Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
3020/09.6TTLSB-A.L1S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: FERNANDES DA SILVA
Descritores: ARGUIÇÃO DE NULIDADES
DESPEDIMENTO COLECTIVO
DESPACHO SANEADOR
Data do Acordão: 05/08/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO DO TRABALHO / CONTRATO DE TRABALHO / CESSAÇÃO DO CONTRATO POR FACTO IMPUTÁVEL AO TRABALHADOR / DESPEDIMENTO COLECTIVO.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PROCESSO DE DECLARAÇÃO / SENTENÇA (NULIDADES) / RECURSOS.
DIREITO PROCESSUAL LABORAL - DESPACHO SANEADOR / SENTENÇA (NULIDADES) - PROCESSO DE IMPUGNAÇÃO DE DESPEDIMENTO COLECTIVO.
Doutrina:
- António Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 13.ª Edição, Janeiro de 2006, Almedina, pp. 602 e 603.
- Júlio Gomes, … , páginas 991 e 992, Nota (2382).
- L.P. Moitinho de Almeida, ‘Código de Processo do Trabalho’, Coimbra Editora, 1997, (4.ª) edição, p. 235.
- Pedro Furtado Martins, Cessação do Contrato de Trabalho, 3.ª Edição, 2012, Principia Editora, p. 304-6.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 510.º, N.º 1, B), 668.º, N.º 1, B), 691.º, N.º2, ALÍNEA H), 716.º, 721.º, N.º 1.
CÓDIGO DE PROCESSO DO TRABALHO (CPT), NA VERSÃO APROVADA PELO DECRETO-LEI N.º 480/99, DE 9-11, E AS DO CÓDIGO DO TRABALHO DE 2003: - ARTIGOS 77.º, N.º1, 158.º, 160.º, N.º2, ALÍNEAS A) E B), N.º 3, 161.º.
CÓDIGO DO TRABALHO: - ARTIGO 419.º.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 8.10.1997, IN CJ/S.T.J., ANO V, TOMO III, P. 269;
-DE 13.1.2010, PROC. N.º 15275/09.1T2SNT.S1, DA 4.ª SECÇÃO, EM WWW.DGSI.PT ;
-DE 20.1.2010, PROC. N.º 228/09.8YFLSB, EM WWW.DGSI.PT .
Sumário :
I – Nos termos do art. 77.º/1 do C.P.T., a arguição das nulidades da decisão deve ser feita, expressa e separadamente, no requerimento de interposição de recurso, sob pena de, se suscitadas mais tarde, delas não se poder conhecer.

II – No processo de impugnação de despedimento colectivo, uma vez junto o relatório elaborado pelo assessor nomeado pelo Juiz, o despacho saneador a proferir, na sequência da Audiência Preliminar, decidirá também, nos termos do n.º 2, alíneas a) e b), do art. 160.º do C.P.T., se foram cumpridas as formalidades legais do despedimento e se procedem os fundamentos invocados para o mesmo.

III – Pese embora se disponha no n.º 3 citada norma (art. 160.º) que, sendo proferido despacho saneador, a decisão sobre as questões referidas nas alíneas a) e b) daquele n.º 2 não pode ser relegada para momento posterior, essa imposição pressupõe, concretamente quanto à decisão acerca dos fundamentos invocados para o despedimento, que haja já nos Autos elementos de facto seguros e bastantes para a prolação de uma decisão conscienciosa.

IV – Esse pressuposto não se cumpre quando se retém, para o efeito, apenas o conteúdo do relatório/parecer pericial, a que se aderiu integralmente, inconsiderando, sem mais, os fundamentos de facto alegados pela trabalhadora/A. na impugnação do despedimento colectivo, cujo apuramento tem manifesto interesse para o cabal e consciencioso esclarecimento da causa.

Decisão Texto Integral:

    Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

                                                           I –

                                                  Relatório

1.

AA, residente na Rua ..., n.º …, …, ..., ..., ..., veio instaurar, em 31/07/2009, a presente acção declarativa de impugnação de despedimento colectivo, com processo especial, contra «BB, S.A.», pessoa colectiva com sede na ..., n.º …, …, … ..., pedindo a declaração da ilicitude do seu despedimento colectivo, e, em consequência, a condenação da Ré:

 - No pagamento das retribuições que aquela deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do Tribunal;

- Na reintegração da A., sem prejuízo da sua categoria profissional e antiguidade, ou, em alternativa, a condenação da Ré no pagamento de uma indemnização correspondente a 45 dias de retribuição-base, por cada ano completo ou fracção de antiguidade, que se verificar à data do trânsito em julgado da decisão judicial, atendendo ao grau de ilicitude do despedimento, conforme opção que vier a fazer até à data da sentença;

- No pagamento das férias não gozadas, vencidas em 1/01/2009, no valor de € 1.425.27;

- No pagamento de € 223,74 referente a subsídio de alimentação de Março de 2009 e subsídio de transporte de Fevereiro e Março de 2009;

- No pagamento de juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação e até integral e efectivo pagamento.

Caso a presente acção seja considerada improcedente, o que a A. só por mera hipótese admite, deverá a Ré ser condenada a pagar à Autora a compensação por despedimento colectivo, correspondente a um mês de retribuição-base, mais diuturnidades, por cada ano completo de antiguidade, ainda não recebida.

