Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
682/18.7T8PVZ.P1.S1
Nº Convencional: 7.ª SECÇÃO
Relator: FÁTIMA GOMES
Descritores: INTERVENÇÃO PRINCIPAL
INTERVENÇÃO PROVOCADA
LEGITIMIDADE ATIVA
LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO
LEGITIMIDADE PARA RECORRER
PARTE VENCIDA
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
REAPRECIAÇÃO DA PROVA
PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA
QUESTÃO NOVA
OBJECTO DO RECURSO
Data do Acordão: 01/19/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Sumário :
I. Ocorrendo intervenção principal provocada pelo lado ativo – isto é para intervir como autor, com vista a suprir a preterição do litisconsórcio necessário activo – não pode o interveniente recorrer da decisão que foi favorável ao autor.
II. O Supremo Tribunal de Justiça apenas conhece de direito e não julga de facto, a não ser em situações excepcionais, conforme impõe o art. 46.º da Lei n.º 62/2013, de 26-8 (“Fora dos casos previstos na lei, o Supremo Tribunal de Justiça apenas conhece da matéria de direito”). Por isso, a intervenção do Supremo Tribunal de Justiça está limitada aos casos previstos no art. 674, n.º 3, (2.ª parte) e 682.º, n.º 3, CPC, ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova (isto é, violação das regras direito probatório material), reenvio do processo para ampliação dos factos (devido ao vício da insuficiência) ou contradições na decisão da matéria de facto que inviabilizem a decisão jurídica.
III. O Supremo Tribunal de Justiça não pode interferir no juízo que a Relação faz com base na reapreciação dos meios de prova sujeitos ao princípio da livre apreciação, como os depoimentos testemunhais, documentos sem força probatória plena ou uso de presunções judiciais.
IV. Os recursos visam a reanálise de decisões adoptadas à luz da situação trazida pelas partes – ou de conhecimento oficioso – no momento em que foram proferidas, de acordo com a livre disponibilidade da defesa e o princípio da concentração da defesa na contestação. Não sendo este o caso, não pode a questão ser objecto do recurso, não tendo o tribunal - nem podendo – dela conhecer.
Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça



I. Relatório

1. Em 18 de abril de 2018, com o benefício de apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo, AA instaurou ação declarativa sob forma comum contra BB e requereu a intervenção principal do lado ativo de CC pedindo a final que a ré seja condenada a transmitir para a autora e seu marido a fração correspondente a uma habitação sita no 2º andar direito traseiras, então inscrita na matriz predial de ... sob o artigo ...53 (atualmente inscrita na matriz predial da União das freguesias ... e ... sob o artigo ...31) e descrita na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...02... e registada a seu favor.

Para fundamentar as suas pretensões a autora alegou, em síntese, que em meados de 2002, início de 2003, a autora e o então namorado, agora seu marido, decidiram adquirir casa tendo em vista o casamento de ambos; para o efeito, após procura em várias localidades perto do Porto, adquiriram, em regime de compropriedade, uma fração no ..., tendo recorrido ao crédito bancário; tendo em conta as possibilidades financeiras do casal, a instituição bancária apenas lhes concedeu crédito quando os pais do seu marido se aprestaram a ser fiadores, o que aconteceu; após o casamento, o casal constituído pela autora e seu marido fixaram a sua residência na dita fração onde permaneceram até meados de 2009; nessa altura, após o nascimento da filha de ambos, DD, o casal constituído pela autora e seu marido CC decidiram adquirir casa em ..., tendo, para o efeito encetado procura para a mesma; quando finalmente encontraram o que procuravam, apartamento em ... tipologia T2, o seu marido, em 27 de junho de 2009, celebrou contrato-promessa de compra e venda com a proprietária da fração que pretendiam adquirir, EE, pelo preço de € 125.000,00 tendo entregue, a título de sinal, a quantia de € 5.000,00; na mesma data, tendo em conta a futura aquisição da fração, decidiram arrendar a fração do ..., e combinaram entre si que tal quantia seria destinada a liquidar o empréstimo da fração que iam adquirir em ...; o que aconteceu, pelo que em agosto de 2009 arrendaram a fração supra mencionada pelo valor de € 450,00 e foram habitar para casa dos pais da autora, com a filha menor de ambos, até à conclusão dos procedimentos necessários à aquisição da fração de ...; encetados os procedimentos bancários destinados à concessão de crédito para aquisição da fração de que já tinham celebrado contrato-promessa e entregue o sinal, o casal, constituído pela autora e o seu marido, foi confrontado com a necessidade de encontrar fiadores para garantia do contrato de mútuo, tendo para o efeito solicitado aos pais do cônjuge marido que interviessem na concessão do crédito hipotecário como seus fiadores, o que foi por eles recusado; face à recusa destes e por sugestão de uma amiga bancária do cônjuge marido, o casal solicitou à ré, irmã do marido da autora, que interviesse na qualidade de adquirente na aquisição da fração prometida comprar, já que tinha condições de crédito muito boas, ficando a autora e o seu marido fiadores do crédito; foi assegurado à ré, que o casal assumiria, na íntegra, todas as despesas com a aquisição da fração bem como o pagamento do empréstimo contraído, condomínio, IMT, etc., o que efetivamente aconteceu; por seu turno, a ré obrigou-se a transmitir a propriedade da fração para o casal constituído pela autora e seu marido, logo que para tanto fosse interpelada; assim, em 16 de outubro de 2009, no posto de atendimento da ... Conservatória do Registo Predial ..., foi celebrada a compra e venda da fração autónoma “HA” correspondente a uma habitação sita no 2º andar direito traseiras, então inscrita na matriz predial de ... sob o artigo ...53 (atualmente inscrita na matriz predial da União das freguesias ... e ... sob o artigo ...31) e descrita na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...02... e na qual figura como compradora a ré e a autora e o seu marido como fiadores; desde janeiro de 2010 até dezembro de 2016, a autora e seu marido e a filha menor de ambos e, posteriormente e desde janeiro de 2017, a autora e a filha, mantêm na fração, em que a ré figura como compradora, o centro da sua atividade familiar social e económica, de forma ininterrupta, ali comendo e confecionando a alimentação, recebendo familiares e amigos, bem como toda a correspondência; desde aquela data que pagam os consumos de água, gás e eletricidade, prestação de condomínio, IMI e taxas de conservação e esgotos e, ainda, a prestação bancária devida pelo empréstimo hipotecário e tudo quanto se mostra necessário à sua manutenção; dela dispondo à vista de toda a gente e com conhecimento de todos quantos nisso tivessem interesse, sem malícia e sem perturbação ou oposição de alguém, decidindo dela sem interferência de outrem e sobre ela intervindo sem pedir licença a ninguém, como donos e efetivos proprietários que sempre foram; e quando a autora desabafava com o seu marido que qualquer dia a irmã poderia exigir a fração, este logo lhe respondia que não era bem assim, já que tinha como provar que era ele que pagava tudo; e, efetivamente, assim aconteceu, pelo menos até recentemente, nomeadamente após a separação entre a autora e o seu marido ocorrida em julho de 2016; desde então, a ré conluiada e a pedido do marido da autora, que pretendia manter-se na casa de morada de família, mas sem esta e a filha de ambos, passou a enviar cartas solicitando a entrega da fração, ao que a autora nunca acedeu.

2. Citada, a ré contestou comprovando ter-lhe sido concedido apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo, impugnou a maior parte dos factos alegados pela autora, negando que tenha celebrado a compra do imóvel ocupado pela autora na qualidade de mandatária sem representação da autora e do marido desta, tendo ao invés acedido à proposta de seu irmão, marido da autora, que face à impossibilidade financeira de consumar a aquisição da fração autónoma, a convenceu a adquiri-la para si, o que aceitou, acordando que cederia temporariamente a seu irmão CC a assinalada fração habitacional, para que este, juntamente com mulher e filha menor, a utilizasse, a troco de uma verba mensal correspondente ao montante da prestação crédito bancário concedido pela Caixa Geral de Depósitos à ré (ascendendo à data a € 239.06) e do não reembolso a este do montante por ele pago à anterior proprietária a título de sinal (€ 5.000,00) e sem prejuízo de correrem por exclusiva responsabilidade de seu irmão o pagamento das despesas de condomínio, à época cerca de € 60,00 mensais, e, bem assim, consumos de água e luz; deduziu reconvenção pedindo que na eventualidade de procedência da ação, deve a autora ser condenada a reembolsar a ré de todas as despesas que haja feito no cumprimento do alegado mandato e na hipótese de improcedência da ação pediu a condenação da autora ao pagamento da quantia de € 12.582,25 pela ocupação sem título da fração autónoma de que é dona, pedindo ainda a condenação da autora como litigante de má-fé em multa exemplar e em condigna e exemplar indemnização a seu favor.

3. A autora não contestou a reconvenção.

4. Admitiu-se a intervenção principal do lado ativo (despacho de 9.7.2018), solicitada pela A. na sua PI,  de CC que citado ofereceu articulado corroborando, no essencial, a contestação da ré e pugnando pela total improcedência da acção, comprovando ter requerido apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo, tendo o Instituto de Solidariedade e Segurança Social., I.P. comunicado a juízo a concessão do interveniente do benefício de apoio judiciário por ele requerido.

5. Realizou-se uma infrutífera tentativa de conciliação, sendo a instância suspensa por acordo das partes pelo prazo de trinta dias.

