Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
4694/08.0TBSTS-O.P1.S1
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: TAVARES DE PAIVA
Descritores: INSOLVÊNCIA
ADMINISTRADOR DE INSOLVÊNCIA
RESOLUÇÃO DE NEGÓCIO
IMPUGNAÇÃO
PRAZO DE CADUCIDADE
NULIDADE
Data do Acordão: 05/22/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL - LEIS, SUA INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO / VIGÊNCIA DA LEI - RELAÇÕES JURÍDICAS / NEGÓCIO JURÍDICO / NULIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO.
DIREITO FALIMENTAR / EFEITOS DA DECLARAÇÃO DE INSOLVÊNCIA / EFEITOS PROCESSUAIS / EFEITOS SOBRE OS NEGÓCIOS EM CURSO / RESOLUÇÃO EM BENEFÍCIO DA MASSA INSOLVENTE / PLANO DE INSOLVÊNCIA.
Doutrina:
- Gravato Morais, Resolução em Benefício da Massa Insolvente, p. 167.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 7.º, N.º3, 286.º
CÓDIGO DE INSOLVÊNCIA E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS (CIRE): - ARTIGOS 9.º, N.º1, 85.º, 88.º, N.º1, 102.º, N.º1, 120.º, 121.º, 123.º, 125.º, 194.º, N.º 1.
Sumário :
A acção de impugnação de resolução dependente do processo de insolvência e portanto com carácter urgente ( cfr. art. 9º nº1 do CIRE) como, aqui, acontece, a que alude o art. 125  do CIRE, tanto pode servir para impugnar os fundamentos fácticos da resolução levada a cabo pelo Administrador da Insolvência, como para impugnar a validade do próprio acto resolutivo em virtude da ocorrência de alguma situação susceptível de provocar a nulidade ou anulabilidade  desse acto e consequentemente está em qualquer dos casos  sempre  sujeita ao prazo de caducidade de seis meses, não sendo, por isso, de observar a respeito do fundamento relativo à nulidade do acto resolutivo o regime geral do art.  286 do C. Civil.
Decisão Texto Integral:

 Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

I-Relatório

Por apenso ao processo de insolvência de AA Ldª instaurou o BB SA , Sociedade Aberta a presente acção de impugnação da resolução , prevista no art. 125º do CIRE contra a Massa Insolvente daquela Imobiliária , representada pelo Sr. Administrador da Insolvência , alegando no essencial que a resolução levada a cabo pelo AI ( Administrador de Insolvência)através da carta registada com A/R datada de 01/09/2009, abrangeu negócios que estão fora do prazo fixado no nº1 do art. 120º do CIRE e que a mesma enferma de nulidade por não indicar os motivos da resolução.
Concluiu pedindo que:
. Seja declarada a nulidade da comunicação de resolução datada de 01/09/2009 e, por conseguinte, de nenhum efeito, considerando-se válidos e eficazes os contratos identificados na p. i., devendo, em consequência, manter-se as garantias prestadas, máxime, as hipotecas registadas a favor do banco autor, sobre as fracções CB, CD e CE, todas do prédio urbano, constituído em propriedade horizontal, sito na Rua ..........., freguesia e concelho de Santo Tirso e descrito na CRP do mesmo concelho sob o nº 0000 e inscrito na matriz predial urbana sob o art. 4241;
. Seja reconhecido o crédito reclamado nos autos de insolvência, no que concerne aos mesmos contratos, como crédito garantido, ao abrigo da al. a) do art. 47º do CIRE.

A Massa Insolvente contestou, por excepção (peremptória) e por impugnação.
No primeiro caso, arguiu a caducidade do direito do banco autor impugnar a resolução em apreço.
No segundo, sustentou que a missiva de resolução contém a factualidade que devia conter até porque se tratou de uma resolução incondicional, nos termos do art. 121º do CIRE.
Pugnou, por isso, pela procedência da excepção peremptória ou, assim não se entendendo, pela improcedência da acção e, em qualquer dos casos, pela sua absolvição do pedido.

O banco autor replicou, concluindo pela improcedência da referida excepção peremptória.

Fixado o valor da causa e dispensada a audiência preliminar, foi proferido despacho saneador, no qual se declarou procedente a excepção da caducidade do direito do banco autor, invocada pela ré, e se julgou, por isso, a acção improcedente, com a consequente absolvição da demandada do pedido, tendo, ainda, aquele sido condenado nas custas da acção.