Alegou para o efeito, em resumo útil, quanto à improcedência dos fundamentos invocados para o despedimento colectivo – e para além dos aspectos relativos ao enquadramento da relação laboral, ao prazo para proferir a decisão de despedimento, aos créditos vencidos e à compensação – o seguinte:

- ‘Os motivos que justificaram o despedimento da Autora são os enumerados no anexo I (a comunicação de decisão final de despedimento, citado doc. 2, que se junta e se dá por reproduzido para todos os efeitos legais).

- Acontece que a Ré não tinha fundamento para integrar a Autora no despedimento colectivo, como se passa a demonstrar:

- A Autora trabalhou para a CC de 1992 a 1998, altura em que se demitiu;

- Em Agosto de 1999, quando estava a acabar o bacharelato em ... e ..., a Autora foi convidada pelo Dr. DD, com a anuência do Administrador Dr. EE, a regressar para a CC para desempenhar funções na área da ...;

 - Em Setembro de 1999, data da admissão, foi prometido à Autora que, terminada a licenciatura, a sua situação seria revista;

 - A Autora terminou a licenciatura em Junho de 20…;

 - Decorrido cerca de um ano depois da admissão, a Autora foi transferida para o departamento financeiro e tesouraria da CC;

 - No departamento financeiro, a Autora exerceu funções de:

- Análise financeira (cálculo e reporte de rácios, análise do endividamento/evolução da taxa de juro, conferência de juros), tesouraria (prazos de recebimentos e pagamentos - reporte);

- Crédito;

- Controlava as participações financeiras da empresa CC, S.A.;

- O grupo FF era composto por sete empresas, cada uma com os seus departamentos de ..., tesouraria, finanças/contas a pagar e controlo de crédito;

 - Em 2001 deu-se uma reestruturação do grupo FF passando os referidos departamentos a ser partilhados entre as diversas empresas do grupo;

 - Assim, passou a existir um único departamento de ..., finanças, tesouraria, contas a pagar e controlo de crédito (Centro de Serviços Partilhados da Área Financeira);

 - Nesta reestruturação foi dado a escolher a Autora entre ficar a reportar ao Sr. Dr. GG, no controlo de crédito, ou ficar como técnica de controlo interno, uma nova função na FF a reportar à Dr.ª HH;

 - A Autora escolheu ficar no controlo interno, reportando à Sra. Dr.ª HH;

 - Esta função foi extinta passados dois anos, passando a Autora a reportar directamente ao Director Geral, Sr. Dr. II, passando a exercer as funções de técnica de projectos especiais;

 - As funções de técnica de projectos especiais consistiam em:

- Gestão/Controlo de Seguros – actualização de capitais, controlo de condições e pagamentos, participação e acompanhamento de sinistros, bem como todas as funções relacionadas com seguros;

- Manutenção dos dossiers "preços de transferência";

- Prestar informação financeira a empresas externas, JJ;

- Registo e actualização de participações financeiras;

- Processo administrativo de contratos de exclusividade:

Facultar informação sobre contratos de locação financeira e operacional (de frota, equipamento informático), no que diz respeito a rendas vincendas e vencidas, a ...;

- Técnica Oficial de contas da empresa KK, LDA.

 - A Autora desempenhou as funções referidas no artigo anterior entre 2003 e a data do despedimento;

 - Em Setembro de 2008, a Administração da FF informou a Autora e restantes trabalhadores da fusão da CC com a LL;

- Em Outubro de 2008, foi emitida uma "Nota Informativa" da administração da Ré a dizer o seguinte (doc. 3):

"O processo de selecção contará com uma pré-avaliação da chefia actual das colaboradoras em causa e com uma recomendação justificada, como se de um novo recrutamento se tratasse. Sempre que seja validado mais do que um candidato para a mesma função, realizar-se-á um "Assessment", em parceria com uma empresa de consultoria de primeiro plano para a obtenção de informação complementar sobre os candidatos. Importa salientar que a validação final da decisão sobre a indigitação do responsável de 2.ª linha será sempre submetida, sob proposta da chefia de 1.º nível. Essa aprovação terá subjacente o princípio de mérito e da integração entre iguais";

- Durante o mês de Outubro de 2008 realizaram-se vários "assessments", que incluíam testes psicotécnicos e outros de avaliação de perfil para outras funções.

 - A Autora não foi convocada para fazer qualquer "assessment";

 - O que levou a Autora a crer que para as suas funções não havia sobreposição de funções entre a CC e a LL;

 - E, de facto, as funções que eram desempenhadas pela Autora não passaram a ser desempenhadas por uma trabalhadora da LL, mas sim por uma trabalhadora da CC;

 - Obviamente que se existissem duas trabalhadoras para o mesmo posto, uma da CC e outra da LL, com a fusão era natural qua uma tivesse de ser despedida;

 - Mas não foi isso que aconteceu;

- Na verdade, a Autora foi substituída pela trabalhadora MM, proveniente de outro departamento da CC;

- A Sra. D. MM pertencia ao departamento de planeamento e controlo da FF – …, S.A.;

 - Com a fusão da FF com a LL, a Sra. D. MM ficou excluída do departamento de planeamento e controlo, ao contrário dos restantes colegas deste departamento que lá se mantêm;

 - Tendo sido colocada no Centro de Serviços Partilhados da Área Financeira, onde foi substituir a Autora;

- Como referido, desde 2003 até à data da fusão entre a FF e a LL, e posteriormente até à data do despedimento, que a Autora desempenhava funções no Centro de Serviços Partilhados da Área Financeira, descritas no artigo 25.º da presente p.i.

