Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
36/12.9TTPRT.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: GONÇALVES ROCHA
Descritores: APOIO JUDICIÁRIO
CADUCIDADE DA ACÇÃO
IMPUGNAÇÃO DO DESPEDIMENTO INDIVIDUAL
PRESCRIÇÃO
INTERRUPÇÃO
Data do Acordão: 04/17/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONCEDIDA EM PARTE
Área Temática:
DIREITO CIVIL - RELAÇÕES JURÍDICAS / NEGÓCIO JURÍDICO / DECLARAÇÃO NEGOCIAL / TEMPO E SUA REPERCUSSÃO NAS RELAÇÕES JURÍDICAS.
DIREITO CONSTITUCIONAL - DIREITOS E DEVERES FUNDAMENTAIS.
DIREITO DO TRABALHO -CONTRATO DE TRABALHO - CESSAÇÃO DO CONTRATO.
DIREITO DE PROCESSO DO TRABALHO - IMPUGNAÇÃO DO DESPEDIMENTO INDIVIDUAL.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGO 279º, ALÍNEAS B) E C), 298.º, N.º2, 323.º, N.ºS 1 E 2, 328.º, 331.º, N.º1.
CÓDIGO DO TRABALHO DE 2003: - ARTIGOS 381.º, N.ºS1 E 2, 435.º, N.º2.
CÓDIGO DO TRABALHO DE 2009 (APROVADO PELA LEI N.º7/2009, DE 12-2): - ARTIGOS 337.º, N.º1, 387.º, N.º2.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGOS 13.º, 20.º, N.º1.
DL Nº 295/2009, DE 13-10: - ARTIGO 9º, Nº 1.
LEI 34/2004, DE 29-7: - ARTIGOS 16.º, 33.º, N.º4.
LEI N.º 7/2009, DE 12-2: - ARTIGOS 12, N.º5, 14.º, N.º1.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 15/9/2010, RECURSO Nº 920/07.7TTPRT.S1; DE 7/2/2007, NO PROCESSO N.º 3317/06; DE 21/5/2008, PROCESSO Nº607/08, ACESSÍVEIS EM WWW.DGSI.PT.
Sumário :
I - Tendo a A sido despedida em 30 de Dezembro de 2009, e embora vigorasse à data o Código do Trabalho de 2009 aprovado pela Lei 7/2009 de 12/2, não se lhe aplica o regime do seu artigo 387º, nº 2, que veio estabelecer que o trabalhador se pode opor ao despedimento mediante a apresentação de requerimento em formulário próprio, a ser apresentado no tribunal competente no prazo de 60 dias contados da data da recepção da comunicação do despedimento, ou da data da cessação do contrato, se posterior, pois continua a aplicar-se-lhe o regime do art. 435.º, n.º 2 do Código do Trabalho de 2003.

II - Efectivamente, e dado que o novo regime impugnatório do despedimento individual exigia concretizações e adaptações do quadro processual existente, a sua entrada em vigor foi relegada para quando passassem a vigorar as alterações ao Código de Processo de Trabalho que as acolhessem, conforme deflui dos artigos 12º, nº 5 e 14º, nº 1 da Lei 7/2009.

III - Assim, a entrada em vigor do regime consagrado naquele artigo 387º/2 do Código do Trabalho/2009 só ocorreu em 1 de Janeiro de 2010, data em que começaram a vigorar as alterações ao CPT, introduzidas pelo DL nº 295/2009 de 13 de Outubro, como veio a estabelecer o artigo 9º, nº 1 deste diploma.

IV - O legislador, ao estabelecer no art. 435.º, n.º 2 do Código do Trabalho de 2003, o prazo de um ano para a propositura da acção de impugnação de despedimento, quis qualificá-lo como prazo de caducidade, ao abrigo do disposto no artigo 298º, nº2 do Código Civil, afastando os créditos emergentes dum despedimento ilícito – reintegração ou indemnização optativa, retribuições intercalares e danos não patrimoniais – do regime da prescrição do art. 381.º, n.º 1, do Código do Trabalho.

