Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
220/16.6T8PVZ.P1.S1
Nº Convencional: 7ª SECÇÃO
Relator: MARIA DO ROSÁRIO MORGADO
Descritores: RESOLUÇÃO BANCÁRIA
BANCO DE PORTUGAL
DELIBERAÇÃO
CONSTITUCIONALIDADE
TRANSMISSÃO
OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAR
PRINCÍPIO DA IGUALDADE
PROPRIEDADE PRIVADA
Data do Acordão: 03/22/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO BANCÁRIO – SANEAMENTO.
DIREITO CONSTITUCIONAL – DIREITOS E DEVERES FUNDAMENTAIS / DIREITOS E DEVERES ECONÓMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS.
Doutrina:
-Menezes Leitão, Informação Bancária e Responsabilidade, Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. Inocêncio Galvão Telles, Volume II, Direito Bancário, Almedina, p. 230;
-Pedro Lobo Xavier, Das Medidas de Resolução das Instituições de Crédito, Revista de Concorrência e Regulação, ano V, 18, abril – junho 2014, p. 178.
Legislação Nacional:
REGIME GERAL DAS INSTITUIÇÕES DE CRÉDITO E SOCIEDADES FINANCEIRAS (RGICSF): - ARTIGOS 139.º, 140.º, 145.º-C, 145.º-O, 145.º-AB E 145.º-AT.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGOS 13.º, N.º 1 E 62.º, N.º 2.
LEI ORGÂNICA DO BANCO DE PORTUGAL, APROVADA PELO DL Nº 5/98, DE 31 DE JANEIRO: - ARTIGOS 1.º, 17.º E 17.º-A.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


- DE 30-03-2017, PROCESSO N.º 725/14.3TBLSD-A.P1.S1;
- DE 02-11-2017, PROCESSO N.º 11674/16.0T8LSB.S1, AMBOS IN WWW.DGSI.PT.


-*-


ACÓRDÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL:


- ACÓRDÃO N.º 620/2004, DE 20-10-2004, IN WWW.TRIBUNALCOSNTITUCIONAL.PT.


-*-


ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA:


- DE 11-05-2017, IN WWW.DGSI.PT.
Sumário :
I - O Banco de Portugal, no uso dos poderes que o Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF) lhe confere (designadamente os arts. 139.º, 140.º, 145.º-C, 145.º-O, 145.º-AB e 145.º-AT) e, ainda, nos termos previstos nos arts. 1.º, 17.º e 17.º-A, da sua Lei Orgânica, deliberou quais as responsabilidades e contingências do Banco EE, S.A. que não seriam transferidas para o Banco DD, S.A..

II - O Banco de Portugal dispõe, por força da lei, do poder de transferência parcialou totalde direitos e obrigações de uma instituição de crédito, que constituam ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão, produzindo a decisão de transferência efeitos independentemente de qualquer disposição legal em contrário.

III - Estando em causa nos autos saber se se transmitiu para o Banco DD, S.A., enquanto banco de transição, a obrigação de indemnização que, segundo alegado pelos autores, incidia sobre o Banco EE, S.A., emergente da atuação dos funcionários deste Banco e que terão levado os autores a subscrever obrigações, sem o seu conhecimento ou acordo, e se essa transmissão viola normas legais, é de concluir, atenta a natureza normativa das deliberações do Banco de Portugal, e face à interpretação e clarificação constantes das mesmas, que qualquer responsabilidade suscetível de ser imputada por esta via ao Banco EE, S.A. e que se tenha constituído a favor dos autores, não foi transferida para o Banco DD, S.A., sem que isso represente violação do regime legal aplicável, designadamente dos preceitos do RGICSF invocados pelos recorrentes.

IV - O regime jurídico da resolução bancária concilia os interesses e os valores constitucionais em presença, pois que: (i) promove a preservação da função bancária da instituição de crédito alvo de resolução, assegurando a continuidade da prestação dos serviços financeiros essenciais para a economia; (ii) previne a ocorrência de consequências graves para a estabilidade financeira, nomeadamente o contágio entre entidades do sistema financeiro; (iii) salvaguarda os interesses dos contribuintes e do erário público, minimizando o recurso a apoio público extraordinário; (iv) protege os depositantes; (v) não agrava a posição jurídica dos credores da instituição de crédito objeto de resolução, na medida em que não podem suportar um prejuízo superior ao que suportariam caso essa instituição entrasse em liquidação, não havendo, assim, nem violação da garantia consagrada no art. 62.º, n.º 2, da CRP, nem tão-pouco do princípio da igualdade entre credores (art. 13.º, n.º 1, da CRP).

V - Ainda que a intervenção do Banco de Portugal possa ter decisivas implicações no ulterior património social do Banco EE, S.A., nem assim se afigura que haja alguma violação da lei ou do texto constitucional pelas deliberações do Banco de Portugal, com o âmbito que nelas foi expresso.

Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça



I – Relatório


1. AA, BB e CC instauraram a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra BANCO DD, S.A., pedindo a condenação da ré a pagar-lhes a quantia de EUR 327.341,10, sendo EUR 300.000,00 a título de capital, EUR 13.500,00 de juros remuneratórios e EUR 13.841,10 de juros moratórios, vencidos e vincendos, à taxa supletiva legal de 4%, até integral pagamento.

Alegaram, em suma, que:

Os autores abriram no Banco EE, S.A. (de ora em diante, EE) uma conta à ordem, nela depositando EUR 276.289,05 para a constituição de um depósito a prazo daquele montante, com início em 16-05-2012 e vencimento em 10-05-2012, à taxa de juro ilíquida de 5,100%, ao ano.

O EE propôs-lhes, mais tarde, a subscrição de obrigações emitidas pela sucursal do Banco em Londres (“EE London”), garantindo-lhes que esta aplicação tinha as mesmas características e segurança de um depósito a prazo, tendo assegurado que poderiam obter uma remuneração superior para o capital.

Assim, a autora subscreveu 319.000 das referidas obrigações do “EE London”, ao preço de EUR 89,37739464, cada uma, perfazendo EUR 286.000,00.

Em dezembro de 2013, o gerente de conta do EE propôs-lhes nova operação com papel comercial, emitido por oferta particular de subscrição pela sociedade FF International, S.A., afiançando-lhes igualmente que teria risco nulo, uma vez que se estava perante uma entidade do grupo FF e o EE garantiria capital e juros.

No entanto, o documento que a autora subscreveu contém uma declaração que é falsa e que nem sequer lhe foi explicada ou lida e da qual resulta que, afinal, se tratava de uma operação de elevado risco.

Entretanto, em 27-10-2014, a “FF International, S.A.” foi declarada em situação de falência pelo Tribunal d’Arrondissement de Luxembourg.

Os autores reclamaram o seu crédito no processo de falência da “FF International, S.A.”, mas nenhum pagamento receberam, nem têm expetativa de receber.

Por deliberação do Banco de Portugal foi decidido revogar a licença do EE e criado o Banco DD, SA, para o qual foram transferidos os ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão do EE.

Com a transferência para o Banco DD, SA da posição do EE na relação contratual com os autores, transferiram-se necessariamente todas as obrigações emergentes da violação de deveres contratuais pelo EE, como as que estão em causa nesta ação.

Nesta conformidade, o Banco DD está obrigado a indemnizar os autores, pelos prejuízos sofridos, conforme peticionado.

2. Na contestação, a ré excecionou a ilegitimidade ativa e passiva; alegou que, conforme decorre das deliberações do BdP, as responsabilidades em causa nesta ação, a existirem, integram os passivos que não foram transferidos do Banco FF, S.A. para o Banco DD, S.A. pelo que inexiste fundamento que suporte o pedido; impugnou, por fim, a factualidade articulada na petição inicial.

3. Os autores responderam à matéria das exceções, pugnando pela sua improcedência.

4. Na 1ª instância, foi proferido saneador-sentença que absolveu a ré do pedido.

5. Não se conformando com a decisão proferida, os autores interpuseram recurso de apelação para o Tribunal da Relação do Porto, tendo sido proferido acórdão que, julgando a apelação improcedente, confirmou a sentença.

6. De novo irresignados, os autores interpuseram recurso para este Supremo Tribunal, o qual foi admitido como revista excecional, por acórdão da Formação de Juízes Conselheiros, a que se refere o art. 672º, nº3, do CPC.

Nas alegações do recurso, os autores formularam as seguintes conclusões:

A responsabilidade que os AA. imputam ao R., radica na celebração do contrato de abertura de conta e na violação dos deveres que dele emergiram para o EE, no quadro de uma relação contratual complexa e multifacetada.

O comportamento do EE na colocação dos títulos emitidos pela ESI despoletou a sua responsabilidade, por força da intensidade da relação de clientela que decorreu da celebração e da execução do contrato de abertura de conta.

O crédito indemnizatório dos AA. representa um dos direitos em que se desdobrava a sua posição contratual perante o EE, a par de outros, e também de obrigações, que formavam o conteúdo da relação contratual complexa.

A deliberação de 03.08.2013 do Conselho de Administração do Banco de Portugal, com as várias redações e esclarecimentos de que foi alvo pelo seu autor, a deliberação "Contingências" e a deliberação "Perímetro" desmembraram a relação contratual complexa formada entre o Banco e os seus clientes depositantes.

Pois, apesar de declararem transferir a globalidade das relações contratuais do EE com os seus depositantes, excluíram responsabilidades como as constituídas perante os AA., assumidas na comercialização, intermediação financeira, processo de contratação e distribuição de instrumentos financeiros emitidos por outras entidades.

Esse desmembramento violou o artigo 145°-H, n° 13, do RGICSF que proibia que a transferência parcial dos ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão para o Banco de transição prejudicasse a cessão integral das posições contratuais da instituição de crédito originária.

Mas, o Banco de Portugal também violou o n° 1, alínea b), 145-B, do RGICSF[1], ao não garantir que os credores assumissem em condições equitativas os prejuízos do EE, de acordo com a hierarquia de prioridade das suas várias classes.

