Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 3.ª SECÇÃO | ||
Relator: | CONCEIÇÃO GOMES | ||
Descritores: | RECURSO PER SALTUM TRÁFICO DE ESTUPEFACIENTES TRÁFICO DE MENOR GRAVIDADE QUALIFICAÇÃO JURÍDICA PENA SUSPENSA PENA DE PRISÃO MEDIDA DA PENA | ||
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Data do Acordão: | 02/17/2021 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO DO AA E PROVIDO O RECURSO DO M. P. . | ||
Indicações Eventuais: | TRANSITADO EM JULGADO | ||
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Sumário : | I - O tráfico de menor gravidade previsto no art. 25.º, do DL n.º 15/93, pressupõe que a ilicitude do facto se mostre consideravelmente diminuída, tendo em conta nomeadamente os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da ação, a qualidade ou a quantidade das plantas, substâncias ou preparações. II - As quantidades de produto estupefaciente detidas pelo arguido - suscetíveis de originar 344 doses de cocaína e 20 doses de heroína - a sua qualidade (cocaína e heroína, amplamente conhecidas pelo seu poder aditivo e incluídas nas chamadas "drogas duras") e a quantia monetária que tinha na sua posse (€ 665,00), o lapso temporal em que desenvolveu a sua atividade - verão do ano de 2017 e até ao dia 12 de dezembro de 2018 e no mês de maio de 2019 - não são compatíveis com o pequeno tráfico. III - Também não é compatível com o pequeno tráfico os objetos que foram apreendidos ao arguido, designadamente duas balança de precisão, recortes em plástico circulares, usados para o acondicionamento de heroína e cocaína, uma garrafa de amoníaco (habitualmente usado para a cozedura da cocaína) e a quantia monetária que foi apreendida (€665,00 euros composta por 3 notas com o valor facial de €50,00; 22 notas com o valor facial de €20,00; 6 notas com o valor facial de €10,00 e 3 notas com o valor facial de €5,00). IV - Não tendo o arguido confessado os factos, não se autocensurou, não contribui de modo nenhum para que pudesse identificar-se e deter os fornecedores ou outros traficantes da mesma linha de tráfico. Visando a suspensão da execução da pena, essencialmente, prevenir a reincidência e que há-de realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, tal desiderato não se mostra acautelado, quer pelas das fortes exigências de prevenção geral neste tipo de crime, quer pelas exigências de prevenção especial, atentas as circunstâncias constantes dos factos dados como provados no acórdão recorrido, pelo que o arguido não pode beneficiar daquela. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam, na 3ª Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça 1. RELATÓRIO 1.1. No Juízo Central Criminal .... – Juiz .. - foram julgados em processo comum com intervenção do tribunal coletivo os arguidos: AA, filho de BB e de CC, natural da ..... (.....), nacional da República de ........., nascido a .. de janeiro de 1990, solteiro, ….., residente na Rua ......., n.º .., ......., em ......, titular do passaporte n.º ......, emitido pela República de ......... [atualmente preso preventivamente à ordem dos presentes autos no E.P. de .......] e - DD, filho de EE e de FF, natural da ........ (......), nacional da República de ........., nascido a .. de agosto de 1993, solteiro, ....., residente na Rua ........, edifício ........, ..., em ......, titular do número de identificação fiscal n.º ...., e por acórdão de 25JUN20 foi deliberado: a) Condenar o Arguido AA, pela prática em autoria material, sob a forma consumada, de um crime de Tráfico de Estupefacientes, previsto e punível pelo artigo 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, com referência às Tabelas I-A e I-B anexas àquele diploma legal, na pena de 6 (seis) anos de prisão: b) Condenar o Arguido DD, pela prática, na forma consumada, em autoria material, de um crime de Tráfico de Menor Gravidade, previsto e punido pelos artigos 21°, n° 1 e 25º, al. a) do Decreto-Lei n° 15/93, de 22 de Janeiro com referência às Tabelas I-A e I-B ao mesmo anexas, na pena de 3 (três) anos de prisão, a qual se suspende na sua execução por igual período de tempo, nos termos do artigo 50º do Código Penal; 1.2. Inconformados com o acórdão dele interpuseram recurso o arguido AA e o Ministério Público para este Supremo Tribunal, que motivaram concluindo nos seguintes termos: (transcrição) ARGUIDO AA «I. Vem o presente recurso, que versa exclusivamente matéria de direito, interposto do, aliás douto acórdão, que julgando procedente a acusação, condenou o Recorrente pela prática, em autoria material, na forma consumada, de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artigo 21.º do DL 15/93 de 22/01, na pena de 6 (seis) anos de prisão. II. Com a, aliás douta, decisão, quer quanto ao enquadramento jurídico-penal da matéria de facto, quer quanto à medida da pena, não se conforma o Recorrente. III. O arguido, aqui recorrente, dá nesta sede, por integralmente reproduzido, o teor da matéria provada que ficou transcrita no Ponto II – A) da motivação. B) DO ENQUADRAMENTO JURÍDICO-PENAL DA MATÉRIA JULGADA PROVADA PELO TRIBUNAL “A QUO” IV. O tribunal “a quo” enquadrou a conduta do Recorrente no crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artigo 21.º, nº 1 do D.L. nº 15/93, de 22 de Janeiro, por referência às tabelas I-A e I-B, anexas. V. Com a devida vénia, discorda o Recorrente com esse enquadramento, pois entende que a sua conduta pode e deve ser subsumida no tipo privilegiado do artigo 25.º do mesmo diploma legal. VI. Nesse sentido, chama-se à colação o douto acórdão do STJ de 02-10-2014, cujo sumário, a propósito desse tipo ilícito, ensina que “I – (…) II - Aquilo que distingue o crime de tráfico de estupefacientes, previsto no art. 21.º do DL 15/93, de 22-01, do crime previsto no art. 25.º do mesmo diploma, reside na menor ilicitude da conduta punida neste último dispositivo. III - Constituem, entre outros, factores relevantes dessa menor ilicitude, os meios utilizados na venda do estupefaciente, a modalidade e circunstância em que a conduta é realizada, a qualidade e quantidade do produto vendido, o lucro obtido, o facto de a actividade constituir ou não modo de vida, a utilização do lucro da venda para a aquisição de produto para consumo próprio, a duração e intensidade da actividade desenvolvida, o número de clientes contactados e o posicionamento do agente na cadeia de distribuição clandestina. IV - É enquadrável no art. 25.º, al. a), do DL 15/93, de 22-01, a conduta do agente que se dedica ao pequeno tráfico, com venda de estupefaciente directamente ao consumidor final, através de contacto directo e de rua, sem a utilização de quaisquer meios sofisticados, em pequenas doses, ainda que de forma regular.” VII. O artigo 25.° do aludido diploma legal refere-se ao tráfico de menor gravidade, fundamentado na diminuição considerável da ilicitude do facto revelada pela valoração em conjunto dos diversos factores, alguns deles enumerados na norma, a título exemplificativo (meios utilizados, modalidade e circunstâncias da acção, qualidade e quantidade das plantas, substâncias ou preparados). VIII. A diminuição da ilicitude que o tráfico de menor gravidade pressupõe resulta, assim, de uma avaliação global da situação de facto, atenta a qualidade ou a quantidade do produto, os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção. IX. Revertendo ao caso dos autos, resulta provado que o arguido actuava sozinho; X. Que vendeu produto estupefaciente a um reduzido número de consumidores (cerca de 4 (quatro); XI. Que as transacções ocorriam em locais públicos através de contacto directo com o consumidor final; XII. Que a área geográfica das vendas era circunscrita à região .......; XIII. Que a dita actividade seria esporádica/pontual conforme se constata pela simples leitura do ponto 1 da matéria assente, ou seja, não fazia dessa actividade modo de vida; XIV. que não terá obtido dessa actividade grandes lucros face ao seu modesto nível de vida (nesse sentido atente-se no ponto 22. Da matéria provada onde consta que “À data da prisão, em 13.07.2019, vivia numa pequena casa arrendada por 200€ mensais, sem grandes condições, na ...., onde ainda se mantêm a companheira e filho. Na altura, alternava horários de trabalho com GG, ela durante o dia ....., o Arguido à noite num ...., com vista a assegurarem o cuidado do bebé.” XV. Face a esse circunstancialismo, estamos em crer ser possível afirmar que o grau de ilicitude é, pois, no quadro de um tráfico comum, pequeno, e que a sua conduta se insere numa situação de pequeno tráfico de rua, incipiente, desorganizado, completamente distinto da do grande e médio tráfico, razão pela qual a actuação do Recorrente deveria ter sido enquadrada no previsto no artigo 25.°, alínea a), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro. XVI. Consequentemente, a pena a aplicar ao Recorrente não deverá ultrapassar os 2 (dois) anos de prisão, atento o limite máximo da pena aplicável previsto no artigo 25.°, alínea a), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, suspensa na sua execução, pelos fundamentos que infra se indicará. XVII. Ao decidir diferentemente o Tribunal a quo violou o disposto no artigo 25.°, alínea a), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro. Sem conceder Por dever de patrocínio, C) DA MEDIDA DA PENA XVIII. Mantendo-se inalterada a qualificação operada pelo Tribunal “a quo”, o que se admite por cautela e dever de patrocínio, sempre a pena aplicada se mostra excessiva e desnecessária. Vejamos porquê: XIX. Resulta provado que o Recorrente apresenta sólidos hábitos de trabalho, num registo basicamente activo ligado a serviços indiferenciados de jardinagem e de cozinha. – cfr. ponto 20 da matéria assente. XX. E que “Já em Portugal, veio a conhecer GG, encetando com ela uma vida marital em 2018. Desta relação nasceu o seu único filho, que conta actualmente 21 meses.” – cfr. ponto 21 dos factos provados. XXI. “À data da prisão, em 13.07.2019, vivia numa pequena casa arrendada por 200€ mensais, sem grandes condições, na ...., onde ainda se mantêm a companheira e filho. Na altura, alternava horários de trabalho com GG, ela durante o dia ...., o Arguido à noite num ...., com vista a assegurarem o cuidado do bebé.” Ponto 22 da matéria provada. XXII. “Nessa medida, trabalhava no período noturno no ……".......", sito na ........, propriedade de HH, aí exercendo as funções inerentes à categoria profissional ..... auferindo uma média de C 600,00 ao que acrescem as gorjetas.” – cfr. ponto 23 dos factos assentes. XXIII. Resultou ainda provado que este é o primeiro confronto de AA com o sistema de administração da justiça penal, do qual acata a oportunidade da acusação, apresentando sentido da reprovação dos alegados factos que lhe deram origem. A companheira, embora crítica e apreensiva com eventuais consequências condenatórias, mostra-se disposta a dar-lhe o apoio possível; - cfr. ponto 24 dos factos provados. XXIV. Em meio prisional, revela um comportamento isento de reparos ou registos disciplinares. Conta com as visitas/contactos regulares da companheira e outros familiares e amigos. – cfr. ponto 25 da matéria assente XXV. Os projectos de vida do recorrente são de mudar a residência para a zona do Porto, com vista a afastar-se de um meio que considerou propenso a relações pró-criminais e à influência negativa das mesmas. XXVI. Tem título de residência válido até 11.03.2022. – cfr. ponto 27 da matéria provada. XXVII. Não regista quaisquer antecedentes criminais. XXVIII. Atenta essa factualidade uma pena coincidente com mínimo da moldura legal que é 4 (quatro) anos, mostra-se mais adequada e proporcional à sua culpa que constitui o limite inultrapassável da pena – cf. artigo 40.º do C.P. – bem como às exigências de prevenção geral e especial. XXIX. Uma pena de 4 (quatro) anos afigura-se suficiente à salvaguarda dos interesses e expectavas da comunidade na validade da norma (prevenção geral), e adequada a promover a reinserção do agente na sociedade (prevenção especial), fim último das penas. D) DA SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA XXX. Pela mesma ordem de razões e atentos os factos provados, mormente: a) O arguido apresentar suporte familiar (tem companheira e um filho); b) Apresentar sólidos hábitos de trabalho; c) Ser jovem (tem actualmente 30 anos de idade porquanto nasceu em 10-01-1990); d) Ser primário; e) (…) acatar a oportunidade da acusação, apresentando sentido da reprovação dos alegados factos que lhe deram origem – cfr. Ponto 24.º dos factos provados; f) Encontrar-se em situação regular em território nacional, possuindo título de residência válido até 11.03.2022. – cfr. ponto 27 da matéria provada, XXXI. Estamos convencidos que a simples ameaça de cumprimento de prisão é suficiente para o Recorrente manter uma conduta de acordo com as normas sociais. XXXII. Pois o cumprimento de uma pena de prisão efectiva no caso vertente, afigura-se-nos contrário ao fim último das penas – o da reinserção do agente na sociedade - ao passo que a suspensão da execução da pena de prisão permite manter as condições de sociabilidade próprias à condução da vida no respeito pelos valores de direito como factores de inclusão. XXXIII. E a factualidade dada como provada permite-nos formular um juízo de prognose favorável quanto ao seu comportamento futuro no sentido de que a simples censura dos factos e a ameaça da pena de prisão realizam de forma adequada as finalidades da punição. XXXIV. Em suma, salvo o devido respeito e com a devida vénia, entendemos que a manter-se a qualificação dos factos provados no crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artigo 21.°, n.º 1, alínea a), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, a pena a ser aplicada não deverá ser superior a 4 (quatro) anos, suspensa na sua execução, nos termos do artigo 50.° do Código Penal, ainda que sujeita a regime de prova nos termos prevenidos no artigo 53.º do C.P.. XXXV. Nesta confluência, a douta decisão recorrida, pela errada interpretação e aplicação que deles fez, viola os artigos 21.º e 25.º do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, o artigo os artigos 40.º, 50.º, 53.º, 71.º, 72.º e 73.º do Código Penal, artigo 410.º do Código de Processo Penal, bem como os artigos 18.º , 29.º, nº 5 e 32.º da Constituição da Republica Portuguesa. Nestes termos, e nos melhores de Direito, que V. Exas., doutamente, suprirão, deve o presente recurso ter provimento e, em consequência: a) Ser revogado o douto Acórdão recorrido, pelo qual foi aplicada ao Recorrente a pena de 6 (seis) anos de prisão, pela prática de 1 (um) crime de tráfico, p. e p. pelo artigo 21.°, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro; b) Ordenar a sua substituição por outro que condene o Recorrente pela prática de 1 (um) crime de tráfico de menor gravidade, p. e p. pelo artigo 25. °, alínea a), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, em pena não superior a 2 (dois) anos de prisão, a qual deve ser suspensa na sua execução, nos termos do disposto no artigo 50.