V - Tendo a A requerido apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono para intentar uma acção judicial, esta considera-se proposta na data em que for apresentado o respectivo pedido nos serviços da Segurança Social, conforme resulta do artigo 33.º, n.º 4 da Lei 34/2004 de 29 de Julho.

VI – Por isso, e tendo este requerimento sido apresentado dois dias antes de se completar o prazo de um ano, os pedidos deduzidos e conexionados com a invocada ilicitude do seu despedimento são tempestivos.

VII- Mas já quanto aos pedidos respeitantes a créditos emergentes do contrato de trabalho, tais como os derivados de diferenças salariais e diuturnidades em falta, consumou-se o prazo da prescrição de um ano, pois embora a acção se tenha como intentada dois dias antes do prazo se completar, por aplicação do nº 4 do artigo 33º da Lei 34/2004, há que conjugar este regime com o da interrupção da prescrição, que só ocorre com citação do Réu para a acção, ou com a notificação de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, conforme estabelece o nº 1 do artigo 323º do CC.

VIII - Daí que, e mesmo equiparando o pedido de nomeação de patrono ao requerimento de citação do R (apresentado dois dias antes do termo do prazo de prescrição), aquele prazo se tenha consumado, pois a sua interrupção só ocorreu cinco dias após aquele pedido, conforme consagra o nº 2 do referido artigo 323°do Código Civil.

Decisão Texto Integral:         

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

1---

AA intentou uma acção com processo comum, emergente de contrato de trabalho, contra Centro Social e Cultural BB, tendo deduzido os seguintes pedidos:
a) Que seja declarado ilícito o despedimento promovido pelo R;
b) Que seja este condenado a pagar-lhe 16 470 euros a título de indemnização de antiguidade em substituição da reintegração;
c) Que o R seja condenado a pagar-lhe 60 000 euros de compensação pelos danos não patrimoniais;
d) Que seja o R condenado a pagar-lhe 790,07 euros para ressarcimento dos danos patrimoniais causados;
e) Que seja o R condenado a pagar-lhe as retribuições e diuturnidades que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal;
f) Que seja o R condenado a pagar-lhe 14 719,83 euros relativos a diferenças salariais entre os valores que lhe foram efectivamente pagos e aqueles a que tinha direito;
g) Que seja o R condenado a pagar-lhe 331,65 euros relativos a diuturnidades em falta no subsídio de Natal e de férias, bem como a subsídios de alimentação não pagos durante o período de suspensão preventiva, incluindo ainda um dia de férias não gozado;
h) Que seja o R condenado a pagar-lhe os juros vincendos, calculados à taxa legal desde a citação e até integral pagamento;
i) Que seja o R condenado a emitir a declaração do tempo de serviço da A, bem como das funções exercidas;
j) Que seja ainda o R condenado a emitir a declaração a rectificar a data do despedimento da A junto da Segurança Social para o dia 30 de Dezembro de 2009, bem como o período de vigência do contrato de trabalho durante aquele mês para 30 dias.

Alegou para tanto que foi despedida pelo R na sequência dum procedimento disciplinar que lhe foi instaurado e cuja decisão final recebeu em 30 de Dezembro de 2009, tendo comunicado à Segurança Social que tal despedimento ocorreu em 31 de Dezembro. Sustenta no entanto, que os factos de que foi acusada são falsos; mas ainda que o não fossem, nunca constituiriam justa causa de despedimento. Esta actuação do R causou-lhe forte sofrimento de que lhe resultou passar a padecer de doença mental em cujos tratamentos e medicação gastou 790,07 euros. Alegou ainda que o R não lhe pagava a retribuição mínima estabelecida na contratação colectiva para a sua categoria profissional, pelo que são devidas as diferenças salariais que peticionou (14 719,83 euros); e que também não lhe pagou a diuturnidade de 20 euros nos subsídios de férias e Natal pagos durante os anos de 2006 a 2009, bem como o subsídio de alimentação durante o período da suspensão preventiva, num total de 331,65 euros.   