O banco autor, inconformado com tal decisão, interpôs o recurso de apelação para o Tribunal da Relação que confirmou por unanimidade aquela decisão da 1ª instância, jugando improcedente a apelação.

É deste Acórdão que o Banco autor interpôs  a presente revista excepcional , invocando como pressuposto de admissibilidade o previsto na al. c) do nº1 do art. 721-A do CPC consistente em contradição do decidido no acórdão recorrido com o decidido em acórdão de 26.03.2009 do Tribunal da Relação de Guimarães, que indica como acórdão-fundamento e de que juntou oportunamente cópia extraída do original, acompanhada de certificação do respectivo trânsito em julgado.

 Submetido o requerimento de interposição do recurso à Formação a que alude o nº3 do art. 721- A do CPC, veio a ser admitida revista excepcional, nos termos do Acórdão de fls. 234 a 238.

O recorrente BB SA nas suas alegações de recurso formula as seguintes conclusões:
A-A presente revista excepcional é admissível por se verificaremos pressupostos da alínea c) do nº1 do art. 721do CPC.
B-Com efeito é manifesta a contradição entre o decidido no acórdão fundamento proferido no âmbito da mesma legislação ( CIRE) e o decidido no acórdão recorrido.
C. Enquanto o acórdão-fundamento determinou que “ Não concretizando a declaração resolutiva os factos constitutivos do direito que se pretendeu exercer, a resolução é nula e de nenhum efeito , por absoluta falta de motivação, razão pela qual não se pode ter por precludido o direito de impugnação, concedido por lei à ré, pelo simples decurso de um prazo cujo início pressupunha a validade daquela declaração” o acórdão recorrido decidiu que “ na resolução extrajudicial, a falta de fundamentação fáctica ( omissão dos elementos relevantes)da carta resolutiva do AI determina a nulidade da respectiva resolução .Tal nulidade é fundamento da acção de impugnação prevista no art. 125 do CIRE e a acção onde a mesma é invocada está sujeita ao prazo de caducidade fixado neste preceito, ficando afastada a aplicação do regime geral do art. 286º do C.Civil.
D. A comunicação de resolução efectuada pelo Administrador de Insolvência da Recorrida é nula e de nenhum efeito , porquanto , para além de não ter sido efectuada no prazo genérico de suspeição, não concretiza quaisquer motivos fácticos e legais para que se opere.
E. Compete ao Administrador de Insolvência alegar os factos que traduzem a prejudicialidade dos actos por ele visados, concretizando os factos constitutivos do direito que exercita.
F. No caso em apreço, há uma pura e simples omissão da motivação da declaração resolutiva.
G.Sendo a resolução nula e de nenhum efeito, por absoluta falta de motivação da declaração resolutiva, uma vez que não concretiza os factos constitutivos do direito que pretendeu exercer , também não pode ter ficado precçudido o direito de impugnação concedido por lei ao A, pelo simples decurso de um prazo cujo início pressupunha a validade daquela operação.
H. O destinatário da resolução tem de conhecer os fundamentos da mesma, sob pena de não estar em condições de perceber a declaração resolutiva( que é nula nestes termos)e de se assim o entender , a impugnar , Cfr. Acórdão da Relação do Porto de 17/01/2012, processo nº 2451/06.8TBVCD-E.P1 disponível in www.dgsi.pt.
I- Só assim( conhecemos os concretos factos e fundamentos da resolução) estará o interessado em condições de demonstrar a insubsistência do acto resolutivo , cfr. o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17/09/2009, processo nº 307/09 .1YFLSB, disponível in www.dgsi.pt.
J. Por atender ao interesse geral esta nulidade é absoluta sendo invocável a todo a tempo( cfr. art. 286 do C. Civil)operando ipso iure ou ipso vi legis, o que significa que ela pode ser declarada ex officio pelo juiz, sempre que no processo tenha elementos para se certificar da sua existência.
K. Não é  preciso , para que a nulidade absoluta produza efeitos , que se intente uma acção nesse sentido. O juiz pode numa acção destinada a qualquer outro efeito , aperceber-se da nulidade dum negócio jurídico que nela seja invocado ( desde que tenha elementos necessários para tal) e declará-la tirando daí as necessárias consequências( na medida em que interessem ao pleito).
L. Outro traço característico das nulidades absolutas é o que são insanáveis pelo tempo. São perpétuas.A todo tempo a nulidade pode ser invocada , quer por via da acção , quer por via de excepção ( defesa). Não está sujeita a qualquer prazo.
M. Não gerando controvérsia a declaração de nulidade ( absoluta)da resolução efectuda pelo Ai e considerando os  efeitos da sua verificação , não poderá o regime da nulidade ser afastado, por via da norma inserta no art. 125º do CIRE.
N.Pelo que se impõe a revogação do acórdão recorrido , nesta parte, fazendo operar o regime de nulidade ao caso concreto, declarando-se nula e de nenhum efeito a resolução efectuada, o que aliás é conhecido ex officiona decisão rescorrida, determinando-se ainda que o conhecimento de tal nulidade não está sujeita ao prazo constante do art. 125º do CIRE.

