Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
95/12.4JAAVR-A.P1.S1
Nº Convencional: 7ª SECÇÃO
Relator: ILÍDIO SACARRÃO MARTINS
Descritores: EMBARGOS DE TERCEIRO
PENHORA
VEÍCULO AUTOMÓVEL
ACTO DE REGISTO
ATO DE REGISTO
OPONIBILIDADE
MATÉRIA DE FACTO
REAPRECIAÇÃO DA PROVA
MODIFICABILIDADE DA DECISÃO DE FACTO
PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Data do Acordão: 05/23/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADO PROVIMENTO À REVISTA
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – PROCESSO DE DECLARAÇÃO / RECURSOS / JULGAMENTO DO RECURSO / RECURSO DE REVISTA.
DIREITO CIVIL – DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / CUMPRIMENTO E NÃO CUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES / NÃO CUMPRIMENTO / REALIZAÇÃO COACTIVA DA PRESTAÇÃO / ACÇÃO DE CUMPRIMENTO E EXECUÇÃO.
Doutrina:
- Amâncio Ferreira, Curso de Processo de Execução, 8ª edição, p. 277-278;
- Antunes Varela, Manual de Processo Civil, 2ª ed., p. 653;
- Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, volume 2º, 2ª edição, p. 660;
- Lopes do Rego, Comentários ao Código de Processo Civil, Volume I, 2ª edição, 2004, p. 545;
- Miguel Teixeira de Sousa, Prova, poderes da Relação e convicção: a lição da epistemologia, Cadernos de Direito Privado nº 44, Outubro/Dezembro de 2013, p. 29 e ss. ; Estudos sobre o novo Processo Civil, p. 348;
- Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil- Os Artigos da Reforma, 2014, 2ª Edição, Vol I, Almedina, p. 588 e 589.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 674.º, N.º 3, 662.º E 682.º, N.ºS 1 E 2.
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 819.º E 822.º, N.º 1.
CÓDIGO DO REGISTO PREDIAL (CREGP): - ARTIGO 6.º, N.º 1.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

- DE 08-06-2011, PROCESSO N.º 350/98.4TAOLH.S1;
- DE 06-07-2011, PROCESSO N.º 8609/03.4TVLSB.L1.S1;
- DE 06-07-2011, PROCESSO N.º 645/05.2TBVCD.P1.S1;
- DE 24-09-2013, PROCESSO N.º 1965/04.9TBSTB.E1.S1, TODOS IN WWW.DGSI.PT.


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ACÓRDÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL:

- ACÓRDÃO N.º 55/85, IN BMJ 360 (SUPLEMENTO), P. 195.
Sumário :
I - Os poderes do Supremo Tribunal de Justiça são muito limitados quanto ao julgamento da matéria de facto, cabendo-lhe, fundamentalmente, e salvo situações excepcionais (artigo 674º nº 3 in fine e artigo 682º nº 2 do CPC), limitar-se a aplicar o direito aos factos materiais fixados pelas instâncias (682º nº 1 do CPC) e não podendo sindicar o juízo que o Tribunal da Relação proferiu em matéria de facto.

II - Contudo, o Supremo Tribunal de Justiça, como tribunal de revista, pode censurar o modo como a Relação exerceu os poderes de reapreciação da matéria de facto, já que se tal for feito ao arrepio do artigo 662º do Código do Processo Civil, está-se no âmbito da aplicação deste preceito e, por conseguinte, no julgamento de direito.

III - A penhora envolve a constituição de um direito real de garantia, conferindo ao credor/exequente o direito de ser pago com preferência a qualquer outro credor, que não tenha garantia real anterior (artº 822° nº 1 do Código Civil) e gerando ineficácia, em relação ao exequente, dos actos de disposição ou de oneração dos bens penhorados, sem prejuízo das regras de registo (artº 819º do Código Civil).

IV - O direito inscrito em primeiro lugar prevalece sobre os que se lhe seguirem relativamente aos mesmos bens, por ordem da data dos registos e, dentro da mesma data, pelo número de ordem das apresentações correspondentes - artigo 6º nº 1 do Código do Registo Predial.

V – A penhora do veículo encontra-se registada em 02.11.2016, data anterior ao do registo da aquisição do veículo pela embargante (07.12.2016); por isso, tal aquisição não poderá ser oponível ao exequente, só o podendo ser se caso tivesse sido adquirido anteriormente.

Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça




I - RELATÓRIO


Por apenso aos autos de execução intentados por AA contra BB, CC, Lda deduziu embargos de terceiro, pedindo que os embargos sejam procedentes e, por via deles, ser reconhecido que o veículo automóvel Mercedes-Benz, modelo CLS 350 CDI, matrícula 17-...-70 é propriedade da embargante, sendo também reconhecida como sua possuidora e, em consequência, ser ordenado o levantamento da penhora, cancelando o registo que incide sobre o dito veículo, dando-se sem efeito a apreensão que sobre o mesmo incide.