O R contestou vindo invocar a prescrição dos créditos da A, bem como a caducidade do direito de impugnar o despedimento, pois mesmo que se conceda que o pedido de apoio judiciário foi formulado em 28 de Dezembro de 2010, os respectivos prazos só se interromperam cinco dias depois, conforme prescreve o artigo 323º, nº 2 do CC, o que leva a que a sua interrupção já se tenha feito depois do prazo de um ano que a lei prevê para a reclamação dos direitos respeitantes a esta acção. E impugnando sustenta que a A foi despedida com justa causa e que não lhe são devidos os valores reclamados a título de diferenças salariais e de diuturnidades.
A A respondeu à matéria das excepções, pugnando pela sua improcedência.

            Seguidamente foi proferido despacho saneador/sentença, que absolvendo parcialmente o Réu, apenas veio a condená-lo a rectificar a data de despedimento da Autora na Segurança Social para o dia 30 de Dezembro de 2009 e o período de trabalho de 30 dias nesse mês.

Inconformada recorreu a A através de recurso “per saltum” dirigido a este Supremo Tribunal, cuja alegação rematou com as seguintes conclusões:

A.        Por esta acção a autora pretende ver declarada a ilicitude do seu despedimento;

B.        As normas aplicáveis à pretensão da autora são essencialmente as contidas nos n°s. 1 e 2 do artigo 435° do Código de Trabalho aprovado pela Lei nº 99/2003, de 27-8 (C.T. 2003). Na data de despedimento de 30-12-2009 o Código do Processo de Trabalho em vigor regia-se pelo Decreto-Lei 480/99, de 9-11.

C.        No Código de Trabalho 2009 (C.T.2009) aprovado pela Lei nº 7/2009 de 12 de Fevereiro, para o despedimento quando se trate de decisão de despedimento individual, comunicado por escrito, nos 'casos de despedimento disciplinar, por inadaptação ou por extinção do posto de trabalho, tal como sucedia na C.T. 2003, há duas normas diferentes relativamente ao prazo para exercício de direitos decorrentes da cessação do contrato de trabalho: o art. 337° (correspondente ao anterior 381°, nº 1/C.T, 2003), e art. 435°, nº 2, do C.T 2003 em vigor até 31 de Dezembro de 2009, art. 387º C.T. 2009 que entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2010 com o Decreto-Lei nº 295/2009 de 13-10. No C.T. 2009 na epígrafe "Aplicação no tempo" se estipulou no nº 5 do art. 7º que “o regime estabelecido no Código do Trabalho, anexo à apresente lei não se aplica a situações constituídas ou iniciadas antes da sua entrada em vigor e relativas a: ....b) Prazos de prescrição e caducidade; c) Procedimentos para aplicação de sanções, bem como para a cessação do contrato de trabalho; "

D.        O prazo previsto no art. 337°, nº 1 do C.T. 2009 (correspondente ao anterior 381°, nº 1/C.T. 2003) é um prazo de prescrição; o prazo de um ano previsto no nº 2 do art. 435° é um prazo de caducidade.

E.        Tanto é o que decorre do princípio consagrado no nº 2 do art. 298° do Código Civil.

F.         E corresponde ao entendimento uniforme da doutrina: cfr. Pedro Romano Martinez e outros, Código de Trabalho Anotado, 4ª edição, Almedina, págs. 699 e ss. e Paula Quintas e Hélder Quintas, Código de Trabalho Anotado e Comentado, 4a edição, 2005, Almedina, págs. 950 e ss.

G.        Introduziu-se no art. 435°, nº 2, do Código do Trabalho/2003, um prazo de caducidade no que se refere ao direito de impugnação do despedimento.

