Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
18679/21.8T8SNT-A.L1.S1
Nº Convencional: 2.ª SECÇÃO
Relator: FERNANDO BAPTISTA
Descritores: AÇÃO EXECUTIVA
TÍTULO EXECUTIVO
RECONHECIMENTO DA DÍVIDA
PRESUNÇÃO LEGAL
RELAÇÃO JURÍDICA SUBJACENTE
OBRIGAÇÃO CAUSAL
ÓNUS DE ALEGAÇÃO
INVERSÃO DO ÓNUS DA PROVA
LIBERDADE CONTRATUAL
TRANSAÇÃO
CONFISSÃO DE DÍVIDA
PROVA PLENA
SEGREDO PROFISSIONAL
ADVOGADO
PROIBIÇÃO DE PROVA
Data do Acordão: 04/04/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA
Sumário :
I. O acertamento é o ponto de partida da acção executiva, pois a realização coactiva da prestação pressupõe a anterior definição dos elementos (subjectivos e objectivos) da relação jurídica de que ela é objecto. O título executivo contém esse acertamento; daí que se diga que constitui a base da execução, por ele se determinando «o fim e os limites da acção executiva», isto é, o tipo de acção e o seu objecto.

II. O reconhecimento de dívida e a promessa de cumprimento sem indicação da causa da constituição da obrigação, referidos no artº 458º do CC, têm como efeito a presunção da existência de uma relação fundamental (de uma fonte constitutiva de uma obrigação). Trata-se, assim, de um negócio jurídico com mera eficácia declarativa, limitada à inversão do ónus da prova.

III. Ou seja, ali, o credor fica dispensado de provar é a existência de relação fundamental, de causa para a dívida, uma vez que se presume que a dívida tem uma causa, é causal. Mas já não se presume qual seja essa causa em concreto e/ou a respectiva validade (motivo pelo qual, tendo presente o princípio da proibição dos negócios abstractos, se entende que o credor deve indicar a causa, não carecendo é de a provar).

IV. Porém, o artigo 458.º do Código Civil apenas se refere à situação em que alguém reconhece uma dívida sem indicar a relação que está na origem da dívida, já não às situações em que na declaração o devedor enuncia expressamente a causa da dívida reconhecida. E isso é assim porque se o devedor indica a causa da dívida reconhecida já não é necessário presumir a sua existência, pois a mesma resulta da própria declaração de dívida.

V. Neste último caso, estar-se-á perante um negócio celebrado com fim de pacificação, que não terá carácter apenas declaratório, mas também constitutivo, na medida em que a parte renuncia a discutir a verificação de pressupostos ou a oponibilidade de excepções ao vínculo obrigacional, que reconhece ter sido constituído por aquela via.

VI. Com efeito, se perante uma declaração unilateral onde não se indica nenhuma relação fundamental o credor fica dispensado de provar a existência de relação fundamental, de uma causa para a dívida, o mesmo deve acontecer, por maioria de razão, nos casos em que no documento se indica uma relação fundamental, caso em se deverá presumir não que a dívida tem uma causa, mas que a dívida tem a causa indicada.

VII. Face ao disposto no art. 457º do CC, a celebração deste negócio só pode ser admitida com base na liberdade contratual (art. 405º CC), constituindo neste caso um contrato análogo à transacção (ut art. 1248º CC), o qual por isso nem sequer deverá admitir que a parte faça prova da inexistência da obrigação.

VIII. Assim, se no requerimento executivo, a exequente indica que o seu crédito provém de um contrato de compra e venda de acções - contrato cuja existência tenta provar nos embargos – mas no título dado à execução, denominado “Confissão de dívida”, se menciona que esta promana de um empréstimo (sem alusão sequer a uma outra relação que porventura tivesse justificado esse empréstimo), esta divergência tem consequências decisivas sobre a viabilidade da execução: a exequente, tendo-se colocado fora (à margem) do declarado na "confissão" quanto à origem do crédito e à natureza da relação fundamental, não pode gozar da presunção do art. 458. º quanto à existência e prova dessa (outra) relação - ao que acresce que não pode ser feita prova de que afinal a relação subjacente não é aquela que é indicada no documento escrito com recurso a prova testemunhal.

IX. Nessas circunstâncias, a declaração confessória plasmada no título executivo faz prova plena do facto confessado (ex vi artigos 352.º, 358.º, n.º 2, 375.º, n.º 1, 371º, nº1 (se documento autêntico) e 376.º (se documento particular), do Código Civil). Prova plena essa que só pode ser revertida mediante a arguição e prova da falsidade do documento, ou através de meio de prova que demonstrasse não ser verdadeiro esse facto (ut artigo 347.º do CC).

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, Segunda Secção Cível


I – RELATÓRIO

AA e BB deduziram oposição, mediante embargos de executado, por apenso à execução comum para pagamento de quantia certa que lhes move Improve People, S.A..

Alegaram, em suma, que o preço pela venda das participações sociais foi integralmente liquidado. Mais alegaram que foi acordado entre os Embargantes e CC e cônjuge, que ao adquirir as participações, os ora Embargantes se obrigavam a contribuir com dinheiro, sempre que necessário e até ao limite de € 1.500.000, para o desenvolvimento da actividade das sociedades e que a escritura pública dada à execução visou precisamente assegurar o cumprimento desse acordo, que, aliás, foi cumprido pelos Embargantes. Concluem que a obrigação exequenda é inexistente e inexigível e requereram ainda a suspensão da execução.

I.2. Regularmente citada, a Embargada apresentou contestação, na qual, em suma, impugnou a matéria alegada pelos Embargantes e pugnou pela improcedência da oposição.

I.3. Realizou-se audiência prévia, na qual se indeferiu a suspensão da execução, foi proferido despacho saneador, identificado o objecto do litígio e enunciados os temas de prova (vd. ref.ª 2877158 do p. e.).

I.4. Realizou-se a audiência de discussão e julgamento e a respectiva produção de prova, com observância de todas as formalidades legais.

I.5. Inconformada com a sentença de 7/2/2023 que julgou totalmente improcedente a oposição à execução, determinando o prosseguimento da execução, sustentando inexistir litigância de má fé, dela apelaram os executados, vindo a Relação de Lisboa, em acórdão, a julgar improcedente a apelação e confirmar a decisão recorrida.

De novo inconformados, vêm os embargantes AA e BB interpor recurso de revista, apresentando alegações que rematam com as seguintes

CONCLUSÕES

1.ª O presente Recurso de Revista é interposto do Douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido em 28/09/2023 (“Acórdão recorrido”), que julgou improcedente a Apelação e confirmou a Sentença proferida em 07/02/2023 (“Sentença”). Tem por fundamentos:

(a) Nulidade por omissão de pronúncia (artigo 615.º n.º 1 alínea d), ex vi do artigo 666.º n.º 1 c/c 608.º, todos do CPC); (b) Nulidade por oposição entre o fundamento e a conclusão/decisão (artigo 615.º n.º 1 alínea c) primeira parte, ex vi do artigo 666.º n.º 1, todos do CPC); (c) Violação da lei processual, por erro na interpretação e aplicação da parte final do artigo 651.º c/c o n.º 3 do artigo 423.º, ambos do CPC (error in procedendo); (d) Conforme autorizado pela parte final do n.º 3 do artigo 674.º do CPC, erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa. Concretamente, i) manutenção do depoimento de testemunha advogada com violação do disposto no artigo 92.º do Estatuto da Ordem dos Advogados (“EOA”) c/c o artigo 497.º, n.º 3 do CPC e, dos artigos 195.º a 199.º do CPC e, ii) violação do disposto nos artigos 371.º, 372.º e 394.º c/c 458.º, todos do CC, quanto ao facto dado como provado de n.º 3; (e) Violação da lei substantiva, por erro na interpretação e aplicação do direito e de determinação da norma aplicável, por ofensa a disposições legais, a saber, artigos 219.º, 341.º, 342.º, n.ºs 1 e 2, 344.º, 347.º, 371.º n.º 1, 372.º, 392.º, 394.º n.º 1, 405.º, 406.º, 458.º, 577.º a 588.º do CC, todos do Código Civil (CC), 726.º, n.º 2 alíneas a) e c), 729.º, 731.º, 734.º, n.º 1 do CPC (error in judicando)

2.ª Quanto à admissibilidade (artigos 671.º, n.ºs 1 e 3 e 672.º do CPC): (1) a Revista é sempre admissível como Revista Comum quanto à questão relativa ao depoimento da advogada testemunha e à questão relativa aos documentos juntos com as alegações de apelação (cf. artigo 71.º, n.º 3 do CPC), desenvolvidas no Ponto IV.2.A, na medida em que estas questões só foram suscitadas pelos Recorrentes neste recurso. Além disto, relativamente às outras matérias, apesar de se ter verificado dupla decisão desfavorável aos Recorrentes, mas porque, a fundamentação da decisão pelas duas instâncias precedentes é essencialmente diferente (2) a Revista é também Comum quanto: (a) ao erro relativo à apreciação de matéria de facto – facto provado de n.º 3 - desenvolvida no Ponto IV.2.B (violação do artigo 371.º, n.º 1 do CC), (b) ao erro relativo à apreciação da matéria de direito relacionada ao regime jurídico aplicável ao título executivo dos presentes autos – Escritura de Confissão de Dívida - e à Escritura de Cessão de Créditos (foram apresentadas pela Recorrida para sustentar a execução) e, consequentemente, (c) à verificação de inexistência/insuficiência do título executivo. Tal diferença essencial de fundamentação é demonstrada no Ponto III.1. Porém, se assim não se entender, (3) a Revista é Excecional ao abrigo do artigo 672.º, n.º 1, alíneas a) (por estar em causa questão com relevância jurídica respeitante à aplicação do artigo 458.º do CC) e c) (por estar em causa oposição de julgados) do CPC, conforme demonstrado, respetivamente, no Ponto III.2. e no Ponto III.3. Cumprindo o ónus que se lhe competem (afastar aplicação da limitação do n.º 3 do artigo 671.º e atender ao ao n.º 2 do artigo 672.º do CPC),

3.ª Sem embargo de a Revista ser Comum quanto às matérias indicadas no n.º 1 da Conclusão 2.ª precedente, o caso em apreço é de Revista Comum (artigo 671.º, n.ºs 1 e 3 do CPC - vd Ponto III.1), por não estar em causa dupla conforme. A razão? Pese embora duas decisões desfavoráveis aos Recorrentes, decisão de 1.ª instância e a de 2.ª instância têm fundamentos “essencialmente diferentes” pois, em suma, na Sentença, o fundamento legal invocado é o artigo 458.º do CC e a inversão do ónus da prova: os embargos improcedem porque os Embargantes não conseguem provar que a dívida não provém do preço de um contrato sobre participações sociais, isto é, porque não conseguem fazer a prova da inexistência da relação fundamental invocada pela Embargada, ora Recorrida. No Acórdão recorrido, o sentido da decisão é determinado pelo efeito jurídico próprio do documento dado à execução, que é o efeito de "um contrato inominado, cuja validade e eficácia é incontestável à luz do disposto nos arts. 219, 405 e 406 CC" (pág. 49). São estes preceitos que o Tribunal da Relação de Lisboa aplica - ao contrário do que fez o tribunal de 1.ª instância, que aplicou simplesmente o artigo 458.º do CC. Acresce que as considerações finais, feitas nas últimas linhas do Acórdão recorrido que remetem para o artigo 458.º do CC, não têm qualquer relação com a fundamentação antes aduzida, e não se repercutem sobre o juízo de direito essencial sobre o caso – esse juízo alicerça-se na distinção essencial entre o reconhecimento previsto no artigo 458.º do CC e a confissão dada à execução e no efeito do contrato, sujeito ao disposto nos artigos 219.º, 405.ª e 406.º do CPC, que a Relação entendeu (e bem) ser o caso da Escritura de Confissão de Dívida. É este novo e decisivo fundamento que o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa trouxe ao processo que não pode deixar de ser suscetível de apreciação em nova instância.

4.ª Mesmo que não se admita a Revista Comum nos termos antes propugnados quanto às matérias indicadas no n.º 2 da Conclusão 2.ª acima, a Revista é Excecional com fundamento em relevância jurídica (alínea a) do n.º 2 do artigo 672.º c/c alínea a) do n.º 1 do CPC - vd Ponto III.2). Assim o é porque se está perante situação que apresenta contornos e regime próprios, e diz respeito a normas basilares e estruturantes do direito civil e, particularmente, às normas atinentes ao regime da prova, sendo claramente necessária para a melhor aplicação do direito, quer pelos sujeitos do tráfego jurídico que possam ter interesse jurídico ou profissional na resolução de tal questão, de modo a que tomem conhecimento da provável interpretação com que poderão contar, quer pelas instâncias.

Ora, no caso dos autos a aplicação do artigo 458.º do CC se fez ao arrepio daquela que tem sido a jurisprudência constante dos tribunais superiores e do próprio Supremo Tribunal de Justiça – e da hipótese da norma aplicada -, que é a de que este artigo só se aplicar a reconhecimento unilateral de uma dívida, na qual o declarante não reconhece a sua causa ou fonte, no próprio título de confissão de dívida. A laia de exemplo, vejam-se os Acórdãos citados no Ponto III.2. Sucede que, ao arrepio disto, a Relação de Lisboa fez aplicação do preceito (artigo 458.º do CC) a um caso que não só não cabe na sua hipótese, como é distinto das hipóteses a que os Tribunais o aplicam. Mais até. A Relação de Lisboa aceitou que a exequente não fica vinculada pela causa que o contrato – Escritura Pública - expressamente indicou ser a fonte da dívida, com a consequência final de que um reconhecimento contratualmente vinculado a uma fonte ou causa vale, afinal, como ponto de partida para a presunção de qualquer causa que seja ou venha a ser indicada pelo beneficiário, qualquer que seja a sua natureza, ainda que não tenha relação alguma com a fonte estipulada. Ao fazer assim, o Tribunal da Relação de Lisboa violou também, a regra de prova dos artigos 371.º, 372.º e 394.º do CC. Neste sentido há, assim, a entender-se que se fez da aplicação do artigo 458.º do CC uma decisão inovadora, que apresenta uma diferença ou contradição abissal relativamente à jurisprudência constante sobre o preceito.

Por fim, as quaestiso com relevância jurídica têm por referência saber se o regime previsto no artigo 458.º do CC é aplicável às confissões de dívida efetuadas, bilateralmente, em documento autêntico, no qual conste declaração atinente à relação causal subjacente à dívida, e não sendo o regime decorrente desta norma, qual é o regime aplicável às confissões com tais características.