- E tanto assim é que de 2003 até à data do despedimento, a Autora reportava ao Dr. II;

 - Entre 2004 e 2006, a Dr.ª HH propôs a Autora para chefe da Tesouraria, para exercer funções de técnica de Tesouraria (orçamento de Tesouraria entre outras), não tendo o Dr. II aceite por não querer prescindir da colaboração da Autora;

- Verifica-se, deste modo, que a Autora foi despedida para que o seu posto de trabalho fosse ocupado por uma trabalhadora proveniente de outro departamento;

 - A Autora tem formação (licenciatura) em controlo financeiro, tendo desempenhado, também, funções no departamento Financeiro/Tesouraria, como referido;

- Enquanto desempenhou funções no Centro de Serviços Partilhados da Área Financeira, a Autora sempre teve bom desempenho;

 - Assim, a inclusão da Autora no despedimento colectivo não se deveu a diminuição de trabalhadores no departamento onde desempenhava funções;

- A inclusão da Autora no despedimento colectivo teve como único objectivo criar uma vaga para a trabalhadora MM;

 - De acordo com o artigo 397.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei 99/2003, em vigor a data dos factos, considera-se despedimento colectivo a cessação de contratos de trabalho promovida pelo empregador, sempre que aquela ocorrência se fundamente em encerramento de uma ou várias secções ou estrutura equivalente ou redução de pessoal determinada por motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos;

- Ora, neste caso, nem houve encerramento do departamento onde a Autora prestava funções, nem o despedimento da Autora foi motivado pela redução de pessoal na sua secção;

 - Na verdade, para o Centro de Serviços Partilhados da Área Financeira onde a Autora exercia as suas funções foram contratados novos trabalhadores através do recurso a empresa de trabalho temporário;

 - Acresce que, em Janeiro de 2009, a trabalhadora NN, contratada a termo, passou a efectiva, desempenhando funções no Centro de Serviços Partilhados da Área Financeira, onde a Autora desempenhava funções;

- De facto, como demonstrado, a Autora foi substituída na sua secção por outra trabalhadora que está actualmente a desempenhar as funções antes desempenhada pela Autora;

 - A figura do despedimento colectivo foi criada para fazer face a necessidades de redução motivadas por motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos, não para, ao abrigo dele, se proceder a substituição dos trabalhadores de uma secção;

 - Ou seja, o despedimento colectivo não foi criado para proceder a despedimentos de determinados trabalhadores, ainda que as suas funções se mantenham na empresa;

- Assim, os fundamentos invocados pela Ré para proceder ao despedimento colectivo da Autora não correspondem a verdade dos factos.

 - Consequentemente, improcedem os fundamentos invocados para o despedimento colectivo, sendo, por isso, o despedimento ilícito’.

                                                           __

Citada, a Ré contestou, alegando, em síntese, o seguinte:

Impugnam-se todos os factos articulados pela Autora, para além dos atrás admitidos, por não corresponderem a verdade.

 Assim:

- Não é verdadeiro o facto descrito sob 14.º da p.i., uma vez que foi a Autora quem, numa altura em que se encontrava descontente no emprego onde estava, pediu ao Dr. DD colocação no Grupo FF.

- É falso o facto descrito sob 15.º da p.i., uma vez que a Ré nada prometeu à Autora em sede de revisão das suas condições de trabalho.

- Quanto aos factos descritos sob 17.º e 18.º da p.i., a Ré apenas admite que a Autora se encontrava a desempenhar funções na área financeira, quando foi criado o Centro de Serviços Partilhados – Área Financeira, em 2002, negando todos os outros factos.

- Quanto aos factos articulados sob 22.º e 23.º da p.i., nega-se que a Ré tenha sido oferecido qualquer escolha à Autora, pois a Ré considerava que a Autora não tinha perfil de chefia e esta última admitia esse facto, elemento que era essencial para ocupar o lugar que a Autora refere sob 22.º da p.i., no controlo de crédito.

- Pelo que, então, a Ré indigitou a Autora para técnica de controlo interno, ficando a reportar à Sra. Dra. HH.

- Quanto ao facto descrito sob 24.º da p.i., é certo que, passados dois anos, a Autora passou a exercer as funções de assistente técnica de projectos especiais, reportando ao Sr. Dr. II, o qual era Director Financeiro da Ré e não Director Geral.

- Não é verdade que as funções inerentes a esse cargo fossem as descritas sob 25.º da p.i., embora a Ré reconheça que, ao longo do tempo, mas não em simultâneo, a Autora desempenhou algumas tarefas que nelas se podem incluir, pelo que se impugnam os factos descritos sob 25.º e 26.º da mesma peça.

- A Autora foi despedida na sequência dum processo de despedimento colectivo, regularmente instaurado e instruído pela Ré.

- A Ré fundamentou o despedimento colectivo, nomeadamente, no facto de, em 31 de Dezembro de 2008, ter sido realizada a fusão das sociedades comerciais denominadas "CC …, SA" e "LL – …, S.A.", na modalidade de incorporação desta última na primeira e tendo adoptado a denominação "FF + LL …. S.A.”.

- Por efeito desta fusão, a estrutura de pessoal da Ré ficou sobredimensionada, nos termos descritos no anexo F da comunicação da intenção de despedimento ("descrição dos motivos invocados para o despedimento colectivo, ponto a.3.1.):

«Estando a actual estrutura de pessoal de FF + LL sobredimensionada face aos objectivos de rentabilidade que lhe são exigidos e face à estratégia de mudança decorrente da recente aquisição, exige-se, neste momento, uma maior eficiência e maximização dos recursos existentes por forma a que o Grupo possa manter a sua posição no mercado, o que, no limite, determina a necessidade de reestruturar o actual quadro de pessoal, o que reconduzirá, inevitavelmente, a dispensa de trabalhadores.