H. A norma do art. 435°, nº 2, constitui regra especial relativamente ao preceituado no art. 381º/C.T. 2003.

I. Como regra especial, em caso de impugnação de despedimento e no que respeita às pretensões relacionadas com a ilicitude do despedimento, aplica-se o disposto no art. 435°, nº 2, em detrimento da regra do art. 381° nºl/CT 2003. Este entendimento está consignado nos Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça: proc. 1920/07.7TTPRT.S1, 4ª Secção, data:15/09/2010 e proc.06S3317, data 07-02-2007.

J. Os valores relativos aos pedidos formulados pela Autora, ora recorrente, nas alíneas a), b), c), d), e), h) e i) do petitório não se encontram abrangidos e sujeitos ao prazo prescricional do art° 337°, n° 1 do Código do Trabalho/2009 (correspondente ao anterior 381°, nº 1/C.T 2003), mas antes pelo prazo de caducidade do art° 435°, nº 2 do código/2003, visto que se reportam a efeitos jurídicos decorrentes da ilicitude do despedimento.

K, É errada e ilegal a aplicação à acção dos autos do prazo prescricional previsto no nº 1 do art. 337° nº 1 do Código de Trabalho (correspondente ao anterior 381°, nº 1/C.T 2003), sendo tal aplicação violadora do disposto no art. 9° do Código Civil.

L. A Meritíssima Juíza a quo ao decidir "não se verifica a caducidade da acção" não podia e não deveria absolver a Ré dos pedidos formulados nas alíneas a), b), c), d), e), h) e i) do petitório.

M. A acção deve prosseguir para apreciação/julgamento dos pedidos formulados nas alíneas a), b), c), d), e), h) e i) do petitório.

N. Sendo improcedente o prazo prescricional previsto no nº 1 do art. 337° nº 1 do Código de Trabalho (correspondente ao anterior 381°, nº 1/C.T 2003), a Meritíssima Juíza a quo não deveria absolver a Ré dos pedidos formulados nas alíneas f) e g), devendo a acção prosseguir para apreciação/julgamento desses pedidos.

O. A interpretação do art° 33° n° 4 da Lei n° 34/2004 de 29.07 deverá considerar que com a apresentação do pedido de apoio judiciário com nomeação de patrono se presume efectuada a citação da Ré para efeitos de interrupção da prescrição, sob pena da violação do princípio constitucional da igualdade (art. 13°) e da garantia de acesso aos tribunais (art. 20° n°1).

P. Foram assim violados o art. 9º do Código Civil, o disposto no art. 435°, nº 2 do C.T.2003, sendo ainda errada a aplicação do artº 337°, nº 1 do C.T. 2009 (correspondente ao anterior 381°, nº 1/C.T 2003) à acção dos autos, bem como o art. 13° e 20°, nº 1 da Constituição da República Portuguesa.

Q. A recorrente, nos termos dos artº 725°, nº 1 e artº 691°, nº 1, do CPC, requer que o recurso ora interposto suba directamente ao Supremo Tribunal de Justiça.

Pede-se assim que seja revogada a sentença recorrida.

            A R não alegou.

Recebido o recurso neste Supremo Tribunal, foi dado cumprimento ao disposto no artigo 87º, nº 3 do CPT, vindo a Ex.mª Procuradora-Geral Adjunta emitir proficiente parecer no sentido da procedência “in totum”da revista, o qual, devidamente notificado, não suscitou qualquer reacção das partes.

            E corridos os vistos legais, cumpre decidir.

2---

Para tanto, temos de atender ao seguinte quadro fáctico, conforme se colhe do despacho saneador/sentença:

a) A A foi despedida em 30 de Dezembro de 2009;

b) Em 28 de Dezembro de 2010, a A apresentou na Segurança Social um requerimento de protecção Jurídica, solicitando apoio judiciário na modalidade de nomeação e pagamento de compensação a patrono e dispensa de taxa de justiça e encargos para propor acção de impugnação de despedimento;

c) A presente acção deu entrada em juízo em 10 de Janeiro de 2012;

d) O Réu foi citado em 23 de Janeiro de 2012.