Esperam os Recorrentes que este Superior Tribunal clarifique se,

-À luz do ordenamento jurídico português é admissível aplicar o regime previsto no artigo 458.º do CC, quando no título de confissão de dívida, que constitua um documento autêntico, bilateral, conste uma causa para a dívida;

- A se admitir tal hipótese, como admitiu a Relação de Lisboa e a MM Juíza de 1.ª Instância, não se estaria a por em causa, em especial, o disposto nos artigos 371.º, 372.º, 394.º, 405.º, 406.º, 457.º e 458.º, todos do CC e, bem assim, a harmonia do ordenamento jurídico que faz clara distinção entre o regime de ónus da prova aplicável aos títulos de confissão de dívida autênticos, com causa nele expressa e, aos títulos de confissão de dívida consubstanciados em documentos, autênticos ou não, sem causa nele expressa, como também às confissões de dívida decorrentes de contratos e, às confissões unilaterais de dívida, com consequências importantes nos valores, princípios e regras nucleares desta área do sistema jurídico?

5.ª A Revista é ainda Excecional por oposição de julgados (alínea c) do n.º 2 do artigo 672.º c/c alínea c) do n.º 1 do CPC - Ponto III.3). O aresto sub judice apresenta uma solução de direito diametralmente oposta à defendida no Acórdão Fundamento (do Tribunal da Relação do Porto de 24/11/2022, proferido no Processo n.º 411/21.8T8OVR.P1), onde foi discutida a mesma questão jurídica; concretamente, a aplicação do artigo 458.º do CC. Analisados os dois Acórdãos, que contemplam decisão no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, a contradição de julgados é evidente. Em ambos os casos se está perante confissão de dívida consignada em documento produzido bilateralmente, com força probatória plena, em que há indicação da fonte/origem da dívida confessada. Diferentemente do que sucede com o Acórdão recorrido que aplica o artigo 458.º do CC a uma confissão de dívida bilateral com indicação da causa, o Acórdão Fundamento afirma, claramente, que o referido artigo se aplica a reconhecimentos sem indicação de causa e não àqueles em que "se enuncia expressamente a causa da dívida reconhecida". Entre um e outro há uma diferença fundamental quanto ao alcance que se dá ao disposto no artigo 458.º do CC; aquele aplica o preceito; este último recusa a sua aplicação. Conclui-se que, relativamente ao decidido no Acórdão recorrido, e ao decidido no Acórdão Fundamento, houve decisões opostas sobre a mesma questão fundamental de direito, impondo-se a adoção, in casu, da decisão constante do douto Acórdão Fundamento.

6.ª Sinteticamente, o que esteve na base dos Embargos e foi mal apreciado, quer pela 1.ª instância, quer pelo Tribunal da Relação e impõem a declaração de nulidade do Acórdão recorrido por omissão de pronúncia e a declaração de nulidade por oposição entre os fundamentos e a decisão e, se assim não se entender, a sua revogação e substituição por outro, foi a completa desconsideração da natureza do título dado à execução, do respetivo conteúdo/teor e regime, incluindo probatório que se lhe é aplicável, e bem assim, do objeto da cessão de créditos, apreciações que desembocam na inexistência (ou insuficiência) do título executivo para efeito de prosseguimento da execução. Neste particular, a inexistência do título executivo é questão de conhecimento oficioso (artigo 726.º, n.º 2 c/c o artigo 734.º, n.º 1 do CPC), que pode ser reconhecida pelo Superior Tribunal de Justiça. Isto porque, a confissão de dívida que serve de Título executivo consta de uma Escritura que formaliza um acordo entre dois sujeitos, na qual as partes assumem a existência de uma dívida, e na qual o devedor a confessa e a outra parte a aceita, nos termos estabelecidos, e indicam que a fonte dessa dívida é um empréstimo. Com esse documento, a exequente instaurou a execução, invocando como fonte da dívida a existência de um contrato de venda de participações sociais e que parte do preço deste contrato estaria em falta (Escritura de Confissão de Dívida, - doc n.º 1 ao RE). Diante disto, o Tribunal de 1.ª instância entendeu que a confissão constante do título executivo (não obstante ser emergente de um empréstimo) era apta a fazer uma inversão do ónus da prova sobre a fonte da dívida e que, não obstante a exequente não ter feito mínima prova (escrita) do contrato de compra e venda de participações sociais alegado, e da própria dívida, nem suscitado a falsidade da declaração da Escritura relativa a empréstimo, na visão do Tribunal da Relação a fonte da dívida por si invocada se presume, em consequência do que deveriam ter sido os Embargantes, os ora Recorrentes, a fazerem a prova de que nada deviam por força desse contrato de venda de participações sociais.

7.ª Assim, a questão que se pretende apreciação, por este Supremo Tribunal de Justiça, tem por base os factos sintetizados nos números 1 a 6 do Ponto II.1) e é de fácil enunciado: tratando-se o título dado a execução - Escritura de Confissão de Dívida - de um contrato (conforme vincou a Relação), e valendo este nos seus termos, que incluem a vinculação à causa da dívida, e não de um reconhecimento unilateral sem indicação de causa, pode o Tribunal julgar sem respeitar esses precisos termos, ou seja, sem dar o mínimo relevo a que as partes, no contrato, fixaram como causa da dívida uma relação fundamental distinta, logo na sua natureza jurídica, daquela que a exequente quer fazer valer? Impedir a revisão deste ponto, em Recurso de Revista, será distorcer a dupla conforme e dar-lhe um sentido que é contrário às finalidades que a motivam e que pode até configurar uma denegação de justiça que se reconduza a uma interpretação do n.º 3 do artigo 671.º do CPC contrária à Constituição da República Portuguesa.

Passando a cada um dos FUNDAMENTOS da Revista:

8.ª Nulidade do Acórdão Recorrido por omissão de pronúncia (artigo 615.º n.º 1 alínea d), ex vi do artigo 666.º n.º 1 c/c 608.º, todos do CPC – vd. Ponto IV.1.A). O Tribunal da Relação não pode deixar de apreciar o que se lhe é posto, devendo, assim, conhecer de todas as questões e matérias que lhes são postas nessas conclusões, como decorre dos artigos 3.º n.º 1, 608.º n.º 2, 635.º, n.ºs 3, 4 e 5, 636.º, 639.º n.ºs 1, 2 e 3 e 640.º do CPC. Se assim não atuar viola as referidas disposições legais e incorre em omissão de pronúncia, à luz do artigo 615º nº 1 alínea d) do CPC, o que ocorreu no caso do Acórdão recorrido. Com efeito, não foram apreciadas as seguintes questões essenciais de direito (a) a declaração / confissão de dívida dos autos não é uma confissão “aberta”, sem indicação de causa, como aquelas a que o artigo 458.º do Código Civil (CC) reporta. Ora, a confissão é confissão de uma concreta dívida, daquela dívida, e não uma pura confissão de que se deve algo, sem se indicar a fonte. Sobre isto, o Acórdão recorrido limita-se a referir que é "verdade que na escritura de 4/7/2008 se fala em empréstimo", mas não só não retira qualquer consequência dessa constatação, como não se pronuncia sobre o ponto – suscitado pelos Recorrentes, constante, v,g., das Conclusões 29.ª, 33.ª, 34.ª e 36.ª da apelação (vd Ponto IV.1.A.1.); (b) objeto da aquisição, pela Embargada, ora Recorrida, nos termos da Escritura de Cessão de Créditos. Com efeito, o que a Recorrida apresenta à execução é a confissão – até porque, como resulta da Escritura Pública de Cessão de Créditos, o que a mesma adquiriu dos cedentes foi a posição na Escritura que formaliza a confissão e não um crédito. (vd Ponto IV.1.A.2.); (c) natureza e efeito probatório do concreto título levado à execução (artigo 394.º CC).

O Acórdão recorrido omite também a pronúncia sobre a questão da violação dos artigos 371.º n.º 1, 372.º e 394.º do CC. Esta é uma questão relevante nos autos, que foi expressamente invocada pelos Recorrentes em suas Conclusões 7.ª, 27.ª, 36.ª, 37.ª, 38.ª e 39.ª da apelação. Ora, no caso dos autos o título executivo é uma Escritura de Confissão de Dívida, na qual constam: declaração de confissão de dívida e, declaração que informa a causa da dívida confessada - empréstimo. Não obstante, no requerimento executivo a ora Recorrida alega que a causa da dívida é um contrato de compra e venda de participações sociais, sem suscitar e ilidir as declarações constantes da referida escritura com base em falsidade. Sucede que, para fazer valer a sua alegação de que a dívida confessada provém do referido contrato, a ora Recorrida produziu prova de sua alegação por testemunhas, o que não é admissível à luz do disposto nas disposições legais atrás mencionadas. Mas há mais. A impossibilidade de se admitir esta prova foi invocada e não foi apreciada (vd Ponto IV.1.A.3.).

9.ª Nulidade do Acórdão Recorrido por oposição entre o fundamento e a conclusão/decisão (artigo 615.º n.º 1 alínea c) primeira parte, ex vi do artigo 666.º n.º 1, todos do CPC), conforme devidamente desenvolvido no Ponto IV.1.B.. Para fundamentar a decisão, o Acórdão recorrido desenvolveu o regime do artigo 458.º do CC afastando-o da situação dos autos.

Com efeito, a Relação assumiu estar-se perante um contrato inominado, sendo-lhe aplicáveis os artigos 219.º, 405.º e 406.º do CC, ou seja, as normas respeitantes aos contratos e nos termos do acordo contratual pelo qual é confessada a dívida - na circunstância de o contrato provar plenamente que os embargantes são devedores. Porém, no final, em contradição com os fundamentos, decidiu com base no regime probatório do artigo 458.º c/c 344.º, n.º 1 do CC que contradiz aquilo que vinha sendo afirmado. Na verdade, nas suas últimas linhas (pág. 50-51), o Acórdão recorrido vem falar de um reconhecimento unilateral de dívida e de inversão do ónus da prova e decide à luz do artigo 458.º do CC. Mais até. O Acórdão recorrido não contradiz apenas a jurisprudência anterior – contradiz as suas próprias proclamações que, essas sim, vão na linha da jurisprudência assente.

10.ª Violação da lei processual, concretamente do artigo 651.º c/c o n.º 3 do artigo 423.º, ambos do CPC (error in procedendo), ao não admitir a junção de documentos com as alegações de recurso, quando não estavam em causa documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa, antes documentos cuja junção se tornou necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância, que valorou (sobrevalorizou) o depoimento da testemunha advogada prestado ao arrepio do artigo 92.º, n.º 5 dos EOA c/c 394.º do CC. Com a junção pretendeu-se fazer prova que testemunha também atuava como advogada das empresas objeto de venda (vd. Ponto IV.2.A.1).

11.ª Erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa (parte final do n.º 3 do artigo 674.º do CPC), por: (a) violação do disposto no artigo 92.º do Estatuto da Ordem dos Advogados (“EOA”) c/c o artigo 497.º, n.º 3 do CPC e, dos artigos 195.º a 199.º do CPC. A Relação de Lisboa valorou e atribuiu validade ao depoimento da testemunha advogada, ao arrepio do disposto no artigo 92.º dos EOA c/c o artigo 497, n.º 3 do CPC. Com efeito, à luz das referidas normas a Relação de Lisboa deveria ter desconsiderado o depoimento da testemunha advogada, conforme impõe o artigo 92.º, n.º 5 dos EOA, com as legais consequências na decisão de facto e de direito; além disso, como está em causa depoimento ilícito, deveria ter declarado a nulidade inominada secundária de tal depoimento. Isto porque, a testemunha advogada, em seu depoimento, declarou a prática de atos próprios de advogado sobre elementos essenciais da causa e da decisão (como se pode ouvir nos minutos 00:02:37 a 00:04:47; 00:14:28 a 00:14:50, 00:18:34 a 00:18:55, 00:24:09 a 00:25:20, 00:28:58 a 00:29:25, 00:36:53 a 00:38:41 e, 00:39:55 a 00:41:46 do depoimento da dra. DD, gravado em ficheiro áudio n.º 20221108141040_4563592_2871303.wma da sessão de julgamento de 08/11/2022), sem prévia obtenção de dispensa pelo Presidente do Conselho Regional da Ordem dos Advogados a que está associada, nem, em alternativa, escusou prestar depoimento sobre os referidos factos conforme impõem o artigo 497.º do CPC (vd. Ponto IV.2.A.2); e, (b) violação do disposto nos artigos 371.º, 372.º e 394.º c/c 458.º, todos do CC. Os Recorrentes não concordam com a alteração que a Relação procedeu ao facto provado de n.º 3, nem em ter mantido tal facto como provado. Ora, atendendo ao regime probatório aplicável aos documentos autênticos não se pode considerar prova testemunhal para determinado facto ser dado como provado, quando o mesmo não resulta do teor da Escritura. Com efeito, o declarado na Escritura de Confissão de Dívida não atesta que a dívida confessada de € 1.500.000,00 diz respeito ao valor remanescente do preço de aquisição das participações sociais. Foi considerando o depoimento (ilícito, diga-se) da testemunha advogada que o Tribunal concluiu no sentido de que o referido valor está relacionado ao negócio de venda das participações sociais e de que a dívida confessada está relacionada a este negócio. Acresce que na Escritura há referência a empréstimo, como fonte da dívida confessada, o que não poderia ter sido afastado ou complementado por depoimento testemunhal. O facto provado de n.º 3 deve ser dado como não provado considerando, em primeiro lugar, o que resulta da Escritura de Confissão de Dívida (doc. n.º 1 ao RE) e, também, a seguinte prova: DOCs N.ºs 1 a 4 juntos com a petição inicial (PI), DOC N.ºs 7 a 23 juntos renumerados com o requerimento de 11/04/2022 com a ref.ª citius ......76, e DOC N.ºs 24 a 79 juntos com o requerimento de 04/10/2022 com a ref.ª citius ......63; Docs n.ºs 2 a 6 do RE; depoimento de CC, minutos 00:03:21 a 00:04:47, 00:05:02 a 00:09:57 00:12:44 a 00:14:20, 00:23:54 a 00:24:44, 00:27:47 a 00:28:13 e, 00:30:35 a 00:32:51, gravado em ficheiro áudio n.º 20221123141109_ 4563592_2871303.wma; depoimento de CC, minutos 00:02:26 a 00:08:02, 00:04:23 a 00:05:57, 00:06:38 a 00:07:04 e, 00:09:11 a 00:10:38, gravado em ficheiro áudio n.º 20221108103057_4563592_2871303.wma; depoimento de EE, minutos 00:06:37 a 00:13:44, 00:14:28 a 00:14:41, gravado em ficheiro áudio n.º 20221108111617_ 4563592_2871303.wma; depoimento do Recorrente marido, AA, minutos 00:06:18 a 00:13:40, 00:13:49 a 00:15:44, 00:16:21 a 00: 17:03 e, 00: 17:59 a 00: 19:09, gravado em ficheiro áudio n.º 20221108101134_4563592_2871303. wma. De mais a mais a Recorrida nunca juntou aos autos o alegado contrato de participações sociais (vd. Ponto IV.2.B).

