Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1222/06.6TYLSB.L1.S1
Nº Convencional: 7ª SECÇÃO
Relator: SILVA GONÇALVES
Descritores: MARCAS
PRINCÍPIO DA NOVIDADE
CONFUSÃO
Nº do Documento: SJ
Data do Acordão: 01/29/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL - MARCAS.
Doutrina:
- F. Nóvoa, Fundamentos de Derecho de Marcas, p. 241.
- Ferrer Correia, Lições de Direito Comercial, 1965, I Volume, pp. 332 e 341.
- Ferrer Correia, Lições, Vol. I, p. 300.
- Luís M. Couto Gonçalves, Função Distintiva da Marca, pp. 30, 115, 140.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL (CPI): - ARTIGOS 167.º, N.º 1, 193.º, N.º1, 312.º, N.º1, AL. A).
DECRETO-LEI N.º 42/89, DE 03-02: - ARTIGO 65.º E SEGS..
DECRETO-LEI N.º 166/86, DE 26-06.
DECRETO-LEI N.º 173/2009, DE 3-08: - ARTIGO 2.º, N.º4.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 15/05/2013, WWW.DGSI.PT .
Sumário :
I - Sendo a marca um sinal distintivo de mercadorias, produtos ou serviços, na sua designação ter-se-á que ter em conta que, no entendimento dos princípios da novidade e/ou da especialidade que a há-de nortear, a sua composição não pode confundir-se com outra anteriormente adoptada para o mesmo produto ou semelhante.

II - Comparando os termos “Porto” e “Adega Dois Portos” dizemos que estas expressões não são passíveis de confusão pelo homem comum, atendendo ao elemento preponderante no conjunto “Adega Dois Portos”- aquele que mais facilmente o vulgar cidadão conserva na sua mente (“Dois Portos”) é a freguesia onde a recorrida tem a sua sede. 

Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça



“Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto IP” veio interpor recurso do despacho do Senhor Director do Serviço de Marcas do “Instituto Nacional da Propriedade Industrial” que concedeu proteção ao registo da marca n.º 376.561 “ADEGA DOIS PORTOS”, pedindo que seja revogado o despacho recorrido e recusado o mencionado registo.

Fundamentou a sua pretensão, em síntese, no facto de a marca em referência violar a denominação de origem “PORTO”, denominação de origem de grande prestígio, contribuindo para sua banalização e diluição, permitindo ainda a prática de atos de concorrência desleal.

Foi apresentada contestação, dizendo a recorrida, em síntese, que se verifica a excepção dilatória de caso julgado, tendo em atenção uma acção judicial que anteriormente correu os seus termos no Tribunal Judicial de Torres Vedras.

Acrescentou que não se verifica a identidade ou afinidade entre os produtos; que as marcas não são confundíveis; inexiste perigo de diluição ou a prática de actos de concorrência desleal.

A recorrente veio responder à matéria da excepção, pugnando pela sua não verificação, dizendo, em síntese, que não se verifica identidade do pedido e da causa de pedir.

Foi proferida sentença que negou provimento ao recurso apresentado por Instituto dos Vinhos do Douro e Porto IP e, consequentemente, manteve o despacho do Sr. Diretor do Serviço de Marcas do Instituto Nacional da Propriedade Industrial que concedeu proteção à marca “Adega Dois Portos” pedida por “Adega Cooperativa de Dois Portos, CRL” para assinalar na classe 33ª “Vinhos”.


Inconformado, recorreu o autor “Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto IP” para a Relação de Lisboa que, por acórdão de 29.05.2014 (cfr. fls. 301 a 308), julgou improcedente a apelação e confirmou a sentença recorrida.

Irresignada, recorre agora para este Supremo Tribunal o autor “Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto IP” que alegou e concluiu pela forma seguinte:

A - A marca "ADEGA DOIS PORTOS" inclui na íntegra a palavra "PORTO", que constitui uma denominação de origem registada no INPI, na OMPI, na Comissão Europeia e legalmente reconhecida como uma D.O., desde 1907.

