Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
21244/17.0T8PRT.P1.S1
Nº Convencional: 1.ª SECÇÃO
Relator: MANUEL AGUIAR PEREIRA
Descritores: RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL
ACIDENTE DE VIAÇÃO
DANO BIOLÓGICO
DANOS FUTUROS
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
CÁLCULO DA INDEMNIZAÇÃO
PERDA DA CAPACIDADE DE GANHO
CRITÉRIOS
EQUIDADE
PODERES DE COGNIÇÃO
PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Data do Acordão: 02/06/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA
Sumário :
1 – Não diverge de modo flagrante dos padrões de avaliação jurisprudencial do dano de natureza não patrimonial sofrido por um jovem adulto de 23 anos de idade que, num acidente de viação a que não deu causa, sofreu graves lesões físicas com um grau de quantum doloris associado de 6 numa escala de 7, que viriam a demandar até à sua consolidação médico legal um período de cerca de dois anos e meio, a provocar um défice permanente de integridade físico-psíquica de 61 pontos numa escala de 100, e a persistência de dores físicas, incómodo e mal estar que as sequelas das lesões lhe causam, o valor de € 175.000,00 (cento e setenta e cinco mil euros);

2 -Tendo o lesado á data do acidente 23 anos de idade e trabalhado anteriormente como cortador de carnes verdes auferindo então salário mensal de cerca de 591,00 euros, considerando a esperança de vida para os homens da sua idade em Portugal e que as lesões sofridas lhe causaram em défice de integridade físico-psíquica de 61 pontos com incapacidade total para o exercício da sua anterior actividade profissional, ainda que sem compromisso do eventual exercício de outras profissões compatíveis com a área da sua preparação técnica que não envolvam a execução de tarefas complexas, o juízo de equidade a formular em relação aos previsíveis danos de natureza patrimonial, nomeadamente por perdas salariais que virá a sofrer no futuro, apontam para o valor de uma indemnização de cerca de 270.000,00 (duzentos e setenta mil euros ).

Decisão Texto Integral:

EM NOME DO POVO PORTUGUÊS, acordam os Juízes Conselheiros da 1.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça:


◌ ◌



RELATÓRIO

Parte I – Introdução

1) AA instaurou a presente ação declarativa sob a forma de processo comum contra “Caravela, Companhia de Seguros, S.A.”, pedindo a sua condenação a pagar a quantia global de € 484.728,00 (quatrocentos e oitenta e quatro mil setecentos e vinte e oito euros), acrescida de juros de mora contados desde a citação e até integral e efetivo pagamento.

Alegou, em suma, ter sido lesado num acidente de viacção ocorrido em ... de setembro de 2016 com o veículo ..-PI-.. em que seguia como passageiro, tendo o veículo automóvel em causa entrado em despiste ao descrever uma curva por imperícia do seu condutor, sendo que a respectiva proprietário transferira para a ré a responsabilidade civil derivada da respectiva circulação.

Posteriormente o autor requereu a ampliação do pedido para o valor de € 1.279.728,00 (um milhão duzentos e setenta e nove mil setecentos e vinte e oito euros), para ressarcimento de danos futuros relacionados com a necessidade de ser assistido por terceira pessoa, o que foi deferido.

2) A ré contestou alegando não estar obrigada a garantir qualquer indemnização ao autor por o seguro ter sido realizado através de declarações inexactas por parte da proprietária do veículo interveniente quanto à identificação do condutor habitual do veículo, circunstância com influência sobre o risco assumido e a quantificação do prémio do seguro, não estando obrigada a suportar o dano que o sinistro que tenha causado, devendo considerar-se anulado o contrato com efeitos a 17 de fevereiro de 2016.

Sem prescindir, impugnou a factualidade alegada pelo autor e alegou que este também é responsável pelos danos por ele sofridos por circular sem cinto de segurança colocado.

A seguradora requereu a intervenção acessória da tomadora do seguro e do condutor do veículo interveniente.

3) O autor, por sua vez, no articulado de resposta requereu também a intervenção principal do Fundo de Garantia Automóvel, da proprietária e do condutor do veículo automóvel sinistrado, a qual foi admitida.

Os intervenientes, tendo contestado, pediram a sua absolvição do pedido.

4) Foi dispensada a realização da audiência prévia e proferido despacho saneador em que foi identificado o objeto do litígio e enunciados os temas da prova.

A requerimento da seguradora ré foi determinada a apensação da acção instaurada pelo Centro Hospitalar e Universitário ..., EPE contra os aqui intervenientes e onde foi pedida a condenação dos ali réus ao pagamento total de 79.987,28 €, acrescidos dos juros vencidos peticionados, no montante de 6.148,16 €, perfazendo um total de 85.135,44 € e juros vincendos até efetivo e integral pagamento.

5) Realizada audiência final foi proferida sentença, que julgou a acção nos seguinte termos:

“Julga-se parcialmente procedente a presente ação, e, consequentemente:

a) Condena-se a Ré, Caravela – Companhia de Seguros, S. A., a pagar ao autor AA a quantia de € 362.215,58, no entanto, opera-se a compensação de € 6.000,00 pagos a título de reparação provisória, pelo que fica a ré obrigada a pagar a quantia de € 356.215,58 (trezentos e cinquenta e seis mil duzentos e quinze euros e cinquenta e oito cêntimos), bem como juros moratórios legais civis, contados desde a citação até efetivo e integral pagamento.

b) Condena-se a ré a pagar ao autor AA a quantia a liquidar em execução de sentença relativo ao valor correspondente a apoio de terceira pessoa até ao limite de € 700.000,00, nos termos do artigo 609.º n.º 2 do Código de Processo Civil.

c) Condena-se a ré a pagar ao Centro Hospitalar e Universitário ..., EPE o valor de € 78.987,28 (setenta e oito mil novecentos e oitenta e sete euros e vinte e oito cêntimos), bem como juros de mora vencidos no montante de € 6.148,16 (seis mil cento e quarenta e oito euros e dezasseis cêntimos) e os juros de mora vincendos à taxa legal.

d) Julga-se improcedente o remanescente do pedido deduzido pelo autor AA e dele se absolve a ré.

e) Absolve-se os Intervenientes Principais, BB, CC e Fundo de Garantia Automóvel da presente ação”.

6) De tal sentença proferida em primeira instância apelaram para o Tribunal da Relação do Porto a seguradora ré e o autor, versando, além do mais, a primeira o valor das indemnização arbitrada a título de danos não patrimoniais e o segundo o dos danos patrimoniais futuros.

7) Por seu acórdão de 8 de maio de 2023 o Tribunal da Relação do Porto julgou a apelação interposta pela seguradora ré parcialmente procedente e a apelação interposta pelo autor inteiramente procedente, assim revogando parcialmente a sentença recorrida e condenando a ré seguradora a pagar ao autor a quantia de € 575.000,00 (quinhentos e setenta e cinco mil euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais e patrimoniais futuros, deduzindo depois a quantia de € 12.000,00 (doze mil euros) já adiantados pela ré, mantendo tudo o mais decidido pela sentença de primeira instância.


◌ ◌



Parte II – A Revista

8) Inconformada com o teor do acórdão do Tribunal da Relação do Porto a seguradora ré interpôs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça.

Nas suas alegações de recurso formula as CONCLUSÕES que se transcrevem:

“1 – O presente recurso tem por objeto a parte do douto acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, que julgou totalmente procedente o recurso do autor, aumentando a indemnização fixada pela primeira instância para o montante de 175.000,00 €, no que concerne aos danos não patrimoniais, e para aquantia de 400.000,00 €, no que respeita ao dano patrimonial futuro.

2 – A recorrente discorda da quantificação do dano não patrimonial efetuada pelo tribunal a quo. A indemnização por danos não patrimoniais tem por finalidade proporcionar um certo desafogo económico que de algum modo mitigue as dores, desilusões, desgostos e outros sofrimentos suportados e a suportar, proporcionando uma melhor qualidade de vida, fazendo eclodir um certo otimismo que permita encarar a vida de uma forma mais positiva. Isto é, esta indemnização destina-se a proporcionar, na medida do possível, ao autor, uma compensação económica que lhe permita satisfazer com mais facilidade as suas necessidades primárias que possam constituir um alívio e um consolo para o mal sofrido. O quantum indemnizatório fixado pela Relação extravasa essas finalidades.

3 – Em primeiro lugar, a decisão que fixa a indemnização pelos danos não patrimoniais não é uma decisão atualizadora. A mesma condena em juros de mora a contar da citação, ou seja, desde 13 de novembro de 2017.

4 – À taxa de 4% ao ano, os juros atingirão, em 13 de novembro de 2023, o total de 24%, o que significa uma verba que rondará os 42.000,00 €, se calculados sobre o montante de 175.000,00 €, o que alavanca a indemnização para os 217.000,00 €.

5 – A decisão não fez uso do artigo 566.º, n.º 2 do Código Civil, que determina que, sem prejuízo do preceituado noutras disposições, a indemnização em dinheiro tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, e a que teria nessa data se não existissem danos.

6 – Caso tivesse havido uma decisão atualizadora, a mesma, nos termos do Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 4/2002, publicado na I Série do DR de 27/06, teria determinado a contagem de juros de mora a partir da decisão atualizadora e não a partir da citação.

7 – Não se tendo procedido à prolação de uma decisão atualizadora, a mesma, condenando no pagamento de juros de mora desde 13/11/2017, tem que ser entendida como se reportando a esse ano de 2017.

8 – Ora, reportando-se ao ano de 2017, a fixação da indemnização pelos danos não patrimoniais, no montante de 175.000,00 €, resulta deveras exagerada e desequilibrada.

9 – Em segundo lugar, refere o acórdão proferido pelo tribunal a quo que o sinistrado “tinha uma modesta condição económica atendendo a que então não trabalhava e quando o fazia auxiliava a sua família, o que demonstra também a sua modesta condição económica”. Essa asserção da Relação do Porto não corresponde à realidade.

10 – O autor AA trabalhava no Brasil, onde exercia a profissão de magarefe, auferindo, nesse país, o equivalente, em Portugal, a 591,00 €, e veio para a Europa em passeio, efetuando os caminhos de Santiago, tendo passado por Espanha antes de vir para Portugal, em data não apurada. Aliás, finalizou o seu percurso, em ..., no dia 27 de agosto de 2016, e o acidente deu-se em 04/09/2016. Vejam-se os seguintes factos provados:

“1) No verão de 2016, o Autor, cidadão de nacionalidade brasileira e até ali naquele país residente, decidiu viajar para a Europa para, entre outros, fazer os caminhos de Santiago e, mais concretamente, o caminho ....

2) Em 6 de agosto de 2016, o Autor deu início ao percurso do mencionado caminho que veio a finalizar em ... no dia 27 do mesmo mês e ano (documento que se junta sob o n.º 1 e que, como os demais adiante juntos, se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).

3) De Espanha veio para Portugal em data não apurada. (…)

43) Antes do sinistro, o Autor trabalhava num supermercado, na secção de talho, onde auferia a quantia mensal de 2.200 reais, o equivalente, sensivelmente, a €591,00.

44) Com tal montante provia ao seu sustento e ao da sua família (mãe e irmã), pagando a renda de casa, as despesas com água, luz e internet.

(…)

46) Assim, não só perdeu o seu emprego e o seu meio de sustento como deixou de prover ao sustento da sua família”.

11 - Não é, pois, verdade, o segmento do acórdão em crise, que brande com o desemprego e modesta situação económica do autor para justificar a necessidade do reforço do valor da indemnização por danos não patrimoniais.

