Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
| Processo: |
| ||
| Nº Convencional: | 3.ª SECÇÃO | ||
| Relator: | CARLOS CAMPOS LOBO | ||
| Descritores: | RECURSO PER SALTUM VIOLÊNCIA DOMÉSTICA OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA QUALIFICADA EXTORSÃO AMEAÇA RELATÓRIO SOCIAL PERÍCIA FACTOS PROVADOS FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO INSUFICIÊNCIA DA MATÉRIA DE FACTO MEDIDA CONCRETA DA PENA PENA ÚNICA IMPROCEDÊNCIA | ||
| Data do Acordão: | 09/17/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
| Decisão: | NEGADO PROVIMENTO | ||
| Sumário : | I – A simples fórmula Do relatório Social consta, Consta da Perícia Psicologia Forense, resultando numa reprodução pura e simples de partes do relatório social e de uma perícia realizada, as quais se transcrevem na íntegra onde, para além de factos, se fazem referências valorativas, opinativas, meramente descritivas, e em muitos segmentos de conteúdo sem qualquer efeito ponderativo, pode redundar na nulidade expressa no artigo 379º, nº 1, alínea a), por referência ao artigo 374º, nº 2, ambos do CPPenal, entendendo outros poder configurar-se a mácula constante da alínea a) do nº2 do artigo 410º do CPPenal – insuficiência da matéria de facto para a decisão -, na medida em que se pode desenhar a ausência de enumeração de factos provados necessários e suficientes para a determinação da medida da pena e, sequentemente, para a escolha da pena em concreto. II – Este tipo de repetido posicionamento que vem sendo tomado, ilustrativo de pouco cuidado, apenas revela que se dá como provado é que o relatório social e / ou outros documentos, apresentam / exibem um determinado conteúdo, elenca referências várias, e já não os factos concretos que tal possa abrigar. III - O recurso em matéria de pena, não é uma oportunidade para o tribunal ad quem fazer um novo juízo sobre a decisão em revista, sendo antes um meio de corrigir o que de menos próprio foi decidido pelo Tribunal recorrido e que sobreleve de toda a mancha decisória pelo que, em sede de medida da pena, o recurso não deixa de reter o paradigma de remédio jurídico, apontando para que a intervenção do tribunal de recurso, se deve ater somente à reparação de qualquer desrespeito, pelo tribunal recorrido, dos princípios e regularidade que definem e demarcam as operações de concretização da pena na moldura abstrata determinada na lei. IV – Ante vários crimes de violência doméstica que foram perpetrados, os quais cada vez mais proliferam, surgem grandes preocupações em termos de prevenção geral, reclamando uma robusta e séria intervenção, tanto mais quando para além de vítima parceira e / ou parceiro, surgem familiares próximos como avó, mãe e irmão. V – Mais censura se impõe em caso de agente que já exibe antecedentes criminais pelo mesmo tipo de prática. VI – Importa reter que a circunstância do arguido ter problemas aditivos, para além de não poder ser justificação para todo o seu agir, é aspeto que cabendo ao mesmo ultrapassar / debelar, ao que se pensa, não se apresenta como algo que lhe foi imposto mas sim como resultado de uma escolha sua. | ||
| Decisão Texto Integral: | Acordam em Conferência na 3ª Secção Criminal I – Relatório 1.No processo nº 2919/23.1PAPTM da Comarca de Faro – Juízo Central Criminal de Portimão – Juiz 1, figurando como arguido, AA (adiante AA), filho de BB e de CC, nascido em D-M-2000, natural de ..., solteiro, ajudante de pladur, residente na Rua 1, atualmente preso preventivamente no Estabelecimento Prisional de ..., realizado o julgamento, foi proferido Acórdão em 6 de março de 2025, onde se decidiu, para o que aqui releva, condenar aquele: - na pena de quatro anos de prisão pela prática de um crime de violência doméstica agravado na forma consumada p.e p. pelo artigo 152º nºs 1 alínea b) e 2 alínea a) do CPenal (ofendida DD); - na pena de três anos de prisão pela prática de um crime de violência doméstica agravado na forma consumada p. e p. pelo artigo 152º nºs 1 alínea d) e 2 alínea a) do CPenal (EE); - na pena de dois anos de prisão pela prática de cada um dos dois crimes de ofensa à integridade física qualificada na forma consumada p. e p. pelo artigo 145º nº 1, 2 e 132º nº 2 alínea a) do CPenal (ofendida CC); - na pena de seis meses de prisão pela prática de um crime de extorsão na forma tentada p.e p. pelo artigo 223º nº 1 e 22º a 23º todos do CPenal (ofendida CC); - na pena de quatro meses de prisão pela prática de um crime de ameaça agravada na forma consumada p.e p. pelo artigo 155º nº 1 alínea a) do CPenal (CC); -na pena de quatro meses de prisão pela prática de um crime de ameaça agravada na forma consumada p.e p. pelo artigo 155º nº 1 alínea a) do CPenal (CC); - na pena de quatro meses de prisão pela prática de um crime de ameaça agravada na forma consumada p.e p. pelo artigo 155º nº 1 alínea a) do CPenal (FF); - na pena de quatro meses de prisão pela prática de um crime de ameaça agravada na forma consumada p.e p. pelo artigo 155º nº 1 alínea a) do CPenal (GG); - Em cúmulo jurídico na pena única de oito anos e seis meses de prisão. * Foi ainda o Arguido condenado na pena acessória de proibições de contactos com as ofendidas DD e EE, pelo período de 5 (cinco) anos. * Mais se determinou: - A título de reparação dos prejuízos sofridos pela vítima / ofendida DD, arbitrar o pagamento pelo arguido da quantia de €2000,00 (dois mil euros), acrescida de juros desde o trânsito em julgado desta decisão até efetivo e integral pagamento; - A título de reparação dos prejuízos sofridos pela vítima / ofendida EE, arbitrar o pagamento da quantia de €900,00 (novecentos euros), acrescida de juros desde o trânsito em julgado desta decisão até efetivo e integral pagamento. -Condenar o arguido / demandado a pagar à Unidade Local de Saúde do Algarve EPE, a título de indemnização cível, a quantia de €239,54 (duzentos e trinta e nove euros e cinquenta e quatro cêntimos), acrescida de juros de mora contados desde o trânsito em julgado do Acórdão até ao efetivo e integral pagamento. - Condenar o arguido / demandado a pagar à Unidade Local de Saúde de Santa Maria EPE, a título de indemnização cível, a quantia de €2.006,89 (dois mil e seis euros e oitenta e nove cêntimos), acrescida de juros de mora contados desde o trânsito em julgado do Acórdão até ao efetivo e integral pagamento. 2. Inconformado com o decidido, o arguido AA interpôs recurso per saltum para este Alto Tribunal e na sequência da motivação que enuncia, apresenta as seguintes conclusões: (transcrição) 1.ª – O Recorrente desde jovem que padece de problemas do foro psiquiátrico além de consumir substâncias psicoactivas que, quando associados influenciam de forma negativa o seu comportamentos para com as outras pessoas, originando comportamentos disruptivos e agressivos que deram origem ao presente processo. 2.ª Contudo, os referidos problemas do Recorrente não foram atendidos aquando da escolha da medida da pena única . 3.ª Também ficou provado em sede de Audiência de Discussão e Julgamento que o arguido quando estava sóbrio era uma pessoa meiga. 4.ª O arguido reconhece que deverá ser alvo de punição face às suas condutas e, inclusive concorda com a aplicação de uma pena efetiva tal como lhe aconteceu porém, a aplicação uma pena de prisão de oito anos e seis meses mostra-se excessiva, tendo em atenção os parâmetros legais e de direito, bem como, os problemas aditivos e psiquiátricos que deveriam ter atendidos aquando da aplicação da pena do Recorrente. 