12.ª Violação da lei substantiva, por erro na interpretação e aplicação do direito e de determinação da norma aplicável. Foram violadas as normas dos artigos 219.º, 341.º, 342.º, n.ºs 1 e 2, 344.º, 347.º, 371.º n.º 1, 372.º, 392.º, 394.º n.º 1, 405.º, 406.º, 458.º, 577.º a 588.º do CC, todos do Código Civil (CC), 726.º, n.º 2 alíneas a) e c), 729.º, 731.º, 734.º, n.º 1, todos do CPC (error in judicando). Neste particular, insurgem-se os Recorrentes contra a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa que manteve a decisão de improcedência dos Embargos, considerando: (a) o artigo 458.º c/ 344.º, n.º 1 do CC aplicável ao caso concreto, ao arrepio de se estar perante uma Escritura de Confissão de Dívida (título executivo) celebrada bilateralmente, com relação causal nela expressamente indicada (empréstimo), sem que tivesse sido invocada - e, por consequência, julgada - qualquer falsidade da declaração respetiva, equiparando-a a uma confissão de dívida abstrata a que reporta o artigo 458.º do CC; (b) que com a cessão de créditos foram transmitidos alegados créditos emergentes de um contrato de compra e venda de participações sociais; e, (c) a suficiência e consequente existência do título executivo dado à execução (vd Ponto IV.3).

Passando a cada um destes Erros de Direito,

13.ª O Tribunal da Relação de Lisboa incorreu em Erro de Direito, por ter aplicado, porém mal, o regime previsto no artigo 458.º do CC ao caso concreto. No caso dos autos o título executivo é uma Escritura de Confissão de Dívida celebrada bilateralmente, na qual consta expressa referência a “empréstimo”. Assim, da conjugação das declarações só pode resultar que a relação fundamental da dívida confessada é um empréstimo. Ora, ao arrepio do regime legal probatório aplicável a um documento autêntico, ao decidir como decidiu, a Relação, por um lado, abstraiu por completo do concreto título apresentado à execução e o regime que lhe é aplicável e, por outro lado, considerou que a relação causal subjacente à confissão de dívida foi um contrato de compra e venda de participações sociais (contrato este, sublinhe-se, que a Recorrida não juntou ao requerimento executivo, nem à contestação dos Embargos), aplicando o regime próprio de declarações unilaterais de dívida sem causa expressa no título da confissão, a uma situação em que o título executivo está nos antípodas de uma declaração unilateral de dívida sem causa. Já nas Conclusões, v.g., 13.ª, 27.ª, 29.ª, 33.ª a 39.ª da apelação, os Recorrentes expuseram o seu entendimento quanto ao regime relativo ao artigo 458.º do CC e a sua inaplicabilidade ao caso concreto. Nem mesmo assim o Tribunal da Relação esgrimiu o regime legal corretamente.

Sobre o artigo 458.º do CC, em linha com a jurisprudência e doutrina sobre a matéria, como sublinha o Douto Professor Filipe Cassiano dos Santos nas páginas 8 e 9 do Parecer que os Recorrentes juntaram com o seu recurso de apelação, “A lei portuguesa prevê, no art. 458.º do CCiv, o reconhecimento (ou confissão) de dívida feito por negócio unilateral e sem indicação da causa (mas com causa subjacente e presumida) - instrumento que a prática documenta e que a jurisprudência e a doutrina têm escalpelizado. À luz do que tem sido adquirido nessa elaboração doutrinal e jurisprudencial, pode dizer-se que não levanta dúvidas a afirmação de que o reconhecimento previsto no art. 458.º do CCiv não é um negócio constitutivo de uma obrigação.”. Desta consideração aflora logo que o reconhecimento de dívida regulado pela disposição legal em comento não tem por base o reconhecimento de uma obrigação a cumprir, e não constitui uma dívida por duas ordens de razão: em primeiro lugar, porque esse reconhecimento é uma declaração unilateral e a regra do nosso direito é a de que as meras declarações unilaterais não constituem vínculos obrigacionais, salvo se a lei assim o admitir (artigo 457.º do CC); em segundo lugar, porque a lei toma como hipótese declarações unilaterais que reconhecem um dívida, mas são emitidas “sem indicar a causa”, não sendo admitidos, no ordenamento jurídico português, os chamados negócios abstratos – se não há indicação da causa, a admissão da existência de uma dívida funda apenas a presunção de que a dívida existe e tem – pelo menos pressupõe que tenha - uma causa. E é por isto que o credor “fica dispensado de provar a relação fundamental” (n.º 1 do art. 458.º), isto é, a relação pela qual se constitui o crédito. Este valor que a lei atribui ao reconhecimento corresponde, aliás, ao conteúdo da declaração que nele é aposta e essa declaração vale nos seus precisos termos (por ela, fica estabelecido que o declarante tem uma dívida perante o sujeito que declara ser o credor). Ora, como todo o crédito tem que ter uma causa, numa execução fundada no reconhecimento de dívida no qual não conste a causa fundamental do crédito, ao exequente não basta alegar e provar que tem um crédito, deve invocar a relação da qual emerge o seu crédito e, a titularidade deste crédito.

E o que temos na Confissão de Dívida dos autos? Uma confissão com as características do artigo 458.º do CC? E a que é aplicável o regime desta norma? Ora, analisado o título – Escritura de Confissão de Dívida - o reconhecimento não foi feito por declaração unilateral, mas antes por contrato - um contrato, atípico –, no qual as partes reconheceram que uma devia à outra, naquela data, a quantia de € 1.500.000,00, e que essa dívida tinha por fonte um empréstimo, o que remete para a aplicação de regime jurídico que está nos antípodas do regime jurídico que decorre do artigo 458.º do CC. Remete, prima facie, para os artigos 405.º e 406.º do CC. E esta dimensão bilateral torna a “confissão de dívida” uma fonte de vinculações negociais nos termos em que as partes as assumem, incluindo quanto a alusão à empréstimo, como da causa da dívida reconhecida. A conclusão é óbvia: nos termos da Escritura que serve de título à execução (documento 1 do RE) a confissão não é ela própria fonte dessa obrigação, mas vincula as partes quanto à existência desse empréstimo e de uma dívida dele resultante.

Acresce que, a Escritura de Confissão de Divida é um documento autêntico e a sua força probatória e forma de afastar uma declaração que conste do mesmo, tem regime probatório específico. Dai que, tomando em especial consideração a desconformidade entre a declaração constante do título (causa da dívida ser um “empréstimo”) e a versão da Recorrida constante dos artigos 1 a 4 do requerimento executivo, como o título executivo e a cessão de créditos são Escrituras públicas que têm força probatória plena, cabia à Recorrida, e não aos Recorrentes, que neste caso têm ao seu favor a produção probatória que emerge dos documentos autênticos, suscitar/alegar, fundamentar e demonstrar/provar a falsidade da declaração relativa à empréstimo na Escritura de Confissão de Dívidas e justificar e, neste caso também provar, que a Cessão de Créditos também abrangeu a dívida relativa ao remanescente do preço de um negócio de transmissão de participações sociais, o que a mesma não fez, não sendo aqui admitida a prova testemunhal.

Ora, no caso concreto, estão em causa documentos autênticos, sendo certo que as declarações constantes de documentos desta natureza fazem prova plena até a demonstração de sua falsidade ou nulidade (artigos 341.º, 342.º 371.º n.º 1, 372.º, 458.º c/c 392.º e 394.º n.º 1 do CC). Consequentemente, a se validar a tese da Recorrida e a decisão do Tribunal da Relação, estaria em causa desconformidade do título (divergência entre o declarado pelas partes e a vontade real, o que configuraria a existência de um negócio indireto), de forma que caberia à Recorrida invocar e sustentar a falsidade da declaração para fazer valer a relação causal que indicou nas alegações de 1 a 4 do RE, o que não fez. Assim sendo, andou mal o Tribunal da Relação, que julgou contra legem, tendo, nesta medida, o Acórdão recorrido violado o disposto nas disposições legais acima citadas, decidindo contra toda a doutrina e jurisprudência assente sobre a matéria (vd a laia de exemplo os Acórdãos indicados no Ponto II.2 supra), razão pela qual, atendendo à concreta Escritura de Confissão de Dívida dos autos, os Recorrentes não aceitam a decisão tal como proferida pela Relação de Lisboa, que deve ser revogada e substituída por outra em que se faça a devida aplicação do direito! (vd. Ponto IV.3.A)

14.ª A Recorrida sustentou a sua legitimidade para a execução e o direito ao crédito que arroga possuir na Escritura de Cessão de Créditos (Escritura junta como doc. n.º 3 ao RE).

Sucede, porém, que neste particular, mais uma vez o Acórdão recorrido incorreu em Erro de Direito, pela má aplicação do regime previsto no artigo 577.º até ao 588.º do CC ao caso concreto.

Ora, sem embargo de ser lícito ao credor ceder o crédito que possua sobre alguém, independentemente da participação do devedor no ato de cessão e a sua autorização e aceitação da transmissão do crédito a outrem, a questão fulcral que importa aos autos é saber se um reconhecimento de dívida, seja ele a confissão prevista no artigo 459.º do CC, seja ele outro reconhecimento bilateral, é um ato, em si, constitutivo de um crédito, pois só o sendo, dele pode emergir um crédito que possa ser cedido, nos termos do n.º 1 do artigo 577.º do CC. A resposta é negativa. Pois, à luz do regime aplicável à cessão de créditos, e tendo presente que o negócio base foi a Escritura de Confissão de Dívida, a consequência é óbvia: a cessão dos autos só incidiu sobre o que consta expressamente da Escritura objeto de cessão, e não sobre o alegado contrato de participações sociais. Neste contexto, como sublinha o Professor Filipe Cassiano dos Santos no Parecer junto aos autos, posição que se acompanha, o título de cessão que a Recorrida apresenta é “A cessão do documento em que se reconhece uma dívida, não é a cessão de um crédito: é assim pela razão singela de que não há aí qualquer crédito para ser transmitido e que o que há para ceder é, muito simplesmente, a admissão da dívida e a posição privilegiada quanto à invocação do crédito correspondente, cuja titularidade há-de ter sido adquirida por outra via. (…) Se o quisermos enquadrar e qualificar à luz dos preceitos do regime da cessão de créditos que acima citámos, o reconhecimento de dívida é um dos "meios probatórios do crédito" (usamos a formulação do art. 586.º), que o cedente do crédito tem que entregar aquando da cessão - não é o próprio crédito, nem acto que o represente. (…) Não cremos que haja fundamento para, em geral (isto é, nos reconhecimentos típicos acolhidos na previsão do Código Civil), se entender que a cessão do reconhecimento de dívida envolve tacitamente a cessão do crédito reconhecido ou confessado. O princípio é o de que é a transmissão do crédito que envolve a transmissão dos seus acessórios e meios de prova (art. 586.º), e não esta que envolve aquele - o menos (a transmissão dos meios de prova) pode estar contido no mais (a cessão), mas o mais não estará normalmente contido no menos. “. Deste modo, à luz dos elementos fornecidos pelo processo, é indiscutível que apesar de a Recorrida invocar a titularidade de um crédito sobre os Recorrentes, não é detentora do crédito que indica por não ter adquirido (à luz da Escritura de Cessão de Créditos) o crédito que emerge da relação causal que invoca.

O que quer que os cedentes tenham transmitido à Recorrida, qualquer que seja o efeito jurídico do negócio que foi designado por “cessão de créditos”, a Recorrida, por esse ato, não adquiriu qualquer direito de crédito sobre os Recorrentes. Consequentemente, além de faltar legitimidade à Recorrida para a execução, o título executivo não é suficiente, padece vício porque não certifica a existência da obrigação e do direito correspondente. A conclusão é patente: sendo o meio processual em que a Recorrida invoca o reconhecimento de dívida uma ação executiva, e optando a mesma (enquanto exequente) por apresentar como título executivo o reconhecimento de dívida que adquiriu por “cessão”, para que possa vir a ficar estabelecida a sua titularidade, por via da presunção ou de prova de outro tipo, tem o ónus de alegar a causa pela qual sucedeu aos sujeitos iniciais na relação fundamental. Esta questão, já havia sido colocada à apreciação do Tribunal integrou, v.g., as Conclusões 13.ª, 27.ª e 29.ª a 35.ª de apelação. Não obstante, a Relação abstraiu do regime aplicável e decidiu como decidiu ao arrepio do que decorre das normas legais aplicáveis. Deste modo, com a decisão proferida o Tribunal da Relação de Lisboa violou o disposto nos artigos 219.º, 405.º, 406.º e 577.º a 588.º do CC e 726.º, n.º 2, alíneas a) e c), 726.º, alíneas a) e c) e 734.º do CPC, devendo ser substituída por outra que respeite os preceitos legais aplicáveis à espécie. (vd. Ponto IV.3.B)

15.ª Mais uma vez o Acórdão recorrido errou ao não reconhecer a inexistência do título executivo. Ora, considerando o antes exposto quanto ao título que embasa a execução – Escritura de Confissão de Dívida -, a origem/fonte da dívida que a Recorrida invoca e, a “aquisição do crédito” nos termos que resultam da Escritura de Cessão de Créditos, só se pode concluir que o título executivo é inexistente. Malgrado, a Relação de Lisboa não chegou a esta conclusão óbvia, errando esta Relação, em primeiro lugar, por aplicar regime jurídico não aplicável ao caso concreto (artigo 458.º do CC), invertendo o ónus da prova em detrimento do direito assegurado aos Recorrentes, impondo-lhes um ónus que não se impunha, antes fazendo sobrepor regime probatório não admissível ao caso concreto (prova testemunhal). Errou ainda a Relação de Lisboa ao considerar que a relação causal da alegada dívida integrava o conteúdo da cessão de créditos, quando o que, efetivamente, a Embargada /Recorrida adquiriu ao abrigo da cessão de créditos foi apenas – e só - o que emerge da Escritura de Confissão de Dívida.

Acresce que, para afastar uma declaração constante de Escritura Pública coberta pela força probatória atribuída pelo artigo 371.º do CC, a complementação do título com outro fundamento, que não o contido na Escritura, só seria possível se a Recorrida invocasse a falsidade do que está declarado na Escritura como relação subjacente à confissão de dívida (artigo 372.º do CC), o que a mesma não fez. De mais a mais, no caso em apreço há ainda outra dificuldade: a Recorrida exequente alega que o crédito exequendo provêm de um contrato de participações sociais, mas, como já se afirmou, não faz prova da aquisição de um qualquer crédito que pudesse emergir deste contrato, do que resulta desconformidade entre a declaração constante do título (causa da dívida ser um “empréstimo”) e a versão da Recorrida constante dos artigos 1 a 4 do requerimento executivo. Porém, como o título executivo e a cessão de créditos são Escrituras Públicas que têm força probatória plena, cabia à Recorrida, e não aos Recorrentes, que neste caso têm ao seu favor a produção probatória que emerge dos documentos autênticos, suscitar/alegar, fundamentar e demonstrar/provar a falsidade da declaração relativa à empréstimo na Escritura de Confissão de Dívidas e justificar e, neste caso também provar, que a Cessão de Créditos também abrangeu um qualquer crédito relativo ao remanescente do preço de um negócio de transmissão de participações sociais, o que a mesma não fez não sendo aqui, como se afirmou, admitida a prova testemunhal. Mas não só. Deveria suscitar a falsidade da declaração relativa a empréstimo, porquanto as declarações constantes de documentos autênticos fazem prova plena até a demonstração de sua falsidade ou nulidade (artigos 341.º, 342.º 371.º n.º 1, 372.º, 458.º c/c 392.º e 394.º n.º 1 do CC).