A par do processo de fusão, a FF + LL irá, ainda, implementar um novo modelo de gestão, que terá repercussões directas nos modelos organizacionais que estão subjacentes ao desenvolvimento das diversas áreas de actuação de cada uma das sociedades envolvidas.”

- Com a aquisição da LL, a Ré iniciou a integração das sociedades, negócios, marcas e pessoas que constituíam os dois grupos económicos, por forma a reunir as sinergias comuns às duas estruturas e dela obter uma maior eficiência e optimização, em termos de competitividade do mercado, realinhamento dos recursos e criação de valor.

- Na área financeira, a opção da Ré consistiu em concentrar em si mesma, BB. S.A., toda a respectiva estrutura organizativa, que anteriormente se encontrava dispersa, operação que implicou harmonizar o quadro de pessoal de todas as empresas envolvidas.

- Esta harmonização foi realizada em duas modalidades:

a) Dispensa de trabalhadores que, por uma questão de redundância ou por se afigurarem excedentários no novo modelo organizacional, foram integrados nos procedimentos do despedimento colectivo implementados em cada uma das sociedades do Grupo que foram afectadas;

b) Transferência de trabalhadores que permaneceram no Grupo, por via da celebração de acordos de cessão da posição contratual da posição da entidade empregadora com as empresas a que os trabalhadores estavam afectos, para a FF + LL.

- No novo modelo organizacional da Ré, a área financeira passou a estar repartida por três áreas, individualmente asseguradas por um gestor, o que, como consequência desta reestruturação, implicou que cada uma dessas áreas passou a desenvolver os seus projectos específicos, sob a coordenação do respectivo gestor.

- Por outro lado, cada uma dessas áreas ficou a ser gerida por pessoas que já as tinham assegurado no passado - uma vez que esta divisão de especialização já tinha existido­ com funções distintas e de nível superior ao da Autora, designadamente no capítulo da responsabilidade e coordenação de equipas, e com conhecimentos específicos de cada uma delas.

- Pelo que o posto de trabalho correspondente a assistente técnico de projectos especiais, tal como existia na titularidade da Autora, deixou de ser necessário, por excedentário.

- A Autora alega que, em Outubro de 2008, a Ré realizou vários assessments, que incluíam testes psicotécnicos e outros de avaliação de perfil para outras funções e que, como não foi convocada para fazer nenhuma deles, concluiu que para as suas funções não haveria sobreposição entre a CC e a LL.

- Diga-se que concluiu bem, uma vez que sendo o seu cargo excedentário e a extinguir, não haveria razão nenhuma para fazer um assessment.

- Não é verdadeiro o alegado sob 32.º da p.i.

- A colaboradora MM veio desempenhar funções de carácter administrativo na área da tesouraria, consistentes, nomeadamente, na recolha de assinaturas e envio de documentos a entidades bancárias, funções que em nada se confundem com as do cargo da Autora, que exigem um perfil técnico adequado e habilitação de nível superior.

- A única tarefa, das que complementarmente eram executadas pela Autora, que a Ré atribuiu a MM foi a do acompanhamento dos contratos de seguro, tarefas de acompanhamento dos contratos de seguro que têm, também, natureza administrativa e não requerem uma pessoa licenciada.

- Pelo que a conclusão a tirar não é a de que a colaboradora MM veio substituir a Autora nas suas funções, mas antes a de que o seu cargo de assistente técnica de projectos especiais deixou de existir e as funções que complementarmente lhe estavam atribuídas foram, em parte, redistribuídas por critérios de racionalidade e, noutra parte, extintas.

- Termos em que se impugna a matéria de facto descrita sob 32.º a 35.º, 37.º e 38.º da p.i.

- É falso o facto descrito sob 41.º da p.i.

- Enquanto desempenhou funções no Centro de Serviços Partilhados – Área Financeira, a Autora não teve um desempenho superior ao nível satisfatório e com notação média muito inferior à da generalidade dos seus colegas de departamento, pelo que se impugna o facto articulado sob 44° da p.i., não são correctas as conclusões vertidas sob 42.º, 45.º, 46.º, 48.º e 51.º da mesma peça processual.

- Como se pode ver do ponto 4.1.3 do anexo I, junto a comunicação da intenção de despedimento, foram reduzidos 5 postos de trabalho.

- A Ré impugna o facto descrito sob 49.º da p.i., uma vez que se limitou a recorrer a trabalho temporário para a execução das tarefas de lançamento de facturas e emissão de pagamentos, sendo que o recurso a esta modalidade de contratação de mão-de-‑obra mostrou-se temporariamente necessário enquanto os sistemas informáticos não se encontraram estabilizados em resultado das operações necessárias por causa da fusão.

- De qualquer maneira, estamos a falar de funções que nada têm a ver com as da Autora, nomeadamente, por se revestirem do muito menor complexidade, serem de natureza administrativa, e não técnica e exigirem habilitação muito inferior à daquela.

- Também as funções da colaboradora NN se traduzem no lançamento de facturas, e à semelhança das anteriores, nada têm a ver com as da Autora.

- A Autora e os demais trabalhadores abrangidos pelo despedimento colectivo declararam que não pretendiam constituir a respectiva comissão representativa e não a constituíram de facto (documento n.º 3, que junta e dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).

