósito de verificar o progresso das medidas acordadas na reunião realizada a 25 de Setembro de 2009 e o cumprimento dos respetivos prazos;

- nessa mesma reunião foi elaborada nova «action list» nos termos do documento que consta de fls. 584 a 591:

- a 12 de Outubro de 2009, a autora retirou toda a biomassa ainda presente no depósito de combustível da Central, de forma a cumprir com o disposto no acordo tripartido e evitar qualquer dúvida em relação ao tipo de biomassa que iria ser utilizada nos testes a efetuar no âmbito daquele acordo;

- após análise dos desenhos referidos em 2.1.1.58., tanto a autora como a HHA rejeitaram a solução apresentada por esta ser tecnicamente inviável;

- ao longo dos meses de outubro e novembro de 2009, a autora e a HHA foram alertando o Consórcio para os sucessivos atrasos verificados no cumprimento das obrigações enumeradas no acordo tripartido;

- devido a atrasos, erros e lacunas por parte do Consórcio na entrega da documentação de sua responsabilidade, só a 11 de Novembro de 2009 é que foi possível à autora reunir toda a documentação necessária para o registo e autorização prévia de instalação da caldeira e entregá-la na DRE-N (Direcção Regional de Energia – Norte);

- nos dias 30 de Novembro a 2 de Dezembro de 2009 foi realizada nova inspeção à obra por parte da HHA, da qual resultou uma nova lista de trabalhos incompletos («punch list») com soluções a implementar, nos termos do documento de fls. 592-595;

- no dia 13 de Dezembro de 2009, representantes da autora, da 1ª ré e da HH determinaram a densidade de amostras da biomassa a utilizar e verificaram que os valores dessas amostras estavam dentro das especificações vertidas no acordo tripartido;

- no período compreendido entre os dias 18 de Dezembro de 2009 e 4 de Janeiro de 2010 não se encontravam em obra quaisquer funcionários do da 1ª Ré ou da HH, designadamente PP, ausência que se repetiu nos períodos entre 9 e 22 de Fevereiro de 2010, 4 de Março e 6 de Abril de 2010 e novamente entre 19 e 26 de Abril de 2010;

- no dia 8 de Janeiro de 2010, a HH apresentou à Autora um novo calendário de testes a realizar entre 11 e 19 de Janeiro de 2010;

- em Abril de 2010 e apesar da carta de 29 de abril de 2010, referida em 2.1.1.61., o Consórcio não enviou o certificado de conclusão de obra à autora para assinatura, nem foi designada data para esse efeito;

- em 29 de abril de 2010 estavam por concluir os seguintes trabalhos mencionados no ponto 4.1. do Acordo Tripartido:

a) Queimador a diesel para arranque da caldeira;

b) Sistema de monitorização da Central

c) Sistema de tratamento de águas

d) Sistema hidráulico

e) Aquecimento do tanque de alimentação de água/desgaseificador

f) Software PLC/Scad, sendo que sem tais equipamentos a Central não podia funcionar».

Referimos que a relação jurídica criada pelo contrato dos autos está sujeita ao regime de resolução por justa causa, justa causa essa que se identifica com uma violação dos deveres contratuais - e, logo, um “incumprimento” – correspondendo àquela “violação contratual que dificulta, torna insuportável ou inexigível para a parte não inadimplente a continuação da relação contratual”.

As partes aludiram ao direito de rescindir (resolver) o contrato com justa causa, no nº 1 da cláusula1 4ª do Contrato, e enumeraram no nº 2 da mesma cláusula entre as condições em que o contrato poderia ser rescindido, verificar-se “falta ou omissão grave na execução do Contrato, designadamente atrasos imputáveis ao Adjudicatário…”.

O circunstancialismo acima descrito reconduz-se, em nosso entender, em atrasos imputáveis ao Consórcio, tal como em imperfeita execução do contrato por parte deste, susceptíveis de tornar inexigível para a A. a manutenção da relação contratual.

Face às circunstâncias apuradas, à luz do princípio da boa fé não era exigível à A. que ela se mantivesse ligada ao Consórcio, dado o fundado receio – derivado da justificada perda de confiança - de que este, incumprindo os seus deveres contratuais, continuasse a perturbar a concretização dos objectivos previstos, evidenciando-se assim a perda do interesse da A. em manter-se vinculada pelo contrato.

Encontra-se, deste modo, legitimada a resolução do contrato por parte da A., não se impondo a ocorrência de uma interpelação admonitória para que houvesse incumprimento definitivo – art. 808 do CC – ao contrário do pretendido pelas apelantes RR..” [negritos nossos]


       A orientação seguida pelo acórdão recorrido no sentido de, no caso dos autos, admitir a resolução do contrato com dispensa de interpelação admonitória do devedor, afigura-se correcta e devidamente fundamentada.

      Tal como entendeu a Relação, o contrato dos autos, denominado “Contrato Misto de Fornecimento de Equipamento e Prestação de Serviço”, celebrado entre a A. e o Consórcio, constituído pela 1ª R. e pela sociedade dinamarquesa “HH A/S”, em regime de solidariedade, corresponde a um contrato misto de empreitada e de prestação de outros serviços não recondutíveis ao objecto da empreitada. Através dele foi constituída uma relação obrigacional complexa, que integra múltiplos deveres para ambas as partes, cujo cumprimento se encontra diferido no tempo pela própria natureza das prestações em causa.

Assim, ainda que sem estarem em causa relações contratuais duradouras propriamente ditas (aquelas em que o tempo é factor conformador dos deveres primários de prestação – cfr. Ferreira Pinto, Contratos de Distribuição Da tutela do distribuidor integrado em face da cessação do vínculo, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2013, págs. 105 e segs.), tanto a natureza das prestações a que o Consórcio se obrigou como o facto de a execução das mesmas se prolongar ao longo do tempo, confere ao contrato sub judice características próximas das relações contratuais duradouras, entre as quais – com relevante implicação para a questão da resolução contratual – as exigências de acrescida confiança recíproca entre as partes.

      Foi nesta equiparação à categoria dos contratos duradouros que a Relação fundamentou a aplicabilidade da doutrina da resolução com fundamento em justa causa, com recurso à doutrina de Baptista Machado (na Anotação ao Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8 de Novembro de 1983, in RLJ, Ano 118, págs. 271-272, 317-320 e 328-332; cfr. do mesmo autor, “Parecer sobre Denúncia e Direito da Resolução de Contrato de Locação de Estabelecimento Comercial”, in Obra Dispersa, Vol. I, Scientia Ivridica, Braga, 1991, págs. 662 e segs.) e, na sua senda, de autores mais recentes (com destaque para Joana Farrajota, A Resolução do Contrato sem Fundamento, Almedina, 2015, págs. 359 e segs.).

Assinale-se, aliás, haver quem defenda que a resolução do contrato por inexigibilidade da subsistência da relação contratual constitui um princípio geral válido para todas a relações contratuais (cfr., neste sentido, Pinto de Oliveira, Princípios de Direito dos Contratos, Coimbra Editora, 2011, págs. 869-874).

      Se alguma dúvida subsistisse acerca da possibilidade de aplicar a resolução contratual com fundamento em justa causa ao contrato dos autos, ela seria suprida pela circunstância de, como salientou o acórdão recorrido, as partes nele terem inserido cláusula (a cláusula 14ª) em cujo nº 1 expressamente se prevê a possibilidade de resolução do contrato “com justa causa”, e em cujo nº 2 se admite a resolução caso “Se verifique falta ou omissão grave na execução do Contrato, designadamente atrasos imputáveis ao Adjudicatário ou utilização de materiais ou meios inaceitáveis que ponham em causa o êxito do empreendimento” e ainda caso “O Adjudicatário se recuse a proceder a reparações ou a modificações necessárias ao bom funcionamento das instalações e ao bom êxito técnico e económico do empreendimento segundo as especificações e determinações contratuais e, nos casos omissos, segundo as regras da técnica”. Quer dizer que, diferentemente do entendido pela 1ª instância, a cláusula 14ª não configura apenas uma cláusula de estilo, antes permite concluir que o próprio contrato dos autos admitia a resolução com fundamento em justa causa, a qual se poderia consubstanciar, precisamente, na verificação de falhas reiteradas na execução do programa contratual por parte do Consórcio.

      Convoca-se aqui a ideia de inexigibilidade, que, nas palavras de Ferreira Pinto (reportando-se à resolução por justa causa dos contratos duradouros, mas em termos válidos para a resolução por justa em causa em geral), assim se perspectiva:

A justa causa constitui, por conseguinte, uma cláusula geral que remete para o juiz a questão de determinar, em cada situação concreta, até que ponto a prossecução da relação em curso é exigível. E isso transforma o conceito de inexigibilidade na pedra-de-toque de todo o sistema de resolução dos contratos duradouros, constituindo o futuro relacionamento entre as partes o ponto focal do juízo implicado por aquele conceito” (cit., pág. 396).


      No caso dos autos, aferir da (in)exigibilidade, para a A., da manutenção do vínculo contratual com o Consórcio que integra a 1ª R. passa, no fundo, pela avaliação do parâmetro daquilo que Pinto de Oliveira (cit., págs. 871 e segs.) qualifica como “não cumprimento sintomático”:

      “O princípio subjacente ao não cumprimento “sintomático” é o de que o não cumprimento de menor importância deve ser equiparado ao não cumprimento de maior importância, desde que cause, justificadamente, o desaparecimento da confiança do credor na (adequada) realização das prestações futuras.

            (…)

     O atraso em si não será, porventura, (suficientemente) grave; o conjunto dos atrasos, sim; o cumprimento defeituoso ou imperfeito em si não será, porventura, (suficientemente) grave; o conjunto dos cumprimentos imperfeitos, sim.” (cit., pág. 873).


      No caso sub judice, perante a sucessão de faltas na execução do programa contratual por parte do Consórcio – numa primeira fase (entre 2006 até ao terceiro quartel de 2009) em que os reiterados atrasos e deficiências dos serviços prestados pelo Consórcio puseram em crise a relação contratual, conduzindo à celebração (em 14 de Setembro de 2009) do denominado Acordo Tripratido (entre o BANCO LL, a Autora, e o Consórcio formado pela 1ª R. e pela “HH S/A”), com o objectivo de tentar viabilizar o projecto da Central de Biomassa; e, numa segunda fase, à medida que (no final de 2009 e em 2010) o Consórcio foi incumprindo as obrigações assumidas no dito Acordo Tripratido –, sufraga-se o entendimento das instâncias de que ocorreu justa causa de resolução pela A., não lhe sendo exigível que permanecesse vinculada diante do Consórcio.     

Não pode também atender-se à pretensão da R. Recorrente de que, “Mesmo a entender-se que existiria uma justa causa de resolução, nos termos expostos no Acórdão recorrido, sempre a vontade manifestada pela Autora de, apesar dessa causa, exigir e receber a prestação da Ré, revelando não ter perdido o interesse nesse cumprimento ainda que atrasado, torna imprescindível a interpelação admonitória prévia à resolução legítima do contrato (cfr. parágrafos 64. a 81. supra).” Invoca a R. Recorrente que tanto o teor da carta enviada pela A. à 1ª R. e à HH, com data de 12 de Maio de 2010 (facto provado 62), como o teor da carta da A., datada 4 de Junho de 2010 (a mesma data da carta de resolução), na qual invoca o direito a aplicar penalidades contratuais (facto provado 64), revelariam que a A. mantinha o interesse na realização das prestações contratuais pelo que – mesmo que se admita existir justa causa de resolução – sempre seria de exigir uma prévia interpelação admonitória do Consórcio devedor.

      Afigura-se que a perspectiva da R. Recorrente não pode ser acompanhada, nem no plano da construção teórica que invoca, nem no plano prático da verificação de uma eventual conduta contraditória da A.