6. Proferiu-se despacho a admitir a reconvenção e fixou-se o valor da causa no montante de € 142.772,25.

7. Proferiu-se despacho saneador tabelar, identificou-se o objeto do litígio, enunciaram-se os temas da prova, conheceu-se dos requerimentos probatórios das partes e designaram-se datas para realização da audiência final.

8. A audiência final realizou-se em três sessões e em 26 de novembro de 2021 foi proferida sentença que terminou com o seguinte dispositivo:

Pelo exposto, decide-se:

III. a) Julgar a ação improcedente;

III. b) Julgar a reconvenção parcialmente procedente, condenando-se a Autora/Reconvinda a pagar à Ré/Reconvinte a quantia de 11.500,00, acrescida da quantia mensal de 650,00, a contar de junho de 2018 até à entrega da fração autónoma HA devoluta de pessoas e bens;

III. c) Absolver a Autora/Reconvinda do demais que foi peticionado pela Ré/Reconvinte.

Condena-se a Autora a pagar as custas da ação e condenam-se a Autora/Reconvinda e a Ré/Reconvinte a pagar as custas da reconvenção na proporção do respetivo decaimento (art. 527.º do Código de Processo Civil), sem prejuízo para o apoio judiciário que lhes foi concedido.

Registe e notifique.


9. Em 26 de Janeiro de 2022, inconformada com a sentença AA interpôs recurso de apelação.

10. O Tribunal da Relação conheceu do recurso, alterou a matéria de facto e decidiu:

Pelo exposto, os juízes subscritores deste acórdão, da ... secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto acordam em julgar procedente o recurso de apelação interposto por AA e, em consequência, em alterar os fundamentos de factos da sentença recorrida nos termos que ficaram expostos quando se conheceu da reapreciação da decisão da matéria de facto e em revogar o seu dispositivo, condenando-se BB a transmitir para AA e CC a fração correspondente a uma habitação sita no 2º andar direito traseiras, então inscrita na matriz predial de ... sob o artigo ...53 (atualmente inscrita na matriz predial da União das freguesias ... e ... sob o artigo ...31) e descrita na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...02... e registada a favor da ré; ao abrigo do disposto no nº 2 do artigo 665º do Código de Processo Civil conhece-se do pedido reconvencional dependente deduzido por BB e cujo conhecimento ficou prejudicado na sentença recorrida e, em consequência, condenam-se AA e CC a pagar a BB a quantia de cinco mil duzentos e cinquenta euros e trinta e nove cents, a título de violação das obrigações melhor descritas nos fundamentos deste acórdão que autora e interveniente do lado ativo assumiram para a com a ré.

As custas do recurso são da responsabilidade da recorrida, pois que ficou vencida, mas sem prejuízo do apoio judiciário que lhe foi concedido, sendo as custas da ação da responsabilidade da ré, pois que também ficou vencida, enquanto as custas da reconvenção são da responsabilidade da autora e do interveniente do lado ativo, de um lado e da ré, de outro lado, na exata proporção do decaimento, mas em todo o caso sem prejuízo do apoio judiciário de que todos gozam (artigo 527º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).

11. Não se conformando com o acórdão dele veio apresentado recurso de revista por BB, no qual formula as seguintes conclusões (transcrição):

“1. O douto acórdão da Relação do Porto violou e fez errada aplicação e interpretação do disposto nos arts. 33º, nº 2, 574, nº 2, do Código de Processo Civil, arts. 1181º e 1182º do Código Civil.

2. O mandato alegado na Petição Inicial é composto de dois contratos e não apenas um.

3. Aquilo que a Ré teria ficado de subscrever no interesse do casal teriam sido dois contratos distintos, a saber: a compra e venda da fracção e o mútuo com a entidade bancária para esse mesmo efeito!

4. Este segundo contrato teria sido, aliás, a verdadeira razão para a Autora e o Chamado não terem intervindo em nome próprio.

5. O cumprimento do contrato de mandato sem representação implicaria não só a transmissão da propriedade da fracção mas também a transmissão da posição contratual no contrato de mútuo celebrado com a Caixa Geral de Depósitos.

6. Só assim se respeitaria e daria cumprimento ao alegado contrato de mandato sem representação, cumprindo não só o artigo 1181º, nº 1 mas também o artigo 1182º do Código Civil!!

7. Estamos perante um caso paradigmático de união de contratos, tendo os mesmo que ser tratados como um todo uma vez que dependem reciprocamente um do outro.

8. Qualquer um dos contratos não existiria, nem teria sido celebrado, sem o outro.

9. A Caixa Geral de Depósitos deveria sempre ter sido demandada no sentido de permitir a transmissão do contrato de crédito hipotecário para a pessoa da Autora e do Chamado, ou, de serem os mandantes condenados a entregar ao mandatário os meios necessários ao cumprimento do crédito hipotecário.

10. Só assim se poderia obter o efeito útil normal da decisão dando pleno cumprimento ao mandato sem representação alegado pela Autora.

11. O facto da Caixa Geral de Depósitos não ter sido chamada à presente lide constitui, assim, uma preterição de litisconsórcio necessário passivo o que constitui um excepção dilatória que é de conhecimento oficioso.

12. Incumbiria ao juiz, nos termos do artigo 6º, nº 2 e 590º, nº 1 do CPC proferir despacho a convidar a Autora ao suprimento de um pressuposto processual susceptivel de sanação através da intervenção do terceiro (CGD).

13. A Ré deverá assim ser absolvida da instância uma vez que se mostra já ultrapassada a fase do pré-saneador onde a intervenção poderia, e deveria, ter sido suscitada.

Ainda que assim não se entenda, e sem prescindir,

14. O Acórdão recorrido considerou provados por acordo os factos 31 e 32 que o Tribunal ... havia considerado não provados.

15. O Chamado nos presentes autos, CC, marido da Autora, e interveniente de forma directa na factualidade em causa nestes dois pontos, impugnou de forma especificada estes factos nos artigos 6º e 7º do seu articulado.

16. Aliás o Chamado impugna de forma expressa estes artigos também no artigo 5º do seu articulado.

17. O facto de Autora e Chamado terem versões diferentes sobre estes factos impede que os mesmos sejam considerados admitidos por acordo, independentemente da posição assumida pela Ré na sua contestação.

18. O entendimento contrário seria impedir que o Chamado principal pudesse fazer prova da sua versão, o que, manifestamente, não pode ter sido a intenção do legislador.

19. O Acórdão da Relação, agora recorrido, violou o artigo 574º, nº 2 do Código de Processo Civil e, como tal, deverão estes factos ser considerados como não provados.

20. Em face da total ausência de prova testemunhal directa, compreensível diga-se em situações como a dos autos, lançou o Tribunal Recorrido mão da análise de um único documento - o extracto bancário da conta da Ré - todo ele cheio de abreviaturas e passível das mais diversas interpretações, para considerar provados os factos não provados pela primeira instância 33, 34 e 35.

21. O Tribunal recorrido retirou um conjunto de conclusões que não encontram respaldo em nenhuma referência do dito documento.

22. Estes factos provados são-no, não porque se demonstrou terem acontecido, mas por ser plausível que tenham acontecido... e tudo em sede de reapreciação do julgamento de 1ª instância, com um total desprezo pela imediação da apreciação da prova em 1ª instância (que ora é princípio basilar do direito processual, como no dia seguinte passa a ser uma nota de rodapé)!

23. Da análise feita pela Relação relativamente a estes factos - veja-se a análise feita relativamente ao requerimento de 26.11.2020 - resulta claramente que esta fez recair o ónus da prova dos factos em discussão sobre a Ré, violando o disposto no artº 342 nº 1 do Código Civil, de onde resultaria que a prova dos factos alegados relativamente à existência do mandato sem representação caberia exclusivamente à Autora.

24. Pelos motivos expostos, incorreu a decisão sobre matéria de facto na violação de regras de direito probatório material, devendo ser revogada nessa parte, pois que o conhecimento desta violação em nada belisca a limitação dos poderes de cognição deste Venerando Tribunal sobre a matéria de facto.

Ainda que assim não se entenda,

25. Ainda que a matéria de facto não fosse alterada, a mesma impunha uma decisão diferente que retirasse todas as consequências da existência do contrato de mandato sem representação.

26. A decisão do tribunal não dá cumprimento à totalidade do contrato de mandato que considerou provado.

27. Não deu a decisão recorrida cumprimento ao artigo 1182º do Código Civil que dispõe “O mandante deve assumir, por qualquer das formas indicadas no nº 1 do artigo 595º, as obrigações contraídas pelo mandatário em execução do mandato; se não puder fazê-lo, deve entregar ao mandatário os meios necessários para as cumprir ou reembolsá-lo do que este houver despendido nesse cumprimento.”

28. A Autora e o Chamado deveriam assumir as obrigações contraídas pela Ré para com a Caixa Geral de Depósitos no âmbito do contrato de mútuo celebrado também no seu interesse.

29. E deveriam tê-lo assumido através da assunção de dívida prevista no artigo 595º.

30. Não sendo a Caixa Geral de Depósitos na presente acção ainda assim deveriam Autora e Chamado ser condenados a entregar ao mandatário, a Ré, os meios necessários para pagar o mútuo contraído, assim dando pleno cumprimento à disciplina do mandato sem representação.”