No quadro de uma medida de resolução, em que as obrigações que se mantenham na instituição de origem ficarão muito provavelmente por satisfazer, enquanto as que transitam para a nova instituição serão cumpridas, a seleção entre credores comuns configura um atentado a uma ideia de igualdade.

O Banco de Portugal transferiu do EE para o R. um variado universo de obrigações perante credores comuns, e mesmo uma parte das obrigações em que se desdobram as relações contratuais que emergem dos contratos de abertura de conta, mas reteve no EE os créditos indemnizatórios da natureza do dos AA.

Na falta de um critério substantivo que justifique o tratamento diferenciado, para além da violação do RGICSF, configura-se uma discriminação arbitrária, que atenta contra o princípio garantido pelo artigo 13° da CRP.

Ao contrário do que ponderou o douto acórdão recorrido, o que importa não é comparar o interesse dos credores do EE com o interesse geral dos cidadãos, mas sim o diferente tratamento dado aos diferentes credores comuns do EE.

O par comparativo que releva é formado, por um lado, pelos credores comuns que lograram ver os seus créditos transferidos para o R., onde é de esperar que obtenham pagamento, e, por outro lado, por aqueles credores que, como os AA., veem os seus créditos ficar no EE, sem quaisquer perspectivas de cobrança.

As deliberações do Banco de Portugal afetam o núcleo essencial do direito de propriedade dos AA., tal como consagrado no artigo 62° da CRP, na vertente do direito de não serem privados dos seus bens.

Já que, ao não ser transferida para o R. a totalidade da relação contratual com o EE, parte dos seus créditos - a mais relevante - fica privada da garantia geral conferida pelo artigo 601° do Código Civil, sem que lhes seja paga, por esse facto, qualquer indemnização, como o impõe o artigo 62, n° 2, da CRP.

O direito de propriedade, quer incida sobre imóveis, quer incida sobre móveis, é um direito fundamental, de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias, que compartilha do seu regime específico e que vincula diretamente todas as entidades públicas e privadas, nos termos dos artigos 17° e 18° da CRP.

Não há na lei fundamental valores que possam justificar que determinados credores comuns de um banco, que nada distingue dos outros credores comuns, se vejam privados da garantia dos seus créditos, sem indemnização.

As deliberações do Banco de Portugal, pela sua natureza discriminatória e pela desmedida amputação do direito de propriedade, ofendem - na pessoa dos AA. e dos que se encontram nas mesmas circunstâncias - os artigos 13° e 62°, n° 1, da CRP.

Ora, os atos administrativos que afetem o conteúdo essencial de um direito fundamental são nulos, não produzem quaisquer efeitos jurídicos independentemente da declaração de nulidade, sendo esta susceptível de ser conhecida a todo o tempo por qualquer autoridade, segundo o artigo 161°, n° 2, alínea d), do CPA[2] .

Os Tribunais Comuns têm, portanto, competência para apreciar a nulidade do ato administrativo, ainda que essa competência apenas lhes caiba se essa nulidade se apresentar como questão prejudicial do litígio, como sucede no caso dos autos.

A nulidade invocada afeta as subalíneas (v) e (vii), da alínea (b), do ponto 1. do Anexo 2, da Deliberação de 03.08.2013 do Conselho de Administração do Banco de Portugal, com as várias redações e esclarecimentos de que foram alvo, bem como a alínea C) da deliberação "Contingências" e a alínea J) da deliberação "Perímetro", referentes à retransmissão de direitos e obrigações para o EE.

Afetando também qualquer outro ponto das deliberações do Conselho de Administração do Banco de Portugal que excluam da transferência para o Banco DD, S.A. o crédito dos AA..

Essa nulidade deve ser reconhecida, com a consequência de que todos os direitos e deveres que integram a relação obrigacional complexa que se constituiu entre os AA. e o EE, incluindo o crédito indemnizatório cujo valor é peticionado nos presentes autos, se transferiram para o Banco DD, S.A..

O que implica que a instância deverá prosseguir os seus termos para apuramento dos factos de que depende a existência e o conteúdo de tal crédito.

A douta decisão recorrida violou os artigos 145°-B, n° 1, alínea b), e 145º-H, n° 13, do RGICSF e os artigos 13° e 62°, n° 1, e n° 2, da CRP.

7. Houve contra-alegações.

8. Como se sabe, o âmbito objetivo do recurso é definido pelas conclusões do recorrente (arts. 608.º, nº2, 635.º, nº4 e 639º, do CPC), importando, assim, decidir se:

- As deliberações do Banco de Portugal, ao excluírem da transferência para o Banco DD responsabilidades como as constituídas perante os AA., assumidas na comercialização, intermediação financeira, processo de contratação e distribuição de instrumentos financeiros emitidos por outras entidades, violam o disposto no Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (doravante RGICSF);

- As deliberações do Banco de Portugal em causa ofendem os princípios constitucionais contidos nos arts. 13° e 62°, n° 1, da Constituição da República;

- Sendo nulas, têm os tribunais comuns competência para declarar a nulidade.


***



II – Fundamentação de facto


9. As instâncias deram como assente a seguinte materialidade:


1. Em 13-05-2011, os AA. abriram, junto do EE, uma conta de depósitos à ordem com o nº 000 38…4, que qualquer um podia isoladamente movimentar, tendo sido depositado nessa conta o montante de 276.289,05 € e depois procederam à constituição do depósito a prazo, com igual montante, início em 16-05-2011 e vencimento em 10-05-2012 e a render uma taxa de juro bruta de 5,100% ao ano.

2. O EE entregou à 1ª A. uma carteira de cheques para movimentação da conta de depósitos à ordem e passou a enviar-lhe, mensalmente, extratos de conta, que continua a receber do R.

3. No princípio de Junho de 2012 subscreveu 319.000 das obrigações do “EE London”, ao preço de 89,37739464 €, cada uma, perfazendo 286.000,00 €.

4. Em 14-05-2013 recebeu 12.184,03 €, a título de juros, e, em 25-11-2013, recebeu 296.296,76 €, a título de capital e juros, sempre por crédito em conta.

5. Em 03-12-2013, deu ordem de subscrição de seis títulos, do valor nominal de 50.000,00 € cada um, emitidos pela FF International, S.A., por um prazo de um ano e que deveriam render um juro de 4,50% ao ano.

6. A 1ª A. não viu creditados na sua conta, nem pagos, o capital e os juros, fosse no vencimento do papel comercial, em 10-12-2014, fosse posteriormente.

7. A FF International, S.A. entrou em incumprimento da generalidade das suas obrigações e foi declarada em falência, pelo Tribunal d’Arrondissement de Luxembourg, em 27-10-2014, no P.º 593/14 do Greffe de la 15ème section, no qual os AA. reclamaram o seu crédito, sem receberem qualquer pagamento.

8. Em 03-08-2014 foi proferida deliberação do Banco de Portugal com o seguinte teor:

«Ponto Um

Constituição do Banco DD, SA

É constituído o Banco DD, SA, ao abrigo do n.º 5 do artigo 145.º-G do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro, cujos Estatutos constam do Anexo 1 à presente deliberação.

Ponto Dois

Transferência para o Banco DD, SA, de ativos, passivos, elementos extra patrimoniais e ativos sob gestão do Banco EE, S.A. São transferidos para o Banco DD, SA, nos termos e para os efeitos do disposto no nº 1 do artigo 145º H do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de  Dezembro, conjugado com o artigo 17º-A da Lei Orgânica do Banco de Portugal, os ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão do Banco CC, SA que constam dos Anexos 2 e 2A à presente deliberação.

Nos termos do artigo 1º dos Estatutos do "Banco DD, SA.", que constam do Anexo 1, "o Banco DD, SA é um banco constituído nos termos do nº 3 do artigo 145º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras ("RGICSF"), aprovado pelo Decreto-Lei n. 298/92, de 31 de Dezembro.

Dispõe o artigo 3.º dos mesmos Estatutos que “O Banco DD, SA tem por objeto a administração dos ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão transferidos do Banco EE, S.A. para o Banco DD, SA, e o desenvolvimento das atividades transferidas, tendo em vista as finalidades enunciadas no artigo 145º-A do RGICSF, e com o objetivo de permitir uma posterior alienação dos referidos ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão para outra ou outras instituições de crédito".

Por sua vez, no referido Anexo 2 à deliberação do Banco de Portugal de 3 de agosto de 2014 que determinou a transferência de ativos, passivos, elementos extra patrimoniais e ativos sob gestão do "Banco EE, S.A. ", para o "Banco DD, SA.", são referidos os critérios que presidirão à aludida transferência:

«[a}Todos os ativos, licenças e direitos, incluindo direitos de propriedade do EE serão transferidos na sua totalidade para o Banco DD, SA com exceção dos seguintes:

( ... )

(b) As responsabilidades do EE perante terceiros que constituam passivos ou elementos extrapatrimoniais deste serão transferidos na sua totalidade para o Banco DD, SA, com exceção dos seguintes “Passivos Excluídos”):

(i) ( ... )

(v) Quaisquer responsabilidades ou contingências decorrentes de dolo, fraude, violações de disposições regulatórias, penais ou contraordenacionais;

(vi) ( ... )

No que concerne às responsabilidades do EE que não serão objeto de transferência, estes permanecerão na esfera jurídica do EE.

(d) Os ativos sob gestão do EE ficam sob gestão do Banco DD, S.A. ( ... ).

Após a transferência prevista nas alíneas anteriores, o Banco de Portugal pode a todo o tempo transferir ou retransmitir, entre o EE e o Banco DD, SA, ativos, passivos, elementos patrimoniais e ativos sob gestão, nos termos do artigo 145º.H, número 5 ( ...)».

Em 11-08-2014, o Banco de Portugal emitiu nova deliberação com vista a clarificar e ajustar o “perímetro” do Banco DD, S.A. e, consequentemente, também, do EE, introduzindo diversas alterações e retificações ao texto da aludida deliberação de 03-08-2014.