B - Resultando do DL 166/86, de 26 de Junho (actualmente do DL 173/2009, de 3 de Agosto) e do art. 312.º do CPI que a utilização da palavra "PORTO" está reservada, exclusivamente, aos vinhos com direito a esta Denominação de Origem, é imperativo proibir o uso da mesma relativamente a vinhos oriundos de outras regiões.

C - Esse direito privativo impõe a recusa do registo de marcas com essa palavra (quando destinadas a vinhos sem direito à DO), independentemente de haver qualquer risco de confusão do consumidor.

D - Havendo uma completa afinidade entre os produtos que os sinais distintivos em confronto se destinam a assinalar (vinhos) - e dado que a marca registando reproduz a palavra "PORTO" - é evidente a invalidade do registo da marca da Recorrida.

E - O facto da recorrida ter sede na freguesia de "Dois Portos" e incluir essas palavras na sua denominação social, não lhe dá o direito de incluir a DO "Porto" na marca com que assinala os seus vinhos.

F - A tese contrária levaria a aceitar que uma pessoa com o apelido "Porto" terá o direito de assinalar com essa palavra qualquer zurrapa que queira lançar no mercado!

G - A existência de localidades com nomes coincidentes com denominações de origem famosas nunca poderá legitimar um uso concorrente, como resulta claro do disposto no artigo 22.º/4 do Acordo TRIPS, que permite impedir o uso de uma indicação geográfica que, embora literalmente verdadeira quanto ao território, região ou localidade de que os produtos são originários, transmita erradamente ao público a impressão de que os produtos são originários de outro território.

H - É incompreensível como - num Estado de Direito - as instâncias puderam ignorar estas normas imperativas, que consagram um direito exclusivo (privativo), que deve ser respeitado pelo INPI e pelos tribunais, independentemente da prova do risco de confusão ou de qualquer outro risco.

l - De qualquer modo, atenta a afinidade dos produtos e a notoriedade desta Denominação de Origem, a inclusão da palavra "PORTO" na marca de vinhos da Recorrida é passível de gerar fácil confusão do consumidor, pelo que também existia um motivo absoluto de recusa do registo desta marca [art. 238.º/4/d) do CPI].

J - Mas, ainda que não houvesse qualquer risco de confusão, o uso de uma marca que reproduz a DO "Porto" afecta negativamente a eficácia distintiva deste sinal, pois contribui para a respectiva banalização e diluição - diminuindo a sua individualidade e a sua "força atractiva" -, o que sempre justificaria a recusa da marca, por força do n.º 4 do art. 312.º do CPI, tendo em conta o grande prestígio desta denominação.

K - Acresce que o registo da marca em causa pode vir a constituir um instrumento que possibilite - de forma objectiva e independentemente de intenção - a prática de concorrência desleal (art. 317.º/a), c) e e) do CPI), pois seria fácil, para a titular da marca ou qualquer revendedor dos seus produtos, aproveitar o uso da palavra "Porto" para criar confusão no espírito dos consumidores.

A douta decisão recorrida violou pois o disposto nos artigos 238.º/4/d), 239.º/1/c) e e), 312.º/1 a 4 e 317.º, alíneas a), c) e e), todos do CPI de 2003 [na redacção em vigor à data do despacho de concessão] e nos artigo 5.º, n.º s l a 4 do DL 212/2004, de 23 de Agosto, no artigo 22.º, n.º 4 do Acordo TRIPS, no art.º 52.º/1 do Regulamento (CE) n° 1493/1999 do Conselho de 17 de Maio de 1999 (em vigor à data do despacho do INPI - actualmente dos arts. 118.º-M e 118.º/2/a) do Regulamento (CE) n.º 491/2009 do Conselho de 25 de Maio de 2009]).

Termina pedindo que seja revogado o acórdão recorrido e, em consequência, que seja determinada a recusa do registo da marca n.º 376.561, ordenando-se ao INPI o respetivo cancelamento.


Contra-alegou a recorrida ”Adega Cooperativa de Dois Portos, C.R.L pedindo a manutenção do julgado.