º do Código Penal, ainda que sujeita a regime de prova, conforme prevenido no artigo 53.º do Código Penal; Sem conceder, c) Quando assim doutamente se não entenda, condenar o Recorrente pela prática de 1 (um) crime de tráfico, p. e p. pelo artigo 21. °, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, em pena não superior a 4 (quatro) anos de prisão, suspensa na sua execução, ainda que sujeita a regime de prova, nos termos dos artigos 50.° e 53.º ambos do Código Penal Todavia, V. Exas., Colendos Conselheiros, farão a costumada e almejada Justiça! O MINISTÉRIO PÚBLICO «1ª – O presente recurso vem interposto no seguimento da douta sentença proferida nos presentes autos no dia 04 de outubro de 2018 que decidiu suspender a execução da pena de 2 (dois) anos de prisão em que o arguido foi condenado; 2ª – Foram dados como provados os seguintes factos: 1 - Nos períodos temporais compreendidos entre data não concretamente apurada do Verão do ano de 2017 e até ao dia 12 de Dezembro de 2018 e no mês de Maio de 2019, o arguido AA (doravante AA), também conhecido pela alcunha de «AA.», cedeu, a troco de dinheiro, cocaína e heroína, a indivíduos consumidores que para tanto o contactavam telefonicamente, sendo certo também, que os encontros entre aquele e estes ocorreram em vários locais do concelho ........ 2 - De entre os indivíduos que adquiriram cocaína e/ou heroína ao arguido AA nas circunstâncias acima referidas, contam-se os seguintes: - II: que adquiriu ao arguido AA, no período temporal compreendido entre o Verão do ano de 2017 e o mês de Novembro de 2018, em pelo menos vinte ocasiões distintas, heroína, pagando em cada uma dessas vezes a quantia de €25,00 por uma saqueta contendo cerca de um grama daquela substância. Em algumas das referidas ocasiões, em pelo menos dez, adquiriu também cocaína ao arguido AA, tendo pago a este, em cada uma dessas vezes, a quantia de €25,00 por uma saqueta contendo cerca de meio grama de cocaína. Uma das mencionadas ocasiões, foi no dia 14 de Novembro de 2018, pelas 12h17m, no parque de estacionamento conhecido por «Parque ........», em ...., local este onde o arguido AA se encontrou com II e entregou a este uma saqueta contendo heroína ou cocaína e recebeu em troca a quantia de €25,00. - JJ: que adquiriu, estando acompanhado pela sua companheira KK, ao arguido AA, no período temporal compreendido entre data não concretamente apurada do ano de 2018 e o mês de Novembro desse mesmo ano, em pelo menos sete ou oito ocasiões distintas, cocaína cozida, pagando em cada uma dessas vezes a quantia de €25,00 por uma saqueta contendo cerca de meio grama daquela substância e, bem ainda, o segundo vendeu-lhe, nesse mesmo período temporal, em pelo menos quinze a vinte ocasiões distintas, heroína, pela qual pagou em cada uma dessas vezes a quantia de €25,00. Acresce ainda que, no mês de Maio de 2019, o arguido AA vendeu a JJ, em quatro ocasiões distintas, heroína, sendo que este último pagou àquele em cada uma dessas vezes a quantia de €25,00 por uma saqueta contendo cerca de um grama daquela substância. O arguido AA disse a JJ para avisar os restantes consumidores de que tinha "branca" [cocaína] para vender. 3 - O arguido AA, para além do acima indicado, efectuou também as seguintes vendas de cocaína e/ou heroína: 3.1. No dia … de Outubro de 2018, entre as 16h09m e as 16h23m, no parque de estacionamento conhecido por «Parque .........», em ......, o Arguido AA encontrou-se com um indivíduo do sexo masculino conhecido pelo nome de "LL" (consumidor de heroína e cocaína) e entregou a este uma saqueta contendo cocaína ou heroína e recebeu em troca quantia monetária não concretamente apurada; 3.2. No dia … de Novembro de 2018, pelas 10h45m, no parque de estacionamento existente junto ao fontanário localizado em ............, o arguido AA encontrou-se com um individuo cuja identidade se desconhece e entregou a este uma saqueta contendo cocaína ou heroína e recebeu em troca quantia monetária não concretamente apurada; 3.3. No dia … de Maio de 2019, pelas 17h40m, na estrada que liga a localidade de ...... à localidade de ........, em ......, o arguido AA encontrou-se com um indivíduo do sexo masculino que se fazia transportar num veículo automóvel da marca e modelo «..........», de matrícula ..-..-FA, e entregou a este uma saqueta contendo cocaína ou heroína, recebendo em troca quantia monetária não concretamente apurada. 4 - No dia … de Dezembro de 2018, entre as 23h07m e as 23h14m, o arguido AA, dirigiu-se para uma zona de mato, localizada na Estrada Nacional n.º ..., nas imediações da ...., em ......, local este onde o mesmo, deitou no interior de um contentor do lixo um saco branco em cujo interior se encontrava o seguinte: diversos recortes circulares em plástico «roxo» e plásticos de cor preta e transparente com vestígios de um pó branco. 5 - Acto contínuo, o arguido AA, abaixou-se junto de uma árvore existente no local acima referido e, escondeu, por debaixo de uns troncos que ali se encontravam um saco contendo o seguinte: - Um telemóvel da marca e modelo «……»; - Uma balança de precisão de cor cinza; - Um cartão em plástico ostentando os dizeres «Pingo Doce»; - 83 embalagens em plástico contendo cocaína (Éster MET.), com o peso líquido de 32,111gramas e um grau de pureza de 29,8% (susceptível de originar 318 doses); - Um pequeno saco em cujo interior se encontrava o seguinte: 4 embalagens de plástico contendo no seu interior cocaína (Éster MET.), com o peso líquido de 1,624gramas (um grau de pureza de 29,6%, susceptível de originar 16 doses); 3 saquetas contendo no seu interior heroína, com o peso líquido de 2,903 gramas (um grau de pureza de 6,6%, susceptível de originar 1 dose) e uma saqueta contendo heroína, com o peso líquido de 0,964gramas (um grau de pureza de 7,8%, susceptível de originar <1 dose). 6 - No dia … de Julho de 2019, pelas 10h30m, o arguido AA tinha em sua posse, no interior da sua residência, localizada na Rua ..........., n.º ............., em ......, o seguinte: - No quarto: - Dois telemóveis da marca "….”, em funcionamento e que se encontravam em cima da mesa de cabeceira; - Um telemóvel de marca "…..", em funcionamento, que se encontrava também em cima da mesa de cabeceira; - A quantia monetária de €665,00 euros (composta do seguinte modo: 3 notas com o valor facial de €50,00; 22 notas com o valor facial de €20,00; 6 notas com o valor facial de €10,00 e 3 notas com o valor facial de €5,00), que se encontrava guardada na gaveta da cómoda. - Na casa de banho: - Recortes em plástico circulares, usados para o acondicionamento de heroína e cocaína, e que estava no lixo da casa de banho. - Na cozinha (no interior da gaveta do armário) - Uma balança de precisão; - Fita-cola castanha e uma tesoura. - No anexo denominado “casa do gás”: - Um saco plástico de cor preto, que estava oculto debaixo do papel informativo da garrafa de gás, e que continha no seu interior o seguinte: - 27 sacos contendo heroína, com o peso líquido de 25,409 gramas e um grau de pureza de 6%, correspondente a 15 doses; - 2 sacos contendo heroína, com o peso líquido de 10,081 gramas e um grau de pureza de 4,6%, correspondente a 4 doses; - 20 sacos contendo no seu interior cocaína (cloridrato), com o peso líquido de 5,830gramas e um grau de pureza de 35,5%, correspondente a 10 doses; - Um saco contendo no seu interior fenacetina, com o peso líquido de 4,890 gramas. - No interior de um veículo automóvel abandonado, que se encontrava estacionado nas traseiras da habitação: - Uma garrafa de amoníaco (habitualmente usado para a cozedura da cocaína). 7 - Ainda nesse mesmo dia … de Julho de 2019, pelas 12h20m, o arguido AA tinha em sua posse, no interior do veículo automóvel da marca e modelo «........», de matrícula ..-..-SR, o seguinte: um telemóvel da marca «…..». 8 - Os telemóveis que o arguido AA tinha em sua posse nas circunstâncias supra descritas, eram destinados por aquele para receber e efectuar contactos telefónicos com vista a concretizar as transacções de venda de cocaína e heroína a que se dedicava. 9 - O arguido AA agiu de forma livre, deliberada e consciente, conhecendo muito bem a natureza estupefaciente da cocaína e da heroína que tinha em sua posse e daquela que revendeu a terceiros. 10 - Mais sabia que não tinha autorização para deter, vender, ceder e transportar cocaína e heroína e, bem assim, estava perfeitamente ciente que a sua conduta era proibida e punida por lei. 11 – No dia … de Janeiro de 2018, pelas 11h53m, o Arguido DD, (doravante DD) também conhecido pelas alcunhas «DD.», «DD..» e «DD...», dirigiu-se para o interior de uma zona arborizada, localizada na Rua ..............., em ......, local este onde o mesmo se abaixou e escondeu por debaixo de uma pedra ali existente o seguinte: - Uma saqueta contendo cocaína (cloridrato), com o peso líquido de 9,680gramas (um grau de pureza de 75,7%, susceptível de originar 36 doses); e, - Uma balança de precisão da marca e modelo «…..». 12 - A referida cocaína era destinada pelo arguido DD à cedência, a troco de dinheiro, a indivíduos consumidores daquela substância que o contactavam predominantemente através de contactos telefónicos, sendo certo também, que os encontros entre aquele e estes ocorreram em vários locais do concelho ........ 13 - De entre os indivíduos que adquiriram cocaína e/ou heroína ao arguido DD, nas circunstâncias mencionadas no artigo antecedente, contam-se os seguintes: - JJ: no mês de Maio de 2019, o arguido DD vendeu a JJ, pelo menos uma vez, heroína, o qual, pagou por esta a quantia de €25,00 por uma saqueta contendo cerca de um grama daquela substância. - MM: que adquiriu ao arguido DD, no período temporal compreendido entre data não concretamente apurada do ano de 2018 e 7 de Maio de 2019, em pelo menos três ocasiões distintas, cocaína cozida, pagando em cada uma dessas vezes a quantia de €25,00 ou €30,00 por uma saqueta contendo cerca de meio grama daquela substância. Uma das referidas ocasiões, foi no dia 7 de Maio de 2019, pelas 23h53m, na Rua ......, em ......, local este onde o Arguido DD se encontrou com MM e entregou a este uma saqueta contendo cocaína e recebeu em troca a quantia de €25,00 ou € 30,00 14 - O arguido DD, para além do acima indicado, efectuou também as seguintes vendas de cocaína e/ou heroína: 14.1. No dia … de Novembro de 2018, pelas 15h36m, pelas 15h36m, na Rua ...., em ...., o Arguido DD encontrou-se com NN, também conhecido por "NN.", e entregou a este uma saqueta contendo cocaína ou heroína, recebendo em troca quantia monetária não concretamente apurada. 14.2. No dia … de Maio de 2019, pelas 18h59m, na estrada que liga a localidade de ..... à localidade de ......, em ......, o arguido DD encontrou-se com um indivíduo do sexo masculino cuja identidade se desconhece e entregou a este uma saqueta contendo cocaína ou heroína, recebendo em troca quantia monetária não concretamente apurada. 15 - No dia … de Julho de 2019, pelas 10h30m, o arguido DD, tinha em sua posse, no interior da sua residência, localizada na Rua ...., edifício ....., apartamento ..., em ......, o seguinte: - Na Sala: - Dois telemóveis, sendo um de marca "….." e o outro de marca "…." (que estavam em cima do sofá); - Duas notas de €5,00 euros, que estavam dentro de umas calças de fato de treino; - A quantia monetária de €265,00 euros, que se encontrava em cima da mesa da sala; - 11 carteiras de pó da marca "…..". - No Quarto de dormir: - A quantia de €1.140,00 euros, composta por diversas notas de €50,00, €20,00, €10,00 e €5,00 (que se encontrava acondicionada numa bolsa dentro da gaveta da mesa de cabeceira). 16 - O telemóvel da marca “….” que o arguido DD tinha em sua posse nas circunstâncias supra descritas, era destinado por aquele para receber e efectuar contactos telefónicos com vista a concretizar as transacções de venda de cocaína e heroína a que se dedicava. 17 - O arguido DD agiu de forma livre, deliberada e consciente, conhecendo muito bem a natureza estupefaciente da cocaína e da heroína que tinha em sua posse e daquela que revendeu a terceiros. 18 - Mais sabia que não tinha autorização para deter, vender, ceder e transportar cocaína e heroína e, bem assim, estava perfeitamente ciente que a sua conduta era proibida e punida por lei. (…) 29 - Tal como na altura da ocorrência dos factos agora em fase de julgamento (2018/2019), DD encontra-se no presente a residir com a companheira, OO, 24 anos, e a filha de ambos de apenas 1 ano, num apartamento T1 arrendado desde 2018 na ............. O Arguido paga 300€ de renda de casa a que acrescem as habituais despesas fixas mensais, sendo o quadro económico familiar relativamente equilibrado. 30 - DD foi contratado há cerca de 9 meses como empregado ....... no Parque .... auferindo um salário de 850€, embora actualmente esteja em regime de layoff, em casa, a tomar conta da filha. O Arguido é pai de uma outra menor (PP, 5 anos) que mora em ........ com uma sua ex-companheira. A actual companheira é......, na ...... e está a trabalhar, tendo uma remuneração mensal de 650€. 31 – Natural ......, ........., DD é filho único da relação dos progenitores, que se separaram ainda antes do seu nascimento, embora tenha mais irmãos, filhos de outras relações de ambos os pais. A mãe cedo migrou para …., pelo que o Arguido foi criado numa aldeia rural junto da família da avó materna e fez todo o seu percurso escolar na terra natal completando o 9º ano de escolaridade aos 16 anos, ocupando-se posteriormente em tarefas agrícolas junto de familiares. 32 - DD viajou para Portugal no final de 2012 para estudar no âmbito do acordo de cooperação escolar com ........., mas acabou por não concluir um curso na área da electricidade que começou a tirar em ........ Após esta desistência, esteve cerca de 1 ano em .... (2013) a residir com a mãe e um irmão (QQ), tendo-se ocupado em …….. enquanto houve trabalho nesse país, mas acabou por regressar devido ao desemprego. 33 - Viveu e trabalhou durante cerca de 3 anos em ......... no sector….., onde conheceu a mãe da sua filha mais velha, mas em 2016 optou por procurar emprego na região ......., fixando-se no concelho ....... Trabalhou em .......e como .......antes de, em 2019, ter conseguido o actual emprego no……. (…) 38 - Do seu Certificado de Registo Criminal nada consta. 3.ª Consta ainda da motivação da decisão de facto que “no uso do direito que lhes cabe, os Arguidos não prestaram declarações.” 4.ª – Analisando os factos dados como provados, a fundamentação de facto, de direito e o dispositivo do acórdão recorrido, e salvo melhor opinião, não podemos concordar com a decisão de suspender a pena de prisão aplicada ao arguido DD. 5.ª – “A medida concreta da pena relevará da consideração da importância dos bens jurídicos a tutelar (art. 40.º, n.