Consta do texto consolidado do Anexo 2 da deliberação de 03-08-2014, com as alterações introduzidas pela deliberação de 11-08-2014, nomeadamente, o seguinte:

«( ... )1. Ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão do Banco FF, AS (EE), registados na contabilidade, que são objeto de transferência para o Banco DD, S.A, de acordo com os seguintes critérios:

(a) Todos os ativos, licenças e direitos, incluindo direitos de propriedade do EE são transferidos na sua totalidade para o Banco DD, S.A com exceção dos seguintes: ( ... ).

(b) As responsabilidades do EE perante terceiros que constituam passivos ou elementos extrapatrimoniais deste são transferidos na sua totalidade para o Banco DD, S.A, com exceção dos seguintes (“Passivos Excluídos"):

(i) Passivos para com (a) os respetivos acionistas, cuja participação seja igual ou superior a 2% do capital social ou por pessoas ou entidades que nos dois anos anteriores à transferência tenham tido participação igual ou superior a 2% do capital social do EE, membros dos órgãos de administração ou de fiscalização, revisores oficiais de contas ou sociedades de revisores oficiais de contas ou pessoas com estatuto semelhante noutras empresas que se encontrem em relação de domínio ou de grupo com a instituição, (b) as pessoas ou entidades que tenham sido acionistas, exercido as funções ou prestado os serviços referidos na alínea anterior nos quatro anos anteriores à criação do Banco DD, S.A., e cuja ação ou omissão tenha estado na origem das dificuldades financeiras da instituição de crédito ou tenha contribuído para o agravamento de tal situação; (c) os cônjuges, parentes ou afins em 1.º grau ou terceiros que atuem por conta das pessoas ou entidades referidas nas alíneas anteriores, (d) os responsáveis por factos relacionados com a instituição de crédito, ou que deles tenham tirado beneficio, diretamente ou por interposta pessoa, e que estejam na origem das dificuldades financeiras ou tenham contribuído, por ação ou omissão no âmbito das suas responsabilidades, para o agravamento de tal situação, no entender do Banco de Portugal;

(ii) Obrigações contraídas perante entidades que integrem o Grupo FF e que constituam créditos subordinados nos termos dos artigos 48.º e 49.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, com exceção das entidades integradas no Grupo FF cujas responsabilidades perante o EE foram transferidas para o Banco DD, sem prejuízo, quanto a estas entidades, da exclusão prevista na subalínea (v);

(iii) Obrigações contraídas ou garantias prestadas perante terceiros relativamente a qualquer tipo de responsabilidades de entidades que integram o Grupo FF, com exceção das entidades integradas no Grupo EE cujas participações sociais tenham sido transferidas para o Banco DD, S.A.;

(iv) Todas as responsabilidades resultantes da emissão de instrumentos que seja, ou em algum momento tenham sido, elegíveis para o cômputo dos fundos próprios do EE e cujas condições tenham sido aprovadas pelo Banco de Portugal;

(v) Quaisquer responsabilidades ou contingências, nomeadamente as decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais;

(vi) Quaisquer responsabilidades ou contingências do EE relativas a ações, instrumentos ou contratos de que resultem créditos subordinados perante o EE;

(vi) Quaisquer obrigações, garantias, responsabilidades ou contingências assumidas na comercialização, intermediação financeira e distribuição de instrumentos de dívida emitidos por entidades que integram o Grupo FF, sem prejuízo de eventuais créditos não subordinados resultantes de estipulações contratuais, anteriores a 30 de junho de 2014, documentalmente comprovadas nos arquivos do EE, em termos que permitam o controlo e fiscalização das decisões tomadas.

(c) No que concerne às responsabilidades do EE que não sejam objeto de transferência, estas permanecem na esfera jurídica do EE ( ... ).

(e) Os ativos sob gestão do EE ficam sob gestão do Banco DD, S.A. ( .. .).

2. Após a transferência prevista nas alíneas anteriores, o Banco de Portugal pode a todo o tempo transferir ou retransmitir, entre o EE e o Banco DD, S.A., ativos, passivos, elementos patrimoniais e ativos sob gestão, nos termos do artigo 145.º H, número 5.º. (...).

9. A transferência decretada (…) não pretende conferir a quaisquer contrapartes ou terceiros quaisquer novos direitos nem permitir exercer quaisquer direitos que na ausência dessa transferência não existissem ou não pudessem ser exercidos sobre ou com relação aos ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão do EE, assim transferidos, incluindo quaisquer direitos de denúncia, resolução ou de decretar o vencimento antecipado ou de compensar {netting/set-off}, nem dar lugar a (i) qualquer incumprimento, (ii) alteração de condições, direitos ou obrigações, ou (iii) sujeição a aprovações ou (iv) direito a executar garantias, (v) direito a efetuar retenções ou compensações (netting/set-off) entre quaisquer pagamentos ou créditos ao abrigo de tais ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão transferidos».

Em 29 de Dezembro de 2015, o Banco de Portugal emitiu três novas deliberações, denominadas “Contingência”, “Perímetro” e "Retransmissão”.

Na deliberação “CONTINGÊNCIA” pode ler-se que a mesma é adotada relativamente ao ponto da agenda “Clarificação e retransmissão de responsabilidades e contingências definidas como passivos excluídos nas subalíneas (v) a (vii) da alínea (b) do nº 1 do Anexo 2 à Deliberação do Banco de Portugal de 3 de agosto de 2014 (20 horas), na redação que lhe foi dada pela Deliberação da Banco de Portugal de 11 de agosto de 2014 (17 horas)”.

Do teor da deliberação “CONTINGÊNCIA” lê-se em particular:

«( ... ) 1. A deliberação do Banco de Portugal de 3 de agosto de 2014 (20:00 horas), com as clarificações e ajustamentos introduzidos pela deliberação de 11 de agosto de 2014 (17:00 horas) - doravante a "Deliberação de 3 de agosto", para efeitos dos considerandos seguintes - que determinou a constituição do Banco DD, S.A. ("DD"), determinou igualmente a transferência de um conjunto de ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão do Banco FF, S.A. ("Banco FF" ou "EE") para o Banco DD, descritos no Anexo 2 da mesma Deliberação de 3 de agosto.

2. O RGICSF estabelece, em conformidade com a legislação europeia na matéria, que os acionistas e credores da instituição objeto de resolução devem assumir os prejuízos da referida instituição.

3. Um dos princípios do RGICSF impõe que os recursos do fundo de resolução não sejam utilizados para assumir diretamente os prejuízos da instituição de crédito objeto de resolução.

4. O Banco de Portugal dispõe de um poder legalmente conferido que pode ser exercido a todo o tempo antes da revogação da autorização do EE para o exercício da atividade ou da venda do Banco DD, para determinar transferências adicionais de ativos e passivos entre o Banco DD e o EE (o " Poder de Retransmissão"). O Poder de Retransmissão encontra-se previsto no Capítulo III (Resolução) do Título VIII do RGICSF, tendo ficado expressamente estabelecido no número 2 do Anexo 2 da Deliberação de 3 de agosto.

Fundamentos para a clarificação e para o exercício do Poder de Retransmissão:

A versão original da Deliberação de 3 de agosto, publicada em 3 de agosto de 2014, dispunha o seguinte na alínea (b) do n.º 1 do Anexo 2:

“As responsabilidades do EE perante terceiros, que constituam passivos ou elementos extrapatrimoniais, serão integralmente transferidas para o Banco DD, SA, com exceção das seguintes (Passivos Excluídos) ... (v) Quaisquer responsabilidades ou contingências decorrentes de dolo, fraude e violação de disposições regulatórias, penais ou contraordenacionais."

A versão alterada da Deliberação de 3 de agosto, publicada em 11 de agosto de 2014, dispunha o seguinte na alínea (b) do nº 1 do Anexo 2:

“As responsabilidades do EE perante terceiros, que constituam passivos ou elementos extrapatrimoniais, serão integralmente transferidas para o Banco DD, SA, com exceção das seguintes (Passivos Excluídos):

(v) Quaisquer responsabilidades ou contingências, nomeadamente as decorrentes de fraude ou violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais.”

7. O Banco de Portugal considerou ser proporcional e de interesse público não transferir para o banco de transição as responsabilidades contingentes ou desconhecidas do EE (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais), independentemente de se encontrarem ou não registadas na contabilidade do EE nos termos da subalínea (v) a (vii) da alínea (b) do nº 1 do Anexo 2 da Deliberação de 3 de agosto, uma vez que a certeza relativamente às responsabilidades do banco de transição é essencial para garantir a continuidade das funções críticas desempenhadas pelo Banco DD e que anteriormente tinham sido desempenhadas pelo EE.

8. A legitimidade processual do EE tem vindo a ser questionada ou enjeitada em processos judiciais em que este é parte, com base na alegada transferência para o Banco DD das responsabilidades que se discutem naqueles processos, em que o EE era réu a 3 de agosto de 2014 e que respeitam a factos anteriores à aplicação da medida de resolução ao EE e por efeito da aplicação desta.

9. Importa clarificar que o Banco de Portugal, enquanto autoridade pública de resolução, decidiu e considera que todas as responsabilidades contingentes e desconhecidas do EE (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais), independentemente de se encontrarem ou não registadas na contabilidade do EE, estão abrangidas pelas subalíneas (v) a (vii) da alínea (b) do n.º 1 do Anexo 2 da Deliberação, não tendo sido, portanto, transferidas para o Banco DD.

10. Alguns tribunais solicitaram ao Banco de Portugal que este lhes comunicasse o seu entendimento, enquanto entidade de resolução, sobre a não transferência de responsabilidades e contingências do EE para o Banco DD, ao abrigo das subalíneas (v) a (vii) da alínea (b) do n. 1 do Anexo 2 da deliberação de 3 de agosto.