12 – Em terceiro lugar, o valor de 175.000,00 € afasta-se imenso do quantitativo que melhor eco encontra na jurisprudência. Vejam-se, entre outros, os seguintes acórdãos deste Colendo Tribunal, cujo teor se encontra citado supra, no corpo das alegações:

Acórdão STJ-19-01-2016Revistan.º3265/08.6TJVNF.G1.S1 - 6.ªSecção José Raínho (Relator);

Acórdão do STJ 11-02-2016 - Revista n.º 1104/12.2T2AVR.P1.S1 - 2.ª Secção João Trindade (Relator);

Acórdão do STJ de 17-03-2016, proferido no âmbito do processo nº 338/09.1TTVRL.P3.G1.S1;

Acórdão do STJ de 13-07-2017, proferido no âmbito do processo nº 3214/11.4TBVIS.C1.S1;

Acórdão proferido em 09-01-2018 - Revista n.º 275/13.5TBTVR.E1.S1 - 6.ª Secção José Raínho (Relator);

Acórdão do STJ 07-09-2020 - Revista n.º 5466/15.1T8GMR.G1.S1 - 6.ª Secção José Raínho (Relator);

Acórdão deste Tribunal proferido no processo n.º 4961/16.0T8LSB.L1.S1, em 14 de julho de 2021, em que foi relator Ferreira Lopes;

Acórdão doSTJde19-10-2021-Revistan.º7098/16.8T8PRT.P1.S1-7.ªSecção Manuel Capelo (Relator);

Acórdão do STJ proferido em 17-11-2021 - Revista n.º 563/18.4T8AVR.P1.S1 - 6.ª Secção - Henrique Araújo (Relator); e

Acórdão do STJ de 21-06-2022, em que foi relator António Magalhães.

13 – Em conclusão, tudo considerado quanto ao quadro factual julgado provado e tendo em conta as lesões, as dores, as angústias, as ansiedades, os desgostos sofridos, ponderando ainda as sequelas permanentes e graves de que ficou a padecer o autor (com caráter permanente e limitativo), o quantum doloris elevado (de grau 6 numa escala crescente de 1 a 7), o dano estético de grau 4, a repercussão nas atividades desportivas e de lazer (graduadas no plano 3, também na dita escala crescente de 1 a 7), a idade da vítima e as demais afeções sofridas, à luz do que decorre dos factos provados, afigura-se que o incremento introduzido pelo tribunal a quo no valor fixado pela primeira instância, não é adequado nem equitativo à reparação dos danos não patrimoniais sofridos.

14 – Propugna-se, por conseguinte, que o douto acórdão da Relação do Porto seja revogado na parte em julgou procedente o recurso do autor, ao aumentar a indemnização por danos não patrimoniais em mais 50.000,00 €.

15 - No que tange ao dano patrimonial futuro, se a ré defendia, em sede de apelação, um valor indemnizatório inferior ao fixado pela primeira instância, não consegue alcançar como foi possível a Relação arbitrar, a este título, a verba manifestamente excessiva de 400.000,00 €.

16 – Com relevo para a análise desta vertente indemnizatória, imposta atentar no facto provado 47, que é do seguinte teor:

“47) Apesar dos tratamentos a que se submeteu o Autor ficou a padecer definitivamente:

a) Défice funcional permanente ao nível da comunicação,

b) Défice de compreensão,

c) Dificuldades de locomoção,

d) Défice ao nível da compreensão do mundo exterior,

e) Défices de memória,

f) Amnésia relativamente à época em que ocorreu o sinistro

g) Dificuldades / défice ao nível da orientação espaço-temporal;

h) Perda de visão

i) Deformidade do olho esquerdo.

Sequelas que lhe determinam uma IPG de 60,97301 pontos, numa escala de 1/100.

48) De acordo com o relatório médico-legal e suas conclusões:

A data da consolidação médico-legal das lesões é fixável em 25/03/2019;

Período de Défice Funcional Temporário Total num período de 256 dias;

Período de Défice Funcional Temporário Parcial de 677 dias;

Período de Repercussão Temporária na Actividade Profissional Total de 933 dias;

Quantum Doloris no grau 6/7;

Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica de 61 pontos;

As sequelas são, em termos de Repercussão Permanente na Actividade Profissional, impeditivas do exercício da actividade profissional habitual, cortador de carnes verdes, podendo ser, no entanto, compatíveis com outras profissões da área da sua preparação técnico profissional, que não exijam a execução de tarefas complexas;

Dano estético permanente no grau 4/7;

Repercussão Permanente nas actividades desportivas e de lazer no grau 3/7;

Repercussão permanente na actividade sexual no grau 4/7;

Ajudas técnicas permanentes, medicamentosas, tratamentos médicos, ajudas técnicas, ajuda de terceira pessoa.”

17 – Em primeiro lugar, não corresponde à realidade o que vem escrito no acórdão da Relação do Porto, quando menciona que o lesado ainda não exerceu uma atividade profissional ou que se encontra desempregado e é ainda relativamente jovem, devendo-se, por isso, seguir a corrente jurisprudencial que pondera o valor do salário médio nacional.

18 – O autor trabalhava no Brasil como cortador de carnes verdes, onde auferia 2.200,00 reais – o equivalente a 591,00 € - facto provado 43. Trabalhando e auferindo esse vencimento, decidiu vir para a Europa percorrer os Caminhos de Santiago, e, mais concretamente, o caminho ... – facto provado n.º 1. Terminou de percorrer os caminhos em 27 de agosto de 2016, em ..., e partiu para Portugal em data não apurada. O acidente deu-se em .../09/2016.

19 – O lesado não é, portanto, alguém nunca tenha trabalhado ou que estivesse desempregado. Trata-se de uma pessoa oriunda do Brasil que, com o dinheiro que ganhava, conseguiu viajar até à Europa, e com os rendimentos que auferia, provia ao seu sustento e ao da sua família (mãe e irmã), pagando a renda de casa, as despesas com água, luz e internet – facto provado 44.

20 – Com 591,00 € mensais, o autor provia ao seu sustento e da sua família.

21 – Só quando se deu o acidente é que o autor perdeu o seu emprego e o seu meio de sustento, como deixou de prover ao sustento da sua família – facto provado 46.

22 - Em segundo lugar, também não corresponde à realidade o que vem dito no acórdão da Relação do Porto, quando menciona que a ré defendeu, no recurso de apelação, a fixação da indemnização pelo dano patrimonial futuro, entre os 210.000,00 € e os 220.000,00 €, “levando em consideração o valor do salário mínimo nacional”.

23 – À data do acidente, ocorrido em 04/09/2016, o salário mínimo nacional era de 530,00 €, de acordo com o DL n.º 254-A/2015, de 31/12, publicado em Suplemento ao DR. A ré, quando recorreu de apelação, apresentou contas a propósito do cálculo do dano patrimonial futuro, com base no salário mensal que o autor auferia de 591,00 €, superior ao salário mínimo em Portugal.

24 – Em terceiro lugar, o salário médio mensal em que a Relação do Porto se baseia para calcular a indemnização, considerando os dados publicados no site pordata.pt, é um salário ilíquido, bruto, com impostos incluídos.

25 – No site da pordata.pt pode-se verificar que, em 2016, a remuneração média de base mensal era de 924,90 € (o acórdão enganou-se ao mencionar o valor de “€ 924,09”). Nesse mesmo site, pode-se encontrar a definição de “Remuneração de Base Mensal”. Essa remuneração “é o montante que o empregado tem direito a receber todos os meses pelo horário normal de trabalho”. É o “Montante ilíquido (antes da dedução de quaisquer descontos) em dinheiro e/ou géneros, pago com caráter regular e garantido ao trabalhador no período de referência e correspondente ao período normal de trabalho”.

26 – Por conseguinte, a quantia de 924,90 € é uma quantia calculada antes de impostos e não o valor líquido que o trabalhador efetivamente aufere. Porém, já a indemnização que pelo presente processo vai receber, é um valor líquido, livre de impostos.

27 – A jurisprudência tem sido unânime na consideração de que os valores salariais a tomar em consideração nesta matéria de cálculo de indemnização com base na responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito, são valores líquidos.

Veja-se a seguinte jurisprudência, cujo teor se encontra reproduzido no corpo das alegações:

- Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 21-01-2021, (processo n.º 6705/14.1T8LRS; relatora Maria dos Prazeres Pizarro Beleza);

- Ac. STJ 21-01-2016 Revista n.º 76/12.8T2AND.P1.S1 - 7.ª Secção Lopes do Rego (Relator);

- 21-03-2019, Revista n.º 1069/09.8TVLSB.L2.S2 - 7.ª Secção - Nuno Pinto Oliveira (Relator); e

- STJ 19-06-2019 - Revista n.º 80/11.3TBMNC.G2.S1 - 2.ª Secção Catarina Serra (Relatora).

28 – Por conseguinte, mesmo que se verificassem os pressupostos para se utilizar a remuneração base média mensal para calcular a indemnização do autor, isto é, que, à data do acidente, sendo o lesado jovem, não trabalhasse ou estivesse desempregado – pressupostos esses que, repete-se, não se verificam in casu -, dever-se-ia introduzir, nessa remuneração, um fator de correção que a diminuísse, dado a mesma contemplar impostos.

29 – Esse fator de correção deve ser apurado em função da prolação de um juízo de equidade: “Na fixação dos montantes indemnizatórios, designadamente tendo em vista o ressarcimento do dano biológico, o tribunal deve atender aos rendimentos líquidos dos lesados quando estejam determinados, justificando-se, quando estão apurados rendimentos ilíquidos em que não se revela viável determinar o montante líquido, deduzir, em sede de juízo de equidade, a quantia que se revelar razoável.”

30 – Em quarto lugar, o cálculo da indemnização deve efetivamente ter por base o valor de 591,00 € auferido pelo autor em 2016, com o qual o provia ao seu sustento e da sua família.

31 – Caso esse valor fosse inferior ao salário mínimo nacional, deveria, então, ser este o valor a ser levado em linha de conta, com vem sustentado pela jurisprudência deste tribunal superior.

Vejam-se, entre outros, os seguintes acórdãos, cujo conteúdo se encontra acima transcrito:

- Acórdão STJ Processo 1585/12.4TBDM.P1.S1 20-11-2019;

- Acórdão proferido no processo n.º 4452/13.0TBVLG.P1.S1, STJ, 14-03-2023.

32 – A ré tem, pois, por pacífico, assente, justo e equilibrado, que o valor a tomar em consideração para o cálculo do dano patrimonial futuro será o de 591,00 €/mês e não o de 924,90 €, corresponde a 156,35% daquele valor.

33 – Em quinto lugar, pretendeu a Relação do Porto atribuir, e bem, uma indemnização, pela perda da capacidade aquisitiva, que fosse calculada em atenção ao tempo provável de vida ativa da vítima, de forma a representar um capital produtor de rendimento que cubra a diferença entre a situação anterior e a atual até final desse período.

34 - Só que, ao calcular essa indemnização com base num valor superior em 56,35% ao que o autor auferia a título de rendimentos do seu trabalho, está já, não a indemnizá-lo, mas a enriquecê-lo.

35 – A indemnização visa tornar o lesado indemne e não a obter uma vantagem patrimonial – cfr. Artigo 562.º do Código Civil. O autor fica com uma vantagem patrimonial se for ressarcido em 400.000,00 €.

36 – A indemnização do dano patrimonial futuro deve ter por base o salário do lesado, sob pena de se lhe atribuir uma indemnização superior ao rendimento que efetivamente auferia se não fosse o evento lesivo, o que se traduziria num enriquecimento ilegítimo e injustificado.

37 – Em sexto lugar, uma vez estabilizados os critérios de cálculo do dano patrimonial futuro, é insustentável que o mesmo seja superior ao fixado pela primeira instância, ou seja, 237.215,58 €.