- Nos dias seguintes ao da reunião referida supra, em 16, a Ré realizou reuniões individuais com os trabalhadores abrangidos pelo despedimento colectivo, incluindo a Autora, onde lhes apresentou uma proposta para a revogação dos respectivos contratos de trabalho por mútuo acordo (documento n.º 4. que junta e dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais), sendo que a proposta da Ré contemplava o pagamento de compensação superior à legal.

- A Autora foi a única trabalhadora abrangida pelo despedimento colectivo que não deu o acordo à revogação do seu contrato de trabalho, nos termos propostos pela Ré.

- A Autora recebeu a comunicação do despedimento e respectivos anexos no dia 9 de Fevereiro de 2009 (documento n.º 4, que junta e dá por integralmente reproduzido para todos os eleitos legais), pelo que, de tudo, se conclui que nenhuma ilicitude existe no despedimento da Autora. (…)»

                                               __

Foi proferido despacho saneador, a fls. 166-178, no âmbito da Audiência Preliminar realizada a fls. 178 e 179, onde, para além de ser considerada válida e regular a instância e julgada improcedente a excepção peremptória de caducidade do despedimento colectivo, procedeu-se à selecção da matéria de facto assente e à elaboração da base instrutória.

Foi ainda proferida, no quadro desse despacho saneador, a fls.166 a 172 e com data de 27/03/2012, a decisão que, em conclusão e relativamente ao despedimento colectivo dos autos, decidiu o seguinte:

“Em suma, aderindo integralmente ao parecer do perito, é manifesto que, subjacente ao despedimento colectivo ocorrido, estiveram motivos estruturais, traduzidos no sobredimensionamento da estrutura de pessoal da BB, “face aos objectivos de rentabilidade que lhe são exigidos e face à estratégia de mudança decorrente da recente aquisição,” o que tornou exigível uma “maior eficiência e maximização dos recursos existentes, por forma a que o Grupo possa manter a sua posição no mercado”, o que determinou a dispensa de trabalhadores quando as suas funções se extinguiram (no caso da Autora), ou se tornaram redundantes, com o que se preenche a al. a), do art. 397.º do Código do Trabalho. Da mesma forma se preenche a al. b) do mesmo artigo, atenta a reestruturação da organização produtiva da Ré. Assim, estamos perante um despedimento colectivo lícito.”

           

2.

A Autora, inconformada, interpôs recurso de Apelação.

Dele conhecendo, o Acórdão prolatado julgou-o procedente, revogando o saneador-sentença impugnado, na parte respeitante à procedência dos ‘fundamentos invocados para o despedimento colectivo’, ordenando a sua substituição pela fixação da matéria de facto assente e pela elaboração da Base Instrutória nos moldes acima determinados (dispositivo a fls. 238-9 dos Autos, a que nos reportamos).

É ora a R. que, irresignada, nos trás a presente Revista, cuja motivação produzida resume neste quadro conclusivo:

1. Em acção de impugnação de despedimento colectivo, o juiz deve decidir, no despacho saneador, se foram cumpridas as formalidades legais desse despedimento e se procedem os fundamentos invocados para o mesmo.

2. O juiz só poderá deixar de o fazer quando o processo ainda não contenha elementos de factos suficientes e seguros para a prolação de uma decisão conscienciosa.

3. Devendo o relatório técnico e a prova documental ser juntos ao processo antes da audiência preliminar, em princípio, os autos conterão todos os elementos necessários a uma decisão conscienciosa sobre o cumprimento das formalidades legais e a procedência dos fundamentos invocados para o despedimento colectivo, no momento da prolação do despacho saneador.

4. O Mm.º Juiz de 1.ª instância considerou que o processo reunia elementos seguros para a prolação de decisão no despacho saneador sobre o cumprimento das formalidades legais e a procedência dos fundamentos invocados para o despedimento colectivo.

5. A conclusão do Tribunal "a quo" é totalmente falha de fundamentação, uma vez que em lugar algum se apontam as razões por que se considera pouco aprofundado o relatório técnico em que, entre outros meios de prova, se baseou a decisão do douto despacho saneador/sentença quanto à procedência dos motivos invocados para o despedimento colectivo ou em que pontos é que se considera excessiva e acrítica a sua alegada "colagem" à fundamentação invocada pela empregadora.

6. O dever de fundamentação é aplicável a todas as decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo (art. 158.º, n.º 1, do CPC), sob pena de nulidade (arts. 668.º, n.º 1, b) e 716.º, n.º 1, do CPC) e a decisão do douto Acórdão sob revista não foi fundamentada, pelo que houve violação da lei processual.

7. A legalidade do despedimento colectivo terá de ser aferida segundo os critérios empresariais utilizados pelo empregador, sendo que ao Tribunal não compete ajuizar da bondade desses critérios nem da bondade da medida adoptada.

8. Ao Tribunal apenas compete verificar a veracidade dos motivos estruturais, tecnológicos ou conjunturais que foram invocados pelo empregador e a existência de um nexo causal entre os motivos e o despedimento, por forma a que, segundo juízos de razoabilidade, se possa concluir que tais motivos eram idóneos para justificar o despedimento colectivo.

9. O douto despacho saneador-sentença encontra-se devidamente fundamentado, de facto e de direito, sobre a existência e veracidade dos motivos objectivos invocados pela empregadora para fundamentar o despedimento colectivo e traça, com clareza, o nexo de causalidade entre esses motivos e o despedimento.