5.º A medida da pena aplicada ao arguido mostra-se manifestamente excessiva, injusta desadequada e desproporcional violando as normas constantes nas disposições legais conjugadas dos artigos 40.º, 70.º, 71.º e 72.º do Código Penal e do n.º 2, do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa. 6.º Atento todo o circunstancialismo envolvente e tudo quanto importa considerar ao presente processo, defendemos que a pena única a aplicar ao Recorrente deverá oscilar entre os cinco e seis anos de prisão, resultando excessiva, desconforme com a gravidade e necessidades de prevenção, qualquer pena única superior, pelo que a pena de oito anos e seis meses de prisão, só por si compromete a reabilitação do Recorrente pelo que não deverá ser confirmada e por conseguinte, a pena única aplicada deverá ser reduzida, assim merecendo provimento o presente Recurso. 7.ª A pena única a que o Recorrente foi condenado após ter sido realizado o cúmulo jurídico é considerada excessiva, extrapolando os limites impostos pelo principio da ressocialização do delinquente da sua reabilitação e da sua preparação para que quando o mesmo esteja em liberdade possa erguer a as vida de forma licita e afastada da prática de futuros delitos, pelo que, salvo o devido respeito por opinião contrária, o douto tribunal “a quo” violou por erro de interpretação, o preceituado no n.º 1, do art.º do 77.º do Código Penal. 8.ªA pena única aplicada ao Recorrente ultrapassou o seu limite da culpa, comprometendo a sua reabilitação e ressocialização, para além de ter sido esquecido que a aplicação das penas tem como função não só a proteção dos bens jurídicos, mas fundamentalmente a reintegração do delinquente na sociedade. 9.ª Pelo que, o douto Tribunal “a quo”, julgando procedente a douta acusação de fls., deveria ter condenado o Recorrente depois de realizado o cúmulo numa pena única nunca superior a seis anos de prisão e, ao ter decidido nos termos do douto Acórdão de fls., aplicando a excesssiva e desnecessária pena única de oito anos e seis meses de prisão, salvo o devido respeito por opinião mais douta, violou o disposto nos artigos 40.º e 71.º do Código Penal, pelo que merecendo provimento o presente recurso, deverá a pena única aplicada no tribunal de instância ser substituída por outra que oscile entre os cinco e seis anos de prisão, assim merecendo provimento o presente Recurso. 3. O Digno Ministério Público, junto do Tribunal de 1ª Instância, respondendo, pugnando pela improcedência do recurso, sem apresentar conclusões, e em síntese, opina (…) entendemos que as concretas medidas das penas aplicadas pelo Tribunal “a quo” a cada um dos crimes pelos quais o arguido foi condenado e bem assim a pena única aplicada em cúmulo jurídico de penas, se mostram adequadas, necessárias e proporcionais à ilicitude dos factos, à culpa do arguido e bem assim às concretas exigências de prevenção geral e especial que no caso se impõem, sendo que a pena única de 6 anos de prisão pela qual o arguido, ora recorrente, pugna, se revela a nosso ver, manifestamente muito insuficiente. 4. Subidos os autos a este Supremo Tribunal de Justiça, o Ex.mo Senhor Procurador-Geral Adjunto, na intervenção a que alude o artigo 416º do CPPenal, emitiu parecer aderindo ao posicionamento tomado pelo Digno Ministério Público em 1ª instância, e alinhando na improcedência do recurso interposto pelo arguido, opina: (transcrição)1 (…) Conforme vem sendo jurisprudência constante do Supremo Tribunal de Justiça, não compete ao STJ proceder a uma nova determinação da pena, mas apenas verificar o respeito pelos critérios legais na sua determinação e, consequentemente, a sua adequação e proporcionalidade. Ora, a resposta do Ministério Público junto do Tribunal a quo rebate de forma fundamentada e sólida os argumentos do recorrente, demonstrando que o acórdão recorrido respeitou aqueles critérios, não havendo, por isso, lugar a qualquer intervenção corretiva na medida da pena aplicada. Com efeito, é também nosso entendimento que a pena única aqui em causa reflete adequadamente as exigências de prevenção geral, que são aqui elevadas, considerando tratar-se de crimes cuja natureza, frequência e potencial lesivo reclamam rigor punitivo para desincentivar o seu cometimento. Reflete, também com rigor, o grau de ilicitude dos factos e o desvio aos valores impostos pela ordem jurídica que os mesmos implicaram, bem como a intensidade do dolo, que é elevada, uma vez que o arguido atuou com intenção direta de levar a cabo os atos pelos quais veio aqui a ser condenado. Como refere Figueiredo Dias (Direito Penal Português, Editorial Notícias, pp. 231, § 310), “Tudo o que o aplicador tem de perguntar-se é qual o mínimo de pena capaz de, perante as circunstâncias concretas do caso relevantes, se mostrar ainda comunitariamente suportável à luz da necessidade de tutela dos bens jurídicos e da estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada”. É exatamente esta ponderação, esta procura de equilíbrio, que está patente na decisão recorrida, pelo que não merece qualquer censura. Neste contexto, cabe aqui inteiramente citar, até na conclusão a que chega, uma decisão recente deste Supremo Tribunal onde se afirma: “cumpre lembrar que o Supremo tem reafirmado que, também em matéria de pena, o recurso mantém o arquétipo de remédio jurídico, não se tratando de um re-julgamento da causa. Ou seja, o Supremo intervém na pena, alterando-a, quando detecta incorrecções ou distorções no processo aplicativo desenvolvido em primeira instância, na interpretação e aplicação das normas legais e constitucionais que regem a determinação da sanção. E não decide como se o fizesse ex novo, como se inexistisse uma decisão de primeira instância. E assim o recurso não visa, não pretende e não pode eliminar alguma margem de apreciação livre, reconhecida ao tribunal de primeira instância enquanto componente individual do acto de julgar. Direccionando-se a sindicabilidade da medida concreta da pena em recurso para esse desrespeito aos princípios gerais, às operações de determinação impostas por lei, à desconsideração dos factores de medida da pena, não abrangendo «a determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto de pena, excepto se tiverem sido violadas regras da experiência ou se a quantificação se revelar de todo desproporcionada» (Figueiredo Dias, DPP, As Consequências Jurídica do Crime 1993, §254, p. 197), há que reconhecer que a decisão do acórdão se mostra justificada.”2 A pena única aplicada pelo Tribunal a quo ao recorrente, a mais adequada, justa e proporcional, pelo que é de confirmar. (…) sufragamos integralmente a argumentação da Senhora Procuradora da República na 1ª instância, que aqui damos por reproduzida e, por todo o exposto, somos de parecer que o recurso deve ser julgado totalmente improcedente mantendo-se a decisão recorrida. Não foi apresentada qualquer resposta. 5. Efetuado o exame preliminar e colhidos que foram os vistos legais, cumpre agora, em conferência, apreciar e decidir. II – Fundamentação 1. Questões a decidir Face ao disposto no artigo 412º do CPPenal, considerando a jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça nº 7/95, de 19 de outubro de 19953, bem como a doutrina dominante4, o objeto do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extraiu da respetiva motivação, sem prejuízo da ponderação de questões de conhecimento oficioso que possam emergir5. Posto isto, e vistas as conclusões do instrumento recursivo trazido pelo arguido recorrente, pretende discutir-se a pena única imposta (sua redução). 