3---

            E decidindo:

                                   Na sua contestação, o Réu invocou a excepção de prescrição dos créditos reclamados pela A e a caducidade do seu direito de impugnar o despedimento de que esta foi alvo, argumentando que tendo sido despedida em 30 de Dezembro de 2009, a presente acção só foi proposta em 10 de Janeiro de 2012. E ainda que se conceda que o pedido de apoio judiciário foi apresentado em 28 de Dezembro de 2010, os respectivos prazos só se interromperam cinco dias depois, conforme prescreve o artigo 323º, nº 2 do CC, pelo que a sua interrupção já ocorreu depois do prazo de um ano que a lei prevê para a reclamação dos direitos respeitantes a esta acção.

            Contrapôs a A que a apresentação do pedido de nomeação de patrono junto da Segurança Social interrompeu a prescrição, pelo que não se consumou o respectivo prazo.

            A decisão recorrida, acolhendo a argumentação do R, absolveu-o parcialmente do pedido, apenas vindo a condená-lo a rectificar a data de despedimento da Autora na Segurança Social para o dia 30 de Dezembro de 2009 e o período de trabalho de 30 dias nesse mês.

            É contra o assim decidido que reage a recorrente.

 

3.1---

           

Conforme se colhe do petitório da A, esta deduz pedidos respeitantes a duas proveniências:

            Os pedidos conexionados com a invocada ilicitude do seu despedimento [alíneas a) a e) e i)] e respectivos juros de mora; e os pedidos conexionados com outros direitos emergentes do contrato de trabalho (os restantes).

            Ora, tendo a A sido despedida em 30 de Dezembro de 2009, vigorava à data o Código do Trabalho de 2009, aprovado pela Lei 7/2009 de 12/2 e que entrou em vigor em 17 de Fevereiro de 2009.

            Dispõe o artigo 337º, n.º 1 deste diploma legal (correspondente ao artigo 381.º, n.º 1 do C.Trabalho/2003) que o crédito de empregador ou trabalhador emergente de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação prescreve decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.

            Por outro lado, resulta do seu artigo 387º, nº 2 que o trabalhador se pode opor ao despedimento mediante a apresentação de requerimento em formulário próprio, o qual tem de ser apresentado no tribunal competente no prazo de 60 dias, contados da data da recepção da comunicação do despedimento, ou da data da cessação do contrato, se posterior, regime que apenas é aplicável aos despedimentos individuais, pois no caso de despedimento colectivo os trabalhadores abrangidos têm o prazo de seis meses para proceder à impugnação da sua regularidade e licitude (artigo 388º/2).

            No entanto, e dado que este novo regime impugnatório do despedimento individual exigia concretizações e adaptações do quadro processual existente, a sua entrada em vigor foi relegada para quando passassem a vigorar as alterações ao Código de Processo de Trabalho que as acolhessem, conforme se colhe dos artigos 12º, nº 5 e 14º, nº 1 da Lei 7/2009.

Assim, a entrada em vigor do regime consagrado no artigo 387º do Código do Trabalho/2009 só ocorreu em 1 de Janeiro de 2010, data em que começaram a vigorar as alterações ao CPT, introduzidas pelo DL nº 295/2009 de 13 de Outubro, como veio a estabelecer o artigo 9º, nº 1 deste diploma.

Como tal, e considerando que a trabalhadora foi despedida em 30 de Dezembro de 2009, temos de reconhecer que a acção de impugnação do despedimento tinha que ser intentada no prazo de um ano a contar da data em que este se verificou, conforme previa o artigo 435º, nº 2 do Código do Trabalho /2003, pois este continuou a vigorar até 31/12/2009. Por outro lado, o legislador ao estabelecer neste preceito o prazo de um ano para a propositura da acção de impugnação de despedimento, quis qualificá-lo como prazo de caducidade, por aplicação do disposto no artigo 298º, nº2 do Código Civil, afastando deste modo os créditos emergentes de um despedimento ilícito – reintegração ou indemnização optativa, retribuições intercalares e danos não patrimoniais – do regime contido no art. 381.º, n.º 1, do Código do Trabalho (2003)[1].