º 1) e que ditam a necessidade, com proibição de excesso da pena, influenciada, em larga medida por considerações de prevenção geral, forma de dissuasão de potenciais delinquentes e de tranquilização da colectividade, que reclama intervenção vigorosa do aparelho punitivo do Estado em relação ao tráfico de estupefacientes e em que se defronta uma ofensividade a plúrimos bens ou valores jurídicos, que vão desde a saúde e liberdade individuais, estabilidade familiar, que destrói, ao erário público, que desfalca, à tranquilidade e segurança públicas porque se situa na génese de criminalidade grave, tornando o traficante alguém de espaço social limitado, que reclama benesses mas esquece sempre, ou quase, a miséria alheia que traz particularmente, aos segmentos juvenis da sociedade. 6.ª - A necessidade da pena é, ainda, influenciada por considerações humanitárias sob a égide da reabilitação do agente do crime, tendo em vista a interiorização do seu mau proceder, evitando a sucumbência futura ao crime, a sua emenda cívica, com o que, ele próprio, ganha, desde logo, como a própria sociedade. 7.ª - A balizar pelo topo, e quaisquer que sejam as considerações de prevenção (art. 71.º, n.º 1, do CP), a culpa do agente, fornecendo a moldura dentro da qual interferem as submolduras de prevenção geral e especial, bem como as circunstâncias que não fazendo parte do tipo atenuam ou agravam a responsabilidade do agente (n.º 2 do art. 71.º do CP), concorrem, ainda, para a formação da pena.” - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12 de Julho de 2006, Processo 1709/06, in CJ 192, T. II, 2006). 8.ª Por sua vez, dispõe o artigo 50.° do Código Penal, que o Tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam deforma adequada e suficiente as finalidades da punição. 9.ª - Da conjugação dos artigos 70.º, n.º 1, e 50.º, n.º 1, do CP, alcança-se que a pena de prisão fixada em medida não superior a cinco anos deve ser suspensa na execução se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. 10.ª - Com efeito, “A opção pela suspensão da execução da pena de prisão depende de um juízo de prognose favorável ao arguido, o qual tem por referência a indução que se possa fazer em relação ao seu comportamento futuro, mas também a efectiva tutela da confiança jurídica em relação ao crime cometido, assim como as fortes exigências da sua prevenção geral, como sucede no tráfico de estupefacientes.” - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28 de Outubro de 2015, Processo 411/14.4PFVNG.P1.S1 - CJ, n.º 267, T. III, 2015. 11.ª - O crime de tráfico de estupefacientes é um crime onde as necessidades de prevenção geral são acrescidas, e onde as exigências de prevenção especial, ainda que relevantes, acabam por sofrer a compressão derivada daquelas necessidades acrescidas dado o alarme social que estes crimes provocam, que atingem proporções de um flagelo nacional. 12.ª – No caso, deu-se como provado que, em 22 Janeiro de 2018, o arguido DD foi visto, por mero acaso, a esconder 36 doses de cocaína e uma balança de precisão numa zona arborizada, sita em ....... 13.ª - Deu-se também como provado actos de vendas de produto estupefaciente durante o ano de 2018 - sendo que em Janeiro de 2018 já vendia cocaína -, e que o fez até Maio de 2019, período dilatado no tempo. 14.º - Deu-se ainda como provado que, no dia 11 de Julho de 2019, no interior da sua residência tinha carteiras de pó de marca “redrate”, para misturar com a cocaína, dois telemóveis, para estabelecer os contactos com os compradores e quantias monetárias provenientes da venda de cocaína e heroína. 15.ª Quanto à qualidade do produto estupefaciente, deu-se como provado que o arguido .......... procedia à venda de cocaína e heroína, drogas ultra duras e duras, atento 24 de 26 o seu elevado grau de danosidade, e, relativamente à cocaína, vendia cocaína cozida (“crack”), tipo de cocaína mais viciante. 16.º - Além disso, em audiência de discussão e julgamento, o arguido não prestou declarações, não mostrando o mínimo arrependimento pela sua conduta altamente censurável, não ignorando que ao desenvolver tal actividade ilícita está a contribuir decisivamente para a miséria, perda de liberdade individual de terceiros consumidores, a estabilidade e coesão familiar, além dos efeitos criminógenos associados. 17. º - O dolo do arguido foi directo e intenso e o motivo da prática do crime foi o lucro, revelando-se uma actividade que se traduzia em obter dinheiro de forma fácil, sendo certo que tinha rendimentos próprios e não precisava de transacionar produto estupefaciente para assegurar a sua subsistência e da sua família. 18.º - No que concerne às exigências de prevenção geral, revelam-se as mesmas elevadíssimas, atentas as dramáticas consequências sociais que advêm do negócio do tráfico ilícito de estupefacientes, com efeitos nefastos sobre a vida dos jovens, das famílias e a saúde e a segurança da comunidade. 19.º - O arguido não era um “dealer” de rua, que vendia para subsistir ou para prover ao seu próprio consumo, actuando, por vezes, nos mesmos locais que AA, disseminando por terceiros consumidores cocaína e heroína, drogas de elevado espectro de danosidade, pelo grau e intensidade da adição que provocam nos consumidores, agindo não a descoberto mas de forma dissimulada, sem demonstrar qualquer arrependimento ou preocupação que a venda de tais produtos provoca aos consumidores. 20.ª - No caso em questão, não se verificam, em nosso entender, situações muito ponderosas, que permitam formular este juízo de prognose favorável, existindo uma forte probabilidade de o arguido continuar a praticar o crime de tráfico de estupefacientes (tem os conhecimentos necessários para preparar os produtos que distribui e vende, conhece os consumidores, e tem a motivação para o continuar a fazer) para daí obter proventos fáceis e significativos a que já se habituou e que de outro modo não obteria). 21.ª – Mais: atenta a postura que o arguido assume perante os factos, à ausência de actividade laboral regular e significativa, à natureza e gravidade do ilícito e as circunstâncias em que é cometido, temos “razões sérias para duvidar da capacidade do agente de não repetir crimes”. 22.ª - Acresce que, nos termos do artigo 50.º do C. Penal, a suspensão da execução da pena há-de realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, o que, neste caso, não se evidencia como suficientemente garantido, por causa das fortes exigências de prevenção geral neste tipo de crime, atentas as circunstâncias apuradas e os factos dados como provados no acórdão recorrido. 23.ª - Conclui-se assim que, no caso, não existem razões sérias para crer na existência de uma “esperança de que a socialização em liberdade possa ser lograda” e que a suspensão da execução da pena não acautela os fins da punição. 24.ª - Pelo supra exposto, e salvo melhor opinião, o Tribunal a quo, ao suspender a execução da pena de 3 (três) anos de prisão em que condenou o arguido DD, violou o disposto no artigo 50.º do Código Penal. 25.ª – O Tribunal a quo, ao decidir suspender a execução da pena de 3 (três) anos de prisão em que condenou o arguido DD, violou o disposto no artigo 50.º do Código Penal. Nestes termos e nos demais de direito deve o presente recurso ter provimento revogando-se nessa parte a douta sentença recorrida, sendo a mesma substituída por outra que condene o arguido DD na pena de 3 (três) anos de prisão efectiva pela prática de um crime de tráfico de menor gravidade, previsto e punido pelos arts. 21º e 25º, al. a), do Decreto-Lei n.º 15/93 de 22.01, com referência às Tabelas I-A e I-B anexas a tal diploma legal». 1.3. O Ministério Público junto do Tribunal “a quo” pronunciou-se pela improcedência do recurso do arguido AA. 1.4. O arguido DD pronunciou-se pela improcedência do recurso do Ministério Público. 1.5. Neste Tribunal a Exmª Procuradora-Geral Adjunta emitiu Parecer no sentido da improcedência do recurso nos seguintes termos: (…) «Do mérito 7- Acompanhamos o entendimento e a argumentação constante da motivação do recurso interposto pelo Magistrado do Mº Pº no que respeita à desadequação e insuficiência da pena de substituição aplicada ao arguido DD. E igualmente subscrevemos o entendimento sufragado na resposta apresentada pelo Mº Pº na 1ª Instância ao recurso interposto pelo arguido AA, no sentido de que aquele recurso não merece provimento. 8. Assim, no que respeita ao enquadramento jurídico dos factos dados como provados quanto ao arguido AA, consideramos que o grau da ilicitude dos factos praticados impede o enquadramento da actividade de tráfico que desenvolveu no tipo privilegiado previsto no art. 25, que pressupõe que a ilicitude seja consideravelmente diminuída. A decisão recorrida analisou a questão da subsunção jurídica dos factos ao tipo privilegiados previsto no art. 25, ponderando a factualidade provada e todo o circunstancialismo envolvente à luz dos ensinamentos jurisprudenciais, que cita, realçando que “o lapso de tempo e a intensidade com que desenvolveu a actividade de tráfico, a quantidade de produto estupefaciente que detinha (susceptíveis de originar 344 doses de cocaína e 20 doses de heroína), a sua qualidade (cocaína e heroína, amplamente conhecidas pelo seu poder aditivo e incluídas nas chamadas "drogas duras") e a quantia monetária que tinha na sua posse (€ 665,00), não nos permitem, de modo algum, concluir por uma ilicitude consideravelmente diminuída.” Subscrevemos as conclusões retiradas pelo Tribunal recorrido e consideramos não proceder a argumentação do arguido recorrente no que respeita à sua pretensão de que os factos provados devam ser subsumidos ao tipo privilegiado previsto no art. 25, do D. L. nº 15/93, de 22 de Janeiro. 9 - Igualmente se nos afigura não merecer qualquer reparo a decisão relativa à escolha e determinação da medida da pena fixada quanto ao arguido AA, mostrando-se essa decisão justa, adequada e respeitadora dos parâmetros decorrentes dos critérios legais fixados nos arts 40 e 71, do Código Penal, Com efeito, a decisão recorrida fez uma análise e valoração criteriosas das circunstâncias que rodearam a prática dos factos, do grau de culpa manifestado, da ilicitude e das exigências de prevenção especial e geral que no caso ocorrem, consignando as razões pelas quais entendeu ser adequada a medida da pena que fixou. Desta forma e ao contrário do que alega o recorrente, a nosso ver, a pena aplicada é adequada e proporcional à gravidade dos factos e à perigosidade do agente pelo que não vemos qualquer fundamento para que a mesma seja reduzida. 10 - No que respeita ao recurso interposto pelo Mº Pº através do qual impugna a aplicação ao arguido DD de uma pena de substituição, em concreto a suspensão da execução da pena de prisão que lhe foi aplicada, acompanhamos as considerações expressas na motivação e afigura-se-nos também que o circunstancialismo envolvente dos factos e a posição do arguido perante os mesmos não permitem fazer um juízo no sentido de que a ameaça da pena de prisão seja suficiente para o afastar da actividade criminosa. É certo que não tem antecedentes criminais, revela hábitos de trabalho e está inserido familiarmente, mas, como salienta o Tribunal recorrido “tais factores de protecção não os impediram de levar a cabo as condutas pelas quais vão ora condenados e tornam ainda mais incompreensível a sua prática.” Acresce que no acórdão recorrido depois de se salientar as elevadas necessidades de prevenção geral que se verificam, justificou-se a suspensão de execução da pena de forma minimalista, consignando-se apenas: “considerar-se-ão as condições de vida do Arguido DD apuradas nos autos, a circunstância de ainda ser jovem e a ausência de antecedentes criminais. É, desta forma, possível esperar que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizem de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”. As considerações expressas pelo Magistrado do Mº Pº na motivação do recurso que interpôs e as reservas que colocou quanto ao juízo de prognose favorável efectuado pelo Tribunal recorrido são prementes, não se mostrando suficientemente acauteladas, a nosso ver, as fortes exigências de prevenção especial que se verificam, pois, como o próprio Tribunal recorrido acentuou, os hábitos de trabalho e a inserção familiar do arguido não impediram que desenvolve-se a actividade de tráfico de estupefacientes, que só cessou com a intervenção policial que levou à instauração destes autos. Mas mesmo que se considere que é ainda possível formular aquele juízo de prognose favorável, impõe-se, tal como propugna o Magistrado do Mº Pº recorrente, que a suspensão da execução da pena seja acompanhada por regime de prova, nos termos do disposto nos arts. 50, nº 2 e 53 do Código Penal. Em conformidade com o exposto, emite-se parecer no sentido da improcedência do recurso interposto pelo arguido AA e da procedência do recurso interposto pelo Mº Pº.». 1.6. Foi cumprido o art. 417º, do CPP. 1.7. Com dispensa de Vistos, e não tendo sido requerida audiência, seguiu o processo para conferência. *** 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1. A matéria de facto provada é a seguinte: AA 1. Nos períodos temporais compreendidos entre data não concretamente apurada do Verão do ano de 2017 e até ao dia 12 de Dezembro de 2018 e no mês de Maio de 2019, o Arguido AA (doravante AA), também conhecido pela alcunha de «AA.», cedeu, a troco de dinheiro, cocaína e heroína, a indivíduos consumidores que para tanto o contactavam telefonicamente, sendo certo também, que os encontros entre aquele e estes ocorreram em vários locais do concelho ....... 2. De entre os indivíduos que adquiriram cocaína e/ou heroína ao Arguido AA nas circunstâncias acima referidas, contam-se os seguintes: > II: que adquiriu ao Arguido AA, no período temporal compreendido entre o Verão do ano de 2017 e o mês de Novembro de 2018, em pelo menos vinte ocasiões distintas, heroína, pagando em cada uma dessas vezes a quantia de €25,00 por uma saqueta contendo cerca de um grama daquela substância. Em algumas das referidas ocasiões, em pelo menos dez, adquiriu também cocaína ao Arguido AA, tendo pago a este, em cada uma dessas vezes, a quantia de €25,00 por uma saqueta contendo cerca de meio grama de cocaína. Uma das mencionadas ocasiões, foi no dia ... de Novembro de 2018, pelas 12h17m, no parque de estacionamento conhecido por «Parque........», em ......, local este onde o Arguido AA se encontrou com II e entregou a este uma saqueta contendo heroína ou cocaína e recebeu em troca a quantia de €25,00. > JJ: que adquiriu, estando acompanhado pela sua companheira KK, ao Arguido AA, no período temporal compreendido entre data não concretamente apurada do ano de 2018 e o mês de Novembro desse mesmo ano, em pelo menos sete ou oito ocasiões distintas, cocaína cozida, pagando em cada uma dessas vezes a quantia de €25,00 por uma saqueta contendo cerca de meio grama daquela substância e, bem ainda, o segundo vendeu-lhe, nesse mesmo período temporal, em pelo menos quinze a vinte ocasiões distintas, heroína, pela qual pagou em cada uma dessas vezes a quantia de €25,00. Acresce ainda que, no mês de Maio de 2019, o Arguido AA vendeu a JJ, em quatro ocasiões distintas, heroína, sendo que este último pagou àquele em cada uma dessas vezes a quantia de €25,00 por uma saqueta contendo cerca de um grama daquela substância. O Arguido AA disse a JJ para avisar os restantes consumidores de que tinha "branca" [cocaína] para vender. 