11. Esses pedidos não foram efetuados na maior parte dos processos pendentes em tribunal, que se relacionam com responsabilidades ou contingências não transferidas para o Banco DD. 12. Se o número de processos pendentes nos tribunais judiciais e a diferente orientação nas decisões até hoje tomadas conduzirem a que, de modo significativo, não venha a ser reconhecida adequadamente a seleção efetuada pelo Banco de Portugal (enquanto autoridade pública de resolução) dos ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão transferidos do EE para o Banco DD (decisão sobre o «perímetro de transferência»), pode ficar comprometida a execução e a eficácia da medida de resolução aplicada ao EE, a qual, entre outros critérios, se baseou num critério de certeza quanto ao perímetro de transferência.

13. Foi esse critério de certeza que permitiu calcular as necessidades de capital da instituição de transição, o Banco DD, e foi com base nesse cálculo que o Fundo de Resolução realizou o capital da instituição de transição.

14. Caso viessem a materializar-se na esfera jurídica do Banco DD responsabilidades e contingências por força de sentenças judiciais, o Banco DD seria chamado a assumir obrigações que de modo algum lhe deveriam caber e cuja satisfação não foi pura e simplesmente tida em consideração no montante do capital com que aquele banco de transição foi inicialmente dotado.

15. Este risco pode materializar-se ainda antes do trânsito em julgado das decisões judiciais se, de acordo com as regras contabilísticas, for entendido que, não obstante a decisão do Banco de Portugal, aquela materialização é provável.

16. Nos termos da lei, a decisão do Banco de Portugal sobre o perímetro de transferência só pode ser alterada através dos meios processuais previstos na legislação do contencioso administrativo, de acordo com o artigo 145º-AR do RGICSF (correspondente ao artigo 145.º-N do RGICSF, em vigor à data de aplicação da medida de resolução ao EE).

17. Questionar o referido perímetro de transferência fora do contencioso administrativo constitui um desvio à competência dos tribunais administrativos, legalmente estabelecida, e impede que o Banco de Portugal exerça a prerrogativa que a lei lhe confere de afastar, por motivo de interesse público, a execução de sentenças desfavoráveis, iniciando-se de imediato o procedimento tendente à fixação da indemnização de acordo com os trâmites definidos no Código do Processo nos Tribunais Administrativos.

18. Decisões de tribunais judiciais que, direta ou indiretamente, ponham em causa o perímetro de transferência neutralizam este mecanismo contencioso (e compensatório), legalmente previsto, de impugnação das decisões do Banco de Portugal, enquanto autoridade pública de resolução, e comprometem a execução e a eficácia da medida de resolução.

19. Tem a presente deliberação o seguinte objetivo:

a. Clarificar o tratamento das responsabilidades contingentes e desconhecidas do EE (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais), independentemente da sua natureza (fiscal, laboral, civil ou outra) e de se encontrarem ou não registadas na contabilidade do EE, nos termos da subalínea (v) da alínea (b) do nº 1 do Anexo 2 da Deliberação de 3 de agosto;

b. Se e na medida em que quaisquer responsabilidades contingentes e desconhecidas ou incertas do EE à data de 3 de agosto (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais), independentemente de se encontrarem ou não registadas na contabilidade do EE e que devessem ter permanecido na sua esfera jurídica nos termos da Deliberação de 3 de agosto, sejam atribuídas ao Banco DD, proceder à sua retransmissão, mediante o exercício do Poder de Retransmissão, das referidas responsabilidades contingentes e desconhecidas (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais) para o EE; e

c. Determinar que, de acordo com o disposto no nº 7 do artigo 145.º-P e nos nºs 2,3 e 4 do artigo 145.º-G do RGICSF, o EE e o Banco DD tomem as medidas previstas nesta deliberação por forma a conferir-lhe eficácia plena.

20. Face ao exposto e de forma a garantir a continuidade das funções essenciais desempenhadas pelo Banco DD, encontram-se reunidos os pressupostos para o exercício da Poder de Retransmissão, conforme previsto nesta deliberação, exercício que se afigura extremamente necessário, urgente e inadiável. O Conselho de Administração do Banco de Portugal, ao abrigo da competência conferida pelo RGICSF para selecionar os ativos e passivos a transferir para o banco de transição, delibera o seguinte:

A) Clarificar que, nos termos da alínea (b) do número 1 do Anexo 2 da deliberação de 3 de agosto, não foram transferidos do EE para o Banco DD quaisquer passivos ou elementos extrapatrimoniais do EE que, às 20:00 horas do dia 3 de agosto de 2014, fossem contingentes ou desconhecidos (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais), independentemente da sua natureza (fiscal, laboral, civil ou outra) e de se encontrarem ou não registadas na contabilidade do EE;

B) Em particular, desde já se clarifica não terem sido transferidos do EE para o Banco DD os seguintes passivos do EE:

(i) Todos os créditos relativos a ações preferenciais emitidas por sociedades veículo estabelecidas pelo EE e vendidas pelo EE;

(ii) Todos os créditos, indemnizações e despesas relacionados com ativos imobiliários que foram transferidos para o Banco DD;

(iii) Todas as indemnizações relacionadas com o incumprimento de contratos (compra e venda de ativos imobiliários e outros), assinados e celebrados antes das 20h00 do dia 3 de agosto de 2014;

(iv) Todas as indemnizações relacionadas com contratos de seguro de vida, em que a seguradora era o EE - Companhia de Seguros de Vida, S.A.;

(v) Todos os créditos e indemnizações relacionados com a alegada anulação de determinadas cláusulas de contratos de mútuo, em que o EE era o mutuante;

(vi) Todas as indemnizações e créditos resultantes de anulação de operações realizadas pelo EE enquanto prestador de serviços financeiros e de investimento; e

(vii) Qualquer responsabilidade que seja objeto de qualquer dos processos descritos no Anexo I. C) Na medida em que, não obstante as clarificações acima efetuadas, se verifique terem sido efetivamente transferidos para o Banco DD quaisquer passivos do EE que, nos termos de qualquer daquelas alíneas e da Deliberação de 3 de agosto, devessem ter permanecido na sua esfera jurídica, serão os referidos passivos retransmitidos do Banco DD para o EE, com efeitos às 20 horas do dia 3 de agosto de 2014;

D) O Conselho de Administração do EE e o Conselho de Administração do Banco DD praticarão todos os atos necessários à implementação e eficácia das clarificações e retransmissões previstos na presente deliberação. Em particular e de acordo com o disposto no nº 7 do artigo 145.º-P e nos nºs 2,3 e 4 do artigo 145º-G do RGICSF, o Banco DD e o EE devem:

(a) Adotar as medidas de execução necessárias à adequada aplicação da medida de resolução aplicada pelo Banco de Portugal ao EE, bem como de todas as decisões do Banco de Portugal que a complementam, alteram ou clarificam, incluindo a presente Deliberação;

(b) Praticar todos os atos, sejam estes de natureza procedimental ou processual, nos processos em que sejam parte de modo a dar adequada execução às decisões do Banco de Portugal referidas em (a), incluindo aqueles que sejam necessários para reverter atos anteriores que tenham praticado contrários aquelas decisões;

(c) Para efeito de cumprimento do disposto na alínea (b), requerer a imediata junção da presente deliberação aos autos em que sejam parte;

(d) Adequar os seus registos contabilísticos ao disposto nas decisões do Banco de Portugal referidas em (a); e

(e) Abster-se de qualquer conduta que possa por em causa as decisões do Banco de Portugal referidas em (a) (...).

Por sua vez, na mesma data - 29-12-2015 - foi emitida pelo Banco de Portugal a denominada Deliberação "PERÍMETRO" de onde consta, nomeadamente, escrito o seguinte:

"(...) 1. A Deliberação do Banco de Portugal de 3 de agosto de 2014 (20:00h), com as clarificações e ajustamentos introduzidos pela deliberação de 11 de agosto de 2014 (17:00 horas) - doravante a "deliberação de 3 de agosto" para efeitos dos considerandos seguintes - que determinou a constituição do Banco DD, S.A. ("DD"), determinou igualmente a transferência de um conjunto de ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão do Banco FF, S.A. ("Banco FF" ou "EE") para o Banco DD, descritos no Anexo 2 à mesma Deliberação de 3 de agosto.

2. Após 3 de agosto, e à medida que tem vindo a ser disponibilizada informação adicional, o Banco de Portugal, na qualidade de autoridade de resolução, tem vindo a aprofundar o conhecimento da situação financeira do conjunto de ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão do Banco DD.

3. O RGICSF estabelece, em conformidade com a legislação europeia na matéria, que os acionistas e credores de uma instituição objeto de medida de resolução devem suportar os prejuízos dessa mesma instituição.

4. Um dos princípios do RGICSF impõe que os recursos do fundo de resolução não sejam utilizados para assumir diretamente os prejuízos da instituição de crédito objeto de resolução.

5. O Banco de Portugal dispõe de um poder legalmente estabelecido que poderá ser exercido a todo o tempo antes da revogação da autorização do EE para exercício da atividade ou da venda do Banco DD, para determinar transferências adicionais de ativos e passivos entre o Banco DD e o EE (o "Poder de Retransmissão"). O Poder de Retransmissão encontra-se previsto no Capítulo III (Resolução) do Título VIII do RGICSF, tendo ficado expressamente previsto no número 2 do anexo 2 da Deliberação de 3 de agosto.

5. São necessárias clarificações adicionais quanto aos ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão transferidos do EE para o Banco DD e alterar o Anexo 2 da deliberação de 3 de agosto para refletir estas clarificações.

7. É desejável clarificar que quaisquer contingências fiscais passivas, quer presentes ou futuras, resultantes de dívidas fiscais, constituídas ou por constituir, relativas a factos tributários anteriores a 3 de agosto de 2014 deverão permanecer na esfera jurídica do EE.