Em síntese, alegou que se dedica à venda de veículos usados, sendo a mesma que detém a posse e é proprietária daquele veículo, nunca tendo o executado sido seu proprietário ou possuidor, apesar de, na data da penhora, o mesmo estar registado em seu nome.


O exequente deduziu oposição, sustentando que a factualidade invocada e por si impugnada é mais um expediente para a embargante recuperar o referido veículo automóvel.


Foi proferida sentença que julgou procedentes os embargos de terceiro e, em consequência, determinou o levantamento da penhora efectuada sobre o referido veículo.


A exequente recorreu e a Relação, por acórdão de 10.01.2019, concedeu provimento ao recurso e revogou a sentença recorrida, julgando improcedentes os embargos de terceiro.


Não se conformando com aquele acórdão, a embargante recorreu de revista, tendo formulado as seguintes CONCLUSÕES:

1ª - O Tribunal da Relação pode oficiosamente alterar a matéria de facto, nos termos do artigo 662º do CPC.

2ª - No entanto, não o pode fazer quando, nos termos do artigo 674º3 do Código de Processo Civil, ofende a validade de um meio de prova.

3ª - O tribunal recorrido alterou a matéria de facto sem ter em consideração o valor da prova documental existente nos autos, e cuja autenticidade, quer da elaboração, quer do seu teor, não foi colocada em causa por nenhuma das instâncias.

4ª - O mesmo se aplica à prova testemunhal.

5ª - A força probatória dos documentos em causa, especialmente do documento emitido pela PSP de …, não foi respeitada pelo tribunal recorrido.

6ª - Alterou a matéria de facto sem ter atendido/valorado o seu teor.

7ª - Referindo apenas que ficou com dúvidas sobre a ocorrência dos factos.

8ª - No entanto, dúvida não pode haver, já que o documento é datado de 13 de Julho de 2016, data anterior ao registo da penhora pelo recorrido/embargado AA e posterior ao registo na Conservatória dos Registos Automóveis da alegada aquisição em nome do outro embargado, BB.

9ª - No documento aludido, articulado com a restante prova documental, designadamente fls 39 a 41 dos autos, acrescida da prova testemunhal, que não foi colocada em causa, não restam dúvidas que a embargante era possuidora real e em nome próprio do veículo em causa aquando do registo da penhora pelo embargado.

10ª - A incúria do seu gerente ao não proceder ao registo na Conservatória dos Registos Automóveis em seu nome, não afasta a sua natureza de possuidora.

11ª - A prova documental em causa reproduz os factos relatados na petição de embargos e confirma os pontos 11, 24 a 28 e por consequência do 29 ao 34 da matéria de facto, que deverá voltar a ser dada por provada, com as consequências legais daí atinentes.

12ª - Ao não tomar em consideração esta prova documental, o tribunal recorrido violou os artigos 674º nº 3 do CPC, os artigos 341º e 362º do Código Civil e o artigo 607º5 do CPC (já que os factos que o mesmo corporiza encontram-se plenamente provados, sem o juiz poder recorrer à sua livre convicção).

13ª - Nos termos do artigo 1268º do CC, o possuidor goza da presunção da titularidade do direito, já que não há registo anterior ao início da sua posse (o registo da penhora a favor do embargado foi posterior ao início da posse da embargante, como já se referiu).

14ª - Tendo havido uma violação deste preceito legal pelo tribunal recorrido.

15ª - Considerando o tribunal ad quem como provada a matéria de facto constante nos pontos nºs 8, 9, 10, 12 a 17 e constituindo todos eles actos materiais e públicos de posse sobre o veículo pela embargante, não pode depois decidir que a mesma não praticou actos de posse.

16ª - Estes não foram actos de posse precária, mas de verdadeiro e real possuidor, constituindo actos essenciais que a definem, havendo violação dos artigos 1262º e 1263, alínea a) do CC e 5º nº 1 do CPC.

17ª - Nunca tendo havido perda da posse, muito menos pela sua cedência, já que, apesar dos registos formais a favor de terceiros, sempre foi a embargante que teve o domínio e a disponibilidade sobre o veículo.

18ª - Basta ver que o registo estava em nome da DD quando foi por si transferido para o BB.

19ª - Não é pelo facto de nunca o veículo em causa ter estado formalmente registado a favor da embargante na Conservatória dos Registos automóveis, que não lhe pertence.

20ª - No sistema jurídico português o registo apenas presume a titularidade, constituindo uma presunção "juris tantum” nos termos conjugados dos artigos 29º do Dec-Lei 54/75, de 12 de Fevereiro, e do artigo 7º do Cód. Reg. Predial.

21ª -“Havendo conflito de presunções, v.g., entre registo e posse, deve prevalecer, em princípio, a que emergir de facto mais antigo - (ver artº 1268º do C.Civil; Ac. STJ, in BMJ nº 414/545 e Oliveira Ascensão, Direitos Reais, 4ª ed., págs. 342/343.