E quanto aos restantes créditos emergentes do contrato de trabalho, temos de aplicar o prazo de prescrição de um ano contado a partir do dia seguinte ao da cessação do contrato, conforme consagra o artigo 337º, nº 1 do Código do Trabalho de 2009.

           

Trata-se portanto de prazos de diferente natureza, e a que correspondem regimes também diversos.

            Com efeito, e quanto à caducidade, só a prática do acto dentro do prazo impede a sua consumação, pois o prazo de caducidade só se suspende ou interrompe nos casos em que a lei o determinar, conforme deflui dos artigos 328º e 331º, nº 1, ambos do Código Civil.

            Já quanto ao prazo de prescrição, esta só se interrompe com a citação, ou com a notificação de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, conforme prescreve o artigo 323º, nº 1 do Código Civil.

            E assim sendo, não basta a mera propositura da acção para o prazo de prescrição se interromper, embora a lei estabeleça que se a citação ou notificação não for feita dentro dos cinco dias seguintes ao requerimento, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida decorridos estes cinco dias, conforme consagra nº 2 do referido artigo 323°do Código Civil.

           

No caso presente, tendo a A sido despedida em 30 de Dezembro de 2009, o prazo de um ano iniciou-se em 31 de Dezembro de 2009, pelo que terminou às 24 horas do dia 31 de Dezembro de 2010, conforme resulta do artigo 279º, alíneas b) e c) do Código Civil.

Por isso, e tendo a presente acção dado entrada em juízo no 10 de Janeiro de 2012, e tendo o Réu sido citado em 23 de Janeiro, poderíamos ser levados a concluir que quer o prazo de caducidade, quer o prazo de prescrição se consumaram.  

No entanto, temos de atender a que em 28 de Dezembro de 2010, a A apresentou na Segurança Social um requerimento de protecção jurídica, solicitando apoio judiciário na modalidade de nomeação, pagamento de compensação a patrono e dispensa de taxa de justiça e encargos para intentar esta acção.

E assim sendo, a situação tem de ser resolvida tomando em consideração o regime consagrado pela Lei 34/2004 de 29 de Julho, que visou criar um sistema de acesso ao direito e aos tribunais destinado a assegurar que a ninguém seja dificultado ou impedido, em razão da sua condição social ou cultural, ou por insuficiência de meios económicos, o conhecimento, o exercício ou a defesa dos seus direitos.

Por isso, o acesso ao direito e aos tribunais constitui uma responsabilidade do Estado, que compreende a informação jurídica e a protecção jurídica, abrangendo esta última as modalidades de consulta jurídica e de apoio judiciário, regime que é aplicável em todos os tribunais e julgados de paz, qualquer que seja a forma do processo.

Por outro lado, e conforme advém do seu artigo 16º, o apoio judiciário compreende as seguintes modalidades:

a) Dispensa total ou parcial de taxa de justiça e demais encargos com o processo;

b) Nomeação e pagamento de honorários de patrono;

c) Pagamento da remuneração do solicitador de execução designado;

d) Pagamento faseado de taxa de justiça e demais encargos com o processo, de honorários de patrono nomeado e de remuneração do solicitador de execução designado;

e) Pagamento de honorários de defensor oficioso.

Quanto ao regime da nomeação e pagamento de honorários a patrono, como foi a modalidade solicitada pela A, diz-nos o artigo 33º que o patrono nomeado para a propositura da acção deve intentá-la nos 30 dias seguintes à notificação da nomeação, e caso não cumpra este prazo, deverá apresentar a respectiva justificação à Ordem dos Advogados (nº1), podendo ainda requerer a esta entidade a prorrogação daquele prazo, fundamentando tal pedido (nº 2).