Assim sendo, a se validar a tese da Recorrida, estaria em causa desconformidade do título (divergência entre o declarado pelas partes e a vontade real, o que configuraria a existência de um negócio indireto), o que os Recorrentes invocaram expressamente na apelação e consta, vg. das Conclusões 39.ª, e conduz ao reconhecimento da inexistência do título exequendo. Por fim, a inexistência do título executivo é questão de conhecimento oficioso (artigo 726.º, n.º 2 c/c o artigo 734.º, n.º 1 do CPC), que pode ser reconhecida pelo Superior Tribunal de Justiça, o que se confia venha a acontecer! (Ponto IV.3.C)


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Contra-alegou a recorrida, pugnando a improcedência do recurso.

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Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

Nada obsta à apreciação do mérito da revista.

Com efeito, a situação tributária mostra-se regularizada, o requerimento de interposição do recurso mostra-se tempestivo (artigos 638º e 139º do CPC) e foi apresentado por quem tem legitimidade para o efeito (art.º 631º do CPC) e se encontra devidamente patrocinado (art.º 40º do CPC). Para além de que tal requerimento está devidamente instruído com alegação e conclusões, nada havendo a registar de “anómalo” relativamente ao valor da causa e da sucumbência (ut artº 639º, nº1 do CPC)

A dúvida que se pode por tem a ver com a eventual existência de uma situação de dupla conforme, impeditiva da revista normal.

Dispõe o art. 671.º, n.º 3, do CPC, não é admissível revista normal do acórdão que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância, sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível.

Esta norma consagra, como é consabido, a figura da dupla conforme, como causa impeditiva do direito de recurso para o STJ.

No caso em análise, é manifesto que o tribunal da Relação confirmou, sem voto de vencido, a decisão da 1.ª instância, havendo, pois, que aquilatar se o fez com recurso a fundamentação, no essencial, diferente, a fim de aferir da admissibilidade do presente recurso de revista.

Ainda antes de analisar as decisões em confronto, cumpre deixar expresso que este STJ tem entendido, de forma reiterada, que para afirmar a existência de fundamentação essencialmente diferente não basta que se constante uma qualquer modificação ou alteração da fundamentação, sendo antes indispensável que ocorra uma diversidade estrutural e diametralmente diferente no plano da subsunção do enquadramento normativo da mesma matéria litigiosa.

Destarte, verifica-se uma situação de dupla conformidade decisória apenas “quando a solução jurídica prevalecente na Relação seja inovatória, esteja ancorada em preceitos, interpretações normativas ou institutos jurídicos diversos e autónomos daqueloutros que fundamentaram a sentença apelada, sendo irrelevantes discordâncias que não encerrem um enquadramento jurídico alternativo, ou, pura e simplesmente, seja o reforço argumentativo aduzido pela Relação para sustentar a solução alcançada1.

Nas palavras do acórdão do STJ de 20-02-20202, “só pode considerar-se estarmos perante uma fundamentação essencialmente diferente quando ambas as instâncias divergirem, de modo substancial, no enquadramento jurídico da questão, mostrando-se o mesmo decisivo para a solução final: ou seja, se o acórdão da Relação assentar num enquadramento normativo absolutamente distinto daquele que foi ponderado na sentença de 1.ª instância. Ou, dito ainda de outro modo: quando o acórdão se estribe definitivamente num enquadramento jurídico perfeitamente diverso e radicalmente diferenciado.”3.

A propósito, refere Abrantes Geraldes que “a alusão à natureza essencial da diversidade da fundamentação claramente nos induz a desconsiderar, para o mesmo efeito, discrepâncias marginais, secundárias, periféricas, que não representa, efetivamente um percurso jurídico diverso. O mesmo se diga quanto a diversidade de fundamentação se traduza apenas na recusa, pela Relação, de uma das vias trilhadas para atingir o mesmo resultado ou, do lado inverso, no aditamento de outro fundamento jurídico que não tenha sido considerado ou que não tenha sido admitido, ou no reforço da decisão recorrida através do recurso a outros argumentos, sem pôr em causa a fundamentação usada pelo tribunal de 1.ª instância”4.

No caso dos autos, perscrutadas as decisões em confronto, muito embora as instâncias tenham concluído no mesmo sentido, a verdade é que o fizeram por apelo a um enquadramento jurídico distinto.

Efectivamente, enquanto a 1.ª instância considerou que o título executivo se tratava de um reconhecimento unilateral de dívida, o tribunal da Relação qualificou o referido título como um verdadeiro contrato de confissão de dívida, o que configura uma fundamentação, no essencial, distinta por ser distinto o enquadramento jurídico dispensado ao caso.

Resulta, assim, que não se verificam obstáculos à admissibilidade da revista.


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Considerando que o objecto do recurso (o “thema decidendum”) é estabelecido pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo daquelas cujo conhecimento oficioso se imponha, atento o estatuído nas disposições conjugadas dos artigos 663º nº 2, 608º nº 2, 635º nº 4 e 639º nºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil (CPC), as questões a decidir são as seguintes:

consistem em saber:

I. Da Nulidade do acórdão recorrido por omissão de pronúncia;

II. Da nulidade do acórdão recorrido por oposição entre os fundamentos e a decisão;

III. Do erro de julgamento na não admissão da junção de documentos em sede de apelação;

IV. Da violação de sigilo profissional do advogado;

V. Da violação da lei substantiva:

a. Erro de julgamento quanto à existência e exequibilidade do título executivo.

b. Erro de julgamento por errada aplicação do regime prevista no art. 577.º do CC;

c. Violação de regras de direito probatório material

d. Erro de julgamento por aplicação do regime constante do art. 458.º do CC;


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III – FUNDAMENTAÇÃO

III. 1. FACTOS PROVADOS

É a seguinte a matéria de facto provada (na Relação após impugnação em recurso – estando a negrito os factos aditados pela Relação):

1. Em Julho de 2008, os Embargantes acordaram com CC e mulher FF, a aquisição das seguintes participações sociais:

a) 6750 acções da sociedade T...Imobiliária, S.A., pessoa coletiva n.º ... ... .72, cada uma no valor de € 50 (cinquenta euros), tudo no valor total de € 337.500 (trezentos e trinta e sete mil e quinhentos euros);

b) 1350 acções da sociedade The L..., S.A., pessoa coletiva n.º ... ... .09, cada uma no valor de € 50 (cinquenta euros), tudo no valor total de € 67.500 (sessenta e sete mil e quinhentos euros); e

c) uma quota no valor de € 2.250 (dois mil duzentos e cinquenta euros) do capital da sociedade Escola . . ., Lda., pessoa coletiva n.º ... ... .04, quota essa da titularidade da empresa “I..., Lda., da qual CC e FF eram sócios.

2. As participações sociais mencionadas em 1. eram representativas, em cada uma das referidas sociedades, de 45% dos respectivos capitais sociais.

3. As participações sociais mencionadas em 1. foram transaccionadas por um valor global muito superior à soma dos valores nominais das participações sociais, o que teve em conta avaliação da sociedade T...Imobiliária, S.A. única com valor patrimonial, de que os embargantes apenas pagaram o valor mencionado em 4, remanescendo o valor constante da escritura de confissão de dívida.

4. Em Julho de 2008, os Embargantes pagaram a CC e FF, por meio de cheque, a quantia de € 750.000 (setecentos e cinquenta mil euros, por conta de parte do preço mencionado em 3.

5. Por escritura pública outorgada em 4 de Julho de 2008, intitulada “Confissão de dívida com penhor e procuração”, os ora Embargantes, na qualidade de primeiros outorgantes e CC e cônjuge, FF, na qualidade de segundos outorgantes, declararam o seguinte:

“(…) que eles, primeiros outorgantes confessam-se devedores aos segundos outorgantes, da quantia de um milhão e quinhentos mil euros.

O referido montante será titulado pelos cheques números (…), cujo valor apenso nos mesmos corresponde à totalidade do capital em dívida que será liquidado em três prestações, iguais, de quinhentos mil euros, cada uma, de acordo com o seguinte plano:

- A primeira prestação será liquidada até trinta de Julho de dois mil e onze;

- A segunda prestação será liquidada até trinta de Julho de dois mil e catorze; e

- A terceira prestação será liquidada até trinta de Outubro de dois mil e catorze;

Para garantia do capital em dívida, respectivos juros remuneratórios e de mora e demais encargos os primeiros contraentes constituem a favor dos segundos outorgantes penhor sobre as acções e quotas, correspondentes a quarenta e cinco por cento do capital social de que são titulares directa ou indirectamente, livres de quaisquer ónus ou encargos, nas sociedades:

“The L..., S.A.” (…), com o capital de cento e cinquenta mil euros. “T...Imobiliária, S.A.” (…), com o capital social de setecentos e cinquenta mil euros.

“Escola..., S.A.” (…), com o capital social de cem mil euros. “Escola . . ., Lda.” (…), com o capital social de cinco mil euros; “Colégio..., Lda” (…), com o capital social de cinco mil euros.

As acima referidas acções ficam na posse dos segundos outorgantes investidos na qualidade de fiéis depositários das mesmas e desde já mandatados pelos primeiros outorgantes para, em caso de mora no pagamento da dívida pela presente titulada, procederem à sua venda extrajudicial, podendo fazer negócio consigo mesmo, receber o produto da sua venda e dar quitação.

O empréstimo vence juros a uma taxa de quatro por cento ou a que for fixada por Portaria, caso seja mais elevada, a que acresce quatro por cento em caso de mora. O pagamento da totalidade da dívida torna-se exigível em caso de incumprimentos do seu pagamento, nos montantes e nas datas acordadas e ainda se sobre as acções e participações penhoradas vier a incidir qualquer ónus ou encargo.

Correrão por conta da parte devedora e serão por ela pagas quaisquer despesas ou encargos relacionados com a celebração, segurança, execução e extinção da presente dívida.

À presente confissão de dívida atribuem força de título executivo nos termos da alínea c) do art.º 46 do Código do Processo Civil.

(…).”

6. Em 6 de Julho de 2008, CC e FF, em representação da empresa “I..., Lda, consideraram integralmente liquidado o preço acordado (€ 2.250) para a cessão da quota da sociedade Escola . . ., Lda., dando a respectiva quitação.

7. Em 7 de Julho de 2008, CC e FF consideraram integralmente liquidado o preço acordado (€ 67.500) para a venda das acções da sociedade The L..., S.A., dando a respectiva quitação.

8. Em 26 de Julho de 2011, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 50.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A.

9. Em 20 de Dezembro de 2011, o Embargante AA emitiu um cheque sacado s/ Banco BPI, à ordem da T...Imobiliária, S.A., no valor de € 49.000, o qual foi apresentado a pagamento em 22 de Dezembro de 2011.

10. Por carta datada de 10 de Abril de 2012, dirigida aos Embargantes, CC comunicava-lhes o seguinte:

“(…) Como é do vosso conhecimento são Vªs Exªs devedores, a mim e à minha mulher, da quantia de € 1.500.000 (um milhão e quinhentos mil euros), conforme resulta da confissão e dívida outorgada no Cartório Notarial (…) em 04 de Julho de 2008. Sucede que ao contrário do previsto naquele contrato não estão a ser cumpridos os pagamentos nele previstos, encontrando-se por liquidar a quantia de € 500.000,00 (quinhentos mil euros), vencida em 30 de Julho de 2011, tal como não foram liquidados os juros devidos e previstos no dito acordo de confissão de dívida e pagamento. Acresce que, face ao facto de existir uma relação de confiança entre as partes, os cheques indicados no aludido acordo, que seriam sacados sobre o Banco BPI, nunca nos foram entregues.

Não obstante estes factos, e porque sempre foi nossa intenção salvaguardar, antes de mais, a relação entre os intervenientes neste negócio, até à presente data não foi executado o acordo de pagamento, não obstante existir incumprimento do mesmo. Contudo, não só pelos montantes envolvidos, mas também por responsabilidades assumidas perante terceiros, importa definir e obter uma solução para este assunto, razão pela qual solicito que procedam ao pagamento das quantias já vencidas, no prazo máximo de 15 dias, sob pena de se considerar o contrato como incumprido, com todas as legais consequências. (…).”

11. Em 6 de Julho de 2012, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 30.000 para conta bancária titulada pela Escola . . ., Lda..

12. Em 6 de Julho de 2012, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 30.000 para conta bancária titulada pela Escola . . ., Lda..

13. Em 27 de Julho de 2012, o Embargante AA emitiu um cheque sacado s/ Banco Espírito Santo, S.A., à ordem da Escola . . ., Lda., no valor de € 10.000, o qual foi apresentado a pagamento em 31 de Julho de 2012.

14. Em 7 de Janeiro de 2013, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 31.067,73 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A.

15. Em 10 de Julho de 2013, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 27.500 para conta bancária titulada pela Escola . . ., Lda..

16. Em 10 de Julho de 2013, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 12.500 para conta bancária titulada pela Escola . . ., Lda..

17. Em 10 de Julho de 2013, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 10.000 para conta bancária titulada pela Escola . . ., Lda..

18. Em 10 de Julho de 2013, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 10.000 para conta bancária titulada pela Escola . . ., Lda..

19. Em 10 de Julho de 2013, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 7.257,52 para conta bancária titulada pela Escola . . ., Lda..

20. Por escritura pública intitulada “cessão de créditos”, outorgada em 10 de Julho de 2013, CC e FF, na qualidade de primeiros outorgantes e cedentes e a ora Embargada, na qualidade de segunda outorgante e cessionária, declararam o seguinte:

“Que os CEDENTES são titulares de um crédito sobre AA (…) e mulher BB (…), adiante designados por Devedores, proveniente de um contrato de Confissão de Dívida com Penhor, no montante de um milhão e quinhentos mil euros, celebrado por escritura pública outorgada em quatro de Julho de dois mil e oito, (…), mantendo-se em dívida, na presente data, pelo referido valor de UM MILHÃO E QUINHENTOS MIL EUROS. (…)

Que, pela presente escritura eles, primeiros outorgantes, CEDEM à cessionária “Improve People, S.A.”, nos termos do artigo 577.º e seguintes do Código Civil, o crédito atrás identificado, acompanhado das referidas garantias. (…)

Que a presente cessão importa a transmissão para a sociedade CESSIONÁRIA de todas as garantias e outros acessórios do crédito ora cedido. (…).”

