Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
2381/19.3T8CBR.C1.S1
Nº Convencional: 7.ª SECÇÃO
Relator: TIBÉRIO NUNES DA SILVA
Descritores: AUTORIDADE DO CASO JULGADO
TRANSAÇÃO JUDICIAL
DESISTÊNCIA DO PEDIDO
SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA
CASO JULGADO MATERIAL
INTERPRETAÇÃO DA SENTENÇA
INTERPRETAÇÃO DA VONTADE
OFENSA DO CASO JULGADO
EXTENSÃO DO CASO JULGADO
PENHORA
AÇÃO EXECUTIVA
ERRO NA DECLARAÇÃO
QUESTÃO NOVA
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
RECURSO DE REVISTA
NULIDADE DE ACÓRDÃO
EXCESSO DE PRONÚNCIA
LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
Data do Acordão: 06/02/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO
Sumário :
I. A questão da alegada ofensa do caso julgado configura uma das situações em que, nos termos do art. 629.º, n.º 2, al. a), do CPC, o recurso é sempre admissível, independentemente do valor da causa e da sucumbência, centrado na apreciação dessa questão e das nulidades do acórdão recorrido que com ela se conexionem.

II. Uma decisão «constitui caso julgado nos precisos termos em que julga» (art. 621º do CPC). Daí que não seja de concluir pela existência de caso julgado, relativamente à obrigatoriedade (ou não) da devolução de quantias penhoradas numa acção executiva,  se o despacho proferido considerou que o meio indicado para dirimir o litígio entre as partes seria um acção declarativa.

III. Uma sentença homologatória de uma transacção, condenando ou absolvendo as partes nos termos acordados, é susceptível de constituir caso julgado material.

Sendo interposto um recurso com invocação da ofensa do caso julgado relativamente a uma tal sentença, não pode o Tribunal da Relação deixar de interpretar, à luz do disposto nos arts. 236º e 238º do C. Civil, os termos da transacção homologada, de modo a aferir da procedência de um pedido assente nos efeitos dessa transacção.

IV. No que tange à autoridade do caso julgado (vertente positiva, baseada numa relação de prejudicialidade entre o objecto da segunda acção e o objecto da primeira, surgindo esta como pressuposto daquela), não é exigível a tríplice identidade prevista no art. 581º do CPC, diversamente do que sucede com a excepção (vertente negativa do caso julgado).

V. Prevendo o art. 291º do CPC meios (acção ou recurso de revisão) para obter a declaração de nulidade ou anulação de uma transacção, não podem eles ser substituídos por uma mera alegação, ex novo, no âmbito de um recurso de revista, invocando a existência de erro enquadrável no art. 247º do C. Civil.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:




I


AA, com os sinais dos autos, veio intentar acção declarativa de condenação, com processo comum, contra BB, também com os sinais dos autos, alegando, em resumo, que:

A A. e o R. foram casados e o seu casamento dissolvido em 24 de Novembro de 2009, através de sentença que decretou o divórcio por mútuo consentimento.

O R. veio a intentar uma acção executiva contra a ora A., a 04/12/2014, invocando a falta de pagamento de tornas por esta, a que ficara obrigada em processo de inventário.

A A., por sua vez, intentou acção executiva de alimentos contra o R., decorrente do não pagamento por este da pensão alimentícia, em que fora condenado, a favor de um filho menor.

Sucede que foram, no âmbito da execução movida pelo ora R., penhorados montantes pertencentes à A..

O R. intentou, ainda, a 04/11/2016, contra a A., uma acção pauliana, na qual as partes chegaram a acordo, pondo fim aos processos que entre elas pendiam.

Nos termos da transacção realizada e homologada, o ora R. desistiu da execução que tinha a correr contra a ora A., e, em consequência disso, deveria ter procedido à restituição das quantias penhoradas no âmbito daquele processo executivo, mas essa restituição nunca se verificou.

Termina pedindo que:

a) Seja o R. condenado a restituir-lhe a quantia penhorada, no montante de €1.811,43 (mil oitocentos e onze euros e quarenta e três cêntimos) no âmbito do Proc. Exec. 6348/..., que correu termos no Juízo de Execução ... – Juiz …, com que indevidamente se locupletou;

b) Seja o R. condenado a pagar-lhe juros de mora vencidos calculados à taxa legal em vigor, sobre o montante sobredito, que se contabilizavam, à data da petição, na quantia de € 121,49 (cento e vinte e um euros e quarenta e nove cêntimos);

c) Seja o R. ser condenado no pagamento dos juros de mora vincendos até integral pagamento.


Contestou o R., alegando, em síntese, que:

Desistiu de todas as penhoras efectuadas no processo que estivessem activas na data do acordo, visando o valor remanescente e não pago.

Na data da transacção, a penhora em causa nos autos já tinha sido definitivamente concretizada e sobre a mesma já tinha decorrido o prazo para eventual oposição, pelo que está, claramente, fora do âmbito da transacção.

Não constando da transacção a devolução das quantias penhoradas, não existe qualquer fundamento para o peticionado, devendo a acção improceder.


A A. requereu a condenação do R. como litigante de má fé, a que o R. se opôs.


Foi proferido saneador-sentença, absolvendo-se o R. do pedido, desatendendo-se o pedido de condenação por litigância da má fé.

Inconformada, a A. recorreu para o Tribunal da Relação de Coimbra, onde se prolatou acórdão que julgou o recurso procedente, condenando o R. no pagamento da quantia de €1.811,43.

O R. interpôs recurso de revista para este Supremo Tribunal, concluindo as suas alegações pela seguinte forma:

«I. Face à violação do instituto de caso julgado pelo douto Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, o presente Recurso de Revista fundamenta-se no previsto nos artigos 671.º, n.º 1 e 629, n.º 2, alínea a) do CPC.

II. A questão que se discute nos presentes autos já foi objeto de decisão judicial no âmbito do processo de Ação Executiva n.º 6348/14…..., com a prolação do despacho com a referência ...686 e datado de 14/11/2017 (que consta nos presentes autos como segundo documento n.º 5 do requerimento da Recorrida com a referência ...207, datado de 01/07/2019), tudo conforme já foi atempadamente alegado e demonstrado pelo Recorrente no requerimento com a referência ...897, datado de 15/09/2019, mais concretamente os seus artigos 5.º a 9.º.

III. Na Ação Executiva n.º 6348/14…... a Recorrida iniciou um incidente processual com a junção aos autos de um requerimento onde peticionou a restituição das quantias aí penhoradas (requerimento com a referência ...207, datado de 01/07/2019, nomeadamente o seu documento n.º 1), em tudo idêntico ao pedido nos presentes autos e onde a causa de pedir era, também, a transação homologada por sentença no processo n.º 8127/... que correu termo no Juízo Local Cível  ... – Juiz … (cfr. Documento anexo ao sobredito requerimento º 1).