2. Apreciação 2.1. O Tribunal recorrido considerou provados e não provados os seguintes factos: (transcrição) FACTOS PROVADOS (…) 1. A ofendida DD iniciou um relacionamento amoroso com o arguido no Verão de 2023, vivendo juntamente com o arguido como se de marido e mulher se tratassem. 2. A ofendida é mãe de três filhas menores, HH, II e JJ, respectivamente com 5 anos, 2 anos e 6 meses de idade. 4. No dia 15-08-2023 pelas 19h, junto ao Pingo Doce ... o arguido dirigiu-se a GG, mãe da ofendida, apontou-lhe uma faca à face e disse-lhe num tom sério e firme: “eu mando o Calu por-te a ti e à tua irmã dentro de um saco (…), eu é que dou educação à tua filha”. 5. Nesse momento ali compareceu a ofendida DD que se colocou entre ambos a chorar, altura em que o arguido se dirigiu a esta e lhe disse: “vai já buscar o carro” 6. Nessa altura a ofendida obedeceu ao arguido e enquanto chorava foi buscar o automóvel e ambos se ausentaram do local. 7. No dia 13-10-2023 pelas 12:00h quando o arguido e a ofendida se encontravam no interior do automóvel da ofendida, concretamente, na Rua 2, em Portimão, o arguido iniciou uma discussão com a aquela relacionada com uma avaria do carro. 9. Nessa altura a ofendida saiu do carro e caminhou em direcção às Bombas de combustível da “Cepsa” ali perto dizendo que ia à casa de banho. 10. Nesse percurso o arguido foi junto à ofendida picando-a várias vezes com a ponta da navalha nas costas, nos braços, na parte superior do tronco, nas mãos e na cabeça. 11. Em consequência de tal conduta a ofendida sofreu ferimentos nas zonas atingidas. 13. Como a ofendida recusou ir com ele até à zona de mato, o arguido desferiu-lhe um pontapé nas pernas, fazendo com que a ofendida caísse ao chão. 14. Em consequência de tal conduta a ofendida sofreu hematomas nas pernas. 15. Com a ofendida caída no chão o arguido preparava-se para desferir um murro na cabeça da ofendida, contudo, apenas não o fez pois ali se dirigiu KK (avô das filhas da ofendida) que o impediu de concretizar os seus intentos. 16. De seguida, o arguido, dirigiu-se à ofendida enquanto esta ainda se encontrava caída no chão e num tom sério e firme disse-lhe: “ou vens comigo ou nunca mais vens”, o que fez com que esta se levantasse do chão e o acompanhasse. 24. Desde 12 de Dezembro de 2023 que o arguido, juntamente com a ofendida DD, passou a residir na habitação de CC, mãe do arguido, sita na Rua 1, local onde também residem CC (mãe do arguido), EE, avó materna do arguido e FF, irmão do arguido (13 anos de idade). 25. No dia 23-02-2024 o arguido desferiu uma chapada à ofendida DD, e empunhou uma navalha na sua direcção dizendo que a matava. 26. Em finais de Fevereiro de 2024 e no inicio do mês de Março de 2024, no interior da referida habitação, o arguido dirigiu-se à sua avó, EE, num tom sério e elevado dizendo-lhe: “JÁ DEVIAS TER MORRIDO, QUALQUER DIA MATO-TE MAS NÃO SOU EU QUE O FAÇO MANDO FAZER, ÉS UMA BRUXA, UMA PUTA, OLHA PARA MIM, QUANTO É QUE TU GANHAS DE REFORMA, TU PAGAS ALGUMA COISA CÁ EM CASA, ESTÁS AQUI COMES E DROMES E NÃO PAGAS NADA, VAI-TE EMBORA, FAZ-TE Á VIDA, JÁ TENS IDADE PARA ISSO, VELHA DE UM CABRÃO” 27. No período compreendido entre 12-12-2023 e início do mês de Março de 2024, o arguido dirigiu-se diariamente à sua avó EE e num tom sério, firme e elevado dirigiu-lhe as seguintes expressões: “FAZES MACUNBA, BRUXA, SÓ ATRASAS A NOSSA VIDA, QUALQUER DIA MANDO-TE MATAR, EU NÃO PRECISO FAZER NADA, NÃO SUJO AS MINHAS MÃOS, EU MANDO ALGUÉM MATAR-TE, QUALQUER DIA ESTÁS A ANDAR NA RUA A APARECE ALGUÉM E PARTE-TE UMA PERNA”. 28. A ofendida EE conta com 64 anos de idade e sofre de vários problemas de saúde, concretamente, doença oncológica, doença cardíaca, insuficiência renal, tendo já sofrido três AVC´s. 29. Como consequência directa e necessária das condutas do arguido supra descritas a ofendida EE sofreu as seguintes sequelas psicológicas: “(…) alterações psicopatológicas significativas, com presença de sintomas de depressão e de stress pós traumático, marcados por um elevado mal estar ao nível do funcionamento corporal, tristeza, infelicidade, solidão, perda de energia, falta de motivação e de interesse pela vida, memórias repetidas, indesejadas e perturbadoras dos episódios de abuso, sonhos e pesadelos, evitamentos, reacções físicas intensas quando algo lhe faz lembrar os acontecimentos, alterações na concentração e alterações muito intensas no sono.” 30. Nesse período temporal compreendido entre 12-12-2023 e inícios de Março de 2024, o arguido, pelo menos por 4 vezes, dirigiu-se ao menor FF e disse-lhe: “FUI EU QUE PEDI PARA NASCERES TENHO DIREITO DE TE RETIRAR A VIDA”. 31. No dia 05 de Março de 2024 o arguido ao chegar a casa pelas 19:30h dirigiu-se à casa de banho onde se encontrava a ofendida CC, mãe do arguido, desferiu um pontapé na porta da casa de banho arrombando-a e de seguida desferiu uma chapada na face da ora ofendida CC que a atingiu junto ao olho, fazendo com que a lente de contacto que esta usava se partisse/deslocasse e lhe ferisse o olho direito. 32. Ao mesmo tempo o arguido disse-lhe num tom sério, firme e elevado: “É HOJE QUE TE MATO”. 33. Mais disse a CC: (…), NÃO FAZES NADA POR MIM, AINDA VAIS FICAR CEGA, ESTÁS A PERCEBER, NÃO FAZES NADA PELO TEU FILHO, SÓ VIVES DE APARÊNCIAS, EU AINDA TE VOU MOSTRAR E AINDA VAIS PASSAR MUITO MAL”. 34. Ao presenciar tais factos, o menor FF defendeu a sua progenitora o que levou a que o arguido se ausentasse da habitação supra identificada. 35. Nesse mesmo dia, momentos mais tarde, o arguido referindo-se ao irmão FF, disse à progenitora: “O ALFREDO VAI VER, AMANHÃ VOU Á ESCOLA APANHÁ-LO E VOU MATÁ-LO POR ME TER ESPETADO UMA FACA”. 37. No mês de Janeiro de 2024 o arguido exigiu à ofendida CC, sua mãe, que lhe entregasse dinheiro pois o mesmo queria comprar erva/canábis. 38. Como a ofendida CC recusou entregar dinheiro ao arguido, este fez uma videochamada para a mãe dizendo-lhe que atenta a recusa da ofendida já havia desferido uma chapada na face da ofendida DD e já tinha partido uma cadeira, dizendo-lhe ainda: “ESTÁS A VER O QUE ME FAZES FAZER”. 39. Nessa sequência mostrou-lhe por videochamada a face da ofendida DD após a referida agressão e a cadeira partida. 40. Quando CC chegou a casa e perguntou ao arguido porque é que ele tinha feito aquilo, o arguido respondeu-lhe: “FIZESTE-ME ESPERAR E AINDA ME ESTÁS A PROVOCAR?” e de seguida desferiu uma chapada na face de CC que lhe rebentou o lábio ficando a sangrar. 42. Desde 12-12-2023 até inícios de Março de 2024 o arguido dirigiu-se todos os dias à ofendida DD dizendo-lhe: “PUTA, VAIS COM TODOS, DÁS CONFIANÇA A TODOS, QUALQUER DIA MATO-TE, MATO A ELES E NINGUÉM FICA A SABER, MANDO FAZER NÃO SUJO AS MÃOS EU MANDO FAZER.” 43. Nesse período temporal o arguido disse ao irmão FF que estava a seduzir DD, o que levou a que o irmão e DD não se falem com receio dos comportamentos agressivos e impulsivos deste. 44. Desde que DD foi viver com o arguido para a casa de CC, concretamente desde meados do Verão de 2023 até inícios de Março de 2024 que o arguido desferiu à ofendida DD chapadas na face e murros que a atingiram na face e na cabeça. 