 Termos em que deve ser concedido provimento ao recurso, devendo ser revogada a decisão subjudice sendo substituída por decisão que declare improcedente a excepção invocada.

A Massa Insolvente da AA Ldª apresentou contra-alegações e depois de considerar que o disposto no art. 286º do C. Civil não tem aplicabilidade ao caso concreto, porquanto este preceito cede perante a norma especial do art. 125 do CIRE, pugnando pela confirmação do Acórdão recorrido.  

Colhidos os vistos, cumpre apreciar:


II- Fundamentação:         
.


III. Circunstancialismo fáctico relevante:

1 – Na decisão recorrida foram dados como provados os seguintes factos:
a) Em 01/09/2009, o senhor Administrador da Insolvência comunicou ao BES, SA, através de carta registada com aviso de recepção, a resolução, nos termos dos arts. 120º e 121º do CIRE, dos negócios jurídicos descritos no art. 20º da petição inicial.
b) A presente acção de impugnação de resolução deu entrada em juízo a 01/07/2012.

2 - A missiva referida em 1 – a) é do seguinte teor [«ipsis verbis»]:

“(…) Exmos. Senhores

Atendendo ao processo de insolvência em que a AA, Lda. se encontra envolvida, foi observada a constituição de hipotecas sobre determinados bens de que a insolvente é titular, como garantia dos empréstimos concedido pela vossa instituição à empresa.... – Materiais de Construção Lda..

Atento o facto de tal contrato ter sido celebrado dentro do período mencionado no n.º 1 do artigo 120.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas e concluído que tais negócios é prejudicial à massa insolvente, declaro resolvido os contratos efectuados em que estão envolvidos os bens da insolvente, no âmbito do art. 121 do CIRE.

Os bens, à data identificados, apresentam os seguintes dados:

[...]


Relativamente às operações em causa, as mesmas reportam-se a:

[...]


Nesta conformidade deverão V. Exas. considerar em definitivo o contratos resolvidos, sendo que qualquer tentativa de movimento dos bens acima identificados será motivo de procedimento judicial junto dos organismos devidos.

Com os meus cumprimentos subscrevo-me com total consideração,

(…)”.

3 – Dos documentos juntos aos autos decorre, ainda, que:
c) O contrato de financiamento CE 31250 foi celebrado em 12/11/2004, entre o banco BIC [ora BES] e a sociedade .... – Materiais de Construção, Lda. [doc. de fls. 17 a 23].
d) Em 12/11/2004, a AA, Lda. constituiu a favor do banco BIC uma hipoteca destinada a garantir todas as dívidas e responsabilidades [e respectivos juros remuneratórios e despesas judiciais e extra-judiciais], decorrentes de operações bancárias - mútuos, aberturas de crédito de qualquer natureza, descobertos em conta à ordem, descontos de letras, livranças ou cheques, garantias bancárias, fianças, avales e outras que existam ou venham a existir perante aquele banco -, vencidas e ou vincendas, que tenham sido ou venham a ser assumidas pela sociedade comercial .... – Materiais de Construção, Lda., hipoteca essa que incidiu sobre as fracções autónomas CB, CD e CE, pertencentes àquela Imobiliária, todas integradas no prédio urbano sito na Rua ..........., freguesia e concelho de Santo Tirso, inscrito na matriz sob o art. 4241 e descrito na CRP respectiva sob o nº 0000 [doc. de fls. 28 a 33].
e) O contrato de financiamento CE 24512 foi celebrado a 12/12/2001 entre o banco BIC e a sociedade .... – Materiais de Construção, Lda. [doc. de fls. 45 a 51].
f) O contrato de financiamento FEC 2692/07 foi celebrado em 08/05/2008, entre o mesmo banco, a .... – Materiais de Construção, Lda. e a AA, Lda., tendo esta última intervindo apenas como «prestadora de garantia de hipoteca» [doc. de fls. 55 e segs.].
g) Em 08/05/2008, a AA, Lda. constituiu a favor do BB, SA uma hipoteca destinada a garantir as obrigações emergentes do financiamento referido na alínea anterior, hipoteca essa que incidiu sobre as fracções autónomas, de sua propriedade, designadas pelas letras CB, CD e CE do prédio urbano sito na Rua ..........., freguesia e concelho de Santo Tirso, inscrito na matriz sob o art. 4241 e descrito na CRP respectiva sob o nº 0000 [doc. de fls. 63 a 70].
h) O descoberto no depósito à ordem supra referido verificou-se a 22/09/2008 [docs. de fls. 73 a 77].