12. Igualmente inconformado o Interveniente apresentou recurso de revista, onde formula as seguintes conclusões (transcrição):

“1. Tendo sido impugnada a matéria de facto, a Relação deve reapreciar a prova produzida por todos os Intervenientes no Processo e não, apenas, pela Autora e Ré.

2. Não tendo procedido à reapreciação da prova, designadamente a posição divergente dos factos trazidos pela A. e pelo Interveniente fê-lo em desrespeito das normas referentes aos impacto e intervenção do Chamado.

3. Mais concretamente os vertidos nos pontos: 31), CC e AA decidiram arrendar a fração do ... em 27-06-2009 e combinaram entre si que o valor da renda seria destinada a liquidar o empréstimo da fração autónoma HA. e 32) CC e AA arrendaram a fração do ... em agosto de 2009, pelo valor de € 450,00

4. O Tribunal olvidou, descurando em absoluto o contido no articulado oferecido pelo Interveniente Chamado, que no seu artigo 6º e 7º quanto à matéria atrás vertida.

5. Na verdade, o Interveniente chamado, no tocante àqueles factos ali afirmou: “É verdade que a A. e o Chamado decidiram arrendar a fração do ..., local onde fixaram a residência até meados de 2009, mas é falso que pretendesse, com isso, angariar quantia para liquidar o empréstimo que contraíram para aquisição da fração de ... onde a A. ainda vive” e “Como bem sabe a A., a fração do ... foi adquirida com recurso ao crédito bancário e, como em qualquer crédito, há a correspondente obrigação de pagamento, pelo que a renda arrecadar será destinada ao pagamento do mesmo”

6. Repare-se a matéria contida nos pontos 31 e 32) são levados à R. em versões absolutamente divergentes.

Ora, é na parte Ativa da lide que surge a discordância, a qual não poderá admitir-se por provada, apenas, com base na posição manifestada pela R.

O Tribunal recorrido, escudou-se na posição tomada pela R. para considerar confessados factos que o próprio Interveniente contraditou.

7. Assim sendo, não poderia o Tribunal da Relação, ignorar, como fez, a existência de duas versões trazidas pela A. e Interv. diferentes e discordantes e submeter, apenas, à prova por acordo, uma dessas versões.

8. Neste conspecto, o Tribunal da Relação fez tábua rasa dos factos alegados pelo Interveniente Chamado, já que só apreciou os factos contidos na Petição Inicial e contestação da R..

9. Portanto, o Tribunal da Relação errou na aplicação cega do artigo 574º nº 2 do C.P.C., uma vez que não conjugou tal norma com a participação e contributo do Interveniente Chamado admitida nos termos do art. 319º nº 2 do mesmo diploma legal.

10. Assim sendo, pugna-se pela alteração da resposta dada aos factos contidos nos pontos 31 e 32, os quais devem ser considerados não provados, tal, como aliás, bem decidiu e fundamentou o Tribunal da 1ª Instância.

10. O Tribunal da Relação socorreu-se unicamente da análise do extrato bancário da conta da Ré para alterar, considerando provados os factos dos pontos 33 e 34: “Após o supra referido em 14), CC e AA solicitaram à Ré BB que interviesse na qualidade de adquirente na aquisição da fração autónoma HA;… e 34) ...Tendo sido acordado entre por, um lado, BB, e, por outro lado, CC e AA, que este casal assumiria, na íntegra, todas as despesas com a aquisição da fração autónoma HA, bem como o pagamento do empréstimo contraído, condomínio, IMT, e todas as despesas relativas a essa fração.”; assim, pugnamos também quanto aos factos dos pontos 33 e 34 pela alteração no sentido de serem considerados não provados.

11. De facto, as presunções e ilações retiradas pelo Tribunal da Relação acerca do extrato bancário da conta da R. são indevidas e sem fundamento não permitindo dar como assentes os factos atrás referidos; na verdade, o extrato bancário não permite aquilatar com a segurança que o direito exige que os movimentos ali refletidos o foram para a concretização de um mandato sem representação.

12. A este propósito veja-se um Acórdão proferido por este Supremo Tribunal de Justiça em 15/05/2003 onde defendeu: “É certo que a conta corrente bancária (artº 334º do C. Comercial) pressupõe a elaboração periódica de extractos a emitir pela entidade bancária e cuja aprovação pelo cliente consolida os movimentos dela constantes; tais extractos comprovam eventuais pagamentos directos ou por transferências inter-bancárias simples, ou mesmo internacionais, por ordem do cliente, mas não provam as eventuais relações subjacentes geradoras de tais movimentos, nem a destinação específica ou seja a aplicação concreta dos montantes movimentados por parte dos respectivos destinatários/beneficiários.” Acrescentando na fundamentação o seguinte:

“Foi realmente emitido um cheque do montante de 11.250.000$00, cujo tomador foi o Réu, mas não se provou que o A. tenha entregue ao réu a importância peticionada e constante desse título de crédito, com a obrigação de a aplicar, na referida compra, para pagamento do seu preço, e em data previamente acordada, nem tão-pouco que o réu haja assumido o encargo de destinar essa importância à compra do imóvel em causa por conta do putativo mandante.

E era sobre os AA que impendia (artº 342º, nº 1 do C. Civil ) o ónus da prova desses factos constitutivos do seu invocado direito a verem transferidos para a respectiva esfera jurídica «os direitos adquiridos em execução do mandato» - conf. citado nº 1 do artº 1181º do mesmo diploma 342º. Mas o certo é que permanecem na mais completa penumbra os contornos do «programa» do aventado contrato”

13. Assim, pelas mesmas razões que este Tribunal aventou no âmbito do Acórdão aludido, não se compreende nem aceitam as ilações e conclusões retiradas do extrato bancário constante dos autos, já que tais conclusões (as que foram feitas no âmbito da interpretação do momento e abreviaturas nele constante que desaguam alegadamente na verificação do mandato sem representação) exorbitam claramente os poderes conferidos ao Tribunal da Relação na reapreciação da matéria de facto, as quais devem ser lógicas e seguras de molde a , com segurança e certeza, provarem os factos que a A. alega para proceder o seu pedido na ação- o de transmitir à A. e Interveniente Chamado o prédio em virtude da existência do mandato sem representação.

14. Era sobre a A. que impendia (artº 342º, nº 1 do C. Civil ) o ónus da prova desses factos constitutivos do seu invocado direito a verem transferidos para a respectiva esfera jurídica «os direitos adquiridos em execução do mandato» - conf. citado nº 1 do artº 1181º do mesmo diploma 342º e, não logrou cumprir.

15. A interpretação errada do documento extracto bancário levada a cabo pelo Tribunal da Relação viola ostensivamente as regras do ónus da prova, nomeadamente a contida no art. 342º nº 1 do Código Civil e como tal deverão os factos dos pontos 33 e 34 ser considerados não provados.”


13. Por despacho do Exmo Senhor Desembargador junto do Tribunal recorrido foram admitidas as revistas, nos seguintes termos:

Requerimento de 30 de setembro de 2022, referência ...91: por estar em tempo, por ter legitimidade e interesse em agir, por a decisão ser recorrível, admite-se o recurso interposto que é de revista, sobe nos próprios autos e no efeito meramente devolutivo. Notifique.

Requerimento de 06 de outubro de 2022, referência ...84: por estar em tempo, por ter legitimidade e interesse em agir, por a decisão ser recorrível, admite-se o recurso interposto que é de revista, sobe nos próprios autos e no efeito meramente devolutivo. Notifique.”


Colhidos os vistos legais, cumpre analisar e decidir.


II. Fundamentação

De facto

14. Factos provados (mantendo a numeração do acórdão, e com as alterações introduzidas pelo tribunal recorrido)

3.2.1.1 AA (ora autora) casou com CC (ora interveniente principal) em 02-08-2003, sem convenção antenupcial.

3.2.1.2 CC (ora interveniente principal) é filho de FF e de GG.

3.2.1.3 BB (ora ré) é filha de FF e de GG.

3.2.1.4 Em meados de 2002, início de 2003, AA e CC, então namorados, decidiram adquirir casa tendo em vista o casamento de ambos.

3.2.1.5 Para o efeito, após procura em várias localidades perto do Porto, adquiriram, em regime de compropriedade, uma fração no ..., tendo recorrido ao crédito bancário.

3.2.1.6 Tendo em conta as possibilidades financeiras do casal, a instituição bancária apenas lhe concedeu crédito quando os pais de CC, se aprestaram a ser fiadores, o que aconteceu.

3.2.1.7 Após o casamento de AA com CC, o casal fixou a sua residência na dita fração onde permaneceu até meados de 2009.

3.2.1.8 Nessa altura, após o nascimento da filha de ambos, DD, o casal decidiu adquirir casa em ..., tendo, para o efeito encetado procura para a mesma.

3.2.1.9 O casal encontrou um apartamento em ..., tipologia T2, do seu agrado, a saber, a fração autónoma designada pelas letras HA, destinada a habitação, no segundo andar, direito traseiras, com lugar de estacionamento e arrumo na cave, do edifício constituído em

regime de propriedade horizontal sito na Avenida da ..., n.ºs ..., Avenida D. ... n.ºs ... e Avenida M... n.ºs ..., freguesia e concelho ..., descrita na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...02....