IV. O Meritíssimo Juiz ao proferir a decisão na Ação Executiva n.º 6348/..., avaliou toda a argumentação e documentação, nos exatos termos do que sucede nos presentes autos, pois nestes a Recorrida não juntou qualquer prova ou fundamento divergente do que já anteriormente tinha feito, mormente, em momento algum alega ou demonstra que existe alguma razão extraprocessual para que esta questão seja litigiosa.

V. No sobredito incidente processual inserto na Ação Executiva n.º 6348/14…... as identidades dos sujeitos processuais, do pedido e da causa de pedir, eram exatamente as mesmas.

VI. Sendo certo que o referido despacho, que pôs termo ao incidente, não foi objeto de qualquer recurso jurisdicional, resulta claro que, por tal motivo, transitou em julgado e, em consequência, a situação jurídica solidificou-se na esfera jurídica de ambos os sujeitos processuais, Recorrente e Recorrido respetivamente, não sendo assim passível de qualquer outra sindicância judicial, nomeadamente a presente, sob pena de violação da exceção do caso julgado (e não autoridade de caso julgado) e com as consequências jurídicas previstas nos artigos 619.º e seguintes do CPC.

VII. Neste conspecto, o douto Acórdão do Tribunal a quo, ao proferir a decisão de que ora se recorre, violou frontalmente o previsto nos artigos 619.º, 621.º e 625.º, todos do CPC, na medida em que a questão que se discute nos presentes autos já foi objeto de decisão judicial no âmbito do processo de Ação Executiva n.º 6348/14……, com a prolação do despacho com a referência ...686 e datado de 14/11/2017.

VIII. Salvo melhor opinião em contrário, a autoridade de caso julgado determinada pelo douto Tribunal a quo, nos termos doutrinários e com os considerandos constantes neste Acórdão, não tem qualquer aplicabilidade ao caso sub judice.

IX. A primeira ação, a Ação Executiva instaurada pelo Recorrente contra a Recorrida (Processo n.º 6348/14…....), tinha por objeto a falta de pagamento de tornas e como quantia exequenda o montante de € 11.199,75; a segunda ação, os presentes autos, tem como pedido o valor de €1.932,92 e como causa de pedir a putativa obrigação de pagamento dos valores entretanto penhorados naquele outro processo, decorrente da transação judicial homologada por sentença no processo n.º 8127/16…... que correu termos no Juízo Local Cível  ....

X. O cerne da questão jurídica em debate nos presentes autos ancora-se, exclusivamente, na interpretação a dar àquela transação obtida no processo n.º 8127/16…., nomeadamente se a desistência do pedido e das penhoras, aí levada a cabo, abrangia também as penhoras anteriores e cujo valor já tinha sido entregue ao Recorrente, mais de um ano antes da transação.

XI. Não há qualquer identidade entre os referidos processos judiciais, para além das partes litigantes, que possa fundamentar qualquer existência de caso julgado.

XII. O douto Tribunal a quo, para concluir pela autoridade de caso julgado, fez uma interpretação das vontades declaradas pelos intervenientes processuais na transação sub judice, na esteira exclusiva da manifestação da vontade das partes nas suas declarações, reguladas pelo nosso Código Civil nos artigos 217.º e seguintes.

XIII. Esta decisão de interpretação de transação, levada a cabo pelo douto Tribunal a quo, excede os poderes jurisdicionais que lhe são concedidos, pois não pode, por tal não lhe ter sido colocado a julgamento e por as regras processuais recursivas não lhe permitirem, proferir quaisquer juízos de valor sobre as vontades e declarações das partes, nem sequer dirimir estas questões fáticas e que dependem de prova.

XIV. Assim, a decisão de existência de autoridade de caso julgado partiu de um pressuposto erróneo e cuja determinação não poderia ter sido levada a cabo, ad hoc, pelo douto Tribunal a quo.

XV. Rebatendo as conclusões exaradas no douto Acórdão de que ora se recorre, sempre se dirá que o Recorrente/Exequente, por mero efeito do pagamento parcelar efetuado mais de um ano antes desta desistência na Ação Executiva n.º 6348/14.... pela Recorrida/Executada, desistiu do pedido à data da transação, isto é, do valor da quantia exequenda nesta última data.

XVI. O pedido numa ação executiva é a quantia exequenda que vai sendo sempre atualizada diariamente em virtude do vencimento de juros, quanto mais não seja dos compulsórios, pelo que não é estanque.

XVII. Assim sendo, o pagamento, sendo uma modalidade de extinção das obrigações, implica também, necessariamente, a alteração do pedido originário que consta em qualquer requerimento executivo.

XVIII. O douto acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, com o n.º 10424/2006-2, de 08/02/2007 3, no seu texto integral, refere que:

IV – 2 - Por requerimento que deu entrada em juízo em 28-10-2004 o executado veio deduzir oposição à penhora de saldo de conta bancária posteriormente determinada e concretizada, atenta a extensão da mesma, referindo ter-se obrigado a proceder ao pagamento da quantia de € 3.990,00, estar em dívida a quantia de € 1.745,66 e ter-lhe sido penhorada a quantia de € 3.500; na sequência, a exequente manifestou posição diversa, requerendo aliás que se procedesse a outras penhoras.

Se desde logo fosse clarificada a situação dos autos com efectiva decisão da questão levantada estes não teriam prosseguido na indefinição que levou a secretaria a informar ter dúvidas em calcular a quantia exequenda – não tendo, também, obtido qualquer decisão ou esclarecimento, antes tendo sido determinada a remessa dos autos à conta (com as dúvidas que existissem).

Daí a situação um pouco estranha da reclamação da conta com os mesmos argumentos da oposição à penhora – esta, então, ainda não decidida.

Vejamos.

O valor exequendo é, nos termos acima aludidos, de € 3.990,00; o executado afirma ter pago 9 prestações de € 249,38 ficando em dívida 7 prestações no valor global de € 1.745,66. A exequente não contesta que o executado lhe pagou o valor correspondente a 9 prestações (ou seja € 2.244,42 = € 249,38 x 9), tendo, aliás, adiantado a fls. 84 que liquidara a quantia de € 2.250

Assim, encontra-se em dívida à exequente € 1.745,58 (€ 3.990,00 - € 2.244,42).

XIX. Em suma, resulta claro e evidente que o pedido, à data da transação e por mero efeito do pagamento efetuado mais de um ano antes, se reduziu no seu exato montante, porquanto a dívida ao ali Exequente e aqui Recorrente era do valor peticionado originalmente, menos o valor já pago, tendo sido deste valor, apurado por simples cálculo aritmético e nos concretos termos expostos, que o Recorrente desistiu e não do pedido original, que, naquela data, reitera-se, já não existia!

XX. De acordo com a relação material controvertida entre as partes e que é objeto dos presentes autos, existe uma divergência de interpretação da transação, que é manifesta pelo teor de todas as peças processuais que constam dos presentes autos.

XXI. O aqui Recorrente desistiu de todas as penhoras efetuadas no processo que, como é óbvio, estivessem ativas na data do acordo, tendo sido claramente esta a intenção das partes na sua celebração.

XXII. Em consequência, não pode, salvo o devido respeito, vir o Tribunal a quo determinar que o acordo das partes obrigava à entrega dos valores já penhorados, porque nunca foi esta a sua intenção.