8. Sem prejuízo das deliberações do Conselho de Administração do Banco de Portugal de 22 de dezembro de 2014, de 11 fevereiro de 2015 e de 15 de setembro de 2015, todas relativas à «Responsabilidade Oak Finance» (tal como definida na deliberação de 15 de setembro de 2015), o Banco de Portugal deve adicionalmente determinar que, por se tratar de uma responsabilidade de natureza equiparável a obrigações, dirigida a, e subscrita por, investidor(es) qualificado(s), tal responsabilidade (bem como todas as responsabilidades com esta conexas) deve permanecer na esfera jurídica do EE, pelo que na eventualidade de, por decisão transitada em julgado, se determinar que a Responsabilidade Oak Finance não se encontra abrangida pela subsubalínea (c) da subalínea (i) da alínea (b) do nº 1 do Anexo 2 da Deliberação de 3 de agosto ou se determinar que essa responsabilidade pertence ao Banco DD, tal responsabilidade (bem como todas as responsabilidades com esta conexas) é retransmitida para o EE.

9. Na medida em que, e não obstante as clarificações e alterações constantes desta Deliberação, um ativo ou passivo tenha sido transferido para o Banco DD que devesse ter permanecido na esfera jurídica do EE, ou tenha permanecido na esfera jurídica do EE, mas que devesse ter sido transferido para o Banco DD, o Poder de Retransmissão é exercido para conferir eficácia às clarificações e alterações constantes desta deliberação.

10. Considerando que, desde a aplicação da medida de resolução ao EE e também na presente data foram tomadas pelo Conselho de Administração do Banco de Portugal várias deliberações que produziram efeitos na seleção de ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão transferidos para o Banco DD, a qual estava originalmente expressa no Anexo 2 da Deliberação de 3 de agosto, revela-se oportuno e adequado proceder-se a um esforço de consolidação, atualizando o referido Anexo 2 às mencionadas Deliberações.

O Conselho de Administração do Banco de Portugal, ao abrigo da competência conferida pelo RGICSF para selecionar os ativos e passivos a transferir para o banco de transição e do disposto no n.º 2 do Anexo 2 da Deliberação de 3 de agosto, delibera o seguinte:

A) A subalínea (vii) da alínea (b) do nº 1 do Anexo 2 passa a ter a seguinte redação:

"Quaisquer obrigações, garantias, responsabilidades ou contingências assumidas na comercialização, intermediação financeira, processo de contratação e distribuição de instrumentos financeiros emitidos por quaisquer entidades, sem prejuízo de eventuais créditos não subordinados, cuja posição devedora não seja excluída por alguma das subalíneas anteriores, designadamente as subalíneas (iii) e (v), que (a) fossem exigíveis à data da medida de resolução em virtude de o respetivo prazo já se ter vencido ou, sendo os créditos condicionais, em virtude de a condição (desde que apenas desta dependesse o respetivo vencimento) já se ter verificado, e cumulativamente (b) resultassem de estipulações contratuais (negócios jurídicos bilaterais) anteriores a 30 de junho de 2014, que tenham cumprido as regras para a expressão da vontade e vinculação contratual do EE e cuja existência se possa comprovar documentalmente nos arquivos do EE, em termos que permitam o controlo e fiscalização das decisões tomadas."

B) A alínea (d) do nº 1 do Anexo 2 passa a ter a seguinte redação:

"São transferidos na sua totalidade para o Banco DD SA todos os restantes elementos extrapatrimoniais do EE, com exceção dos relativos ao Banco FF Angola SA, ao FF Bank (Miami), ao Aman Bank (Líbia) e dos relativos às entidades cujas responsabilidades perante o EE não foram transferidas nos termos da subalínea (v) da alínea (a) do nº 1 e, com efeitos a partir de 29 de dezembro de 2015, ao EE Finance, limited;"

C) É aditado um n.º 10, com a seguinte redação:

“Transferem-se ainda para o Banco DD quaisquer créditos já constituídos ou por constituir reportadas a factos tributários anteriores a 3 de agosto de 2014, independentemente de estarem ou não registados na contabilidade do EE.”

D) A Administração do EE deve, para efeitos de cumprimento de quaisquer formalidades que se julguem necessárias, exercer as suas competências, praticar os atos e tomar as iniciativas adequadas para garantir as transferências de valores a receber e créditos para o Banco DD decorrentes das contingências fiscais ativos, atualmente identificadas ou futuras, resultantes de créditos fiscais já constituídos ou por constituir, reportados a factos tributários anteriores a 3 de agosto de 2014, independentemente de se encontrarem ou não registadas na contabilidade.

E) É aditado um novo nº 11, com a seguinte redação:

"O disposto nas subalíneas (v) a (vii) da alínea (b) do nº 1 do presente Anexo devem ser interpretadas à luz das clarificações constantes do Anexo 2C".

F) É aditado um novo Anexo 2C à deliberação de 3 de agosto, com a redação constante da deliberação relativa à "Clarificação e retransmissão de responsabilidades e contingências definidas como passivos excluídos nas subalíneas (v) a (vii) da alínea (b) do nº 1 do Anexo 2 à Deliberação do Banco de Portugal de 3 de agosto de 2014 (20horas), na redação que lhe foi dada pela Deliberação do Banco de Portugal de 11 de agosto de 2014 (17 horas)", adotada pelo Conselho de Administração do Banco de Portugal na presente data; G) Sem prejuízo das deliberações do Conselho de Administração do Banco de Portugal de 22 de dezembro de 2014, de 11 fevereiro de 2015 e de 15 de setembro de 2015, todas relativas à «Responsabilidade Oak Finance» (tal como definida na deliberação de 15 de setembro de 2015), o Banco de Portugal determina adicionalmente que, por se tratar de uma responsabilidade de natureza equiparável a obrigações, dirigida a, e subscrita por, investidor(es) qualificado(s), tal responsabilidade (bem como todas as responsabilidades com esta conexas) deve permanecer na esfera jurídica do EE, pelo que na eventualidade de, por decisão transitada em julgado, se determinar que a Responsabilidade Oak Finance não se encontra abrangida pela subsubalínea (c) da subalínea (i) da alínea (b) do n.o 1 do Anexo 2 da Deliberação de 3 de agosto ou se determinar que essa responsabilidade pertence ao Banco DD, tal responsabilidade (bem como todas as responsabilidades com esta conexas) é retransmitida para o EE;

H) É aditada uma subalínea (ix) à alínea (b) ao nº 1 do Anexo 2, com a seguinte redação: “'Responsabilidade Oak Finance”.

I) Na medida em que qualquer ativo, passivo ou elemento extrapatrimonial que, nos termos de qualquer das alíneas anteriores, devesse ser transferido para o Banco DD, mas que, de facto, tenha permanecido na esfera jurídica no EE, são, pela presente, os referidos ativos, passivos ou elementos extrapatrimoniais transferidos do EE para o Banco DD, com efeitos a 3 de agosto de 2014 (20.00h);

J) Na medida em que qualquer ativo, passivo ou elemento extrapatrimonial que, nos termos de qualquer uma das alíneas anteriores, devesse ter permanecido na esfera jurídica do EE mas que foram, de facto, transferidos para o Banco DD, são, pela presente, os referidos ativos, passivos ou elementos extrapatrimoniais retransmitidos do Banco DD para o EE, com efeitos a 3 de agosto de 2014 (20.00h);

K) O Conselho de Administração do EE e o Conselho de Administração do Banco DD devem tomar todas as medidas necessárias à execução eficaz das clarificações, ajustamentos, transferências e retransmissões previstos na presente deliberação.

L) É anexada à presente deliberação uma versão revista e consolidada do Anexo 2 da Deliberação de 3 de agosto de 2014, a qual incorpora:

a. As clarificações e alterações constantes da presente deliberação;

b. As deliberações do Conselho de Administração do Banco de Portugal, adotadas na presente datam, relativas à "Retransmissão de obrigações não subordinadas do Banco DD, S.A., para o Banco FF, S.A. e à "Retransmissão das ações representativas da totalidade do capital social do EE Finance, Limited do Banco DD, S.A., para o Banco FF, S.A. ":

c. As deliberações do Conselho de Administração do Banco de Portugal de 22 de dezembro de 2014, de 11 fevereiro de 2015 e 15 de setembro de 2015, todas relativas à Responsabilidade Oak Finance, e de 13 de maio de 2015, relativa a eventuais obrigações contraídas e garantias prestadas perante terceiros pelo EE, relacionadas com a comercialização de instrumentos de dívida do GEE;

d. O Anexo 2 da Deliberação de 3 de agosto será alterado e retificado de modo a revestir a forma estabelecida no anexo da presente deliberação, incluindo o aditamento dos Anexos 2B e 2C ( ... ).

Anexo 2C DELIBERAÇÃO

Clarificação e retransmissão de responsabilidades e contingências definidas como passivos excluídos nas alíneas (v) a (vii) do nº 1 do Anexo 2 à Deliberação do Banco de Portugal de 3 de agosto de 2014 (20 horas), na redação que lhe foi dada pela Deliberação do Banco de Portugal de 11 de agosto de 2014 (17 horas).

O Conselho de Administração do Banco de Portugal - ao abrigo da competência conferida pelo RGICSF para selecionar os ativos e passivos a transferir para o banco de transição, delibera o seguinte:

A) Clarificar que, nos termos da alínea (b) do número 1 do Anexo 2 da deliberação de 3 de agosto, não foram transferidos do EE para o Banco DD quaisquer passivos ou elementos extrapatrimoniais do EE que, às 20:00 horas do dia 3 de agosto de 2014, fossem contingentes ou desconhecidos (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais), independentemente da sua natureza (fiscal, laboral, civil ou outra) e de se encontrarem ou não registadas na contabilidade do EE;

B) Em particular, desde já se clarifica não terem sido transferidos do EE para o Banco DD os seguintes passivos do EE: (i) Todos os créditos relativos a ações preferenciais emitidas por sociedade veículo estabelecidas pelo EE e vendidas pelo EE; (ii) Todos os créditos, indemnizações e despesas relacionados com ativos imobiliários que foram transferidos para o Banco DD; (iii) Todas as indemnizações relacionadas com o incumprimento de contratos (compra e venda de ativos imobiliários e outros), assinados e celebrados antes das 20hOO do dia 3 de agosto de 2014; (iv) Todas as indemnizações relacionadas com contratos de seguro de vida, em que a seguradora era o EE - Companhia de Seguros de Vida, S.A.; (v) Todos os créditos e indemnizações relacionados com a alegada anulação de determinadas cláusulas de contratos de mútuo, em que o EE era o mutuante; (vi) Todas as indemnizações e créditos resultantes de anulação de operações realizadas pelo EE enquanto prestador de serviços financeiros e de investimento; e (vii) Qualquer responsabilidade que seja objeto de qualquer dos processos descritos no Anexo I.