3.2.1.10 Em 27-06-2009, entre, por um lado, EE, e, por outro lado, CC, foi celebrado um acordo intitulado «CONTRATO PROMESSA DE COMPRA E VENDA», pelo qual EE prometeu vender a CC e AA, ou a quem estes indicarem, a «fracção designada pelas letras “HA” destinada exclusivamente a habitação, no segundo andar, direito traseiras, com lugar de estacionamento e arrumo na cave, do prédio urbano, em regime de propriedade horizontal sito na Avenida ..., ..., Avenida D. ... n.ºs ... e Avenida M... n.ºs ..., freguesia e concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ..., sob o número mil setecentos e setenta e três», tendo entregue à promitente-vendedora a quantia de € 5.000,00 (cinco mil euros) a título de sinal.

3.2.1.11 Tendo em conta a futura aquisição da fração autónoma HA, CC e AA decidiram arrendar a fração do ... em 27 de junho de 2009 e combinaram entre si que o valor da renda seria destinado a liquidar o empréstimo contraído para aquisição da fração autónoma HA.

3.2.1.12 CC e AA arrendaram a fração do ... em agosto de 2009, pelo valor de € 450,00 (quatrocentos e cinquenta euros) e foram habitar para casa dos pais da autora AA, com a filha menor de ambos, até à conclusão dos procedimentos necessários à aquisição da fração autónoma HA.

3.2.1.13 Encetados os procedimentos bancários destinados à concessão de crédito para aquisição da fração autónoma HA, relativamente à qual já havia sido celebrado contrato-promessa e entregue o sinal, o casal constituído por CC e AA, foi confrontado com a necessidade de encontrar fiadores para a concessão do crédito bancário.

3.2.1.14 Tendo para o efeito solicitado aos pais de CC que interviessem na concessão do crédito hipotecário como seus fiadores, o que foi recusado.

3.2.1.15 Após o supra referido em 14) [3.2.1.14], CC e AA solicitaram à ré BB que interviesse na qualidade de adquirente na aquisição da fração autónoma HA, tendo sido acordado entre por, um lado, BB, e, por outro lado, CC e AA, que este casal assumiria, na íntegra, todas as despesas com a aquisição da fração autónoma HA, bem como o pagamento do empréstimo contraído, condomínio, IMT, e todas as despesas relativas a essa fração e que BB transmitiria a propriedade da fração autónoma HA para o casal constituído por CC e AA, logo que para tanto fosse interpelada.

3.2.1.16 Em 16-10-2009, no Posto de Atendimento da ... Conservatória do Registo Predial ..., foi celebrado um acordo intitulado «COMPRA E VENDA – MÚTUO COM HIPOTECA E FIANÇA», no qual intervieram, nomeadamente, EE, como «parte vendedora», BB, como «parte compradora», e CC e AA, como «parte fiadora», pelo qual, nomeadamente, EE declarou vender a BB a fração autónoma HA, destinada a habitação sita no segundo andar, direito traseiras, com lugar de estacionamento e arrumo na cave, descrita na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...02..., pelo preço de cento e vinte e cinco mil euros, o que BB aceitou.

3.2.1.17 A Caixa Geral de Depósitos, S.A. concedeu a BB um empréstimo no montante de cento e quinze mil euros, de cuja quantia BB se confessou devedora à Caixa Geral de Depósitos, S.A. e CC e AA declararam que se responsabilizam «como fiadores perante a Caixa […], por todas as obrigações decorrentes do empréstimo […]», assumindo «a obrigação de principais pagadores, renunciando ao benefício da excussão prévia».

3.2.1.18 Pela apresentação n.º 702, de 2009/10/16, foi definitivamente inscrita a aquisição a favor de BB, da fração autónoma descrita na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...02....

3.2.1.19 As despesas com a aquisição da fração autónoma HA, designadamente com o imposto municipal sobre as transmissões (IMT) e com o imposto de selo (IS), foram suportadas pelo casal constituído por CC e AA.

3.2.1.20 Em janeiro de 2010 e até dezembro de 2016, CC e AA, bem como a filha de ambos, passaram a habitar a fração autónoma HA, aí mantendo o centro da sua atividade familiar e social, de forma ininterrupta, aí comendo e confecionando a alimentação, recebendo familiares e amigos, bem como toda a correspondência.

3.2.1.21 CC e AA, entre janeiro de 2010 e dezembro de 2016 habitaram a fração autónoma HA à vista de toda a gente e sem perturbação ou oposição de alguém, continuando AA a habitar na fração a partir de janeiro de 2017, à vista de toda a gente.

3.2.1.22 Em dezembro de 2016, CC deixou de habitar a fração autónoma HA, não fazendo CC e AA vida em comum, continuando AA e a filha do casal a habitar na fração autónoma HA, mantendo estas nessa fração o centro da sua atividade familiar e social, de forma ininterrupta, aí comendo e confecionando a alimentação, recebendo familiares e amigos, bem como toda a correspondência.

3.2.1.23 Desde janeiro de 2010 até 31-12-2016, CC e AA pagaram os consumos de água, gás e eletricidade, prestação de condomínio, IMI e taxas de conservação e esgotos e, ainda, a prestação bancária devida pelo empréstimo hipotecário relativo à fração autónoma HA.

3.2.1.24 Desde a separação entre a Autora AA e o seu marido CC, ocorrida em 2016, a ré BB enviou cartas solicitando a entrega da fração autónoma HA, nomeadamente a carta datada de 26-10-2016 e a carta datada de 19-01-2017.

3.2.1.25 Ao que a Autora AA nunca acedeu, tendo a autora remetido à ré a carta datada de 08-08-2017.

3.2.1.26 A autora, confrontada com o corte do fornecimento de água e eletricidade à fração autónoma HA, corte esse ocorrido em setembro de 2017, instaurou procedimento cautelar contra a ré, que correu termos sob o n.º 4339/17.... (atualmente 682/18....), no âmbito do qual foi proferida decisão que determinou, entre o mais, «a notificação da Requerida para, em 20 dias, repor os contratos de fornecimento de eletricidade e água na [fração autónoma HA] […], ficando a cargo da Requerente o pagamento dos respectivos consumos, bem como a abster-se de qualquer actuação que impeça a Requerente de utilizar aquela casa de habitação».

3.2.1.27 Em 13-07-2017, a ré rececionou uma comunicação da EDP Comercial para cobrança de uma dívida no montante de € 82,25 (oitenta e dois euros e vinte e cinco cents), relativa a faturas emitidas e vencidas, cujo integral pagamento a ré satisfez em 25-08-2017.

3.2.1.28 Em 08-05-2017, a ré rececionou uma comunicação do condomínio onde se integra a fração autónoma HA para cobrança de uma dívida no montante de € 918,07 (novecentos e dezoito euros e sete cêntimos), que foi paga pela ré.

3.2.1.29 Desde 01 de janeiro de 2017, BB tem vindo a suportar as prestações mensais relativas ao crédito bancário obtido junto da Caixa Geral de Depósitos, S.A., no montante de € 239,09 cada, o que em maio/2018 perfaz um total de € 4.064,53.

3.2.1.30 BB procedeu ao pagamento da 1ª prestação de IMI, vencida em abril/2018, no montante de € 185,54.

3.2.1.31 O valor locativo da fração autónoma HA é de € 650,00 (seiscentos e cinquenta euros), por mês, ilíquidos.


15. Factos não provados (mantendo a numeração do acórdão)

3.2.2.1 Sem prejuízo para o supra referido em 24) [3.2.1.23], desde janeiro de 2010 até 31-12-2016, CC e AA pagaram tudo quanto se mostrou necessário à manutenção da fração autónoma HA.

3.2.2.2 A ocupação da fração autónoma HA por AA, a partir de janeiro de 2017 foi sem perturbação ou oposição de alguém.

3.2.2.3 CC e AA decidiram ou intervieram sobre a fração HA sem interferência de outrem e sem pedir licença a ninguém.


Fundamentação de Direito

15. O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões do Recurso, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso e devendo limitar-se a conhecer das questões e não das razões ou fundamentos que àquelas subjazam, conforme previsto no direito adjetivo civil - arts. 635º n.º 4 e 639º n.º 1, ex vi, art.º 679º, todos do Código de Processo Civil.

As questões suscitadas são assim, quanto ao recurso da Ré:

i) Saber se o TR decidiu bem ao alterar a matéria de facto;

ii) Saber se o TR decidiu bem ao nada dizer sobre o contrato de mútuo associado ao contrato de mandato sem representação.

16. Recurso do interveniente – o mesmo também apresentou recurso de revista, que foi recebido no TR, mas neste STJ entendeu-se que o recurso não devia ser admitido e, por esse motivo, fez-se o despacho convite imposto pelo art.º 655.º do CPC, com vista à adopção da decisão de não admitir o recurso do interveniente.

O interveniente não respondeu ao despacho-convite, pelo que se impõe, agora, decidir a não admissão do seu recurso, com os fundamentos já adiantados no despacho convite e que aqui se reproduzem:

CC foi chamado ao processo pela A. através do incidente de intervenção principal provocada, com vista a regularizar a legitimidade necessária à sua pretensão, por com ele ser casado, em regime de comunhão de adquiridos, chamamento que foi solicitado na PI (art.ºs 28 e ss) e não foi contestado pela Ré, na sua contestação (de fls. 28v e ss), na qual foi efectuado pedido reconvencional.

A intervenção principal provocada pelo lado ativo – isto é para intervir como autor, com vista a suprir a preterição do litisconsórcio necessário activo – foi deferida por despacho de 2018 (fls. 59 e ss) e o interveniente apresentou a sua posição, apresentado uma peça própria em que culmina pedindo que a acção seja julgada improcedente, pelo que nessa sua peça não aderiu à posição da A., mas esteve mais próximo da posição da ré.