38 – Ao autor foi fixado um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 61 pontos, se bem que com incapacidade permanente para o trabalho habitual (IPATH), mas compatível com outras profissões da área da sua preparação técnico-profissional, que não exijam a execução de tarefas complexas.

39 – O autor continua a poder exercer uma atividade profissional num posto diferente daquele em que se encontrava, o que, felizmente, constitui uma possibilidade de se reabilitar e de poder, inclusivamente, continuar a contribuir economicamente para o sustento do agregado familiar.

40 – Para o cálculo indemnizatório do dano ora em consideração, e sempre considerando qualquer critério a usar como meramente orientador e não puramente matemático – artigos 562.º, 564.º e 566., n.ºs 1 e 2, dever-se-á seguir o critério que foi utilizado pela Relação de Coimbra, em Acórdão de 4.4.95 (CJ II, p.23), e que representa um desenvolvimento e ajustamento do critério que vinha sendo utilizado pelo S.T.J. em alguns arestos - vejam-se os Ac. S.T.J. de 4.2.93 (CJ STJ I, p.128) e de 5.5.94 (CJ STJ II, p.86).

41 - Para a determinação do quantum indemnizatório destinado a compensar a perda de rendimento futuro é de perfilhar um critério comparativo temperando o uso das fórmulas matemáticas de determinação do capital produtor de um rendimento remunerado à taxa de juro praticada na banca para depósitos a longo prazo, mas que se esgota no final da vida ativa do lesado, com critérios corretivos, pela intervenção de juízos de equidade, com apelo às regras da experiência que a caracteriza. No presente processo, o autor tinha 23 anos de idade à data do acidente, do que resulta que a sua esperança média de vida, nesse momento, era de cerca 55 anos, de acordo com os dados estatísticos divulgados no site www.pordata.pt..

42 – Baseando-nos, por analogia, no que dispõe a Lei n.º n.º 98/2009, de 04/09 (Lei dos Acidentes de Trabalho - LAT), para o caso de pensão por IPATH, essa pensão, nos termos do artigo 48.º, n.º 3, al. b), corresponderá a uma pensão anual e vitalícia compreendida entre 50% e 70% da retribuição (591,00 €/mês), conforme a maior ou menor capacidade funcional residual para o exercício de outra função compatível.

Assim, temos:

88.274,00 (591 x 14) x 50% = 4.137,00

8.274,00 x 70% = 5.791,80

5.792,80 - 4.137,00 = 1.654,80

1.654,80 x 61% = 1.009,43

4.137,00 + 1.009,43 = 5.146,43

5.146,43 : 14 = 367,60 €

43 – Levando em linha de conta o valor mensal de 367,60 €, a indemnização, a este título, será de 217.691,66 €, de acordo com a tabela financeira utilizada pela Relação de Coimbra, no referido acórdão de 4.4.95 (CJ II, p.23), mas reajustada de acordo com os seguintes elementos:

- Taxa de juro nominal líquida de 2%;

- Taxa de inflação de 1%; e

- Esperança de vida até aos 78 anos.

44 – Por outro lado, deixando de lado a analogia que se estabeleceu com a lei dos acidentes de trabalho, e socorrendo-nos diretamente da tabela financeira para o cálculo da indemnização, com a introdução do salário mensal de 591,00 €, IPP de 61%, taxa de juro nominal líquida de 2%, taxa de inflação de 1% e esperança de vida até aos 78 anos, o resultado final será um total de capital a pagar de 213.260,92 €.

45 – Reajustando-se o valor final, face ao recebimento imediato da totalidade do capital, com a subtração da percentagem utilizada pela Relação do Porto, que foi de cerca 8% (passou de 434.472,50 € para 400.000,00 €), o valor do capital obtido através do cálculo de base enunciado na sentença para o cálculo do dano patrimonial futuro ascenderia a 196.200,05 € (213.260,92 – 17.060,87).

46 - Não se vê, assim, como pode ser sustentável um valor superior ao fixado pela primeira instância, muito menos, de 400.000,00 €, manifestamente irrealista, injusto, desequilibrado e que confere ao autor um enriquecimento sem causa.

47 - Finalmente, e em sétimo lugar, o dano patrimonial futuro fixado pela Relação do Porto ainda é mais gritantemente injusto quando se encontra relegado, para liquidação em execução de sentença, o valor correspondente ao apoio de terceira pessoa, até ao limite de 700.000,00 €, a acrescer à indemnização líquida a receber no presente processo.

48 – A sentença recorrida violou, entre outras disposições legais, os artigos 494.º, 496.º, n.º 4 (1.ª parte), 562.º, 564.º e 566.º, n.ºs 2 e 3, todos do Código Civil.”

9) O autor apresentou articulado de resposta às alegações de recurso, pugnando pela improcedência da revista e manutenção do decidido no acórdão recorrido.


◌ ◌



10) Colhidos os vistos legais dos Senhores Juízes Conselheiros que subscrevem o presente acórdão, importa agora decidir as questões colocadas pela ré recorrente e que, no essencial, se prendem com a determinação do montante da indemnização atribuída ao autor a título de danos de natureza não patrimonial e dos danos patrimoniais futuros.

Comecemos por descrever os factos apurados nas instâncias.


֎ ֎

֎



FUNDAMENTAÇÃO

PARTE I – OS FACTOS

São os seguintes os factos, provados e não provados considerados pelas instâncias, tendo já em conta considerando as alterações introduzidas pelo Tribunal da Relação do Porto.

A) Factos Provados

1) No verão de 2016, o Autor, cidadão de nacionalidade brasileira e até ali naquele país residente, decidiu viajar para a Europa para, entre outros, fazer os Caminhos de Santiago e, mais concretamente, o caminho ....

2) Em 6 de agosto de 2016, o Autor deu início ao percurso do mencionado caminho que veio a finalizar em ... no dia 27 do mesmo mês e ano (…).

3) De Espanha veio para Portugal em data não apurada.

4) No dia 4 de setembro de 2016, já em Portugal, o Autor viajou, na qualidade de passageiro, no veículo de matrícula ..-PI-.., ligeiro de passageiros, da marca Jaguar (doravante apenas Jaguar), da propriedade de BB, então conduzido por CC.

5) Nesse mesmo dia, pelas 09h 40m, circulava o Jaguar, pela Estrada Nacional ..., na direção P...- M....

6) Ao chegar à zona de confluência entre aquela estrada (conhecida por Estrada ...) com a Rua ..., próximo do centro comercial ..., o referido veículo sofreu um acidente, na freguesia de ..., concelho de ....

7) Naquelas circunstâncias de tempo e lugar, circulava o Jaguar na referida via e ao chegar à zona de confluência da EN ... com a Rua ..., o condutor do veículo perdeu o seu controlo, entrou em despiste e foi embater nos rails de proteção situados do lado direito, atento o seu sentido de marcha.

8) Atento o sentido prosseguido pelo Jaguar, a via tem piso betuminoso, em bom estado de conservação.

9) Era de dia, o tempo estava bom e a visibilidade era excelente.

10) No local do sinistro, a via desenvolve-se em curva acentuada, com inclinação ascendente.

11) Poucos metros antes do local onde ocorreu o sinistro existe sinalização vertical de indicação de curva perigosa à esquerda e de proibição de circular a mais de 50 km/h aposta quer do lado direito, quer do lado esquerdo, da faixa de rodagem.

12) O Jaguar, depois de entrar em despiste e antes de se imobilizar, deixou impresso no pavimento um rastro de travagem de 21 m.

13) (eliminado do elenco dos “factos provados”)

14) O veículo “PI” havia sido cedido ao seu condutor no uso e poderes de disposição da sua proprietária para os fins indicados em 96) e no âmbito do acordo mencionado em 90) e 91) dos factos provados.

15) Ao local do sinistro ocorreu uma viatura de emergência médica do INEM, uma ambulância, uma viatura de desencarceramento dos Bombeiros da ..., os Bombeiros Voluntários de ..., entre outros meios de assistência.

16) Como consequência direta e necessária do sinistro o Autor ficou encarcerado, inconsciente, politraumatizado, com hemorragia digestiva, enfisema subcutâneo direito.

17) Os Bombeiros tiveram que proceder à remoção de um pilar da viatura com vista ao desencarceramento do Autor,

18) A quem estabilizaram com colar cervical, colete de extração, tubo de guedel, administraram-lhe O2, aspiraram-no quatro vezes, até entubação endotraqueal, devido a hemorragia interna, tendo-lhe sido colocado cinto aranha de modo a possibilitar o seu transporte.

19) Ainda no local, a equipa da emergência médica do Hospital de ..., sedou-o, entubou-o e colocou-o em suporte ventilatório mecânico.

20) Sendo, depois, conduzido às urgências do Hospital de ....

21) Ao chegar ao Hospital de ... foi diagnosticado ao Autor politrauma com traumatismo craniano grave, hematoma peri-orbitrário direito com pupila ipsilateral midriática e não reativa, hemorragia nasal e da orofaringe importante, tendo-lhe sido identificados os seguintes traumas:

a) Inúmeros focos de contusão hemorrágicos em ambos os hemisférios cerebrais. Hematomas extra-axiais com cerca de 7,2 mm de espessura máxima deformando os lobos adjacentes. Apagamento generalizado dos sulcos e das cisternas da base com as amígdalas cerebelosas a aflorar o plano do buraco magno; não se definia o III ventríloco.

b) Na face traços de fratura nos ossos do maciço facial, seios maxilares, esfeinodal, frontais, paredes das orbitas e nos ossos próprios do nariz; fratura na vertente posterior do canal ótico esquerdo, na apófise zigomática direita e grande asa esfenoide direita.

c) No tórax, provável fratura não descoaptada do manúbrio external; fratura de vários arcos costais bilateralmente e fratura da asa da omoplata direita.

22) A 21 de setembro foi submetido a traqueostomia cirúrgica para proteção da via aérea.

23) Padeceu ainda de pneumonia de aspiração, celulite do MSD,

24) Permaneceu nos cuidados intensivos até 23 de setembro de 2016, sendo depois transferido para o serviço de TCE, onde lhe veio a ser retirada a cânula de traqueostomia.

25) A 6 de outubro de 2016 foi o Autor submetido a craniotomia frontal bilateral com drenagem de pneumocéfalo e plastia do andar anterior por fistula traumática.

26) Desenvolveu hematoma epidural pós craniotomia pelo que, a 12 de outubro de 2016, foi novamente submetido a cirurgia com reabertura de craniotomia e drenagem de hematoma.

27) Desenvolveu durante o internamento pneumonia de aspiração bilateral e pneumonia associada a ventilação invasiva, com isolamento pseudomonas MS SR.

28) A 15 de novembro de 2016 foi transferido para o serviço de fisiatria do Hospital ..., para tratamento fisiátrico intensivo.

29) À entrada neste serviço, o Autor mostrava-se desorientado no tempo e no espaço e necessitava de auxílio para se alimentar, vestir e cuidar da sua higiene.

30) Os défices cognitivos de que ficou a padecer eram muitíssimo significativos, os quais embora tenham melhorado, persistem na presente data.

31) Naquele serviço fez, entre outros, terapia da fala e fisiatria.

32) Quanto à lesão ocular, o serviço de oftalmologia do Hospital, deu indicação para se aguardar entre 6 a 8 meses e só depois avaliar a intervenção cirúrgica a efetuar.

33) É transferido para o Centro de Reabilitação ... em 11 de janeiro de 2017, apresentando à chegada a esta instituição:

a) Suspeita de alterações cognitivas múltiplas

b) Disartria flácida ligeira,

c) Discreta alteração na prova dedo-nariz à direita, provavelmente por falta de visão, já que o Requerente não via, nem vê com o olho direito, em consequência do sinistro;

d) Caminhava, mas com baixa dissociação das cinturas e instabilidade pélvica à direita, tendo necessidade de recorrer a bastão,

e) entre outras.