21. Por cartas datadas de 29 de Agosto de 2013, CC e FF comunicavam aos ora Embargantes o seguinte: “(…)Vimos pela presente comunicar que ao abrigo do vertido no artigo 577.º do Código Civil e, em cumprimento do disposto no artigo 583º nº 1 do mesmo diploma legal, procedemos por meio de acto notarial realizado em 10 de Julho de 2013, à cedência a terceiros dos créditos e demais garantias, inerentes ao contrato de Confissão de Dívida com Penhor, supra mencionado, e celebrado com Vªs. Exªs. em 4 de Julho de 2008 (…).

Os créditos e garantias respeitantes aos mesmos foram transmitidos à firma IMPROVE PEOPLE, S.A. (…). Por conseguinte, e nos termos da lei aplicável, com a cessão dos créditos foram transmitidos igualmente todos os direitos, garantias e acessórios que se encontram associados ao crédito em causa, Designadamente o direito de obter o cumprimento judicial ou extrajudicial das obrigações.

Com a presente comunicação, e a partir da data em que a presente cessão produz os seus efeitos, todos os aspectos e vicissitudes relacionados com o crédito transmitido serão assumidos pela cessionária IMPROVE PEOPLE, S.A., mantendo-se inalterados os termos acordados no acordo de confissão de dívida e pagamento celebrado com Vªs. Exªs. (…).”

22. As cartas mencionadas em 21. foram recebidas em 2 de Setembro de 2013.

23. Por carta datada de 2 de Outubro de 2013, dirigida aos Embargantes, a Embargada comunicava-lhes o seguinte:

“(…)

Vimos por este meio confirmar, na sequência da reunião ocorrida no passado dia 16 de Setembro de 2013, que o contrato supra mencionado já se encontra na fase de contencioso, face ao incumprimento do mesmo, pelo que, de acordo com o clausulado naquela declaração de confissão e dívida, a qual foi adquirida por esta empresa, conforme comunicações efectuadas em, respectivamente, 9 de Agosto de 2013 e 30 de Agosto de 2013 (…) a quantia em dívida já se encontra integralmente vencida.

Mais se informa que, face ao clausulado no contrato de confissão de dívida, o montante atualmente em dívida é aquele que abaixo se descrimina:

Capital - € 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil euros).

Juros – devidos desde 4 de Julho de 2008, à taxa de 4%, até 30 de Julho de 2011, no montante de € 184.273,97.

Juros – devidos desde 31 de Julho de 2011, à taxa de 8%, até 4 de Outubro de 2013, no montante de € 261.698,63.

Assim, para efetuar o pagamento do montante total em dívida, no valor de € 1.945.972,60 (um milhão novecentos e quarenta e cinco mil novecentos e setenta e dois euros e sessenta cêntimos) deverá Vª Exª remeter um cheque à ordem da credora, IMPROVE PEOPLE, S.A.

(…), valor que deverá ser regularizado, no prazo máximo de 8 dias, a contar da data de recepção desta missiva, sob pena de a mesma vir a ser reclamada judicialmente.

(…).”

24. Por carta datada de 8 de Outubro de 2013, em resposta à carta mencionada em 23., o mandatário dos Embargantes comunicava à Embargante o seguinte:

“(…)

Na sequência da carta acima referida, vimos reiterar, por incumbência do n/Cliente, que não existe qualquer crédito que possa ser accionado, sendo certo que V. Exas. não provaram a existência do mesmo, nem, tão pouco, remeteram documentação que o suporte. Deste modo e como não poderão ignorar, caso V. Exas. Venham a promover qualquer medida que possa causar danos pessoais ou patrimoniais ao n/Cliente, ficarão responsáveis pelas consequências que daí advierem.

(…).”

25. A carta mencionada em 24. foi recebida pela Embargada em 10 de Outubro de 2013.

26. Em 3 de Janeiro de 2014, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 21.500 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A.

27. Em 8 de Outubro de 2014, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 10.000 para conta bancária titulada pela Escola . . ., Lda. (Escola . . ., Lda.).

28. Em 9 de Outubro de 2014, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 10.000 para conta bancária titulada pela Escola . . ., Lda..

29. Em 10 de Outubro de 2014, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 6.950,41 para conta bancária titulada pela Escola . . ., Lda..

30. Em 7 de Janeiro de 2015, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 18.183,65 para conta bancária titulada pela Escola . . ., Lda..

31. Em 27 de Março de 2015, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 11.780,40 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A.

32. Em 30 de Março de 2015, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 14.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A.

33. Em 31 de Março de 2015, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 6.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A.

34. Em 27 de Julho de 2015, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 5.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

35. Em 28 de Julho de 2015, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 5.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A.

36. Em 29 de Julho de 2015, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 3.434,70 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

37. Em 6 de Janeiro de 2016, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 9.317,58 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A..

38. Em 6 de Janeiro de 2016, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 8.140 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos”.

39. Em 7 de Janeiro de 2016, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 2.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos”.

40. Em 8 de Janeiro de 2016, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 2.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos”.

41. Em 30 de Março de 2016, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 5.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

42. Em 31 de Março de 2016, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 5.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

43. Em 31 de Março de 2016, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 5.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

44. Em 1 de Abril de 2016, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 5.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

45. Em 4 de Abril de 2016, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 5.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

46. Em 4 de Abril de 2016, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 3.257,44 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

47. Em 23 de Junho de 2016, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 2.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

48. Em 23 de Junho de 2016, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 6.500 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

49. Em 27 de Junho de 2016, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 2.000 para conta bancária titulada pela Escola . . ., Lda., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

50. Em 27 de Junho de 2016, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 10.000 para conta bancária titulada pela Escola . . ., Lda., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

51. Em 28 de Junho de 2016, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 4.500 para conta bancária titulada pela Escola . . ., Lda., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

52. Em 28 de Junho de 2016, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 6.500 para conta bancária titulada pela Escola . . ., Lda., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

53. Em 11 de Julho de 2016, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 5.000 para conta bancária titulada pela Escola . . ., Lda., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

54. Em 12 de Julho de 2016, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 5.000 para conta bancária titulada pela Escola . . ., Lda., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

55. Em 12 de Julho de 2016, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 10.000 para conta bancária titulada pela Escola . . ., Lda., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

56. Em 13 de Julho de 2016, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 5.000 para conta bancária titulada pela Escola . . ., Lda., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

57. Em 14 de Julho de 2016, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 4.250 para conta bancária titulada pela Escola . . ., Lda., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

58. Em 30 de Dezembro de 2016, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 5.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

59. Em 30 de Dezembro de 2016, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 8.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

60. Em 2 de Janeiro de 2017, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 8.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

61. Em 3 de Abril de 2017, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 5.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

62. Em 4 de Abril de 2017, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 5.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

63. Em 4 de Abril de 2017, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 10.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

64. Em 5 de Abril de 2017, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 5.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

65. Em 5 de Abril de 2017, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 8.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

66. Em 7 de Abril de 2017, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 3.688,71 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

67. Em 28 de Junho de 2017, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 10.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

68. Em 28 de Junho de 2017, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 5.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”. 69. Em 29 de Junho de 2017, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 10.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

70. Em 29 de Junho de 2017, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 5.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

71. Em 30 de Junho de 2017, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 1.500 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

72. Em 11 de Julho de 2017, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 8.000 para conta bancária titulada pela Escola . . ., Lda., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

73. Em 12 de Julho de 2017, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 10.000 para conta bancária titulada pela Escola . . ., Lda., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

74. Em 14 de Julho de 2017, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 5.000 para conta bancária titulada pela Escola . . ., Lda., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

75. Em 21 de Julho de 2017, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 5.000 para conta bancária titulada pela Escola . . ., Lda., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

76. Em 31 de Julho de 2017, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 1.250 para conta bancária titulada pela Escola . . ., Lda., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

77. Em 19 de Março de 2018, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 5.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

78. Em 27 de Março de 2018, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 5.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”. 79. Em 28 de Março de 2018, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de € 8.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

80. Em 3 de Abril de 2018, o Embargante AA efectuou a transferência da quantia de €3.000 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A., constando do respectivo descritivo “suprimentos AA”.

Factos não provados:

i) Os Embargantes pagaram o remanescente (€ 1.500.000) do preço acordado pela aquisição das acções da sociedade T...Imobiliária, S.A.

ii) No âmbito das negociações para aquisição por parte dos ora Embargantes, das participações sociais nas referidas sociedades foi acordado entre as partes que aqueles adquiriam as mesmas, obrigando-se a contribuir, em dinheiro, sempre que fosse necessário e até ao limite de € 1.500.000, para o desenvolvimento das actividades das sociedades Escola . . ., Lda. e T... e T...Imobiliária, S.A..

iii) Com a outorga da escritura mencionada em 5., as partes pretenderam assegurar o cumprimento do acordo assumido entre os outorgantes e supra mencionado em ii).

iv) Os pagamentos aludidos em 4., 8., 9., 11. a 19., 26. a 80. destinaram-se à execução do acordo supra mencionado em ii).

v) Em 3 de Janeiro de 2014, os Embargantes efectuaram a transferência da quantia de € 20.166 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A.

vi) Em 2 de Abril de 2014, os Embargantes efectuaram a transferência da quantia de € 24.750 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A.

vii) Em 3 de Julho de 2014, os Embargantes efectuaram a transferência da quantia de € 31.500 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A.

viii) Em 16 de Julho de 2014, os Embargantes efectuaram a transferência da quantia de € 29.250 para conta bancária titulada pela Escola . . ., Lda..

ix) Em 3 de Julho de 2015, os Embargantes efectuaram a transferência da quantia de € 31.500 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A.

x) Em 13 de Julho de 2015, os Embargantes efectuaram a transferência da quantia de € 29.250 para conta bancária titulada pela T...Imobiliária, S.A.


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III. 2. DO MÉRITO DO RECURSO

Analisemos, então, as questões suscitadas na revista.

DA NULIDADE DO ACÓRDÃO RECORRIDO POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA

Invocam os recorrentes a nulidade do acórdão recorrido por omissão de pronúncia por considerarem, no essencial, que o tribunal da Relação não se pronunciou sobre se “(i) a declaração / confissão de dívida dos autos não é uma confissão “aberta”, sem indicação de causa, como aquelas a que o artigo 458.º do Código Civil (CC) reporta; (ii) objeto da aquisição, pela Embargada, ora Recorrida, nos termos da Escritura de Cessão de Créditos; (iii) natureza e efeito probatório do concreto título levado à execução, nos termos preconizados pelo artigo 394.º CC.”.

No que concerne à invocada nulidade por omissão de pronúncia, o STJ tem-se pronunciado, de forma unânime, no sentido de que apenas a total ausência de pronúncia sobre as questões objecto de decisão gera o apontado vício.

Como é sabido, a invocada nulidade encontra-se relacionada com o comando normativo ínsito no art. 608.º, n.º 2, do CPC, segundo o qual “O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.” e verifica-se quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar – cfr. art. 615.º, n.º 1, al. d), do CPC.

Quanto à invocada nulidade por omissão de pronúncia, este STJ tem vindo a entender, de forma pacífica, que “a nulidade da decisão por omissão de pronúncia apenas se verificará nos casos em que ocorra omissão absoluta de conhecimentos relativamente a cada questão e já não quando seja meramente deficiente ou quando se tenham descurado as razões e argumentos invocados pelas partes5.

Atentemos no caso em apreço nos autos.

No que concerne à questão de saber se a declaração/confissão de dívida não é uma confissão aberta, sem indicação de causa, o tribunal da Relação deixou escrito que “Mais do que um reconhecimento de dívida ilidível nos termos do artº 458º CC, [o contrato de confissão de dívida] prova plenamente que os embargantes são devedores do mencionando CC e cônjuge de um milhão e quinhentos mil euros a serem pagos da forma ali convencionada com penhor das mencionadas acções. (…) Verdade que na referida escritura de 4/7/2008 se fala em empréstimo que verdadeiramente não se prova existir antes um crédito por cessão de participações sociais parcialmente pago. (…) O facto de a embargada não ter logrado provar a causa negocial da dívida inicialmente alegada e reflectida na própria escritura de contrato de confissão de dívida de cujo correspondente crédito é cessionária, ou seja os factos consubstanciadoras do alegado contrato de mútuo, alegando depois na resposta aos embargos e na sequência do por estes alegado em relação ao negócio causal que este na verdade foi um negócio de transmissão global de participações sociais por um valor ainda que não concretamente apurado de que os embargados pagaram parte remanescendo aquele que consta da escritura de confissão de dívida, não significa que a dívida cuja existência os embargantes reconhecem na escritura, que não tenha uma causa, causa essa cuja alegação e prova tal como o por si alegado nos embargos, atenta a invocação do comprovado reconhecimento unilateral de dívida passou a caber-lhe.”.

Como resulta da leitura deste segmento do acórdão recorrido, resulta evidente que o tribunal da Relação se pronunciou sobre esta questão colocada pelos recorrentes, concluindo, no essencial, que existe uma confissão de dívida que prova, plenamente, que os embargantes são devedores da quantia de € 1 500 000,00 e que essa dívida tem uma causa que corresponde ao negócio de transmissão de participações sociais e cuja prova foi realizada nos autos.

Como é evidente, saber se o tribunal recorrido decidiu bem ou mal ou ainda se devia ter desenvolvido a sua argumentação jurídica é matéria que se prende com um eventual erro de julgamento e não com a eventual nulidade por omissão de pronúncia, que, de todo, não se verifica.

E que dizer no que respeita às questões de saber qual o objeto da aquisição, pela Embargada, ora Recorrida, nos termos da Escritura de Cessão de Créditos natureza e qual o efeito probatório do concreto título levado à execução, nos termos preconizados pelo artigo 394.º CC?

Analisadas as alegações de recurso, cumpre consignar que estão em causa as seguintes questões: i) saber se a cessão de crédito de uma escritura de reconhecimento de dívida configura uma cessão de créditos (relativamente ao crédito que motivou a confissão), matéria que se prende com a legitimidade substantiva da recorrente e ii) saber se, não tendo sido invocada a falsidade do documento autêntico junto aos autos como título executivo, era admissível a prova testemunhal sobre a causa da confissão de dívida para se concluir por uma causa distinta da que consta do referido documento autêntico.

Estas questões foram colocadas em sede de alegações de recurso.

Ora, analisado o acórdão recorrido resulta à evidência que estas questões foram conhecidas pelo acórdão recorrido.