Corridos os vistos legais, cumpre decidir.


As instâncias consideraram provados os factos seguintes:

1. Por despacho datado de 18.07.2006 o Sr. Diretor do Serviço de Marcas do Instituto Nacional de Propriedade Industrial concedeu o registo da marca nacional n.º 376.561 “ADEGA DOIS PORTOS” pedida em 11.11.2003 por “Adega Cooperativa de Dois Portos CRL”, com sede em Av.ª …, …, Dois Portos, 2565-506 Torres Vedras.

2. A mencionada marca é constituída nos termos constantes de fls. 146 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

3. A mencionada palavra destina-se a assinalar, na classe 33.ª “Vinhos”.

4. A recorrente é titular da denominação de origem “Porto”, inscrita no NPI sob o n.º 4, destinada a “produtos vinícolas definidos pelo art.º 1º do Decreto-Lei 7 934 de 10 de Dezembro de 1921”.

5. A recorrente é titular do registo da mesma denominação de origem na OMPI, ao abrigo do acordo de Lisboa de 31.10.1958, sob o n.º 682 para o produto “Vin généreux (vin de liqueur).

6. A recorrente é titular da marca mista, colectiva de certificação n.º 316.439 “Rota do Vinho do Porto”, destinada a assinalar, nomeadamente “serviços de hotelaria e similares e organização de viagens e excursões turísticas”.

7. A mencionada marca foi pedida em 09.04.96 e concedida em 18.12.1996.

8. A referida marca é constituída, na parte superior, pelos elementos figurativos do desenho de um copo de vinho, com o desenho da sua parte superior direita incompleto e o prolongamento do mesmo em espirais cruzadas e a menção por baixo da figura das palavras “ROTA do VINHO DO PORTO”.

9 – A recorrida é titular do logótipo n.º 6290, “Adega Cooperativa de Dois Portos CRL”, pedido em 22.06.2004 e concedido em 20.12.2005.

10. O referido logótipo é constituído nos termos constantes de fls. 140.

11 - A recorrida é titular do nome de domínio <acdoisportos.com>.

12 - A recorrida é titular do site “www-acdoisportos.com”.

13 - Em todos os vinhos que produz e comercializa a recorrida utiliza a firma “Adega Cooperativa Dois Portos CRL” e o sinal “Adega Dois Portos”.

14 - Assim fazendo no que respeita às marcas “Maria Afonso”, “Robusto”, “Tamuge” e “Monte Judeu”.



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A “Adega Cooperativa de Dois Portos CRL” (recorrida) obteve do Instituto Nacional de Propriedade Industrial, em seu favor, o registo da marca nacional n.º 376.561 “Adega Dois Portos” e titular do logótipo n.º 6290, “Adega Cooperativa de Dois Portos CRL”.

Por sua vez o recorrente “Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto IP” é o titular da denominação de origem “Porto”, inscrita no NPI sob o n.º 4, destinada a “produtos vinícolas definidos pelo art.º 1º do Decreto-Lei 7 934 de 10 de Dezembro de 1921” e, também, também protegido pela marca mista, colectiva de certificação n.º 316.439 “Rota do Vinho do Porto”, destinada a assinalar, nomeadamente “serviços de hotelaria e similares e organização de viagens e excursões turísticas”.

Arguindo que a inclusão da palavra "Porto" na marca “Adega Dois Portos” de vinhos da “Cooperativa de Dois Portos CRL” (recorrida) é suscetível de produzir uma fácil confusão do consumidor, o que nós havemos de ajuizar é se estas duas assinaladas marcas, por estarem em causa produtos semelhantes ou afins, naturalmente se confundem aos olhos do vulgar consumidor.


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I. A marca é também um sinal distintivo do comércio que se propõe particularizar essencialmente produtos ou mercadorias e também serviços, permitindo que, através delas, possam distinguir-se as múltiplas e variadas espécies destes bens.