34) Naquele Centro realizou programa de reabilitação integral e abrangente, em esquema bidiário multimodal (fisioterapia, terapia da fala, enfermagem de reabilitação e reabilitação cognitiva),

35) O Autor apresentava, entre outros:

a) Discurso tendencialmente organizado, mas por vezes descontextualizado e com incongruências temporais;

b) Reconhecia que teve um acidente automóvel, mas não tinha, como ainda não tem, memória do mesmo;

c) Reconhecia as alterações motoras, mas não as alterações neuropsicológicas, não tendo consciência de tal défice.

36) Reavaliado um mês após o internamento, verificou-se que mantinha um funcionamento da memória de trabalho inferior, tendo até uma ligeira diminuição, revelando ainda um IVP muito inferior.

37) Aquando da alta já não necessitava de auxiliares de marcha, mas carecia de supervisão por manter desorientação espacial.

38) Conseguia subir um lanço de escadas sem apoio no corrimão, mas sem total segurança,

39) Tinha autonomia para a maior parte das atividades da vida diária, mas necessitava e ainda necessita de supervisão para as atividades da vida diária instrumentadas.

40) Aquando da alta (maio de 2017), era o seguinte o seu quadro:

MEDIDA DE INDEPENDÊNCIA FUNCIONAL (MIF)ENTRADA (<72 H)OBJECTIVOALTA (<48 H)
AutocuidadosAlimentação677
Higiene Pessoal575
Banho575
Vestir metade superior575
Vestir metade inferior575
Utilização da sanita575
Controle de esfíncteresBexiga567
Intestino166
TransferênciasLeito/Cadeira/CR477
Sanita475
Banheira/Duche475
LocomoçãoMarcha / CR (M)465
Escadas466
TOTAL MOTOR (91)518773
ComunicaçãoCompreensão666
Expressão666
Consciência do mundo exteriorInteração social465
Resolução de problemas354
Memória252
TOTAL COGNITIVO (35)212823
TOTAL (126)7211596

41) Obteve o Autor alta, mas com indicação para continuação do tratamento em regime ambulatório.

42) O Autor, por força do sinistro, ainda está absolutamente incapaz de prover ao seu sustento, necessitando do auxílio de terceira pessoa em especial para se deslocar no exterior, não saindo de casa sozinho por ser incapaz de se orientar.

43) Antes do sinistro, o Autor trabalhava num supermercado, na secção de talho, onde auferia a quantia mensal de 2.200 reais, o equivalente, sensivelmente, a € 591,00.

44) Com tal montante provia ao seu sustento e ao da sua família (mãe e irmã), pagando a renda de casa, as despesas com água, luz e internet.

45) Também por força do sinistro, a sua mãe e irmã, que também residiam no Brasil de onde todos são naturais e cidadãos, tiveram que abandonar a vida que ali tinham e vir para Portugal.

46) Assim, não só o Autor perdeu o seu emprego e o seu meio de sustento como deixou de poder prover ao sustento da sua família,

47) Apesar dos tratamentos a que se submeteu o Autor ficou a padecer definitivamente:

a) Défice funcional permanente ao nível da comunicação,

b) Défice de compreensão,

c) Dificuldades de locomoção,

d) Défice ao nível da compreensão do mundo exterior,

e) Défices de memória,

f) Amnésia relativamente à época em que ocorreu o sinistro

g) Dificuldades / défice ao nível da orientação espaço-temporal;

h) Perda de visão

i) Deformidade do olho esquerdo.

Sequelas que lhe determinam uma IPG de 60,97301 pontos, numa escala de 1/100.

48) De acordo com o relatório médico-legal e suas conclusões:

A data da consolidação médico-legal das lesões é fixável em 25/03/2019;

Período de Défice Funcional Temporário Total num período de 256 dias;

Período de Défice Funcional Temporário Parcial de 677 dias;

Período de Repercussão Temporária na Atividade Profissional Total de 933 dias;

Quantum Doloris no grau 6/7;

Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica de 61 pontos;

As sequelas são, em termos de Repercussão Permanente na Atividade Profissional, impeditivas do exercício da atividade profissional habitual, cortador de carnes verdes, podendo ser, no entanto, compatíveis com outras profissões da área da sua preparação técnico profissional, que não exijam a execução de tarefas complexas;

Dano estético permanente no grau 4/7;

Repercussão Permanente nas atividades desportivas e de lazer no grau 3/7;

Repercussão permanente na atividade sexual no grau 4/7;

Ajudas técnicas permanentes, medicamentosas, tratamentos médicos, ajudas técnicas, ajuda de terceira pessoa.

49) Sendo que esteve totalmente incapacitado, no período compreendido entre a data do sinistro (04/09/2016) e a data da alta (17/05/2017),

50) A lesões sofridas provocaram-lhe dores físicas muito intensas, tanto no momento do acidente, como no decurso dos tratamentos.

51) E as sequelas de que ficou a padecer definitivamente continuam a provocar-lhe dores físicas, incómodo e mal-estar, que o vão acompanhar durante toda a vida e, sobretudo, provocam-lhe um profundo sentimento de desgosto.

52) O Autor nasceu em 16 de junho de 1993.

53) E era saudável, fisicamente bem constituído, dinâmico e trabalhador.

54) Gostava de sair com os amigos, ir a bares, cafés, festas, ginásios e praticar atividades físicas, em especial desportos ao ar livre.

55) A proprietária do Jaguar, transferiu para a Ré a responsabilidade civil emergente da sua circulação, através de adequado contrato de seguro titulado pela apólice ...13.

56) A ré solicitou ao gabinete de peritagens "Realperitos" uma averiguação ao sinistro.

57) No decurso dessa averiguação, que aquele Gabinete terminou em 24 de abril de 2017, e doutras diligências realizadas posteriormente pela ré, foi elaborado um documento onde consta e se escreveu o seguinte:

- O CC, condutor do Jaguar, tinha, à data do acidente, 33 anos de idade, uma vez que nasceu em .../09/1982.

- O CC tem carta de condução de veículos ligeiros apenas desde 14/11/2014;

- Antes deste acidente, o CC teve pelo menos dois acidentes, ao volante do mesmo veículo.

- O CC comprou o Jaguar em março de 2015, cerca de 3 meses depois de ter tirado a carta - cfr. registo automóvel ora junto sob o n.º 3, através do qual se verifica que a propriedade do ..-PI-.. foi registada em seu nome em 06/03/2015.

- No dia 29 de março de 2015 o CC teve um acidente com o Jaguar, num choque contra um muro em ..., tendo o mesmo sido considerado "perda total".

- O Jaguar deu entrada acidentado nas instalações da "Cibercar", concessionário da Jaguar, e saiu como perda total em novembro de 2015.

- Nessa data, ou seja, novembro de 2015, o CC ainda figurava como proprietário desta viatura.

- Só a partir de 02/12/2015 é que a propriedade do veículo passou a estar registada no nome de BB,

- Em nome da qual veio a ser contraída mais tarde, em 17/02/2016, junto da ré, a apólice n.º 90.709413, respeitante ao seguro obrigatório de responsabilidade civil, por danos provocados a terceiros, emergente da circulação rodoviária do ..-PI-...

- Como o Jaguar ficou sem circular por causa do acidente ocorrido em março de 2015, o CC cancelou o seguro do veículo, que havia sido celebrado com a congénere "Fidelidade", sob o n.º ...42, a partir de 30/03/2015, tendo o veículo permanecido sem seguro até fevereiro de 2016, data em que foi contraída a apólice junto da ré - cfr. a pesquisa na base de dados da "Segurnet".

- Na realidade, o veículo, depois de ter sido retirado do concessionário da Jaguar, foi reparado numa oficina que a ré desconhece, e voltou a ser colocado em circulação com deficiência de funcionamento dos airbags.

- Este deficiente funcionamento dos airbags pôde ser constatado na sequência da averiguação do sinistro em análise, e depois do perito-averiguador ter conseguido encontrar, após múltiplas diligências, o paradeiro da viatura,

- Mas também no decurso de uma averiguação anterior, encetada em julho de 2016, por ocasião de outro sinistro que o CC teve ao volante do Jaguar, num momento em que já se encontrava seguro na ré.

- No dia 09/07/2016, por volta da 01H15, na Avenida ..., no ..., o CC circulava com o Jaguar quando teve que efetuar marcha atrás num espaço de cerca de dois metros, embatendo, com o para-choques traseiro na frente de um veículo que circulava à sua retaguarda - cfr. a "Declaração Amigável" que o CC apresentou na ré.

- Por ocasião desse sinistro, o perito-averiguador apercebeu-se que o sistema de airbags do Jaguar não funcionava, de acordo com a informação que era apresentada no tablier, ao colocar o veículo em funcionamento.

- Para além disso, a capa do volante era constituída por um material diferente do original, percebendo-se que ao optar pela reparação se abdicou de ter o airbag do condutor em funcionamento.

- No âmbito do acidente dos autos, a ré também efetuou um diagnóstico, no concessionário da Jaguar, ao sistema de airbags.

- O perito-averiguador deslocou-se à "T...", no ..., e na realização do diagnóstico ao Jaguar foi possível concluir que o airbag do condutor e passageiro pertencem ao veículo desde novo, pelo que, tendo em consideração o acidente em 2015, em que foi atribuída perda total e o sistema dos airbags foi acionado, no sinistro em análise o veículo não tinha o sistema de airbags no seu devido funcionamento.

- A situação dos airbags era a seguinte:

- airbag do condutor: o volante apresentava a referida capa exterior que não era de origem e o airbag não existia.

- airbag do passageiro: encontrava-se cortado, sem possibilidade de funcionamento, e com a referência de fábrica.

- airbag lateral do passageiro: encontrava-se na mala do veículo, intacto, não tendo, portanto, sido acionado no acidente em análise.

- Da leitura à unidade do sistema de airbags, a informação é que o número máximo de eventos de ativação do sistema de proteção para peões foi atingido.

- Assim, na data do sinistro dos autos, o Jaguar encontrava-se a circular com o sistema de segurança de airbags desativado, motivo pelo qual estes, com o impacto, não foram acionados.

58) Em 17/02/2016 foi subscrita a proposta de seguro perante a ré, assinada pela segurada, BB, referente ao veículo Jaguar ..-PI-...

59) Na proposta de seguro, ficou a constar, como condutor habitual, a própria segurada, nascida em 24/08/1960 e com carta desde 16/04/1982.

60) Foi indicado, na proposta de seguro, que o condutor habitual esteve 6 anos sem sinistros, inexistindo sinistros da sua responsabilidade (a data que foi colocada no campo destinado a indicar esse tipo de sinistros é de 16/04/1982, ou seja, a data da sua carta).

61) De acordo com estes dados, a ré atribuiu à segurada um bónus de 50% no prémio.

62) A BB costuma conduzir vários carros entre os quais um VW Golf, com a matrícula ..-JF-...

63) A referência ao condutor habitual na proposta de seguro é importante para a apreciação do risco assumido pela ré e possui reflexos na quantificação do prémio.

64) Quanto mais inexperiente e acidentado é o condutor mais elevado é o risco e maior é o prémio.

65) Se a ré soubesse que o condutor habitual era o dito CC e não a segurada, não teria aceitado celebrar este seguro, ou teria introduzido um agravamento no prémio e não um bónus de 50%, como foi concedido.

66) Na proposta de seguro foi prestada a informação de que "Este contrato poderá considerar-se nulo e, consequentemente, não produzirá quaisquer efeitos em caso de sinistro, quando da parte do tomador do seguro ou do segurado tenha havido declarações inexatas assim como reticências de factos ou circunstâncias dele conhecidas, e que teriam podido influir sobre a existência ou condições do contrato".