4. Por informação prestada por e-mail pelo Tribunal «a quo» [a nossa solicitação], decorre, ainda, que:
i) O processo de insolvência a que estes autos estão apensos tiveram o seu início em 04/11/2008.
j) A sentença de declaração de insolvência da aí requerida, AA, Lda., foi proferida a 03/06/2009, tendo transitado em julgado.

                       
Apreciando:

Conforme se constata a única questão a decidir no presente recurso consiste em saber se havendo nulidade na declaração resolutiva emitida pelo Administrador da Insolvência, a acção de impugnação dessa resolução está sujeita ao prazo de caducidade de seis meses, a que alude o art. 125 do CIRE, ou se aplica, antes  o regime geral do art. 286 do C. Civil.

Como é sabido a insolvência apresenta como um dos objectivos essenciais a de prosseguir a satisfação paritária dos interesses dos credores, de forma a impedir que após a declaração de insolvência algum credor possa vir a obter ou adquirir na satisfação do seu crédito uma posição privilegiada ou mais  eficaz ( mais rápida ou mais completa) do que os restantes credores.

Trata-se do princípio par conditio creditorum que se encontra consagrado no art. 194 nº1 do CIRE segundo o qual “ o plano de insolvência obedece ao princípio da igualdade dos credores da insolvência, sem prejuízo das diferenciações justificadas por razões objectivas.”

Com a declaração de insolvência a posição dos credores assume uma particular e significativa alteração, nomeadamente quanto ao exercício do seu poder executivo, na medida em que ficam impossibilitados de instaurar ou prosseguir com as acções executivas ( cfr. art. 88ºnº1 do CIRE) e no que respeita às acções declarativas “cujo resultado possa influenciar o valor da massa e todas as acções de natureza patrimonial intentadas pelo devedor são apensadas ao processo de insolvência, desde que a apensação seja requerida pelo administrador da insolvência com fundamento na conveniência para os fins do processo”.( cfr. art. 85 do CIRE).

O Administrador a partir do momento em que é declarado o estado de insolvência de um particular ou de uma sociedade comercial ou empresa, fica investido no poder de gerir, administrar, zelar, conservar e reintegrar o património do devedor, facultando-lhe a lei a possibilidade de actuar e impulsionar as acções tendentes a evitar a depreciação do património que irá dar satisfação aos créditos que venham a apresentar-se ao concurso de credores.

Para além do poder potestativo que o CIRE atribui ao administrador da insolvência, o poder de dar ou recusar o cumprimento de contratos bilaterais pendentes ( cfr. art. 102 nº1) institui um novo regime que visa salvaguardar as acções anteriores praticadas pelo devedor e que se prefigurem ou contenham indicações de haverem sido efectivadas ou levadas a efeito com vista a prejudicar o pagamento ( igualitário) dos credores, como é o caso da resolução em benefício da massa insolvente que vem regulada nos arts. 120 a 126 do CIRE.

 E neste domínio parece não haver dúvidas que o instituto da resolução consagrado no CIRE visa conferir uma maior eficácia e celeridade aos actos de recuperação de bens que estivessem no património do devedor insolvente e que tivessem sido desviados do fim a que se destina o processo de insolvência, como seja o de dar satisfação, na medidas das forças do património dos créditos existentes à data da declaração da insolvência.