A marca serve para distinguir produtos ou serviços e a abordagem da função distintiva é válida para produtos ou serviços. As marcas de produtos e serviços são tipos de um mesmo conceito de marca (Luís M. Couto Gonçalves; Função Distintiva da Marca; pág. 30) e, seja qual for a sua composição, a marca traduz-se sempre num nome ou sinal que o empresário apõe nas mercadorias; há-de ela ser dotada, para o bom desempenho da sua função, de eficácia ou capacidade distintiva, isto é, há-de ser apropriada para diferençar o produto marcado de outros idênticos ou semelhantes (Prof. Ferrer Correia; Lições de Direito Comercial; 1965; I Volume; pág. 332 e 341).

Sendo a marca um sinal distintivo de mercadorias, produtos ou serviços, na sua designação ter-se-á que ter em conta que, no entendimento dos princípios da novidade e/ou da especialidade que a há-de nortear, a sua composição não pode confundir-se com outra anteriormente adoptada para o mesmo produto ou semelhante.

É que a marca, atento o embate causado pelo significativo e gradual favorecimento legal da protecção publicitária, não é só um sinal distintivo do produto ou serviço, mas é um sinal com uma especial força de venda (selling power); a marca é uma verdadeira qualidade do produto, a ponto de poder ser mais valiosa que o próprio bem que distingue (Luís M. Couto Gonçalves; ob. citada; pág. 115).

Assinale-se que a marca só goza de protecção após a efectivação do seu registo (art.º 167.º, n.º 1, do CPI), isto é, o registo da marca é constitutivo deste direito, consubstanciado no poder que tem o seu titular de impedir que terceiros, sem o seu consentimento, usem na sua actividade económica qualquer sinal idêntico ou confundível com essa marca, para produtos idênticos ou afins àqueles para os quais aquela foi registada, ou que, em consequência da identidade ou semelhança entre os sinais ou da afinidade dos produtos ou serviços, crie no espírito do consumidor um risco de confusão que compreenda o risco de associação entre o sinal e a marca.

II. E quais são os expedientes que a lei põe ao dispor do titular da marca registada para se opor e impedir que outro comerciante use na sua actividade económica qualquer sinal idêntico ou com ela confundível?

- Um deles, de carácter administrativo, é o recurso hierárquico para o director-geral dos Registos e do Notariado do despacho final que admitiu ou indeferiu determinada firma ou denominação social ou que considere haver ou não obstáculo legal ao registo de nome de estabelecimento ou declare a perda do direito à exclusividade, desta decisão cabendo recurso contencioso para o tribunal do domicílio ou da sede do recorrente, conforme vem regulado no artigo 65.º e segs. do Dec. Lei n.º 42/89, de 03/02.

- Outro meio de poder atacar o registo de uma marca em violação do princípio da novidade (ou exclusividade) é o seu titular socorrer-se da acção judicial, propondo directamente nos tribunais a acção comum a pedir a condenação na alteração da denominação social susceptível de confusão com outra, propriedade da autora; e a utilização de um ou outro modo de agir fica na disponibilidade do interessado, não impondo a lei que se opte por um deles em prejuízo do outro e regulando os casos em que há lugar a um deles e as situações em que tem de observar-se comando diferente (ubi lex non distinguit nec nos distinguire debemus).

III. A eficácia distintiva da marca consubstancia-se no princípio da novidade (ou exclusividade) consagrado na al. m) do n.º 1 do art.º 189.º do CPI, obstando ao seu registo o facto de esta ser reprodução ou imitação total ou parcial de marca anteriormente registada.

O critério a que temos de recorrer para, em cada caso concreto ficarmos a saber se há ou não violação do princípio da novidade, terá de passar pela apreciação da susceptibilidade de erro ou confusão das expressões em confronto e que os elementos gráfico, sonoro, silábico, isolada ou postos em conjunto, podem sugerir.