      Com efeito, diversamente do que alega a R. Recorrente, os pressupostos do regime da transformação da mora em incumprimento definitivo (do art. 808º do Código Civil) não se confundem com os pressupostos da resolução por justa causa. O juízo de verificação da justa causa resolutiva assenta na avaliação da ruptura da relação de confiança entre as partes, não se identificando com a aferição da subsistência ou não do interesse do credor na prestação. Dito de outra forma, ainda que a A. mantivesse o interesse na conclusão da Central, diante dos sucessivos e gravosos incumprimentos do Consórcio devedor, a confiança da A. na contraparte ficou irremediavelmente afectada, tornando-se inexigível a subsistência do vínculo contratual. Assim, não se contesta que a A. tenha conservado o interesse na conclusão da edificação da Central, mas antes que conservasse a confiança na competência e na capacidade do devedor (o Consórcio) para levar a bom termo a tarefa. O que consubstancia justa causa resolutiva.

      Também no plano prático da verificação de uma eventual conduta contraditória da A. – atento o conteúdo das cartas invocadas – não tem a R. Recorrente razão.

Vejamos.

     Relevam, em especial, os seguintes factos provados:

61. No dia 29 de Abril de 2010 a 1ª ré e a HH escreveram à autora solicitando que o certificado de conclusão da obra fosse assinado em conformidade com o acordado em Dezembro de 2009, nos termos que constam do documento traduzido a fls. 806 e 807, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

62. Em resposta, a autora enviou à 1ª ré e à HH uma carta datada de 12 de Maio de 2010, que constitui o documento traduzido a fls. 810 a 813, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

63. Através de carta datada de 4 de Junho de 2010, a autora, autorizada para esse efeito por parte do BANCO LL, declarou a resolução do Contrato nos termos que constam do documento junto a fls. 440-441 do apenso A), cujo teor aqui se dá por reproduzido;

64. Nesse mesmo dia 4 de junho de 2010, a autora enviou à 1ª ré e à HH a carta que constitui o documento junto de fls. 690-692 do apenso A), cujo interior aqui se dá por integralmente referido, no qual refere, além do mais, a aplicação de penalidades correspondentes a 10%, no valor de 1.770.774,50 €, enviando-lhe um auto relativo às mesmas;

110. Em Abril de 2010 e apesar da carta de 29 de abril de 2010, referida em 61., a 1ª ré e a HH não enviaram o certificado de conclusão de obra à autora para assinatura, nem foi designada data para esse efeito;

111. E nessa data estavam por concluir os seguintes trabalhos mencionados no ponto 4.1. do Acordo Tripartido:

(a) Queimador a diesel para arranque da caldeira;

(b) Sistema de monitorização da Central

(c) Sistema de tratamento de águas

(d) Sistema hidráulico

(e) Aquecimento do tanque de alimentação de água/desgaseificador

(f) Software PLC/Scad;

112. Sem tais equipamentos a Central não podia funcionar.


    A R. Recorrente alega ser a declaração de resolução da A. incongruente com o teor da carta (da A.) de 12 de Maio e com o teor da segunda carta (também da A.) de 4 de Junho relativa à aplicação de penalidades contratuais por atrasos.

     Vejamos.

      Que, na mesma data (04/06/2010), a A. tenha enviado duas cartas à contraparte, uma contendo a declaração de resolução do contrato e outra invocando a aplicação de penalidades por atrasos, não é em si mesmo contraditório; apenas demonstra que a A. entende serem tais penalidades cumuláveis com a resolução do contrato. Saber se tem ou não razão é questão que será apreciada infra neste acórdão.

   Quanto à alegada contradição entre a declaração de resolução com fundamento em justa causa e o conteúdo da carta da A., datada de 12 de Maio, deve ter-se presente, por um lado, que esta carta foi escrita em resposta à exigência do Consórcio de que a A. assinasse o certificado de conclusão da obra (factos 61 e 62), sem que o Consórcio tivesse concluído os trabalhos previstos no Acordo Tripartido (facto 111), falta de conclusão que determinava a impossibilidade de funcionamento da Central (facto 112); e, por outro lado, que, para se compreender a posição assumida pela A. naquela data (12/05/2010), não basta atentar no excerto da carta que a R. Recorrente transcreveu a fl. 1631 das conclusões recursórias, antes se deve ponderar o texto completo da mesma, que em seguida se transcreve:


Assunto: Carta do Consórcio datada de 29 de Abril de 2010

Exmo. Senhor,

Foi com grande surpresa que recebemos a vossa carta datada de 29 de Abril de 2010, dado que o respectivo conteúdo é manifestamente falso e mal intencionado.

O TPA foi assinado no dia 14 de Setembro de 2009 e estava previsto que o AFM (Auto de Fim de Montagem) fosse assinado no dia 26 de Outubro de 2009 após a inspecção da Central e a conclusão dos diversos trabalhos e tarefas enumerados na Cláusula 4.1 do referido TPA.

Por motivos imputáveis exclusivamente aos actos e/ou omissões do Consórcio, a inspecção da Central só teve lugar entre os dias 30 de Novembro e 3 de Dezembro de 2009 - isto é, com mais de um mês de atraso, e em incumprimento das disposições e acordos constantes do TP A.

Apesar de ter sérias e fundadas dúvidas relativamente à conclusão dos trabalhos e tarefas que eram da responsabilidade do Consórcio ao abrigo do TPA, a CTBAA aceitou, num primeiro momento, assinar um AFM Provisório, conforme referido no seu e-mail de 11 de Dezembro de 2009.

Esta decisão destinava-se a representar apenas um acto de boa fé por parte da CTBAA, dado que, nessa altura, a CTBAA tinha reservas substanciais quanto à operacionalidade da central e ao cumprimento integral, por parte do Consórcio, das suas obrigações legais e contratuais.

No entanto, quando no dia 22 de Dezembro de 2009, o Relatório de Inspecção da Central juntamente com a sua longa Lista de trabalhos incompletos a qual constavam 98 (!) pontos foi entregue pela HHA, a CTBAA chegou à conclusão que assinar o AFM Provisório, naquela altura, não seria a decisão mais acertada, nem asseguraria ou protegeria os interesses da CTBAA e do Banco BANCO LL.

Para além dessa convicção e da consequente decisão tomada pela CTBAA a esse respeito, o Consórcio abandonou a Central no dia 18 de Dezembro de 2009, deixando um grande número de problemas por resolver, para além do facto de se terem verificado quatro atrasos sucessivos no Programa de Trabalhos durante a semana que antecedeu a entrega do Relatório da HHA (vide as mensagens de e-mail da HH de 11, 14, 17 e 18 de Dezembro de 2009), alegando problemas primeiro com o Sistema de Tratamento de Água e depois com a aprovação das Placas de Vapor.

Apesar do que antecede, a CTBAA nunca recusou assinar o AFM Provisório.

Foi o Consórcio que, quiçá num acto de honestidade e integridade ou tomando em consideração a longa Lista de trabalhos incompletos e a extensão e o nível de violação e incumprimento grave do TPA, decidiu não enviar qualquer Auto para ser assinado nem marcou uma data para a respectiva assinatura.

Rejeitamos veementemente a insinuação, que consideramos ofensiva - para não dizer, totalmente inconveniente e até falsa - que a CTBAA não permitiu que o Consórcio continuasse os seus trabalhos e ensaios e que não estava disposta a prestar-lhe qualquer assistência, ou que recusou disponibilizar mais combustível para a Central, dado ser esta a sua obrigação.

Queremos recordar o Consórcio que a CTBAA dispõe em permanência de dois (e por vezes mais) funcionários na Central que sempre, sem excepção, satisfizeram todos os pedidos e exigências do Consórcio. Adicionalmente, o Edifício de Armazenagem de Combustível encontra-se cheio de biomassa pronta a ser utilizada e a plataforma superior tem mais de 2.000 m2 de troncos de madeira que aguardam trituração.

Só podemos interpretar estas falsas acusações como desculpas para justificar as falhas sucessivas e não sanadas da Consórcio, o que contribui ainda mais para a convicção da CTBAA que o Consórcio não tem, definitivamente, a capacidade de satisfazer as obrigações decorrentes do TPA.

Consequentemente, contestamos e até desafiamos o Consórcio a fornecer prova das graves alegações e acusações feitas à CTBAA e aos respectivos funcionários e representantes legais na sua carta datada de 29 de Abril último, a qual rejeitamos em absoluto e consideramos injusta e totalmente falsa.

Em último lugar e contrariamente ao referido pelo Consórcio na sua carta datada de 29 de Abril de 2010, a CTBAA não considera que até à data os trabalhos e tarefas referidos na Cláusula 4 do TPA tenham sido concluídos, nem que se tenha verificado uma redução significativa do número de itens na Lista de Trabalhos Incompletos, por forma a permitir à CTBAA considerar assinar o ACC.

A título de exemplo e sem levar em consideração a Lista de Trabalhos Incompletos, mas apenas referindo algumas alíneas da Cláusula 4 do TP A, consideramos que os trabalhos a seguir indicados se encontram por concluir: 

(iv) Queimador diesel para ignição da caldeira: a chama não alcança a biomassa.

(vii) Sistema de monitorização da Central: inacabado.

(viii) Sistema de tratamento de água: ausência de solução para o aquecimento da entrada de água. Incapacidade de produzir 4 m3/h.

(ix) Sistema hidráulico: incapaz de arrefecer o óleo de forma adequada. Potência insuficiente.

(xi) Aquecimento da agua de alimentação/desgaseificador: problemas de segurança.

Processo de funcionamento manual e perigoso. Continuam a faltar as radiografias.

(xvi) Software de aplicação PLC /SCADA: longe de estar completo. De muito difícil utilização.


O sentimento de que o Consórcio não possui a capacidade técnica nem a vontade de concluir a central é reforçada: (i) pelo desrespeito do longo prazo de que dispunha para cumprir as obrigações que para ele decorriam do TP A; (ii) pela oportunidade que lhe foi dada para "limpar" ou, pelo menos, reduzir substancialmente a Lista de Trabalhos Incompletos entregue em Dezembro de 2009; (iii) pela não entrega à CTBAA do projecto completo para o Sistema de PÓ de Cortiça; e, finalmente, (iv) pela falta de empenho demonstrada pelo Consórcio desde Dezembro de 2009, que culminou com o seu abandono da Central, em primeiro lugar entre 18 de Dezembro de 2009 e 4 de Janeiro de 2010, em segundo lugar entre 9 e 22 de Fevereiro de 2010 e, mais recentemente, entre 4 de Março e 6 de Abril de 2010 e entre 19 e 26 de Abril de 2010.

Para concluir e tomando em consideração a extensão e o nível de violação e incumprimento grave do TPA pelo Consórcio, particularmente da respectiva Cláusula 4, e a fim de assegurar os interesses quer da CTBAA quer do Banco BANCO LL, somos de opinião que as condições para a assinatura do AFM ainda não se encontram satisfeitas, pelo que se impõe que o Consórcio as satisfaça rapidamente, sendo que se não o fizer, a CTBAA ver-se-á obrigada a recorrer aos meios legais e contratuais ao seu dispor para proteger os seus direitos e interesses legais. [negritos nossos]


      A simples leitura do texto integral permite confirmar que, não apenas o conteúdo da carta de 12 de Maio de 2010 não é contraditório com a declaração de resolução que veio a ser feita em 4 de Junho de 2010, como é antes inteiramente coerente com tal declaração. Na carta supra reproduzida na íntegra, a A. manifesta, em termos claros e firmes, o seu descontentamento com a falta de cumprimento pontual do Acordo Tripartido pelo Consórcio, assim como a sua desconfiança quanto à capacidade e vontade deste em concluir a edificação da Central, exigindo uma rápida actuação do Consórcio e advertindo-o de que recorrerá aos meios que a lei e o contrato lhe facultam para tutelar os seus interesses.

      O teor da carta é de tal modo veemente que pouco falta para configurar uma interpelação admonitória prévia à resolução. Interpelação admonitória exigida pelo regime da transformação da mora em incumprimento definitivo do art. 808º do CC, mas que – repete-se – não se exige na resolução por justa causa que aqui está em causa. Na verdade, não pode esquecer-se que o regime da interpelação admonitória impõe que o credor fixe ao devedor um prazo razoável para cumprimento da obrigação (nº 1, do art. 808º). Se tal exigência legal fosse aplicável ao caso dos autos, teríamos que, não obstante os sucessivos e reiterados incumprimentos do Consórcio, teria ainda a A. de conceder novo prazo (o dito prazo razoável) para a conclusão do contrato. O que é manifestamente inexigível.