46. No dia 26 de Fevereiro de 2024, o arguido desferiu uma chapada na face da ofendida DD que a atingiu no maxilar esquerdo e fez com que a mesma embatesse com a cabeça na parede. 47. Mais lhe exibiu uma navalha que acabou por atirar para o caixote do lixo. 48. Essa chapada foi tão forte que o maxilar da ofendida ficou fracturado. 49. Como consequência directa e necessária de tais agressões, ocorridas no dia 26 de Fevereiro de 2024, a ofendida foi sujeita a uma operação cirúrgica à face, na qual lhe colocaram duas microplacas de metal com 4 parafusos cada e uma microplaca com 6 parafusos. 50. Como consequência directa e necessária dos factos acima descritos em 46, a ofendida DD ficou com as seguintes sequelas: “cicatriz pós-cirúrgica (…) no angulo e na mandibula esquerda com 0,5cm e cicatrizes na gengiva interna da mandibula.” 51. Tais lesões causaram-lhe e um período de 53 dias para a cura, dos quais 53 dias com afectação da capacidade profissional e 2 dos quais com afectação para o trabalho em geral. 52. Do episódio datado de 26 de Fevereiro de 2024, resultaram para a ofendida DD consequências permanentes, concretamente: na “consolidação dos ossos da mandibula” com a presença de placas metálicas e cicatrizes as quais não são visíveis para os outros e não afectam funcionalmente. 53. No decurso das discussões e das agressões supra descritas o arguido dirigiu-se por várias vezes à ofendida DD dizendo-lhe que a matava que é “UMA GRANDE PUTA”. 54. Cerca de uma semana depois de o arguido ficar sujeito à medida de coacção de prisão preventiva, ou seja, no início da segunda quinzena do mês de Março de 2024 o arguido telefonou à ofendida DD e num tom sério, firme e alto proferiu as seguintes expressões: “ANDAS A COMER OS GAJOS TODOS DE PORTIMÃO, ÉS UMA PORCA E UMA PUTA, PENSAS QUE ME ENGANAS MAS EU CONSIGO VER TUDO O QUE TU PÕES NO INSTAGRAM, ÉS UMA IRRESPONSÁVEL, AS TUAS FILHAS DEVIAM SER RETIRADAS DE TI, ANDAS A CHUPAR A PILA DE TODOS, NÃO VAIS FAZER NADA DA TUA VIDA SEM MIM. 55. No dia 01-06-2024 quando a ofendida se encontrava na zona Ribeirinha de Portimão, individuo que dá pela alcunha de LL abordou a ofendida que depois de lhe dizer que esteve preso juntamente coim o arguido disse-lhe ainda: “tenho um recado para o teu amigo, que quando ele sair vocês os dois estão tramados”. 56. Como consequência directa e necessária das condutas do arguido supra descritas dirigidas à ofendida DD, esta sofreu as seguintes sequelas psicológicas: “alterações psicopatológicas significativas, com presença de sintomas de ansiedade, ansiedade fóbica e de depressão, e critérios para o diagnóstico de uma Perturbação de Stress Pós Traumático, marcados pela presença de medos, evitamento, nervosismo, tensão nervosa, insónias, irritabilidade, agressividade, tendência para o isolamento, vergonha, suspeita e desconfiança em relação ao exterior, perda de energia vital, falta de motivação e de interesse pela vida, memórias repetidas indesejadas sobre os alegados acontecimentos de abuso, sonhos e pesadelos, sentimentos de culpa, dificuldade em experimentar sentimentos positivos e dificuldade em concentrar-se.” 57. Em relação à personalidade, a ofendida DD, apresenta “traços de personalidade do tipo evitante”, tratando-se de uma pessoa que “evita actividades que envolvam contactos interpessoais, que se preocupa em ser criticada e/ou rejeitada, que se vê a si própria como uma inapta socialmente, não atractiva e/ou inferior aos outros, e que não está disponível para o envolvimento com pessoas.” 58. Estes traços de personalidade que a ofendida DD apresenta são resultado directo dos factos perpetrados pelo arguido. 59. Ao actuar dessa forma o arguido agiu sempre com o propósito de molestar física e psicologicamente a ofendida DD e afectá-la na sua dignidade pessoal, segurança, liberdade, honra e bem-estar, propósito esse que logrou alcançar, porquanto a ofendida teme e receia pela saúde, vida, liberdade e integridade física, bem como padece de sequelas psicológicas resultantes do comportamento violento do arguido. 60. O arguido agiu ainda com o propósito de causar à ofendida lesões físicas permanentes como aquelas que vieram a resultar do episódio vertido em 46). 61. Agiu ainda com o propósito de molestar psicologicamente a ofendida EE e afectá-la na sua dignidade pessoal, segurança, liberdade, honra e bem-estar, propósito esse que logrou alcançar, porquanto a ofendida teme e receia pela saúde, vida, liberdade e integridade física, bem como padece de sequelas psicológicas em resultado da conduta do arguido. 62. Mais conhecia o arguido a idade avançada da ofendida EE, bem como que esta padecia de várias doenças que a tornavam particularmente vulnerável face às suas investidas e modos violentos, contudo, ainda assim, optou por agir da forma acima descrita, 63. Ao actuar dessa forma o arguido agiu com o propósito de molestar fisicamente a ofendida CC, bem sabendo que a ofendida se tratava de sua mãe a quem o arguido devia especial respeito e consideração, contudo, isso não o impediu de agir da forma acima descrita, logrando alcançar os seus intentos de a molestar fisicamente. 64. O arguido actuou com o propósito de, com recurso a modos violentos, perturbar o sentimento de segurança da ofendida CC, afectando-a na sua liberdade pessoal, querendo forçá-la a efectuar, contra a sua vontade, uma disposição patrimonial avultada. 65. O arguido apenas não conseguiu alcançar os seus intentos de obter uma quantia patrimonial por parte da ofendida, com recurso a modos violentos, porquanto a ofendida não cedeu às exigências do mesmo. 66. As expressões supra descritas dirigidas pelo arguido a CC, FF e GG, revestiram foros de seriedade e provocaram nos ofendidos receio, medo e inquietação. 67. O arguido actuou ainda com o propósito de perturbar os ofendidos CC e FF, GG nos seus respectivos sentimentos de segurança e de confiança, amedrontando-os e fazendo-os temer pelas suas vidas, integridade física e vida, o que efectivamente logrou concretizar. 69. O arguido agiu sempre voluntária e conscientemente, conhecendo que a sua conduta era proibida e punida por lei, e actuou com a liberdade necessária para se determinar segundo essa resolução. Mais se provou que Dos antecedentes criminais No âmbito do processo n.º 101/18.9PBFAR, foi o arguido condenado por decisão transitada em julgado em 23.06.2020, pela pratica em 23.01.2018, de um crime de dano qualificado na forma tentada, na pena de 100 dias de multa à razão diária de cinco euros. No âmbito do processo n.