Como refere Gravato Morais in “ Resolução em Benefício da Massa Insolvente” “ os actos resolúveis não se configuram, nem são havidos, como actos inválidos, seja do ponto de vista formal, seja sob o prima substancial, atendendo naturalmente à inexistência de vícios que os afectem”.

“Do que se trata aqui é de, em razão de interesses supremos da generalidade dos credores da insolvência, sacrificar outros interesses havidos como menores( os de que contratam com o devedor insolvente e, eventualmente , os de que negoceiam com aqueles , portanto todos os terceiros em relação ao devedor insolvente)em função do empobrecimento patrimonial daqueles credores , por via da prática de actos num dado período temporal , designado como suspeito, que precede a situação de insolvência”.

 A finalidade é, pois, a da reintegração no património do devedor ( ou melhor da massa insolvente) para efeito de satisfazer os direitos do credor”.

 Conforme resulta dos citados arts. 120 a 126 do CIRE a resolução em benefício da massa insolvente comporta duas modalidades : a) a resolução condicional prevista no art. 120 do CIRE; b) a resolução incondicional prevista no art. 121º do citado diploma.

É  fazendo o confronto  deste regime de resolução  como o circunstancialismo fáctico que ocorre, no caso em apreço, que  se encontrará  a solução para o caso em apreço.

Segundo o nº1 do citado art. 120 “ podem ser resolvidos em benefício da massa insolvente os actos prejudiciais à massa praticados ou omitidos dentro dos quatro anos anteriores à data do início do processo de insolvência .

E  o nº2 estatui “ consideram-se prejudiciais á massa os actos que diminuam, frustrem , dificultem , ponham em perigo ou retardem a satisfação dos credores da insolvência”.

 No que concerne à prejudicialidade, o nº3 do citado art. 120 consagra uma presunção legal , júris et jure , sem admissão de prova contrária, desde que referente a actos de qualquer dos tipos referidos no artigo seguinte, ainda que praticados ou omitidos fora dos prazos aí contemplados”.

Por último não se pode esquecer a respeito da impugnação da resolução o estatuído no art. 125 do CIRE que é expresso no sentido de que “ o direito de impugnar a resolução caduca no prazo de seis meses, correndo a acção correspondente, proposta contra a massa insolvente, como dependência do processo de insolvência”

 Há que fazer, então, o confronto deste regime da resolução com o caso dos autos:

 Estamos perante uma acção de impugnação da resolução que, corre por apenso ao processo de insolvência prevista no citado art. 125º do CIRE.

Acontece que a recorrente a pretexto da nulidade da declaração resolutiva por falta de motivação, vem socorrer-se do regime geral do art. 286 do C. Civil, para fugir ao prazo de caducidade previsto citado art. 125º.

  Embora a recorrente considere que a falta de motivação provoque a nulidade da declaração, o certo é que não se pode esquecer que nem sempre a declaração resolutiva que não reúna os requisitos substanciais ( vg. Falta de fundamentação) provoca  a nulidade ou anulabilidade.

 E nessa medida a declaração pode não produzir efeitos resolutivos.

O certo é que no caso em apreço, estamos sempre  perante uma declaração resolutiva , que quer com esses ou quaisquer outros fundamentos pode sempre  ser impugnada pelo credor.

 Aqui e antes da apreciação do próprio mérito da declaração( a alegada falta de motivação), há que indagar se verifica ou não apontada caducidade do direito de impugnar a resolução.

  Vejamos:

Note-se, como diz Fernando Gravato Morais in “Resolução em Benefício da Massa Insolvente” pag. 167  que “ a acção em causa corre na “ dependência do processo de insolvente ( art. 125 in fine CIRE) : tem, portanto “ carácter urgente” pelo que goza inclusivamente de “ precedência sobre o serviço ordinário do tribunal “  ao abrigo do art. 9º nº1 do CIRE”.

E acrescenta o citado Autor “ não podia deixar de ser doutra forma, dado que a massa insolvente na pendência da acção de impugnação , não está ainda completamente constituída . A incerteza quanto á integração dos bens na referida massa que, a resolução teve em vista , impõe uma decisão em tempo célere”.