XXIII. A proceder o entendimento do douto Tribunal a quo, o que não se aceita, mas se acautela por dever de patrocínio, então fica claro que existiu, pelo Recorrente, um erro na declaração, pois a vontade declarada não correspondeu à vontade real, o que torna a transação nula nos  termos e para os efeitos do artigo 247.º e 286.º do Código Civil, conforme resulta da interpretação do Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, processo n.º 67/14.4T8OHPA.C1, de 16/02/2017 4:

I – O erro na declaração, ou erro obstáculo, existe quando, não intencionalmente - v.g., por inadvertência, engano ou equívoco -, a vontade declarada não corresponde a uma vontade real do autor, existente, mas de sentido diverso.

II - Existe erro obstáculo sobre a identidade da coisa que constitui objecto da declaração - error in corpore -, “quando a indicação ou a descrição que dela se faz, leve a identificar uma coisa diferente da que o declarante pretende”.

III - Contudo, a relevância do erro obstáculo, para que o negócio seja anulável, carece:

- Que para o declarante seja essencial o elemento sobre o qual incidiu o erro, de tal forma que, se deste se tivesse apercebido, não teria celebrado o negócio;

- Que o declaratário conheça ou não deva ignorar a essencialidade do elemento sobre o qual incidiu o erro para o declarante.

IV - O vício da vontade negocial que se traduza ou envolva uma deficiência de discernimento do seu autor constitui erro que corresponde à ignorância ou falsa representação de uma realidade (a ignorância do que se ignora).

XXIV. Pelo exposto, o douto Acórdão de que ora se recorre também é nulo por violação dos artigos 615.º, n.º 2, alínea b), in fine, ex vi artigo 674.º, n.º 1, alínea c), todos do CPC, porquanto, ao decidir pela existência de autoridade de caso julgado, fez uma interpretação das vontades e declarações expostas na transação em causa nos presentes autos, o que vai para além dos seus poderes de decisão,

Termos em que deverá o presente Recurso de Revista ser julgado totalmente procedente, e em consequência, ser o douto Acórdão recorrido revogado, mantendo-se na íntegra a douta sentença proferida em 1.ª Instância, tudo com as legais consequências, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA.»


Contra-alegou a Recorrida, defendendo que o recurso é inadmissível e, de qualquer modo, que deve improceder. Além disso, pediu a condenação do Recorrente como litigante de má-fé, em multa nunca inferior a € 1.000,00 (mil euros).

O Recorrente respondeu, defendendo ser infundado este pedido, razão por que deve improceder.


*


Sendo o objecto dos recursos definido pelas conclusões de quem recorre, para além do que for de conhecimento oficioso, importará, in casu, após tratamento da questão prévia da inadmissibilidade do recurso (levantada pela Recorrida), verificar:

- se o problema da restituição dos valores penhorados foi alvo de decisão na acção executiva em que tal penhora teve lugar, ocorrendo uma situação de caso julgado;

- se não havia razões para o Tribunal a quo concluir pela autoridade do caso julgado, com as consequências daí resultantes, relativamente à transacção, homologada por sentença, a que os autos se referem, conhecendo, ademais, de matéria que lhe estava vedada, estando o acórdão ferido de nulidade;

- se há que abordar, neste recurso, a questão do erro na declaração que o Recorrente invocou;

- finalmente, se há razões para, como pretende a Recorrida, através de requerimento apresentado nas contra-alegações, condenar o Recorrente por litigância de má fé.



II


No acórdão recorrido, consideraram-se provados os seguintes factos:

«1. A autora contraiu casamento com o réu no dia ... de Janeiro de 1991;

2. Tal casamento foi dissolvido em ... de Novembro de 2009, através de sentença que decretou o divórcio por mútuo consentimento, no âmbito do Processo nº 639/09……, que correu termos no …Juízo do Tribunal de Família e Menores …...;

3. No dia ... .12.2014, o réu intentou acção executiva contra a ora autora, que correu termos no Juízo de Execução ....... sob o nº 6348/14…..., alegando o incumprimento da ora autora no âmbito do processo nº 639/09…...-C (Processo de Inventário), nos termos do qual aquela foi condenada a dar de tornas ao exequente, ora réu, a quantia de € 11.000,00;

4. A autora demandou o réu na acção executiva de alimentos, que correu termos no âmbito do processo nº 639/09......, no Juízo de Família e Menores ..., reclamando o pagamento da quantia de € 9.773,54, acrescida de juros de mora sobre o capital em dívida;

5. A quantia exequenda reclamada pela ali exequente, ora autora, prendia-se com o incumprimento do executado, ora réu, no pagamento da pensão de alimentos em que fora condenado a pagar ao seu filho menor, no âmbito do processo nº 639/09…...;

6. No período temporal entre a entrada da execução movida pelo ora réu no âmbito do processo nº 6348/14…... contra a ora autora e a execução intentada por esta contra o réu, que correu termos no Juízo de Família e Menores de ... sob o nº 639/09….., foram penhorados salários à autora;

7. O ora réu, na qualidade de autor, intentou, a ....11.2016, contra a ora autora, uma Acção Pauliana, que correu termos no Juízo Local Cível  ..., sob o nº 8127/16.....;

8. No dia ... .06.2017, as partes chegaram a acordo, pondo fim a esse processo, mediante transacção;

9. Nessa transacção, fizeram constar o seguinte:

1. O Autor desiste do pedido formulado na presente acção;

2. Desiste também do pedido formulado no processo de execução intentada contra a aqui Ré AA e executada no processo de execução comum, nº 6348/14…... (por lapso ostensivo escreveu-se …) – a correr termos no Juízo de Execução – e das penhoras ali efectuadas;

3. A aqui Ré e os Réus CC e DD aceitam a desistência apresentada pelo aqui Autor e em consequência de tal a Ré/exequente no processo que corre termos por apenso ao processo 639/09…. (execução para alimentos) a correr termos no Juízo de Família e Menores ... – Juiz …, desiste do pedido ali formulado e das penhoras efectuadas no mesmo;

4. O Autor aceita a desistência formulada no ponto anterior;

5. Em consequência declaram as partes estarem globalmente compensadas de todos os créditos/débitos que entre si mantinham, em função da partilha dos bens comuns que possuíram em virtude do casamento entre si celebrado, bem como os suportados pela aqui Ré em substituição do Autor no que concerne a alimentos devidos a filhos menores que tinham em comum;

6. Mais acordam, autor e réus em custas, em cada um dos processos supra elencados e em que as partes através do presente acordo desistiram do pedido, pelos desistentes, prescindindo as partes de custas de parte, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficiam.