3. O Arguido AA, para além do acima indicado, efectuou também as seguintes vendas de cocaína e/ou heroína: 3.1. No dia ... de Outubro de 2018, entre as 16h09m e as 16h23m, no parque de estacionamento conhecido por «Parque ........», em ......, o Arguido AA encontrou-se com um indivíduo do sexo masculino conhecido pelo nome de "LL" (consumidor de heroína e cocaína) e entregou a este uma saqueta contendo cocaína ou heroína e recebeu em troca quantia monetária não concretamente apurada; 3.2. No dia ... de Novembro de 2018, pelas 10h45m, no parque de estacionamento existente junto ao fontanário localizado em ............, o Arguido AA encontrou-se com um individuo cuja identidade se desconhece e entregou a este uma saqueta contendo cocaína ou heroína e recebeu em troca quantia monetária não concretamente apurada; 3.3. No dia ... de Maio de 2019, pelas 17h40m na estrada que liga a localidade ........ à localidade .................., em ......, o Arguido AA encontrou-se com um indivíduo do sexo masculino que se fazia transportar num veículo automóvel da marca e modelo «..........», de matrícula ..-..-FA, e entregou a este uma saqueta contendo cocaína ou heroína, recebendo em troca quantia monetária não concretamente apurada. 4. No dia ... de Dezembro de 2018, entre as 23h07m e as 23h14m, o Arguido AA, dirigiu-se para uma zona de mato, localizada na Estrada Nacional n.° ....., nas imediações .........., em ......, local este onde o mesmo, deitou no interior de um contentor do lixo um saco branco em cujo interior se encontrava o seguinte: diversos recortes circulares em plástico «roxo» e plásticos de cor preta e transparente com vestígios de um pó branco. 5. Acto contínuo, o Arguido AA, abaixou-se junto de uma árvore existente no local acima referido e, escondeu, por debaixo de uns troncos que ali se encontravam um saco contendo o seguinte: > Um telemóvel da marca e modelo «……»; > Uma balança de precisão de cor cinza; > Um cartão em plástico ostentando os dizeres «Pingo Doce»; > 83 embalagens em plástico contendo cocaína (Éster MET.), com o peso líquido de 32,mgramas e um grau de pureza de 29,8% (susceptível de originar 318 doses); > Um pequeno saco em cujo interior se encontrava o seguinte: 4 embalagens de plástico contendo no seu interior cocaína (Éster MET.), com o peso líquido de i,624gramas (um grau de pureza de 29,6%, susceptível de originar 16 doses); 3 saquetas contendo no seu interior heroína, com o peso líquido de 2,903 gramas (um grau de pureza de 6,6%, susceptível de originar 1 dose) e uma saqueta contendo heroína, com o peso líquido de o,964gramas (um grau de pureza de 7,8%, susceptível de originar <1 dose). 6. No dia ... de Julho de 2019, pelas 10h30m, o Arguido AA tinha em sua posse, no interior da sua residência, localizada na Rua ............, n.º ......., em ......, o seguinte: No quarto: • Dois telemóveis da marca "….", em funcionamento e que se encontravam em cima da mesa de cabeceira; • Um telemóvel de marca "……", em funcionamento, que se encontrava também em cima da mesa de cabeceira; • A quantia monetária de €665,00 euros (composta do seguinte modo: 3 notas com o valor facial de €50,00; 22 notas com o valor facial de €20,00; 6 notas com o valor facial de €10,00 e 3 notas com o valor facial de €5,00), que se encontrava guardada na gaveta da cómoda. Na casa de banho: • Recortes em plástico circulares, usados para o acondicionamento de heroína e cocaíia, e que estava no lixo da casa de banho. Na cozinha (no interior da gaveta do armário) • Uma balança de precisão; • Fita-cola castanha e uma tesoura. No anexo denominado "casa do gás": • Um saco plástico de cor preto, que estava oculto debaixo do papel informativo da garrafa de gás, e que continha no seu interior o seguinte: - 27 sacos contendo heroína, com o peso líquido de 25,409 gramas e um grau de pureza de 6%, correspondente a 15 doses; - 2 sacos contendo heroína, com o peso líquido de 10,081 gramas e um grau de pureza de 4,6%, correspondente a 4 doses; - 20 sacos contendo no seu interior cocaína (cloridrato), com o peso líquido de 5,830gramas e um grau de pureza de 35,5%, correspondente a 10 doses; - Um saco contendo no seu interior fenacetina, com o peso líquido de 4,890gramas. No interior de um veículo automóvel abandonado, que se encontrava estacionado nas traseiras da habitação: • Uma garrafa de amoníaco (habitualmente usado para a cozedura da cocaína). Ainda nesse mesmo dia ... de Julho de 2019, pelas 12h20m, o Arguido AA tinha em sua posse, no interior do veículo automóvel da marca e modelo «.......», de matrícula ..-..-SR, o seguinte: um telemóvel da marca «……». 8. Os telemóveis que o Arguido AA tinha em sua posse nas circunstâncias supra descritas, eram destinados por aquele para receber e efectuar contactos telefónicos com vista a concretizar as transacções de venda de cocaína e heroína a que se dedicava. 9. O Arguido AA agiu de forma livre, deliberada e consciente, conhecendo muito bem a natureza estupefaciente da cocaína e da heroína que tinha em sua posse e daquela que revendeu a terceiros. 10. Mais sabia que não tinha autorização para deter, vender, ceder e transportar cocaína e heroína e, bem assim, estava perfeitamente ciente que a sua conduta era proibida e punida por lei. DD 11. No dia ... de Janeiro de 2018, pelas nh53m, o Arguido DD, (doravante DD) também conhecido pelas alcunhas «DD.», «DD..» e «DD...», dirigiu-se para o interior de uma zona arborizada, localizada na Rua ............., em ......, local este onde o mesmo se abaixou e escondeu por debaixo de uma pedra ali existente o seguinte: • Uma saqueta contendo cocaína (cloridrato), com o peso líquido de 9,68ogramas (um grau de pureza de 75,7%, susceptível de originar 36 doses); e, • Uma balança de precisão da marca e modelo «Pocket Sale, MH-Series». 12. A referida cocaína era destinada pelo Arguido DD à cedência, a troco de dinheiro, a indivíduos consumidores daquela substância que o contactavam predominantemente através de contactos telefónicos, sendo certo também, que os encontros entre aquele e estes ocorreram em vários locais do concelho ....... 13. De entre os indivíduos que adquiriram cocaína e/ou heroína ao Arguido DD, nas circunstâncias mencionadas no artigo antecedente, contam-se os seguintes: JJ: no mês de Maio de 2019, o Arguido DD vendeu a JJ, pelo menos uma vez, heroína, o qual, pagou por esta a quantia de €25,00 por uma saqueta contendo cerca de um grama daquela substância. MM: que adquiriu ao Arguido DD, no período temporal compreendido entre data não concretamente apurada do ano de 2018 e .. de Maio de 2019,' em pelo menos três ocasiões distintas, cocaína cozida, pagando em cada uma dessas vezes a quantia de €25,00 ou €30,00 por uma saqueta contendo cerca de meio grama daquela substância. Uma das referidas ocasiões, foi no dia 7 de Maio de 2019, pelas 23h53m, na Rua do ........, em ......, local este onde o Arguido DD se encontrou com MM e entregou a este uma saqueta contendo cocaína e recebeu em troca a quantia de €25,00 ou € 30,00 14. O Arguido DD, para além do acima indicado, efectuou também as seguintes vendas de cocaína e/ou heroína: 14.1. No dia ... de Novembro de 2018, pelas 15h36m, na Rua ..., em ......, o Arguido DD encontrou-se com NN, também conhecido por "NN.", e entregou a este uma saqueta contendo cocaína ou heroína, recebendo em troca quantia monetária não concretamente apurada. 14.2. No dia ... de Maio de 2019, pelas 18h59m, na estrada que liga a localidade de ........ à localidade de ........, em ......, o Arguido DD encontrou-se com um indivíduo do sexo masculino cuja identidade se desconhece e entregou a este uma saqueta contendo cocaína ou heroína, recebendo em troca quantia monetária não concretamente apurada. 15. No dia ... de Julho de 2019, pelas 10h30m o Arguido DD, tinha em sua posse, no interior da sua residência, localizada na Rua ....., edifício ...., apartamento ..., em ...., o seguinte: Na Sala: • Dois telemóveis, sendo um de marca "….." e o outro de marca "…." (que estavam em cima do sofá); • Duas notas de €5,00 euros, que estavam dentro de umas calças de fato de treino; • A quantia monetária de €265,00 euros, que se encontrava em cima da mesa da sala; • 11 carteiras de pó da marca "REDRATE". No Quarto de dormir: A quantia de €1.140,00 euros, composta por diversas notas de €50,00, €20,00, €10,00 e €5,00 que se encontrava acondicionada numa bolsa dentro da gaveta da mesa de cabeceira). 16. O telemóvel da marca "……" que o Arguido DD tinha em sua posse nas circunstâncias supra descritas, era destinado por aquele para receber e efectuar contactos telefónicos com vista a concretizar as transacções de venda de cocaína e heroína a que se dedicava. 17. O Arguido DD agiu de forma livre, deliberada e consciente, conhecendo muito bem a natureza estupefaciente da cocaína e da heroína que tinha em sua posse e daquela que revendeu a terceiros. 18. Mais sabia que não tinha autorização para deter, vender, ceder e transportar cocaína e heroína e, bem assim, estava perfeitamente ciente que a sua conduta era proibida e punida por lei. Mais se apurou relativamente Ao Arguido AA 19. AA é natural de ...., onde cresceu inserido na família alargada, com os pais, avós e uma numerosa fratria, alguns deles por afinidade. Os recursos provinham do trabalho …..dos adultos, sendo que o Arguido depois de tirar carta de condução, aos 22 anos, passou a trabalhar como…….. 20. Em 2016, com 26 anos, veio de visita a familiares em Portugal, sem projectos concretos, onde acabou por permanecer. No país de acolhimento tem vivido na região ....., nas zonas ....... e de ......, onde situa referências familiares. Apresenta ligação ao trabalho, num registo basicamente activo, ligado a serviços indiferenciados de jardinagem e de cozinha. 21. Já em Portugal, veio a conhecer GG, encetando com ela uma vida marital em 2018. Desta relação nasceu o seu único filho, que conta actualmente 21 meses. 22. À data da prisão, em ... .07.2019, vivia numa pequena casa arrendada por 20o€ mensais, sem grandes condições, na .............., onde ainda se mantêm a companheira e filho. Na altura, alternava horários de trabalho com GG, ela durante o dia………, o Arguido à noite……., com vista a assegurarem o cuidado do bebé. 23. Nessa medida, trabalhava no período noturno no "......", sito na ........, propriedade de HH, aí exercendo as funções inerentes à categoria profissional de ......., auferindo uma média de € 600,00 ao que acrescem as gorjetas. 24. Este é o primeiro confronto de AA com o sistema de administração da justiça penal, do qual acata a oportunidade da acusação, apresentando sentido da reprovação dos alegados factos que lhe deram origem. A companheira, embora crítica e apreensiva com eventuais consequências condenatórias, mostra-se disposta a dar-lhe o apoio possível. 25. Em meio prisional, revela um comportamento isento de reparos ou registos disciplinares. Conta com as visitas/contactos regulares da companheira e outros familiares e amigos. 26. Os projectos são de mudar a residência para a zona......, com vista a afastar-se de um meio que considerou propenso a relações pró-criminais e à influência negativa das mesmas. 27. Tem título de residência válido até 11.03.2022. 28. Do Certificado de Registo Criminal deste Arguido nada consta. Arguido DD 29. Tal como na altura da ocorrência dos factos agora em fase de julgamento (2018/2019), DD encontra-se no presente a residir com a companheira, OO, 24 anos, e a filha de ambos de apenas 1 ano, num apartamento Ti arrendado desde 2018 na ........... O Arguido paga 300€ de renda de casa a que acrescem as habituais despesas fixas mensais, sendo o quadro económico familiar relativamente equilibrado. 30. DD foi contratado há cerca de 9 meses como empregado ……..no Parque…. – T…, Lda., auferindo um salário de 850€ embora actualmente esteja em regime de layoff, em casa, a tomar conta da filha. O Arguido é pai de uma outra menor (PP, 5 anos) que mora em ....... com uma sua ex-companheira. A actual companheira é………., na ........ e está a trabalhar, tendo uma remuneração mensal de 650€ 31. Natural ......, ....., DD é filho único da relação dos progenitores, que se separaram ainda antes do seu nascimento, embora tenha mais irmãos, filhos de outras relações de ambos os pais. A mãe cedo migrou para ….., pelo que o Arguido foi criado numa aldeia …… junto da família da avó materna e fez todo o seu percurso escolar na terra natal completando o 9º ano de escolaridade aos 16 anos, ocupando-se posteriormente em …… junto de familiares. 32. DD viajou para Portugal no final de 2012 para estudar no âmbito do acordo de cooperação escolar com ....., mas acabou por não concluir um curso na área da electricidade que começou a tirar em ... . Após esta desistência, esteve cerca de 1 ano em …… (2013) a residir com a mãe e um irmão (QQ), tendo-se ocupado em ….. enquanto houve trabalho nesse país, mas acabou por regressar devido ao desemprego. 33. Viveu e trabalhou durante cerca de 3 anos em ...... no sector……., onde conheceu a mãe da sua filha mais velha, mas em 2016 optou por procurar emprego na região ...., fixando-se no concelho ... . Trabalhou em …… e como ……… antes de, em 2019, ter conseguido o actual emprego no Parque … . 34. No plano afectivo, DD mantêm desde há mais de 4 anos uma união de facto estável com OO, não tendo familiares directos no ... . Refere ainda assim uma ligação preferencial com a progenitora através de contactos telefónicos para …….., bem com os irmãos e o pai, este último a residir em .... . 35. DD não tem problemas de saúde e apresenta a sua situação enquanto cidadão estrangeiro regularizada junto do SEF. Apesar de ter uma personalidade extrovertida, segundo a sua companheira, este processo trouxe algumas alterações na sua conduta social e agora passa muito mais tempo em casa. 36. O telemóvel da marca …. apreendido aquando das buscas domiciliárias foi adquirido pela companheira do Arguido DD. 37. A quantia de € 500,00 que se encontrava numa bolsa sobre a mesinha de cabeceira do quarto onde viviam e que se encontra apreendida nos autos foi enviada …., no dia … .06.2019, pelo irmão do Arguido, RR, residente em ....... , como prenda para a sobrinha, filha do Arguido. 38. Do seu Certificado de Registo Criminal nada consta. *** 3. O DIREITO 3.1. Nos presentes autos são dois os recursos a conhecer, como supra se referiu, ou seja, o recurso do arguido AA e o recurso do Ministério Público. O objeto do recurso arguido AA atentas as conclusões da respetiva motivação, são as seguintes: - O enquadramento jurídico-penal - A dosimetria da pena. - A suspensão da execução da pena. O objeto do recurso do Ministério Público prende-se com a seguinte questão: - A suspensão da execução da pena, aplicada ao arguido DD.