     Não é de mais insistir em que, no caso dos autos, o não cumprimento ou o não cumprimento pontual das obrigações assumidas pelo Consórcio no Acordo Tripartido de 14/09/2009 se seguiu a toda uma sucessão de faltas do mesmo Consórcio na execução do programa contratual durante a primeira fase da relação jurídica entre as partes (entre 2006 e o terceiro quartel de 2009), sendo que os reiterados atrasos e deficiências dos serviços prestados pelo Consórcio puseram em risco a viabilidade do projecto de construção e funcionamento da Central de Biomassa. Deste modo, é patente o carácter “sintomático” da falta de cumprimento das obrigações do Acordo Tripartido pelo prestador de serviços (o Consórcio que integra a 1ª R.), uma vez que está em causa o incumprimento de acordo feito para tentar “salvar” uma relação contratual que já anteriormente fora, por aquele prestador, posta em crise.

Por tudo o exposto, conclui-se estar plenamente provada a justa causa resolutiva, não sendo exigível que a A. permanecesse vinculada ao Consórcio.


10. Assente a validade da declaração resolutiva, torna-se necessário apreciar a questão da indemnização a que a A. tem direito, na qual se englobam as demais questões objecto do recurso da R. que ainda falta apreciar, assim como todas as questões objecto do recurso da A.

        Recorde-se que a R. Recorrente invoca, em síntese:

- Ser inadmissível a condenação que, alegadamente, cumula três indemnizações: a pena convencional prevista para a mora; uma indemnização pelo interesse contratual positivo; uma indemnização pelo interesse contratual negativo;

- Ser inadmissível a condenação genérica e ilíquida em indemnização por danos não concretizados;

- Só poder a 1ª R. ser responsabilizada pelo atraso no cumprimento contratual por aplicação da pena convencional, pelo que, estando provado ter a A. retido quantia correspondente a tal pena, nada mais haverá a pagar.


Por sua vez, defende a A. ser de manter a condenação da 1ª R. no pagamento das parcelas indemnizatórias reconhecidas pelo acórdão recorrido, à qual deverão acrescer:

- A quantia de € 58.685,00, a que alude o facto provado 67;

- A quantia de € 1.763.070,00, a título de penalidades contratuais, a que aludem os factos provados 40, 44 e 64;

- Pagamento dos sobrecustos de carácter permanente, a que alude o facto provado 121, até ao limite máximo de € 2.213.731,00, assim como os juros de mora vincendos que incidam sobre a quantia apurada, contados da data da notificação da sentença de liquidação.


10.1. Antes de proceder à análise de cada uma das parcelas indemnizatórias em causa, torna-se necessário clarificar qual o âmbito da indemnização cumulável com a resolução do contrato, designadamente, se tal indemnização visa colocar o credor/lesado na situação em que estaria se o contrato tivesse sido pontualmente cumprido (ressarcimento do interesse contratual positivo) ou se tal indemnização visa antes colocá-lo na situação em que estaria se o contrato não tivesse sido celebrado (ressarcimento do interesse contratual negativo). Trata-se de uma das problemáticas mais relevantes do recente direito dos contratos, tanto ao nível doutrinal como jurisprudencial. Para efeitos de compreensão da questão, socorremo-nos da actualizada e exaustiva explanação de recente acórdão deste Supremo Tribunal, o acórdão de 15/02/2018 (proc. n.º 7461/11.0TBCSC.L1.S1), ainda não publicado:


“Ainda na vigência do Código Civil de 1867, uma boa parte da doutrina – entre outros Autores, GUILHERME MOREIRA e CUNHA GON-ÇALVES - e da jurisprudência admitia, à luz do disposto nos respetivos artigos 676.º (condição resolutiva tácita) e 709.º (rescisão do contrato bilateral), que a resolução do contrato era simultaneamente cumulável com a indemnização por perdas e danos resultantes do não cumprimento do mesmo.[1]

     Porém, INOCÊNCIO GALVÃO TELLES, em estudo publicado na ROA, Ano 5.º, 1945, n.º 1, pp. 100-102, relativo ao não cumprimento dos contratos bilaterais, sustentou a inadmissibilidade da cumulação da rescisão (resolução) com a indemnização pelo prejuízo decorrente do não cumprimento, “porque o dever de cumprir desapareceu juridicamente no passado, em consequência da retroactividade da rescisão”, mas considerava já admissível a cumulação da resolução com a indemnização em sede do desi-gnado interesse contratual negativo ou dano de confiança.

     Sucede que, no contexto dos trabalhos preparatórios do Código Civil de 1966, VAZ SERRA defendeu a possibilidade de se cumular a resolução com a indemnização pelo interesse contratual positivo, na medida do necessário para, uma vez compensada a falta da prestação com a da contra-prestação por via dessa resolução, proporcionar ainda ao contraente fiel o acréscimo patrimonial que obteria com o contrato.[2] E nesse sentido aquele Autor formulou solução expressa no art.º 75.º do seu anteprojeto do novo Código Civil.

      O teor desse artigo, sob a epígrafe contrato bilateral, era o seguinte:

 1. Tratando-se de contrato bilateral, o credor pode também na hipótese do artigo 73.º [em caso de impossibilidade da prestação por causa imputável ao devedor], resolver o contrato e exigir indemnização dos danos resultantes do facto de o contrato não ter sido cumprido.

 2. O credor com direito de indemnização pode exigir esta contra a sua contra-prestação, e pode, se resolver o contrato, deixar de fazer a sua contraprestação e exigir do devedor a diferença de valor entre esta e a prestação. Ressalva-se o direito à reparação do maior dano.

 3. A exigência do substitutivo da prestação ou o exercício dos direitos substitutivos dela, de que trata o artigo 74.º, ou a exigência da indemnização, não ex-cluem o direito de resolução do contrato, a não ser que sejam feitas em termos que impliquem renúncia a esse direito. Se o credor exigiu indemnização em termos incompatíveis com a resolução do contrato, só pode resolvê-lo, quando de produza algum facto que, segundo a boa-fé, a isso o autorize.            

   Entretanto, tal formulação foi alterada, aquando da 1.ª revisão ministerial, no sentido de só admitir a cumulação da resolução com a indemnização dos danos provenientes da não realização do contrato, ou seja, em sede de violação do interesse contratual negativo. Só que, na 2.ª revisão ministerial, da formulação do normativo em referência ficou a constar a ressalva inserida no atual artigo 801.º, n.º 2, do CC: independentemente do direito à indemnização.

     Em face disso, desde a entrada em vigor do novo Código Civil (de 1966), a doutrina e a jurisprudência orientaram-se, predominantemente, no sentido de que, em caso de resolução do contrato, inclusive com fundamento em incumprimento definitivo, os efeitos daquela eram incompatíveis com o direito a indemnização do interesse contratual positivo, só podendo dar lugar a indemnização fundada em violação do interesse contratual negativo, a coberto do artigo 227.º do mesmo diploma. Tal orientação foi sustentada ou seguida, entre outros, por FRANCISCO PEREIRA COE-LHO[3], PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA[4], INOCÊNCIO GALVÃO TELLES[5], CARLOS MOTA PINTO[6], VASCO LOBO XAVIER[7], ALMEIDA COSTA[8], PESSOA JORGE[9], PINTO MONTEIRO[10], CALVÃO DA SILVA[11] e MENEZES LEITÃO[12].

O argumento fulcral dessa orientação radica na ideia de que a resolução tem uma função puramente repristinatória do satus quo ante, dado o seu efeito ex tunc equiparado ao da invalidade, por via de regra, retroativo, conforme o estatuído, respetivamente, nos artigos 433.º, com referência aos artigos 289.º e 290.º, e 434.º, n.º 1, do CC. E, como tal, seria contraditório que o contraente fiel optasse pela resolução e, ao mesmo tempo, preten-desse a indemnização de um prejuízo que o colocasse, afora o efeito resolutivo, numa posição equivalente àquela em que estaria se o contrato tivesse sido celebrado – dano in contractu, correspondente ao interesse contratual positivo. Daí que, em caso de resolução, só lhe restasse optar pela indemnização dos prejuízos, a título de danos emergentes ou de lucros cessantes, resultantes da violação do interesse contratual negativo (dano in contrahendo ou dano de confiança); ou seja, os prejuízos que não teria se não tivesse celebrado o contrato frustrado, nomeadamente os lucros que, por tal, deixara de obter pela não celebração de outros negócios alternativos. É pois nesse sentido que, segundo a mesma orientação, se tem interpretado a ressalva do direito a indemnização feita no n.º 2 do artigo 801.º do CC.

Segundo MENEZES LEITÃO[13], a tese que sustenta a cumulação da resolução com a indemnização do interesse contratual positivo traduz “uma certa quebra no regime da resolução por incumprimento, cuja função principal é precisamente libertar o credor do dever de efectuar a sua contraprestação ou permitir-lhe obter a sua restituição”.

E acrescenta que[14]:

«Nesse enquadramento, a resolução implicaria um desequilíbrio na estrutura sinalagmática do contrato, já que o contraente fiel obteria a exoneração da sua obrigação ou a restituição da prestação anteriormente realizada, enquanto o contraente faltoso continuaria a responder integralmente pelo interesse de cumprimento da outra parte. É claro que a tese referida permite o desconto da contra-prestação na indemnização pelo interesse contratual positivo, mas essa solução não deixa de representar um desequilíbrio na estrutura sinalagmática do contrato na medida em que atribui ao contraente fiel simultaneamente uma pretensão restituitória da sua própria prestação e uma pretensão indemnizatória pelo interesse de cumprimento, quando superior a esta, enquanto o contraente faltoso perde qualquer pretensão em relação à outra parte.

Nesse enquadramento, a resolução por incumprimento praticamente transformaria o contrato sinalagmático em unilateral, uma vez que determinaria uma sua liquidação num só sentido. Ora, parece que não é seguramente essa a solução do nosso direito, que estabelece o carácter retroactivo da resolução (arts. 433.º, 289.º e 290.º). Assim sendo, parece seguro que a indemnização terá que ser limitada ao interesse contratual negativo, na medida em que não pode abranger os danos resultantes da frustração das utilidades proporcionadas pela própria prestação. Tal não significa, porém, que não possa ocorrer uma indemnização por lucros cessantes, bastando ao credor demonstrar que a celebração daquele contrato o impediu de celebrar outro que lhe teria proporcionado benefícios que assim deixou de obter (art.º 564.º, n.º 1).»


Todavia, outros Autores – com destaque para VAZ SERRA[15], BAPTISTA MACHADO[16], ANA PRATA[17], RIBEIRO DE FARIA[18], PAULO MOTA PINTO[19], NUNO PINTO OLIVEIRA[20], ROMANO MARTINEZ[21] e MENEZES CORDEIRO[22] - defendem a solução, de jure constituto, da admissibilidade da cumulação da resolução com a indemnização do interesse contratual positivo, na medida em que esta vise a reparação de prejuízos resultantes do não cumprimento definitivo do contrato resolvido, mas não cobertos pelo aniquilamento resolutivo das prestações devidas.

Desde logo, VAZ SERRA, mesmo na vigência do CC/1966, continuou a sustentar tal admissibilidade, pautando o cálculo de indemnização pela diferença de valor entre o preço do contrato não cumprido e o valor da coisa para o credor, como seja o resultante do preço de uma revenda (dano do comprador) ou de uma venda de substituição (dano do vendedor)[23].

De forma reconhecidamente mais sistemática, BAPTISTA MACHADO[24], ancorando-se na teoria da diferença como método de calcular a indemnização devida ao credor, refuta o argumento da incompatibilidade lógica entre a resolução e a indemnização pelo não cumprimento e, com base na análise do quadro normativo constante, designadamente, dos artigos 801.º, n.º 2, 802.º, n.º 1, e 1223.º do CC, conclui que:

«[…] o nosso Código Civil afinal configura a resolução legal por incumprimento como um instituto de função ampla, como o fazem a Lei Uniforme da venda internacional de objectos móveis e as leis de vários países, e não como um meio de tutela do credor incompatível, pela sua função específica, com utilização de outros meios de tutela do mesmo credor. Quer-se com isto dizer que a configura como compatível ou combinável com um simultâneo direito de indemnização pelo não cumprimento, e não como um instituto com uma função particular e específica de alcance mais restrito: como simples meio expedito facultado a uma das partes para se desvincular de um contrato cuja execução foi perturbada (e assim reconquistar rapidamente a sua liberdade de disposição económico-negocial), sem haver que fazer a prova morosa e complexa dos danos do incumprimento, mas (em contrapartida) sob condição de renunciar à indemnização por estes danos; ou então como único meio com a função específica de permitir ao credor reaver a prestação por si feita, sob a mesma condição.»     