10. O ora réu não restituiu à autora as quantias penhoradas no âmbito da execução nº 6348/14.....;

11. Nesse processo, a ora autora requereu ao ora réu a restituição das quantias penhoradas, por requerimento datado de 07.07.2017;

12. Em resposta a esse requerimento, o ora réu referiu que “A transacção alcançada nos autos com o nº 8127/16...., e junta com o requerimento, é omissa quanto à verba ora em causa, pelo que, sendo incontroverso que a entrega do produto da penhora ocorreu em data anterior à prolação da sentença homologatória da transacção, está vedada à executada pedir aquilo que já foi pago”;

13. No dia 15.04.2015, no âmbito do processo de execução nº 6348/14.... o ora réu procedeu à penhora do saldo bancário existente na conta da autora na Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de …, CRL, no montante de € 1.811,43».



III


III.1.

A Recorrida defende, nas suas contra-alegações, a inadmissibilidade do presente recurso.

Refere que a revista interposta mais não é do que um pedido de reforma, aclaração do Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, pelo que não reúne por isso os pressupostos de admissibilidade.

Acrescenta que o Recorrente considera que o acórdão da Relação padece de vícios e como tal deve ser nulo, mas de vícios e nulidades enfermava, sim, a sentença da 1ª Instância, que violou o caso julgado.

Vejamos:

Tendo o Recorrente invocado a violação do caso julgado, por parte do acórdão recorrido, estribou-se no disposto no art. 629º, nº 1, al. a), do CPC, tratando-se de uma situação que permite o recurso independentemente do valor da causa e da sucumbência.

Considera-se, com todo o respeito, que a Recorrida acaba por defender a inadmissibilidade do recurso por razões que se prendem com o mérito deste, pugnando pela justeza do acórdão, face à sentença proferida pela 1ª Instância, acentuando que foi esta que violou o caso julgado. Ora, há que ter em conta que, em primeiro lugar, há que verificar se se preenchem os requisitos formais de admissibilidade do recurso e só depois virá o conhecimento do mérito.

No que concerne às nulidades, importa referir que, conforme se decidiu no Ac. do STJ de 22-11-2018, Rel. Rosa Ribeiro Coelho, Proc, nº 408/16.0T8CTB.C1.S1, publicado em www.dgsi.pt, num recurso de revista que tenha como objecto a questão do caso julgado, interposto à luz do disposto no art. 629º, nº 2, a), do CPC, havendo arguição de vícios formais da decisão recorrida, deve conhecer-se dos que envolvam a formulação de questões que se prendam com o objecto da revista.

No mesmo sentido, veja-se, por exemplo, o Ac. do STJ de 15-02-2017, Rel. Nunes Ribeiro, Proc. 2623/11.3TBSTB.E1.S1, em www.dgsi.pt, ou, ainda, o Ac. do STJ 25-03-2021, Proc. 12191/18.0T8LSB.L1.S1, Rel. Maria da Graça Trigo, na mesma base de dados, neste se tendo, entre o mais, exarado que:

«A questão da alegada ofensa do efeito do caso julgado formado por anteriores decisões judiciais integra uma das hipóteses em que, nos termos do art. 629.º, n.º 2, al. a), do CPC, e independentemente da ocorrência de dupla conforme entre as decisões das instâncias (cfr. art. 671.º, n.º 3, 1.ª parte, do CPC), o recurso é sempre admissível, circunscrito, porém, à apreciação de tal questão e, conexamente, à apreciação das invocadas nulidades do acórdão recorrido».

Estando, por ora, em causa apenas a questão da admissibilidade da revista, entende-se que ela cabe na previsão do art. 629º, nº 2, al. a), do CPC, tendo sido devidamente recebida.

III.2.

Defende o Recorrente que a questão que se discute nos presentes autos já foi objecto de decisão judicial no âmbito da Acção Executiva n.º 6348/14....., com a prolação do despacho com a referência ...686 e datado de 14/11/2017, junto aos presentes autos com o requerimento da Recorrida datado de 01/07/2019, conforme foi atempadamente alegado e demonstrado pelo Recorrente no requerimento com a referência ...897, datado de 15/07/2019 (por lapso, referiu “15/09/2019”).

Entende que, face a tal despacho, proferido em 14/11/2017, na referida acção executiva, o Tribunal a quo violou o previsto nos artigos 619.º, 621.º e 625.º, todos do CPC, ou seja, considera que há uma ofensa do caso julgado.

Provou-se que:

«10. O ora réu não restituiu à autora as quantias penhoradas no âmbito da execução nº 6348/14...;

11. Nesse processo, a ora autora requereu ao ora réu a restituição das quantias penhoradas, por requerimento datado de 07.07.2017;

12. Em resposta a esse requerimento, o ora réu referiu que “A transacção alcançada nos autos com o nº 8127/16..., e junta com o requerimento, é omissa quanto à verba ora em causa, pelo que, sendo incontroverso que a entrega do produto da penhora ocorreu em data anterior à prolação da sentença homologatória da transacção, está vedada à executada pedir aquilo que já foi pago”;

13. No dia 15.04.2015, no âmbito do processo de execução nº 6348/14... o ora réu procedeu à penhora do saldo bancário existente na conta da autora na Caixa de Crédito Agrícola Mútuo …, CRL, no montante de € 1.811,43».

Sendo certo que uma decisão «constitui caso julgado nos precisos termos em que julga» (art. 621º do CPC), verifica-se que, no despacho em que o Recorrente se apoia para defender a existência de caso julgado (excepção de conhecimento oficioso, nos termos do art. 578º, conjugado com o art. 577º, al. i), do CPC), se começou por referir que os autos de execução estavam findos, sem qualquer bem ou depósito à sua ordem. E prosseguiu-se, dizendo ser, assim, «inútil discutir ou argumentar sobre se existe, ou não, fundamento válido extraprocessual para a restituição de quantias que foram penhoradas mas cuja disponibilidade já não se encontra à ordem do Tribunal por terem sido entregues ao Exequente para pagamento da dívida exequenda».

Escreveu-se ainda:

«Nos casos em que existe litígio processual entre as Partes sobre a dívida ou sobre os bens penhorados (Oposição à Execução ou à Penhora) os pagamentos só têm lugar mediante a prestação de caução. No caso concreto, não houve qualquer litígio, pelo que houve pagamentos sem qualquer caução em data muito anterior à data da desistência do pedido formulada na acção declarativa n.° 8127/16... [desistência que veio ao conhecimento dos presentes autos já após a sua extinção].

Se a Executada entende que, por razões extraprocessuais aos presentes autos, houve pagamentos indevidos ao Exequente e tal questão é litigiosa entre as Partes, terá que fazer reconhecer esse seu direito em acção declarativa própria.»

Como se vê, o Tribunal, dado o processo encontrar-se findo e visto o mais que deixou expresso, acabou por “remeter” a Executada, ora Recorrida, para uma acção declarativa própria, para ver dirimida a questão da pretendia restituição dos valores em causa.

Não houve, pois, uma pronúncia do Tribunal sobre a existência (ou não) do direito à restituição.

Daí que não se possa afirmar que a questão discutida no presente processo (que representa, afinal, a utilização do meio sugerido pelo Tribunal) tendo sido decidida no dito despacho e que haja, assim, uma situação de caso julgado.

III.3.

Defende o Recorrente que a autoridade de caso julgado, nos termos doutrinários e com os considerandos constantes do acórdão recorrido, não tem qualquer aplicabilidade ao caso sub judice.