 A respeito dos próprios termos do acto resolutivo, como bem observa o Acórdão recorrido, a acção de impugnação não pressupõe a validade formal e material do acto resolutivo, no sentido de só ser admitida para impugnação dos concretos fundamentos fácticos constantes da missiva de resolução.

 E acrescenta e bem o Acórdão “ tal acção tanto pode servir para impugnar a existência dos fundamentos da resolução levada a cabo pelo AI ( Administrador da Insolvência), como para impugnar a validade do próprio acto resolutivo, por exemplo não ter sido observada a forma estabelecida no art. 123º ( não ter sido feita por carta registada com aviso de recepção)ou por terem  sido omitidos os fundamentos fácticos relevantes da resolução condicional do art. 120 ou da resolução incondicional do art. 121º ( a carta resolutiva não cumpriu as exigências “ alegatórias” atrás apontadas. Nestas situações ( e outras são possíveis) é através da acção de impugnação a que vimos aludindo que a resolução concretizada pode ser atacada pelo(s) respectivo(s) interessado(s).

 No caso dos autos, como observa o Acórdão recorrido, estamos no âmbito de uma acção de impugnação ( a presente acção) dependente de um processo de insolvência,( cfr. o já citado art. 125 in fine do CIRE) através da qual o banco recorrente veio impugnar a resolução efectuada pelo Administrador da Insolvência e não através de uma acção comum de anulação ou de declaração de nulidade.

 Significa em função do entendimento que vimos descrevendo que a acção de impugnação dependente do processo de insolvência e portanto com carácter urgente( cfr. art. 9º nº1 do CIRE) como, aqui, acontece, a que alude o art. 125  do CIRE, tanto pode servir para impugnar os fundamentos fácticos da resolução levada a cabo pelo Administrador da Insolvência, como para impugnar a validade do próprio acto resolutivo em virtude da ocorrência de alguma situação susceptível de provocar a nulidade ou anulabilidade  desse acto e consequentemente está em qualquer dos casos  sempre  sujeita ao prazo de caducidade de seis meses, não sendo, por isso, de observar a respeito do fundamento relativo à nulidade do acto resolutivo o regime geral do art.  286 do C. Civil.

Neste domínio, há ainda que ter em conta o princípio geral consagrado no art. 7º nº3 do C. Civil, segundo o qual a “a lei geral não revoga lei especial, excepto se outra for a intenção inequívoca do legislador”, pelo que à luz deste princípio  aquele regime geral do citado art.286 sempre teria de ceder perante o regime especial do art. 125 do C. Civil, atento os interesses subjacentes ao processo de insolvência- reconstituição do património do devedor ( a massa insolvente)por meio de um instituto específico a « resolução em benefício da massa insolvente » que permite de forma expedita e eficaz , a destruição de actos prejudiciais  a esse património” (cfr. preâmbulo do  CIRE) .

Portanto, atenta a data da declaração resolutiva do AI - 1/9/2009 e a data de 1/07/2012- da propositura da presente acção de impugnação, aliás, por apenso ao processo de insolvência e o prazo de seis meses estatuído no citado art. 125 do CIRE, dúvidas não existem que,  aqui, o direito de impugnar a resolução pela via da acção como fez o recorrente caducou.

Sumário:

A acção de impugnação de resolução dependente do processo de insolvência e portanto com carácter urgente ( cfr. art. 9º nº1 do CIRE) como, aqui, acontece, a que alude o art. 125  do CIRE, tanto pode servir para impugnar os fundamentos fácticos da resolução levada a cabo pelo Administrador da Insolvência, como para impugnar a validade do próprio acto resolutivo em virtude da ocorrência de alguma situação susceptível de provocar a nulidade ou anulabilidade  desse acto e consequentemente está em qualquer dos casos  sempre  sujeita ao prazo de caducidade de seis meses, não sendo, por isso, de observar a respeito do fundamento relativo à nulidade do acto resolutivo o regime geral do art.  286 do C. Civil.

 III-Decisão:

 Nestes termos e considerando o exposto acordam os Juízes deste Supremo em negar a revista, confirmando o Acórdão recorrido.

 Custas pelo recorrente

Lisboa e Supremo Tribunal de Justiça  

 

Lisboa, 22 de Maio de 2013

Tavares de Paiva (Relator)

Abrantes Geraldes

Bettencourt de Faria