De facto, no que concerne à invocada violação de regras de direito probatório material, na decisão ora em sindicância, o tribunal da Relação ponderou a prova produzida e proferiu decisão quanto à matéria de facto, considerando e reapreciando a prova testemunhal e documental produzida. Como é evidente, ainda que não tenha analisado a questão em análise de forma expressa, a verdade é que o fez de forma implícita, ao considerar relevante a prova testemunhal produzida nos autos, o que afasta, por si só, a invocada nulidade por omissão de pronúncia. O mesmo é dizer que o tribunal da Relação ao considerar a prova testemunhal produzida afirmou, implicitamente, que tal prova era admissível.

Ora, este STJ tem vindo a decidir que não há omissão de pronúncia sempre que a matéria tida por omissa ficou implícita ou tacitamente decidida no julgamento da matéria com ela relacionada6.

Como já se deixou escrito, no âmbito da nulidade da decisão não importa aferir se a Relação decidiu bem ou mal, matéria que, naturalmente, será analisada em sede de mérito.

No que concerne à questão atinente à titularidade do crédito exequendo, o tribunal da Relação deixou expresso “O facto de a embargada não ter logrado provar a causa negocial da dívida inicialmente alegada e reflectida na própria escritura de contrato de confissão de dívida de cujo correspondente crédito é cessionária, ou seja, os factos consubstanciadoras do alegado contrato de mútuo”. Mais uma vez, fica claro que o tribunal da Relação deixou expresso o entendimento de que a exequente é cessionária do crédito correspondente à confissão de dívida.

Esta pronúncia é expressa e ocorreu em sede de decisão de mérito.

Não se verifica, assim, a invocada nulidade.

DA NULIDADE DO ACÓRDÃO RECORRIDO POR OPOSIÇÃO ENTRE OS FUNDAMENTOS E A DECISÃO

Neste ponto, invocam os recorrentes, em suma, que “no Acórdão recorrido foram desenvolvidos fundamentos atinentes ao conteúdo e ao regime probatório do concreto título exequendo assimilando-o a um contrato com causa da dívida confessada no próprio título; malgrado, em contradição com os fundamentos que expendeu, veio a proferir a decisão sustentada em regime jurídico de declaração unilateral sem causa (artigo 458.º do CC), que é completamente distinto daquele que antes desenvolveu e associou ao título executivo dos autos – a Escritura de Confissão de Dívida - (efetivamente o aplicável ao caso concreto).”.

Consideram, assim, os recorrentes que na decisão recorrida há oposição entre os fundamentos e a decisão.

Dispõe o mencionado art. 615.º, n.º 1, al. c), do CPC, aplicável ex vi art. 666.º, n.º 1, do mesmo Código, que “é nula a sentença quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível”.

Ora, este STJ tem vindo a propugnar, de forma reiterada, o entendimento de que tal nulidade “pressupõe um erro de raciocínio lógico consistente em a decisão emitida ser contrária à que seria imposta pelos fundamentos de facto ou de direito de que o juiz se serviu ao proferi-la7.

No caso em apreciação não ocorre a invocada nulidade.

De facto, o que sucede nos autos é que, como os próprios recorrentes reconhecem, os fundamentos em que assenta a decisão recorrida se podem assumir, entre si, contraditórios. Na verdade, o que os recorrentes afirmam é que não é possível, a um só tempo, considerar que se está perante um contrato de confissão de dívida e aplicar o regime constante do disposto no art. 458.º do CC, relativo ao reconhecimento unilateral de dívida.

Sucede que não se verifica aqui qualquer erro de raciocínio lógico que impusesse uma decisão distinta da que foi alcançada pelo tribunal da Relação, havendo, no limite, erro de julgamento quanto ao regime jurídico aplicável.

Ou seja, reitera-se que não releva, neste conspecto, aferir do acerto da decisão recorrida, mas tão-só verificar se a dita contradição se verifica. Resposta que não pode deixar de ser negativa.

Assim se não verifica a invocada nulidade.

DO ERRO DE JULGAMENTO NA NÃO ADMISSÃO DA JUNÇÃO DE DOCUMENTOS EM SEDE DE APELAÇÃO E DO IMPEDIMENTO DE PRESTAÇÃO DE DEPOIMENTO POR FORÇA DO DEVER DE SGILO PROFISSIONAL DO ADVOGADO

Inconformados com a decisão que rejeitou a junção de documentos apresentados em fase de recurso, invocam os recorrentes que tal junção deve ser determinada por se ter tornado necessária em face da decisão final proferida pela 1.ª instância.

Está em causa a junção aos autos de documentos que visam demonstrar que DD exerceu funções como advogada do grupo de empresas integrado pelas sociedades T..., T...-GE e Escola . . ., Lda. e que, como tal, estaria impedida de prestar depoimento por força do sigilo profissional a que está obrigada, nos termos do disposto no art. 92.º do EOA.

O tribunal recorrido escreveu a este propósito que “o recorrente, em sede de recurso, pode juntar documentos cuja apresentação não tenha sido possível até ao momento das alegações, quando o resultado do julgamento se revele surpreendente relativamente ao expectável dos elementos constantes do processo, não podendo ser juntos documentos para prova de factos que já antes da sentença a parte sabia estarem sujeitos a prova, não podendo servir de pretexto a surpresa da sentença.3 Nada disto ocorre nenhuma razão existe para a junção dos documentos que os apelantes pretende juntar que devem ser entregues aos recorrente transitada que esteja este acórdão”.

Como refere o STJ, em acórdão de 23-04-20208, “II - A junção de documentos na fase de recurso não só é excecional como depende da alegação e prova, por parte do apresentante de uma de duas situações: (i) da impossibilidade de apresentação do documento até ao encerramento da discussão em primeira instância, exigindo-se, neste caso, a demonstração pelo interessado na sua junção da superveniência objetiva (por o documento se ter formado depois daquele momento) ou subjetiva (por o documento, não obstante existir anteriormente, só se ter tornado conhecido do apresentante em momento posterior ao encerramento da discussão e por razões que, num quadro de normal diligência, revelem a impossibilidade do mesmo ter tido conhecimento anterior da existência do documento); (ii) da junção do documento ter-se tornado necessária em virtude do julgamento em primeira instância, ou seja, quando o julgamento da primeira instância tenha introduzido na ação um elemento de novidade que torne necessária a consideração de prova documental adicional.”

Sabido que a junção de documentos na fase de recurso assume um caráter excepcional, importa apreciar se a junção pretendida devia ter sido admitida pelo tribunal da Relação.

Consideramos que sim.

Das consequências da violação do dever de sigilo profissional do advogado

A matéria atinente às consequências da violação do segredo profissional tem vindo a criar, ao nível do STJ, uma divergência jurisprudencial.

Para uns, a prestação de depoimento em violação do sigilo profissional do advogado configura “nulidade processual inominada a ser invocada pelo interessado, sob pena de sanação9

Já outros propugnam o entendimento de que “33.O caso específico em violação do dever de sigilo profissional do advogado, esse, não pode reconduzir-se ao conceito e, sobretudo, não pode reconduzir-se ao regime das nulidades processuais secundárias:

34. O artigo 92.º, n.º 5, do Estatuto da Ordem dos Advogados ao determinar que “[os] actos praticados pelo advogado com violação de segredo profissional não podem fazer prova em juízo”, contém uma cominação específica….

(…)36. Entendendo-se, como se entende, que o depoimento prestado em violação do sigilo profissional do advogado determina a aplicação de um regime autónomo, distinto do regime das nulidades processuais, deve conhecer-se do vício e decidir-se a terceira questão — se deve ser determinada a anulação de todo o processo a partir do depoimento do Dr. FF e o regresso à fase processual em que deveria ter sido requerido o incidente de levantamento do sigilo profissional.”10.

Entendemos ser esta última posição a mais acertada.

Por um lado, o legislador, no âmbito do já mencionado art. 92.º do EOA, deixou expresso que “os atos praticados pelo advogado com violação de segredo profissional não podem fazer prova em juízo.”. Esta redação remete-nos para o campo das proibições de prova, cujo regime é, como é sabido, autónomo face ao regime das nulidades processuais.

Como se explica no último acórdão citado do STJ, “Estamos perante uma proibição de valoração da prova, tendo essa proibição um tratamento autónomo do que se encontra previsto para as nulidades processuais, podendo, designadamente, tal infração ser conhecida em recurso, sem que a nulidade da produção do respetivo meio de prova tenha que ser arguida nos termos previstos no artigo 199.º do Código de Processo Civil.”11.

Por outro lado, importa não esquecer que subjacente ao sigilo profissional existem razões de interesse público que visam tutelar não só a relação de confiança entre o advogado e o cliente, como garantir a relação de confiança entre o advogado e o cliente, dignificar a função do advogado enquanto agente ativo na administração da justiça e promover o papel essencial do advogado na composição extrajudicial dos conflitos (ut cita ac. do STJ, de 05-05-2022).

Todos estes aspectos determinam que, não só esta questão pode ser conhecida em sede de recurso – sendo insanável – como não devem levantar-se obstáculos probatórios no âmbito do conhecimento desta questão.

É que, como salientam os recorrentes, até ao momento da prestação do depoimento não são certos os factos sobre os quais o depoimento irá versar, sendo certo que existe sempre a possibilidade de tal depoimento não ser valorado.

Neste contexto, entendemos que tendo sido invocada a violação do sigilo profissional em sede de recurso de apelação, por apenas nesta altura tal se afigurar necessário, estava o tribunal da Relação obrigado a admitir a junção dos documentos juntos aos autos precisamente com vista a aferir da eventual prestação de depoimento em violação daquele dever profissional.

Não se mostra, assim, justificada a não admissão de junção de documentos.

Da alegada violação do dever de sigilo profissional do advogado

Na sequência do que ficou exposto, e como ficou já patente, invocam os recorrentes a violação do sigilo profissional, por considerarem que DD estava impedida de prestar depoimento por força da relação de advogado que manteve com as empresas mencionadas nos autos.

Para sustentar a referida alegação juntaram aos autos os seguintes documentos:

- documento 1, print de campo do site da Ordem dos Advogados visando fazer prova de que a testemunha Dra. DD é advogada regularmente inscrita na Ordem dos Advogados desde 14/04/1998 com o nome profissional "DD", com cédula n.º ...92L;

- documento 2, certidão comercial da T...-GE, S.A. para fazer prova de que a testemunha assumia uma dupla função no grupo de empresas integrado pela T..., T...-GE e Escola . . ., Lda., a de advogada e, também, concomitantemente, a de administradora da T...-GE;

- documento 3, certidão do registo comercial com 5 páginas, da qual consta um conjunto de documentos, mas que, conforme sublinhado nas alegações de apelação, o documento de interesse era a Acta n.º 5 da assembleia de accionistas da T...-GE realizada no dia 21/08/2004, na qual a testemunha foi nomeada administradora da sociedade por indicação da Presidente da Mesa da Assembleia Geral, FF (cedente da Escritura de Confissão de Dívida); e

- documento 4, certidão do registo comercial com 26 páginas, da qual, entre outros documentos, constam (a) “Requisição de REGISTO” do aumento do capital social da T...-GE, apresentada na Conservatória do Registo Comercial no dia 29/09/2005 pela testemunha Dra. DD que subscreveu a apresentação a registo na qualidade de advogada da sociedade, (b) escritura do aumento do capital social da sociedade outorgada no dia 02/02/2005, na qual a testemunha Dra. DD interveio na qualidade de administradora da sociedade, (c) versão atualizada do pacto social da sociedade na altura (onde nas disposições transitórias se pode constatar que CC foi nomeado Presidente da Mesa da Assembleia).

Ora, dispõe o art. 92.º do EOA que “1 - O advogado é obrigado a guardar segredo profissional no que respeita a todos os factos cujo conhecimento lhe advenha do exercício das suas funções ou da prestação dos seus serviços, designadamente:

a) A factos referentes a assuntos profissionais conhecidos, exclusivamente, por revelação do cliente ou revelados por ordem deste;

b) A factos de que tenha tido conhecimento em virtude de cargo desempenhado na Ordem dos Advogados;

c) A factos referentes a assuntos profissionais comunicados por colega com o qual esteja associado ou ao qual preste colaboração;

d) A factos comunicados por coautor, corréu ou cointeressado do seu constituinte ou pelo respetivo representante;

e) A factos de que a parte contrária do cliente ou respetivos representantes lhe tenham dado conhecimento durante negociações para acordo que vise pôr termo ao diferendo ou litígio;

f) A factos de que tenha tido conhecimento no âmbito de quaisquer negociações malogradas, orais ou escritas, em que tenha intervindo.”

Esta matéria foi invocada junto do tribunal da Relação que concluiu assim: “Artigo 92.º (…) III.4.2. Muito embora a testemunha fosse advogada não resulta minimamente evidenciado que a sua actuação como administradora da mencionada sociedade ou grupo de sociedades que foram parte na venda das participações sociais que se discute nos autos também tivesse sido realizada enquanto advogada dessa sociedade ou outra no âmbito de mandato que lhe tenha sido conferido para o efeito, donde quedar indemonstrada a alegação feita”.

Ora, analisados os documentos juntos aos autos não resulta de forma alguma evidenciada a invocada violação de sigilo profissional.

Efectivamente, resulta, de facto, que DD exerce a profissão de advogada. Mas o que é certo é que, no contexto das empresas do grupo mencionadas nos autos, exerceu sempre funções de administradora e titular de órgãos sociais.

A circunstância de ser, também, advogada não significa que tenha tomado conhecimento dos negócios mencionados nos autos naquela qualidade, até porque, sendo membro dos órgãos sociais, facilmente poderia obter informações sobre tal negócio sem que estivesse ao abrigo da relação cliente-advogado.

Além disso, a única vez em que, nos termos da documentação junta aos autos, DD surge como advogada corresponde ao momento do registo do aumento de capital realizado em 2005, ou seja, 3 anos antes do invocado negócio de transmissão de ações.

Pelo que se não mostra demonstrado, de forma alguma, que o teor do depoimento de DD tenha sido influenciado por conhecimentos revelados por qualquer cliente ou por terceiro a mando daquele.

Não se vislumbra, assim, a violação do sigilo profissional, não havendo razões para desconsiderar o depoimento de DD


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DA VIOLAÇÃO DA LEI SUBSTANTIVA.

Neste domínio, são quatro asa questões que se discutem nos autos: (ordenadas por ordem de precedência lógica):

i. Erro de julgamento quanto à existência e exequibilidade do título executivo;

ii. Erro de julgamento por errada aplicação do regime prevista no art. 577.º do CC;

iii. Violação de regras de direito probatório material;

iv. Erro de julgamento por aplicação do regime constante do art. 458.º do CC.

DA EXISTÊNCIA E EXEQUIBILIDADE DO TÍTULO EXECUTIVO JUNTO AOS AUTOS

Principiando a nossa análise pela questão atinente à existência e exequibilidade do título executivo junto aos autos, cumpre sublinhar que o caso vertente assume características que o tornam distinto dos casos comuns de execução fundada em reconhecimento de dívida.