As marcas serão distintas se, pondo em confronto a sua descrição linguística, elas filologicamente se diferenciam, isto é, comparando-as, não apresentam similitudes capazes de compelir os seus interessados observadores a atribuírem-lhe o mesmo reconhecimento textual; e no exame que neste contexto tenhamos de fazer sempre haveremos de considerar que, neste cotejo a perfazer, se deve dar realce ao elemento preponderante posto no conjunto da sua descrição, porquanto é esta a apreensão que o usual consumidor mais espontaneamente apreende.

Nesta apreciação, repetimos, ter-se-á que atender ao tipo de pessoas que possam por este sinal serem afectadas, ou seja, o médio cliente e já não a pessoa dotada de especiais qualidades para avaliar a qualidade do produto que a marca visa acolher.

O melhor critério para dar execução na prática, a este princípio, é o de "verificar, com referência à diligência normal do homem médio, se uma firma pode ser confundida com outra, se uma pessoa que tenha em mente o nome de uma firma e pretenda dirigir-se a esta, poderá ser induzida em erro pela semelhança do nome e dirigir-se, portanto, a outra firma. A possibilidade de confusão deve subsistir de modo objectivo: a circunstância de uma confusão ter tido lugar pelo descuido ou ligeireza de qualquer cliente, não é suficiente quando as firmas se apresentam diferenciadas aos olhos de uma pessoa de diligência média (Ferrer Correia; Lições; Vol. I; pág. 300); e uma marca mista não é novidade só pela circunstância de o seu ponto essencial se não distinguir de marca anteriormente registada.

Na imitação de que ora falamos sobressai mais a conformidade descritiva que advém do conjunto de elementos de uma especificada marca do que da diversidade de certos pormenores nela detetados - embora integrem uma marca registada, os termos de uso corrente, sem efectivo valor distintivo, não podem ser objecto de apropriação exclusiva, sendo autorizada a sua utilização na composição de outras marcas, ainda que para designação de produtos similares (Ac. STJ de 15/05.2013; www.dgsi.pt).

Só no caso de não ser possível encontrar o elemento dominante é que se deverá alargar o espectro da marca mista, resguardando-a tanto no confronto com a marca mista semelhante, como no caso de confronto com marca nominativa ou marca gráfica confundível (Luís M. Couto Gonçalves; ob. citada; pág. 140, seguindo de perto os critérios defendidos por F. Nóvoa in Fundamentos de Derecho de Marcas; pág. 241).

IV. Analisemos agora se a inscrição de "Adega Dois Portos" corre o risco de confusão com a marca da recorrente “Porto”.

À expressão "Porto", se a conectarmos ao círculo do consumo de vinhos generosos, anda ligada a ideia de que “Porto” é a denominação da marca que, por excelência, melhor sedimenta a qualidade do vinho generoso do Douro, uma DO (denominação de origem) registada no INPI, na OMPI, na Comissão Europeia, a esta palavra se equiparando também as frases “Vinho do Porto”, “Rota do Vinho do Porto” e outras redigidas em língua estrangeira, tais como “Vin de Porto”, “Port Wine” e Port”, igualmente protegidas como denominações de origem e, desta feita, proibida a sua utilização noutros produtos vínicos, segundo a regra predisposta no Dec. Lei n.º 166/86, de 26/06.



A imitação (usurpação) de uma marca registada por outra verifica-se quando, tendo prioridade a marca registada, a nova marca, em confronto com a primeira, tem tal semelhança gráfica, figurativa ou fonética com a já inscrita, que destes pormenorizados sinais resultam instintiva indução em erro ou confusão no consumidor, ou que compreende um risco de associação com marca anteriormente registada, de forma que o consumidor não possa distinguir as duas marcas senão depois de exame atento ou confronto, sejam ambas destinadas a assinalar produtos ou serviços idênticos ou de afinidade manifesta (artigo 193.º n.º 1, do CPI).