O processo prosseguiu, houve tentativa de conciliação e veio a ser proferida sentença.

O interveniente não recorreu da sentença – o que se justifica (pelo que nos foi possível compreender) pelos seguintes motivos:

1. Sendo interveniente do lado activo, mas defendendo a posição da ré, deve ter sentido que era essa a melhor solução e por isso nada fez;

2. Contudo, de acordo com a lei, quer reagisse quer não o fizesse sempre se lhe aplicaria a norma do art.º 320.º do CPC – a solução que viesse a ser firmada ser-lhe-ia oponível.

3. Por outro lado, mesmo defendendo a posição da ré, o seu chamamento foi efectuado para se colocar ao lado da autora, por via do litisconsórcio associado à questão colocada – e nessa perspectiva – em conjugação com o regime do art.º 320.º - ele teria saído vencido na acção, podendo suscitar-se a questão do recurso contra esse vencimento, mas porque o seu objectivo era que a A. mulher não lograsse vencimento na acção, não se justificava recorrer da sentença que fora desfavorável à pretensão da A. mulher.

A situação é diversa na fase do recurso de revista – é que aqui a recorrente é a Ré – e o interveniente está colocado do lado da A., pelo que não ficou vencido (senão parcialmente) na apelação, como a A. também não o ficara e, por isso, não pode recorrer do acórdão que deu razão à apelante – quer ele queira ou não fazer-se valer do direito que o tribunal lhe reconheceu por via do efeito do caso julgado a que se reporta o art.º 320.º do CPC.

No acórdão recorrido a decisão foi assim proferida, no que respeita à procedência da acção, em favor da A. e interveniente (sublinhado nosso):

 “condenando-se BB a transmitir para AA e CC a fração correspondente a uma habitação sita no 2º andar direito traseiras, então inscrita na matriz predial de ... sob o artigo ...53 (atualmente inscrita na matriz predial da União das freguesias ... e ... sob o artigo ...31) e descrita na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...02... e registada a favor da ré”

Adicionalmente importa também referir que:

i) O interveniente apenas ficou vencido na parte relativa ao pedido reconvencional, sendo a sua sucumbência igual ao valor condenatório - cinco mil duzentos e cinquenta euros e trinta e nove cêntimos – valor que está muito abaixo do valor fixado pela lei para efeitos de recurso – art.º 629.º, n.º1 do CPC.

O segmento decisório em que consta a condenação foi o seguinte:ao abrigo do disposto no nº 2 do artigo 665º do Código de Processo Civil conhece-se do pedido reconvencional dependente deduzido por BB e cujo conhecimento ficou prejudicado na sentença recorrida e, em consequência, condenam-se AA e CC a pagar a BB a quantia de cinco mil duzentos e cinquenta euros e trinta e nove cents, a título de violação das obrigações melhor descritas nos fundamentos deste acórdão que autora e interveniente do lado ativo assumiram para a com a ré.”

ii) Nos fundamentos do recurso e no seu objecto o interveniente nem sequer coloca em causa essa decisão condenatória, pois o seu entendimento expresso nos autos não é o de se considerar na posição de A., mas na da Ré, o que o leva a considerar que a Ré deve receber esse valor da condenação (pelo menos) da parte da A. mulher.”

Pelo exposto, não se admite o recurso do interveniente.

17. Considerando que já se decidiu não ser admissível o recurso do interveniente, passemos agora a analisar o objecto do recurso da Ré:

Para além dos elementos que constam do relatório e dos factos provados e não provados, para responder às questões suscitadas pela Ré, na sua revista, importa também ter em consideração os aspectos seguintes do desenrolar do processo:

Em 18.4.2018 a Autora, AA, apresentou a sua PI contra a Ré e pediu a intervenção provocada de CC, seu marido, demandando BB.

Em 22.5.2018 a Ré apresentou a sua contestação, defendendo-se por excepção (art.º 4.º a 79.º, procurando demonstrar que não foi celebrado nenhum mandato sem representação para a aquisição da casa; nesta defesa nada afirma sobre a contração do empréstimo bancário e necessidade de cessão da posição contratual, na hipótese de a acção ser julgada procedente), por impugnação (art.º 80º a …, contestando que a A. tenha suportado IMI, despesas de condomínio e consumos de luz da casa, que a separação do casal se tenha ocorrido em meados de 2016) e formulando pedido reconvencional (art.º 112.º e ss), formulando os seguintes pedidos, além do pedido de condenação como litigante de má fé:

127.º - Na hipótese, que não se concede, de procedência da presente acção, deverá a A. ser condenada a reembolsar a Ré de tudo quanto esta comprovadamente haja dispendido no cumprimento do alegado mandato (art. 1182º CCivil), encargos e despesas estas que, achando-se identificadas nos arts. 21º, 22º, 118º a 122º supra, atingem o valor global de Eur 8 766,63.

128º - Na hipótese contrária, isto é e como fundadamente se crê, a ser julgada totalmente improcedente, a A. deverá ser condenada a pagar á Ré, a titulo indemnizatório ( arts. 562º, 563º e 564º CCivil ), uma quantia correspondente ao rendimento que a fracção a esta poderia ter proporcionado no mercado de arrendamento, á razão de Eur 650,00/mês ilíquidos, contados desde 1/Janeiro/2017 até efectiva entrega da mesma, no estado de devoluta de pessoas e bens, o que, na presente data, ascende a Eur 11 050,00,

129º - E, bem assim, a reembolsá-la das quantias por esta comprovadamente suportadas a título de despesas com o condomínio ( Eur 1450,63 ) e EDP Comercial ( Eur 82,25 ),

130º - Perfazendo, neste quadro, Eur 12 582,25.

Em 09-07-2018 foi proferido despacho onde se diz:

“Incidente de intervenção principal provocada:

Como resulta do assento de casamento junto a fls. 23, a Autora AA casou civilmente com CC, em 02/08/2003, sem convenção antenupcial.

Assim, tendo presente o alegado e peticionado pela Autora e tendo em vista suprir a preterição do litisconsórcio necessário ativo, nos termos dos arts. 33.º, 34.º e 316.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, admite-se o incidente da intervenção principal provocada com vista a chamar ao presente processo CC, para intervir na presente ação como Autor.

Condena-se a Requerente/Autora a pagar as custas do incidente, que se fixam no mínimo legal (art. 527.º e art. 539.º, n.º 1 do Código de Processo Civil e art. 7.º, n.º 4 do Regulamento das Custas Processuais).

Notifique e proceda-se à citação do Chamado (art. 319.º do Código de Processo Civil).”

Em 1.10.2018 o chamado CC veio apresentar o seu articulado, onde manifesta desacordo com o pedido formulado pela A., sua esposa, declarando que não celebrou um mandato sem representação com a sua irmã com vista à compra da casa, dizendo que a esposa ocupa ilegitimamente a casa da irmã, aqui ré.

Em 28 de fevereiro de 2019, pelas 13:30 horas realizou-se uma tentativa de conciliação e o processo foi suspenso por 30 dias para as partes se entenderem.

Não se tendo realizado acordo, foi agendada a audiência prévia, entretanto adiada para 23 de Setembro de 2019 pelas 13:30 horas.

Em 17-06-2019 foi fixado o valor da causa 142.772,25 (cento e quarenta e dois mil, setecentos e setenta e dois euros e vinte e cinco cêntimos).

Em 23/09/2019 foi proferido o despacho saneador, do qual consta:

“Sendo a hora marcada, publicamente e de viva voz, identifiquei o presente processo e de imediato procedi à chamada de todas as pessoas que neste ato devem intervir, após o que comuniquei verbalmente ao Mmo. Juiz os presentes e os faltosos.

Presentes: A Ilustre Mandatária da Autora Dra. HH e a Autora AA. No decurso da audiência, compareceram os Ilustres Mandatários do Interveniente Principal e da Ré.

Declarada aberta a audiência à hora agendada, o Mmo. Juiz determinou que se aguardasse, por quinze minutos, pela comparência dos Ilustres Mandatários do Interveniente Principal e da Ré.

Pelas 13:45 horas, não se verificando a comparência dos Ilustres Mandatários em falta, o Mmo. Juiz deu início aos trabalhos da audiência, determinando que, atenta a inexistência de meios técnicos de gravação na sala onde nos encontramos, se proceda à documentação da audiência em ata, nos termos dos arts. 591.º, n.º 4 e 155.º, n.º 7, ambos do Código de Processo Civil.

Depois, a Ilustre Mandatária pronunciou-se nos termos previstos art. 591.º, n.º 1, alíneas b) e c) do Código de Processo Civil, e, após, foram proferidos os seguintes despachos:

DESPACHO SANEADOR

O tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia.

O processo mostra-se isento de nulidades que o invalidem de todo.

As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciárias.

Assiste legitimidade às partes e não se verificam irregularidades de representação.

Não há exceções dilatórias, nulidades processuais ou questões prévias de que cumpra conhecer.

Sobre o valor processual da causa: O valor processual da causa foi já fixado em € 142.772,25 (cfr. refª citius ...03).

Logo foi a Ilustre Mandatária presente notificada dos precedentes despachos.

Em seguida, foi dada a palavra à Ilustre Mandatária presente, nos termos e para os efeitos do art. 591.º, n.º 1, alínea f) do Código de Processo Civil, tendo sido reiterado o já exposto e requerido nos autos.