     E acrescenta[25] que:

   «A solução do problema em causa depende (…) da função que à resolução seja atribuída em cada ordenamento. Ora o nosso Código Civil parece ter-lhe atribuído uma função ampla de meio de tutela combinável com outros para compor um regime global aplicável a certos casos de perturbação da relação contratual – e não uma função restrita de meio de tutela exclusivamente destinado a uma tipicizada e expedita satisfação mínima do interesse do credor que se vê embaraçado por um laço contratual que não funciona bem.»

    Na mesma trajetória, ANA PRATA[26], rebatendo a opinião de Antunes Varela, observa que, atento o contexto da consagração legislativa do artigo 801.º, n.º 2, do CC, a ressalva ali feita à admissibilidade de indemnização, tal como a constante do artigo 802.º, n.º 1, só poderá referir-se à manutenção do direito à indemnização pelo dano contratual positivo do incumprimento de modo a relativizar a eficácia retroativa da resolução, já que tal ressalva não se impunha ou até seria inútil em relação à indemnização pelo interesse contratual negativo, tida como pacificamente aceite, como sucede no âmbito da invalidade.

     Mas a construção mais estruturada e robusta da tese da admissibilidade da cumulação da indemnização pelo interesse contratual positivo com a resolução consta da obra de PAULO MOTA PINTO, intitulada Interesse Contratual Negativo e Interesse Contratual Positivo, Volume II, Coimbra Editora, 2008, páginas 1604 e seguintes, em que o Autor analisa, de forma vasta e profunda, toda essa problemática, percorrendo a doutrina e jurisprudência nacionais desde o Código de Seabra, dando noticia da sua evolução no panorama comparatístico, quer do direito continental com maiores afinidades com o nosso ordenamento jurídico[27], quer do direito do common law[28] e até de outros ordenamentos periféricos[29], bem como em sede de instrumentos internacionais, tais como: a Convenção de Viena sobre os Contratos de Venda Internacional de Mercadorias, os Princípios Unidroit sobre Contratos Comerciais Internacionais e os Princípios de Direito Europeu dos Contratos. [30] 

    Dessa investigação, aquele Autor conclui que hoje, a par do direito helvético – também ele objeto de críticas -, “a orientação dominante na doutrina e jurisprudência portuguesas constitui uma excepção, ao arrepio dos desenvolvimentos internacionais e superada há mais ou menos tempo na maioria dos direitos que nos são mais próximos.”[31] 

     Seguidamente, o mesmo Autor fundamenta, no plano jurídico- positivo, a posição por si adotada no sentido da admissibilidade da cumulação da resolução com a indemnização pelo interesse contratual positivo e do seu alcance, de iure constituto, na linha de Baptista Machado, embora de forma mais substancial, escalpelizando os argumentos interpretativos de ordem histórica, sistemática e teleológica.

    Nessa base, começa aquele Autor por considerar[32] que a orientação que tem sido predominante - dita clássica – “não é (…) justificada, ou pelo menos não é imposta, no plano jurídico-positivo, pelo Código Civil, desde logo, pelo próprio artigo 801.º, n.º 2 (independentemente do direito à resolução) e observa que:

«O cerne da argumentação dessa posição tem, efectivamente, estado nos efeitos ex tunc da resolução, que não só tornariam objectivamente contraditória a emergência de uma pretensão indemnizatória pelo interesse no cumprimento com base num contrato que foi destruído, como fundamentam a objecção dirigida subjectivamente ao credor de que ele optou por destruir o contrato, não podendo coerentemente querer fazê-lo valer por via indemnizatória.»           

Considerando tal argumentação de “pura lógica formal”, enraizada na ideia de função da resolução meramente repristinatória, “destinada a colocar o credor lesado no status quo ante[33], PAULO MOTA PINTO contrapõe-lhe, de certo modo na linha de BAPTISTA MACHADO, uma finalidade mais ampla da “relação de liquidação” em que desemboca a extinção resolutiva da originária relação contratual.

No âmbito dessa “relação de liquidação”, dominada pelo primado do princípio geral da obrigação de indemnizar o lesado, consagrado no artigo 562.º do CC, segundo o método da teoria da diferença acolhido pelo artigo 566.º, n.º 2, do mesmo Código, haverá, pois, que relativizar a eficácia retroativa da resolução, atendendo à relevância do próprio incumprimento que a esta serve de fundamento e que, por isso, não pode ser ignorado, tendo ainda em conta que tal retroatividade não deve contrariar a finalidade da resolução, como se ressalva no artigo 434.º, n.º 1, do CC.[34]

Para tanto, considera[35] que:

«(…) o plano ou programa de efeitos do contrato se projecta em diversas dimensões, juridicamente relevantes, designadamente, como causa de uma certa composição ou conformação qualitativa do património como efeito do cumprimento (entrega das próprias prestação e contraprestação) e como mecanismo que fundamenta certas modificações quantitativas, de valor (no plano, portanto, não da “repartição real”, ou em espécie, mas da repartição do valor, também como consequência do adimplemento. Consequentemente, estas duas dimensões, ou planos, são afectadas pelo inadimplemento, portanto com efeitos qualitativos e quantitativos, contra os quais a resolução e indemnização constituem (…) distintos “remédios: o primeiro, com origem no sinalagma das prestações, permitindo a restituição do prestado; o segundo, com fins ressarcitórios, conduzindo ao ressarcimento dos prejuízos (sendo que existe, evidentemente, interferência do primeiro no segundo por com o cumprimento das obrigações de restituição fica reduzido o dano).»

      E prossegue[36], argumentando o seguinte:

 «(…) entendendo-se que a resolução visa justamente possibilitar ao credor libertar-se do vínculo contratual, ficando livre para celebrar outros negócios e não exposto ao risco da espera do cumprimento (manutenção do contrato), a racionalidade do segundo modelo indicado resulta da exigência de subtrair o contraente fiel à justa alternativa de dever renunciar ao incremento patrimonial adquirido com o contrato (que a contraparte não cumpriu) para não ser exposto a esse risco da manutenção do contrato ou ter de aceitar esse risco para não renunciar ao lucro do contrato. Isto, evidentemente, sem prejuízo de o credor ter de descontar na indemnização que possa obter as vantagens que são possibilitadas com a liberação do contrato e que não teria conseguido com o seu cumprimento.

   A resolução possibilita, pois, ao credor afastar as consequências, no plano qualitativo, do inadimplemento, obtendo a restituição da sua contraprestação, sem, porém, pôr o credor perante a alternativa de ter de renunciar ao lucro cessante do contrato – sendo certo, aliás, que as referidas dimensões (o lucro económico do contrato e o interesse na prestação que lhe era devida em espécie) não estavam colocadas em alternativa no “programa” do contrato não cumprido, antes este proporcionava às partes a satisfação simultânea de ambas (e que é apenas por causa do não cumprimento que tal satisfação é impossibilitada). Para tal, tem de possibilitar a restituição e permitir que o credor obtenha uma indemnização pelo interesse contratual positivo, se tiver sido prejudicado.

   Que essa solução, além de não implicar qualquer contradição com a eficácia retroactiva, é igualmente preferível, é, depois, o que resulta da atenção às indesejáveis consequências práticas que a posição dominante tem. Esta posição coloca injustificadamente o credor, que com fundamento no contrato pensava assegurado o lucro que resultaria do cumprimento e que é frustrado pelo inadimplemento, perante uma alternativa limitativa (criando, mesmo, a já referida “armadilha da resolução): porque não pode obter a restituição e a indemnização pelo lucro cessante que teria obtido com o contrato, tem de optar entre obter o que prestou e a indemnização pelo não cumprimento.»      

     Por fim, neste particular, PAULO MOTA PINTO remata dizendo que[37]:

  «A consideração dos diversos planos afectados pelo programa contratual e pelo seu inadimplemento, em que se movem a resolução e a indemnização por não cumprimento, permitem-nos, por fim, igualmente detectar a improcedência do argumento segundo o qual a protecção dada ao credor que pode cumular a restituição com a obrigação de indemnização é desequilibrada, em face da finalidade e da origem sinalagmática da resolução e do regime das restituições consequentes à resolução e à invalidade nos contratos sinalagmáticos. O argumento afigura-se improcedente, pois, além do mais, as diversas pretensões em causa ligam-se às diversas dimensões dos efeitos do inadimplemento, e ao facto de apenas ter sido realizada a contraprestação pelo credor: a obrigação de indemnizar pelo interesse no cumprimento corresponde à perda dos efeitos, em termos do valor económico, por força do não cumprimento; a possibilidade de restituição corresponde à impossibilidade de realização da conformação qualitativa, pela entrega das próprias prestações devidas nos termos do contrato, também em consequência do inadimplemento. Longe de desequilibrar o sinalagma, a cumulação entre as pretensões restituitória e indemnizatória, pelo interesse no cumprimento, dá, pois, conta dos diversos aspectos afectados pelo não cumprimento, facultando ao credor uma tutela integral, e, designadamente, não o colocando na alternativa de ter de renunciar à sua contraprestação já realizada ou ao lucro cessante do negócio, quando apenas pretendeu trocar a primeira pela própria prestação que o devedor não cumpriu e este lucro cessante lhe era devido pelo contrato cujo não cumprimento é imputável ao devedor.

   Afastamo-nos, deste modo, da posição menos “amiga” do credor que tem sido dominada (já quase só) entre nós, que não assume até ao fim as limitações da tutela resolutiva e ressarcitória isoladamente consideradas, e, mesmo, a ideia de que a responsabilidade contratual tem como consequência a indemnização do interesse no cumprimento, introduzindo uma excessiva diferença entre a manutenção do contrato e a resolução, E podemos, assim, concluir, partindo do direito comparado, sem quaisquer óbices (e, antes, com alguns apoios) no plano do nosso direito positivo, e, decisivamente, considerando o sentido e alcance da retroactividade da resolução e a função e finalidade, como reacção sinalagmática a uma situação de não cumprimento, que nada obsta ente nós (e já de jure constituto) a que o credor que resolve o contrato reclame igualmente uma indemnização pelo interesse positivo, no cumprimento, numa posição que constitui também um incentivo à protecção do credor e à circulação, permitindo àquele libertar-se do contrato sem ter para tal que renunciar aos lucros frustrados pelo não cumprimento.»      


    Também ROMANO MARTINEZ apresenta seis pontos críticos à doutrina clássica[38], num dos quais observa que:

«A ideia de que, em caso de resolução do contrato, o credor seria indemnizado pelo interesse contratual negativo teve, em parte, por fonte o disposto no anterior § 325 (1) do BGB. No mencionado preceito – alterado na reforma de 2002 - prescrevia-se que em caso de impossibilidade (total) “a outra parte pode exigir indemnização por incumprimento ou resolver o contrato, repetindo-se a alternativa na hipótese de impossibilidade parcial na segunda parte do mesmo preceito. Como a indemnização era admitida em alternativa à resolução do contrato, entendia-se que a Schadensersatz seria pelo interesse contratual positivo, sendo lícito ao credor resolver o contrato e pedir uma indemnização (menor) pelo interesse contratual negativo. Esta ideia era explicada, nomeadamente com recurso à “teoria da subrogação”, nos termos da qual, sendo a prestação impossível, o credor poderia exigir a indemnização pelo interesse contratual negativo, na medida em que esta estava fora do âmbito sinalagmático a que se reportava o preceito do Código Civil Alemão. Uma explicação diversa encontrava-se na designada “teoria da diferença”, que, atendendo à natureza das coisas, admitia a extinção do vínculo como consequência necessária e automática da impossibilidade da prestação, justificando que a indemnização pelo interesse positivo seria a única hipótese prevista no § 325 do BGB …»

    Sucede que, como refere o mesmo Autor, a reforma do BGB operada em 1 de janeiro de 2002 veio alterar o § 325 do BGB, o qual passou a dispor simplesmente que: «Nos contratos sinalagmáticos, o direito à indemnização não está excluído em caso de resolução»

      Assim, contrariando a doutrina clássica, ROMANO MARTINEZ conclui[39], no que aqui releva, que:

«No âmbito de contratos sinalagmáticos, impossibilitando-se a prestação de uma das partes, a contraparte pode optar entre a subsistência do vínculo e a sua resolução. Qualquer das opções é uma manifestação do sinalagma. Se o contrato persiste, a parte fiel, apesar de não receber a prestação por impossibilidade, poderá optar por realizar a contraprestação, sendo indemnizada pelo dano resultante do incumprimento definitivo. Na outra opção, a parte lesada resolve o contrato, não tendo de cumprir a prestação ou, já o tendo feito, exigindo a sua devolução e será igualmente indemnizada pelo prejuízo decorrente do incumprimento definitivo, devendo, porém, descontar-se as vantagens que teve com a não realização da contraprestação.»