Refere que a primeira acção, ou seja, a acção executiva instaurada pelo Recorrente contra a Recorrida (Processo n.º 6348/14.....), tinha por objecto a falta de pagamento de tornas e como quantia exequenda o montante de € 11.199,75; a segunda acção (os presentes autos), tem como pedido o valor de €1.932,92 e como causa de pedir a putativa obrigação de pagamento dos valores entretanto penhorados naquele processo, decorrente da transacção judicial homologada por sentença no processo n.º 8127/16..., que correu termos no Juízo Local Cível  ....

Acrescenta que o cerne da questão jurídica em debate nos presentes autos se ancora, exclusivamente, na interpretação a dar àquela transacção obtida no processo n.º 8127/16...., nomeadamente, quanto a saber se a desistência do pedido e das penhoras, aí levada a cabo, abrangia também as penhoras anteriores e cujo valor já tinha sido entregue ao Recorrente, mais de um ano antes da transacção.

Conclui que não há qualquer identidade entre os referidos processos judiciais, para além das partes litigantes, que possa fundamentar qualquer existência de caso julgado.

Conforme é referido pelo Recorrente, está em causa neste processo a interpretação da transacção a que se chegou na acção pauliana com o nº 8127/16....

Nessa transacção, o A. (aqui Réu e Recorrente) declarou desistir do pedido formulado na acção.

Além disso, declarou desistir do pedido formulado no processo de execução intentada contra a aqui Ré AA e executada no processo de execução comum, nº 6348/14... – a correr termos no Juízo de Execução – e das penhoras ali efectuadas.

Por sua vez, a Ré (ora Autora e Recorrida) e os Réus CC e DD aceitaram tal desistência e a Ré/exequente no processo que corria termos por apenso ao processo 639/09... (execução para alimentos), no Juízo de Família e Menores  ... – Juiz …, desistiu do pedido ali formulado e das penhoras efectuadas no mesmo.

Em consequência declararam as partes estarem globalmente compensadas de todos os créditos/débitos que entre si mantinham, em função da partilha dos bens comuns que possuíram em virtude do casamento entre si celebrado, bem como os suportados pela (ali) Ré em substituição do Autor no que concerne a alimentos devidos aos filhos menores que tinham em comum.

Na 1ª Instância, considerou-se, no que tange à interpretação da transacção, o seguinte:

«Nessa transacção, as partes, ora autora e ora réu, fizeram constar que o ali autor, ora réu, desiste do pedido formulado na execução intentada contra a ora autora e desiste das penhoras ali efectuadas.

Daqui decorre que a penhora do saldo bancário cuja quantia a autora pretende ver restituída ocorreu em 15 de Abril de 2015.

Por sua vez, a transacção efectuada na Acção Pauliana teve lugar no dia 1 de Junho de 2017, ou seja, mais de dois anos depois da referida penhora.

Na data da transacção, o réu desistiu da execução e das penhoras que estivessem activas nessa data, não constando do clausulado da transacção que o autor desiste da penhora efectuada em Abril de 2015.

Se fosse essa a intenção das partes, certamente teriam inserido no clausulado da transacção uma cláusula que previsse a restituição do montante penhorado no processo em data anterior à transacção.

Na verdade, almejassem autora e réu o desiderato de devolução das quantias já penhoradas e entregues ao aqui réu, do perfeito conhecimento de ambas as partes, e atento o decurso do tempo decorrido, isto é, mais de dois anos, teriam, claramente, colocado essa questão na transacção efectuada, o que não aconteceu.

Não constando da transacção a devolução das quantias penhoradas mais de dois anos antes do acordo não existe qualquer fundamento para o ora peticionado pela autora.

Constata-se, por outro lado, que o valor penhorado é equivalente à diferença do que era peticionado por ambas as partes nos respectivos processos de execução, sendo que só assim se entende ambos abdicarem das mesmas quantias e compensarem os respectivos créditos.»

O Tribunal da Relação discordou deste entendimento, vincando que o ora R. desistiu do pedido formulado no processo de execução intentado contra a ora A. e das penhoras ali efectuadas, sendo que, nessa execução, em data anterior àquela desistência, tinha ocorrido a penhora de um saldo bancário da ora A., no montante de 1.811,43 € (facto 13.).

Considerou, então, o Tribunal recorrido:

«Ora, como resulta cristalinamente da lei, no art. 285º, nº 1, do NCPC, a desistência do pedido extingue o direito que se pretendia fazer valer.

Ou seja, o R., aí exequente, ficou sem direito a receber tudo o que ali pretendia reclamar, houvesse já penhoras ou não.

Este efeito extintivo do direito do aí exequente, ora R., já pré-claro, ficou ainda mais reforçado, quando se estipulou que o exequente também desistia das penhoras efectuadas no âmbito de tal execução. Isto é, perante um direito que se extinguia pela simples desistência do pedido, as partes ainda reforçaram tal efeito, mediante o acrescento da desistência das penhoras.

De maneira que o resultado final, conclusivo, era o ora R. não ter direito a qualquer quantia reclamada nessa execução, ainda que já houvesse, por processado natural da execução, penhora de quantias bancárias! Houvesse ou não tal penhora, o direito exequendo reclamado extinguia-se.

Assim, para afastar ou fugir de tal consequência, careciam as partes de fazer uma reserva nesse sentido. Portanto, a reserva a fazer, que ressalvasse a consequência jurídica adveniente da desistência do pedido, era exactamente em sentido contrário ao que a julgadora apontou.

O que não aconteceu de todo, pois nenhuma reserva com tal propósito ficou assente entre as partes.

Aqui chegados, e uma vez que a referida transacção, transitada em julgado, implicou a homologação da desistência do pedido (art. 290º, nº 3, do NCPC), verifica-se que se produziu o efeito de caso julgado material, nos termos do art. 619º, nº 1, e 621º, 1ª parte do NCPC – vide neste sentido L. Freitas, CPC Anotado, Vol. 1º, 2ª Ed., nota 4. ao anterior artigo 300º do CPC = ao actual art. 290º, pág. 577.

Desta sorte, a decisão recorrida ao supor o contrário, colide, irrefragavelmente, como caso julgado material formado com a sentença homologatória de transacção obtida (no âmbito do Proc.8127/16....).»

Escrevem Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, em anotação ao art. 290º do CPC, no Código de Processo Civil Anotado, vol. 1º, 4ª edição, reimpressão, Almedina, Coimbra, 2021, p. 587:

«Tratando-se de negócio de autocomposição do litígio, o juiz, verificado que o ato é válido e que é pertinente para o processo, profere sentença homo­logatória, que, embora não aplicando o direito objetivo aos factos provados na causa, constitui uma sentença de mérito, como tal condenando o réu no pedido ou dele o absolvendo, consoante o negócio jurídico celebrado; e, tratando-se de ato de desistência da instância, o juiz, verificado que o praticou o autor, absolve o réu da instância (n.os3 e 4).