22ª - Prevalece a presunção possessória, ou seja a posse da embargante.

23ª - Independentemente das datas de 07/08 e 11 de Julho poderem motivar alguma confusão, não invalidam que se tenha provado que a embargante, pelo menos no dia 13 de Julho de 2016, tinha a posse do veículo (documento emitido pela PSP de … e depoimento das testemunhas EE, FF e GG e declarações de parte do gerente da embargante).

24ª - Essa data já é posterior à data do registo na Conservatória dos Registos Automóveis a favor do embargado BB e anterior à penhora registada a favor do embargado AA.

25ª - Essa posse foi ininterrupta (como foi mencionado na sentença da 1ª instância).

26ª - Tendo por isso, com esta decisão, o tribunal violado os artigos 29º do Dec-Lei 54/75, de 12 de Fevereiro e o artº 7º do Cód. Reg. Predial.

27ª - Decidiu em conformidade de facto e de direito, o tribunal a quo, devendo por isso a decisão recorrida ser revogada, mantendo-se a sentença por aquele proferida.


Termina, pedindo que o acórdão recorrido seja revogado e substituído por outro que julgue os embargos de terceiro procedentes por provados, em conformidade com a sentença proferida em primeira instância.

 

Não houve contra-alegações.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.


II - FUNDAMENTAÇÃO


A) Fundamentação de facto


Mostram-se provados os seguintes factos, após a modificação oficiosa efectuada pela Relação:

1. Nos autos principais de execução é exequente AA e executado BB, (autos apensos).

2. Com data de 02.X1.2016, foi elaborado auto de penhora relativo ao veículo automóvel de marca Mercedes-Benz e modelo CLS 350 CDI e de matrícula I7-…-70, mostrando-se registado o pedido de penhora com data de 02. XI.2016 - (auto de penhora de lis. 112 e 113 dos autos principais).

3. Com data de 07.XII.2016, a embargante solicitou a inscrição no registo automóvel da aquisição do veículo referido em 1, declarando tê-lo comprado em 11.X.2016; a propriedade foi inscrita no registo com data de 07.XII.2016 - (certidão de teor das inscrições do veículo emitida pela CRA de fls. 31).

4. O embargado BB constava na data dita em 3 como proprietário inscrito no registo desde 05.VH.2016 - (certidão de teor das inscrições do veiculo emitida pela CRA de fls. 31).

5. A embargante, que é uma sociedade comercial, dedica-se, além de outras actividades, à venda de veículos automóveis usados - (cfr certidão de matrícula de fls. 35 a 38).

6. Além da divulgação que efectua dos veículos automóveis no sítio da internet tem um estabelecimento comercial, junto ao supermercado "Modelo", na cidade de …, na Zona Industrial, utilizando a designação comercial "HH".

7. Local onde os veículos para venda se encontram em exposição ao público.

8. Era onde se encontrava o veículo em causa no dia em que o executado/embargado BB o viu.

9. Como se encontrava publicitado no sitio da internet, com o link http://HH.com.pt/HH/cars/mercedes-benz-cls-350-amg-3-0- bluefficience - (cfr documento de fls. 39 a 41).

10. O mencionado veículo era utilizado regularmente pelo gerente da embargante, para se deslocar.

11. Não provado – Cfr fls 214 vº e 215 dos autos e 10 e 11 do acórdão da Relação.

12. A embargante colocou tal veículo em exposição ao público no seu stand, com publicidade no seu sítio da internet, onde permanece desde então - (doc de fls.47 e 48, pesquisa do site dito em 9).

13. A 31 de Março de 2016 a embargante outorgou um contrato de venda do dito veículo com DD, pelo preço de € 55.000,00 (com o pagamento parcial em dinheiro e na retoma de urn veículo) - (doc de fls.49)

14. Efectuou o registo de propriedade em nome da compradora, com pagamento de multa, já que a antiga proprietária e ela própria não haviam procedido à formalização do mesmo - (doc de fls.50).

15. E procedeu até então à revisão do veículo, tendo pago a mesma - (doc de fls.54 a 61).

16. Mas houve desistência do negócio pela compradora, que entregou à embargante uma declaração de registo de propriedade devidamente assinada para proceder à sua transferência e que foi utilizada para levar a cabo o registo em nome do embargado BB.

17. O veículo continuou na embargante, em exposição para venda, com publicidade no sítio da Internet e sendo utilizada pelo seu gerente, quando necessário, em seu nome e por sua conta.

18. Face à actividade comercial exercida pela embargante e por ter uma relação de amizade com um dos seus colaboradores, FF, o embargado BB, no fim do mês de Junho de 2016, dirigiu-se às suas instalações, com o propósito de adquirir um veículo automóvel.

19. O referido FF mostrou-lhe diversos automóveis, incluindo o dito em 2, de que o embargado BB gostou e afirmou pretender adquirir.