C) Na medida em que, não obstante as clarificações acima efetuadas, se verifique terem sido efetivamente transferidos para o Banco DD quaisquer passivos do EE que, nos termos de qualquer daquelas alíneas e da Deliberação de 3 de agosto, devessem ter permanecido na sua esfera jurídica, serão os referidos passivos retransmitidos do Banco DD para o EE, com efeitos às 20 horas do dia 3 de agosto de 2014;

D) O Conselho de Administração do EE e o Conselho de Administração do Banco DD praticarão todos os atos necessários à implementação e eficácia das clarificações e retransmissões previstos na presente deliberação. Em particular e de acordo com o disposto no nº 7 do artigo 145º -P e nos nºs 2,3 e 4 do artigo 145º-6 do R6ICSF, o Banco DD e o EE devem:

(a) Adotar as medidas de execução necessárias à adequada aplicação da medida de resolução aplicada pelo Banco de Portugal ao EE, bem como de todas as decisões do Banco de Portugal que a complementam, alteram ou clarificam, incluindo a presente deliberação;

(b) Praticar todos os atos, sejam estes de natureza procedimental ou processual, nos processos em que sejam parte de modo a dar adequada execução às decisões do Banco de Portugal referidas em (a), incluindo aqueles que sejam necessários para reverter atas anteriores que tenham praticado contrários aquelas decisões;

(c) Para efeito de cumprimento do disposto na alínea (b), requerer a imediata junção da presente deliberação aos autos em que sejam parte;

(d) Adequar os seus registos contabilísticos ao disposto nas decisões do Banco de Portugal referidas em (a); e

(e) Abster-se de qualquer conduta que possa por em causa as decisões do Banco de Portugal referidas em (a) ( ... )».



***



III – Fundamentação de direito


10. As deliberações do Banco de Portugal


Nesta revista, os recorrentes sustentam que as deliberações do Banco de Portugal que excluíram da transferência para o Banco DD, SA os créditos indemnizatórios, da natureza dos invocados pelos autores, violam o disposto no art. 145°-H, n° 13 e no n° 1, alínea b) do art. 145-B, ambos do RGICSF.


Sobre esta questão, pronunciou-se o acórdão recorrido nos seguintes termos:


“Os AA. alegam que aceitaram investir o capital ali depositado, sob proposta do EE, em papel comercial da ESI. Subscrição que vieram a efetuar em 03-12-2013 porque o EE lhe assegurou estar em causa uma operação de risco nulo, que lhe garantia o capital investido e os juros. Só que a ESI veio, entretanto, a ser declarada falida por Tribunal luxemburguês, sem que tal risco lhe tivesse sido exposto.

(…)

Esta proposta e aceitação de subscrição de papel comercial consubstancia da parte do EE uma atividade de intermediação financeira, submetida a rigorosos deveres de informação ao investidor, em função do seu perfil, e regulada pelo Código dos Valores Mobiliários.[3] Atividade que pode ser juridicamente enquadrada no âmbito da responsabilidade delitual, por violação de direitos absolutos ou disposições legais de proteção (artigo 483º do Código Civil) ou obrigacional, pelo incumprimento das obrigações derivadas do contrato ou ainda na responsabilidade pré-contratual ou na responsabilidade por informações.[4].

(…)

Mesmo admitindo que o EE  infringiu os deveres de lealdade, diligência, cuidado, informação e alerta decorrentes do princípio geral da boa fé, reforçados pelos elevados níveis de competência técnica e de organização empresarial dos bancos, como propugnam os recorrentes, a problemática que subjaz à questão solvenda é que a eventual responsabilidade civil do EE não foi transferida para o Banco DD, aqui demandado.

(…)

O Banco DD foi criado pela medida de resolução do BdP e, como tal, é uma instituição de crédito com a natureza jurídica de banco, com um capital social detido pelo Fundo de Resolução, autorizada a exercer a sua atividade sem prévio cumprimento dos requisitos legais e procedimentos formais com vista a futura alienação, mas apenas sucedeu aos direitos e obrigações do EE nas precisas condições resultantes da Deliberação do BdP.[5].

(…)

As Deliberações do BdP deixaram na esfera jurídica do EE as responsabilidades da natureza daquelas que os AA. disporiam e, não tendo sido transmitidas para o Banco DD, ressalta evidente a declarada improcedência da ação.”.


Cremos que se decidiu acertadamente.


Com efeito:


No novo sistema de supervisão financeira, composto pelo Banco Central Europeu (doravante BCE) e pelas autoridades nacionais competentes (ANC) dos países da zona Euro, ao BCE são atribuídas funções de supervisão com vista a proteger a estabilidade do sistema financeiro europeu, em concertação com as referidas ANC.

No seio destas, o BCE tem competência para conceder e revogar a autorização para o acesso à atividade de quaisquer instituições de crédito e para avaliar a aquisição de participações em instituições de crédito na área do Euro, o que veio a fazer relativamente ao Banco EE, S.A.[6].

Por sua vez, ao Banco de Portugal, enquanto entidade de supervisão, compete exercer as atribuições e competências definidas na sua Lei Orgânica (cf. DL nº 5/98, de 31 de janeiro) e no Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF), aprovado pelo DL n.º 298/92, de 31 de Dezembro, cabendo-lhe designadamente conceder autorização para a constituição de instituições de crédito, bem como revogar a licença para o exercício da atividade bancária.


Concretizando:


Nos termos do art. 139° do RGICSF, tendo em vista a salvaguarda da solidez financeira da instituição de crédito, dos interesses dos depositantes ou da estabilidade do sistema financeiro, o Banco de Portugal pode adotar as medidas sujeitas aos princípios da adequação e da proporcionalidade, tendo em conta o risco ou o grau de incumprimento, por parte da instituição de crédito, das regras legais e regulamentares que disciplinam a sua atividade, bem como a gravidade das respectivas consequências na solidez financeira da instituição em causa, nos interesses dos depositantes ou na estabilidade do sistema financeira.

Na adoção dessas medidas, o Banco de Portugal não se encontra vinculado a observar qualquer relação de precedência, estando habilitado, de acordo com as exigências de cada situação e os princípios indicados no artigo anterior, a combinar medidas de natureza diferente (cf. art. 140° do RGICSF).

De entre as medidas possíveis (intervenção corretiva, administração provisória ou medida de resolução), no caso do EE, o BdP optou pela medida de resolução, (cf. art. 144º do RGICSF).

Por sua vez, no âmbito dos poderes que lhe são atribuídos, o BdP, atento o disposto no art. 145°-E, nº1 do RGICSF, optou por transferir a totalidade da atividade prosseguida pelo Banco e um conjunto dos seus ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão para o Banco DD, SA, entidade criada transitoriamente para este efeito, que é exclusivamente detida pelo Fundo de Resolução, no qual participam todas as instituições de crédito com sede em Portugal.

Ainda neste âmbito, importa considerar, igualmente, o Aviso do Banco de Portugal nº 13/2012, de 8 de Outubro de 2012, o qual veio estabelecer que:

“As regras necessárias à criação e ao funcionamento de bancos de transição” (cf. art. 1.º), sendo que, de acordo com o n.º 1 do artigo 2.º do mesmo Aviso, sob o título “Regime dos bancos de transição”, estabeleceu-se que: «Os bancos de transição são instituições de crédito com duração limitada, com a natureza jurídica de banco e a forma de sociedade anónima, que se regem pelos estatutos aprovados por deliberação do Banco de Portugal, pelas disposições legais e regulamentares que lhes são especialmente aplicáveis, pelas normas aplicáveis aos bancos e, subsidiariamente, pelo Código das Sociedades Comerciais, com as adaptações necessárias aos objetivos e natureza destas instituições».

Acrescenta o nº 3 do mesmo artigo 2º que: «Os bancos de transição são criados para receberem e administrarem a totalidade ou parte dos ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão de uma instituição originária, desenvolvendo todas ou parte das atividades dessa instituição com vista à prossecução das finalidades enunciadas no artigo 145.º-A do RGICSF».


Ora bem.


O Banco de Portugal, no uso dos poderes que o RGICSF lhe confere (cf. designadamente os arts. 139°, 140°, 145°-C, 145°-0, 145°-AB e 145°-AT) e, ainda, nos termos previstos nos arts. 1º, 17° e 17°-A da sua Lei Orgânica, deliberou quais as responsabilidades e contingências do Banco FF, S.A. que não seriam transferidas para o Banco DD, S.A.

Efetivamente, por deliberações do Banco de Portugal de 3 e 11 de Agosto de 2014, foi determinado transferir do Banco FF, S.A. - que mantém a sua personalidade jurídica - para o Banco DD, S.A., determinados ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sobre a gestão daquele e excetuar da transferência "quaisquer responsabilidades e contingências do EE, nomeadamente as decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais" (cf. subalínea v), da al. b), do Anexo 2, da Deliberação do Banco de Portugal de 3 de Agosto de 2014, na redação que lhe foi dada pela Deliberação de 11 de Agosto de 2014).