Por outro lado, o incumprimento deste prazo apenas implicará eventual responsabilidade disciplinar para o advogado nomeado, quando não for apresentada justificação, ou quando esta não for julgada satisfatória, podendo a Ordem nomear novo patrono ao requerente quando o advogado nomeado solicite escusa.          

Compreende-se este regime de eventuais incumprimentos dos prazos pelo advogado nomeado, pois nas situações em que se solicita a nomeação de patrono para intentar uma acção judicial esta considera-se proposta na data em que for apresentado o respectivo pedido de nomeação de patrono, conforme resulta do artigo 33.º, n.º 4 do referido diploma, sendo assim irrelevante o período de tempo que decorra entre a apresentação do requerimento de nomeação e a data da instauração da acção.

Por isso, e tendo em conta estes parâmetros, a presente acção tem de se considerar proposta em 28 de Dezembro de 2010.

Donde resulta que, qualificando-se o prazo de um ano para a instauração da acção de impugnação de despedimento como prazo de caducidade, tenhamos de considerar que este foi cumprido, pois o mesmo só se completava em 31 de Dezembro.

E assim sendo, os pedidos respeitantes às alíneas a), b), c), d), e) e i) do petitório apresentado pela A, bem como o referente aos juros de mora conexionados com estes pedidos, foram deduzidos em tempo, pois tratando-se dum prazo de caducidade, bastou a prática do acto para impedir que o prazo se consumasse (artigo 331º,nº 1 do CC).

E quanto aos restantes pedidos em relação aos quais se aplica o regime da prescrição, tais como os formulados nas alíneas f) e g), respeitantes a diferenças salariais e diuturnidades em falta?

Ora, quanto a estes já dissemos que vale o prazo de prescrição de um ano contado do dia seguinte ao da cessação do contrato, conforme estabelece o nº 1 do artigo 337º do Código do Trabalho actualmente em vigor.

 Por outro lado, quando o regime aplicável for o da prescrição, não basta a instauração da acção dentro do prazo, pois o prazo de prescrição só se interrompe com a citação, ou com a notificação de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, conforme estabelece o artigo 323º, nº 1 do Código Civil.

De qualquer forma, o legislador, partindo do pressuposto que, em condições de normalidade, a citação se fará em regra cinco dias depois de ter sido requerida, ficcionou que a prescrição se tem por interrompida decorridos esses cinco dias, conforme resulta do nº 2 do referido artigo 323°do Código Civil.

Donde ser de concluir que, considerando-se proposta a acção em 28 de Dezembro de 2010, data em que foi apresentado o pedido de nomeação de patrono, a interrupção da prescrição só ocorreu em 2 de Janeiro de 2011, ou seja, já depois de se ter completado o prazo de um ano previsto no artigo 337º, nº 1 do Código do Trabalho/2009.

Assim sendo e quanto aos pedidos formulados nas alíneas f) e g) do petitório da A, e que respeitam às diferenças salariais reclamadas e diuturnidades em falta, bem julgou a decisão recorrida considerando que se consumou o prazo da prescrição dos créditos peticionados nestas alíneas.

Sustenta a recorrente que não deverá adoptar-se este entendimento, pois deverá considerar-se que com a apresentação do pedido de apoio judiciário para nomeação de patrono se presume efectuada a citação da Ré para efeitos de interrupção da prescrição, sob pena da violação do princípio constitucional da igualdade (art. 13°) e da garantia de acesso aos tribunais (art. 20°, n°1, ambos da CRP), mas não tem razão.

Efectivamente, o regime geral da interrupção da prescrição está regulado no artigo 323º, nº 1 do Código Civil, que é bem claro ao consagrar que não basta a instauração da acção pelo credor para se interromper a prescrição.

E assim sendo, embora se tenha de considerar que a presente acção foi intentada na data em que a trabalhadora requereu a concessão do apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono, conforme consagrou o nº 4 do artigo 33º da Lei 34/2004, temos, no entanto, de conjugar este regime com o da interrupção da prescrição, que só ocorre com citação do Réu para a acção, ou com a notificação de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, conforme já se disse.