67) Na proposta de seguro, foi prestada a seguinte declaração: "Declaro que me foram postas à disposição todas as Condições Gerais e Especiais do contrato, com a advertência de que delas devo tomar conhecimento antes da subscrição da presente proposta, como condição da exata compreensão do seu conteúdo, das garantias que confere e das exclusões que contém".

68) Foi ainda declarado: "Declaro ter tido conhecimento e respondido com exatidão, verdade e sem omissão ou reticência de qualquer facto ou circunstância por mim conhecidos, a todas as perguntas que me foram colocadas, não induzindo em erro nem suscitando quaisquer dúvidas à Caravela Seguros, na apreciação do risco proposto, ainda que a proposta tenha sido preenchida por terceiros e por mim assinada, nos termos do previsto no ponto 1 e 2 da cláusula 6.ª, bem como da cláusula 7ª e 8.ª das Condições Gerais da Apólice referente ao seu incumprimento".

69) A segurada BB, por carta expedida para a ré em 30/09/2016, havia solicitado a anulação da apólice em virtude de o Jaguar ter sido vendido no dia 28/09/2016.

70) Atualmente, o veículo encontra-se reparado e a circular sob a apólice ...73 da "AGEAS".

71) A Ré comunicou à BB, por carta registada com aviso de receção, datada de 13/09/2017 (doc. 18 em anexo), e recebida no dia 15 seguinte (doc. 27 em anexo), designadamente, o seguinte: " (...) na sequência das diligências levadas a efeito para enquadramento do sinistro nas garantias da apólice, concluíram os nossos serviços técnicos após diligências de averiguação, que houve declarações inexatas no ato de subscrição do seguro, pelo que vamos considerar o mesmo nulo e sem efeito desde a data do seu início (17/02/2016).

72) As declarações inexatas por ora observadas, influenciavam a aceitação do risco ou um ajustamento do respetivo prémio de seguro".

73) O autor, em 18/08/2017, instaurou contra a ré uma providência cautelar de arbitramento de reparação provisória, cujos termos correram sob o nº 2682/17.5..., pelo Juízo Local Cível de ... - Juiz ....

74) A referida providência foi extinta por acordo, tendo a ré aceitado pagar ao autor, por conta da indemnização eventualmente devida a final, a quantia de € 6 000,00, nos seguintes termos:

“1. O requerente reduz o pedido para a quantia de € 6.000,00 (seis mil euros), que a requerida se compromete a pagar no prazo de 20 dias, a contar da presente data, por cheque e contra recibo, no escritório da Ilustre Mandatária do requerente.

2. Ambas as partes declaram que:

a) a quantia referida em 1 tem a natureza de reparação provisória do dano nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 388 do CPC;

b) que a presente liquidação provisória do dano será deduzida na indemnização final em que a requerida vier eventualmente a ser condenada, ou será por si restituída caso a requerida venha a ser absolvida.

2. As custas serão suportadas em partes iguais por requerente e requerida, prescindindo reciprocamente de custas de parte.

3. A requerida manifesta particular interesse em declarar que aceitou realizar a presente transação em obediência a pressupostos de ordem prática, não abdicando do entendimento plasmado na contestação quanto à invalidade do contrato de seguro e responsabilidade do próprio requerente na produção ou agravamento das lesões que sofreu, entendendo que a presente providência cautelar - em que razões de ordem de celeridade constrangem o apuramento efetivo da verdade material e a decisão é tomada com base em indícios -, não é o meio processual adequado para discutir as questões por si levantadas.”

75) O acordo foi homologado por sentença e a quantia paga ao autor - cfr. carta, recibo e cheque n.º ...30, sacado s/ BBVA e emitido em 2017/09/20, enviado ao autor.

76) Correu processo crime sob o número 348/16.2..., tendo como denunciante o aqui Interveniente CC e arguido o aqui Autor.

77) O interveniente CC conheceu o aqui autor AA em circunstâncias não apuradas no Verão de 2016, tendo ambos travado amizade, tendo o CC permitido deixar o aqui Autor AA pernoitar em sua casa.

78) Na declaração amigável de acidente automóvel (sob doc. 5 da contestação da R. Caravela), relativo a acidente ocorrido na Alameda ..., ..., em .../07/16, com o veículo automóvel Jaguar ..-PI-.., consta como condutor do veículo no momento do acidente o aqui Interveniente CC.

79) O condutor habitual do veículo ..-PI-.. era a Interveniente BB.

80) O Interveniente CC é o cabeleireiro, desde há muito tempo, da BB.

81) Em conversa casual, “de cabeleireiro”, o CC comunicou à BB que estava com dificuldades financeiras e que queria vender o seu Jaguar.

82) A BB, que sempre havia elogiado o carro do CC, e apercebendo-se de que poderia fazer um bom negócio, em face das confessadas dificuldades financeiras do CC, falou com o seu marido que a informou que o carro poderia valer € 25.000,00.

83) Pelo que a BB, fez uma proposta de compra bastante abaixo do valor do veículo, mas que seria pago de imediato.

84) Tendo o CC acabado por aceder na venda do veículo por € 19.000,00.

85) Assim que regularizou a documentação, a BB começou a utilizar o veículo no seu dia-a-dia, o que fez até à data do acidente.

86) Sendo certa que sendo possuidora de outro veículo automóvel, sempre utilizava aquele mais ao fim de semana ou quando ia para o seu restaurante, designado: D... em ..., uma vez que dispunha sempre de estacionamento.

87) Em meados de 2016, a BB, em mais uma ida ao cabeleireiro, confidenciou ao CC que não se estava a habituar ao tamanho e ao tipo de condução proporcionado pelo Jaguar, pelo que estava a pensar vendê-lo.

88) Em face desta informação, o CC de imediato se propôs a encontrar um comprador, uma vez que várias pessoas já lhe haviam transmitido terem pena de não saber que o Jaguar estava à venda, ainda por cima por um preço tão atrativo.

89) Em troca, o CC pedia apenas uma comissão sobre a margem de lucro que a BB obtivesse.

90) A BB acedeu ao proposto pelo CC, pois, sendo pessoa muito ocupada, não queria ter o trabalho de encontrar comprador, tendo ambos acordado que o CC poderia vender o carro pelo preço mínimo de € 22.000,00, e que como comissão ficaria com todo o valor acima dos € 22.000.00 que conseguisse pelo veículo.

91) No âmbito deste acordo, a BB disponibilizou o veículo ao CC para o mostrar aos interessados.

92) (eliminado do elenco dos “factos provados”).

93) (eliminado do elenco dos “factos provados”).

94) Mas na verdade pelo menos em 2 ocasiões os compradores queriam comprar, mas queriam pagar a prestações, o que a BB não aceitou.

95) Sendo que em data não apurada surgiu um interessado para pagar o carro a pronto.

96) O CC levou o carro no âmbito do acordo mencionado em 90 para um interessado o experimentar e unicamente para esse fim.

97) Neste âmbito, ficou absolutamente perturbada quando soube do acidente ocorrido.

98) Mais perturbada ficou quando tomou conhecimento de que, no âmbito destas disponibilizações, o CC, pelo menos no dia do acidente, estava a usar o veículo para fins pessoais, em completa contravenção das indicações que tinha da proprietária do veículo.

99) Aliás, a BB responsabilizou em absoluto e de imediato o CC pelo acidente ocorrido, tendo exigido o valor do carro.

100) Uma vez que a BB, depois do acidente já não queria o carro, acordaram em o CC pagar o valor que aquela havia despendido, ou seja, o valor de € 19.000,00, a receber em prestações.

101) Pois o CC, não tinha disponibilidade para assumir o prejuízo de imediato.

102) Assim o carro foi vendido como salvado pelo valor de € 2.800,00 pagos pela testemunha DD.

103) Tendo o CC acrescentado € 200,00 e assim considerado como pago a primeira prestação de € 3.000,00.

104) E tendo pago o restante valor em 16 prestações mensais de € 1.000,00.

105) A propriedade do veículo passou a ser da BB a partir de 2/12/2015.

107) A Interveniente BB desconhecia se os airbags estavam em bom estado de funcionamento.

108) Apenas garantiu que o veículo se encontrava com as inspeções em dia.

109) Quando vendeu o carro, o CC jamais referiu que este se encontrasse limitado em termos de condições de segurança, designadamente sem airbags funcionais.

110) A BB tinha cedido o veículo ao CC, exclusivamente, com o intuito de o vender, sendo que este no momento do acidente fez do veículo uso pessoal.

111) Em consequência do acidente dos autos, o Centro Hospitalar e Universitário ..., EPE prestou assistência a CC nos serviços de urgência em .../09/2016 e a AA, no Serviço de urgência em .../09/2016, internamento de 04/09/2016 a 11/01/2017, Consulta externa de cuidados pós internamento UCIP em 04/07/2017, consultas externas de fisiatria em 13/04/2017, 28/12/2017 e 12/07/2018, consultas externas de oftalmologia em 14/06/2017, 16/10/2018, 29/11/2018, 16/01/2019, 15/03/2019 e 25/03/2019.

112) A Ré foi interpelada pelo Centro Hospitalar por ofício datado de 09/12/2016 e via correio eletrónico nos dias 18/09/ e 11/01/2019 para pagar as despesas hospitalares tidas com a prestação de serviços ao aqui Autor e ao Interveniente CC.

113) O valor das despesas tidas pela aludida prestação de serviços importou em € 78.987,28.

114) No âmbito do procedimento cautelar de arbitramento de reparação provisória, que constitui o apenso D dos autos, foi celebrado o seguinte acordo, devidamente homologado por sentença:

“1. O requerente convola o pedido para a quantia de 6.000,00 € (seis mil euros), a receber de uma só vez, que será paga em exclusivo pela 1.ª requerida, no prazo de 20 dias, a contar da presente data, por transferência bancária para a conta com o seguinte IBAN: PT50...94

2. Ambas as partes declaram que:

a) A quantia referida em 1 tem a natureza de reparação provisória do dano nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 388.º do Código de Processo Civil;

b) A presente liquidação provisória do dano será deduzida na indemnização final em que a 1.ª requerida vier eventualmente a ser condenada, ou será restituída pelo requerente caso a 1.ª requerida venha a ser absolvida.

3. Tal como na primeira providência cautelar instaurada pelo requerente, a 1.ª requerida manifesta particular interesse em declarar que aceitou realizar a presente transação em obediência a pressupostos de ordem prática, não abdicando do entendimento plasmado na contestação quanto à invalidade do contrato de seguro e responsabilidade do próprio requerente na produção ou agravamento das lesões que sofreu, entendendo que a presente providência cautelar - em que razões de ordem de celeridade constrangem o apuramento efetivo da verdade material e a decisão é tomada com base em indícios -, não é o meio processual adequado para discutir as questões por si levantadas.

4. As custas serão suportadas em partes iguais por requerente e 1.ª requerida, prescindindo reciprocamente de custas de parte.”

115) O valor mencionado em 114 foi pago ao autor.