3.1.1. A. Conhecendo do recurso do arguido AA Insurge-se o recorrente contra o enquadramento jurídico-penal a que se procedeu no acórdão recorrido, alegando que deve ser condenado pelo tráfico de menor gravidade p. e p pelo art. 25º al a) do D.L 15/93 de 22JAN em vez do crime de tráfico p. e p pelo art. 21º do referido diploma, alegando que o arguido actuava sozinho; que vendeu produto estupefaciente a um reduzido número de consumidores (cerca de 4 (quatro); que as transações ocorriam em locais públicos através de contacto direto com o consumidor final; que a área geográfica das vendas era circunscrita à região ....; que a dita actividade seria esporádica/pontual conforme se constata pela simples leitura do ponto 1 da matéria assente, ou seja, não fazia dessa atividade modo de vida; que não terá obtido dessa atividade grandes lucros face ao seu modesto nível de vida, o que leva a concluir que o grau de ilicitude é no quadro de um tráfico comum, pequeno, e que a sua conduta se insere numa situação de pequeno tráfico de rua, incipiente, desorganizado, completamente distinto da do grande e médio tráfico, razão pela qual a atuação do Recorrente deveria ter sido enquadrada no previsto no artigo 25.°, alínea a), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro. No acórdão recorrido foi o arguido AA condenado pela prática, como autor material de um crime de tráfico de estupefacientes do p. p. pelo art. 21º, nº 1, do Dec. Lei nº 15/93 de 22 de Janeiro, com referência às Tabelas I-B e I-C anexas, na pena de 6 (seis) anos de prisão. Vejamos: O art 21º, nº 1 do D.L nº 15/93 de 22JAN consagra que “Quem, sem para tal se encontrar autorizado, cultivar, produzir, fabricar, extrair, preparar, oferecer, puser à venda, vender, distribuir, comprar, ceder ou por qualquer título receber, proporcionar a outrem, transportar, importar, exportar, fizer transitar ou ilicitamente detiver, fora dos casos previstos no artº 40º, plantas, substâncias ou preparações compreendidas nas tabelas I a III é punido com pena de prisão de 4 a 12 anos”. Este preceito constitui o crime matricial do crime de tráfico de estupefacientes, onde cabem, o verdadeiro tráfico, grande e médio, permitindo distinguir entre os casos «graves» (art. 21.°), os muito graves (art. 24.º) e os pouco graves (art. 25.º) [2] Com efeito, conforme se afirma no AC do STJ de 17ABR08, processo nº 08P571, Relator Henriques Gaspar[3] «O artigo 21º, nº 1, do Decreto-Lei nº 15/93 contém, pois, a descrição fundamental - o tipo essencial - relativa à previsão e ao tratamento penal das actividades de tráfico de estupefacientes, construindo um tipo de crime que assume, na dogmática das qualificações penais, a natureza de crime de perigo. A lei, nas condutas que descreve, basta-se com a aptidão que revelam para constituir um perigo para determinados bens e valores (a vida, a saúde, a tranquilidade, a coesão interindividual das unidades de organização fundamental da sociedade), considerando integrado o tipo de crime logo que qualquer das condutas descritas se revele, independentemente das consequências que possa determinar ou efetivamente determine: a lei faz recuar a proteção para momentos anteriores, ou seja, para o momento em que o perigo se manifesta. A construção e a estrutura dos crimes ditos de tráfico de estupefacientes, como crimes de perigo, de protecção (total) recuada a momentos anteriores a qualquer manifestação de consequências danosas, e com a descrição típica alargada, pressupõe, porém, a graduação em escalas diversas dos diferentes padrões de ilicitude em que se manifeste a intensidade (a potencialidade) do perigo (um perigo que é abstracto-concreto) para os bens jurídicos protegidos. De contrário, o tipo fundamental, com os índices de intensidade da ilicitude pré-avaliados pela moldura abstracta das penas previstas, poderia fazer corresponder a um grau de ilicitude menor uma pena relativamente grave, com risco de afetação de uma ideia fundamental de proporcionalidade que imperiosamente deve existir na definição dos crimes e das correspondentes penas. Por isso, a fragmentação por escala dos crimes de tráfico (mais fragmentação dos tipos de ilicitude do que da factualidade típica, que permanece no essencial), respondendo às diferentes realidades, do ponto de vista das condutas e do agente, que necessariamente preexistem à compreensão do legislador: a delimitação pensada para o grande tráfico (artigos 21º e 22º do Decreto-Lei no 15/93), para os pequenos e médios traficantes (artigo 25º) e para os traficantes-consumidores (artigo 26º) (Cfr.. v. g., LOURENÇO MARTINS, “Droga e Direito”, ed. Aequitas, 1994, pág. 123; e, entre vários, o acórdão deste Supremo Tribunal, de 1 de Março de 2001, na “Colectânea de Jurisprudência”, ano IX, tomo I, pág. 234)».
O art. 25º do DL nº 15/93 de 22JAN, sob a epígrafe “tráfico de menor gravidade”, dispõe: “Se, nos casos dos arts. 21º e 22º, a ilicitude do facto se mostrar consideravelmente diminuída, tendo em conta nomeadamente os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da ação, a qualidade ou a quantidade das plantas, substâncias ou preparações, a pena é de: a) prisão de um a cinco anos se se tratar de plantas, substâncias ou preparações compreendidas nas Tabelas I a III, V e VI».
O AC do STJ de 04JUN2014, processo nº 3/12.2GALLE.S, Relator Sousa Fonte[4], afirma que «O Supremo Tribunal de Justiça, a propósito daquele crime dito de menor gravidade, tido como válvula de segurança do sistema, em ordem a evitar que situações efetivas de menor gravidade sejam tratadas com penas desproporcionadas – trata-se de um crime «para o pequeno tráfico, para o pequeno “retalhista” de rua», como se disse, por exemplo, no Acórdão de 31.01.02, Pº nº 4624/01-5ª, citando Maia Costa em “Direito Penal da droga: breve história de um fracasso”, Revista do Ministério Público, Ano 19, Nº 74, 103 e segs. –, vem entendendo, também sem discrepâncias de relevo, que a conclusão sobre o elemento típico da considerável diminuição da ilicitude do facto terá de resultar de uma valoração global deste, tendo em conta, não só as circunstâncias que o preceito enumera de forma não taxativa mas, ainda, outras que apontem para aquela considerável diminuição. Reiteramos, uma vez mais, este entendimento, porquanto também pensamos que a avaliação da ilicitude de um facto criminoso como consideravelmente diminuída não pode deixar de envolver uma avaliação global de todos os elementos que interessam àquele elemento do tipo, tanto no domínio do direito penal da droga como em qualquer outro. Aqui, como em qualquer outro campo do direito penal, não bastará, por certo, a presença de uma circunstância fortemente atenuativa para considerar preenchido o conceito, quando as restantes, com incidência nessa avaliação, são de sentido contrário, do mesmo modo que um conjunto de circunstâncias fortemente atenuativas não poderá ser postergado, sem mais, pela presença de uma circunstância grave. A imagem global do facto, no que se refere à sua ilicitude (parece pacífico que, para efeitos de preenchimento do crime do artº 25º, não intervêm considerações sobre a culpa) é que é decisiva, como nos parece evidente. As dificuldades estarão em eleger os critérios de aferição dessa imagem global dos factos». E, conforme se refere no AC do STJ de 05NOV14, processo nº 99/14.2YRFLS. S1, Relator Pires da Graça, [5], o crime de tráfico de menor gravidade previsto no art. 25º do D.L nº 15/93 de 22JAN caracteriza-se por constituir um “minus” relativamente ao crime matricial do art. 21º do mesmo diploma, isto é, trata-se de um facto típico, cujo elemento distintivo do crime-tipo reside apenas na diminuição da ilicitude, redução que o legislador impõe seja considerável, indicando como fatores aferidores de menorização da ilicitude, a título exemplificativo, os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da ação e a qualidade ou a quantidade das plantas, substâncias ou preparações. E essa aferição do grau da ilicitude não pode prescindir de uma análise de todas as circunstâncias objetivas que em concreto se revelem e sejam suscetíveis de aumentar ou diminuir a quantidade do ilícito. Assim, e para além das circunstâncias atinentes aos fatores de aferição da ilicitude indicados no texto do art. 25.º do DL 15/93, já atrás citados, há que ter em conta todas as demais suscetíveis de interferir na graduação da gravidade do facto, designadamente as que traduzam uma menor perigosidade da ação e/ou desvalor do resultado, em que a ofensa ou o perigo de ofensa aos bens jurídicos protegidos se mostre significativamente atenuado, sendo certo que para a subsunção de um comportamento delituoso (tráfico) àquele tipo privilegiado, como vem defendendo este Supremo Tribunal, torna-se necessária a valorização global do facto, tendo presente que o legislador quis aqui incluir os casos de menor gravidade, ou seja, aqueles casos que ficam aquém da gravidade do ilícito justificativa do crime-tipo, o que tanto pode decorrer da verificação de circunstâncias que, global e conjugadamente sopesadas, se tenham por consideravelmente diminuidoras da ilicitude do facto, como da não ocorrência (ausência) daquelas circunstâncias que o legislador pressupôs se verificarem habitualmente nos comportamentos e atividades contemplados no crime-tipo, isto é, que aumentam a quantidade do ilícito colocando-o ao nível ou grau exigível para integração da norma que prevê e pune o crime-tipo. - Ac- do STJ de 20-12-2006, Proc. n.º 3059/06 – 3ª. O tipo legal de crime de tráfico de menor gravidade procura, assim, dar resposta, em nome da proibição de excesso, da equidade e da justiça, àquelas situações que, sem atingirem a gravidade pressuposta no tráfico simples, merecem reprovação, sendo injusto, sem se lançar mão de atenuação especial, não eficazes métodos para se atingir o tráfico no seu escalão médio e de maior dimensão. A gravidade à escala assim delineada encontra tradução na conformação da ação típica, enquanto não prescinde de a ilicitude, ou seja o demérito da ação típica, na sua expressão de contrariedade à lei, ser consideravelmente reduzida, um ato de repercussão ética de menor gravidade, em função da consideração, além do mais, dos meios utilizados, da modalidade ou circunstância da ação, da qualidade ou quantidade das substâncias ou preparações – al. a) daquele art. 25.º. Essa ponderação, tal como este STJ tem repetidamente afirmado, não prescinde, antes exige, uma valoração global do evento, sem fazer avultar um seu elemento em detrimento do outro. Ac. deste Supremo de 24-01-2007, Proc. n.º 3112/06 - 3.ª Secção».