20. O preço afixado era de € 55.000,00 mas o negócio, após algum tempo de negociações, foi acordado em € 53.000,00, que submeteram a documento escrito - (documento de fls. 42, contrato escrito de 30 de Junho de 2016).

21. Não provado – Cfr fls 215 e vº dos autos e 11 e vº do acórdão da Relação.

22. O próprio embargado/executado assinou/outorgou no dia 30 de Junho de 2016, data em que assinou o contrato de compra e venda dito em 20, uma confissão de dívida do valor total do veículo, onde afirma que o preço seria pago no prazo de trinta dias - (documento de fls. 43)

23. A embargante procedeu ao averbamento on line do registo em nome do embargado BB em 5.V1L2016 (documento de fls. 30 a 34)

24 a 28 - Não provados – Cfr fls 215 vº a 217 dos autos e 12 a 15 do acórdão da Relação.

29 a 34 - Não provados – Cfr fls 217 e vº dos autos e 15 e vº do acórdão da Relação.

35. A dada altura, o embargado BB entregou o veículo ao representante legal da embargante, II, juntamente com uma declaração de registo de propriedade devidamente assinada para aquela poder regularizar a situação na Conservatória de Registos Automóveis - (doc de fls. 51 a 53).

36. A embargante apenas fez no passado dia 07 de Dezembro de 2016, data em que teve conhecimento da existência da penhora nos presentes autos sobre o dito veiculo, o registo de aquisição deste veículo.

37. Data em que, por ter um comprador para o automóvel dito em 3, e porque o mesmo pretendia recorrer ao crédito, impunha que a sociedade vendedora fosse formalmente a titular do veículo.


Factos não provados

11. A embargante tinha e tem ininterruptamente na sua posse o veículo, pelo menos desde Agosto de 2014, data em que o adquiriu à sua primeira proprietária em Portugal, JJ, residente na Rua …., em … - (doc de fls. 46, declaração aduaneira)

12. A embargante adquiriu-o nesta data este veículo para venda

21. Foi acordado que o preço seria pago da seguinte forma: €15.000,00 na data da entrega da declaração do registo de propriedade a seu favor que o Embargante BB exigiu e o restante em divida, no valor de € 38.000,00, seria pago aquando da entrega do veículo.

24. Entre o dia 7/8 de Julho de 2016, o embargado BB, com o pretexto de que pretendia fazer o seguro ao veículo, com danos próprios porque iria levantar o veículo, com o seu consequente pagamento, solicitou que lho facultassem por horas levar o veículo à companhia de seguros para poder tirar fotografias e verificar o livro de revisões.

25. Ao que o gerente da embargante, que nesse dia o conduzia para levar à revisão, acedeu, entregando o veículo e chaves ao embargado BB, deixando no mesmo pertences pessoais.

26. Tendo-se o embargado BB comprometido a demorar pouco a entregar o veículo.

27. Todavia, mesmo contactado telefonicamente, não o fez nem nesse dia nem nos seguintes.

28. O que motivou que a embargante apresentasse no dia 11 de Julho participação criminal contra o embargado, denunciando o furto, na PSP de ….

29. Sendo que nesse mesmo dia o gerente da empresa embargante recebeu um telefonema, do dono de uma oficina de reparação de automóveis sito em …, na Rua …, numero 100, a referir-lhe que o veículo em causa lhe foi oferecido para venda por € 25.000,00 desconfiando dessa proposta, face ao seu modelo e características.

30. E que o contactou por ter reparado que na matrícula constava o endereço electrónico da embargante www.HH.com.pt, tendo procurado na internet e encontrado a sua página, na qual constam os contactos, inclusive o numero de telemóvel do seu gerente.

31. O gerente da embargante contou-lhe o sucedido e combinaram que o veículo ficaria retido na oficina, com o pretexto de ter um problema mecânico até que chegassem as entidades policiais e o representante da embargante, o que aconteceu.

32. O dono da oficina disse ao gerente da embargante que até por € 15.000,00 o embargado BB aceitava vender-lhe o veículo.

33. Quando tal ocorreu, a embargante procedeu como descrito em 28 e pela PSP de … foi contactada a Esquadra da PSP de …, que accionou o piquete da DIC ….

34. Pelo que, quando o representante da embargante chegou ao local, acompanhado por um amigo já aí se encontravam as autoridades policiais e o embargado BB.

35. O ocorrido neste item sucedeu no dia 11 de Julho de 2016.

36. O descrito neste item deveu-se a negligência da embargante.

a) - Que a revisão dita em 15 orçou em (767€);

b) - Que a DD pagou à embargante as despesas tidas referidas em 15 e de registo;

c) - Que por ocasião do descrito em 31 o gerente da embargante combinou com o mencionado dono da oficina que lhe pagaria o tempo que o veículo aí permanecesse.