Neste último caso, a instância extingue-se (art. 277-d). Nos outros, a sen­tença homologatória tem, para além deste, o efeito de constituir caso julgado material (arts. 291-2 e 619-1) e o de, sendo condenatória, formar título exe­cutivo (art. 703-a). Distinguem-se assim os efeitos de direito substantivo do negócio de autocomposição do litígio e os efeitos processuais da sentença que o homologa.»

No Ac. do STJ de 08-05-2003, Proc. 03B329, Rel. Ferreira Girão, publicado em www.dgsi.pt, assinala-se que o caso julgado abrange não só as sentenças contenciosas, mas ainda as sentenças homologatórias.

Nessa linha, o Tribunal recorrido concluiu que referida transacção, transitada em julgado, implicou a homologação da desistência do pedido, verificando-se, por isso, efeito de caso julgado material que se entendeu ter sido desrespeitado pela decisão da 1ª Instância.

Explicou-se, depois, estar em jogo a autoridade do caso julgado, não a excepção, citando-se, a propósito, o Ac. do STJ de 26-02-2019, Proc. 4043/10.8TBVLG.P1.S1, Rel. Pinto de Almeida, publicado em www.dgsi.pt, em cuja fundamentação se expendeu, entre o mais, o seguinte:

«Quando vigora como autoridade de caso julgado, o caso julgado manifesta-se no seu aspecto positivo de proibição de contradição da decisão transitada; a autoridade de caso julgado é o comando de acção ou a proibição de omissão respeitante à vinculação subjectiva à repetição no processo subsequente do conteúdo da decisão anterior e à não contradição no processo posterior do conteúdo da decisão antecedente ("proibição de contradição/permissão de repetição") (…); a excepção de caso julgado é a proibição de acção ou comando de omissão atinente ao impedimento subjectivo à repetição no processo subsequente do conteúdo da decisão anterior e à contradição no processo posterior do conteúdo da decisão antecedente" ("proibição de contradição/proibição de repetição") […].

Esta distinção tem justamente por pressuposto que, na autoridade de caso julgado, existe uma diversidade entre os objectos dos dois processos e na excepção uma identidade entre esses objectos. Naquele caso, o objecto processual decidido na primeira acção surge como condição para apreciação do objecto processual da segunda acção; neste caso, o objecto processual da primeira acção é repetido na segunda.

Na excepção, a repetição deve ser impedida, uma vez que só iria reproduzir inutilmente a decisão anterior ou decidir diversamente, contradizendo-a.

Na autoridade, há uma conexão ou dependência entre o objecto da segunda acção e o objecto definido na primeira acção, sem que aquele se esgote neste. Aqui, impõe-se que essas questões comuns não sejam decididas de forma diferente, devendo a decisão da segunda acção acatar o que foi decidido na primeira, como pressuposto indiscutível. […]»

Tem este Supremo Tribunal repetidamente entendido que, no que tange à autoridade do caso julgado, não é exigível a tríplice identidade prevista no art. 581º do CPC (a propósito, Ac. do STJ de 03-03-2021, Proc. nº 1399/18.8T8STS-A.P1.S1, Rel. Manuel Capelo, em www.dgsi.pt), sendo certo existir, in casu, a basilar identidade subjectiva (sobre este requisito, veja-se o citado Ac. do STJ de 25-03-2021, Rel. Maria da Graça Trigo).

Com o efeito positivo do caso julgado, «um ato processual decisório anterior determina (ou pode determinar) o sentido de um ato processual decisório posterior» (Rui Pinto, Exceção e autoridade de caso julgado – algumas notas provisórias, Julgar Online, Novembro de 2018, http://julgar.pt/wp-content/uploads/2018/11/20181126-ARTIGO-JULGAR-Exce%C3%A7%C3%A3o-e-autoridade-do-caso-julgado-Rui-Pinto.pdf.

O que está em causa no presente processo é a retirada, em termos decisórios,  dos efeitos de uma transacção ocorrida, noutro processo, entre as partes, devidamente homologada por sentença, importando, por isso, definir os limites do que foi acertado, de modo a saber-se se a A. pode, alicerçada nesse acordo, pedir aquilo que veio reclamar, verificando-se que, na sentença proferida na 1ª Instância, se fez uma interpretação que levou a uma resposta negativa a essa dúvida e, no acórdão recorrido, respondeu-se positivamente, concluindo-se que aquela sentença, com tal interpretação,  violou o caso julgado decorrente da sentença homologatória.

É, pois, de concluir que, nesta situação, pode, diversamente do que defende o Recorrente, invocar-se a autoridade do caso julgado.

III.4.

Considera o Recorrente que o Tribunal a quo, para concluir pela autoridade de caso julgado, fez uma interpretação das vontades declaradas pelos intervenientes processuais na transacção, na esteira exclusiva do regulado pelo Código Civil nos artigos 217.º e seguintes, sendo que tal decisão de interpretação levada a cabo pelo Tribunal a quo excede os poderes jurisdicionais que lhe são concedidos, pois não pode, por tal não lhe ter sido colocado a julgamento e por as regras processuais recursivas não lhe permitirem, proferir quaisquer juízos de valor sobre as vontades e declarações das partes, nem sequer dirimir estas questões fácticas e que dependem de prova.

Vejamos:

Tendo sido interposto recurso para a Relação de Coimbra com invocação do caso julgado, defendendo-se que a sentença recorrida não interpretara devidamente a transacção homologada por sentença, teria o Tribunal da Relação, necessariamente, de proceder a uma interpretação da sentença homologatória, que condenou as partes no cumprimento do acordado.

A sentença homologatória «como que se apropriará das cláusulas do contrato de transacção e, em conformidade com o aí concertado pelas partes e tendo ainda por referente ineliminável a própria controvérsia litigiosa, condená-las-á ou absolvê-las-á correspondentemente» (Ac. do STJ de 04-11-1993, Proc. 84 541, Rel. Raul Mateus, BMJ 431º, p. 422).

Conforme se exarou no Ac. do STJ de 03-02-2011, Proc. nº 190-A/1999.E1.S1, Rel. Lopes do Rego, publicado em www.dgsi.pt:

«1. Num recurso fundado em violação do caso julgado, tem necessariamente o Tribunal «ad quem» de começar por determinar qual é – segundo os critérios interpretativos que devem ser utilizados para determinar o sentido de uma sentença – o âmbito possível de tal operação interpretativa, excluindo aqueles sentidos normativos que extravasem o âmbito consentido a uma actividade interpretativa, levando a alcançar e imputar-lhe sentidos decisórios que a sentença interpretada manifestamente não pode comportar.

2. Sendo as decisões judiciais actos formais, - amplamente regulamentados pela lei de processo e implicando uma «objectivação» da composição de interesses nelas contida –tem de se aplicar à respectiva interpretação a regra fundamental segundo a qual não pode a sentença valer com um sentido que não tenha no documento ou escrito que a corporiza um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.»

O Recorrente entende que o Tribunal recorrido não podia emitir quaisquer juízos de valor sobre as vontades e declarações das partes, nem sequer dirimir estas questões fácticas e que dependem de prova.