 

Por sua vez, MENEZES CORDEIRO[40] critica a doutrina tradicional, observando que:

«A limitação das indemnizações ao interesse contratual negativo é uma (infeliz) singularidade nacional. Fruto de uma doutrina alemã há muito abandonada na terra de origem, ela conserva-se pelo hábito de manter referências clássicas fora do contexto. A jurisprudência, ainda que com dificuldades dispensavelmente causadas pela literatura, tem vindo a abrir à indemnização alargada: admitindo, assim, o “interesse positivo”.      


E considera[41] que:

   «Perante o moderno Direito das obrigações, não é possível vir afirmar que a resolução destrói retroativamente o contrato, suprimindo todas as obrigações dele derivadas. O vínculo obrigacional é uma realidade complexa. A resolução apenas visa suprimir o dever de prestar principal do contraente fiel, perante o incumprimento definitivo do dever de prestar principal a cargo do contraente faltoso (…).

 Quer dizer que a resolução apenas põe termo aos deveres de prestação principais. Todos os demais deveres envolvidos, secundários e acessórios se mantêm.

  A ideia de que, havendo resolução, não faria sentido optar pelo interesse positivo do cumprimento … por se ter desistido do contrato é puramente formal e conceitual.

  Com efeito, o incumprimento acarreta danos. Perante eles, há que prever uma indemnização integral. A pessoa que resolva o contrato apenas tenciona libertar-se da prestação principal que lhe incumbe: não pretende, minimamente, desistir da indemnização a que tenha direito.

  A regra é, pois, sempre a mesma, simples e justa: o incumprimento, que se presume culposo, obriga a indemnizar por todos os danos causados. Ficarão envolvidos danos negativos ou de confiança e danos positivos ou do cumprimento, cabendo, caso a caso, verificar até onde vão uns e outros, sem duplicações e descontando a contraprestação de que a parte fiel fique liberta.»

    

    Outros Autores, que dantes se inclinavam para a tese tradicional ou, pelo menos, hesitavam entre ela e a tese da admissibilidade da cumulação da resolução com a indemnização pelo interesse contratual positivo, têm vindo a aderir a esta última

Assim, RIBEIRO DE FARIA, na sua obra Direito das Obrigações, Vol. II, Almedina, 1990, páginas 424-434, analisando os argumentos das duas teses em confronto, não arriscava uma resposta prerentória, considerando que a tese tradicional estava “muito longe de ter perdido definitivamente na confrontação”.

Porém, já em artigo intitulado A Natureza do Direito de Indemnização Cumulável com o Direito de Resolução dos Arts. 801.º e 802.º do Código Civil – texto de 4/3/1993 -, publicado na Revista Direito e Justiça da Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa, Volume [42] VIII, Tomo 1, 1994, páginas 57 a 89, revia aquela posição dúbia, escrevendo o seguinte[43]:

«Aparecem-nos hoje bem mais razões a favor da indemnização pelo interesse positivo aquando da resolução do contrato por facto imputável ao devedor que na data em que escrevemos as nossas Lições. O princípio da sinalagmaticidade é fundamental neste domínio e é, como bem se sabe, por outro lado, também entre nós, uma pedra-chave do direito positivo dos contratos bilaterais. Ora bem: não se podendo ignorar isso nem fazer tábua rasa das relações contratualmente no interim havidas entre as partes, a liquidação terá de ser um esquema adaptável às situações típicas que nela ocorrem e em que o sinalagma continua a desempenhar um papel fundamental. Por outras palavras (…), a indemnização teria que ser pelo interesse positivo.»   


Também BRANDÃO PROENÇA, na sua obra intitulada Resolução do Contrato no Direito Civil – Do Enquadramento e do Regime, Coimbra, 1982, páginas 199 a 214, analisando a problemática em foco, considerava, embora sem pretensão definitiva, que, ao lado do escopo recuperatório da opção resolutiva, a indemnização do “interesse negativo” ou pelas expetativas goradas lhe parecia «como a mais adequada a complementar essa necessidade reintegradora (…), mesmo quando a “relação de liquidação” resulte de uma resolução estritamente desvinculativa», ressalvando, no entanto, que «certo casuísmo poderá infirmar estas conclusões” e que “a jurisprudência poderá flexibilizar o critério defendido, quando assim for exigido pelos interesses em presença» (pp. 210-211 e 214).

Contudo, o mesmo Autor, em obra posterior intitulada Lições de Cumprimento e Não Cumprimento das Obrigações, Coimbra Editora, 1.ª Edição de 2011, páginas 280-306[44], retomando essa temática, considera que[45] a doutrina mais clássica:

   «(…) ao defender a indemnização pelo “interesse contratual negativo, esquece a diversidade ontológica da resolução (em relação à invalidade), o seu sentido libertador, a relatividade do efeito retroactivo e, sobretudo, que a opção resolutiva não pode ser “sancionada”, em desfavor do lesado, como uma indemnização “menor” (qualitativamente falando) que não é suficientemente preventiva (do incumprimento) e que pode não cobrir os prejuízos que o incumprimento trouxe ao legitimado.» 

Nessa linha, reconhece (pp. 304-305) que:

«Esta solução mais moderna [a tese da admissibilidade da cumulação da resolução com a indemnização do interesse contratual positivo] deve integrar, pois, o leque de opções do lesado (ao lado da solução meramente indemnizatória, do recurso ao commodum de representação, da execução específica e da conjugação da resolução com os danos negativos existentes) e é aliás, aquela que se colhe da interpretação das normas de outros sistemas, daquelas que nos modelos de harmonização legislativa tratam da matéria (…) e aflora já nalgumas soluções normativas e decisões dos nossos tribunais.»

E acrescenta ainda que:      

   «O que importa salientar é que deve ser afastada a rigidez do modelo exclusivo “indemnização por danos negativos”/indemnização repositiva, tanto mais que a solução “positiva”/indemnização pelo incumprimento concebe a resolução em função dos interesses do lesado, ao serviço de uma verdadeira reintegração, perante o programa negocial frustrado pelo incumprimento ilícito e culposo e não como meio limitado, de fim marcadamente “eliminador”. A defesa de soluções alternativas, consoante os concretos prejuízos sofridos pelo adimplente, a maior ou menor facilidade de provar os danos, a diversa natureza do interesse lesado, o diferente quantitativo das despesas feitas e a situação económica do faltoso (solvente ou não) não deveria recusar ao credor uma indemnização diferencial na troca de prestações em espécie (…)»  

           

Mesmo INOCÊNCIO GALVÃO TELLES, na 7.ª Edição da sua obra Direito das Obrigações, Coimbra Editora, de 1997, em nota de rodapé, na página 463, considera conceber-se “que o julgador, além dos danos negativos, atenda também aos positivos se, no caso concreto, essa solução se afigurar mais equitativa segundo as circunstâncias.”

                

Em suma, deste universo doutrinário podemos inferir que, a nível nacional, a tese da admissibilidade da cumulação tem vindo a ganhar terreno em detrimento da tese tradicional.

Por seu lado, a nossa jurisprudência, em especial a do Supremo Tribunal de Justiça, a partir da vigência do Código Civil de 1966, alinhou de forma predominante, ou quiçá uniforme, com a sobredita orientação doutrinária clássica ou tradicional[46].

Porém, o acórdão do STJ, de 12/02/2009, proferido no processo n.º 08B4052[47], relatado pelo Juiz Conselheiro JOÃO BERNARDO, veio introduzir, de algum modo, uma brecha no entendimento jurisprudencial que vinha sendo seguido, ao considerar, em síntese, que, muito embora a resolução, por regra, abra caminho a indemnização apenas pelos danos negativos, poderia, excecionalmente, haver lugar a indemnização pelos danos positivos, numa ponderação casuística dos interesses em jogo, à luz do princípio da boa fé, competindo à parte resolvente alegar e provar, além do mais, os factos que possam integrar essa situação de excecionalidade.

Todavia no caso ali versado, considerou-se que “não correspondia a tal exigência a resolução levada a cabo relativamente a um contrato de financiamento de compra a prestações em que o financiador, a par da declaração resolutiva, declara as 56 prestações a cargo do financiado, que estavam em dívida, imediatamente vencidas e, com o respectivo valor, preenche uma livrança em branco que tinha em seu poder, dando-a à execução”.

Seguiram, na mesma linha, outros acórdãos do STJ, designadamente os acórdãos: de 15/12/2011, proferido no processo n.º 1807/08.6TVLSB. L1.S1[48]; de 12/03/2013, proferido no processo n.º 1097/09.3TBVCT.G1. S1[49]; de 04/06/2015, proferido no processo n.º 4308/10.9TJVNF.G1.S1[50]; de 08/09/2016, proferido no processo n.º 21769/10.9T2SNT.L1.S1[51].

Neste último aresto, foi considerado, em síntese, que:

«Embora se venha admitindo que, em determinadas circunstâncias específicas, a indemnização, no caso de resolução de contrato, possa não se circunscrever absolutamente ao perímetro dos danos ligados à violação do interesse contratual negativo, podendo abarcar justificadamente outros danos, como forma de obter uma plena tutela do interesse do credor, não é aceitável que, por sistema, a parte que resolve o contrato pretenda obter automaticamente todas as prestações a que teria direito se o contrato resolvido subsistisse intocado na sua eficácia inter partes – cabendo-lhe, neste caso, pedir em primeira linha indemnização pelo interesse contratual negativo e só excepcionalmente e em situações materialmente fundadas lhe sendo possível peticionar uma indemnização complementar.»   


Porém, já no acórdão do STJ de 21/10/2010, proferido no processo n.º 1285/07.7TJVNF.P1.S1[52], convocando-se a posição doutrinária de PAULO MOTA PINTO, foi consignado o seguinte:

«Este Supremo Tribunal é sensível aos argumentos exaustivamente analisados e objectivamente desenvolvidos de forma sustentada por Paulo Mota Pinto, no sentido de inexistirem fundamentos para, em tese, afastar a possibilidade de se cumular a resolução do contrato com o pedido indemnizatório pelo interesse contratual positivo, admitindo, consequentemente, a referida cumulação. E dizemos em tese porque caso a caso, consoante o tipo de contrato e o circunstancialismo que o rodeia, tal poderá resultar num desequilíbrio ou benefício injustificado.

        ----------------------------------------------------------------

Por tudo isto somos do entendimento que, em regra, havendo de operar aqui o crivo a que no Ac. do STJ … (de 12/02/2009 …) se aludiu do equilíbrio e/ou benefício justificado, por contraposição aquele que levaria a um desequilíbrio manifesto e ostensivo – será admissível a cumulação da resolução do contrato com o pedido de indemnização pelo mesmo interesse positivo»   

   Mais recentemente, no acórdão do STJ de 24/01/2017, proferido no processo n.º 1725/13.6TVLSB.C1.S1[53], foi observado que, “diferentemente” da linha seguida no acórdão do STJ de 12/02/2009, proferido no processo n.º 08B4052 e outros subsequentes, o acima citado acórdão do STJ de 21/10/2010, proferido no processo n.º 1285/07.7TJVNF.P1.S1, avançava «(…) no entendimento de que, por regra, será possível cumular a resolução do contrato com o pedido de indemnização pelo interesse contratual positivo. Sem prejuízo de, “caso a caso, consoante o crivo a que se alude no Acórdão de 12/02/2009, por forma a evitar situações de desequilíbrio ou de benefício injustificado».