º 161/23.0GDPTM, foi o arguido condenado por decisão transitada em julgado em 07.11.2024, pela pratica em 15.03.2023, de um crime de violência doméstica, na pena de dois anos de prisão suspensa por igual período de tempo. Do relatório Social consta: «AA encontra-se no EP de ... desde D/M/2024, à ordem do presente processo. Nesta altura cumpria outras medidas de coacção, que, tendo em conta o agravamento dos seus comportamentos, foram revertidas nesta medida privativa de liberdade. Vivia então com a mãe, na dependência económica desta, uma vez que não exercia actividade laboral. Deste agregado faz parte a mãe, CC, de 45 anos, ..., a avó, EE, de 65 anos, reformada e o irmão FF, de 14 anos. Também a ex-companheira do arguido, DD, chegou a integrar o grupo. Todos estes elementos são vítimas identificadas no presente processo. A dinâmica familiar surgiu muito centrada na imprevisibilidade dos comportamentos e descontrole do arguido face a contrariedades, afigurando-se existir em ambiente relacional de tensão pela iminência das reacções violentas daquele elemento. AA já enfrentou vários processos judiciais, associados a agressões em contexto de relacionamentos íntimos e envolvendo outros membros da família. Assinala-se uma historia de vida marcada por comportamentos disruptivos desde idade precoce, envolvendo organismos ligados à promoção e protecção e à saúde mental infantil. Dos 10 aos 17 anos manteve-se em meio institucional, após o que regressou ao agregado materno. Nesta altura, fruto de uma relação de namoro e gravidez não planeada, registou o nascimento do seu único filho, que conta actualmente 8 anos e com quem não desenvolveu vínculos ou compromissos. Em termos escolares, não progrediu além do 9º ano, por ter desistido antes da conclusão do ensino secundário. Relativamente aos vários contextos familiar, institucional e escolar a sua percepção é negativa, expressando ideias de desamparo injustiça e discriminação, que, do seu ponto de vista são justificativos dos comportamentos disruptivos que foi mantendo até à actualidade. Refere ter começado a trabalhar a partir dos 17 anos, mas o percurso tem sido precário e muito irregular, em actividades diversificadas de cariz indiferenciado. São reportados hábitos de consumo de substancias psicoactivas, designadamente bebidas alcoólicas e canábis, com impacto na vida do arguido, designadamente no tocante a gastos pecuniários, desregulação comportamental e desorganização no cumprimento de obrigações (e.g. trabalho). Em termos de interesses, não se envolve em actividades positivas estruturadas. As tentativas efectuadas de autonomização da família de origem acabaram por fracassar, resultando em situações de sem-abrigo e no recorrente retorno ao agregado materno. O relacionamento amoroso com a ultima companheira, DD, como outros relacionamentos que manteve, foi pautado pela disfuncionalidade e elevados conflitos, envolvendo outros elementos da família. Também aquela foi dando igualmente sinais de risco, associado à sua própria instabilidade e incoerência de comportamentos, que se traduziram designadamente na manutenção de visitas no EP. Em termos futuros, os recursos do arguido são escassos, não perspectivando alternativas consistentes em meio livre. O seu discurso é pouco reflexivo, isento de antecipação realista de problemas e da resolução dos mesmos. AA encontra-se em prisão preventiva, sendo a primeira vez que se vê nesta situação, apesar de registar vários antecedentes de confrontos com o sistema de administração da justiça penal, envolvendo maioritariamente ofensas à integridade física e ameaças em contexto de relações de maior proximidade. Embora reconheça algumas reacções mais intempestivas, tende a legitimar os seus comportamentos através dos actos dos outros e não admite o dano causado às vítimas identificadas, vendo-se a ele próprio como o principal prejudicado nas situações. Já em contexto prisional foi condenado no âmbito do pº nº 161/23.0GDPTM, em 2 anos de pena suspensa, transitada em julgado em 7/11/2024, por crime de violência doméstica. Das medidas anteriores aplicadas em meio livre, contamos sempre com uma difícil adesão e cumprimento de obrigações por parte do arguido, tal como aconteceu no presente processo em que se iniciaram medidas de coacção não privativas de liberdade, que foram posteriormente revogadas. Em contexto prisional, mantém consultas de psiquiatria. Actualmente encontra-se integrado em trabalho de faxina. Por parte da progenitora, o nível de saturação pelos problemas atribuídos ao arguido e preocupações com o impacto destas vivencias no filho mais novo, conduz a que, embora apoie o arguido no EP, não mostre receptividade a voltar a recebê-lo em casa.» Consta da Perícia Psicologia Forense elaborado ao arguido que: «conseguiu-se identificar um perfil de personalidade muito grave, com presença de traços de personalidade de todas as patologias do cluster A e B, em particular, paranóide, esquizoide e esquizotípico (cluster A), e antissocial, borderline, histriónico e narcisista (cluster B), bem como critérios claros para o diagnóstico de psicopatia. Este diagnóstico está associado a um individuo que apresenta um claro desrespeito pelas normas e costumes sociais, elevada impulsividade, falsidade, irritabilidade, agressividade, irresponsabilidade, desrespeito pela segurança de si e dos outros, ausência de remorsos, encanto superficial, sentido grandioso de si mesmo, superficialidade afectiva, deficiente controlo comportamental, comportamentos problemáticos precoces, ausência de objectivos realistas, não acatamento de responsabilidades pelas suas acções, delinquência juvenil e versatilidade criminal. Quanto à personalidade do tipo psicopata, a nossa avaliação foi realizada com base no funcionamento típico do sujeito e não no seu estado atual (avaliação de traços e não de estado), pelo que podemos afirmar que já estava presente à data dos factos. Quanto às alterações na personalidade as mesmas não incapacitam o arguido de perceber o conteúdo e alcance dos factos que pratica.» * 2. FACTOS NÃO PROVADOS (…) 3. Em data não concretamente apurada, mas situada entre o Verão de 2023 e 24-10-2023 o arguido dirigiu-se à ofendida dizendo-lhe que iria fazer mal às suas filhas. Como GG disse à ofendida para não o fazer, aquele, mais uma vez, num tom sério e firme dirigiu-se a GG dizendo-lhe: “não vale a pena dizer isso que eu tenho-a nas minhas mãos”. Que a discussão mantida no dia 13.10.2023 tenha sido relacionada com a intenção do arguido vender o carro pertença da ofendida. 8. Na sequência da referida discussão o arguido desferiu vários murros na cabeça da ofendida e recorrendo a uma navalha picou várias vezes a cabeça da ofendida com a ponta da navalha. 12. Ainda nessas mesmas circunstâncias de tempo, modo e lugar o arguido retirou à ofendida todo o dinheiro que esta trazia consigo, arremessou-lhe pedras, dizendo-lhe ainda que a queria levar para uma zona de mato ali próxima. 17. Nessa ocasião o arguido dirigiu-se a KK dizendo-lhe num tom sério, firme e alto que se levasse consigo a ofendida que iria matá-lo. 18. Mais disse à ofendida que se chamasse alguém para a auxiliar que mataria ambos ali no mato, referindo-se à ofendida e a KK. 19. No dia 23-10-2023 pelas 14:25h, na via pública, concretamente, em Portimão, o arguido apodou a ofendida DD de “vaca” e “puta” e arremessou ao rio o saco que continha os pertences da ofendida. 20. Em data não concretamente apurada mas compreendida entre o verão de 2023 e 13 de outubro de 2023, o arguido cruzou-se na rua com KK (avô das filhas da ofendida), concretamente, no Largo 3 e num tom sério e firme disse-lhe: “andas a meter-te na minha vida, vais ver quando sobrar para ti e para as meninas, vou à escola e apanho-as uma por uma vais ver.” 21. Durante o relacionamento que o arguido manteve com a ofendida, aquele controlou sempre os movimentos daquela, seguindo-a e acompanhando-a para todo o lado, esperando-a junto ao local de trabalho e retirou-lhe todos os documentos e cartões bancários. 