No acórdão recorrido o Tribunal “a quo” fundamentou o enquadramento jurídico-penal, nos seguintes termos: (…) «Compulsada a factualidade apurada nos presentes autos, temos, desde logo e no que ao Arguido AA respeita, que o mesmo, se dedicou à venda e distribuição de produtos estupefacientes, nomeadamente heroína e cocaína, os períodos temporais compreendidos entre data não concretamente apurada do Verão do ano de 2017 e até ao dia 12 de Dezembro de 2018 e no mês de Maio de 2019, detendo e fazendo a entrega dessas substâncias a consumidores das mesmas, a troco de uma compensação pecuniária. Tal actividade foi levada a cabo, designadamente, nas circunstâncias e aos consumidores indicados na matéria dada como provada em 2. e 3.. Mais resultou que o mesmo tinha na sua posse os seguintes bens e produtos que escondeu: Ø Um telemóvel da marca e modelo «……..»; Ø Uma balança de precisão de cor cinza; Ø Um cartão em plástico ostentando os dizeres «Pingo Doce»; - 83 embalagens em plástico contendo cocaína (Éster MET.), com o peso líquido de 32,111 gramas e um grau de pureza de 29,8% (susceptível de originar 318 doses); - Um pequeno saco em cujo interior se encontrava o seguinte: 4 embalagens de plástico contendo no seu interior cocaína (Éster MET.), com o peso líquido de 1,624gramas (um grau de pureza de 29,6%, susceptível de originar 16 doses); 3 saquetas contendo no seu interior heroína, com o peso líquido de 2,903 gramas (um grau de pureza de 6,6%, susceptível de originar 1 dose) e uma saqueta contendo heroína, com o peso líquido de 0,964gramas (um grau de pureza de 7,8%, susceptível de originar <1 dose). E, guardado na "casa do gás" anexa à sua habitação, o mesmo Arguido tinha: - 27 sacos contendo heroína, com o peso líquido de 25,409 gramas e um grau de pureza de 6%, correspondente a 15 doses; - 2 sacos contendo heroína, com o peso líquido de 10,081 gramas e um grau de pureza de 4,6%, correspondente a 4 doses; - 20 sacos contendo no seu interior cocaína (cloridrato), com o peso líquido de 5,830gramas e um grau de pureza de 35,5%, correspondente a 10 doses; - Um saco contendo no seu interior fenacetina, com o peso líquido de 4,890gramas. (…) Tais produtos vêm previstos nas Tabela I-A e I-B anexas ao Decreto-Lei n° 15/93, de 22 de Janeiro. Resultou, por fim, que estes Arguidos agiram de forma livre, deliberada e consciente, bem conhecendo as características dos produtos estupefacientes que transaccionavam, guardavam e que detinham. Mais sabiam que não tinham autorização para deter, vender, ceder e transportar cocaína e heroína e que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei. Resulta, assim, inequívoco que tais condutas dos Arguidos integram os elementos objectivos e subjectivo do tipo legal contido no artigo 21o do Decreto-Lei n° 15/93 de 22 de Janeiro.(…) Cumprirá, no entanto, analisar se as condutas de AA e de DD integrarão o ilícito previsto artigo 25o do mesmo diploma legal, E, relativamente ao Arguido AA, o lapso de tempo e a intensidade com que desenvolveu a actividade de tráfico, a quantidade de produto estupefaciente que detinha (susceptíveis de originar 344 doses de cocaína e 20 doses de heroína), a sua qualidade (cocaína e heroína, amplamente conhecidas pelo seu poder aditivo e incluídas nas chamadas "drogas duras") e a quantia monetária que tinha na sua posse (€ 665,00), não nos permitem, de modo algum, concluir por uma ilicitude consideravelmente diminuída» Retomando a matéria de facto provada, na parte que aqui releva: AA 1. Nos períodos temporais compreendidos entre data não concretamente apurada do Verão do ano de 2017 e até ao dia ... de Dezembro de 2018 e no mês de Maio de 2019, o Arguido AA (doravante AA), também conhecido pela alcunha de «AA.», cedeu, a troco de dinheiro, cocaína e heroína, a indivíduos consumidores que para tanto o contactavam telefonicamente, sendo certo também, que os encontros entre aquele e estes ocorreram em vários locais do concelho de ....... 2. De entre os indivíduos que adquiriram cocaína e/ou heroína ao Arguido AA nas circunstâncias acima referidas, contam-se os seguintes: > II: que adquiriu ao Arguido AA, no período temporal compreendido entre o Verão do ano de 2017 e o mês de Novembro de 2018, em pelo menos vinte ocasiões distintas, heroína, pagando em cada uma dessas vezes a quantia de €25,00 por uma saqueta contendo cerca de um grama daquela substância. Em algumas das referidas ocasiões, em pelo menos dez, adquiriu também cocaína ao Arguido AA, tendo pago a este, em cada uma dessas vezes, a quantia de €25,00 por uma saqueta contendo cerca de meio grama de cocaína. Uma das mencionadas ocasiões, foi no dia ... de Novembro de 2018, pelas 12h17m, no parque de estacionamento conhecido por «.....», em ......, local este onde o Arguido AA se encontrou com II e entregou a este uma saqueta contendo heroína ou cocaína e recebeu em troca a quantia de €25,00. > JJ: que adquiriu, estando acompanhado pela sua companheira KK, ao Arguido AA, no período temporal compreendido entre data não concretamente apurada do ano de 2018 e o mês de Novembro desse mesmo ano, em pelo menos sete ou oito ocasiões distintas, cocaína cozida, pagando em cada uma dessas vezes a quantia de €25,00 por uma saqueta contendo cerca de meio grama daquela substância e, bem ainda, o segundo vendeu-lhe, nesse mesmo período temporal, em pelo menos quinze a vinte ocasiões distintas, heroína, pela qual pagou em cada uma dessas vezes a quantia de €25,00. Acresce ainda que, no mês de Maio de 2019, o Arguido AA vendeu a JJ, em quatro ocasiões distintas, heroína, sendo que este último pagou àquele em cada uma dessas vezes a quantia de €25,00 por uma saqueta contendo cerca de um grama daquela substância. O Arguido AA disse a JJ para avisar os restantes consumidores de que tinha "branca" [cocaína] para vender. 3. O Arguido AA, para além do acima indicado, efectuou também as seguintes vendas de cocaína e/ou heroína: 3.1. No dia ... de Outubro de 2018, entre as 16h09m e 16h23m, no parque de estacionamento conhecido por «....», em ......, o Arguido AA encontrou-se com um indivíduo do sexo masculino conhecido pelo nome de "LL" (consumidor de heroína e cocaína) e entregou a este uma saqueta contendo cocaína ou heroína e recebeu em troca quantia monetária não concretamente apurada; 3.2. No dia ... de Novembro de 2018, pelas ..h..m no parque de estacionamento existente junto ao fontanário localizado em ........, ......., o Arguido AA encontrou-se com um individuo cuja identidade se desconhece e entregou a este uma saqueta contendo cocaína ou heroína e recebeu em troca quantia monetária não concretamente apurada; 3.3. No dia ... de Maio de 2019, pelas 17h40m, na estrada que liga a localidade de .... à localidade de ...., em ...., o Arguido AA encontrou-se com um indivíduo do sexo masculino que se fazia transportar num veículo automóvel da marca e modelo «....», de matrícula ..-..-FA, e entregou a este uma saqueta contendo cocaína ou heroína, recebendo em troca quantia monetária não concretamente apurada. 4. No dia ... de Dezembro de 2018, entre as 23h07m e as 23h14m, o Arguido AA, dirigiu-se para uma zona de mato, localizada na Estrada Nacional n.° ..., nas imediações ...., em ......, local este onde o mesmo, deitou no interior de um contentor do lixo um saco branco em cujo interior se encontrava o seguinte: diversos recortes circulares em plástico «roxo» e plásticos de cor preta e transparente com vestígios de um pó branco. 5. Acto contínuo, o Arguido AA, abaixou-se junto de uma árvore existente no local acima referido e, escondeu, por debaixo de uns troncos que ali se encontravam um saco contendo o seguinte: > Um telemóvel da marca e modelo «……»; > Uma balança de precisão de cor cinza; > Um cartão em plástico ostentando os dizeres «Pingo Doce»; > 83 embalagens em plástico contendo cocaína (Éster MET.), com o peso líquido de 32,mgramas e um grau de pureza de 29,8% (susceptível de originar 318 doses); > Um pequeno saco em cujo interior se encontrava o seguinte: 4 embalagens de plástico contendo no seu interior cocaína (Éster MET.), com o peso líquido de 1,624gramas (um grau de pureza de 29,6%, susceptível de originar 16 doses); 3 saquetas contendo no seu interior heroína, com o peso líquido de 2,903 gramas (um grau de pureza de 6,6%, susceptível de originar 1 dose) e uma saqueta contendo heroína, com o peso líquido de o,964gramas (um grau de pureza de 7,8%, susceptível de originar <1 dose). 6. No dia ... de Julho de 2019, pelas 10h30m, o Arguido AA tinha em sua posse, no interior da sua residência, localizada na Rua ....., nº .., ....., em ...., o seguinte: No quarto: • Dois telemóveis da marca "….", em funcionamento e que se encontravam em cima da mesa de cabeceira; • Um telemóvel de marca "…", em funcionamento, que se encontrava também em cima da mesa de cabeceira; • A quantia monetária de €665,00 euros (composta do seguinte modo: 3 notas com o valor facial de €50,00; 22 notas com o valor facial de €20,00; 6 notas com o valor facial de €10,00 e 3 notas com o valor facial de €5,00), que se encontrava guardada na gaveta da cómoda. Na casa de banho: • Recortes em plástico circulares, usados para o acondicionamento de heroína e cocaína, e que estava no lixo da casa de banho. Na cozinha (no interior da gaveta do armário) • Uma balança de precisão; • Fita-cola castanha e uma tesoura. No anexo denominado "casa do gás": • Um saco plástico de cor preto, que estava oculto debaixo do papel informativo da garrafa de gás, e que continha no seu interior o seguinte: - 27 sacos contendo heroína, com o peso líquido de 25,409 gramas e um grau de pureza de 6%, correspondente a 15 doses; - 2 sacos contendo heroína, com o peso líquido de 10,081 gramas e um grau de pureza de 4,6%, correspondente a 4 doses; - 20 sacos contendo no seu interior cocaína (cloridrato), com o peso líquido de 5,830gramas e um grau de pureza de 35,5%, correspondente a 10 doses; - Um saco contendo no seu interior fenacetina, com o peso líquido de 4,890gramas. No interior de um veículo automóvel abandonado, que se encontrava estacionado nas traseiras da habitação: • Uma garrafa de amoníaco (habitualmente usado para a cozedura da cocaína). 7. Ainda nesse mesmo dia ... de Julho de 2019, pelas 10h30m, o Arguido AA tinha em sua posse, no interior do veículo automóvel da marca e modelo «....», de matrícula ..-..-SR, o seguinte: um telemóvel da marca «……». 8. Os telemóveis que o Arguido AA tinha em sua posse nas circunstâncias supra descritas, eram destinados por aquele para receber e efectuar contactos telefónicos com vista a concretizar as transacções de venda de cocaína e heroína a que se dedicava. 9. O Arguido AA agiu de forma livre, deliberada e consciente, conhecendo muito bem a natureza estupefaciente da cocaína e da heroína que tinha em sua posse e daquela que revendeu a terceiros. 10. Mais sabia que não tinha autorização para deter, vender, ceder e transportar cocaína e heroína e, bem assim, estava perfeitamente ciente que a sua conduta era proibida e punida por lei. Do exposto podemos concluir que a avaliação global da situação supra descrita não se traduz num menor grau de ilicitude da sua conduta, atenta a qualidade e quantidade dos produtos que transacionou e que tinha na sua posse, os meios utilizados, a quantia monetária que lhe foi apreendida. Com efeito, as quantidades de produto estupefaciente detidas pelo arguido - suscetíveis de originar 344 doses de cocaína e 20 doses de heroína- a sua qualidade (cocaína e heroína, amplamente conhecidas pelo seu poder aditivo e incluídas nas chamadas "drogas duras") e a quantia monetária que tinha na sua posse (€ 665,00), o lapso temporal em que desenvolveu a sua atividade - Verão do ano de 2017 e até ao dia 12 de Dezembro de 2018 e no mês de Maio de 2019 - não são compatíveis com o pequeno tráfico. Tais produtos eram destinados, pelo menos em parte, à venda/cedência a terceiros e o dinheiro apreendido era proveniente dessas vendas. Por outro lado, também não é compatível com o pequeno tráfico os objetos que lhe foram apreendidos, designadamente duas balança de precisão, uma delas de cor cinza, recortes em plástico circulares, usados para o acondicionamento de heroína e cocaína, uma garrafa de amoníaco (habitualmente usado para a cozedura da cocaína). Ou seja, o arguido comprava por atacado, retalhava e vendia. De igual modo, a quantia monetária que foi apreendida, €665,00 euros composta por 3 notas com o valor facial de €50,00; 22 notas com o valor facial de €20,00; 6 notas com o valor facial de €10,00 e 3 notas com o valor facial de €5,00), não é compatível com o pequeno tráfico. Assim sendo, a conduta do arguido integra o crime de tráfico de estupefacientes, p. e p., pelo art. 21° n°1, do Dec. Lei n°15/93, de 22JAN. Neste sentido, improcede nesta parte o recurso. 3.1.2 Vejamos a dosimetria da pena. No acórdão recorrido foi o arguido condenado pela prática, como autor material de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22.01, com referência à Tabela anexa I-A e I-B, na pena de 6 (seis) anos de prisão; Insurge-se o recorrente quanto à pena que lhe foi aplicada pelo crime de tráfico de estupefacientes, p. e p., pelo art. 21º n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22.01, defendendo que a pena deve ser substancialmente reduzida e suspensa na sua execução, para 4 (quatro) anos, considerando as condições pessoais do arguido, e não ter antecedentes criminais. O Tribunal “a quo” fundamentou a pena aplicada ao arguido AA nos seguintes termos, considerando os critérios norteadores a que aludem os arts. 40º e 71º, do Código Penal, as exigências de prevenção geral e especial: (…) «Há que considerar ainda a natureza dos produtos estupefacientes comercializados pelos Arguidos, heroína e cocaína, incluídas entre as chamadas "drogas duras" - vide Relatório da Comissão de Inquérito Parlamentar (Parlamento Europeu), datado de 22 de Novembro de 1989, in Sub Júdice, T. III de 1992. O dolo é intenso - dolo directo - e o grau de ilicitude dos factos é elevado, sobretudo no que diz respeito ao Arguido AA, atendendo, nomeadamente, à quantidade de produto estupefaciente que tinha na sua posse (num total de 344 doses de cocaína e 20 doses de heroína), ao lapso de tempo e à intensidade com que desenvolviam a respectiva actividade e às quantias monetárias encontradas na sua posse. Por outro lado, ambos os Arguidos revelam hábitos de trabalho e encontram-se familiarmente inseridos. Porém, tais factores de protecção não os impediram de levar a cabo as condutas pelas quais vão ora condenados e tornam ainda mais incompreensível a sua prática. Por outro lado, não têm antecedentes criminais e o Arguido AA apresenta um bom comportamento em meio prisional. Tudo ponderado, julga-se adequado aplicar: a) Ao Arguido AA, a penas de 6 (seis) anos de prisão pela prática do crime de Tráfico de Estupefacientes». A moldura penal abstrata correspondente ao crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21.