   Nessa conformidade, no referido aresto de 24/01/2017, foi considerado que:

«No quadro desta tendência para, em caso de resolução, se admitir a indemnização pelo interesse contratual positivo propende-se para esta última solução, por se entender que a resolução deve ser concebida tendo em conta os interesses do lesado, visando uma verdadeira reintegração perante a frustração do programa negocial provocada pelo inadimplemento; não como mero meio de destruição da relação contratual.»

    Todavia, no caso ali tratado, respeitante a resolução de um contrato de utilização de loja em centro comercial, foi negada a revista por nada se ter provado para além da perda de rendimento que a autora obteria com a execução do contrato, mais precisamente não se tendo provado que, após a resolução, a autora tivesse celebrado com terceiros novo contrato de utilização da loja e que, sem justificação razoável tivesse deixado de o fazer, tendo deixado de cobrar a terceiros a retribuição e comparticipação nos encargos que cobrava à ré, nem que, por outro modo, tivesse contribuído para o agravamento ou por a não minimização dos danos.

   De referir com esse acórdão foi aprovado com um voto de vencido quanto à questão da reparação do invocado dano de cumprimento ou positivo, por se entender que “a opção pela resolução do contrato, com as consequências que lhe estão legalmente associadas, é em substância contraditória com a pretensão de indemnização pelo não cumprimento.”

    Aqui chegados, afigura-se que a tese da admissibilidade da cumulação da resolução com a indemnização pelo interesse contratual positivo assenta em argumentação sólida, que, numa análise sistémica de todo o quadro normativo relevante, melhor corresponde ao primado da responsabilidade civil contratual e da sua função na reintegração dos interesses do credor lesado pela frustração do programa negocial.

Assim sendo, propendemos a considerar, em tese, admissível aquela cumulação, na linha do que foi ponderado no acórdão do STJ de 21/10/ 2010, proferido no processo n.º 1285/07.7TJVNF.P1.S1, sem prejuízo da ponderação casuística a fazer, à luz do princípio da boa fé, no concreto contexto dos interesses em jogo, mormente em função do tipo de contrato em causa, de modo a evitar situações de grave desequilíbrio na relação de liquidação ou de benefício injustificado por parte do credor lesado.

E afigura-se-nos que, no atual panorama da jurisprudência, será mais curial prosseguir por via da ponderação de caso a caso, sem a condicionar, de forma apriorística, ao critério abstrato de regra-exceção.       

   Para tanto, consideramos, à luz da doutrina acima convocada nesse sentido, em síntese, que:

a) – Do preceituado no artigo 801.º, n.º 2, do CC, no respeitante à ressalva do direito a indemnização, em caso de resolução de contratos bilaterais, nenhum argumento interpretativo substancialmente decisivo se pode extrair no sentido de excluir o direito de indemnização pelos danos positivos resultantes do incumprimento definitivo desde que não se encontrem cobertos pelo aniquilamento resolutivo das prestações que eram devidas;

b) – Por isso mesmo, impõe-se equacionar a solução na perspetiva da finalidade e função da resolução, enquadrada no plano mais latitudinário do programa negocial, multidimensional, envolvente e da relação de liquidação em que, por virtude dessa resolução, se transfigura a relação contratual originária;

c) – Nesse quadro, deve ser reconhecido o primado do princípio geral da obrigação de indemnizar o credor lesado, consagrado no artigo 562.º do CC, segundo o método da teoria da diferença acolhido pelo artigo 566.º, n.º 2, do mesmo diploma, como escopo fundamental reintegrador dos interesses atingidos pelo incumprimento do contrato;

d) – Nessa medida, tendo em conta a “diversidade ontológica” da invalidade e da resolução, deve ser relativizada a eficácia retroativa atribuída a esta pelos artigos 433.º e 434.º, n.º 1, por equiparação aos efeitos daquela estatuídos nos artigos 289.º e 290.º do CC, em termos de salvaguardar a vertente da tutela ressarcitória (a par da tutela restituitória ou recuperatória), quanto aos danos positivos resultantes do incumprimento que serviu de fundamento à mesma resolução e não abrangidos pelo obliteração resolutiva das prestações que eram devidas, assim se ressalvando a finalidade da resolução (que se tem por restrita) a que se refere a parte final do citado artigo 434.º, n.º 1;

e) – Consequentemente, ao contraente fiel, perante o incumprimento definitivo imputável ao outro contraente, assistirá a faculdade de optar, em simultâneo, pela resolução do contrato de forma a libertar-se do respetivo dever típico de prestar ou a recuperar a prestação já por si efetuada, e pelo direito a indemnização dos danos decorrentes daquele incumprimento não satisfeitos pelo valor económico das prestações atingidas pela resolução;

d) – Todavia, em caso de resolução, poderá ser ainda assim desatendida a indemnização pelos danos positivos, quando esta revele desequilíbrio grave na relação de liquidação ou se traduza em benefício injustificado para o credor, ponderado, à luz do princípio da boa fé, o concreto contexto dos interesses em jogo, atento o tipo de contrato em causa, sem prejuízo, nessas circunstâncias, do direito a indemnização em sede do interesse contratual negativo nos termos gerais.       

            

    De resto, esse é o modelo de solução por que se pauta a larga maioria dos ordenamentos jurídicos estrangeiros próximos do nosso, bem como o acolhido nos instrumentos internacionais como são a Convenção de Viena sobre os Contratos de Venda Internacional de Mercadorias; os Princípios Unidroit sobre Contratos Comerciais Internacionais; os Princípios de Direito Europeu dos Contratos. [negritos nossos]



    Em conclusão, da fundamentação do acórdão deste Supremo Tribunal de 15/02/2018, que se acompanha, resulta essencialmente a seguinte orientação: a resolução do contrato é compatível com a indemnização pelo interesse contratual positivo, que, porém, não será admitida “quando esta revele desequilíbrio grave na relação de liquidação ou se traduza em benefício injustificado para o credor, ponderado, à luz do princípio da boa fé”, hipótese em que se indemnizará antes pelo interesse contratual negativo.

Esta conclusão permite-nos esclarecer, desde já, a questão que a 1ª R. suscitou, tanto em sede de apelação como em sede de revista, relativa à possibilidade de cumulação de indemnização por interesse contratual positivo com indemnização por interesse contratual negativo, questão que se entende ter tido uma resposta equívoca no acórdão recorrido. Razão pela qual a 1ª R. nela vem insistir.

Com efeito, verifica-se que, por um lado, a Relação acolheu a orientação que se afigura correcta da inviabilidade de cumulação de indemnização por interesse contratual positivo com indemnização por interesse contratual negativo, socorrendo-se das palavas de Paulo Mota Pinto:

ninguém pode pretender ser colocado simultaneamente na situação em que estaria, se não tivesse sido concluído um certo contrato e na situação em que estaria se esse mesmo negócio (fosse eficaz) e tivesse sido cumprido (…) Não pode, sem contradição (performativa e teleológica) reclamar-se ao mesmo tempo uma reparação correspondente ao interesse negativo e ao interesse positivo” (Interesse contratual negativo e interesse contratual positivo, Vol. II, cit., págs.1003-1004).

Acrescenta ainda o acórdão:

“menciona [o mesmo autor] que a proibição de cumulação do ressarcimento correspondente ao interesse negativo com o do interesse positivo depende, também, do princípio de que a prestação ressarcitória não deve deixar o lesado em melhor situação do que aquela em que teria estado se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação”.

Mas, por outro lado, o acórdão recorrido afirma também o seguinte:

“Como vimos, considerou o Tribunal de 1ª instância que o não cumprimento converte a relação de cumprimento em relação de liquidação e que a indemnização pela destruição da relação contratual por efeito da resolução não está limitada ao interesse contratual negativo, podendo ainda abranger, em certos casos, o interesse contratual positivo, desde que isso não acarrete qualquer situação geradora de desequilíbrios ou benefícios injustificados”.

Parecendo aderir a esta perspectiva ao incluir no sumário do acórdão o seguinte ponto:

VII – “A indemnização pela destruição da relação contratual, por efeito da resolução, não está limitada ao interesse contratual negativo, podendo ainda abranger o interesse contratual positivo; havendo que indemnizar por todos os danos causados, poderão estar envolvidos danos negativos ou de confiança e danos positivos ou do cumprimento.”


Ora, as duas perspectivas não são conciliáveis, sendo que a primeira é aquela que se afigura correcta: a indemnização por interesse contratual positivo não é cumulável com a indemnização por interesse contratual negativo.  


10.2. Apesar de se ter chegado a esta importante conclusão, a delimitação do âmbito da indemnização não se encontra ainda completa. Como reconheceu, aliás, a Relação, ao acrescentar o seguinte:

“Salienta [Paulo Mota Pinto], todavia, que «existem rubricas do dano que podem ser comuns à indemnização correspondente ao interesse contratual negativo e ao interesse contratual positivo».

Numa análise em perspectiva antecedente, ponderando sobre a opção entre as teses da relevância do interesse positivo ou do interesse negativo, diz-nos Ribeiro de Faria [27 Em «A natureza da indemnização no caso de resolução do contrato – Novamente a questão», Estudos em Comemoração dos Cinco Anos da Faculdade de Direito da Universidade do Porto», Coimbra Editora, 2001, pag. 30] que haverá efeitos que são, ou se têm querido pelo menos, comuns às duas: por exemplo a consideração dos danos especiais – nem eles se teriam produzido se a prestação fosse a prestação devida, nem se teriam de igual forma produzido na ausência da celebração do contrato». Reconduz aos ditos “danos especiais” o «que os alemães designam por danos resultantes do cumprimento defeituoso» [28 Nota 78, pag. 30]


Quer dizer que, sendo inadmissível cumular uma indemnização por interesse contratual positivo com uma indemnização por interesse contratual negativo, importa averiguar se cada categoria de danos peticionados se encontra ou não abrangida pelo interesse contratual positivo, independentemente da hipótese de que alguma (ou algumas) dessas categorias de danos pudesse(m) ser abrangida(s) por uma indemnização por interesse contratual negativo, caso fosse equacionada. Contudo – e este ponto é crucial – tal possibilidade não se confunde com a cumulação de indemnizações, que já afastámos

No caso dos autos, estando em causa danos causados pelo cumprimento defeituoso ou pela mora do devedor, pode suceder que as categorias de danos suportados pela A. tanto possam integrar, em abstracto, o interesse contratual positivo como o interesse contratual negativo. Mas a sua reparação será apreciada exclusivamente em função do critério do interesse contratual positivo.

Como resulta da orientação propugnada no acórdão deste Supremo Tribunal de 15/02/2018, supra citado – orientação que aqui acolhemos – admitir a reparabilidade do interesse contratual positivo, traduz-se, na prática, em reconhecer “o primado do princípio geral da obrigação de indemnizar o credor lesado, consagrado no artigo 562.º do CC, segundo o método da teoria da diferença acolhido pelo artigo 566.º, n.º 2, do mesmo diploma, como escopo fundamental reintegrador dos interesses atingidos pelo incumprimento do contrato”.

Por isso, afastando a confusão qualificativa em que frequentemente incorrem as partes, do que se trata é de proceder à aplicação do regime do art. 566º, nº 2, do CC: “a indemnização em dinheiro tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, e a que teria nessa data se não existissem danos”.


11. Tendo presentes os critérios gerais definidos nos pontos anteriores deste acórdão, retomemos agora a apreciação das diferentes questões e sub-questões concretas relativas à indemnização.