Ulteriormente, o Banco de Portugal tomou a Deliberação de 29/12/2015 (com as retificações aprovadas em 12/01/2016), clarificando que, nos termos da alínea b), do número 1, do Anexo 2 da deliberação de 3 de Agosto, não foram transferidos do EE para o Banco DD quaisquer passivos ou elementos extrapatrimoniais daquele que, às 20:00 horas do dia 3 de Agosto de 2014, fossem contingentes ou desconhecidos (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais), independentemente da sua natureza (fiscal, laboral, civil ou outra) e de se encontrarem ou não registadas na contabilidade do EE; clarificando não terem sido transferidos do EE para o Banco DD inter alia:

- Todos os créditos relativos a ações preferenciais emitidas por sociedades veículo estabelecidas pelo EE e vendidas pelo EE;

- Qualquer responsabilidade que seja objeto de qualquer dos processos descritos em anexo, entre os quais o Banco de Portugal incluiu, expressamente, os casos como o dos autos.

Foram ainda publicadas em 13/01/2016, três outras Deliberações do Banco de Portugal, destacando-se:


- Deliberação relativa à "Clarificação e retransmissão de responsabilidades e contingências definidas como passivos excluídos nas subalíneas (v) a (vii) da alínea (b) do n.º 1 do Anexo 2 à Deliberação do Banco de Portugal de 3 de agosto de 2014 (20 horas), na redação que lhe foi dada pela Deliberação do Banco de Portugal de 3 de Agosto de 2014 (20 horas) na redação que lhe foi dada pela Deliberação do Banco de Portugal de 11 de agosto de 2014 (17horas)" - (doravante designada “Deliberação "Contingências";[7] 


- Deliberação relativa às "Transferências, retransmissões e alterações e clarificações ao Anexo 2 da deliberação de 3 de agosto de 2014 (20.00b)" - (doravante designada Deliberação "Perímetro".         

Resumidamente, no que agora releva, as diversas alíneas do ponto 1. do Anexo 2 da Deliberação de 11.08.2014 na redação conferida pela Deliberação perímetro de 29.12.2015, são do seguinte teor:

"(b) As responsabilidades do EE perante terceiros que constituam responsabilidades ou elementos extrapatrimoniais deste são transferidos na sua totalidade para o Banco DD, SA, com exceção dos seguintes ("Passivos Excluídos"): (...)

(v) Quaisquer responsabilidades ou contingências, nomeadamente decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, fiscais, penais ou contraordenacionais, com exceção das contingências fiscais ativas;

(vi) Quaisquer responsabilidades ou contingências do EE relativas a ações instrumentos ou contratos de que resultem créditos subordinados perante o Banco FF, S.A.;

(vii) Quaisquer obrigações, garantias, responsabilidades ou contingências assumidas na comercialização, intermediação financeira, processo de contratação e distribuição de instrumentos financeiros emitidos por quaisquer entidades, sem prejuízo de eventuais créditos subordinados, cuja posição devedora não seja excluída por alguma das subalíneas anteriores, designadamente as subalíneas (iii) e (v), que (a) fossem exigíveis à data da medida de resolução em virtude de o respetivo prazo já se ter vencido ou, sendo os créditos condicionais, em virtude de a condição (desde que apenas desta dependesse o respetivo vencimento) já se ter verificado e cumulativamente (b) resultassem de estipulações contratuais (negócios jurídicos bilaterais) anteriores a 30 de junho de 2014, que tenham cumprido as regras para a expressão da vontade e vinculação contratual do EE e cuja existência se possa comprovar documentalmente nos arquivos do EE, em termos que permitam o controlo e fiscalização das decisões tomadas.

(viii) Com efeitos a partir de 29 de dezembro de 2015, todos os direitos e responsabilidades do Banco DD, decorrentes dos instrumentos de dívida não subordinada enumerados no Anexo 2B (excluindo os detidos pelo Banco DD), juntamente com todos os passivos, contingências e elementos extrapatrimoniais, na medida em que estejam relacionados com os referidos instrumentos de dívida (incluindo (i) a emissão, comercialização e venda dos mesmos, e (ii) decorrentes de documentos contratuais ou outros instrumentos, celebrados ou emitidos pelo banco, e com conexão com esses instrumentos, incluindo documentos de programa ou subscrição, ou quaisquer outros atos do banco praticados em relação a esses instrumentos, em data anterior, simultânea ou posterior à data das respectivas emissões); (c) No que concerne às responsabilidades do EE que não são o b/e to de transferência, estas ' permanecem na esfera jurídica do EE." (sic). Mais é clarificado no Ponto 11. da mesma deliberação que "O disposto nas subalíneas a (vii) da alínea (b) do n.º 1 do presente Anexo devem ser interpretadas à luz das clarificações constantes do Anexo 2C." (sic. página 10).

Por sua vez, o Anexo 2C da Deliberação Perímetro tem a seguinte redação:

“Clarificação e retransmissão de responsabilidades e contingências definidas como passivos excluídos nas alíneas (v) a (vii do n. °1 do Anexo 2 à Deliberação do Banco de Portugal de 3 de agosto de 2014 (20 horas), na redação que lhe foi dada pela Deliberação do Banco de Portugal de 11 de agosto de 2014 (17 horas).

O Conselho de Administração do Banco de Portugal, ao abrigo da competência conferida pelo RGICSF para selecionar os ativos e passivos a transferir para o banco de transição, delibera o seguinte:

A) Clarificar que, nos termos da alínea (b) do número 1 do Anexo 2 da deliberação de 3 de agosto, não foram transferidos do EE para o Banco DD quaisquer passivos ou elementos extrapatrimoniais do EE que, às 20:00 horas do dia 3 de agosto 2014, fossem contingentes ou desconhecidos (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais), independentemente da sua natureza (fiscal, laboral, civil ou outra) e de se encontrarem ou não registadas na contabilidade do EE;

B) Em particular, desde já se clarifica não terem sido transferidos do EE para o Banco DD os seguintes passivos do EE:

(i) Todos os créditos relativos a ações preferenciais emitidas por sociedades-veículo estabelecidas pelo EE e vendidas pelo EE;

(H) Todos os créditos, indemnizações e despesas relacionados com ativos imobiliários que foram transferidos para o Banco DD;

(iii) Todas as indemnizações relacionadas com o incumprimento de contratos (compra e venda de ativos imobiliários e outros) assinados e celebrados antes das 20b00 do dia 3 de agosto de 2014;

(iv) Todas as indemnizações relacionadas com contratos de seguro de vida, em que a seguradora era o EE- Companhia de Seguros de Vida, SA.;

(v) Todos os créditos e indemnizações relacionados com a alegada anulação de determinadas cláusulas de contratos de mútuo, em que o EE era mutuante;

(vi) Todas as indemnizações e créditos resultantes de anulação de operações realizadas pelo EE enquanto prestador de serviços financeiros e de investimento ;e

(vii) Qualquer responsabilidade que seja objeto de qualquer dos processos descritos no Anexo I.

C) Na medida em que, não obstante as clarificações acima efetuadas, se verifique terem sido efetivamente transferidos para o Banco DD quaisquer passivos do EE que, nos termos de qualquer daquelas alíneas e da Deliberação de 3 de agosto, devessem ter permanecido na sua esfera jurídica, serão os referidos passivos retransmitidos do Banco DD para o EE, com efeitos às 20 horas do dia 3 de agosto 2014;"

No caso dos autos:

Como se referiu, está em causa saber se se transmitiu para o Banco DD, SA, enquanto banco de transição, a obrigação de indemnização emergente da atuação dos funcionários do EE que, segundo alegado pelos autores, os terá induzido a subscrever obrigações, sem o seu conhecimento ou acordo, bem como se essa transmissão consubstancia uma violação de normas legais e/ou constitucionais.

Decorre do supra exposto que o Banco de Portugal dispõe, por força da lei, do poder de transmissão (e de retransmissão) parcial ou total de direitos e obrigações de uma instituição de crédito, que constituam ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão, produzindo a decisão de transferência efeitos independentemente de qualquer disposição legal ou contratual em contrário.

Neste contexto, atenta a natureza normativa das deliberações do Banco de Portugal, e face à interpretação e clarificação constantes das deliberações acima mencionadas, é de concluir que qualquer responsabilidade suscetível de ser imputada ao Banco EE, SA. (EE) e que eventualmente se tenha constituído a favor dos autores, não foi transferida do EE para o Banco DD, SA, o que não representa violação do regime legal aplicável, mormente dos preceitos do RGICSF invocados pelos recorrentes.



***



11. Da inconstitucionalidade


Os recorrentes alegam, porém, que as deliberações em causa, pela sua natureza discriminatória e pela desmedida amputação do direito de propriedade dos autores, ofendem os princípios consagrados nos artigos 13° e 62°, n° 1 da Constituição da República Portuguesa (CRP).

Mais alegam que os atos administrativos, corporizados nas deliberações do BdP, por afetarem o conteúdo essencial de direitos fundamentais são nulos, tendo os tribunais comuns competência para apreciar tal nulidade.

Sobre esta questão, pode ler-se no acórdão recorrido:

“A resolução do BdP foi deliberada por razões de interesse público, particularmente com vista à prevenção do risco sistémico, atendendo à importância da atividade bancária para o equilíbrio do sistema financeiro e até para garantir o interesse público subjacente às funções que desenvolve, como sejam o financiamento da economia e a gestão dos serviços de pagamentos, obstando ao colapso financeiro do EE e a consequente contaminação de todo o sistema financeiro nacional com as consequentes perdas para a economia em geral.

(…)

Há, de facto, uma contraposição de interesses: enquanto a medida de liquidação da instituição bancária visa, em primeira linha, a salvaguarda dos interesses dos credores, a medida de resolução cumpre as finalidades sinalizadas, essencialmente a salvaguarda dos interesses dos contribuintes e do erário público. É que um dos elementos básicos da medida de resolução é evitar o uso de fundos públicos para suprir as falhas bancárias de instituições privadas. A injeção de capitais no banco de transição é efetuada através do Fundo de Resolução e do Fundo de Garantia de Depósitos, que são financiados apenas pelo sistema financeiro. Daí que possamos afirmar que a medida de resolução visou, em primeira linha, evitar a afetação de fundos públicos para proteção dos contribuintes e do erário público.