10. A sua fundamentação traça, com a requerida clareza e o devido assento no relatório técnico, o necessário nexo de causalidade entre os motivos invocados pela entidade empregadora e o despedimento da trabalhadora, sendo que o conhecimento da questão relevada quanto à pretensa finalidade de criar uma vaga para outra trabalhadora fica prejudicado.

11. O douto despacho saneador-sentença não encerra nenhuma precipitação do julgador (na medida em que decidiu a questão da procedência dos fundamentos invocados para o despedimento colectivo no momento certo - artigo 160.º, n.º 2, b) e n.º 3 do CPT) e encontra-se suficientemente sustentado, pelo que não merece qualquer censura.

12. O douto Acórdão, que revogou a parte da decisão em crise, ao considerar insuficientemente fundamentado o douto despacho saneador-sentença e ordenar a sua substituição pela fixação da matéria de facto assente e pela elaboração de base instrutória, procedeu a errada interpretação dos artigos 158.º, n.º 1 e 659.º, n.º 3, do CPC e 160.º, n.º 2, b), do CPT, incorrendo em erro de julgamento.

13. O douto Acórdão sob revista, ao decidir que o douto despacho saneador-sentença " (...) não só peca por ser pouco aprofundado como se "cola", em demasia e acriticamente, à fundamentação avançada pela Apelada para a cessação do contrato de trabalho da recorrente", padece, ele próprio, de falta de fundamentação, pelo que, se outra razão não houvesse para a sua revogação, teria que ser considerado nulo, nos termos do disposto nos artigos 668.º, n.º 1, b) e 716.º, n.º 1. do CPC.

 Termina solicitando que seja concedida a revista, confirmando-se a douta decisão do despacho saneador-sentença sobre a procedência dos motivos invocados para o despedimento colectivo.

A recorrida contra-alegou, concluindo, por sua vez, que, tendo a sentença da 1.ª Instância aderido integralmente, sem mais, ao parecer do perito, não se pronunciando sobre os factos alegados pela recorrida para motivar o pedido de declaração de ilicitude do despedimento colectivo, como bem se ajuizou no Acórdão sob protesto, deve o recurso ser julgado improcedente.

                                                           __

Subidos os Autos a este Supremo Tribunal, a Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta tomou posição, nos termos do n.º 3 do art. 87.º do C.P.T., emitindo proficiente ‘parecer’ em que propende no sentido de que o recurso da R. deve improceder.

Notificado o douto parecer, as partes não reagiram.

                                                           __

Colhidos os vistos legais, cumpre analisar, ponderar e decidir.

                                                           __

3. O objecto da Revista.

Como deflui do acervo conclusivo – por onde se afere e delimita, por via de regra, o objecto e âmbito do recurso, inexistindo, como no caso, qualquer temática de conhecimento oficioso – a questão axial que nos vem posta analisa-se em dilucidar e resolver, concretamente, se, ante os elementos de facto já reunidos e disponíveis nos Autos, dos alegadamente relevantes, a decisão podia e devia ser tomada, como foi, no despacho saneador, ou se, pelo contrário, o processo não continha ainda todos os elementos seguros/necessários à prolação da mesma, como se concluiu e proclamou na deliberação sob censura.

                                                           II –

                                        Dos Fundamentos

1 – De Facto.

As ocorrências de facto consideradas relevantes na deliberação sub judicio foram as alinhadas no respectivo relatório, para onde se remeteu, e a cujo teor ora igualmente nos reportamos, sem prejuízo da retenção de outra materialidade, de natureza e comprovação processual, que se mostre eventualmente interessante ou necessária.

2 – Os Factos e o Direito.

2.1 – Da pretensa nulidade do Acórdão (arts. 668.º, n.º 1, b) e 716.º, ambos do C.P.C.).

Sem a invocar expressamente, de modo autónomo e individualizado, a R. apenas nas alegações recursórias alude à falta de fundamentação do Acórdão impugnado enquanto nulidade tipificada na norma em epígrafe, dever de fundamentação a que depois volta a aludir nas proposições conclusivas sob os n.ºs VI e XIII do respectivo acervo.

Ignorou, contudo, a disciplina adjectiva constante do art. 77.º/1 do C.P.T., aplicável aos Acórdãos da Relação por força do disposto no art. 716.º/1 do C.P.C., que impõe que tal arguição seja feita, expressa e separadamente, no requerimento de interposição do recurso, por consabidas razões, sob pena de, se suscitada mais tarde, ser havida por inatendível e dela não se poder conhecer.

É este o pacífico e reiterado entendimento deste Tribunal e Secção, como pode ver-se, por todos, no Acórdão de 20.1.2010, Revista n.º 228/09.8YFLSB, consultável em www.dgsi.pt, a cuja desenvolvida fundamentação, nele expendida, nos reportamos.

Desse pretenso vício não se conhece, pois.

                                                           __

Identificada já a problemática a dirimir, vejamos então.

2.2 – Como resulta da exposição precedente, as Instâncias não coincidiram na solução.

