Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
4778/15.9T8VNF-C.G1.S1
Nº Convencional: 6ª. SECÇÃO
Relator: FONSECA RAMOS
Descritores: RECURSO – ART. 14º
Nº1
DO CIRE
OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS
DECISÃO SINGULAR
INADMISSIBILIDADE DO RECURSO
Data do Acordão: 09/01/2016
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO DO RELATOR
Área Temática:
DIREITO FALIMENTAR - RECURSOS.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PROCESSO DE DECLARAÇÃO / RECURSOS / ADMISSIBILIDADE DO RECURSO.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGO 9.º.
CÓDIGO DA INSOLVÊNCIA E DA RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS (CIRE): - ARTIGO 14.º, N.º1.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGO 656.º.
Sumário :
1. Uma decisão liminar, singular do relator, no Tribunal da Relação, proferida ao abrigo do art. 656º do Código de Processo Civil, não pode ser equiparada a um Acórdão para fundamentar a oposição de acórdãos que constitui requisito do recurso de revista ao abrigo do art. 14º, nº1, do CIRE.

2. Sem nos apegarmos, com excessivo formalismo, à letra da lei – que não é o único critério interpretativo, nos termos do art. 9º do Código Civil – é manifesto que a ratio legis do art. 14º, nº1, do CIRE se destina a confrontar duas decisões de igual força – decisões colegiais – circunstância que não existe quando se invoca como Acórdão-fundamento, em alegada oposição com o Acórdão recorrido, uma decisão singular do Relator, como sucedeu in casu.

Decisão Texto Integral:

Proc.4778/15.9T8VNF-C.G1.S1

R-538-A[1]

Conferência

Acordam, em Conferência, no Supremo Tribunal de Justiça

AA, S.A, na sequência de decisão proferida em 1ª Instância, que declarou a sua Insolvência, apelou de tal decisão para o Tribunal da Relação de Guimarães, que, por Acórdão de 12.11.2015 – fls. 362 a 373 –, negou provimento ao recurso, confirmando, integralmente, a sentença recorrida.

O PER não conduziu à aprovação de um Plano de Recuperação da devedora/recorrente, e como tal, foi entendido no Acórdão recorrido, como resulta do sumário (fls. 372), que:

“Quando o processo de revitalização não conduza à aprovação de um plano de recuperação, seja porque os credores não o aprovaram, seja porque o devedor desistiu do processo, e o administrador judicial provisório concluir, no parecer a que ser reporta o n.°4 do artigo 17°-G do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, que o devedor se encontra em situação de insolvência, deve requerer que seja declarada a insolvência do devedor, o que será feito pelo juiz no prazo de 3 dias úteis.

Ao requerimento de insolvência do devedor aplica-se com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 28° do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas. 

Da aplicação destes não decorre que, em cumprimento do contraditório, tenha o devedor que ser citado para deduzir oposição ao parecer do administrador provisório, que concluindo pela verificação da situação actual de insolvência do devedor, pede a declaração desta, estando assegurado ao devedor a faculdade de recorrer e/ou embargar da sentença declaratória da insolvência, nos termos dos artigos 40° e 42° do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas”.

Não admitido o recurso de revista excepcional que interpôs e remetidos os autos para distribuição – 6ª Secção –, foi aí proferido o despacho liminar de fls.296, de 2.2.2016, do seguinte teor:

           

“A Recorrente “AA” sustenta existir oposição de Acórdãos, nos termos do art. 14º, nºl, do CIRE.

Juntou a fls. 213 e segs., uma decisão singular do Tribunal da Relação de Évora de 15.7.2015, a que chama “Acórdão” de onde apenas consta o nome do Relator e que foi extraída da base de dados www.dgsi.pt., que consultámos.

A decisão, sendo uma decisão singular do Relator não é, obviamente um Acórdão, razão por que não pode ser invocada para demonstrar a alegada oposição.

Assim, e porque a oposição deve ocorrer entre Acórdãos, notifique-a para, em 5 dias juntar um Acórdão em alegada oposição com o Acórdão recorrido, sob [pena] de não se admitir o recurso.”

A Recorrente, reiteradamente, afirmou que, em função da decisão que não admitiu a revista excepcional, onde se disse a fls. 290:“Vem sendo entendimento dos Juízes que integram a 6ª Secção deste Tribunal (à qual está atribuída a distribuição dos recursos sobre questões de comércio – art. 54°-2 da LOSJ) e desta formação (a que se refere o art. 672°-3 Código de Processo Civil) que o PER, por razões de identificação com o processo de insolvência, deve ter-se por incluído no campo de aplicabilidade do art. 14°-1 do CIRE, norma que estabelece um regime especial, de aplicação directa e autónoma em que a admissibilidade do recurso não está condicionada ao regime específico da revista excecional, ocorrendo, portanto, independentemente da dupla conformidade das decisões das Instâncias.