Então, o Mmo. Juiz, proferiu os seguintes despachos:

OBJETO DO LITÍGIO

O objeto do litígio consiste, por um lado, em saber se a Ré deverá ser condenada a transmitir para a Autora AA e para CC a fração autónoma designada pelas letras HA, descrita na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...02...; e, por outro lado, em saber se, em caso de procedência da ação, a Autora deverá ser condenada a pagar à Ré a quantia de € 8.766,63 ou se, em caso de improcedência da ação, a Autora deverá ser condenada a pagar à Ré a quantia de € 12.582,25, acrescida de € 650,00 por mês, até efetiva entrega da mencionada fração, devoluta de pessoas e bens. Também constitui objeto do litígio saber se a Autora litiga de má fé.

TEMAS DA PROVA

Procede-se à enunciação dos temas da prova nos seguintes termos:

1) apurar em que circunstâncias AA, CC e BB celebraram o negócio denominado «COMPRA E VENDA – MÚTUO COM HIPOTECA E FIANÇA», outorgado em 17/10/2009;

2) Apurar quem suportou as despesas relativas à formalização da aquisição do imóvel (designadamente, o custo de € 625,00 do procedimento especial de aquisição, oneração e registos de imóveis – Casa Pronta; o valor de € 1.278,61 relativo ao imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis; e o valor de € 1.080,58 relativo ao imposto de selo), as prestações mensais relativas ao crédito bancário obtido junto da Caixa Geral de Depósitos, S. A., as quotas de condomínio relativas à fração em causa neste processo, o imposto municipal sobre imóveis relativo à fração em causa neste processo e o custo do fornecimento de energia elétrica à fração em causa neste processo.

Após, pela Ilustre Mandatária da Autora foi dito não ter reclamações a fazer quanto aos despachos proferidos.

Em seguida, pela Ilustre Mandatária da Autora foi dito que renova os requerimentos probatórios que apresentou nos autos, mais requerendo que tendo em conta que a Ré alega que procedeu aos pagamentos dos impostos que a aquisição obriga, IMT e imposto de selo, bem como o registo da aquisição, requer o prazo de 10 dias, para os vir indicar aos autos, e, ao mesmo tempo, requer a notificação das entidades bancárias para virem informar as contas e os movimentos quer da R. quer de CC.

Consigna-se que pelas 13:53 horas, compareceram os Ilustres Mandatários do Interveniente Principal e da Ré.

Dada a palavra aos Ilustres Mandatários do Interveniente Principal e da Ré, por estes foi dito que renovam os requerimentos probatórios que apresentaram nos autos.

Então, o Mmo. Juiz, proferiu o seguinte despacho sobre os meios de prova:

MEIOS DE PROVA

Prova documental. – Fiquem nos autos os documentos apresentados.

Notifique a A. para apresentar certidão do registo predial atualizada relativa à fração autónoma a que diz respeito o presente processo.

Notifique a R. para juntar documentos comprovativos de que é titular das contas bancárias a partir das quais foram realizados os movimentos referidos nos documentos 17 a 27 da contestação.

Notifique a R. para apresentar certidão do seu assento de nascimento ou cópia certificada do seu cartão de cidadão.

Decorrido o prazo de 10 dias requerido pela Autora, o Tribunal pronunciar-se-á sobre o requerido pela Autora nesta audiência prévia.

Prova testemunhal. – Admitem-se os róis de testemunhas apresentados (a fls. 7v-8 pela A.; a fls. 61v pelo Chamado e a fls. 38v pela R.).

Logo foram os Ilustres Mandatários notificados do precedente despacho.

Seguidamente, depois de cumprido o disposto no art. 591.º, n.º 1, alínea g), do Código de Processo Civil, o Mmo. Juiz proferiu o seguinte despacho:

D E S P A C H O

Para realização da audiência final de julgamento, designa-se o dia 22 de janeiro de 2020, pelas 13:30 horas para a inquirição das testemunhas arroladas pela Autora; e o dia 27 de janeiro de 2020 pelas 13:30 horas para inquirição das demais testemunhas (datas e horas designadas por acordo com os I. Mandatários).

Do douto despacho que antecede foram os I. Mandatários notificados.

De seguida, o Mmo. Juiz declarou encerrada a diligência, pelas 13:58 horas.

Para constar se lavrou a presente ata, que lida e achada conforme, vai ser assinada.”

Em 26 de janeiro de 2022, inconformada com a sentença, AA interpôs recurso de apelação.

BB, ré, contra-alegou pugnando pela total improcedência do recurso em 7.3.2022, analisando os pontos da matéria de facto cuja apreciação era solicitada, á luz dos argumentos que considerou relevantes da peça da recorrente, e defendendo que o tribunal decidiu bem, até porque eram matérias sujeitas a livre apreciação pelo juiz, que considerou muito bem justificadas na convicção formada.

E o interveniente? Que fez?

Simplesmente nada. Nem recorreu, não contra-alegou nem aderiu à posição de nenhuma das partes.

18. O TR identificou como questões a conhecer na apelação:

a) Da reapreciação dos pontos 31 a 39 dos factos não provados (isto é, todos os factos não provados);

b) Da repercussão da eventual alteração da decisão da matéria de facto na solução do caso.

Conhecendo do recurso no que respeita à impugnação da matéria de facto, o TR identificou os seguintes meios de prova a serem convocados pela recorrente:

- Para os pontos 31 e 32 - a confissão da ré no artigo 31º da sua contestação;

- Para o ponto 33 dos factos - as declarações de parte da autora e o depoimento da testemunha II, nos segmentos que destaca e localiza;

- Para o ponto 34 dos factos - confissão da ré resultante dos artigos 26º e 27º da contestação, o depoimento da testemunha JJ, nos segmentos que transcreve e localiza e ainda o conteúdo do ponto 24 dos factos provados que pressupõe necessariamente um acordo entre as partes;

- Para o ponto 35 dos factos - depoimento da testemunha KK, nos segmentos que identifica localizando;

-  Para o ponto 36 dos factos - falta de explicação para a causa da entrega dos quinze mil euros pelo irmão da ré, pouco antes da celebração da compra e venda da fração e as declarações de parte da autora, nos segmentos que transcreve localizando;

- Para o ponto 37 dos factos - depoimento da testemunha JJ, nos segmentos que sublinha localizando;

- Para os pontos 38 e 39 dos factos - declarações de parte da autora e no depoimento da testemunha II, tudo nos segmentos que destaca e localiza.

E em seguida o tribunal empreendeu a análise dos factos impugnados, indicando qual o procedimento seguido (“procedeu-se à audição da prova pessoal produzida na audiência final e examinou-se detalhadamente a prova documental produzida nos autos e especialmente os extratos de movimentos da conta aberta na Caixa Geral de Depósitos, Agência de ..., com o nº ...00, da titularidade da ré BB, no período compreendido entre 02 de outubro de 2009 e 14 de maio de 2018, destacando-se da mesma os seguintes movimentos e referências”….; “Em sede de prova documental, devem ainda relevar-se os seguintes dados de facto….”; “Ouviu-se a totalidade da prova pessoal produzida em duas sessões da audiência final….”).

E feito este percurso o tribunal afirmou:

O essencial da matéria probanda nestes autos e que o tribunal recorrido julgou não provada é matéria reservada e em que dificilmente existe prova direta, sendo que a única prova direta existente, porque proveniente dos diversos interessados e intervenientes no negócio, carece de corroboração independente para poder firmar e formar uma convicção probatória prudente por parte do tribunal (artigo 607º, nº 5 do Código de Processo Civil).”

Mas não se ficou por aqui e analisou ponto por ponto as questões suscitadas pela recorrente A.:

- fê-lo por referência aos pontos 31 e 32 dos factos não provados – confrontando os art.º 7.º e 8.º da PI e 31.º da contestação – e daí concluiu que essa matéria devia ter-se por provada por acordo das partes!

- passou em seguida para os pontos 33, 34 e 35 dos factos não provados – e aqui considerou que “que a prova documental produzida e resultante do extrato bancário remetida aos autos pela Caixa Geral de Depósitos, S.A. com o ofício datado de 28 de setembro de 2020, conforta a prova pessoal resultante das declarações da autora, do pai desta e da testemunha II, antigo namorado da ré”, explicando de seguida porque assim concluía; o tribunal analisou ainda a posição do interveniente e a sua profissão e interesses na forma como a causa seria decidida; e também concluiu que “A hipótese que a ré defende na sua contestação de a autora, seu marido e filha terem ido residir para a fração autónoma HA a título precário e com termo incerto é de todo implausível, não se percebendo que uma família com uma criança pequena deixe e arrende uma casa própria onde até então residiu para ir habitar em casa alheia, sem garantias de estabilidade, ainda que em condições financeiras favoráveis atento o valor locativo desse imóvel superior ao total das despesas suportadas pelos seus ocupantes”. E por isso formou a sua convicção a partir de certos elementos de facto provados, para deles extrair outros, cuja prova directa já havia explicado não ter sido possível de obter, o que lhe permitia dar factos por provados através de presunção judicial (“Assim, tudo sopesado, afigura-se-nos que a versão dos factos transmitida pela autora nas suas declarações de parte tem suficiente corroboração na prova documental que criticamente antes se analisou não sendo apenas plausível mas sim a mais provável, ao contrário da versão trazida a juízo pela mãe da ré e por LL, antigo namorado da ré.”).