B) Fundamentação de direito


As questões colocadas e que este tribunal deve decidir, nos termos dos artigos 663º nº 2, 608º nº 2, 635º nº 4 e 639º nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil são as seguintes:

- Deficiência formal da apreciação das provas e da fixação dos factos materiais da causa.

- A questão de direito.


DEFICIÊNCIA FORMAL DA APRECIAÇÃO DAS PROVAS E DA FIXAÇÃO DOS FACTOS MATERIAIS DA CAUSA.


A recorrente alega que o acórdão da Relação, ao alterar a matéria de facto, ofende a validade de um meio de prova, nos termos do disposto no artigo 674º nº 3 do CPC, pois não teve em consideração o valor da prova documental existente nos autos, e cuja autenticidade, quer da elaboração, quer do seu teor, não foi colocada em causa por nenhuma das instâncias.


Refere-se especialmente à força probatória do documento emitido pela PSP de … que não foi respeitada pelo tribunal recorrido.

Trata-se do documento datado de 13 de Julho de 2016, data anterior ao registo da penhora pelo recorrido/embargado AA e posterior ao registo na Conservatória dos Registos Automóveis da alegada aquisição em nome do outro embargado, BB.

No documento aludido, articulado com a restante prova documental, designadamente fls 39 a 41 dos autos, acrescida da prova testemunhal, que não foi colocada em causa, não restam dúvidas que a embargante era possuidora real e em nome próprio do veículo em causa aquando do registo da penhora pelo embargado.


Cumpre decidir.

Como é sabido, os poderes do Supremo Tribunal de Justiça são muito limitados quanto ao julgamento da matéria de facto, cabendo-lhe, fundamentalmente, e salvo situações excepcionais (artigo 674º nº 3 in fine e artigo 682º nº 2 do CPC), limitar-se a aplicar o direito aos factos materiais fixados pelas instâncias (682º nº 1 do CPC) e não podendo sindicar o juízo que o Tribunal da Relação proferiu em matéria de facto.


Efectivamente, preceitua o nº 3 do artigo 674º do CPC que “o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto de recurso de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova”.


Contudo, o Supremo Tribunal de Justiça, como tribunal de revista, pode censurar o modo como a Relação exerceu os poderes de reapreciação da matéria de facto, já que se tal for feito ao arrepio do artigo 662º do Código do Processo Civil, está-se no âmbito da aplicação deste preceito e, por conseguinte, no julgamento de direito[1].


Ou seja, e nas palavras do acórdão do STJ de 06/07/2011[2], “se a este Supremo Tribunal de Justiça lhe é vedado sindicar o uso feito pela Relação dos seus poderes de modificação da matéria de facto, já lhe é, todavia, possível verificar se, ao usar tais poderes, agiu ela dentro dos limites traçados pela lei”.


Trata-se, por conseguinte, de verificar se o Tribunal da Relação, ao usar os seus poderes, respeitou a lei processual, o que é inequivocamente, e como também destaca o Acórdão do STJ de 06/07/2011, matéria de direito[3].


Entremos agora na questão nuclear que diz respeito à alegada deficiência formal da apreciação das provas e da fixação dos factos materiais da causa, ou seja, à fundamentação da matéria de facto e à análise crítica das provas.


Se se exige que o Tribunal da Relação forme livremente a sua própria convicção, ainda que a mesma porventura possa coincidir com a (também ela livre) convicção do julgador de 1ª instância, a fundamentação da decisão deve, de modo transparente, mostrar o caminho próprio que o Tribunal da Relação seguiu ao formar essa convicção e ao decidir da matéria de facto.


Nas palavras do Acórdão do STJ de 08.06.2011[4], “motivar é justificar a decisão de modo a que possa ser controlada, desde logo, pelo tribunal e, naturalmente, pelos sujeitos processuais e pelas instâncias de recurso”.

Assim, da fundamentação deve resultar, com clareza, o caminho próprio que o Tribunal da Relação seguiu para formar a sua própria convicção, não podendo ser suficiente uma remissão ou concordância genérica com a fundamentação da 1ª instância, como destacou, entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24/09/2013[5], anotado em sentido concordante por Miguel Teixeira de Sousa[6], e em que se afirma inequivocamente que “a reapreciação das provas não pode traduzir-se em meras considerações genéricas, sem qualquer densidade ou individualidade que as referencie ao caso concreto”.


Sobre esta matéria prescreve o artigo 607º nº 4 do C.P.Civil o seguinte:

“Na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência”.


No regime de fundamentação da sentença ou do acórdão sobre matéria de facto, para além da fundamentação das respostas positivas, o juiz passa a ter de justificar as respostas negativas; por outro lado, a decisão, para além de especificar os fundamentos que foram decisivos para convicção do julgador, tem de proceder à análise crítica das provas.



Isto significa que o juiz deve esclarecer quais as provas que o levaram a formar a sua convicção e deve ainda analisar criticamente as provas produzidas, explicando os motivos que o levaram a optar por uma determinada resposta.