Nesta conformidade, não dependendo a admissão do recurso da verificação dos requisitos exigidos pelo n.°1 do art. 672° Código de Processo Civil, e porque a verificação dos requisitos exigidos pelo nº1 do art. 672º do Código de Processo Civil, e porque caberá ao Exmo. Relator a quem o processo vier a ser distribuído, determina-se a remessa dos autos à distribuição normal”, o recurso não pode deixar de ser admitido, omitindo sempre que o que está em causa para apreciar da admissibilidade do recurso de revista normal é a existência, documentada no processo pela Recorrente, da existência de oposição de Acórdãos, nos termos do art. 14º, nº1, do CIRE.

Com efeito, a norma especial do art. 14º, nº1, do CIRE, estatui – “No processo de insolvência, e nos embargos opostos à sentença de declaração de insolvência, não é admitido recurso dos acórdãos proferidos por tribunal da Relação, salvo se o recorrente demonstrar que o acórdão de que pretende recorrer está em oposição com outro, proferido por alguma das Relações ou pelo Supremo Tribunal de Justiça, no domínio da mesma legislação e que haja decidido de forma divergente a mesma questão fundamental de direito e não houver sido fixada pelo Supremo, nos termos dos artigos 732º-A e 732º-B do Código do Processo civil, jurisprudência com ele conforme”.

Apesar de notificada no despacho liminar do Relator, a Recorrente persistiu em considerar que a decisão singular proferida no Tribunal da Relação de Évora – fls. 213 e segs. - é o Acórdão fundamente da oposição-requisito de admissibilidade da Revista, nos termos do citado normativo.

No requerimento em que pede a intervenção da Conferência – a fls. 460 – a Reclamante refere – “Objectivamente a Recorrente, através de tal Reclamação, pretende que os Ex.mos Srs. Drs. Juízes Conselheiros, em Conferência, escrutinem o douto despacho de inadmissibilidade do Recurso proferido pelo Ex.mo Sr. Dr. Juiz Conselheiro Relator no sentido de revogar tal Despacho, admitindo o Recurso à luz da tese apresentada neste requerimento e anteriores, a qual, aliás, se limita à escorreita interpretação do disposto no art. 14º. do CIRE.”

Não houve resposta.

Decidindo:

Com o devido respeito, a Recorrente podendo juntar um Acórdão como fundante da alegada oposição, nos termos do art. 14º, nº1, do CIRE, não o fez.

A razão de ser da exigência de Acórdão em oposição ao Acórdão recorrido, como requisito de recorribilidade, não se cumpre com a demonstração de uma decisão singular proferida pelo Relator no Tribunal da Relação.

Um Acórdão da Relação, ou do Supremo Tribunal de Justiça, sendo uma decisão colegial, colectiva de três Juízes, obviamente dispõe maior autoridade e força persuasiva. A oposição de Acórdãos é sempre exigida (em casos legais de restrição ao recurso), como requisito de recorribilidade tanto na revista excepcional, como no recurso extraordinário para uniformização de jurisprudência, não bastando uma decisão singular do Relator.

Sem nos apegarmos, com excessivo formalismo, à letra da lei – que não é o único critério interpretativo nos termos do art. 9º do Código Civil – é manifesto que a ratio legis do art. 14º, nº1, do CIRE se destina a confrontar duas decisões de igual força, que, salvo o devido respeito, não existe quando se invoca como Acórdão em oposição uma decisão singular do Relator, como sucedeu in casu.

Neste entendimento o despacho do Relator ao não admitir o recurso, não cometeu ilegalidade.

Decisão:

 

Nestes termos, acorda-se em Conferência, em desatender a Reclamação, mantendo-se a decisão reclamada de não admissão do recurso, por falta do requisito a que alude o art. 14º, nº1, do CIRE, que postula a demonstração de oposição de Acórdãos e não contempla que a decisão singular valha como “acórdão” fundamento da oposição.

Custas pela Recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 2 UCs.

Supremo Tribunal de Justiça, 01 de setembro de 2016

Fonseca Ramos (Relator)

Fernandes do Vale

Ana Paula Boularot - (Vencida, teria admitido a revista porquanto entendo que quando a Lei se refere a oposição de Acórdãos quererá dizer oposição de decisões de Tribunais Superiores, desde que transitadas em julgado independentemente de se tratar de decisão singular ou colectivo)

           

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[1] Relator – Fonseca Ramos
Ex.mos Adjuntos:
Conselheiro Fernandes do Vale
Conselheira Ana Paula Boularot