Sucede que, na 1ª Instância, se entendeu que os autos forneciam os elementos necessários ao conhecimento do pedido no despacho saneador e as partes foram notificadas para se pronunciarem sobre essa questão (veja-se a acta da audiência prévia de 29-01-2020). Ora, o R./Recorrente, nas alegações que então produziu, começou por dizer:

«1.º Entende o Réu que efectivamente o processo reúne todos os elementos para que seja proferida douta sentença de absolvição.

2.º Com efeito, a questão sub judice nos presentes autos é exclusivamente matéria de direito e resume-se em saber se o acordo obtido no Processo n.º 8127/16.... obriga o aqui Réu a entregar qualquer quantia à Autora.»

Ou seja –  extrai-se daqui –, o próprio Recorrente considerou que não havia prova a produzir, para além, naturalmente, da (documental) que já constava dos autos.

Não se olvidarão, de qualquer modo, os amplos poderes da Relação quanto à matéria de facto (art. 662º do CPC), que passam, designadamente, pela possibilidade de anulação da decisão quando se considere indispensável a ampliação daquela matéria. Ora, o Tribunal da Relação não entendeu que tivesse sido prematuro o conhecimento do pedido no despacho saneador.

O Tribunal a quo conheceu, assim, do objecto do recurso tendo em atenção os factos elencados pela 1ª Instância, não se vendo em que aspecto possa ter excedido os seus poderes jurisdicionais.

III.5

Alega o Recorrente que, por mero efeito do pagamento parcelar efectuado mais de um ano antes desta desistência na Acção Executiva n.º 6348/... pela Recorrida/Executada, desistiu do pedido à data da transacção, isto é, do valor da quantia exequenda nesta última data, e que o pedido numa acção executiva é a quantia exequenda que vai sendo sempre actualizada diariamente em virtude do vencimento de juros, quanto mais não seja dos compulsórios, pelo que não é estanque.

E acrescenta:

«XVII. Assim sendo, o pagamento, sendo uma modalidade de extinção das obrigações, implica também, necessariamente, a alteração do pedido originário que consta em qualquer requerimento executivo.

[…]

XIX. Em suma, resulta claro e evidente que o pedido, à data da transação e por mero efeito do pagamento efetuado mais de um ano antes, se reduziu no seu exato montante, porquanto a dívida ao ali Exequente e aqui Recorrente era do valor peticionado originalmente, menos o valor já pago, tendo sido deste valor, apurado por simples cálculo aritmético e nos concretos termos expostos, que o Recorrente desistiu e não do pedido original, que, naquela data, reitera-se, já não existia!»

Cita, em abono da sua tese, o Ac. da Rel. de Lisboa de 08-02-2007, Proc. n.º 10424/2006-2, Rel. Maria José Mouro, publicado em www.dgsi.pt.

Com todo o respeito, este acórdão versa sobre um caso em que foi apresentado um plano de pagamento, com redução, pela exequente, da quantia exequenda, considerando-se que essa redução se reconduzia a uma válida e eficaz redução do pedido executivo.

Além disso, afirmou-se aí a necessidade da adequação da penhora ao valor da obrigação exequenda, razão por que, tendo sido penhorado um saldo de conta bancária num montante excessivo, atento o valor da obrigação exequenda, haveria que reduzir a penhora ao valor adequado.

No caso que nos ocupa, não houve, na transacção, qualquer redução do pedido executivo, mas tão-só desistência do pedido.

Da circunstância de, em certos casos, se vencerem juros ao longo da execução, a acrescentar ao pedido inicialmente deduzido, não decorre a conclusão de que, ao desistir-se do pedido executivo, tal configure uma desistência parcial. Quando se pretende desistir de parte do pedido, reduz-se o pedido, tal como, aliás, sucedeu no acórdão citado pelo Recorrente. Desistindo-se, pura e simplesmente, de um pedido, sem qualquer redução ou ressalva, a consequência é a extinção do direito que se pretendia fazer valer, in totum (art. 285º, nº 1, do C.P.C.). E quando se desiste, pura e simplesmente, das penhoras (também aqui, sem qualquer ressalva), não se vê como possa subsistir esta ou aquela.

Não se encontra razão para considerar que o acórdão citado suporta, de algum modo, a tese do Recorrente.

Conforme se exarou no citado Ac. do STJ de 03-02-2011 (Rel. Lopes do Rego):

«Constitui afirmação corrente a de que a sentença proferida em processo judicial constitui um verdadeiro acto jurídico a que se aplicam as regras reguladoras dos negócios jurídicos – pelo que as normas que disciplinam a interpretação da declaração negocial são igualmente válidas para a interpretação de uma sentença - o que determina que a sentença deve ser interpretada com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do seu contexto.»

Trata-se de aplicar o disposto nos arts. 236º, nº1 e 238º, nº1 do C. Civil.

Face aos princípios de interpretação constantes destes artigos, considera-se que o acórdão fez, perante os factos provados, a adequada exegese do caso, ao considerar que, resultando da  desistência do pedido a extinção do direito que se pretendia fazer valer, o R., ao desistir do pedido executivo, ficou sem direito a receber tudo o que ali pretendia reclamar, houvesse já penhoras ou não, sendo que esse efeito extintivo do direito do  exequente ficou ainda mais reforçado quando se estipulou que também desistia das penhoras efectuadas no âmbito de tal execução. E «para afastar ou fugir de tal consequência, careciam as partes de fazer uma reserva nesse sentido. Portanto, a reserva a fazer, que ressalvasse a consequência jurídica adveniente da desistência do pedido, era exactamente em sentido contrário ao que a julgadora apontou», sucedendo que nenhuma reserva foi feita.

Na verdade, não foi feita qualquer redução do pedido nem foi estabelecido qualquer limite temporal à desistência das penhoras.

Conforme refere Manuel Pita, no Código Civil Anotado, sob coordenação de Ana Prata, Vol. I, 2ª edição, Almedina, Coimbra, 2019, p. 325, em anotação ao art. 238º, «a solenidade do negócio formal exige especial diligência das partes na procura dos termos a utilizar.»

III.6.

Referindo que não foi sua intenção que houvesse entrega de valores já penhorados, alega o Recorrente que:

«XXIII. A proceder o entendimento do douto Tribunal a quo, o que não se aceita, mas se acautela por dever de patrocínio, então fica claro que existiu, pelo Recorrente, um erro na declaração, pois a vontade declarada não correspondeu à vontade real, o que torna a transação nula nos  termos e para os efeitos do artigo 247.º e 286.º do Código Civil, conforme resulta da interpretação do Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, processo n.º 67/14.4T8OHPA.C1, de 16/02/2017 4:

I – O erro na declaração, ou erro obstáculo, existe quando, não intencionalmente - v.g., por inadvertência, engano ou equívoco -, a vontade declarada não corresponde a uma vontade real do autor, existente, mas de sentido diverso.

II - Existe erro obstáculo sobre a identidade da coisa que constitui objecto da declaração - error in corpore -, “quando a indicação ou a descrição que dela se faz, leve a identificar uma coisa diferente da que o declarante pretende”.