º do DL nº 15/93 é de 4 anos a 12 anos de prisão. A aplicação das penas visa a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade (art. 40º, nº 1, do CP). A determinação da medida da pena, dentro dos limites da lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, sendo que em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa (arts. 71º, nº 1 e 40º, nº 2, do CP), vista enquanto juízo de censura que lhe é dirigido em virtude do desvalor da ação praticada (arts. 40º e 71º, ambos do Código Penal). E, na determinação concreta da medida da pena, como impõe o art. 71º, nº 2, do Código Penal, o tribunal tem de atender a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depõem a favor do agente ou contra ele, designadamente as que a título exemplificativo estão enumeradas naquele preceito, bem como as exigências de prevenção que no caso se façam sentir, incluindo-se tanto exigências de prevenção geral como de prevenção especial. A primeira dirige-se ao restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada pelo crime, que corresponde ao indispensável para a estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada. A segunda visa a reintegração do arguido na sociedade (prevenção especial positiva) e evitar a prática de novos crimes (prevenção especial negativa) e por isso impõe-se a consideração da conduta e da personalidade do agente. Conforme salienta o Prof. Figueiredo Dias[6], a propósito do critério da prevenção geral positiva, «A necessidade de tutela dos bens jurídicos – cuja medida ótima, relembre-se, não tem de coincidir sempre com a medida culpa – não é dada como um ponto exato da pena, mas como uma espécie de «moldura de prevenção»; a moldura cujo máximo é constituído pelo ponto mais alto consentido pela culpa do caso e cujo mínimo resulta do «quantum» da pena imprescindível, também no caso concreto, à tutela dos bens jurídicos e das expectativas comunitárias. É esta medida mínima da moldura de prevenção que merece o nome de defesa do ordenamento jurídico. Uma tal medida em nada pode ser influenciada por considerações, seja de culpa, seja de prevenção especial. Decisivo só pode ser o quantum da pena indispensável para se não ponham irremediavelmente em causa a crença da comunidade na validade de uma norma e, por essa via, os sentimentos de confiança e de segurança dos cidadãos nas instituições jurídico-penais». E, relativamente ao critério da prevenção especial, escreve o ilustre mestre, «Dentro da «moldura de prevenção acabada de referir atuam irrestritamente as finalidades de prevenção especial. Isto significa que devem aqui ser valorados todos os fatores de medida da pena relevantes para qualquer uma das funções que o pensamento da prevenção especial realiza, seja a função primordial de socialização, seja qualquer uma das funções subordinadas de advertência individual ou de segurança ou inocuização. (...). A medida das necessidades de socialização do agente é pois em princípio, o critério decisivo das exigências de prevenção especial para efeito de medida da pena». Considerando os critérios norteadores a que aludem os arts. 71º, nºs 1 e 2, e 40º, nº 1 e 2, do Código Penal, ponderando as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime depõem contra o arguido temos: - o grau de ilicitude dos factos, é elevado, atendendo à quantidade e à natureza e dos produtos estupefacientes, que detinha em seu poder, num total de 344 doses de cocaína e 20 doses de heroína, ao lapso de tempo e à intensidade com que desenvolveu a atividade de tráfico e às quantias monetárias encontradas na sua posse. A intensidade do dolo – na sua forma mais elevada de dolo direto e intenso. - a gravidade das consequências da conduta do arguido – de grande danosidade para a saúde pública e da tranquilidade e segurança da comunidade, e com tão nefastas consequências para os consumidores e a sociedade. A culpa do arguido, enquanto reflexo da ilicitude, ou seja, como censura por o arguido ter atuado como descrito, é elevada - tendo em atenção a conduta concreta do arguido que ficou descrita na factualidade apurada, não podia desconhecer a gravidade das consequências dos atos por si praticados, considerando que o tráfico de estupefacientes constitui um flagelo da sociedade, com consequências muito nefastas para a saúde pública. Relativamente ao seu percurso de vida e às suas condições pessoais, e a sua conduta anterior e posterior aos factos – milita a seu favor o facto de não ter antecedentes criminais, a circunstância de ter hábitos de trabalho e apresenta um bom comportamento em meio prisional. No que se refere à proteção de bens jurídicos, que constitui uma das finalidades das penas (art. 40º, nº 1, do CP), no caso o bem jurídico protegido no crime de tráfico de estupefacientes é a saúde pública, sendo as necessidades de prevenção muito elevadas, atendendo que este crime é de grande danosidade social, indutor da prática de outros crimes, e por isso contribui para a degradação da sociedade e quanto ao crime de detenção de arma proibida é a segurança e tranquilidade públicas. No que se refere à reintegração do agente na sociedade (art. 40º, nº 1, do CP), prevenção especial, devem aqui ser valorados todos os fatores da medida da pena relevantes para qualquer uma das funções que o pensamento da prevenção especial realiza, seja a função primordial de socialização, seja qualquer uma das funções subordinadas de advertência individual ou de segurança ou inocuização. As exigências de prevenção especial – são elevadas, não obstante não ter antecedentes criminais, a natureza dos produtos estupefacientes transacionados, e os que tinha em seu poder, bem como o lapso temporal, em que desenvolveu a sua atividade, não obstante ter família constituída, não impediu o arguido de entrar no mundo do tráfico de estupefacientes, e assim obter “dinheiro fácil”, pondo em causa um bem jurídico fundamental – a saúde pública. Na determinação da medida da pena o modelo mais equilibrado é aquele que comete à culpa a função de determinar o limite máximo e inultrapassável da pena; à prevenção geral (de integração positiva das normas e valores) a função de fornecer uma moldura de prevenção, cujo limite máximo é dado pela medida ótima da tutela dos bens jurídicos, dentro do que é consentido pela culpa, e cujo limite mínimo é fornecido pelas exigências irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico; e à prevenção especial a função de encontrar o quantum exato da pena, dentro da referida moldura de prevenção, que melhor sirva as exigências de socialização do agente[7]. Por outro lado, um dos princípios fundamentais rege a aplicação das penas tal como é definida pelo art. 40º, do Código Penal, é o princípio da proporcionalidade «A aplicação de penas e de medidas de segurança visa a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade». O AC do STJ de 20FEV19, processo nº 5/16.0GABJA.E1.S1, Relator Nuno Gonçalves [8] a propósito do princípio da proporcionalidade refere o seguinte: «O princípio da proporcionalidade e a proibição do excesso são princípios com assento na Constituição da República – art. 18º n.º 2. “O princípio da proporcionalidade (também chamado princípio da proibição do excesso) desdobra-se em três subprincípios: (a) princípio da adequação (também designado princípio da idoneidade), isto é, as medidas restritivas legalmente previstas devem revelar-se meio adequado para a prossecução dos fins visados pela lei (salvaguarda de outros direitos ou bens constitucionalmente protegidos); (b) princípio da exigibilidade (também chamado princípio da necessidade ou da indispensabilidade), ou seja, as medidas restritivas previstas na lei devem revelar-se necessárias /ornarem-se exigíveis), porque os fins visados pela lei não podiam ser obtidos por outros meios menos onerosos para os direitos, liberdades e garantias; (c) princípio da proporcionalidade em sentido restrito, que significa que os meios legais restritivos e os fins obtidos devem situar-se em «justa medida», impedindo a adopção de medidas legais restritivas desproporcionadas, excessivas em relação aos fins obtidos”.[9] Princípios que têm essencialmente uma dimensão objectiva, impondo-se ao legislador, balizando a sua margem de discricionariedade na conformação de restrições aos direitos fundamentais. O Código Penal, compilação nuclear das restrições mais compressivas do direito à liberdade pessoal, tem também e necessariamente, sobretudo a partir da reforma de 1995, como princípios retores a necessidade, a proporcionalidade e a adequação da pena aplicada à violação de bens jurídico-criminalmente tutelados. Compete ao legislador escolher os bens jurídicos que entende serem dignos de tutela penal, também a pena abstractamente aplicável com que pode ser sancionada a sua violação, e bem assim a moldura penal do concurso de crimes. Nesta dimensão, a proporcionalidade é, em princípio, uma questão de política criminal. Aos tribunais comuns corresponde, no quadro constitucional, a aplicação da lei penal aos factos concretos. Entendendo um tribunal que a pena cominada pelo legislador para um determinado tipo de crime ofende os princípios da necessidade, da proporcionalidade ou da adequação, pode (deve) julga-la inconstitucional, mas a decisão final e vinculativa sempre caberá ao Tribunal Constitucional. É também ao legislador que compete escolher as finalidades das penas e os critérios da sua quantificação concreta. Critérios de construção da medida da pena que devem ser interpretados e aplicados em correspondência com o programa politico-criminal assumido sobre as finalidades da punição». Assim sendo, considerando que a medida da concreta da pena, assenta na «moldura de prevenção», «cujo limite máximo é constituído pelo ponto ideal da proteção dos bens jurídicos e o limite mínimo aquele que ainda é compatível com essa mesma proteção, que a pena não pode, contudo, exceder a medida da culpa, e que dentro da moldura da prevenção geral são as necessidades de prevenção especial que determinam o quantum da pena a aplicar», dentro da moldura penal abstrata prevista para o crime de tráfico de estupefacientes, p. e p., pelo art. 21º, do DL 15/93, de 22JAN, ponderando todas as circunstâncias acima referidas, de harmonia com os critérios de proporcionalidade e proibição do excesso, mostra-se justa, necessária, adequada e proporcional, a pena de 6 (seis) anos de prisão aplicada ao arguido AA, no acórdão recorrido. Pelo exposto, mostra-se prejudicado conhecimento da questão sobre a aplicação da suspensão da execução da pena, uma vez que a pena aplicada é superior a 5 anos de prisão, (artº 50.º, n.º 1, do CP). Neste sentido improcede na totalidade o recurso. *** B – RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO 3.2. O objeto do recurso do Ministério Público prende-se com a seguinte questão: - A suspensão da execução da pena, aplicada ao arguido DD ... . Insurge-se o recorrente quanto à circunstância do Tribunal “a quo” ter suspendido a execução da pena de 3 anos de prisão, por igual período, aplicada ao arguido DD, pela prática de um crime de tráfico de menor gravidade p. e p., pelo art. previsto e punido nos artigos 21.º, nº 1 e 25.° alínea a), ambos do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro, com referência às tabelas I-A e I-B anexas àquele diploma legal, nos termos do art. 50º, do Código Penal, porquanto no seu entender, não se verificam os pressupostos de ordem substantiva a que alude o citado preceito, considerando a matéria de facto dada como provada. Vejamos: O Tribunal “a quo” fundamentou da seguinte forma a suspensão da execução da pena aplicada ao arguido DD: «F. Da Suspensão De acordo com o artigo 50º do Código Penal, a execução de pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos deverá ser suspensa sempre que, atendendo à personalidade do agente, às suas condições de vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, for de concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. Significa isto que nos casos em que seja possível ao julgador formular um juízo de prognose favorável, através de considerações de prevenção especial acerca da possibilidade de ressocialização, deverá suspender a execução da pena. Nos termos do disposto do mesmo artigo, para aferir da capacidade do agente manter uma conduta conforme o direito, é necessário fazer, em concreto, uma análise da personalidade do Arguido DD, das suas condições de vida, da conduta que manteve antes e depois dos factos e das circunstâncias em que os praticou. Se dessa análise resultar que é possível esperar que a mera ameaça da pena de prisão e a censura do facto são idóneos a permitir a formulação de um juízo de confiança na sua capacidade para não cometer novos crimes, deverá ser decretada a suspensão da execução das penas. É ainda de ponderar que a execução de uma pena de prisão de curta duração seria de todo desvantajosa para a socialização do Arguido DD. Contudo, no caso em apreço e tratando-se do crime de Tráfico, «as necessidades de prevenção geral positiva (ou de integração e reforço da consciência jurídica comunitária e do seu sentimento de confiança no direito) são elevadas, atendendo a que o tráfico, assim como o consumo de droga, constituem, reconhecidamente, a principal causa do crescimento da criminalidade e da insegurança na sociedade portuguesa. Na verdade, "os crimes contra o património, cometidos com ou sem violência, sobretudo nos grandes centros urbanos, apresentam como móbil principal o financiamento do consumo. Assim se explica, aliás, uma tendência para a diversificação da criminalidade, que engloba, nomeadamente, o roubo com seringa, o furto de auto-rádio e o abuso de cartões de crédito", como defende Rui Carlos Pereira ("O consumo e o tráfico de droga na lei penal portuguesa", in Revista do Ministério Público, n.° 65, também acessível na Internet em www.smmp.pt/consu.htm). Para já não falar nos danos à saúde pública a que tais práticas conduzem. No entanto, considerar-se-ão as condições de vida do Arguido DD apuradas nos autos, a circunstância de ainda ser jovem e a ausência de antecedentes criminais. É, desta forma, possível esperar que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizem de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. Pelo exposto, ao abrigo do disposto no artigo 50º do Código Penal, determina-se a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao Arguido DD, pelo período de 3 (três) anos. Retomando a matéria de facto provada relativamente ao arguido DD: «11. No dia ... de Janeiro de 2018, pelas 11h53m, o Arguido DD, (doravante DD) também conhecido pelas alcunhas «DD.», «DD..» e «DD...», dirigiu-se para o interior de uma zona arborizada, localizada na Rua ..........., em ......, local este onde o mesmo se abaixou e escondeu por debaixo de uma pedra ali existente o seguinte: • Uma saqueta contendo cocaína (cloridrato), com o peso líquido de 9,68ogramas (um grau de pureza de 75,7%, susceptível de originar 36 doses); e, • Uma balança de precisão da marca e modelo «….. ». 