◌ ◌



B) Factos Não Provados

São os seguintes os factos considerados não provados pelas instâncias:

a) A velocidade permitida em 11) fosse de 40km/h.

b) A mãe tenha vendido tudo quanto tinha, de modo a custear as despesas de deslocação para Portugal e ter meios que lhe permitissem aqui sobreviver durante algum tempo para o acompanhar.

c) Ao nível da capacidade para o trabalho, as sequelas são de tal ordem que o impedem de exercer qualquer profissão remunerada, desconhecendo-se se algum dia estará apto para o desempenho da sua profissão habitual ou de qualquer outra compatível, pelo que, a este nível, a sua incapacidade é de 100%.

d) Que na data do acidente o veículo automóvel ..-PI-.. a Interveniente BB não fosse a sua proprietária, ou não fosse a sua condutora habitual.

e) Apesar de todas as advertências e declarações, a segurada BB teve o propósito de enganar a ré quanto à identidade do condutor habitual da viatura.

f) O Autor circulava sem o cinto de segurança colocado.

g) No dia 4 de setembro de 2016, de manhã, o AA, sem motivo aparente, deslocou-se à cozinha do CC, onde agarrou numa faca, tendo-se dirigido ao quarto deste, onde, com essa faca, o tentou matar.

h) O que só não conseguiu, porque o CC agarrou a lâmina, tendo-se cortado num dedo com gravidade e defendeu-se entrando ambos em luta.

i) Dessa luta e porque caíram ambos agarrados pela escada do primeiro andar, zona dos quartos, resultaram ferimentos para os dois.

j) Tendo o CC gritado por socorro na sua porta.

k) Mas como era domingo e a sua casa é individual, ninguém o socorreu.

l) Perante o facto de ambos estarem feridos e a casa cheia de sangue, acordaram pôr fim à contenda e deslocarem-se ambos para o hospital.

m) Tenha sido por tal razão que estavam a efetuar a viagem no Jaguar aquando do acidente.

n) O CC conduzia com o dedo médio absolutamente cortado de cima a baixo e com um pano a estancar o sangue.

o) Pelo que a forma como segurava o volante da viatura era limitada e absolutamente nervosa.

p) Até porque verificou que o AA não colocou o cinto de segurança, o que o fazia prever grande mobilidade deste para o voltar a atacar.

q) E na verdade não satisfeito com o desfecho do seu ataque, o AA, durante o percurso para o hospital, de forma inopinada e absolutamente criminosa, agarrou o volante do veículo, que estava a ser conduzido pelo CC, dando-lhe uma guinada para o seu lado, i.é. o lado direito.

r) Tenha sido este ato forte e inesperado e a limitação física do CC, este perdeu o controle da viatura acabando por se despistar.

s) Nas circunstâncias de tempo e lugar em que ocorreu o acidente descrito em 7 dos factos provados, o referido condutor conduzia o veículo por conta e no interesse da sua proprietária,

t) Tais disponibilizações (do Jaguar pela proprietária ao condutor interveniente no acidente) nunca foram por mais de 3 ou 4 dias, uma vez que normalmente era ao fim de semana, para que este o pudesse mostrar a potenciais compradores.

u) O Jaguar foi disponibilizado alguns dias à 6.ª feira e devolvido à 2.ª feira.


◌ ◌



PARTE II – O DIREITO

1) No presente recurso de revista interposto pela seguradora ré, responsável pelo ressarcimento dos danos sofridos pelo autor num acidente de viação ocorrido no dia ... de setembro de 2016, sendo ele então transportado no veículo de matrícula veículo ..-PI-.. na via pública é colocada em causa a quantificação da indemnização arbitrada no acórdão recorrido do Tribunal da Relação do Porto a título de danos de natureza não patrimonial e de natureza patrimonial futuros.

A sentença proferida em primeira instância condenou a ré seguradora a pagar ao autor a quantia global de € 356.215,58 (trezentos e cinquenta e seis mil duzentos e quinze euros e cinquenta e oito cêntimos), acrescida dos juros vencidos e vincendos desde a citação e a quantia, a liquidar posteriormente, relativa ao apoio de terceira pessoa, até ao limite de € 700.000,00.

No referido montante global foi englobada a quantia de € 125.000,00 (cento e vinte e cinco mil euros) atribuída para reparação dos danos de natureza não patrimonial sofridos pelo autor.

Por sua vez no acórdão recorrido a condenação da seguradora ré foi alterada, tendo sido fixado o valor da indemnização global arbitrada ao autor em € 575.000,00 (quinhentos e setenta e cinco mil euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais e patrimoniais futuros.

No acórdão recorrido foi tida por adequada ao ressarcimento dos prejuízos de natureza não patrimonial sofridos pelo autor a quanta de € 175.000,00 (cento e setenta e cinco mil euros).

2) A responsabilidade civil decorrente da prática de factos ilícitos tem acolhimento no artigo 483.º n.º 1 do Código Civil, preceito que enuncia o princípio geral em matéria de responsabilidade civil por factos ilícitos nos termos seguintes: “Aquele que com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação.

3) Uma vez que na presente revista não se discute a verificação dos requisitos da responsabilidade civil por factos ilícitos – matéria sobre a qual não existem discrepâncias relevantes na doutrina nem na jurisprudência – e se mostra assente que o acidente de viação de que resultaram os danos invocados foi causado pelo condutor do único veículo interveniente e que a proprietária do veículo transferira para a ré seguradora a responsabilidade civil decorrente da sua circulação, estando exclusivamente em causa a determinação do valor da indemnização arbitrada ao lesado não se afigura necessário abordar nesta sede senão a questão assim colocada, dando por assentes, nomeadamente, os pressupostos da responsabilidade civil da proprietária do veículo automóvel, a satisfazer pela seguradora recorrente.

4) Assente que está a obrigação de indemnização do lesado pelos danos resultantes da violação, importa então atentar no princípio geral que rege a sua concretização – o artigo 562.º do Código Civil, que preceitua que “quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação”.

A singela enunciação do princípio encerra, porém, dificuldades de monta, por vezes originadas em dúvidas sobre o nexo de causalidade, directa ou indirecta mas todo o caso adequada, entre o facto e o dano, mas outras vezes – relativamente frequentes – decorrentes de a reconstituição natural da situação anterior à lesão não ser possível, não reparar integralmente o dano ou ser excessivamente onerosa para o devedor, caso em que se impõe fazer operar a indemnização através da atribuição de uma compensação monetária ao lesado, acrescendo ainda as situações em que há necessidade de fazer intervir critérios de equidade por não poder ser averiguado o valor exacto dos danos

Em todas essas situações o artigo 566.º n.º 2 do Código Civil estabelece o critério que deve orientar a medida da indemnização: ela deve corresponder à diferença entre a situação patrimonial do lesado na data mais próxima que possa ser atendida pelo tribunal e a que teria nessa data se não tivesse ocorrido a lesão.

5) Nos termos do artigo 564.º n.º 1 do Código Civil o dever de indemnizar o dano causado – que pode ser patrimonial (na forma de danos emergentes ou de lucros cessantes) ou não patrimonial consoante seja ou não susceptível de avaliação pecuniária – compreende não só o prejuízo causado directamente ao lesado como os benefícios que ele deixou de obter em consequência da lesão, podendo o tribunal atender aos danos patrimoniais futuros desde que previsíveis.


◌ ◌



6) Os danos sofridos pelo lesado que tenham natureza não patrimonial são susceptíveis de ser abrangidos na indemnização desde que, pela sua gravidade, avaliada segundo parâmetros objectivos, sejam merecedores da tutela do direito – artigo 496.º n.º 1 do Código Civil.

Relativamente a este tipo de danos mostra-se, por natureza, impossível a sua reparação natural pelo que o seu ressarcimento tem de ocorrer através da atribuição de uma compensação pecuniária que propicie ao lesado a satisfação de uma ampla gama de interesses pessoais contrabalançando os desgostos e sofrimentos causados, directa ou indirectamente, pela lesão sofrida.

A quantificação do montante do valor da indemnização faz-se com recurso a critérios de equidade, tal como estabelece o artigo 496.º n.º 3 do Código Civil, ponderando as circunstâncias a que manda atender o artigo 494.º do Código Civil, entre as quais se deve incluir factores como a idade do lesado ou a natureza das actividades desenvolvidas anteriormente, a intensidade das dores sofridas no momento da lesão e duração dos tratamentos efectuados e a impossibilidade definitiva de usufruir actividades de lazer, a culpabilidade do agente, a situação económica do responsável e do lesado, sem esquecer a intensidade e gravidade das lesões sofridas e a sua repercussão na vida do lesado – assim, entre outros, o acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 17 de dezembro de 2019 na revista 2224/17.2T8BRG.G1.S1, consultável em www.dgsi.pt.

7) Constitui tendência generalizada da jurisprudência recente deste Supremo Tribunal de Justiça salientar que o valor das indemnizações por danos de natureza não patrimonial deve reflectir o aumento generalizado do custo de vida de forma para compensar, de facto, o lesado e atingir a finalidade que a doutrina e a jurisprudência lhe atribuem.

Vejamos então o caso dos autos.

8) Do elenco dos factos provados salientam-se, por mais relevantes, os seguintes factos que traduzam a gravidade da lesão sofrida e foram considerados em primeira e segunda instância na quantificação do valor da compensação/indemnização devida ao autor:

a) Por ocasião do acidente de viacção o autor ficou encarcerado na viatura em que seguia, inconsciente, politraumatizado, com hemorragia digestiva e enfisema subcutâneo direito, tendo sido, ainda no local, após estabilização com colar cervical e colete de extração, sedado, entubado e colocado em suporte ventilatório mecânico;

b) Em consequência do acidente foi-lhe diagnosticado no Hospital de ... politrauma com traumatismo craniano grave, com inúmeros focos de contusão hemorrágica em ambos os hemisférios cerebrais, hematoma peri-orbitrário direito com pupila ipsilateral midriática e não reativa, hemorragia nasal e da orofaringe importante, traços de fratura nos ossos do maciço facial, seios maxilares, esfenoidal, frontais, paredes das orbitas e nos ossos próprios do nariz; fratura na vertente posterior do canal ótico esquerdo, na apófise zigomática direita e grande asa esfenoide direita e fractura de vários arcos costais bilateralmente e fratura da asa da omoplata direita.

c) O autor permaneceu nos cuidados intensivos cerca de vinte dias, tendo sido submetido em 21 de setembro se 2016 a traqueostomia cirúrgica para proteção da via aérea;

d) Posteriormente foi transferido para o serviço de TCE (Traumatologia Crânio-Encefálica), onde lhe veio a ser retirada a cânula de traqueostomia;

e) O autor foi submetido em 6 de outubro de 2016 a craniotomia frontal bilateral com drenagem de pneumocefalo e plastia do andar anterior por fistula traumática, após o que desenvolveu hematoma epidural pós craniotomia que determinou a necessidade de nova cirurgia com reabertura de craniotomia e drenagem de hematoma.;

f) Durante o internamento hospitalar desenvolveu pneumonia de aspiração bilateral e pneumonia associada a ventilação invasiva, com isolamento por infeção por pseudomonas MS SR;

g) Em 15 de novembro de 2016 foi transferido para o serviço de fisiatria do Hospital de ..., para tratamento fisiátrico intensivo, tendo ali dado entrada desorientado no tempo e no espaço e necessitando de auxílio para se alimentar, vestir e cuidar da sua higiene;

h) Os défices cognitivos de que ficou a padecer eram muitíssimo significativos, os quais embora tenham melhorado, persistiam à data da sentença;

i) O autor fez no serviço de fisiatria do Hospital de ...terapia da fala e fisiatria;

j) O autor foi transferido para o Centro de Reabilitação ...em 11 de janeiro de 2017, apresentando à chegada a esta instituição suspeita de alterações cognitivas múltiplas, disartria flácida ligeira, discreta alteração na prova dedo-nariz à direita, provavelmente por falta de visão, já que o Requerente não via, nem vê com o olho direito, em consequência do sinistro e caminhava com recurso a bastão;

k) Naquele Centro realizou programa de reabilitação integral e abrangente, em esquema bidiário multimodal (fisioterapia, terapia da fala, enfermagem de reabilitação e reabilitação cognitiva), e, aquando da alta já não necessitava de auxiliares de marcha, mas carecia de supervisão por manter desorientação espacial, conseguia subir um lanço de escadas sem apoio no corrimão, mas sem total segurança e tinha autonomia para a maior parte das atividades da vida diária, mas necessitava e ainda necessita de supervisão para as atividades da vida diária instrumentadas.

l) As lesões sofridas pelo autor causaram-lhe dores físicas muito intensas, tanto no momento do acidente, como no decurso dos tratamentos, tendo sido fixado o quantum doloris no grau 6 de uma escala de 7.

m) As sequelas de que ficou a padecer definitivamente continuam a provocar-lhe dores físicas, incómodo e mal-estar, que o vão acompanhar durante toda a vida causando-lhe profundo sentimento de desgosto;

n) Antes do acidente o autor era um jovem saudável, contando então vinte e três anos de idade, que gostava de sair com amigos, ir a bares, cafés e ginásios e praticar atividades físicas, em especial desportos ao ar livre.

o) O autor apresenta actualmente um défice permanente de integridade físico-psíquica de 61 pontos e um dano estético permanente avaliável no grau 4 numa escala de 7;

p) As lesões sofridas pelo autor continuam a ter uma repercussão de carácter permanente da prática de actividades desportivas e de lazer no grau 3 de uma escala de 7 e na actividade sexual no grau 4 de uma escala de 7.