Para Antunes Varela, “além do mínimo traduzido na menção especificada dos meios de prova geradores da convicção do julgador, deve este ainda, para plena consecução do fim almejado pela lei, referir, na medida do possível, as razões da credibilidade ou da força decisiva reconhecida a esses meios de prova”[7].


Miguel Teixeira de Sousa refere que “ o tribunal deve indicar os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento do facto provado ou não provado. A exigência da motivação da decisão não se destina a obter a exteriorização das razões psicológicas da convicção do juiz, mas a permitir que o juiz convença os terceiros da correcção da sua decisão. Através da fundamentação, o juiz passa de convencido a convincente”[8].


Em anotação ao artigo 653º nº 2 (a que corresponde o actual 607º nº 4), Lopes do Rego escreveu: “… a fundamentação da decisão sobre a matéria de facto, provada e não provada, deverá fazer-se por indicação dos fundamentos que foram decisivos para a convicção do juiz, o que compreenderá não só a especificação dos concretos meios de prova, mas também a enunciação das razões ou motivos substanciais por que eles relevaram ou obtiveram credibilidade no espírito do julgador – só assim se realizando verdadeiramente uma “análise crítica das provas”. Tal circunstância determinou a alteração do preceituado no nº 5 do artigo 712º do CPC, podendo ter lugar a remessa do processo à 1ª instância para fundamentação da decisão proferida sobre a matéria de facto sempre que ela se não mostre “devidamente fundamentada” (e não apenas quando omita a menção dos concretos meios de prova que a suportaram)[9].


Segundo o acórdão nº 55/85 do Tribunal Constitucional[10], a fundamentação das decisões jurisdicionais cumpre, em geral, duas funções:

a) Uma, de ordem endoprocessual, que visa essencialmente impor ao juiz um momento de verificação e controlo crítico da lógica da decisão, permitindo às partes o recurso da decisão com perfeito conhecimento da situação e ainda colocar o tribunal de recurso em posição de exprimir, em termos mais seguros, um juízo concordante ou divergente com o decidido;

b) Outra, de ordem extraprocessual, já não dirigida essencialmente às partes e ao juiz “ad quem”, que procura, acima de tudo, tornar possível o controlo externo e geral sobre a fundamentação factual, lógica e jurídica da decisão – e que visa garantir, em última análise, a “transparência” do processo e da decisão.


Não sendo satisfatoriamente cumprida, quanto a algum facto essencial, a exigência de fundamentação emergente do estatuído no nº 2 do artigo 653º, pode a parte prejudicada requerer que o tribunal de 1ª instância supra a nulidade, procedendo à fundamentação adequada. Face à actual relevância – constitucional e legal – da exigência de fundamentação, temos como duvidosa a solução consistente em considerar que a lei não estabelece qualquer sanção para a falta de fundamentação da decisão sobre a matéria de facto: o que, a nosso ver, decorre do nº 5 deste artigo 712º é que a nulidade cometida, quando reclamada adequadamente pela parte, deve, na medida do possível, ser sempre suprida pela 1ª instância; mas, se tal suprimento for impossível, não nos parece excluída a possibilidade de a Relação anular o julgamento com base numa omissão essencial e relevante de fundamentação (sublinhado nosso)[11].


A fundamentação deve conter, como suporte mínimo, a concretização do meio probatório gerador da convicção do julgador e ainda a indicação, na medida do possível, das razões da credibilidade ou da força decisiva reconhecida a esses meios de prova, a menção das razões justificativas da opção feita pelo julgador entre os meios probatórios de sinal oposto relativos ao mesmo facto[12].


“Quando a prova é gravada, a sua análise crítica constitui complemento fundamental da gravação; indo, nomeadamente, além do mero significado das palavras do depoente (registadas em audiência e depois transcritas), evidencia a importância do modo como ele depôs, as suas reacções, as suas hesitações e, de um modo geral, todo o comportamento que rodeou o depoimento”[13].


A análise crítica das provas prevista para o julgamento referido na primeira parte do nº 4 do artigo 607º do Código de Processo Civil não difere funcionalmente do exame pressuposto no julgamento regulado na segunda parte deste número: ambos visam concluir se a prova produzida é, em concreto, bastante para a demonstração do facto. O modo como se chega a tal conclusão é, no entanto, profundamente diferente, o que se reflecte na motivação da convicção.


Na motivação da decisão sobre os factos julgados de acordo com a norma constante da primeira parte do nº 4, o juiz explica por que razão, de acordo com a sua livre convicção (primeira parte do nº 5), o meio é idóneo, em abstracto e em concreto, à prova do facto; na motivação do julgamento feito no contexto da segunda norma, o juiz partindo da certeza e afirmando que o meio é, em abstracto, idóneo (v.g. um documento), esclarece por que razão se extrai dele (ou não) o facto a provar (segunda parte do nº 5).