22. No dia 02-12-2023, pelas 11h, na via pública, no Largo 3, o arguido dirigiu-se a KK e disse-lhe que lhe ia dar um tiro. 23. No dia 03-12-2023 pelas 18:30h, na via pública, na Localização 4, o arguido dirigiu-se a MM, ex-companheiro da ofendida DD, pai das filhas da ofendida, e disse-lhe: “vou a ..., arrombo a porta e parto a casa toda.” 41. No início de 2024, na sequência de uma discussão com a ofendida DD relacionada com uns documentos que esta tinha que assinar o arguido desferiu uma chapada na face de DD. 45. As agressões supra descritas ocorreram dentro do carro onde o arguido e a ofendida pernoitaram desde o Verão de 2023 até Dezembro do mesmo ano. 36. Já em datas anteriores o arguido agrediu CC, sua mãe, concretamente, no dia 25-05-2023 por esta se ter recusado atender a um pedido daquele, o arguido forçou e estroncou a porta de entrada na habitação da ofendida CC e desferiu-lhe um soco na boca. 68. O arguido actuou ainda com o propósito de perturbar os ofendidos KK e MM, nos seus respectivos sentimentos de segurança, amedrontando-os e fazendo-os temer pela saúde e integridade física, o que efectivamente logrou concretizar. 2.2. Thema Decidendum Em primeiro momento, como questão prévia, e por se poder revelar, eventualmente, a existência de vício de conhecimento oficioso, um debruce sobre o caminho seguido pelo tribunal recorrido, quanto à vertente relativa às condições pessoais e situação económica do aqui agente, traço importante para escolha e determinação da medida da pena – artigo 71º, nº 1, alínea c) do CPenal -, tanto mais que se exibe como o único segmento aqui em dissídio. Na esteira do que vem sendo uma linha seguida nos mais diversos arestos, a qual se assume como pouco rigorosa, e muitas vezes reveladora de ausência de qualquer valoração crítica, também aqui se enfileira na fórmula (…) Do relatório Social consta (…) Consta da Perícia Psicologia Forense elaborado ao arguido (…), resultando numa reprodução pura e simples de partes do relatório social e de uma perícia realizada, as quais se transcrevem na íntegra onde, para além de factos, se fazem referências valorativas, opinativas, meramente descritivas, e em muitos segmentos de conteúdo sem qualquer efeito ponderativo. Ou seja, na verdade, neste tipo de repetido posicionamento, ilustrativo de pouco cuidado, o que se dá como provado é que o relatório social e / ou outros documentos, apresentam / exibem um determinado conteúdo, elenca referências várias, e já não os factos concretos que o mesmo possa abrigar. Este retrato, ao que se entende, é passível de conduzir à nulidade expressa no artigo 379º, nº 1, alínea a), por referência ao artigo 374º, nº 2, ambos do CPPenal, na medida em que se pode desenhar a ausência de enumeração de factos provados necessários e suficientes para a determinação da medida da pena e, sequentemente, para a escolha da pena em concreto6, entendendo outros, poder configurar-se a mácula constante da alínea a) do nº2 do artigo 410º do CPPenal – insuficiência da matéria de facto para a decisão7. Todavia, tendo em atenção o modo como o tribunal a quo discorreu sobre este conspecto na decisão – O Tribunal teve igualmente em atenção os documentos que se encontram juntos aos autos (…) teve ainda em atenção o relatório social junto aos autos (…) -, ou seja, perante este explicativo parece haver um sinal / dado, minimamente consistente, de que o tribunal considerou como provados os factos (reitera-se apenas os factos) que constam dos ditos documentos, os quais transcreveu e reproduziu, e assim sendo, fez um excurso mínimo bastamente e necessário para firmar a materialidade provada. Mostra-se patente, por todo o expendido, não ser este o melhor e mais adequado e apurado dos rumos a encetar nesta dimensão, sendo recomendável e esperável um outro ensaio inequívoco e de pendor mais cristalino. Conquanto, ainda assim, parece não emergir uma falha tal que elucide a supra adiantada mácula a suscitar outra intervenção, para além desta nota. Ultrapassada esta vicissitude recursória, há que prosseguir na demanda suscitada pelo arguido recorrente, ou seja, ponderar sobre a bondade da pena única imposta. * No presente intento recursivo pretende reagir-se contra a pena única arbitrada, sendo que o arguido AA vem pugnar no sentido de que considera que (…) deverá a pena única aplicada no tribunal de instância ser substituída por outra que oscile entre os cinco e seis anos de prisão e não a que lhe foi aplicada. Como alicerce desta pretensão adianta (…) desde jovem que padece de problemas do foro psiquiátrico além de consumir substâncias psicoactivas que, quando associados influenciam de forma negativa o seu comportamentos para com as outras pessoas, originando comportamentos disruptivos e agressivos que deram origem ao presente processo (…) os referidos problemas do Recorrente não foram atendidos aquando da escolha da medida da pena única (…) Também ficou provado (…) que o arguido quando estava sóbrio era uma pessoa meiga (…) reconhece que deverá ser alvo de punição face às suas condutas e, inclusive concorda com a aplicação de uma pena efetiva tal como lhe aconteceu porém, a aplicação uma pena de prisão de oito anos e seis meses mostra-se excessiva, tendo em atenção os parâmetros legais e de direito (…) os problemas aditivos e psiquiátricos que deveriam ter atendidos (…). De seu lado, a decisão em questionamento, nesta matéria aponta (…) No caso fazem-se sentir particulares necessidades de prevenção geral, pelo crescente número de ilícitos desta natureza que têm ocorrido (…) pela elevada insegurança que os mesmos geram na comunidade (…) o modo de execução dos factos, a pouca longevidade dos mesmos, a idade da ofendida mãe e avó, as ofensas à companheira e as suas consequências, é médio o grau de ilicitude dos factos, e elevada a gravidade das suas consequências (…) todas as condutas do arguido são graves e atentam contra a vida em sociedade (…) actuou com dolo directo, sabia perfeitamente o que estava a fazer atento o que transparece no relatório psiquiátrico junto (…) não mostrou qualquer arrependimento, e mostrou uma postura de total vitimização perante o Tribunal (…) à luz dos critérios supra expostos, tendo em consideração, no seu conjunto, os factos praticados pelo arguido e a personalidade revelada pelo mesmo, sendo que a moldura se encontra entre quatro anos e doze anos e seis meses de prisão, entendemos adequado e proporcional fixar a pena única em oito anos e seis meses de prisão. Em pronto passo, registe-se que vem sendo entendimento pacífico e sedimentado que o recurso em matéria de pena, não é uma oportunidade para o tribunal ad quem fazer um novo juízo sobre a decisão em revista, sendo antes um meio de corrigir o que de menos próprio foi decidido pelo Tribunal recorrido e que sobreleve de todo espetro decisório. Também, e ao que se pensa, exige-se ao recorrente o ónus de demonstrar perante o tribunal de recurso o que de errado ocorreu nesta vertente. Verdadeiramente, tanto quanto se crê, há muito que a doutrina e jurisprudência se mostram pacificamente assentes, no sentido de que em sede de medida da pena, o recurso não deixa de reter o paradigma de remédio jurídico, apontando para que a intervenção do tribunal de recurso, se deve cingir à reparação de qualquer desrespeito, pelo tribunal recorrido, dos princípios e regularidade que definem e demarcam as operações de concretização da pena na moldura abstrata determinada na lei, sendo que observados os critérios globais insertos no artigo 71º do CPenal, a margem do julgador