- o tribunal passou então para o ponto 36 dos factos não provados – e reanalisou os argumentos e contra argumentos do recurso, concluindo que “A nosso ver, como resulta da motivação da reapreciação dos pontos 33 a 35 dos factos não provados, é inequívoco que em 16 de outubro de 2009, a conta da ré não se achava suficientemente provisionada para suportar o integral pagamento do preço devido pela compra e venda e com as despesas com a celebração desse negócio e impostos inerentes a essa transação, pois que a ré apenas tinha depositado nessa conta o valor de € 680,00 e desse montante apenas restavam € 195,35. Assim, no que respeita este ponto de facto, atendendo ao que se acabou de expor, deve julgar-se provada a matéria nele vertida.”

- Foram finalmente analisados os demais pontos – 37 a 39 – mantendo-se não provado o 37 e parcialmente alterados os 38 e 39.

Do exposto resulta à evidência que, ante as limitações impostas ao conhecimento da matéria de facto impostas por lei ao STJ – com as excepções limitadas do art.º 682.º, n.2 e 674.º, n.º3 do CPC – a apreciação da impugnação da matéria de facto efectuada pelo tribunal da Relação se deu no quadro da livre apreciação dos meios de prova que estavam em causa e foram invocados pela recorrente e contraditados pela recorrida (ré), sem que os mesmos fossem meios de prova de valor tabelado ou que houvesse algum facto dado por provado que só o pudesse ser por meio de prova de valor reforçado sem que o mesmo tivesse existido.

No aludido sentido, entre muitos outros, cf. acórdão do STJ de 8/11/2022, processo 46/08.0TBMIR.C2.S1, onde se sumaria[1]:

I - O Supremo Tribunal de Justiça apenas conhece de direito e não julga de facto, a não ser em situações excepcionais, conforme impõe o art. 46.º da Lei n.º 62/2013, de 26-8 (“Fora dos casos previstos na lei, o Supremo Tribunal de Justiça apenas conhece da matéria de direito”). Por isso, a intervenção do Supremo Tribunal de Justiça está limitada aos casos previstos no art. 674, n.º 3, (2.ª parte) e 682.º, n.º 3, CPC, ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova (isto é, violação das regras direito probatório material), reenvio do processo para ampliação dos factos (devido ao vício da insuficiência) ou contradições na decisão da matéria de facto que inviabilizem a decisão jurídica.

II - O Supremo Tribunal de Justiça não pode interferir no juízo que a Relação faz com base na reapreciação dos meios de prova sujeitos ao princípio da livre apreciação, como os depoimentos testemunhais, documentos sem força probatória plena ou uso de presunções judiciais.

19. Como o TR explicou, estava em causa uma decisão sobre factos onde a prova directa não existiu, mas a prova de elementos essenciais e adjuvantes permitia ao tribunal formar uma convicção e presumir o facto desconhecido – foi celebrado um acordo de mandato sem representação.

As instâncias divergiram na solução: a 1ª instância não ficou convencida da celebração do contrato de mandato sem representação com vista à aquisição da casa HÁ pela Ré, por conta da A. e seu marido; O Tribunal da Relação considerou que os elementos existentes apontavam para essa conclusão.

Como reagiu a Ré a esta solução?

Em primeiro lugar, nos primeiros pontos conclusivos da revista (conclusões 2 a 12) e nas conclusões finais (conclusões 25 a 30), suscita uma questão nova – a da conexão de contratos – o de compra da casa HA e do empréstimo com mútuo bancário – para dizer que não é admissível que tenha de cumprir o mandato e fique com o empréstimo a responsabilizá-la!

Sucede que, ainda que seja um argumento impressivo, ele só surge agora e a questão esteve sempre em “discussão” na acção, nunca tendo a Ré invocado na contestação esta questão.

Como tem sido dito à exaustão, os recursos visam a reanálise de decisões adoptadas à luz da situação trazida pelas partes – ou de conhecimento oficioso – no momento em que foram proferidas, de acordo com a livre disponibilidade da defesa e o princípio da concentração da defesa na contestação.

Não sendo este o caso, não pode a questão ser objecto do recurso, não tendo o tribunal - nem podendo – dela conhecer.

Mais: lida com atenção a decisão do tribunal é claro o seu sentido de ter sido dado provimento ao pedido reconvencional que inclui parte das despesas e encargos do mútuo, temporalmente limitado, em função do próprio pedido.

E também foi feita a explicação da diferença entre despesas necessárias à execução do contrato de mandato e os valores devidos pela violação pela autora e marido das obrigações que assumiram face à ré de suportar, na íntegra, o pagamento do empréstimo contraído, condomínio e todas as despesas relativas a essa fração.

Foi aí dito:

“Nos termos do disposto na alínea c) do artigo 1167º do Código Civil, o mandante é obrigado a reembolsar o mandatário das despesas feitas que este fundadamente tenha considerado indispensáveis, com juros legais desde que foram efetuadas.

As despesas contempladas neste preceito são as necessárias à execução do contrato de mandato e que o mandatário, fundadamente, tenha considerado indispensáveis.

“Sendo dois ou mais os mandantes, as suas obrigações para com o mandatário são solidárias, se o mandato tiver sido conferido para assunto de interesse comum” (artigo 1169º do Código Civil).

Das despesas que a ora recorrida reclama em via reconvencional apenas as referentes a Imposto Municipal sobre Transações e Imposto de Selo se enquadram no conceito de despesas necessárias à execução do contrato de mandato, tendo-se porém provado que foram suportadas pela autora e pelo seu marido (veja-se o ponto 3.2.1.19 dos factos provados).

As restantes despesas que a recorrida afirma ter suportado e que em parte estão factualmente comprovadas, resultam da violação pela autora e marido das obrigações que assumiram face à ré de suportar, na íntegra, o pagamento do empréstimo contraído, condomínio e todas as despesas relativas a essa fração.

No que respeita estas despesas apenas se provou que a ré rececionou uma comunicação da EDP Comercial para cobrança de uma dívida no montante de € 82,25 (oitenta e dois euros e vinte e cinco cents), relativa a faturas emitidas e vencidas, cujo integral pagamento a ré satisfez em 25-08-2017 (ponto 3.2.1.27 dos factos provados), que em 08-05-2017, a ré rececionou uma comunicação do condomínio onde se integra a fração autónoma HA para cobrança de uma dívida no montante de € 918,07 (novecentos e dezoito euros e sete cents), que foi paga pela ré, que desde 01 de janeiro de 2017, BB tem vindo a suportar as prestações mensais relativas ao crédito bancário obtido junto da Caixa Geral de Depósitos, S.A., no montante de € 239,09 cada, o que em maio/2018 perfaz um total de € 4.064,53 e ainda que BB procedeu ao pagamento da 1ª prestação de IMI, vencida em abril/2018, no montante de € 185,54.

Desta factualidade resulta que a ré suportou o valor global de € 5.250,39, valor que autora e interveniente do lado ativo se obrigaram a pagar à ré.

Assim, a título de violação das obrigações que autora e interveniente do lado ativo assumiram para a com a ré, devem os primeiros ser condenados a pagar à ré a quantia global de € 5.250,39 (€ 82,25 + € 918,07 + € 4.064,53 + € 185,54= € 5.250,39).”

Assim, por referência ao pedido reconvencional e à defesa da Ré nada mais podia o tribunal decretar.

20. Em segundo lugar, a estratégia da Ré é procurar uma violação de lei na decisão recorrida relativa ao conhecimento da impugnação da matéria de facto, pretendendo ultrapassar os obstáculos que se colocam no acesso ao STJ quanto a este ponto do recurso.

E aqui aparece a violação (suposta) do art.º 574º, nº 2 e do art.º 342.º do CC, expressa pelas seguintes conclusões (que repetimos):

 14. O Acórdão recorrido considerou provados por acordo os factos 31 e 32 que o Tribunal ... havia considerado não provados.

15. O Chamado nos presentes autos, CC, marido da Autora, e interveniente de forma directa na factualidade em causa nestes dois pontos, impugnou de forma especificada estes factos nos artigos 6º e 7º do seu articulado.

16. Aliás o Chamado impugna de forma expressa estes artigos também no artigo 5º do seu articulado.

17. O facto de Autora e Chamado terem versões diferentes sobre estes factos impede que os mesmos sejam considerados admitidos por acordo, independentemente da posição assumida pela Ré na sua contestação.

18. O entendimento contrário seria impedir que o Chamado principal pudesse fazer prova da sua versão, o que, manifestamente, não pode ter sido a intenção do legislador.

19. O Acórdão da Relação, agora recorrido, violou o artigo 574º, nº 2 do Código de Processo Civil e, como tal, deverão estes factos ser considerados como não provados.

20. Em face da total ausência de prova testemunhal directa, compreensível diga-se em situações como a dos autos, lançou o Tribunal Recorrido mão da análise de um único documento - o extracto bancário da conta da Ré - todo ele cheio de abreviaturas e passível das mais diversas interpretações, para considerar provados os factos não provados pela primeira instância 33, 34 e 35.

21. O Tribunal recorrido retirou um conjunto de conclusões que não encontram respaldo em nenhuma referência do dito documento.