Num caso, o juízo de conformidade entre os factos alegados e a realidade histórica estriba-se na prudente convicção do julgador; noutro, este juízo funda-se, em especial, no valor que a lei atribui a determinados meios de prova[14].


Entrando mais directamente no caso dos autos, a questão que se coloca é a de saber em que medida a queixa crime apresentada em 13.07.2016, consubstanciada no documento entregue na audiência prévia (fls 99), articulado com a restante prova documental, designadamente fls 39 a 41 dos autos, acrescida da prova testemunhal, é susceptível de confirmar os pontos 11, 24 a 28 e por consequência do 29 ao 34 da matéria de facto, que deverá voltar a ser dada por provada.

Ao não tomar em consideração a prova documental, o tribunal recorrido violou o artigo 674º nº 3 do Código de Processo Civil?


Lendo o acórdão da Relação sobre a fundamentação das respostas à matéria de facto (fls. 214 vº a 218), que apreciou livremente as provas, fazendo o seu próprio juízo com total autonomia, verificamos que a mesma, quase de forma exaustiva, analisou criticamente as provas, especificou, de forma racional, coerente e lógica os fundamentos que foram decisivos para a respectiva convicção e com respeito pela prova testemunhal e documental produzida.


Duma coisa não temos dúvidas: não vislumbramos que tenha havido grosseira valoração da prova que foi feita na Relação. Pelo contrário, a prova foi apreciada com análise crítica e com o cuidado e atenção devidos, dando o tribunal credibilidade ao que merecia e refutando o que considerou espúrio ou sem interesse para a decisão de facto.

O acórdão procedeu ainda, além da respectiva fundamentação, à análise crítica das provas, com ponderação dos elementos probatórios. Esclareceu, explicou e analisou o conteúdo dos depoimentos das testemunhas, em articulação com a prova documental produzida.


Concluímos, pois, que o acórdão recorrido seguiu um processo lógico e racional de apreciação da prova, ou seja, não se mostra ilógico, arbitrário ou notoriamente violador das regras da experiência comum e muito menos do disposto no artigo 674º nº 3 do Código de Processo Civil.


Nesta conformidade, improcedem as conclusões 1ª a 12ª das alegações da recorrente, confirmando-se, nesta parte, o acórdão da Relação, por não haver “ deficiência formal da apreciação das provas e da fixação dos factos materiais em causa”.


A QUESTÃO DE DIREITO


O CPC estabelece no seu artigo 342° n° 1, que "Se a penhora, ou qualquer acto judicialmente ordenado de apreensão ou entrega de bens, ofender a posse ou qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência, de que seja titular quem não é parte na causa, pode o lesado fazê-lo valer, deduzindo embargos de terceiro”.


Antes da revisão processual de 1995/1996 era um processo especial apenas dirigido à defesa da posse – artigos 1037º e 1043º do CPC; agora – artº 342º nº 1 – é um incidente de oposição a qualquer acto ordenado judicialmente, de apreensão) ou de entrega de bens que ofenda a posse ou qualquer direito incompatível com a diligência ordenada, direito de que seja titular quem não é parte na causa. (salvo em processo de insolvência).


Em confronto com o revogado nº 1 do artigo 1037º, constata-se que se ampliaram os pressupostos de admissibilidade dos embargos de terceiro, que deixaram de estar necessariamente ligados à defesa da posse do embargante, para abrangerem todos os actos de agressão patrimonial.


No preâmbulo do DL 329-A/95, de 12 de Dezembro foi dito o seguinte: “Permite-se, deste modo, que os direitos substanciais atingidos ilegalmente pela penhora ou outro acto de apreensão judicial de bens possam ser invocados, desde logo, pelo lesado no próprio processo em que a diligência ofensiva da posse teve lugar, em vez de o orientar necessariamente para a propositura da acção de reivindicação – por esta via se obstando, no caso de a oposição de embargos se revelar fundada, à própria venda dos bens e prevenindo a possível necessidade de ulterior anulação desta, no caso de procedência da reivindicação”.


Daqui resulta que, para a penhora ou diligência judicialmente ordenada poder basear a oposição mediante embargos de terceiro, se torna necessária a verificação dum dos seguintes requisitos: ofensa da posse e ofensa de qualquer direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência.

Quanto ao primeiro requisito, relacionado com o artº 1285º do Código Civil, o direito de embargar pertence ao possuidor em nome próprio, por este gozar da presunção de titularidade do direito correspondente à sua posse (artº 1268º nº 1 do CC).

Quanto ao segundo requisito, o conceito de direito incompatível apura-se em referência à finalidade da diligência que o lesa[15].


Efectivamente, preceitua o artigo 1285º do Código Civil, sob a epígrafe (Embargos de terceiro), que “ o possuidor cuja posse for ofendida por penhora ou diligência ordenada judicialmente pode defender a sua posse mediante embargos de terceiro, nos termos definidos na lei de processo”.