dificilmente pode ser sindicável8. Diga-se, assim, que o exame da concreta medida da pena estabelecida, suscitado pela via recursiva, não deve afastar-se desta, senão, quando haja de prevenir-se e emendar-se a fixação de um determinado quantum em derrogação dos princípios e regras pertinentes, cumprindo precaver (desde logo à míngua da imediação e da oralidade de que beneficiou o Tribunal a quo) qualquer abusiva fixação de uma concreta pena que ainda se revele congruente, proporcional, justa e acertada9. Estando em causa a discordância quanto à pena única, há que apelar às regras / padrão de punição do concurso de crimes emergente do artigo 77º do CPenal. Aqui encara-se o sistema da pena conjunta, rejeitando-se uma visão atomística da pluralidade de crimes, e nessa medida, obriga a que se olhe para o conjunto – para a possível conexão dos factos entre si e para a necessária relação de todo esse bocado de vida criminosa com a personalidade do seu agente. Nesse trajeto, encontradas as penas parcelares correspondentes a cada um dos singulares factos, cabe ao tribunal, depois de estabelecida a moldura do concurso, encontrar e justificar a pena conjunta, cujos critérios legais de determinação são diferentes dos propostos para a primeira etapa. Quanto ao segundo momento, importa essencialmente atender à unicidade / visão de conjunto, abandonando a ideia de compartimentação em que se fundou a construção de cada uma das molduras singulares que, não apagando a pluralidade de ilícitos perpetrados, antes a converte numa nova conexão de sentido, entendendo-se que a este novo ilícito corresponderá uma nova culpa (que continuará a ser culpa pelo facto) mas, agora, culpa pelos factos em relação. Ou seja, a pena única deve formar-se mediante uma valoração completa da personalidade do agente e das diversas penas parcelares, sendo por isso necessário que se obtenha uma visão integrada dos factos, a relação dos diversos factos entre si em especial o seu contexto, a maior ou menor autonomia, a frequência da comissão dos delitos, a diversidade ou igualdade dos bens jurídicos protegidos violados e a forma de comissão, bem como o peso conjunto das circunstâncias de facto sujeitas a julgamento10. Impõe-se o equacionar, em conjunto, a pessoa do autor e os delitos individuais, de modo que a formação da pena global não é uma elevação esquemática ou arbitrária da pena disponível mas deve sempre refletir a personalidade do autor e os factos individuais num plano de conexão e frequência, sendo que na valoração da personalidade do agente deve, apurar-se, antes de tudo, se os factos são expressão de uma inclinação criminosa ou só constituem delitos ocasionais sem relação entre si11. Há a reter, também, que não emergindo do ordenamento penal português o sistema de acumulação material (soma das penas com mera limitação do limite máximo) nem o da exasperação ou agravação da pena mais grave (elevação da pena mais grave, através da avaliação conjunta da pessoa do agente e dos singulares factos puníveis, elevação que não pode atingir a soma das penas singulares nem o limite absoluto legalmente fixado), é forçoso concluir que com a fixação da pena conjunta se pretende sancionar o agente, não só pelos factos individualmente considerados, mas também, e especialmente, pelo seu conjunto, este visto não como mero somatório de factos criminosos, mas enquanto revelador da dimensão e gravidade global do comportamento delituoso do agente, visto que a lei manda se considere e pondere, em conjunto os factos e a personalidade do agente12. Releva, ainda, a ponderação do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização)13. Toda esta métrica, reclama, por isso, que se fundamente a opção a tomar, por forma a que a medida da pena do concurso não surja como fruto de um ato intuitivo – da «arte» do juiz – ou puramente mecânico e, portanto, arbitrário, pese embora aqui, o dever de fundamentação não assuma nem o rigor nem a extensão dimanados do artigo 71º, podendo, contudo, os fatores enumerados no nº 2 deste inciso servir de mote enformador. Debruçando um olhar no caso sub judice, como primeira nota que importa reter, emerge alguma fragilidade / superficialidade na fundamentação deste matiz decisório, revelando o Tribunal a quo um mínimo esforço justificativo que, ainda assim, se reputa de aceitável pois, alimenta-se, basicamente, no que considerou para a escolha e determinação concreta de cada uma das penas parcelares. Em termos de pena única, tem-se como dosimetria a pena de 4 (quatro) a 12 anos e 10 (dez) meses de prisão. O quadro em presença revela sérias preocupações em termos de prevenção geral, considerando os bens jurídicos em causa, mormente considerando os crimes de violência doméstica perpetrados, que cada vez mais proliferam, reclamando uma robusta e séria intervenção. Diga-se, ainda, nesta vertente, a repulsa que determinado agir desencadeia no seio comunitário quando, para além de vítima parceira e / ou parceiro, surgem familiares próximos como é o caso – avó, mãe e irmão. A sublinhar, o dolo direto que acompanhou toda a ação do arguido, a repetição do mesmo tipo de comportamento dirigido a diversas pessoas da sua família, sem o menor laivo de arrependimento e / ou capacidade de controlo dos seus ímpetos. Urge, também, realçar o elevado grau de ilicitude que encerra todo o seu estar e, bem assim, as evidentes e severas consequências para as vítimas advindas dos factos cometidos pelo arguido, traduzidas nas lesões físicas e consequências psicológicas àquelas causadas. O arguido exibe já uma condenação anterior por crime de violência doméstica, não assumiu os factos e não esboçou qualquer traço de arrependimento. Tal permite concluir pela total ausência de sentido crítico, incapacidade de autocensura e de se nortear conforme o direito e o quadro normativo vigente. Por fim, aponte-se que a circunstância de ter problemas aditivos, para além de não poder ser justificação para todo o seu agir, é aspeto que cabendo ao arguido ultrapassar / debelar, ao que se pensa, não se apresenta como algo que lhe foi imposto mas sim como resultado de uma escolha sua. Faceando, a pena única aplicada de 8 anos e 6 meses de prisão, situando-se um pouco acima da mediania possível – 8 anos e 5 meses -, não merece qualquer censura e, por isso, não suscita intervenção por banda deste Alto Tribunal. III - Dispositivo Nestes termos, acordam os Juízes da 3ª Secção Criminal deste Supremo Tribunal de Justiça em julgar improcedente o recurso interposto pelo arguido AA e, consequentemente, decidem manter, a decisão recorrida. * Custas a cargo do arguido recorrente, fixando-se a Taxa de Justiça em 6 (seis) UC – artigos 513º, nº 1 do CPPenal e artigo 8º, por referência à Tabela III Anexa, do RCP. * O Acórdão foi processado em computador e elaborado e revisto integralmente pelo Relator (artigo 94º, nº 2, do CPPenal), sendo assinado pelo próprio e pelos Senhores Juízes Conselheiros Adjuntos. * Supremo Tribunal de Justiça, 17 de setembro de 2025 Carlos de Campos Lobo (Relator) Jorge Raposo (1º Adjunto) José Vaz Carreto (1º Adjunto) ________