III - Contudo, a relevância do erro obstáculo, para que o negócio seja anulável, carece:

- Que para o declarante seja essencial o elemento sobre o qual incidiu o erro, de tal forma que, se deste se tivesse apercebido, não teria celebrado o negócio;

- Que o declaratário conheça ou não deva ignorar a essencialidade do elemento sobre o qual incidiu o erro para o declarante.

IV - O vício da vontade negocial que se traduza ou envolva uma deficiência de discernimento do seu autor constitui erro que corresponde à ignorância ou falsa representação de uma realidade (a ignorância do que se ignora).»

Dispõe o art. 291º, nºs 1 e 2 do C.P.Civil:

«1 — A confissão, a desistência e a transação podem ser declaradas nulas ou anuladas como os outros atos da mesma natureza, sendo aplicável à confissão o disposto no n.º 2 do artigo 359.º do Código Civil.

2 — O trânsito em julgado da sentença proferida sobre a confissão, a desistência ou a transação não obsta a que se intente a ação destinada à declaração de nulidade ou à anulação de qualquer delas, ou se peça a revisão da sentença com esse fundamento, sem prejuízo da caducidade do direito à anulação.»

O Recorrente estriba-se no art. 247º do C. Civil (erro na declaração), que se reporta a um vício anulável, prevendo o art. 291º do CPC, como resulta da sua leitura, dois mecanismos: acção intentada para a declaração de nulidade ou anulação (e esta seria a adequada ao caso, de acordo com o alegado) ou revisão da sentença com esse fundamento (art. 696º, d), do CPC), sem prejuízo da caducidade do direito de anulação. Ora, o Recorrente não demonstra que tenha lançado mão de algum desses meios (que, naturalmente, exigem um cortejo de formalidades, maxime, em termos da prova do invocado erro), não podendo eles ser substituídos por uma alegação, ex novo, num recurso de revista.

Aliás, o acórdão que o Recorrente trouxe à colação, quanto à questão do erro, foi proferido num recurso de revisão.

Não há, assim, que conhecer desta matéria.

III.7.

Defende, ainda, o Recorrente que o acórdão recorrido é nulo por violação dos artigos 615.º, n.º 2, alínea b), in fine (pretenderia, por certo, referir-se à al. d), porquanto, ao decidir pela existência da autoridade de caso julgado, fez uma interpretação das vontades e declarações expostas na transacção em causa nos presentes autos, para além dos seus poderes de decisão.

Conforme decorre do que atrás se expôs, entende-se que o Tribunal a quo, perante a invocação de ofensa do caso julgado, procedeu, como lhe competia, à interpretação da transacção, homologada por sentença, com os elementos que já vinham da 1ª Instância, tendo esta entendido que eram suficientes para conhecer do pedido no saneador, o que, como se deixou dito, não foi contrariado pelo R., que considerou estar em causa apenas uma questão de direito, o que representava ter por desnecessárias  outras indagações fácticas além das que já emanavam dos autos.

Para a aferição de uma alegada ofensa do caso julgado, não pode deixar-se de proceder a uma interpretação da decisão que se considera ter sido desrespeitada, com o fim de determinar o seu alcance, os seus limites, só assim se podendo saber se uma decisão posterior incorreu em tal ofensa.

O Tribunal a quo conheceu do que tinha que conhecer, não tendo, ao contrário do afirmado pelo Recorrente, excedido os seus poderes de decisão.

III.8.

A Recorrida requereu, nas contra-alegações, a condenação do Recorrente como litigante de má fé, em multa não inferior a €1.000,00.

Alegou que o Recorrente se encontra a fazer do processo e dos meios processuais um uso completamente reprovável, com vista a entorpecer a acção da justiça e a adiar, sem qualquer tipo de fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.

Estriba-se, pois, na previsão do art. 542º, nº2, d), do CPC.

O Recorrente opôs-se a esta pretensão.

Não se vê que haja motivo para condenar o Recorrente como litigante de má fé, pois o que se verifica é que usou do seu legítimo direito de recorrer, batendo-se pela tese que tem por correcta e que, aliás, fora sufragada pela decisão da 1ª Instância.

A divergência entre as instâncias quanto à solução do pleito parece-nos suficiente para, neste caso, afastar a litigância de má fé, designadamente no que concerne ao preenchimento da “falta de fundamento sério” (independentemente de não se concordar com a posição defendida pelo Recorrente).


*


Improcede, pelo que ficou dito, o recurso, mas não há razões para se condenar o Recorrente como litigante de má fé.

*



Sumário (da responsabilidade do relator)

1. A questão da alegada ofensa do caso julgado configura uma das situações em que, nos termos do art. 629.º, n.º 2, al. a), do CPC, o recurso é sempre admissível, independentemente do valor da causa e da sucumbência, centrado na apreciação dessa questão e das nulidades do acórdão recorrido que com ela se conexionem.

2. Uma decisão «constitui caso julgado nos precisos termos em que julga» (art. 621º do CPC). Daí que não seja de concluir pela existência de caso julgado, relativamente à obrigatoriedade (ou não) da devolução de quantias penhoradas numa acção executiva,  se o despacho proferido considerou que o meio indicado para dirimir o litígio entre as partes seria um acção declarativa.

3. Uma sentença homologatória de uma transacção, condenando ou absolvendo as partes nos termos acordados, é susceptível de constituir caso julgado material.

Sendo interposto um recurso com invocação da ofensa do caso julgado relativamente a uma tal sentença, não pode o Tribunal da Relação deixar de interpretar, à luz do disposto nos arts. 236º e 238º do C. Civil, os termos da transacção homologada, de modo a aferir da procedência de um pedido assente nos efeitos dessa transacção.

4. No que tange à autoridade do caso julgado (vertente positiva, baseada numa relação de prejudicialidade entre o objecto da segunda acção e o objecto da primeira, surgindo esta como pressuposto daquela), não é exigível a tríplice identidade prevista no art. 581º do CPC, diversamente do que sucede com a excepção (vertente negativa do caso julgado).

5. Prevendo o art. 291º do CPC meios (acção ou recurso de revisão) para obter a declaração de nulidade ou anulação de uma transacção, não podem eles ser substituídos por uma mera alegação, ex novo, no âmbito de um recurso de revista, invocando a existência de erro enquadrável no art. 247º do C. Civil.



IV


- Pelo exposto, na improcedência da revista, mantém-se o acórdão recorrido.

- Custas pelo Recorrente.


*


Indefere-se a pretensão de condenação do Recorrente como litigante de má fé.

*


Lisboa, 02 de Junho de 2021


Tibério Nunes da Silva

Maria dos Prazeres Beleza

Olindo dos Santos Geraldes


*


Nos termos do art. 15º-A do DL nº 10º-A de 13.03, aditado pelo DL nº 20/20 de 01.05, o relator declara que o presente acórdão tem o voto de conformidade dos restantes Juízes Conselheiros que compõem este colectivo.

Tibério Nunes da Silva (relator)