Daí que, e mesmo equiparando o pedido de nomeação de patrono ao requerimento de citação do R, tenhamos de considerar que a prescrição se tem por interrompida decorridos cinco dias depois daquele pedido, conforme consagra o nº 2 do referido artigo 323°do Código Civil.

O que nos leva a concluir que tal interrupção só ocorreu em 2 de Janeiro de 2011, ou seja, já depois de se ter completado o prazo de um ano.

Na verdade, não resulta do nº 4 do artigo 33º da Lei 34/2004 que o legislador visasse instituir um regime especial de interrupção da prescrição, diferente do regime geral previsto naquele preceito do Código Civil, pois uma coisa é a data da propositura da acção e outra bem diversa a interrupção dos prazos prescricionais. 

E nem se diga que este regime afronta o princípio da igualdade, consagrado no artigo 13º da CRP, pois estando consagrado em termos gerais na lei civil, o que era do conhecimento do legislador, nenhuma razão vemos para o afastar no caso presente, e para proceder à equiparação da propositura da acção à citação do devedor, conforme pretende a recorrente.

Efectivamente, a lei já salvaguarda suficientemente a posição do requerente do apoio judiciário nesta modalidade ao considerar que a acção se tem por intentada na data em que a trabalhadora requereu a sua concessão, conforme consagrou o nº 4 do artigo 33º da Lei 34/2004, evitando assim que as delongas resultantes das diligências para a designação de patrono venham prejudicar o exercício tempestivo do direito.

Por isso, é de concluir que o interessado que requeira a nomeação de patrono o tem de fazer com a antecedência de cinco dias em relação ao termo do prazo da prescrição, conforme exige o artigo 323º, nº 2 do CC, pois os demais credores também têm que se conformar com este regime.

Por outro lado, também não vemos que esta interpretação ponha em causa o n.º 1 do artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa que consagra que a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais, não podendo os cidadãos que carecem de meios económicos ser afectados na defesa jurisdicional dos seus direitos.

Na verdade, tal direito já fica salvaguardado com o regime resultante do nº 4 do artigo 33º da Lei 34/2004, que considera proposta a acção na data em que a trabalhadora requereu a concessão do apoio judiciário, ficando assim imune aos atrasos normais do procedimento para a sua concessão, e com a consequente consagração da total irrelevância do período de tempo que decorra entre aquele momento e a data da instauração da acção.

 

Pelo exposto, e em conclusão:

Em relação aos pedidos respeitantes às alíneas a), b), c), d), e) e i) do petitório apresentado pela A, e respectivos juros de mora, conforme consta da alínea h), tendo sido deduzidos em tempo, temos de revogar a decisão recorrida que absolveu o R, ordenando-se que os autos prossigam quanto a estes.

Mas já quanto aos restantes pedidos [os formulados nas alíneas f) e g)], respeitantes a diferenças salariais e diuturnidades em falta, temos de considerar que se consumou o prazo da prescrição, pelo que em relação a eles o R foi correctamente absolvido.

 

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            Termos em que se acorda nesta Secção Social em conceder parcialmente a revista, pelo que, e revogando-se a decisão recorrida em relação aos pedidos deduzidos nas alíneas a), b), c), d), e) e i) do petitório apresentado pela A, e respectivos juros de mora, se ordena o prosseguimento da acção quanto aos mesmos.

            Custas a final.

 

(Anexa-se sumário do acórdão)

Lisboa, 17 de Abril de 2013

Gonçalves Rocha (Relator)

Leones Dantas

Maria Clara Sottomayor 

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[1] Neste sentido veja-se os acórdãos deste Supremo Tribunal de 15/9/2010, recurso nº 920/07.7TTPRT.S1; de 7/2/2007, no Processo n.º 3317/06; de 21 de Maio de 2008, processo nº607/08, acessíveis em www.dgsi.pt.