1. Consigna-se que apenas se transcrevem as partes do texto que não constituem a reprodução dos diversos articulados existentes e já referidos no Relatório e, bem assim, excertos do Acórdão propalado em 1ª instância. 2. Ac. STJ de 03.07.2024, relatora Ana Barata de Brito, processo 72/73.0GCPBL.C1.S1. 3. Publicado no Diário da República de 28 de dezembro de 1995, na 1ª Série A. 4. SILVA, Germano Marques da, Direito Processual Penal Português, vol. 3, 2015, Universidade Católica Editora, p. 335; SIMAS SANTOS, Manuel e LEAL-HENRIQUES, Manuel, Recursos Penais, 8ª edição, 2011, Rei dos Livros, p. 113. 5. Neste sentido, que constitui jurisprudência dominante, podem consultar-se, entre outros, o Acórdão do STJ, de 12/09/2007, proferido no Processo nº 07P2583, que se indica pela exposição da evolução legislativa, doutrinária e jurisprudencial nesta matéria, disponível em www.dgsi.pt. 6. Neste sentido o Acórdão do STJ de 8/07/2022, proferido no Processo nº 469/21.0GACSC.S1 – (…) Os factos provados com origem no Relatório devem ser elencados de modo claro e inequívoco. Mas só os factos relevantes (…) Não devem ser levados aos factos provados trechos do relatório, mas os concretos factos. Consignar nos factos provados que “do relatório social consta”, seguindo-se uma transcrição (…) não tem valor probatório como facto provado, apenas se prova que no relatório consta essa afirmação (…) Essa desconformidade nem sempre representará nulidade (arts. 374.º/2 e 379.º/1/a), nomeadamente quando da motivação se apreende que o tribunal considerou como provados todos os factos constantes do relatório social que transcreveu (…) – disponível em www.dgsi.pt. 7. Neste sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 5/04/2022, proferido no Processo nº 381/20.PCSTB.E1, disponível em www.dgsi.pt. 8. Neste sentido, entre outros, os Acórdãos do STJ de 11/04/2024, proferido no Processo nº 2/23.9GBTMR.S1 (…) em conformidade com a jurisprudência uniforme do STJ no sentido da abstenção de princípio do tribunal de recurso na definição do quantum concreto das penas fixadas em tais circunstâncias, por não se verificar qualquer desvio daqueles critérios e parâmetros de que resulte uma situação de injustiça das penas, por desproporcionalidade ou desnecessidade -, de 18/05/2022, proferido no Processo nº 1537/20.0GLSNT.L1.S1 – (…) A sindicabilidade da medida concreta da pena em recurso abrange a determinação da pena que desrespeite os princípios gerais respectivos, as operações de determinação impostas por lei, a indicação e consideração dos factores de medida da pena, mas “não abrangerá a determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto de pena, excepto se tiverem sido violadas regras da experiência ou se a quantificação se revelar de todo desproporcionada” -, de 19/06/2019, proferido no Processo nº 763/17.4JALRA.C1.S1- (…) justifica-se uma intervenção correctiva quanto à pena aplicada ao arguido, reduzindo-se a pena de (…) para (…) que entendemos adequada e justa e proporcional e que satisfaz as exigências de prevenção, respeitando a medida da culpa - , disponíveis em www.dgsi.pt.↩︎ 9. Neste sentido, o Acórdão do STJ de 27/05/2009, proferido no Processo nº 09P0484, disponível em www.dgsi.pt, onde se pode ler (…) no recurso de revista pode sindicar-se a decisão de determinação da medida da pena, quer quanto à correcção das operações de determinação ou do procedimento, à indicação dos factores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis, à falta de indicação de factores relevantes, ao desconhecimento pelo tribunal ou à errada aplicação dos princípios gerais de determinação, quer quanto à questão do limite da moldura da culpa, bem como a forma de actuação dos fins das penas no quadro da prevenção, mas já não a determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto da pena, salvo perante a violação das regras da experiência, ou a desproporção da quantificação efectuada. 10. Neste sentido, entre outros, o Acórdão do STJ de 28/4/2010, proferido no Processo 4/06.0GACCH.E1.S1, disponível em www.dgsi.pt. - I - Fundamental na formação da pena conjunta é a visão de conjunto, a eventual conexão dos factos entre si e a relação «desse bocado de vida criminosa com a personalidade». A pena conjunta deve formar-se mediante uma valoração completa da pessoa do autor e das diversas penas parcelares. Para a determinação da dimensão da pena conjunta o decisivo é que, antes do mais, se obtenha uma visão conjunta dos factos, ou seja, a relação dos diversos factos entre si em especial o seu contexto; a maior ou menor autonomia; a frequência da comissão dos delitos; a diversidade ou igualdade dos bens jurídicos protegidos violados e a forma de comissão bem como o peso conjunto das circunstâncias de facto sujeitas a julgamento mas também a receptividade à pena pelo agente deve ser objecto de nova discussão perante o concurso ou seja a sua culpa com referência ao acontecer conjunto da mesma forma que circunstâncias pessoais, como por exemplo uma eventual possível tendência criminosa. II - Será, assim, o conjunto dos factos que fornece a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade – unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma «carreira») criminosa, ou tão-só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta. De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização). III - A substituição daquela operação valorativa por um processo de índole essencialmente aritmética de fracções e somas torna-se incompatível com a natureza própria da segunda fase do processo. Com efeito, fazer contas indica voltar às penas já medidas, ao passo que o sistema parece exigir um regresso aos próprios factos. Dito de outro modo, e como refere Cláudia Santos (RPDC, Ano 16.º, pg. 154 e ss.), as operações aritméticas podem fazer-se com números, não com valorações autónomas. IV - Por outro lado, importa determinar os motivos e objectivos do agente no denominador comum dos actos ilícitos praticados e, eventualmente, dos estados de dependência. Igualmente deve ser expressa a determinação da tendência para a actividade criminosa revelada pelo número de infracções, pela sua perduração no tempo, pela dependência de vida em relação àquela actividade. V - Na avaliação da personalidade expressa nos factos é todo um processo de socialização e de inserção, ou de repúdio, pelas normas de identificação social e de vivência em comunidade que deve ser ponderado. 11. Neste sentido, entre outros, os Acórdãos do STJ, de 27/05/2015, proferido no Processo nº 173/08.4PFSNT-C.S1, de 14/07/2022, proferido no Processo nº 36/15.7PDCSC-A.S1 - para a determinação da medida da pena única, como já acima se disse, há que ponderar o conjunto dos factos que integram os crimes em concurso, procedendo-se a uma avaliação da gravidade da ilicitude global dos mesmos (tendo em conta o tipo de conexão entre os factos em concurso), e a uma avaliação da personalidade do agente (aferindo-se em que termos é que a mesma se projecta nos factos por si praticados), de forma a apurar se a sua conduta traduz já uma tendência para a prática de crimes, ou se a sua conduta se reconduz apenas a uma situação de pluriocasionalidade (…) -, de 24/03/2021, proferido no Processo nº 536/16.1GAFAF.S1 - (…) na determinação da pena única devem considerar-se todos os factos, crimes e penas aplicados, para a obtenção da imagem do “comportamento global” e da personalidade do agente (…), disponíveis em www.dgsi.pt. 12. Neste sentido, DIAS, Jorge de Figueiredo, Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, 1993, Aequitas – Editorial Notícias, pp. 290-292. 13. Neste sentido, DIAS, Jorge de Figueiredo, ibidem, p. 292. |