E o artigo 1268º (Presunção da titularidade do direito) tem a seguinte redacção:

“ 1. O possuidor goza da presunção da titularidade do direito, excepto se existir, a favor de outrem, presunção fundada em registo anterior ao início da posse.

2. Havendo concorrência de presunções legais fundadas em registo, será a prioridade entre elas fixada na legislação respectiva”.


A realização coactiva das obrigações patrimoniais é garantida por via da acção executiva através da qual o credor pode promover a execução do património do devedor ou, excepcionalmente, de terceiro, nos termos genericamente previstos nos artigos 817º a 826º do Código Civil.


Por outro lado, o artigo 735º do Código de Processo Civil (objecto da execução), preceitua no seu nº 1 que “estão sujeitos à execução todos os bens do devedor susceptíveis de penhora que, nos termos da lei substantiva, respondem pela dívida exequenda”.


A penhora envolve a constituição de um direito real de garantia, conferindo ao credor/exequente o direito de ser pago com preferência a qualquer outro credor, que não tenha garantia real anterior (artº 822° nº 1 do Código Civil) e gerando ineficácia, em relação ao exequente, dos actos de disposição ou de oneração dos bens penhorados, sem prejuízo das regras de registo (artº 819º do Código Civil).


E, a penhora, para produzir efeitos em relação a terceiros, terá de ser registada (artº 2º alª n) e nº 1 do artº 5º, ambos do Código do Registo Predial).


O n° 4 do artigo 5º esclarece quem é considerado terceiro para efeitos de registo, dizendo que “ são aqueles que tenham adquirido de um autor comum direitos incompatíveis entre si”.

Por outro lado, preceitua o artigo 6º nº 1 do Código do Registo Predial que o “direito inscrito em primeiro lugar prevalece sobre os que se lhe seguirem relativamente aos mesmos bens, por ordem da data dos registos e, dentro da mesma data, pelo número de ordem das apresentações correspondentes”.


Como bem observa o acórdão recorrido, a posse que, em regra, releva para efeitos de embargos de terceiro é a posse real e não a posse obrigacional, só relevando esta quando tal estiver legal e expressamente previsto, como sucede, por exemplo, com a posse do locatário (artº 1037º nº 2 do Código Civil).


Voltando ao caso dos autos verifica-se que a penhora foi realizada e registada em 21.11.2016 (fls 112-113 dos autos principais e fls 31 do I volume dos embargos de terceiro).


A embargante só registou a aquisição do veículo penhorado em 07.12.2016 (fls 31).

É certo que a embargante é terceiro para efeitos de poder embargar, mas o direito do exequente encontra-se registado em data anterior à data em que a embargante registou a sua aquisição.

Da enunciada realidade factual resulta que a penhora do veículo se encontra registada em data anterior à da aquisição do veículo pela embargante; por isso, tal aquisição não poderá ser oponível ao exequente, só o podendo ser se caso tivesse sido adquirido anteriormente.


Nesta conformidade, improcedem as restantes conclusões das alegações da revista.



III - DECISÃO


Atento o exposto, nega-se provimento à revista, confirmando-se o acórdão recorrido.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 23 de Maio de 2019


Ilídio Sacarrão Martins (Relator)

Nuno Manuel Pinto Oliveira

Paula Sá Fernandes


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[1] Ac STJ de 13/11/2012, in www.dgsi.pt Proc.º nº 10/08.0TBVVD.G1.S1/jstj
[2] Proc.º nº 645/05.2TBVCD.P1.S1, in www.dgsi.pt/jstj
[3] Proc.º nº 8609/03.4TVLSB.L1.S1, in www.dgsi.pt/jstj
[4] Proc.º nº 350/98.4TAOLH.S1, in www.dgsi.pt/jstj
[5] Proc.º nº 1965/04.9TBSTB.E1.S1, in www.dgsi.pt/ jstj
[6] Prova, poderes da Relação e convicção: a lição da epistemologia, Cadernos de Direito Privado nº 44, Outubro/Dezembro de 2013, pp. 29 e ss.
[7] Manual de Processo Civil, 2ª ed. pág. 653.
[8] Estudos sobre o novo Processo Civil, pág. 348.
[9] Comentários ao Código de Processo Civil, Volume I, 2ª edição, 2004, pág. 545.
[10] BMJ 360 (Suplemento), pág. 195, citado por Lopes do Rego, loc e ob cit.
[11] Lopes do Rego, ob cit, em anotação ao artigo 712º, pág. 610.
[12] Antunes Varela, ob cit pág. 653 a 655.
[13] Lebre de Freitas,  Código de Processo Civil Anotado, volume 2º, 2ª edição, pág. 660.
[14] Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro “Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil- Os Artigos da Reforma”, 2014, 2ª Edição, Vol I, Almedina, pág588 e 589.
[15] Amâncio Ferreira, “Curso de Processo de Execução”, 8ª edição, pág 277-278.