As instâncias condenaram a 1ª R. a pagar à A. as seguintes parcelas indemnizatórias:

- “Quantia que vier a ser liquidada em sede de incidente de liquidação, a título de indemnização correspondente aos custos por esta despendidos com o diagnóstico e a execução dos trabalhos inerentes às reparações e modificações necessárias para que a Central pudesse entrar em funcionamento, até ao limite máximo de € 4.473.973,00 (quatro milhões e quatrocentos e setenta e três euros);

- “Quantia que vier a ser liquidada em sede de incidente de liquidação, a título de indemnização correspondente aos custos de financiamento, de pessoal e administrativos em que a autora incorreu desde Outubro de 2008 e até final de 2010, derivados da inatividade da Central e que não tiveram qualquer contrapartida, até ao limite máximo de € 2.575.433,00 (dois milhões e quinhentos e setenta e cinco euros);

- “À indemnização global que vier a ser apurada em sede de incidente de liquidação acrescerão juros de mora à taxa supletiva de juros moratórios relativamente aos créditos de que sejam titulares empresas comerciais, contados a partir da data em que a 1ª ré for notificada da sentença que, no âmbito daquele incidente fixar o montante indemnizatório, até efetivo e integral pagamento”.

 

A R. Recorrente impugna esta decisão, alegando (cfr. ponto 83 do corpo das alegações) o seguinte:

“Na prática, a decisão proferida confere à Autora os muito consideráveis benefícios inteiramente injustificados que cumpre elencar:

a) A retenção pela Autora da cláusula penal por mora aplicada ao consórcio, nos termos constantes do ponto 72. dos factos provados [" 72. Do preço fixado no Contrato a autora reteve em seu beneficio o montante total de € 1.763.070,00, correspondente a 10% do valor do Contrato, tendo ficado acordado no âmbito do acordo tripartido que o valor a ser pago pela autora à 18 ré seria de 1.312.700,00 €'];

b) Uma compensação pelo atraso no cumprimento que, supondo a manutenção do vínculo contratual - INTERESSE CONTRATUAL POSITIVO, visa indemnizar danos decorrentes da mora do faltoso e que, in casu, foram identificados como correspondendo "aos custos de financiamento, de pessoal e administrativos em que a autora incorreu desde Outubro de 2008 e até final de 2010, derivados da inatividade da Central e que não tiveram qualquer contrapartida, até ao limite máximo de € 2.575.433,00";

c) Uma compensação pelo incumprimento definitivo que, decorrendo da resolução do contrato - INTERESSE CONTRATUAL NEGATIVO, visa indemnizar danos decorrentes da respetiva celebração e que, in casu, foram identificados como correspondendo "aos custos despendidos pela autora com o diagnóstico e a execução dos trabalhos inerentes às reparações e modificações necessárias para que a Central pudesse entrar em funcionamento, até ao limite máximo de € 4.473.973,00".


Não pode aceitar-se esta divisão tripartida da R. Recorrente, nem tampouco a qualificação das diversas parcelas indemnizatórias.

     Antes de mais, porque o facto provado 72 (“Do preço fixado no Contrato de Fornecimento e Instalação de Equipamento a A. não pagou o montante de 1.737.700,00 €, tendo ficado acordado no âmbito do Acordo Tripartido que desse montante o valor a ser pago pela A. à 1ª R. seria de 1.312.700,00 €”) não permite concluir, sem mais, que a parte do preço retida pela A. o tivesse sido a título de penalidades contratuais pela mora, nem tampouco tal resulta da brevíssima fundamentação da sentença ao absolver a A. do pedido reconvencional pelo qual a 1ª R. exigia o pagamento da parte do preço em falta a que, no âmbito do Consórcio, tinha direito (“Considerada lícita a resolução do Contrato operada pela autora através da carta de 6 de Junho de 2010, improcede naturalmente, a pretensão indemnizatória da 1ª ré.”), decisão da qual a 1ª R. não apelou pelo que transitou em julgado.

     Além disso, os danos agrupados pela R. Recorrente como b) e c) não correspondem à dicotomia interesse contratual positivo versus interesse contratual negativo.  

      Vejamos.

      Estão em causa os seguintes factos provados:

119. A autora, com recurso a fornecedores especializados, procedeu às reparações e às modificações necessárias para que a Central pudesse entrar em funcionamento, incorrendo em custos com o diagnóstico e execução dos trabalhos necessários;

120. Desde Outubro de 2008 e até final de 2010, a autora incorreu em custos de financiamento, de pessoal e administrativos derivados da inatividade da Central e que não tiveram qualquer contrapartida.

      Os custos despendidos pela A. com o diagnóstico e a execução dos trabalhos inerentes às reparações e modificações necessárias para que a Central pudesse entrar em funcionamento (facto provado 119) correspondem a danos próprios do cumprimento defeituoso e são indemnizáveis ao abrigo da regra do ressarcimento do interesse contratual positivo.

Os custos de financiamento, de pessoal e administrativos em que a A. incorreu desde Outubro de 2008 e até final de 2010, derivados da inactividade da Central e que não tiveram qualquer contrapartida (facto provado 120), correspondem a danos causados pela mora do devedor e são também eles indemnizáveis ao abrigo do ressarcimento por interesse contratual positivo.


Em relação a estas parcelas indemnizatórias, que o acórdão recorrido condenou a 1ª R. a pagar à A., suscita ainda a R. Recorrente a questão da sua (in)admissibilidade por consistir em condenação genérica e ilíquida de indemnização por danos não concretizados.

     Não tem razão. De acordo com os pontos 119 e 120 da matéria de facto, os danos encontram-se suficientemente delimitados, admitindo a lei a condenação em pedido genérico (art. 609º, nº 2, do CPC), a liquidar nos termos de incidente próprio (arts. 358º, nº 2, e 359º a 361º do CPC).


     Conclui-se, assim, pela confirmação da condenação da 1ª R. a pagar à A. as quantias indemnizatórias reconhecidas pela Relação.


12. Passemos a apreciar as questões suscitadas pela A., começando pela pretensão de indemnização pelos sobrecustos de carácter permanente a que alude o facto provado 121, até ao limite máximo de € 2.213.731,00, assim como os juros de mora vincendos que incidam sobre a quantia apurada, contados da data da notificação da sentença de liquidação.

      É o seguinte o teor do facto provado 121:

121. Fruto dos defeitos de conceção do projeto elaborado pelo Consórcio liderado pela 1ª ré, a operacionalização da Central implicou a reconfiguração do sistema de alimentação da caldeira, que implica ineficiências e sobrecustos de carácter permanente, designadamente de mão-de-obra, de combustível, de equipamento, de manutenção do equipamento e de consumo de energia que implicam um sobrecusto adicional durante a vida útil esperada do equipamento da Central.


      A pretensão da A. a ser indemnizada por estes custos acrescidos foi apreciada pela Relação da seguinte forma:

“Defende a A. que a R. deveria ser condenada a pagar-lhe os sobrecustos de carácter permanente referidos no ponto 2.1.1.121 dos factos provados, na quantia que se viesse a liquidar em incidente de liquidação a título de indemnização, até ao limite máximo de 2.213.721,00 €.

Consta daquele ponto 121 dos factos provados: (…)

Na sentença recorrida entendeu-se não serem indemnizáveis estes sobrecustos.

Também nos parece que assim é. Não está demonstrado que a dita reconfiguração tenha sido realizada pelo Consórcio, tendo antes – como parece decorrer da sequência dos factos elencados nos pontos 119 a 121 dos factos provados – resultado das reparações e modificações que foram consideradas necessárias pela A.. Deste modo, e desde logo, não está concretizado o nexo de causalidade  (no âmbito da causa adequada – art. 563 do CC) que permitiria concluir, nesta parte, pela obrigação de indemnizar.”


Deve ter-se presente que o juízo sobre o nexo causal (ou a sua ausência) é tanto um juízo de facto como de direito. Não cabe a este Supremo Tribunal sindicar o juízo de facto feito pela Relação, mas apenas pronunciar-se acerca do respeito pelo critério normativo da causalidade (neste sentido, ver, por exemplo, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 15/11/2007 (proc. nº 07B2998), de 1 de Julho de 2010 (proc. nº 2164/06.OTVPRT.P1), de 06/05/2010 (proc. nº 11/2002.P1.S1), e de 28/01/2016 (proc. nº 136/12.5TVLSB.L1.S1), consultáveis em www.dgsi.pt).

    Considera-se que, tendo sido alegados e provados apenas os factos que integram o ponto 121 da matéria de facto, não merece censura o juízo das instâncias que conclui pela ausência de nexo causal entre o cumprimento defeituoso/mora do Consórcio devedor e os sobrecustos suportados ou a suportar pela A. à luz da teoria da causalidade adequada, que se entende comumente consagrada no nosso direito (cfr. art. 563º do CC).

     Conclui-se, assim pela confirmação da rejeição da pretensão da A. de ser indemnizada pelos sobrecustos de carácter permanente a que alude o facto provado 121, e respectivos juros de mora.


13. Passemos a apreciar a pretensão da A. Recorrente de que a 1ª R. seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 1.763.070,00, a título de penalidades contratuais a que aludem os factos provados 40, 44 e 64.

    Relevam os seguintes factos provados:

20. A cláusula 11ª do Contrato [Contrato inicial] tem, além do mais, os seguintes dizeres:

«1. Caso o Adjudicatário se atrase com a data do início do serviço industrial, o Dono da Obra poderá aplicar uma penalidade de 0.25% do montante do contrato, por cada semana completa de atraso, nas primeiras quatro semanas de atraso contadas a partir da terceira semana de atraso, sendo as duas primeiras semanas de período de graça. Caso o atraso seja superior a seis semanas a penalidade será de 0,5% do montante do contrato por cada semana adicional de atraso»;

(…)

6. Cada uma das penalidades acima indicadas será limitada, individualmente a 10% do montante total do contrato, sendo o total das penalidades aplicáveis no âmbito do presente contrato 10% do montante total do mesmo»;

40. Por e-mail de 18 de Maio de 2009, que constitui o documento de fls. 488, cujo teor aqui se dá por reproduzido, a autora comunicou ao BANCO LL a sua intenção de aplicar penalidades à 1ª ré e à HH, nos termos que constam do documento de fls. 489-490, sob a epígrafe «Auto de Aplicação de Penalidades», concluindo pela aplicação da penalidade total de 10%»;

44. No dia 8 de Junho de 2009 a autora remeteu à 1ª Ré e à HH a carta que constitui o documento de fls. 512-513 do apenso A), cujo teor aqui se dá por reproduzido, e na qual aplica a penalidade de 10% referida no auto anexo a essa carta;

64. Nesse mesmo dia 4 de junho de 2010, a autora enviou à 1ª ré e à HH a carta que constitui o documento junto de fls. 690-692 do apenso A), cujo interior aqui se dá por integralmente referido, no qual refere, além do mais, a aplicação de penalidades correspondentes a 10%, no valor de 1.770.774,50 €, enviando-lhe um auto relativo às mesmas;

98. Nesse acordo tripartido [Acordo Tripartido que reviu o Contrato inicial] ficou estabelecido que ficaram sem efeito as penalidades previstas no Anexo 6 do Contrato, caso os termos e disposições daquele acordo viessem a ser cumpridos;


    O acórdão recorrido apreciou a questão da seguinte forma:

“As penalidades em causa derivavam da previsão respeitante a penalidades por atrasos e por desempenho e/ou rendimento deficientes constantes da cláusula 11ª do «Contrato Misto de Fornecimento e Prestação de Serviços», mencionada no ponto 20 dos factos provados.

Posteriormente, no acordo tripartido ficou estabelecido que ficavam sem efeito as penalidades previstas no Anexo 6 do Contrato, caso os termos e disposições daquele acordo viessem a ser cumpridos - ponto 98 dos factos provados.

Sucede que havendo a A. resolvido o contrato por incumprimento da contraparte, abrindo-se a fase de “liquidação”, não pode a mesma A. exigir da R. que sejam realizadas prestações que decorriam do clausulado no contrato já resolvido em função de atrasos no cumprimento.”


Vem A. Recorrente insistir na pretensão de condenação da 1ª R. a pagar-lhe a quantia de € 1.763.070,00, a título de penalidades contratuais por atrasos no cumprimento das obrigações contratuais (previstas no contrato inicial e reactivadas pelo incumprimento do Acordo Tripartido – cfr. facto provado 98), invocando o regime legal da cláusula penal (art. 810º, nº 1 do Código Civil), designadamente a possibilidade que resulta, a contrario, do art. 811º, nº 1, 1ª parte, in fine, do mesmo Código, de cumular a cláusula penal moratória com a exigência de cumprimento da obrigação principal; e alegando ser essa a solução imposta pelo objectivo de indemnizar a A. pelo interesse contratual positivo.