De facto, prolifera nos nossos tribunais jurisprudência que se debruça sobre a natureza jurídica do reconhecimento unilateral de dívida e da necessidade de alegação, pelo exequente, da causa subjacente à referida confissão, causa esta que, à semelhança da dívida, se presume.

Como é referido no ainda recente ac. do STJ de em 16-02-2023 (Maria da Graça Trigo)12, “Quando o título executivo consista numa declaração de reconhecimento de dívida, a qual, nos termos do art. 458.º do CC, reveste a natureza de negócio unilateral presuntivo de causa, cabe ao exequente o ónus de, em sede de requerimento executivo, alegar sucintamente factos que integrem a relação causal subjacente a tal declaração (cfr. art. 724.º, n.º 1, al. e), do CPC).” .

Sucede que esta jurisprudência parte de um pressuposto que não se verifica nos autos, qual seja o de não constar do título a causa ou fundamento da obrigação. Nessas circunstâncias, a causa da obrigação presume-se, ainda que deva ser, sucintamente, alegada pelo exequente.

Neste sentido se pronunciaram, entre outros, os acórdãos do STJ de 02-11-2023 (A. Barateiro Martins)13 e de 08-04-2021 (Manuel Capelo)14

Esta é a situação-tipo que vemos retratada pelos nossos tribunais.

Tal não sucede, porém, no caso que nos ocupa, porquanto a causa da obrigação (objecto da confissão de dívida) consta expressamente do título, que é constituído por um contrato em que intervieram credores e devedores.

Dispõe o art. 724.º, n.º 1, al. e), do CPC que “no requerimento executivo, dirigido ao tribunal de execução, o exequente (…) e) Expõe sucintamente os factos que fundamentam o pedido, quando não constem do título executivo, podendo ainda alegar os factos que fundamentam a comunicabilidade da dívida constante de título assinado apenas por um dos cônjuges” – destaque nosso.

Ora, independentemente da natureza jurídica da confissão de dívida (contrato/negócio unilateral), o que é certo é que do reconhecimento de dívida junto aos autos consta a causa que subjaz à dívida cujo cumprimento é reclamado.

Como é evidente, também essa causa deve gozar de presunção de existência, desde logo por um argumento de maioria de razão; o mesmo é dizer: se a confissão de uma dívida (unilateral) faz presumir a existência da causa alegada, por maioria de razão tal presunção deve considerar-se extensível à causa assumida como sendo fonte da obrigação exequenda no próprio título executivo.

Mas esta conclusão, por si só – que nos parece evidente – , não resolve o caso dos autos (a questão ora sob apreciação): é que, a cresce que resulta dos autos que a própria exequente invocou em sede de requerimento executivo uma causa contrária à que consta no título.

Do exposto colocam-se as seguintes questões: a causa constante do título vincula ambas as partes, que dela não se podem afastar? Existe um conflito entre causas concorrentes? Qual a causa que se presume? Nestas circunstâncias, quem surge onerado com a prova da causa invocada?

Entendemos que a questão deve ser analisada da seguinte perspetiva:

Sobre a noção de título executivo, escreve LEBRE DE FREITAS que “o acertamento é o ponto de partida da acção executiva, pois a realização coactiva da prestação pressupõe a anterior definição dos elementos (subjectivos e objectivos) da relação jurídica de que ela é objecto. O título executivo contém esse acertamento; daí que se diga que constitui a base da execução, por ele se determinando «o fim e os limites da acção executiva», isto é, o tipo de acção e o seu objecto (…)”15.

Este acertamento determina o carácter suficiente do título executivo, a significar que deixa de ser necessária “qualquer indagação prévia sobre a real existência ou subsistência do direito a que se refere. (…) o título (…) faz as vezes do direito que vai ser realizado16.

Este acertamento pressupõe, ainda, a validade formal e substancial do título.

LEBBRE DE FREITAS explica que “o título executivo extrajudicial constitui documento probatório da declaração de vontade constitutiva duma obrigação ou duma declaração direta ou indiretamente probatória do facto constitutivo duma obrigação e é este seu valor probatório que leva a atribuir-lhe exequibilidade. (…) de qualquer modo, a função executiva do documento, embora pressupondo sempre sempre a sua função probatória, não se confunde com ela e o documento constitui base da ação executiva, com autonomia relativamente à atual existência da obrigação, que não tem, em princípio, de ser questionada na ação executiva, e em conformidade com a lei vigente à data em que o tribunal tenha de verifica a exequibilidade17.

Prossegue o referido autor: “a desconformidade entre o título e a obrigação exequenda pode resultar de vício formal ou substancial da declaração de vontade ou de ciência que lhe constitui o conteúdo ou do acto jurídico a que a declaração de ciência se reporte ou ainda de causa que afecte a ulterior subsistência da obrigação. (…) também aqui a desconformidade manifesta entre o título e o direito que se pretende fazer valer impede a realização de actos executivos. Estes não deverão ter lugar, se, por exemplo, a simulação do negócio jurídico resulta seguramente do título (o que é hipótese meramente académica), de elementos de facto fornecidos ao tribunal pelo próprio exequente no requerimento inicial (o que é altamente improvável)18.

Só que, no caso dos autos, esse improvável aconteceu!

Com efeito, a exequente, beneficiando de um título executivo do qual constava uma causa que se presumia, optou por invocar uma causa de pedir distinta, afirmando, necessariamente, que a causa constante do título não correspondia à vontade das partes.

O mesmo é dizer: o direito invocado pela exequente é contrário ao que consta do título, do que resulta que esta causa alternativa, que é a causa de pedir da ação executiva, não tem no título executivo dos autos qualquer suporte.

Ou ainda: a causa de pedir representada pelo título não corresponde à causa de pedir invocada pela exequente.

Como é evidente e é salientado por ABRANTES GERALDES, PAULO PIMENTA e LUÍS FILIPE DE SOUSA19, “toda a pretensão, mesmo no âmbito de uma ação executiva, tem de ter subjacente determinado fundamento fáctico e com o qual deve ser compatível”.

Donde se concluir que, com esta actuação, a exequente deixou de poder de beneficiar do título executivo invocado, na medida em que o direito invocado – crédito decorrente da transmissão das acções – não é o que decorre do título.

Falta, assim, o acertamento a que se fez referência supra, donde se retirar a conclusão de que o direito não pode ser executivo.

Desenvolvendo esta temática (e no mesmo sentido), veja-se, ainda, o Ac. da Relação do Porto de 24.11.2022 (proc. 411/21.8T8OVR.P1 –Aristides Rodrigues de Almeida), disponível em www.dgsi.pt, assim sumariado:

I - O artigo 458.º do Código Civil refere-se à situação em que alguém reconhece uma dívida sem indicar a relação que está na origem da dívida, não às situações em que na declaração o devedor enuncia expressamente a causa da dívida reconhecida.

II - A declaração constante de um documento escrito na qual uma pessoa se confessa devedor perante outro em razão de uma determinada causa constitui uma confissão extrajudicial escrita em documento particular.

III - O documento particular cuja autoria esteja reconhecida faz prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor, sem prejuízo da arguição e prova da falsidade do documento; também os factos compreendidos na declaração se consideram provados na medida em que forem contrários aos interesses do declarante20.

Num caso como o dos autos, de duas uma: i) ou o exequente instaurava execução com base no título executivo, caso em que beneficiaria da presunção da causa inserta no título; ii) ou então não teria outra alternativa que não fosse o recurso a uma ação declarativa para demonstrar a (que invocou no requerimento executivo) existência de um crédito emergente de contrato de transmissão de participações sociais.

É que, face aos contornos dos autos, outra solução não se vislumbra, percutindo-se ser apodíctico que se não pode ignorar que a próprio exequente indicou como causa de pedir uma causa diferente da constante do título. E esta questão, obviamente, não se resolve ao nível da existência, ou não, de presunção de causa ou ainda das regras de distribuição do ónus da prova, mas sim no plano da falta de título, que opera a montante. É que, ao actuar como actuou, a exequente colocou-se na posição de não ter título bastante para a obrigação invocada, o que não pode deixar de redundar na excepção de falta de título executivo.

Diga-se, a latere, que a esta mesma conclusão chegou FILIPE CASSIANO DOS SANTOS, no seu parecer junto aos autos pelos recorrentes no requerimento de 02.06.202321:

« Um segundo ponto que salta à vista é a divergência entre a relação subjacente ou fundamental que justificará a confissão, de acordo com o que é mencionado no próprio documento que é o título executivo, e aquela relação fundamental que no requerimento executivo apresentada como fonte do crédito exequendo: no documento que formaliza a confissão de dívida menciona-se que esta promana de um empréstimo, sem alusão sequer a uma outra relação que porventura tivesse justificado esse empréstimo, ao passo que, no requerimento executivo, a exequente indica que o seu crédito provém de um contrato de compra e venda de acções - contrato cuja existência tenta provar nos embargos. Esta divergência tem, também ela, consequências que se nos afiguram decisivas sobre a viabilidade da execução: desde logo, a exequente, tendo-se colocado fora (à margem) do declarado na "confissão" quanto à origem do crédito e à natureza da relação fundamental, não pode gozar da presunção do art. 458. º quanto à existência e prova dessa (outra) relação - ao que acresce que não pode ser feita prova de que afinal a relação subjacente não é aquela que é indicada no documento escrito com recurso a prova testemunhal.”22.

O terceiro ponto que logo prima facie nos impressiona gira em torno da intrigante ausência de qualquer prova documental sobre o contrato do qual, segundo invoca agora a exequente, emerge a dívida. Essa ausência começa por ser prenunciada no requerimento inicial, quando a exequente se limita a uma alegação (muito) genérica desse contrato. Diante disto, logo se coloca a questão de saber se essa alegação simples é suficiente para dar cumprimento ao ónus de alegação da relação fundamental que impende sobre o beneficiário de um reconhecimento de dívida, mesmo quando este, nos termos do art. 458.º, beneficia de presunção quanto à prova da relação fundamental, questão que é mais aguda ( e grave), se bem vemos, num quadro em que a exequente não pode beneficiar de presunção, por se ter colocado fora da relação fundamental nomeada no reconhecimento ou confissão23. (…)”.

Tendo rematado assim o mesmo Professor:

“…o título executivo e o modo como a exequente adquiriu a posição nele e o requerimento inicial, não nos oferece dúvidas a conclusão de que o requerimento inicial da execução deveria ter sido objecto de indeferimento liminar, com fundamento no n. º 2 do art. 726. º, alíneas a) e c), e a execução deverá agora ser objecto de rejeição e extinta, oficiosamente, nos termos do 734. º, n.ºs 1 e 2, ambos do CPC. Sobre isto, a sentença que decidiu os embargos admitiu amplamente a prova da relação fundamental por meio de prova testemunhal, contra as regras do direito probatório.”24.

Assim, cremos que mal andou a Relação quando – ignorando, de todo, a declaração relativa ao empréstimo que consta expressamente da “Escritura de Confissão de Dívida” e, outrossim, o específico regime ínsito no artº 458º do Cód. Civil – escreve:

O facto de a embargada não ter logrado provar a causa negocial da dívida inicialmente alegada e reflectida na própria escritura de contrato de confissão de dívida” (pois a causa alegada pela Embargada – contrato de compra e venda de participações sociais – não está reflectida na Escritura) “de cujo correspondente crédito é cessionária, ou seja os factos consubstanciadoras do alegado contrato de mútuo, alegando depois na resposta aos embargos e na sequência do por estes alegado em relação ao negócio causal que este na verdade foi um negócio de transmissão global de participações sociais por um valor ainda que não concretamente apurado de que os embargados pagaram parte remanescendo aquele que consta da escritura de confissão de dívida, não significa que a dívida cuja existência os embargantes reconhecem na escritura, que não tenha uma causa, causa essa cuja alegação e prova tal como o por si alegado nos embargos, atenta a invocação do comprovado reconhecimento unilateral de dívida passou a caber-lhe (art.ºs 458/1, 344/1 do CCiv e 516).”25.

Esta conclusão da Relação foi prolatada ao arrepio de se estar perante uma Escritura de Confissão de Dívida com relação causal nela expressamente indicada (empréstimo), sem que tenha sido invocada (e, por consequência, julgada) qualquer falsidade da declaração respectiva, como se tal Escritura Pública, que constitui o título executivo, fosse equiparável a uma confissão de dívida abstracta a que reporta o ali referido artigo 458.º do CC, enão a um contrato com relação causal nele consignada. Entendeu a Relação de Lisboa que, mesmo perante as concretas – e válidas - declarações constantes da Escritura apresentada à execução, caberia aos Embargantes, ora Recorrentes, fazer prova de que a relação causal alegada pela Embargada, ora Recorrida, não existe, ou que esta não tem qualquer relação com a dívida (de € 1.500.000.00,00) confessada no documento autêntico, ou que o valor já foi pago.

O mesmo é dizer que – salvo, obviamente, melhor opinião – o raciocínio assim desenvolvido pela decisão recorrida e a conclusão a que, dessa forma, chegou o Tribunal da Relação de Lisboa, não encontra qualquer respaldo na lei, nem na jurisprudência dos Tribunais, incluindo deste Superior Tribunal de Justiça.


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Em conclusão: no caso dos autos inexiste título executivo bastante para a presente execução, razão pela qual os embargos não podem deixar de ser julgados procedentes, devendo, em consequência, ser os embargantes absolvidos da instância executiva.

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E tratando-se da falta de título executivo – de um pressuposto processual formal da acção em causa, de conhecimento oficioso (ut artº 726º, nº2, al. a) do CPC) – , é evidente que as demais questões suscitadas pelos recorrentes (prendendo-se com o mérito, nomeadamente a questão atinente à legitimidade substantiva da exequente) resultam prejudicadas face à conclusão a que acima se chegou26.

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IV. DECISÃO

Face ao exposto, acorda-se em julgar procedente o recurso e, consequentemente, conceder a revista, revogando-se o decidido no Acórdão da Relação, julgando-se procedentes os embargos de executado deduzidos pelos embargantes, absolvendo-se estes da instância executiva.

As custas ficarão a cargo da recorrida Improve People, S.A.

Lisboa, 4 de Abril de 2024

Fernando Baptista de Oliveira (Juiz Conselheiro Relator)

Catarina Serra (Juíza Conselheira 1º adjunto)

Maria da Graça Trigo (Juíza Conselheira 2º Adjunto)

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1. Acórdão do STJ de 17-11-2021 (Revista n.º 22990/16.1T8PRT-B.P1-A.S1 (Oliveira Abreu), disponível em www.dgsi.pt).