12. A referida cocaína era destinada pelo Arguido DD à cedência, a troco de dinheiro, a indivíduos consumidores daquela substância que o contactavam predominantemente através de contactos telefónicos, sendo certo também, que os encontros entre aquele e estes ocorreram em vários locais do concelho de ... . 13. De entre os indivíduos que adquiriram cocaína e/ou heroína ao Arguido DD, nas circunstâncias mencionadas no artigo antecedente, contam-se os seguintes: JJ: no mês de Maio de 2019, o Arguido DD vendeu a JJ, pelo menos uma vez, heroína, o qual, pagou por esta a quantia de €25,00 por uma saqueta contendo cerca de um grama daquela substância. MM: que adquiriu ao Arguido DD, no período temporal compreendido entre data não concretamente apurada do ano de 2018 e .. de Maio de 2019, em pelo menos três ocasiões distintas, cocaína cozida, pagando em cada uma dessas vezes a quantia de €25,00 ou €30,00 por uma saqueta contendo cerca de meio grama daquela substância. Uma das referidas ocasiões, foi no dia 7 de Maio de 2019, pelas 23h53m, na Rua do ...., em ...., local este onde o Arguido DD se encontrou com MM e entregou a este uma saqueta contendo cocaína e recebeu em troca a quantia de €25,00 ou € 30,00. 14. O Arguido DD, para além do acima indicado, efectuou também as seguintes vendas de cocaína e/ou heroína: 14.1. No dia ... de Novembro de 2018, pelas 15h36m, na Rua ....., em ......, o Arguido DD encontrou-se com NN, também conhecido por "NN.", e entregou a este uma saqueta contendo cocaína ou heroína, recebendo em troca quantia monetária não concretamente apurada. 14.2. No dia ... de Maio de 2019, pelas 18h59m, na estrada que liga a localidade de .... à localidade de ...., em ...., o Arguido DD encontrou-se com um indivíduo do sexo masculino cuja identidade se desconhece e entregou a este uma saqueta contendo cocaína ou heroína, recebendo em troca quantia monetária não concretamente apurada. 15. No dia ... de Julho de 2019, pelas 10h30m o Arguido DD, tinha em sua posse, no interior da sua residência, localizada na Rua ...., edifício ...., apartamento 001, em ...., o seguinte: Na Sala: • Dois telemóveis, sendo um de marca "……." e o outro de marca "…..." (que estavam em cima do sofá); • Duas notas de €5,00 euros, que estavam dentro de umas calças de fato de treino; • A quantia monetária de €265,00 euros, que se encontrava em cima da mesa da sala; • 11 carteiras de pó da marca "REDRATE". No Quarto de dormir: A quantia de €1.140,00 euros, composta por diversas notas de €50,00, €20,00, €10,00 e €5,00 que se encontrava acondicionada numa bolsa dentro da gaveta da mesa de cabeceira). 16. O telemóvel da marca "……" que o Arguido DD tinha em sua posse nas circunstâncias supra descritas, era destinado por aquele para receber e efectuar contactos telefónicos com vista a concretizar as transacções de venda de cocaína e heroína a que se dedicava. 17. O Arguido DD agiu de forma livre, deliberada e consciente, conhecendo muito bem a natureza estupefaciente da cocaína e da heroína que tinha em sua posse e daquela que revendeu a terceiros. 18. Mais sabia que não tinha autorização para deter, vender, ceder e transportar cocaína e heroína e, bem assim, estava perfeitamente ciente que a sua conduta era proibida e punida por lei. (..) 29. Tal como na altura da ocorrência dos factos agora em fase de julgamento (2018/2019), DD encontra-se no presente a residir com a companheira, OO, 24 anos, e a filha de ambos de apenas 1 ano, num apartamento Ti arrendado desde 2018 na .... . O Arguido paga 300€ de renda de casa a que acrescem as habituais despesas fixas mensais, sendo o quadro económico familiar relativamente equilibrado. 30. DD foi contratado há cerca de 9 meses como ……. no Parque ...., auferindo um salário de 850€, embora atualmente esteja em regime de layoff, em casa, a tomar conta da filha. O Arguido é pai de uma outra menor (PP, 5 anos) que mora em Lisboa com uma sua ex-companheira. A actual companheira é…, na .... e está a trabalhar, tendo uma remuneração mensal de 650€ 31. Natural ....., DD é filho único da relação dos progenitores, que se separaram ainda antes do seu nascimento, embora tenha mais irmãos, filhos de outras relações de ambos os pais. A mãe cedo migrou para ……, pelo que o Arguido foi criado numa aldeia rural junto da família da avó materna e fez todo o seu percurso escolar na terra natal completando o 9º ano de escolaridade aos 16 anos, ocupando-se posteriormente em tarefas agrícolas junto de familiares. 32. DD viajou para Portugal no final de 2012 para estudar no âmbito do acordo de cooperação escolar com ...., mas acabou por não concluir um curso na área da electricidade que começou a tirar em .......... Após esta desistência, esteve cerca de 1 ano em …… (2013) a residir com a mãe e um irmão (QQ), tendo-se ocupado em … enquanto houve trabalho nesse país, mas acabou por regressar devido ao desemprego. 33. Viveu e trabalhou durante cerca de 3 anos em ...... no sector …, onde conheceu a mãe da sua filha mais velha, mas em 2016 optou por procurar emprego na região ...., fixando-se no concelho .... . Trabalhou em .......e como .......antes de, em 2019, ter conseguido o actual emprego no Parque ……... 34. No plano afectivo, DD mantêm desde há mais de 4 anos uma união de facto estável com OO, não tendo familiares directos ... . Refere ainda assim uma ligação preferencial com a progenitora através de contactos telefónicos para ...., bem com os irmãos e o pai, este último a residir em ... . 35. DD não tem problemas de saúde e apresenta a sua situação enquanto cidadão estrangeiro regularizada junto do SEF. Apesar de ter uma personalidade extrovertida, segundo a sua companheira, este processo trouxe algumas alterações na sua conduta social e agora passa muito mais tempo em casa. 36. O telemóvel da marca …….. apreendido aquando das buscas domiciliárias foi adquirido pela companheira do Arguido DD. 37. A quantia de € 500,00 que se encontrava numa bolsa sobre a mesinha de cabeceira do quarto onde viviam e que se encontra apreendida nos autos foi enviada de ……, no dia … .06.2019, pelo irmão do Arguido, RR, residente em .... , como prenda para a sobrinha, filha do Arguido. 38. Do seu Certificado de Registo Criminal nada consta. De harmonia com o nº 1, do art. 50º do Código Penal, «O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição». A suspensão da execução da pena de prisão depende da verificação cumulativa de dois pressupostos: um formal, outro material. O primeiro, exige que a pena aplicada não exceda cinco anos. O pressuposto material consiste num juízo de prognose segundo o qual o tribunal, atendendo à personalidade do agente e às circunstâncias do caso, conclui que a simples censura do facto e a ameaça da prisão bastarão para afastar o delinquente da criminalidade, satisfazendo as exigências mínimas da prevenção geral. O instituto da suspensão da execução da pena como uma autêntica medida penal, suscetível de servir tão bem (ou tão eficazmente), quanto a efetividade das sanções, aos desideratos da prevenção geral positiva, com a acrescida vantagem de, do mesmo passo, satisfazer aos da prevenção especial. Com efeito, a suspensão da execução da pena, como pena de substituição, em sentido próprio, na medida em que se trata de uma pena não detentiva, do ponto de vista dogmático pressupõe a prévia determinação de uma pena de prisão, e tem como subjacente o mesmo desiderato de política criminal, os esforços empreendidos para substituir as penas curtas de prisão (contínua). Ou seja, o critério subjacente à aplicação das penas substituição, tem como pressuposto teleológico que as penas curtas de prisão, nunca sejam executadas, salvo se tal for imposto por exigências de prevenção, e por outro lado que em concreto se mostre mais adequada à realização das exigências de prevenção, tendo em atenção o critério geral das finalidades das penas consagradas no art. 40º, do CP, a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, sendo que, em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa. No caso subjudice, as exigências de prevenção geral, tal como se afirma no acórdão recorrido, «tratando-se do crime de Tráfico, as necessidades de prevenção geral positiva (ou de integração e reforço da consciência jurídica comunitária e do seu sentimento de confiança no direito) são elevadas, atendendo a que o tráfico, assim como o consumo de droga, constituem, reconhecidamente, a principal causa do crescimento da criminalidade e da insegurança na sociedade portuguesa. Na verdade, "os crimes contra o património, cometidos com ou sem violência, sobretudo nos grandes centros urbanos, apresentam como móbil principal o financiamento do consumo. Assim se explica, aliás, uma tendência para a diversificação da criminalidade, que engloba, nomeadamente, o roubo com seringa, o furto de auto-rádio e o abuso de cartões de crédito", como defende Rui Carlos Pereira ("O consumo e o tráfico de droga na lei penal portuguesa", in Revista do Ministério Público, n.° 65, também acessível na Internet em www.smmp.pt/consu.htm). Para já não falar nos danos à saúde pública a que tais práticas conduzem». Por outro lado, é certo que o arguido, nascido a … de agosto de 1993 contava à data dos factos, 25 anos de idade, não tem antecedentes criminais, revela hábitos de trabalho e está inserido familiarmente, o que não o impediu de entrar no mundo do tráfico de estupefacientes, obtendo um lucro fácil, como se afirma no acórdão recorrido. Contudo, o arguido não confessou, não se autocensurou, nem contribui de modo nenhum para que pudesse identificar-se e deter os fornecedores ou outros traficantes da mesma linha de tráfico. Com efeito, analisando a conduta do arguido, tal como bem salienta o Magistrado do Ministério Público nas conclusões de recurso, verifica-se que da matéria de facto provada resulta que, «em 22 janeiro de 2018, o arguido DD foi visto, por mero acaso, a esconder 36 doses de cocaína e uma balança de precisão numa zona arborizada, sita em ....... Os actos de vendas de produto estupefaciente durante o ano de 2018 - sendo que em Janeiro de 2018 já vendia cocaína -, e que o fez até Maio de 2019, período dilatado no tempo. No dia … de julho de 2019, no interior da sua residência tinha carteiras de pó de marca “redrate”, para misturar com a cocaína, dois telemóveis, para estabelecer os contactos com os compradores e quantias monetárias provenientes da venda de cocaína e heroína. O arguido ....., quanto à qualidade do produto estupefaciente, procedia à venda de cocaína e heroína, drogas ultra duras e duras, atento 24 de 26 o seu elevado grau de danosidade, e, relativamente à cocaína, vendia cocaína cozida (“crack”), tipo de cocaína mais viciante. Em audiência de discussão e julgamento, o arguido não prestou declarações, não mostrando o mínimo arrependimento pela sua conduta altamente censurável, não ignorando que ao desenvolver tal actividade ilícita está a contribuir decisivamente para a miséria, perda de liberdade individual de terceiros consumidores, a estabilidade e coesão familiar, além dos efeitos criminógenos associados. O dolo do arguido foi directo e intenso e o motivo da prática do crime foi o lucro, revelando-se uma actividade que se traduzia em obter dinheiro de forma fácil, sendo certo que tinha rendimentos próprios e não precisava de transacionar produto estupefaciente para assegurar a sua subsistência e da sua família. O arguido não era um “dealer” de rua, que vendia para subsistir ou para prover ao seu próprio consumo, actuando, por vezes, nos mesmos locais que AA, disseminando por terceiros consumidores cocaína e heroína, drogas de elevado espectro de danosidade, pelo grau e intensidade da adição que provocam nos consumidores, agindo não a descoberto mas de forma dissimulada, sem demonstrar qualquer arrependimento ou preocupação que a venda de tais produtos provoca aos consumidores. Do exposto se conclui, que no caso, não é possível formular um juízo de prognose favorável ao arguido, no sentido de que o mesmo não voltará a praticar atividade de tráfico, mas ao invés existe uma forte probabilidade de o arguido continuar a praticar o crime de tráfico de estupefacientes (tem os conhecimentos necessários para preparar os produtos que distribui e vende, conhece os consumidores, e tem a motivação para o continuar a fazer) para daí obter proventos fáceis e significativos a que já se habituou e que de outro modo não obteria). Atenta a postura que o arguido assume perante os factos, à ausência de atividade laboral regular e significativa, à natureza e gravidade do ilícito e as circunstâncias em que é cometido, temos “razões sérias para duvidar da capacidade do agente de não repetir crimes”. Assim sendo, e uma vez que a suspensão da execução pena visa essencialmente prevenir a reincidência e há-de realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, no caso subjudice tal desiderato não se mostra acautelado, quer pelas das fortes exigências de prevenção geral neste tipo de crime, quer pelas exigências de prevenção especial, atentas as circunstâncias constantes dos factos dados como provados no acórdão recorrido, o arguido DD não pode beneficiar da suspensão da execução da pena. Pelo exposto, revoga-se o acórdão recorrido, nesta parte, e em consequência condena-se o Arguido DD, pela prática, na forma consumada, em autoria material, de um crime de Tráfico de Menor Gravidade, previsto e punido pelos artigos 21°, n° 1 e 25º, al. a) do Decreto-Lei n° 15/93, de 22 de janeiro com referência às Tabelas I-A e I-B ao mesmo anexas, na pena de 3 (três) anos de prisão efetiva. Neste sentido procede o recurso do Ministério Público. *** 4. DECISÃO. Termos em que acordam os Juízes que compõem a 3ª Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em: a) Negar provimento ao recurso do arguido AA. b) Julgar procedente o recurso do MINISTÉRIO PÚBLICO, e, em consequência, revoga-se o acórdão recorrido, no seguintes termos: Condena-se o Arguido DD, pela prática, na forma consumada, em autoria material, de um crime de Tráfico de Menor Gravidade, previsto e punido pelos artigos 21°, n° 1 e 25º, al. a) do Decreto-Lei n° 15/93, de 22 de Janeiro com referência às Tabelas I-A e I-B ao mesmo anexas, na pena de 3 (três) anos de prisão efetiva. Mantém-se quanto ao mais o acórdão recorrido. Custas pelo recorrente AA fixando a taxa de justiça em 5 (cinco) Uc’s. Processado em computador e revisto pela relatora (art. 94º, nº 2, do CPP). *** Lisboa, 17 de janeiro de 2021 Maria da Conceição Simão Gomes (relatora) Nuno Gonçalves ________ [1] Processo redistribuído à relatora em 18DEZ20 |