Vejamos.

Não tem aqui aplicação o regime do art. 811º, nº 1, 1ª parte, do CC, uma vez que a A. não pretende cumular a cláusula penal moratória com a exigência do cumprimento do contrato, mas antes com a indemnização por danos resultantes de cumprimento defeituoso e de mora (cfr. supra ponto 11 do presente acórdão).

Mas a questão sub judice também não se resolve declarando, sem mais, como fez o acórdão recorrido, ser a relação de liquidação incompatível com a aplicação de penalidades contratuais por atrasos.

Importa sim considerar que, em conformidade com os princípios gerais da obrigação de indemnizar (princípio da reparação integral dos danos e principio da proibição de enriquecimento do lesado), colocar o credor/lesado na situação em que estaria se o contrato tivesse sido pontualmente cumprido, isto é, indemnizá-lo pelo interesse contratual positivo, não permite duplicar a indemnização por uma mesma categoria de danos.

Ora, no caso dos autos, encontrando-se a 1ª R. condenada a pagar “os custos de financiamento, de pessoal e administrativos em que a autora incorreu desde Outubro de 2008 e até final de 2010, derivados da inatividade da Central e que não tiveram qualquer contrapartida” (facto provado 120), até ao limite máximo de € 2.575.433,00, verifica-se uma duplicação entre essa indemnização e as penalidades contratuais por atraso que invoca. Com efeito, do documento de fls. 489-490 [do Apenso A)], assim como dos anexos aos documentos de fls. 512-513 e 690-692 [do Apenso A], indicados nos factos provados 40, 44 e 64, resulta que as penalidades contratuais por atraso retroagem a 18 de Outubro de 2008.

Ora, não tendo a A. alegado e provado que a pena convencional moratória e a indemnização dos “custos de financiamento, de pessoal e administrativos em que a autora incorreu desde Outubro de 2008 e até final de 2010” se destinem a reparar danos distintos, nem tendo também alegado e provado terem as partes adoptado aquela pena convencional com a função de substituir a indemnização ou de acrescer a esta, não pode admitir-se a duplicação da reparação dos danos causados pela mora do devedor, concluindo-se pela rejeição da pretensão da A. de condenação da 1ª R. a pagar-lhe a quantia de € 1.763.070,00, a título de penalidades contratuais a que aludem os factos provados 40, 44 e 64.


14. Por último, considere-se a questão, suscitada pela A. Recorrente, de que a 1ª R. seja condenada a paga-lhe a quantia de € 58.685,00, a que alude o facto provado 67.

      Apenas foi provado o seguinte:

67. A Autora tem a receber da 1ª ré e da HH a quantia de € 58.685,00 a título de custos que lhes foram debitados e que estas reconheceram dever.


      Sobre a questão a Relação limitou-se a afirmar:

Tais factos são escassos para permitir qualquer condenação naquele valor.”


     Vem a A. defender que “A admissão, por acordo, da referida factualidade, equivale ao reconhecimento de dívida, nos termos e para os efeitos previstos no art.° 458.°, n.° 1, do Código Civil, sendo certo que, no caso concreto dos autos, consta também do ponto 67 dos factos provados identificados no Acórdão recorrido a causa da mencionada dívida: corresponde a custos que foram debitados pela Autora à 1ª Ré e à HH e que estas reconheceram dever”.

     Vejamos.

     Entende-se que, ainda o regime do art. 458º do Código Civil, dispensando o credor do ónus de provar a causa da dívida, não o dispensa do ónus de alegar tal causa, a qual integra os factos constitutivos do direito que invoca. Não o tendo feito, não pode dar-se como provado o crédito invocado.

      No caso dos autos em que está em causa a mora e o cumprimento defeituoso de múltiplas obrigações enquadradas numa relação obrigacional complexa, impunha-se, aliás, à A. um esforço de alegação acrescido relativamente à causa da dívida reconhecida pelo Consórcio, de modo a evitar o risco de a 1ª R. vir a ser duplamente condenada pelos mesmos custos suportados pela A.

     Conclui-se, também aqui, pela improcedência desta pretensão da A.


15. Pelo exposto, julgam-se os recursos da 1ª R. e da A. improcedentes, confirmando-se a decisão do acórdão recorrido.


Custas dos recursos pelas respectivas Recorrentes.


Lisboa, 17 de Maio de 2018


Maria da Graça Trigo (Relatora)

Maria Rosa Tching

Rosa Maria Ribeiro Coelho

___________

[1] Nesse sentido, veja-se, entre outros, GUILHERME MOREIRA, em Instituições do direito civil por-tuguês, Das Obrigações, II, Coimbra Editora, 1925, pp. 566 e segs. e CUNHA GONÇALVES, in Tratado do Direito Civil, Vol. IV, Coimbra Editora, 1932, pag. 497. Em sentido contrário, admitindo apenas a cumulação da resolução com a indemnização pelos “prejuízos causados (…) a propósito do contrato”, ou seja, pelo interesse contratual negativo ou dano confiança, vide DIAS FERREIRA, Código Civil Português anotado, Vol. II, 2.ª edição, Imprensa Nacional, 1895, p. 24.  

[2] In Impossibilidade superveniente e cumprimento imputáveis ao devedor, BMJ n.º 47 (1955), pp. 28 e segs. (40).

[3] In Obrigações – Sumários das Lições ao Curso de 1966-1967, edição policopiada, Coimbra, 1967, p. 230.

[4] Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, Vol. II, 4.ª Edição, Coimbra Editora, 1997, p. 58, nota 3. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. II, Almedina, 7.ª Edição, 1997, pp. 109-112.

[5] In Manual de Direito das Obrigações, tomo 1, 2.ª edição, Coimbra Editora, 1965, pp. 248 e segs.; Direito das Obrigações, ª Edição Coimbra Editora, 1982, pp. 368-369. Porém, na 7.ª Edição desta última obra, de 1997, o Autor, em nota de rodapé (1) a pag. 463, admite que “o julgador, além dos danos negativos, atenda também aos positivos se, no caso concreto, essa solução se afigurar mais equilibrada segundo as circunstâncias.      

[6] In Cessão da Posição Contratual, Almedina, 1982, p. 412, nota 1.

[7] No artigo doutrinário intitulado Venda a prestações. Algumas notas sobre os artigos 934.º e 935.º do Código Civil, in RDES Ano 21.º, 1977, pp. 199-266 (262 

[8] In Direito das Obrigações, Almedina, 12.ª Edição, 2009, pp. 1044-1047.

[9] In Direito das Obrigações, Vol. I, Universidade de Lisboa, 1971/1972, p. 656; e Ensaio sobre os Pres-supostos da Responsabilidade Civil, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, Lisboa, 1972, p. 380

[10] In Cláusula Penal e Indemnização, Almedina, 1990, pp. 694, embora ressalvando, na nota 1568, que tal entendimento não é inteiramente pacífico.

[11] In Responsabilidade Civil do Produtor, Almedina, 1990, p. 248, perfilhando a tese de Pereira Coelho.

[12] In Direito das Obrigações, Vol. II, Almedina, 10.ª Edição, 2017, pp. 259-264.  

[13] Ob. cit. p 263.

[14] Ob. cit. pp. 263-264.

[15] Anotação ao acórdão do STJ, de 30/06/1970, RLJ, Ano 104, pp. 204-208 (207).

[16] Pressupostos da Resolução por Incumprimento – referência ao “direito à indemnização” cumulável com a resolução, in Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor J. J. Teixeira Ribeiro, II Iuridica, Coimbra, 1979, pp. 393-401.   

[17] In Cláusulas de Exclusão e Limitação da Responsabilidade Contratual, Almedina, 1985, pp. 479-495.

[18] Este Autor manifestou, inicialmente, uma posição hesitante entre as duas teses em confronto, in Direito das Obrigações, Vol. II, Almedina, 1990, pp. 424-435. Mas, em escritos posteriores, acabou por aderir à tese da compatibilidade da resolução com a indemnização pelo interesse contratual positivo – estudos intitulados A natureza do direito de indemnização cumulável com o direito de resolução dos arts. 801.º e 802.º do Código Civil, in Direito e Justiça, Vol. VIII, 1994, Tomo 1, pp. 57-89, e A natureza da indemnização no caso de resolução do contrato – Novamente a Questão, in Estudos em comemoração dos cinco anos (1995-2000) da Faculdade de Direito da Universidade do Porto, Coimbra, 2001, pp. 11-62.        

[19] In Interesse Contratual Negativo e Interesse Contratual Positivo, Volumes I e II, Coimbra Editora, 2008

[20] In Princípios de Direito dos Contratos, Coimbra Editora, 1.ª Edição, 2011, pp. 882 e segs. (890).

[21] In Da Cessação do Contrato, Almedina, 3.ª Edição, 2017, pp. 195-204.

[22] In Tratado de Direito Civil Português, Direito das Obrigações, IX, Almedina, 3.ª Edição, 2017, pp. 937-949.

[23] Vide, anotação ao acórdão do STJ de 05/12/1967, in RLJ Ano 101, pp. 264 e seguintes.

[24] Pressupostos da Resolução por Incumprimento …, in Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor J. J. Teixeira Ribeiro, II Iuridica, Coimbra, 1979, p. 399.    

[25] Ob. cit. p. 400.

[26] In Cláusulas de Exclusão e Limitação da Responsabilidade Contratual, Almedina, 1985, pp. 479-481.

[27] No direito francês (ob. citada p. 1622-1623); no direito alemão, em especial após a adoção do novo § 325 do BGB, resultante da reforma de 2002 (ob. citada p. 1623-1628); no direito italiano (ob. citada p. 1628-1631); no direito austríaco (ob. citada p. 1632); no direito helvético (ob. citada p. 1632-1634); no direito holandês (nota 4702, p. 1636); no direito espanhol (nota 4702, pp. 1636-1637).       

[28] Ob. cit. pp. 1635-1636.

[29] No direito brasileiro (ob. cit. nota 4702, p. 1637); nos direitos japonês, chileno e cubano (ob. cit. nota 4702, p. 1637); no direito grego (ob. cit., nota 4709, p. 1639).

[30] Ob. cit. pp. 1636 a 1638.

[31] Ob. cit, p. 1639.

[32] Ob. cit. p. 1644.

[33] Ob. cit. pp. 1645 e 1647.

[34] Ob. cit. pp. 1645-1546.

[35] Ob. cit. p. 1648.

[36] Ob. cit. p. 1649.

[37] Ob. cit. p. 1654.

[38] In Da Cessação do Contrato, Almedina, 3.ª Edição, 2017, pp. 195-204.

[39] Ob. cit. pp. 203-204.

[40] In Tratado de Direito Civil Português, Direito das Obrigações, IX, Almedina, 3.ª Edição, 2017, pp. 936-949 (947-948).

[41] Ob. cit. p. 949.

[42] Ob. cit. pp. 1636 a 1638.

[43] Revista cit. p. 88.

[44] Posição mantida na 2.ª Edição, Universidade Católica Editora, Porto, de 2017, pp. 358-384.

[45] Ob. cit. p 302.

[46] Vide a recensão feita por PAULO MOTA PINTO, ob. cit., Vol. II, notas 4833 e 4634, pp. 1616-1619.

[47] Acessível na Internet: http://www.dgsi.pt/jstj.

[48] Relatado pelo Juiz Cons. Álvaro Rodrigues, acessível na Internet: http://www.dgsi.pt/jstj.

[49] Relatado pelo Juiz Cons. Alves Velho, acessível na Internet: http://www.dgsi.pt/jstj.

[50] Relatado pelo Juiz Cons. António Silva Gonçalves., acessível na Internet: http://www.dgsi.pt/jstj.

[51] Relatado pelo Juiz Cons. Lopes do Rego, acessível na Internet: http://www.dgsi.pt/jstj.

[52] Relatado pelo Juiz Cons. Barreto Nunes, acessível na Internet: http://www.dgsi.pt/jstj.

[53] Relatado pelo Juiz Cons. Pinto de Almeida, acessível na Internet: http://www.dgsi.pt/jstj.