2. Proc. n.º 1003/13.0T2AVR.P1.S1 (Ilídio Sacarrão Martins), disponível em www.dgsi.pt.

3. Neste sentido, vejam-se, inter alios, os acórdãos do STJ de 17-11-2021 (Revista n.º 712/19.5T8LSB.L1.S1 (Tibério Nunes da Silva), de 04-11-2021 (Revista n.º 26069/18.3T8PRT.P1.S1 (Maria João Vaz Tomé), de 09-06-2021 (Incidente n.º 1035/10.0TYLSB-B.L1.S1 (Ricardo Costa), de 22-06-2021 (Revista n.º 15319/16.0T8PRT.P1.S1, (Maria Clara Sottomayor), de 06-05-2021 (Revista n.º 1097/16.7T8FAR.E2.S1 (Oliveira Abreu), de 29-04-2021 (Revista n.º 115/16.3T8PRG.G1.S1 (João Cura Mariano), de 02-03-2021 (Revista n.º 2622/19.7T8VNF-B.G1.S1 (Graça Amaral), de 02-03-2021 (Revista n.º 30690/15.3T8LSB.L1.S1 (Ricardo Costa) e de 18-03-2021 ( Revista n.º 22563/19.7T8LSB.L1.S1 (Tibério Nunes da Silva), todos publicados em www.dgsi.pt.↩︎

4. Recursos em Processo Civil, 6.ª Ed., Almedina, 2020, pág. 413.↩︎

5. Cfr., inter alios, os Ac. do STJ, de 09-03-2022 (proc. n.º 1600/17.5T8PTM.E1.S1), de 23-03-2021? (proc. n.º 618/17.2T8ETR.P1.S1), de 12-01-2021 (proc. n.º 379/13.4TBGMR-B.G1.S1) e de 16-11-2021 (proc. n.º 5097/05.4TVLSB.L2.S3), todos disponíveis em www.dgsi.pt.

6. Cfr., a título de exemplo, acórdãos proferidos em 13-12-2022 (proc. n.º 608/19.0T8CTB.C1.S1) e em 07-09-2020 (proc. n.º 2774/17.0T8STR.E1.S1.

7. Ac. do STJ, de 11-01-2018, proc. n.º 779/14.2TBEVR-A.E1.S1. Sendo que neste sentido se pronunciaram, entre muitos outros, os acórdãos deste STJ de 12-01-2021 (proc. n.º 1801/19.1T8CSC.L1-B-A.S1) - não publicado nas bases de dados), de 21-01-2021 (proc. n.º 3384/16.5T8GMR.G1.S1) e de 04-02-2021 (proc. n.º 22/17.2T8CLB.C1.S1 – estes, disponíveis em www.dgsi.pt.

8. Proc. n.º 6640/12.8TBMAI.P2.S1 - Rel. Rosa Tching - acessível em www.dgsi.pt.

9. Cfr. Acs. de 27-09-2018 (proc. n.º 17/14.8TBVZL.C1.S1 - Maria do Rosário Morgado) e de 30-05-2013 (proc. n.º 158/07.8TBLLE.E1.S1 - Álvaro Rodrigues), o primeiro publicado em www.dgsi.pt.

10. Cfr. acórdãos do STJ de 12-12-2023 (proc. n.º 1178/21.5T8FNC.L1.S1- Nuno Pinto de Oliveira) e de 05-05-2022? (proc. n.º 126/20.4T8OAZ-A.P1.S1 - Cura Mariano), disponíveis em www.dgsi.pt, que deixa escrito que “com esta cominação específica, a produção dos meios de prova com esta incidência não constitui uma simples nulidade inominada secundária, a ser arguida, nos termos dos artigos 195.º e 199.º do Código de Processo Civil […], revelando-se antes uma violação de uma proibição de produção de prova, cuja consequência é a proibição da sua valoração, tendo essa violação um tratamento autónomo do que se encontra previsto para as nulidades processuais, podendo, designadamente, tal infração ser conhecida em recurso, sem que a nulidade da produção do respetivo meio de prova tenha que ser arguida nos termos previstos no artigo 199.º do Código de Processo Civil”.↩︎

11. Destaque nosso.↩︎

12. Proc. n.º 30218/15.5T8LSB-A.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt.↩︎

13. Proc. n.º 1766/20.7T8VCT-G.G1.S1. disponível em www.dgsi.pt.↩︎

14. Proc. n.º 3269/13.7TCLRS.L2.S1, disponíveis em www.dgsi.pt.

15. A Acção Executiva, Depois da Reforma, Coimbra Editora, 4.ª edição, pp. 35 e ss.

16. ANSELMO DE CASTRO, A Acção Executiva Singular, Comum e Especial, Coimbra Editora, 1977, p. 14-15.

17. Destaques e sublinhados nossos – in A Ação Executiva – À luz do Código de Processo Civil de 2013, Coimbra Editora, 6.ª edição, pp. 83-85.

18. De novo, o destaque e sublinhado são nossos - ob. Cit. pp. 87 e ss.↩︎

19. Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, Almedina, p.72.

20. Dada a sua pertinência e utilidade aos presentes autos – nomeadamente no que tange à inaplicabilidade aos autos do disposto no artº 458º do CC (ao contrário do que entendeu o ac. recorrido), aqui se plasma o seguinte excerto deste aresto:

  «É sabido que a nossa ordem jurídica não admite os chamados negócios abstractos: toda a obrigação carece de uma fonte ou causa, sendo em função desta que a obrigação tem de ser aferida, designadamente para efeitos de definição da sua medida, validade e exigibilidade.

  Para Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, vol. I, pág. 413, os «negócios puramente abstractos existem apenas no domínio dos títulos de crédito, no campo do direito comercial».
Segundo Pais de Vasconcelos, in Teoria Geral do Direito Civil, 5.ª edição, pág. 313, «para o direito não é normalmente suficiente que alguém esteja obrigado a fazer ou não fazer alguma coisa: é também importante considerar e ter presente qual a raiz dessa obrigação, de onde provém. Este interesse não tem uma importância meramente informativa, mas antes legitimadora. Aquele que exige o cumprimento de certa obrigação tem normalmente – fora os casos de abstracção ou presunção de causa – de invocar e demonstrar a causa dessa mesma obrigação».

  (…).

  Segundo o artigo 458.º do Código Civil, se alguém, por simples declaração unilateral, reconhecer uma dívida, sem indicação da respectiva causa, fica o credor dispensado de provar a relação fundamental, cuja existência se presume até prova em contrário.

  Antunes Varela, in Das obrigações em geral, 9.ª edição, págs. 454/455, por referência ao regime que o artigo 458.º consagra para o reconhecimento de dívida, escreve que «nenhum destes actos (A promete pagar 1000 a B; C reconhece dever 1000 acções da Torralta a D) constitui, com efeito, fonte autónoma de uma obrigação. Criam apenas a presunção da existência de uma relação negocial ou extranegocial (a relação fundamental a que aquele preceito se refere), sendo esta a verdadeira fonte da obrigação. Há neste caso não só uma inversão do ónus da prova, mas um agravamento desse ónus, na medida em que o aparente devedor não tem apenas que afastar determinada causa, mas convencer o tribunal de que a prestação prometida ou a divida reconhecida não têm nenhuma causa. Por isso se inverte o ónus da prova, mediante uma verdadeira relevatio ab onere probandi. Se o declarante ou seus sucessores alegarem e provarem que semelhante relação não existe (porque o negócio que a promessa de prestação ou o reconhecimento de dívida pressupõem não chegou a constituir-se, porque é nulo ou foi anulado, porque caducou, ou os seus efeitos se extinguiram entretanto, porque não foi afinal o promitente o autor do dano que pretende reparar, porque contra a sua convicção inicial não há responsabilidade objectiva naquele tipo de casos, porque contra a sua expectativa a culpa foi da vítima ou de terceiro, etc.) a obrigação cai, não lhe servindo de suporte bastante nem a promessa de cumprimento nem o reconhecimento da dívida (…) A simples inversão do ónus probandi quanto à causa da relação fundamental estabelecida no artigo 458 é diferente do regime do negócio abstracto, cuja validade não dependa da existência daquela relação.»

  Da mesma forma Pais de Vasconcelos, in Teoria Geral do Direito Civil, 2008, pág. 503, afirma que «sempre que alguém, por uma declaração unilateral nua, isto é, sem invocação da respectiva causa, reconheça uma dívida ou prometa pagá-la, a procedência da pretensão do respectivo credor não fica prejudicada pela falta de demonstração da sua causa, ficando o devedor onerado com o encargo de demonstrar o contrário, isto é, que a causa não existe, ou cessou, ou é ilícita.»

  Também Galvão Telles, in Direito das Obrigações, 1997, págs. 181 e 182, a propósito do artigo 458.º do Código Civil, afirma «estamos na presença de simples declarações unilaterais que não criam obrigações, mas apenas fazem presumir a existência de obrigações, derivadas de outros actos ou factos, que esses, sim, são a sua fonte. A numa carta dirigida a B promete pagar-lhe mil contos ou reconhece dever-lhe essa importância; ou, como é vulgar, faz no seu testamento inserir este reconhecimento de dívida. Pode mesmo o declarante não especificar a causa ou título justificativo da dívida que promete cumprir ou reconhece existir. Perante a sua declaração, fica-se sem saber se essa dívida provém de uma compra ou de um empréstimo ou de um facto danoso gerador de responsabilidade. Presume-se, no entanto, que a dívida realmente existe; que há uma causa que a justifica, ou seja, uma relação fundamental em que se integra, um acto ou facto que a gerou. Inverte-se, pois, o ónus da prova. Aquele que se arroga a posição de credor (B) não precisa provar a causa da dívida, visto beneficiar da presunção decorrente da declaração feita. À outra parte (A) é que competirá provar, se para isso dispuser dos elementos necessários, que afinal não é devedora porque a dívida nunca teve causa ou essa causa já cessara. Por exemplo os mil contos que A se comprometeu a pagar ou cujo débito reconheceu correspondiam a um empréstimo que lhe ia ser feito mas não chegou a sê-lo, ou a uma compra nula, ou a uma compra cujo preço veio a verificar que afinal já se encontrava, ao tempo, pago.»

  No Comentário ao Código Civil - Direito das Obrigações. Das Obrigações em Geral, Coordenação de José Brandão Proença, Universidade Católica Editora, página 215, lê-se o seguinte: «O reconhecimento de dívida e a promessa de cumprimento sem indicação da causa da constituição da obrigação têm como efeito a presunção da existência de uma relação fundamental, de uma fonte constitutiva de uma obrigação (…). Trata-se, portanto, de um negócio jurídico com «mera eficácia declarativa, limitada à inversão do ónus da prova» (…).

  (…)O preceito em causa refere-se à situação em que alguém reconhece uma dívida sem indicar a relação que está na origem da dívida. A presunção que a norma estabelece é a presunção de que a dívida tem uma causa jurídica. O que o credor fica dispensado de provar é a existência de relação fundamental, de causa para a dívida, uma vez que se presume que a dívida tem uma causa, é causal. Mas já não se presume qual seja essa causa em concreto e/ou a respectiva validade, motivo pelo qual, tendo presente o princípio da proibição dos negócios abstractos, se entende que o credor deve indicar a causa, não carecendo é de a provar.

  Por isso, por não ser essa a sua previsão, a norma não se aplica nas situações em que na declaração o devedor enuncia expressamente a causa da dívida reconhecida. E isso é assim porque se o devedor indica a causa da dívida reconhecida já não é necessário presumir a sua existência, pois a mesma resulta da própria declaração de dívida. Eventualmente pode é colocar-se a questão da necessidade de provar que essa indicação é falsa e que a causa da dívida é outra, designadamente para efeitos de prova da sua invalidade, mas isso já nada tem a ver com a disposição do artigo 458.º do Código Civil.

  Sendo assim, o artigo 458.º do Código Civil não se aplica ao caso concreto. Com efeito, no documento apresentado pela autora está expressamente indicado que a dívida que aí se afirma existir é «resultante da diferença de partilhas, (…). Em face dessa redacção, não havia necessidade de presumir que a dívida tinha subjacente uma relação jurídica causal pois ela estava expressamente identificada no documento pela devedora.

  Menezes Leitão, in Direito das Obrigações, vol. 1, 15.ª edição, 2018, página 271, nota 612, esclarece precisamente que «não é abrangida pelo art. 458º a promessa de cumprimento ou reconhecimento de dívida com carácter causal, em que é indicada a respectiva fonte (ex: um contrato, ou responsabilidade civil). Neste caso, estar-se-á perante um negócio celebrado com fim de pacificação, que não terá carácter apenas declaratório, mas também constitutivo, na medida em que a parte renuncia a discutir a verificação de pressupostos ou a oponibilidade de excepções ao vínculo obrigacional, que reconhece ter sido constituído por aquela via. Face ao disposto no art. 457º, a celebração deste negócio só pode ser admitida com base na liberdade contratual (art. 405º), constituindo neste caso um contrato análogo à transacção (art. 1248º), o qual por isso nem sequer deverá admitir que a parte faça prova da inexistência da obrigação. Cf. Karl Larenz / Claus Wilhelm Canaris, Lehrbuch desSchuldrechtsll- Besonderer Teil, 2,13s ed., Miinchen, Beck, 1994, § 61II, pp. 32-33.» (sublinhados nossos).

  Parece, com efeito, que se perante uma declaração unilateral onde não se indica nenhuma relação fundamental o credor fica dispensado de provar (não se cuida por ora da diferença entre dispensa de prova e dispensa de alegação, nem se aquela acarreta esta) a existência de relação fundamental, de uma causa para a dívida, o mesmo deve acontecer, por maioria de razão, nos casos em que no documento se indica uma relação fundamental, caso em se deverá presumir não que a dívida tem uma causa mas que a dívida tem a causa indicada.

  As normas jurídicas permitem esta conclusão? Parece que sim. A declaração constante de um documento escrito na qual uma pessoa se confessa devedor perante outro em razão de uma determinada causa constitui efectivamente uma confissão extrajudicial escrita em documento particular.

  Nessas circunstâncias, a declaração confessória faz prova plena do facto confessado, ex vi artigos 352.º, 358.º, n.º 2, 375.º, n.º 1, e 376.º do Código Civil. Essa prova plena só podia ser revertida mediante a arguição e prova da falsidade do documento (o que não aconteceu) ou através de meio de prova que demonstrasse não ser verdadeiro esse facto (artigo 347.º do Código Civil).

  (…)

  Tendo sido assim, então, nos termos do n.º 1 do artigo 376.º do mesmo diploma, o documento particular cuja autoria esteja reconhecida faz prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor, sem prejuízo da arguição e prova da falsidade do documento. No caso, aliás, a ré não impugnou o teor da declaração que fez no documento e também, como vimos, não arguiu a respectiva falsidade. Logo está provado com força de prova plena que a declaração redigida no documento foi feita.».

  São nossos os destaques e sublinhados.

21. Refª citius ......49.

22. Págs 4-5 do parecer.

23. Pág 6 do parecer.

24. Pág 2 do parecer.

25. Destaques nossos.

26. Cfr. o acórdão do STJ, de 25-03-2021, proc. n.º 6258/18.9T8GMR-A.G1.S1 (Maria da Graça Trigo), disponível em www.dgsi.pt