9) Dos factos descritos no ponto anterior retira-se a conclusão de que as lesões sofridas pelo autor tiveram consequências muito graves na sua saúde física e no seu bem estar psicológico, provocando nele sofrimento em grau assaz relevante e limitação na sua capacidade de interação social, mantendo-se os seus efeitos e os tratamentos realizados até à sua estabilização clínica, por um período de tempo muito prolongado.

O autor, que aos vinte e três anos viu alteradas, sem que para tal tivesse contribuído, muitas das expectativas que tinha em relação a seu futuro subitamente alteradas, continua a sofrer – e assim acontecerá seguramente no resto da sua vida – dores e incómodos derivados das lesões sofridas com origem no acidente de viacção a que os autos se reportam

10) Nas conclusões 2 a 14 das suas alegações do recurso de revista a seguradora recorrente aponta três razões para afirmar que o valor encontrado para ressarcimento dos danos de natureza não patrimonial encontrado no acórdão recorrido é exagerado:

- em primeiro lugar, o acórdão recorrido condenou a recorrente a pagar juros de mora desde a citação, sem atender ao disposto no artigo 566.º n.º 2 do Código Civil que aponta no sentido de o valor da indemnização ser actualizado à data mais próxima que possa ser considerada pelo tribunal daí resultando que a contagem de juros de mora a partir da decisão atualizadora não poderia ser feita a partir da citação (Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 4/2002, publicado na I Série do DR de 27/06);

- em segundo lugar, não se extrai dos factos apurados um dos fundamentos expressos na quantificação dos danos não patrimoniais sofridos pelo autor, mais precisamente que ele tinha à data do acidente de que foi vítima modesta condição económica, não trabalhava e quando o fazia ajudava a família;

- em terceiro lugar, o valor arbitrado ao autor afasta-se do quantitativo que a título de danos não patrimoniais tem sido fixado pela jurisprudência, não sendo adequado nem equitativo à reparação dos danos não patrimoniais sofridos pelo autor.

11) Resulta dos pontos 43 a 46 dos factos apurados que antes do sinistro, no Brasil, o autor trabalhava num supermercado auferindo salário equivalente a, sensivelmente, 591,00 euros, com o que provia ao seu sustento e da sua família e que, por causa do acidente a que os autos se reportam, perdeu o seu emprego e meio de sustento, tendo deixado de poder prover ao sustento da sua família.

Apesar de não corresponder à situação apurada – tal como se mostra descrita – que o autor estivesse desempregado aquando do acidente de viacção – sabe-se apenas que no Verão de 2016 o autor decidiu viajar para a Europa e, entre outros, fazer os Caminhos de Santiago – não se vê como possa concluir-se que ele não tinha à data do acidente uma situação económica modesta que deva interferir negativamente na determinação do valor da indemnização, nos termos do artigo 494.º do Código Civil.

Na verdade, apesar de o salário então auferido pelo autor ser superior ao salário mínimo nacional vigente à data em Portugal (530,00 euros), não restam dúvidas de que ele era substancialmente inferior ao salário médio mensal então praticado em Portugal (superior a 900,00 euros) e que era com esse valor que o autor provia ao seu sustento e ao do seu agregado familiar.

Ainda que se desconheçam os valores concretamente alocados à satisfação de necessidades básicas de alojamento e alimentação do agregado familiar do autor os dados de experiência comum apontam inequivocamente no sentido de o nível de poupança que o salário auferido permitiria ser praticamente inexistente.

Improcede este argumento deduzido pela seguradora recorrente.

12) No acórdão recorrido citaram-se dois acórdãos recentes que se pronunciaram sobre a indemnização a atribuir para ressarcimento de danos não patrimoniais sofridos na sequência de acidentes de viação em situações semelhantes à dos presentes autos no que se refere à faixa etária dos lesados e gravidade das lesões sofridas.

São eles o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21 de junho de 2022, prolatado na revista 1633/18.4T8GMR.G1.S1 1 e julgado nesta seção e o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 24 de janeiro de 2023, proferido na apelação 2833/17.0T8CBR.C1, ambos disponíveis em www.dgsi.pt.

Tal como se aponta no acórdão recorrido, tendo em conta os parâmetros de equidade a que a lei manda atender, por imperativo de justiça e de igualdade de tratamento de situações similares decididas anteriormente, haverá que considerar e, em concreto, os seguintes elementos:

- a total ausência de culpa do autor na produção do acidente;

- a sua idade de 23 anos à data do acidente, já que nasceu a ...de junho de 1993, sendo um jovem na fase inicial da sua vida adulta, saudável, fisicamente bem constituído, dinâmico e trabalhador que gostava de sair com os amigos, ir a bares, cafés, festas, ginásios e praticar atividades físicas, em especial desportos ao ar livre afectadas no grau 3 de uma escala de 7;

- o dano estético de que ficou a sofrer no grau 4 de uma escala de 7;

- a repercussão / afectação da sua actividade sexual num grau de 4 numa escala de 7;

- a sua modesta condição económica;

- a intensidade e a gravidade das lesões sofridas pelo autor (ver pontos 50 e 51 do elenco dos factos provados de onde consta que as lesões sofridas pelo autor lhe provocaram dores físicas muito intensas, tanto no momento do acidente, como no decurso dos tratamentos e que as sequelas de que ficou a padecer definitivamente continuam a provocar-lhe dores físicas, incómodo e mal-estar, que o vão acompanhar durante toda a vida e, sobretudo, provocam-lhe um profundo sentimento de desgosto), sendo que o quantum doloris foi fixado no grau 6 de uma escala de 7;

- a redução permanente das suas capacidades funcionais (défice funcional permanente de integridade físico-psíquica) em 61 pontos;

- a prolongada recuperação de mais de dois anos e meio - a data da consolidação médico-legal das lesões foi estabelecida em 25 de março de 2019;

- a permanência futura de dores físicas e incómodos.

Ora o teor e a gravidade das circunstâncias descritas tornam manifestamente insuficiente para o ressarcimento dos danos de natureza não patrimonial sofridos pelo autor a atribuição da indemnização proposta pela seguradora recorrente (50.000,00 euros) e, bem assim, a indemnização na quantia a esse título arbitrada em primeira instância (125.000,00 euros).

13) Não diverge de modo flagrante dos padrões de avaliação jurisprudencial do dano invocado tal como utilizados em decisões similares nem extravasa os limites de equidade, ponderadas as circunstâncias do caso concreto apuradas e anteriormente descritas, a atribuição no acórdão recorrido da quantia de 175.000,00 (cento e setenta e cinco mil euros) para ressarcimento dos danos não patrimoniais sofridos pelo autor.

Termos em que, sindicando-se no Supremo Tribunal de Justiça a questão de direito consistente na adequação do uso da margem conferida pela equidade, nesta parte se confirma a decisão recorrida.

14) Quanto há questão da data a partir da qual são devidos juros de mora parece haver um equívoco da parte da seguradora recorrente.

Na verdade, apesar de a sentença proferida em primeira instância a ter condenado a pagar juros de mora sobre a quantia global da indemnização arbitrada desde a data da citação 2, do acórdão recorrido não consta qualquer referência à data a partir de quando são devidos juros de mora 3.

Como quer que seja, esclarecendo, sempre se dirá que nos termos conjugados dos artigos 804.º n.º 1 e 2, 805.º n.º 1, 2 alínea b) e 3 e 806.º n.º 1, todos do Código Civil e da interpretação jurisprudencial uniformizadora do Acórdão para Uniformização de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça n.º 4 / 2002 de 09/05/2002 (publicado no Diário da República nº. 146/2002, Série I-A de 2002-06-27), nos termos da qual “sempre que a indemnização pecuniária por facto ilícito ou pelo risco tiver sido objecto de cálculo actualizado, nos termos do n.º 2 do artigo 566.º do Código Civil, vence juros de mora, por efeito do disposto nos artigos 805.º, n.º 3 (interpretado restritivamente), e 806.º, n.º 1, também do Código Civil, a partir da decisão actualizadora, e não a partir da citação.”

Ora estando em causa nestes autos a responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos e bem assim montantes indemnizatórios fixados para ressarcimento de danos não patrimoniais e patrimoniais futuros com base na ponderação fundada, total ou parcialmente, em critérios de equidade, não poderá deixar de se ter em conta que só são devidos juros de mora a partir da decisão actualizadora.

Entre vários outros acórdãos que perfilham o mesmo entendimento o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de março de 2023 na revista 11575/18. 8T8 LSB.L1.S1 (consultável em www.dgsi.pt )em que o ora relator interveio como primeiro adjunto.


◌ ◌



15) Impugna a seguradora recorrente nas conclusões 15 e seguintes das suas alegações de recurso, o valor da indemnização por danos patrimoniais futuros que foi atribuída ao autor.

Em síntese alega que:

O acórdão recorrido atribuiu erradamente relevância ao valor do salário médio nacional à data do acidente quando deveria ter atendido ao valor do salário comprovadamente auferido pelo autor antes do acidente;

O salário médio nacional considerado no acórdão recorrido é um valor ilíquido sujeito a impostos e não o valor que o trabalhador efectivamente aufere, sendo que apenas a este importa atender;

O valor da indemnização a título de danos patrimoniais futuros não deve ser superior ao do valor a esse título atribuído em primeira instância, sendo manifestamente exagerada a verba decidida no acórdão recorrido, até porque foi também atribuída indemnização de montante a liquidar até ao valor de 700.000,00 euros decorrente da necessidade de acompanhamento por terceira pessoa.

16) Dada a circunstância de se tratar de prejuízos que ainda não se reflectiram na situação patrimonial do lesado, mas que em todo o caso assentam na sua indiscutível previsibilidade e inevitável verificação futura, a sua quantificação, sendo possível, exige ainda o recurso a critérios de equidade.

Na quantificação dos danos de natureza patrimonial futuros é viável fazer intervir parâmetros tendentes a uma aproximação ao seu valor a partir do momento em que se apure a situação patrimonial do lesado no momento em que o facto ilícito interferiu com a previsível evolução da sua vida segundo parâmetros estatisticamente mensuráveis como a esperança média de vida e a manutenção da capacidade laboral ao longo da vida.

17) O autor peticionou o pagamento de indemnização a esse título no valor de 400.000,00 (quatrocentos mil euros) (cfr artigo 87.º da petição inicial), atendendo à “perda futura de ganho, considerando a sua idade, a sua incapacidade, o projeto profissional que tinha que lhe daria acesso a um maior rendimento, que era saudável e fisicamente bem constituído, o seu rendimento mensal de € 591,00” e que a esperança média de vida ultrapassava já os oitenta anos.