22. Estes factos provados são-no, não porque se demonstrou terem acontecido, mas por ser plausível que tenham acontecido... e tudo em sede de reapreciação do julgamento de 1ª instância, com um total desprezo pela imediação da apreciação da prova em 1ª instância (que ora é princípio basilar do direito processual, como no dia seguinte passa a ser uma nota de rodapé)!

23. Da análise feita pela Relação relativamente a estes factos - veja-se a análise feita relativamente ao requerimento de 26.11.2020 - resulta claramente que esta fez recair o ónus da prova dos factos em discussão sobre a Ré, violando o disposto no artº 342 nº 1 do Código Civil, de onde resultaria que a prova dos factos alegados relativamente à existência do mandato sem representação caberia exclusivamente à Autora.

24. Pelos motivos expostos, incorreu a decisão sobre matéria de facto na violação de regras de direito probatório material, devendo ser revogada nessa parte, pois que o conhecimento desta violação em nada belisca a limitação dos poderes de cognição deste Venerando Tribunal sobre a matéria de facto.

21. Importa reafirmar que a análise dos factos provados 31 e 32 foram solicitados no recurso de apelação, dizendo-se aí:

“QUANTO AOS FACTOS 31) E 32) DADOS COMO NÃO PROVADOS:

Tais factos mostram-se incorrectamente julgados.

Com efeito, basta atentar à posição tomada pela recorrida, em sede de contestação, que para justificar o alegado acordo para a ocupação da fracção, confessa, em sede de contestação, de forma expressa e inequívoca tal factualidade, ao alegar em 31 da Contestação que, “ … seriam sempre inferiores ao valor da renda (€ 450,00) que mensalmente passaram a receber do contrato de arrendamento celebrado com respeito à fracção de que eram proprietários no ....”

22. E em resposta a este argumento o que disse a ré na contra-alegação da apelação?

Verdadeiramente nada.

Nas contra-alegações tece considerações sobre depoimentos de testemunhas e depoimentos de parte e alude ao seu art.º 14.º da contestação e ainda sobre a transferência de 15.000 euros para a sua conta.

E fê-lo assim:

c ) quanto ás questões constantes das conclusões V e V

8 – Começando pela 1ª delas (que não pode nem deve ser considerada factualidade com respeito á qual o tribunal tivesse de se pronunciar, designadamente por ser irrelevante para a decisão da causa), a Recorrente, á míngua de mais e/ou melhores argumentos, manifestou-se inconformada por da sentença “ não decorrer qualquer explicação “ para o seguinte facto: “a que título surge a recorrida no contrato definitivo, acordo, cessão da posição contratual, mandato sem representação ????“ (cfr. conclusão V).

À guisa de esclarecimento e porque não se afiguram necessários maiores desenvolvimentos, sempre convirá deixar bem claro que no art. 14º da Contestação se assinalou que foi firme propósito da Recorrida e seu ex-marido ceder/transmitir a respectiva posição contratual de promitente compradores a um potencial interessado na aquisição da fracção HA, tendo, já na qualidade de cessionária, a Ré/Recorrida sido interveniente no correspondente contrato definitivo, a par dos identificados cedentes e do outro contraente, i.é., a própria promitente vendedora … que, desta forma, consentiu expressamente na referida transmissão/cessão de posição contratual ( cfr. art. 424º CCivil).

Por outro lado e relativamente ao depósito da quantia de Eur 15 000,00 efectuado na conta da ora Recorrida, a Recorrente desconsiderou,  propositadamente, ou não, a seguinte análise crítica, manifestamente inatacável, em que se fundou a sentença recorrida .

“Verifica-se que, dias antes da escritura de aquisição da fração autónoma HA, mais concretamente, em 14-10-2009, CC transferiu para a conta de que era titular a Ré BB a quantia de € 15.000,00, «Referente a: APTO» (é esta a menção que consta do documento subscrito por CC, pelo qual este ordena a realização da transferência, cfr. fls. 241).

A abreviatura «APTO» poderá significar apartamento, não custando a admitir que estava a ser feita menção ao apartamento que iria ser adquirido dois dias depois: ou seja, a fração autónoma HA. Aliás, a Ré não põe em causa que esse montante estava relacionado com a fração autónoma HA, pois afirma no requerimento com a refª ...26, fls. 228 e segs., que o «montante de Eur. 15.000,00 corresponde a um mútuo efectuado pelo irmão da Ré, CC, a fim de possibilitar a esta assumir, entre outras as responsabilidades inerentes à aquisição da fracção identificada nos autos». Não resulta da prova produzida no presente processo a que título foi entregue essa quantia de € 15.000,00…

A grande diferença entre essa quantia de € 15.000,00 e o valor das despesas com a aquisição da fração autónoma HA, que ascenderam a € 3.084,19, não permite concluir que a entrega da quantia de € 15.000,00 teve por finalidade custear as despesas com a aquisição da fração autónoma HA, pelo que se considerou não provado que foram CC e AA quem suportaram as despesas com a aquisição da fração autónoma HA.

E os documentos juntos aos autos, apesar de revelarem a existência de quantias entregues pelo casal à Ré, não esclarecem o que terá sido combinado e não demonstram que a Ré tenha adquirido a aquisição da fração autónoma HA por conta e no interesse da Autora e seu marido, com a obrigação de a transmitir a estes, em momento ulterior.

Para aqui ter chegado, ao tribunal recorrido não terá igualmente passado despercebida a factualidade e documentação que a Ré/Recorrente levou oportunamente aos autos por requerimento de 26/11/2020, com a ref. Citius ...09, que seguidamente se reproduz pela manifesta pertinência que assume na clarificação/apreciação desta concreta factualidade:

“Quanto a este movimento, cumpre, porém, esclarecer que :

a)  ao tempo dos factos, as poupanças da Ré estavam concentradas em aplicações financeiras de longo prazo, sendo que o respectivo resgate antes do termo implicaria penalização, vindo daí a razão do mútuo efectuado;

b)  tanto assim que, vencida uma dessas aplicações em 10/Dez/2013, foi a aludida conta bancária da Ré nesse mesmo dia creditada pelo montante de Eur 12 050,35 ( vd. descritivo “ capital investido” ), conforme se pode comprovar pelo sobredito extracto;

c)   sendo que, a 13/Dez/2013 e por sua iniciativa, a Ré procedeu ao reembolso parcial desse mútuo, transferindo para o identificado mutuante CC a quantia de Eur 12 000,00, movimento que se encontra a débito da sua conta, conforme facilmente se comprova pelo mesmo extracto e também pelo DOC 3 que adiante igualmente se junta;

d) tendo este último, conhecedor dos contrangimentos, designadamente profissionais, que á data muita instabilidade e insegurança provocaram na Ré (cfr. arts. 34º a 41º, inclusives, da Contestação), transferido, com data/valor de 17/Dez/2013, igual quantia, ou seja, Eur 12 000,00, para crédito                                                                                       da conta desta, com quem igualmente convencionou que o “ acerto de contas “ entre ambos apenas ocorreria no momento em que a fracção de ... lhe fosse entregue, devoluta de pessoas e bens.”

9 – Vale todo o exposto por dizer que, conferidos os argumentos arremessados pela Recorrente, não se descortina qualquer erro de julgamento que pudesse alterar a decisão proferida, nomeadamente no que concerna aos factos não provados 31 a 39.

As contra-alegações da apelação seriam o local e o momento próprio para responder à questão colocada no respectivo recurso.

Não o tendo feito não nos parece que o possa fazer agora, apenas porque o resultado atingido não satisfaz a sua pretensão.

23. Adicionalmente, relativamente ao argumento relativo ao art.º 574.º, n.º2  do CPC:

- i) a haver violação desta norma a mesma não está abarcada pelo âmbito do conhecimento permitido ao STJ no âmbito da revista quanto à fixação dos factos e sua impugnação;

ii) ademais, entendemos que há aqui um equívoco: quem se poderia queixar de haver violação desta norma seria o interveniente e não a ré. Não há dúvidas de que ela afirmou o que já se transcreveu no art.º 31º da contestação e que face ao art.º 7.º e 8º da PI a conclusão do tribunal está certa. A ré admitiu tais factos, por acordo.

Pouco releva que tais factos não tenham sido também admitidos pelo interveniente, que não apelou nem contra-alegou na apelação, procurando demonstrar que não deveriam os mesmos ter-se por provados.

24. Relativamente à invocada violação do art.º 342.º do CC volta a haver, por parte da Ré recorrente, um equívoco.

O art.º 342.º é norma que não determina o que se deve ter por provada e não provado, mas como o julgador deve decidir se faltar a prova.

No caso dos autos, o TR alterou diversos factos não provados, passando-os para factos provados – com recurso a meios de prova lícitos e não sujeitos a força probatória tabelada – não se colocando a questão do recurso à aplicação do art.º 342.º do CC pois ficou provado que a ré adquiriu a casa HÁ por mandato sem representação, em seu nome, mas por conta da A. e marido.

Pelos motivos invocados o recurso da Ré improcede na sua totalidade.

III. Decisão

Pelos fundamentos indicados, não se admite o recurso do interveniente e é negada a revista da Ré.

O interveniente é condenado em custas pela não recepção do seu recurso.

A Ré é condenada em custas por decaimento do seu recurso, sem prejuízo do apoio judiciário.

Lisboa, 19 de Janeiro de 2023

Fátima Gomes (Relatora)

Oliveira Abreu

Nuno Pinto Oliveira

______

[1] http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/e382a3d61862f818802588f40063fc1f?OpenDocument.