(…)

A medida de resolução implica, é certo, uma intromissão do poder público no tecido empresarial privado num contexto económico de crise no intuito de evitar, tanto quanto possível, que os bancos sejam resgatados por capitais públicos, mas no intuito de obstar a que se permaneça «num horizonte referencial em que os lucros são privados e os prejuízos são públicos». Portanto, esta solução de garantir a minimização das perdas para o Estado poderá reconduzir-se a um interesse superior à proteção da propriedade privada.

(…)

Ademais, embora a resolução do BdP, ao proceder à segregação dos ativos e à expurgação dos ativos não tóxicos do EE pareça representar uma expropriação ex lege das posições dos acionistas e dos credores, a verdade é que o seu direito de propriedade não incide sobre direitos reais clássicos e, por isso, gozam de mais débil proteção constitucional, desfrutando o legislador de grande margem de discricionariedade na matéria.

(…)

A resolução não pode deixar de observar o princípio da proporcionalidade, como princípio geral de limitação do poder público, ancorado no princípio geral do Estado de Direito (artigo 18º/2 da CRP).

No fundo, trata-se de apreciar se a intervenção do BdP, nos seus efeitos restritivos ou lesivos, se encontra numa relação de justa medida com os fins públicos prosseguidos, sem descurar que os Estados detêm larga margem de apreciação na definição do interesse geral.

(…)

Mesmo neste âmbito, a Constituição não consagra uma tutela de intangibilidade absoluta das poupanças, dando ampla margem de liberdade ao legislador ordinário para escolher os meios adequados aos fins que institui. Donde nos pareça que a limitação dos interesses privados dos credores do banco submetido a resolução cai na alçada do considerável espaço de liberdade de conformação do Estado na ponderação dos bens em conflito. (…) Em suma, tudo a apontar para, na ponderação dos interesses em jogo, a supremacia do interesse público fundar a proporcionalidade da medida de resolução.

(…)

Também não parece haver violação do princípio da igualdade, porque ele não proíbe ao Estado que faça distinções; apenas proíbe diferenciações de tratamento sem fundamento material bastante, sem uma justificação razoável, segundo critérios objetivos e relevantes.

(…)

O BdP recorreu ao princípio da concordância prática dos interesses em conflito, distribuindo os custos do conflito e escolhendo entre os modos de resolução da situação aquela que menos comprime os valores em causa – o direito de propriedade dos acionistas e dos credores do EE e o interesse geral dos cidadãos.

(…)

O Tribunal Constitucional também não focaliza o direito de propriedade sem condicionamentos, afastando a conceção de que os únicos atos ablativos do direito de propriedade são os consentidos pela Constituição (artigo 62º/2) e admitindo outros, desde que encontrem cobertura constitucional.”.

Sufragamos, sem reservas, o entendimento vertido no acórdão recorrido.

Acrescentaremos, apenas, o seguinte:

A deliberação de resolução e as clarificações e concretizações tomadas pelo BdP, a respeito do EE e do banco de transição - o Banco DD, SA - têm – como se viu - indiscutível suporte legal.

Além disso, como resulta do próprio teor das deliberações tomadas, o Banco de Portugal não visou atribuir direitos a quem não os tivesse, nem coartar direitos existentes, sendo, por outro lado, de salientar que o regime de garantia dos potenciais credores de uma instituição financeira assenta no respectivo capital social (cf. art. 14.º, n.º 1, al. d) e n.º 3, do RGICSF e art. 601.º do CC), como sucede em geral relativamente a qualquer sociedade anónima (cf. art. 14.º, n.º 1, al. b) do RGICSF).

Ora, uma vez que a decisão e revogação de autorização para o exercício da atividade equivale à declaração de insolvência definitiva da entidade bancária em apreço, cumprindo ao BdP requerer a sua liquidação nos tribunais competentes, é no processo de liquidação que se fará a execução do ativo restante, cujo produto será utilizado para satisfação do passivo que nele vier a ser verificado e graduado.

Nesta conformidade, face ao disposto no CIRE, aqui aplicável, devem os autores reclamar os seus créditos dentro dos prazos e no âmbito do processo de liquidação/insolvência pendente (cf. arts. 90º e 85º, do CIRE).[8]

Por outro lado, a propósito do direito de propriedade garantido pelo art.º 62º n.º 1 da CRP, há que ter presente, tal como é referido no Ac. do TC n.º 620/2004 de 20-10-2004, disponível in www.tribunalcosntitucional.pt, que mesmo admitindo, que da garantia constitucional da propriedade privada se extrai a garantia (constitucional também) do direito do credor à satisfação do seu crédito, isto não implica que essa garantia, em todo o seu alcance, se transforme num direito subjectivo fundamental do credor, como se fosse uma faculdade nuclear do direito de propriedade. De facto, apenas os meios ou instrumentos essenciais à tutela da garantia patrimonial do direito do credor integram a dimensão essencial do direito de crédito que pode ser objeto de tutela no artigo 62º da Constituição.

Acresce que:

A lei estabelece como princípio orientador da aplicação das medidas de resolução que nenhum credor da instituição de crédito objeto de resolução pode suportar um prejuízo superior ao que suportaria caso essa instituição tivesse entrado em liquidação (art.145.º-D-1, al. c), do RGICSF), competindo ao Fundo de Resolução suportar a diferença se se concluir que o credor teve um prejuízo com a resolução superior ao que teria tido se o Banco FF, S.A. tivesse entrado em liquidação (art.145.º-H-16, do RGICSF).

Em suma: o regime jurídico da resolução bancária concilia os interesses e os valores constitucionais em presença, pois que:[9]

a) Promove a preservação da função bancária da instituição de crédito alvo de resolução, assegurando a continuidade da prestação dos serviços financeiros essenciais para a economia (cf. artigo 145.º-C-1, al. a) do RGICSF e art.101.º da CRP);

b) Previne a ocorrência de consequências graves para a estabilidade financeira, nomeadamente o contágio entre entidades do sistema financeiro (cf. art. 145.º- C-1, al. b) do RGICSF e art. 101.º da CRP);

c) Salvaguarda os interesses dos contribuintes e do erário público, minimizando o recurso a apoio público extraordinário (cf. art. 145.º- C-1, al. c), do RGICSF);

d) Protege os depositantes (cf. arts. 145.º-C-1,al.d) e 145.º-D-1, al. d) do RGICSF e art. 101.º da CRP);

c) Não agrava a posição jurídica dos credores da instituição de crédito objeto de resolução, na medida em que não podem suportar um prejuízo superior ao que suportariam caso essa instituição entrasse em liquidação (cf. art.145.º-D/1/alínea c) do RGICSF), não havendo, assim, nem violação da garantia consagrada no art. 62.º/2 da CRP, nem tão-pouco do princípio da igualdade entre credores (art.13.º, nº1, da CRP).


É, portanto, inequívoco que não foi violado qualquer preceito ou princípio constitucional, mormente os invocados pelos recorrentes.



***



12. A questão da competência dos tribunais comuns


Os recorrentes invocam que as suprarreferidas deliberações do Banco de Portugal são nulas, nulidade que deve ser conhecida nesta ação, por caber na competência dos tribunais comuns.

Já vimos que não é assim.

Todavia, ainda que assim não fosse, sendo as medidas de resolução atos administrativos, quaisquer questões sobre a legalidade das correspondentes deliberações do Banco de Portugal apenas poderiam ser invocadas em processo de impugnação contenciosa da competência exclusiva dos tribunais administrativos (cf. arts. 145º-AR, nº1, do RGICSF e arts. 9º e 15º, do DL nº 199/06), tal como já foi afirmado nos acs. do STJ de 30.3.2017 (Salazar Casanova) e de 2.11.2017 (Abrantes Geraldes), proferidos nos processos 725/14.3TBLSD-A.P1.S1 e 11674/16.0T8LSB.S1, respectivamente, ambos disponíveis em www.dgsi.pt.



***



IV – Decisão


13. Nestes termos, negando provimento à revista, acorda-se em confirmar o acórdão recorrido.

Custas pelos recorrentes.


Lisboa, 22.03.2018


Maria do Rosário Correia de Oliveira Morgado (Relatora)

José Sousa Lameira

Hélder Almeida

________


[1] Hoje contido no artigo 145°-D, n° 1, do RGICSF
[2] Que tem redação igual à do artigo 133°, n° 2, alínea b), do anterior CPA.
[3] Aprovado pelo decreto-lei nº 486/1999, de 13 de novembro, na redação dada pelo decreto-lei nº 18/2013, de 06 de fevereiro, vigente à data da subscrição de papel comercial ESI. Código, doravante, denominado “CdVM”.
[4] Menezes Leitão, Informação Bancária e Responsabilidade, Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. Inocêncio Galvão Telles, Volume II, Direito Bancário, Almedina, pág. 230.
[5] Pedro Lobo Xavier, Das Medidas de Resolução das Instituições de Crédito, in Revista de Concorrência e Regulação, ano V, 18, abril – junho 2014, pág. 178.
[6]Sobre o Mecanismo Único de Supervisão (MUS), veja-se, https://www.bankingsupervision.europa.eu/ecb/pub/pdf/ssmguidebankingsupervision201409pt.pdf
[7] Acessível em https:// www.bportugal.pt/ptOBancoeoEurosistema/ComunicadoseNotasdelnformacao/Documents/Deliberacao20151229d.pdf
[8] Cf, a este respeito, o ac. do STJ de 2.11.2017, proc. 11674/16.0T8LSB.S1 (Abrantes Geraldes).
[9] Como em síntese se afirma no ac. da Rel. Lisboa de 11.5.2017, disponível in www.dgsi.pt.