Enquanto o Tribunal do Trabalho de Lisboa, aderindo integralmente ao parecer do perito, considerou, desde logo, ao nível do despacho saneador, que se estava perante um despedimento colectivo lícito – porquanto… subjacente ao despedimento colectivo ocorrido, estiveram motivos estruturais, traduzidos no sobredimensionamento da estrutura de pessoal da BB, “face aos objectivos de rentabilidade que lhe são exigidos e face à estratégia de mudança decorrente da recente aquisição”, o que tornou exigível uma “maior eficiência e maximização dos recursos existentes, por forma a que o Grupo possa manter a sua posição de mercado”, o que determinou a dispensa de trabalhadores quando as suas funções se extinguiram (no caso da A.), ou se tornaram redundantes, com o que se preenche a al. a) do art. 397.º do Código do Trabalho, e, da mesma forma, se preenche a al. b) do mesmo artigo, atenta a reestruturação da organização produtiva da R. –, no Acórdão ora sub judicio entendeu-se diversamente, em síntese, acolhendo, no essencial, as razões aduzidas pela recorrente, em cujos termos o Tribunal a quo não deveria ter conhecido, no despacho saneador, acerca da verificação dos motivos invocados para o despedimento (colectivo) da A., bem como relativamente ao cumprimento dos procedimentos formais legalmente previstos.

E isto porque o Tribunal do Trabalho  de Lisboa, não estando, por um lado, obrigado a decidir, de imediato e no despacho saneador, das matérias discriminadas nas duas alíneas do n.º 2 do art. 160.º do C.P.T., também não dispunha então dos factos bastantes para o efeito.

Em consequência, julgando procedente a apelação interposta pela A., revogou o saneador-sentença, na parte respeitante à procedência dos ‘fundamentos invocados para o despedimento colectivo’, e ordenou a sua substituição pela fixação da matéria de facto assente e pela elaboração da Base Instrutória, conforme antes determinara.

2.3 – Depois de identificado o regime legal aplicável  – maxime as normas adjectivas do C.P.T., na versão aprovada pelo Decreto-Lei n.º 480/99, de 9 de Novembro, e as do Código do Trabalho de 2003, que enformam a respectiva disciplina –,  o Acórdão sub specie, ancorou o predito entendimento na fundamentação jurídica seguinte, desenvolvida sob as epígrafes C2 a C4, de que lembramos os passos mais impressivos (transcrição parcial):

“A primeira questão que pode  ser aqui colocada prende-se com interpretação a dar ao disposto no número 3 do artigo 160.º do Código do Processo do Trabalho, quando parece impor ao juiz do processo a decisão obrigatória das questões elencadas nas duas alíneas do citado número 2 (o que parece também ser insinuado por este último normativo).       

Ora, afigura-se-nos que, quer olhando para o texto dos dispositivos legais acima reproduzidos, como para os artigos que se lhes seguem, não é esse (não pode ser) o conteúdo, alcance e sentido do regime legal em análise.

O artigo 161.º, desde logo, com a epígrafe “Termos subsequentes”, estipula que “[s]e o processo houver de prosseguir, a audiência de discussão e julgamento pode ser marcada separadamente com referência a cada um dos trabalhadores, observando-se, quanto ao mais, as regras do processo comum.”

Logo, apesar da importância da assessoria técnica prevista nos artigos 157.º a 159.º do Código do Processo do Trabalho, tal perícia não é necessariamente o único meio de prova consentido pelo legislador no quadro do processo especial de impugnação de despedimento colectivo, designadamente, para demonstrar o incumprimento dos procedimentos elencados nos artigos 360.º a 365.º ou a não verificação dos motivos de natureza objectiva descritos no artigo 359.º, por referência aos artigos 382.º e 383.º, todos do Código do Trabalho de 2009.

É que o parecer técnico-económico, ainda que lógico e coerente com os elementos e informações que lhe foram fornecidos pela empresa promotora da cessação plural de diversos contratos de trabalho, pode não espelhar toda a realidade ou reflectir um cenário justificativo do despedimento colectivo, tendencioso e conveniente aos interesses do empregador em questão.

Ora, pode acontecer que o exame pericial não responda a questões suscitadas nos autos pelos trabalhadores afectados ou pela própria entidade patronal, dúvidas essas que só outro tipo de prova – documental, porque não junta até ao termo da Audiência Preliminar, por confissão, testemunhal, com base em presunções judiciais ou legais, etc. – pode lograr esclarecer, implicando tal impasse momentâneo o prosseguimento do processo, nos termos e para os efeitos do artigo 161.º do Código do Processo do Trabalho.    

Sendo assim, não nos parece que haja um dever funcional do julgador, em sede de Audiência Preliminar e correspondente despacho saneador, em apreciar e julgar necessária e inapelavelmente da conformidade legal das formalidades levadas a cabo no despedimento colectivo que concretamente está a ser apreciado, o mesmo se devendo dizer – e aqui, com muito mais propriedade, por ter a ver com a substância do litígio – da efectiva existência dos fundamentos invocados para o mesmo.   

Podemos invocar, nesse preciso sentido, os seguintes Arestos deste mesmo tribunal da 2.ª instância (ainda que proferidos ao abrigo de legislação anterior à actual, mas que, nesta matéria, tem uma grande similitude com o determinado no Código do Processo do Trabalho de 2010):

- Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 22/03/2000, processo n.º 0078064, relator: Pereira Rodrigues, publicado em www.dgsi.pt (Sumário): 

V – O artigo 156.º – F, n.º 2 do CPT/81[1] não pode ser entendido como impondo ao julgador a obrigação inelutável de conhecer logo no saneador dos fundamentos invocados para o despedimento colectivo.