A sentença de primeira instância teve por ajustada ao ressarcimento dos danos patrimoniais futuros a quantia de € 237.215,58 (duzentos e trinta e sete mil duzentos e quinze euros e cinquenta e oito cêntimos), por correspondente ao da perda da sua capacidade de ganho em consequência do acidente.

O acórdão recorrido, por sua vez, deu integral procedência ao pedido formulado pelo autor na petição inicial, fixando o valor da indemnização em € 400.000,00 (quatrocentos mil euros).

Não obstante os critérios de determinação do concreto valor da indemnização terem sido idênticos em ambas as decisões, os muito diferentes resultados a que chegaram encontram justificação, no essencial, no facto de terem partido de diferentes valores salarias auferidos pelo lesado e de diferente abrangência temporal: a sentença de primeira instância atendeu aos rendimentos comprovadamente auferidos pelo autor antes do acidente (591,00 euros) e ao tempo provável de vida activa do autor (47 anos de vida), ao passo que o acórdão recorrido atendeu ao valor do salário médio nacional à data do acidente (925,00 euros) e a um período de esperança média de vida restante do autor que situou em 55 anos (até aos 78 anos).

18) Os factos mais relevantes para determinação do valor dos danos patrimoniais futuros são os descritos nos pontos 42 a 54 do elenco dos factos provados que aqui sinteticamente se relembram:

Na sequência do acidente de que foi vítima o autor encontra-se absolutamente incapaz de prover ao seu sustento, necessitando do auxílio de terceira pessoa, em especial para se deslocar no exterior, não saindo de casa sozinho por ser incapaz de se orientar;

Antes do acidente o autor trabalhava num supermercado, auferindo salário correspondente a cerca de 591,00 euros, valor com que provia ao seu sustento e ao da sua família (mãe e irmã), pagando a renda de casa, as despesas com água, luz e internet;

O autor perdeu com o acidente o seu emprego e o seu sustento e deixou de poder prover ao sustento da sua família;

Apesar dos tratamentos a que se submeteu o autor ficou a padecer definitivamente de sequelas que afectam a sua capacidade de comunicação, de compreensão do mundo exterior e de locomoção e lhe determinam uma incapacidade permanente para o trabalho em geral de 60,97301 pontos numa escala de 100,00 e incapacidade total para o exercício da sua actividade profissional habitual anterior de cortador de carnes verdes, sendo, no entanto as sequelas permanentes das lesões compatíveis com o exercício de outras profissões da área da sua preparação técnica profissional que não exijam a execução de tarefas complexas;

De acordo com as conclusões do relatório médico legal o autor sofreu um período de Défice Funcional Temporário Total de 256 dias e de Défice Funcional Temporário Parcial de 677 dias, sendo o período de Repercussão Temporária na Atividade Profissional Total de 933 dias, tendo estado totalmente incapacitado, no período compreendido entre a data do sinistro (04/09/2016) e a data da alta (17/05/2017), passando a necessitar de ajudas técnicas permanentes, medicamentosas, tratamentos médicos, ajudas técnicas, ajuda de terceira pessoa.

19) Apesar de o acórdão recorrido ter partido do pressuposto que o autor não auferia qualquer rendimento à data em que sofreu o acidente dos factos, tal conclusão não é de sufragar face aos factos apurados não correspondendo, de resto, à alegação do próprio lesado.

Sabe-se que o autor trabalhou antes da data do acidente e que auferia um determinado salário mensal com que satisfazia as suas necessidades e do seu agregado familiar e que, no Verão de 2016, decidiu viajar para a Europa e que, por foça do acidente dos autos perdeu o seu emprego e deixou de poder suportar as despesas próprias e as do seu agregado familiar.

Os rendimentos a considerar para efeitos de indemnização pela capacidade de ganho perdida são aqueles que ele anteriormente auferia – como aliás o autor também entende e pede – e não o valor do salário médio mensal vigente em Portugal na data do acidente, o qual só é atendível quando não tenha resultado provado o rendimento efectivamente auferido ou quando o lesado ainda não entrou no mercado de trabalho ou se encontrava desempregado à data da lesão de que resultou diminuída a sua capacidade de ganho 4.

Por outro lado, a esperança média de vida à nascença para os homens nascidos em Portugal em 1993 é, segundo dados da “Pordata – Estatísticas sobre Portugal e Europa” da Fundação Francisco Manuel dos Santos e do Instituto Nacional de Estatística, divulgados pela página da Internet www.pordata.pt, de 71 (setenta e um) anos.

20) O cálculo do valor da indemnização a arbitrar ao autor para ressarcimento dos prejuízos futuros deverá ter em consideração que:

- O autor tinha vinte e três anos de idade à data da lesão, sendo a esperança média de vida para os homens nascidos em 1993 de 71 anos;

- O autor sofreu com o acidente uma diminuição da sua capacidade de ganho (défice de integridade físico-psíquica) de 0,61%;

- Auferia do exercício da actividade profissional como cortador de carnes verdes salário mensal de cerca de 591,00 euros.

21) Tomando por base tais elementos o cálculo do valor da indemnização com utilização da fórmula (valor do salário anual X número de anos de esperança de vida X grau de incapacidade actual) atingiria o valor, ficcionado, de rendimentos perdidos ao longo da vida provável do autor de € 242.262,72 (duzentos e quarente e dois mil duzentos e sessenta e dois euros e setenta e dois cêntimos).

O apuramento do montante da indemnização deverá, no entanto, ser ajustado face à antecipação integral do capital do que viria a receber ao longo de várias décadas, com uma muito ligeira redução do valor encontrado decorrente da possibilidade que confere ao lesado de o rentabilizar.

Mas também, como bem refere o acórdão recorrido, importa ponderar, em sentido contrário, para além da mais do que previsível evolução positiva do nível dos rendimentos do trabalho em geral – e inerentes perdas do autor que dela não irá beneficiar – que o autor ficou totalmente incapacitado de exercer a sua profissão habitual e se encontra muitíssimo condicionado para o exercício de qualquer outra profissão ou actividade, mesmo que relacionada com a área da sua anterior actividade profissional.

22) O recurso ao conceito, mais abrangente, de dano biológico derivado da incapacidade geral permanente do lesado, susceptível de enquadrar na mesma realidade jurídica os tradicionais danos de natureza não patrimonial e patrimonial futuros, tem vindo a justificar na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça a ponderação de factores como o chamado dano de esforço – o lesado para conseguir desempenhar as tarefas que anteriormente desempenhava e para as quais continue residualmente capacitado, carece de realizar um empenho ou estímulo acrescido – acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de dezembro de 2017 na revista 505/15.9T8AVR.P1.S1 – ou a impossibilidade de opção por outras e mais rentáveis soluções profissionais através de mudança ou reconversão de emprego – assim, por exemplo o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23 de outubro de 2018 na revista 902/14.7TBVCT.G1.S1, também consultável em www.dgsi.pt .

23) Tendo o acórdão recorrido sido fundado em juízos de equidade com base na ponderação das particularidades e especificidades do caso concreto, e a sua discussão, por não se fundar em estrito critério normativo, não integrar a resolução de uma questão de direito, constitui entendimento uniforme que o Supremo Tribunal de Justiça só deve alterar a decisão impugnada se o critério de equidade tiver conduzido a resultados que se afastem da margem de discricionariedade consentida pela norma que legitima o recurso à equidade, “muito em particular, se o critério adoptado se afastar, de modo substancial, dos critérios ou padrões que generalizadamente se entende deverem ser adoptados, numa jurisprudência evolutiva e actualística, abalando, em consequência, a segurança na aplicação do direito, decorrente da adopção de critérios jurisprudenciais minimamente uniformizados, e , em última análise, o princípio da igualdade” – assim, entre outros o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10 de novembro de 2016 na revista 175/05.2TBPSR.E2.S1.

24) Sendo o valor encontrado no primeiro parágrafo do ponto 21 não mais do que um valor de referência e ponderando as circunstâncias aduzidas supra nos pontos 18), 19) e 20) haverá que reformular o juízo de equidade utilizado no acórdão recorrido e, tendo em conta as circunstâncias de facto comprovadas no caso presente, fixar o valor da indemnização a que o autor tem direito pelo dano patrimonial futuro em 270.000,00 (duzentos e setenta mil euros).

Ao valor da indemnização global arbitrada a título de indemnização devida ao autor será deduzida a quantia que a seguradora recorrente já suportou, conforme vem provado.

25) Em conclusão, a revista interposta pela seguradora ré procede parcialmente, mantendo-se o acórdão recorrido quanto ao valor adequado ao ressarcimento/compensação dos danos de natureza não patrimonial sofridos pelo autor (175.000,00 euros) e alterando o valor da quantia que se tem por ajustada ao ressarcimento dos danos patrimoniais futuros, que se fixa em 270.000,00 euros.

Ao valor global da indemnização (445.000,00 euros) será deduzida a quantia de 12.000,00 euros já paga (factos 73) a 75) e 114) e 115) pela seguradora recorrente ao autor.

A recorrente e o autor suportarão as custas da revista em apreciação, na proporção do respectivo decaimento.


֎ ֎


DECISÃO

Termos em que julgam parcialmente procedente o presente recurso de revista, e, em conformidade:

- Condenam a seguradora recorrente – Caravela, Companhia de Seguros, SA – a pagar ao autor a quantia € 445.000 (quatrocentos e quarenta e cinco mil euros) a título de indemnização para ressarcimento de danos de natureza não patrimonial e de natureza patrimonial futuros, montante a que se deduz a quantia de € 12.000,00 (doze mil euros) já pagos ao autor;

- Sobre a quantia de € 433.000,00 (quatrocentos e trinta e três mil euros), acrescem juros de mora a partir da presente decisão;

- Condenam a recorrente e o autor no pagamento das custas da revista na proporção do respectivo decaimento.

- Permanece inalterada a parte da sentença e do acórdão recorrido não afectada pelo presente acórdão.

Lisboa e Supremo Tribunal de Justiça, 6 de fevereiro de 2024

Manuel José Aguiar Pereira (Relator)

Maria João Romão Carreiro Vaz Tomé

Jorge Manuel Leitão Leal

_____________________________________________

1. O ora relator foi segundo adjunto no coletivo que decidiu a revista em causa.↩︎

2. Cfr alínea a) da parte dispositiva da sentença que tem o seguinte teor:

“a) Condena-se a Ré, Caravela – Companhia de Seguros, S. A., a pagar ao A., AA a quantia de €362.215,58, no entanto, opera-se a compensação de €6.000,00 pagos a título de reparação provisória, pelo que fica a R. obrigada a pagar a quantia de €356.215,58 (trezentos e cinquenta e seis mil duzentos e quinze euros e cinquenta e oito cêntimos), bem como juros moratórios legais civis, contados desde a citação até efectivo e integral pagamento;”↩︎

3. O dispositivo é do seguinte teor:

“Em face do exposto, acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto em julgar parcialmente procedente o recurso interposto pela R. Caravela e totalmente procedente o recurso interposto pelo A., consequentemente e revogando parcialmente a decisão recorrida decidindo:

Condenar a R. Caravela a pagar ao A. a quantia global de € 575.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais e patrimoniais futuros.

A esta quantia deduzindo o valor de € 12.000,00 já adiantados pela R., assim reduzindo o valor a pagar ao total de € 563.000,00.

No mais mantem-se o decidido pelo tribunal a quo.”↩︎

4. No acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21 de junho de 2022, seguido de perto pelo acórdão recorrido, o lesado, apesar de ter anteriormente trabalhado como segurança e auferido rendimentos profissionais nessa sua ocupação profissional, encontrava-se desempregado à data do acidente.↩︎