Comparando os termos "Porto" (o vinho do Porto é um vinho natural e fortificado, produzido exclusivamente a partir de uvas tintas provenientes da Região Demarcada do Douro, no Norte de Portugal a cerca de 100 km a leste da cidade do Porto, cujo titular do registo de tal denominação é o recorrente “Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto IP” e nos termos conferidos a fls. 22) e “Adega Dois Portos” (inclui vinhos tintos, brancos, rosés e licores, marca nominativa registada no Serviço de Marcas do Instituto Nacional de Propriedade, destinada a assinalar produtos da classe 33.ª “vinhos”), dizemos que estas expressões não são passíveis de confusão pelo homem comum, atendendo ao elemento preponderante no conjunto – Adega Dois Portos”- aquele que mais facilmente o vulgar cidadão conserva na sua mente ("Dois Portos" é a freguesia onde a recorrida tem a sua sede).

Quer isto dizer que, porque se não configura risco de se confundirem estas duas locuções, nem do ponto de vista gráfico nem da análise referente ao seu aspecto fonético, as duas marcas podem coexistir sem que haja violação da lei protectora desta prerrogativa: o normal consumidor, sentado na mesa do seu escolhido restaurante ou posto perante a regalia de poder desfrutar de uma mais distinta bebida ao caso apropriada, sendo-lhe apresentada a lista de vinhos destinados a acompanhar a sua projetada refeição e/ou se isso lhe for enunciado verbalmente pelo seu prestativo servidor, logo se aperceberá que um “Porto” se diferenciará do vinho regional identificado por “Adega Dois Portos” e imediatamente dará conta de que, evidentemente, estas duas marcas de vinhos se não assimilam na sua essência formal e qualitativa e, por isso, logo escolherá, distinguindo-os, o que na oportunidade lhe convirá.


V. Argui o recorrente “Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto IP” no sentido de que, ex vi Dec. Lei n.º 173/2009, de 3/08 e do art.º 312.º do CPI, a utilização da palavra "Porto" está reservada, exclusivamente, aos vinhos com direito a esta Denominação de Origem, independentemente de haver qualquer risco de confusão do consumidor.

A falta de rigor desta afirmação assim protagonizada é manifestamente infundada.

Na verdade, o que resulta do estatuído no n.º 4 do art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 173/2009, de 3 de Agosto (Douro) é que “é proibida a utilização, por qualquer meio, de nomes, marcas, termos, expressões ou símbolos, ou qualquer indicação ou sugestão falsa ou falaciosa, que sejam susceptíveis de confundir o consumidor quanto à proveniência, natureza ou qualidades essenciais dos produtos, bem como de qualquer sinal que constitua reprodução, imitação ou evocação das DO ou IG da RDD; e o que se depreende do que está descrito no art.º 312.º do CPI é que a tutela dos direitos conferidos ao registo se circunscreve às denominações de origem, exatamente nos termos em que tais designações estão assim registadas - o registo das denominações de origem ou das indicações geográficas confere o direito de impedir a utilização, por terceiros, na designação ou na apresentação de um produto, de qualquer meio que indique, ou sugira, que o produto em questão é originário de uma região geográfica diferente do verdadeiro lugar de origem (n.º 1, alínea a).

O entendimento proclamado pela Relação no seu acórdão não nos merece o repúdio que o recorrente infundadamente lhe aponta.

Concluindo:

1. Sendo a marca um sinal distintivo de mercadorias, produtos ou serviços, na sua designação ter-se-á que ter em conta que, no entendimento dos princípios da novidade e/ou da especialidade que a há-de nortear, a sua composição não pode confundir-se com outra anteriormente adoptada para o mesmo produto ou semelhante.

2. Comparando os termos "Porto" e “Adega Dois Portos” dizemos que estas expressões não são passíveis de confusão pelo homem comum, atendendo ao elemento preponderante no conjunto – Adega Dois Portos”- aquele que mais facilmente o vulgar cidadão conserva na sua mente ("Dois Portos" é a freguesia onde a recorrida tem a sua sede).


Pelo exposto, nega-se a revista e confirma-se o acórdão recorrido.


Custas pelo recorrente.


Supremo Tribunal de Justiça, 29 de janeiro de 2015.


Silva Gonçalves (Relator)


Fernanda Isabel Pereira


Pires da Rosa