Só haverá que decidir de tais pontos no saneador se já houver nos autos elementos de facto seguros para que possa ser proferida uma decisão conscienciosa;

- Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 31/05/2000, processo n.º 0072324, relatora: Manuela Gomes, publicado em www.dgsi.pt (Sumário): 

I – A estruturação dialéctica do processo traduz-se no ónus imposto às partes de impugnarem especificadamente os factos alegados pela parte contrária, mas também no direito de deduzirem, em relação a cada um desses factos, as suas razões de facto e de direito, de oferecem as suas provas e de discorrerem sobre o resulto de umas e outras.

2 - Nisto se realiza o princípio de contraditório, cujo conteúdo essencial impõe que, de uma forma geral, nenhuma prova deva ser aceite e nenhuma decisão (mesmo interlocutória) deva ser tomada pelo juiz sem que previamente tenha sido dada ampla e efectiva possibilidade ao sujeito processual contra quem é dirigida, de a discutir, de a contestar e de a valorar.

3 - Estes princípios, que devem ser tidos em consideração na interpretação dos segmentos normativos constantes do n.º 1, alínea d), e do n.º 2 do art.º 156.º-F do CPT/81, levam a concluir que estes preceitos visavam apenas ter um carácter enfatizante, no sentido de impor a decisão quando estivessem em causa aspectos meramente formais do despedimento, nas nunca com prejuízo dos referidos direitos das partes e sem a salvaguarda da exigência do processo conter todos os elementos necessários e suficientes para a decisão.

4 - Entendimento contrário determinaria que os segmentos em apreciação tivessem que ser julgados inconstitucionais e consequentemente inaplicáveis, por violação de princípios e direitos com consagração constitucional, designadamente do princípio da igualdade e de direito de acesso ao direito de acesso ao direito e aos tribunais, constantes dos art.º 13º e art.º 20.º, n.º 1 da Constituição.

5 - Assim, o tribunal recorrido não estava obrigado a decidir, no saneador, sobre os fundamentos invocados para o despedimento colectivo, nem a conhecer logo de pedido, como fez, devendo relegar o seu conhecimento para final, uma vez que ainda não estão apurados os factos necessários e suficientes para a decisão, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito;

- Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 15/12/2005, processo n.º 8779/2005-4, relator: Ramalho Pinto, publicado em www.dgsi.pt (Sumário): 

I – Na acção de impugnação do despedimento colectivo, o n.º 3 do art.º 160.º do Código de Processo de Trabalho não impõe ao julgador uma obrigação de decidir, logo no saneador, os pontos referidos nas duas alíneas do n.º 2 do art.º 160.º. Só haverá que deles decidir no despacho saneador se já houver nos autos elementos de facto seguros para a prolação de uma decisão conscienciosa sobre os mesmos.

II – No domínio desse processo de impugnação do despedimento colectivo, e a par da prova pericial resultante da intervenção do assessor nomeado pelo tribunal e dos técnicos de parte, é à prova documental a que as partes essencialmente poderão recorrer.

III – Não há qualquer norma legal que obrigue o juiz a identificar os documentos que serviram de base à fixação dos factos considerados provados documentalmente em despacho saneador-‑sentença que seja proferido, bastando que eles estejam juntos ao processo e que, sem necessidade de outro meio de prova, demonstrem os factos alegados pelas partes.

Sendo assim, o tribunal de Trabalho de Lisboa não estava obrigado a decidir, de imediato e no despacho saneador, as matérias discriminadas nas duas alíneas do número 2 do artigo 160.º do Código do Processo do Trabalho, como veio a fazer. 

Dir-se-á, contudo, que, apesar de tal interpretação das normas legais acima reproduzidas ser a que corresponde à intenção do legislador, (…), [t]al conclusão não se extrai, contudo, do mencionado relatório do único perito nomeado pelo tribunal da 1.ª instância, nos termos do artigo 157.º do Código do Processo do Trabalho, pois o mesmo, salvo o devido respeito, não só peca por ser pouco aprofundado como se “cola”, em demasia e acriticamente, à fundamentação avançada pela Apelada para a cessação do contrato de trabalho da recorrente, vindo o saneador/sentença a padecer, por tabela e indirectamente, dessas mesmas características, ao aderir ao teor, do qual reproduz grandes excertos, bem como às conclusões de tal parecer técnico.

Importa fazer notar que a Autora, em rigor, não questiona que os procedimentos formais legalmente previstos tenham sido (des)respeitados, nem que a fusão entre as duas empresas (não) impôs a dispensa de trabalhadores, por excedentários dentro das novas estrutura e organização da BB, colocando antes em causa que, relativamente a ela[2], tenham sido efectivamente aplicados os critérios previamente definidos com vista à selecção dos trabalhadores que seriam objecto do dito despedimento colectivo, sugerindo mesmo que a cessação do seu vínculo laboral teve como único desiderato o de criar uma vaga para uma outra trabalhadora, de nome MM, que seria proveniente do departamento de planeamento e controlo da FF – …, S.A., e que teria ficado sem lugar no mesmo, na sequência da dita fusão.                                   

Argumentar-se-á, porém, com a insindicabilidade por parte dos tribunais de trabalho dos critérios adoptados pelo empregador, bem como da sua aplicação concreta aos trabalhadores colectivamente dispensados.   

 (…)

Entramos numa área juridicamente controversa, onde se têm verificado assinaláveis divisões entre a nossa doutrina e jurisprudência.[3]   

Bastará contrapor os três seguintes Arestos dos nossos tribunais superiores para constatar as diferenças de posição que nesta matéria se têm verificado:

- Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17/09/2009, processo n.º 08S3844, relator Sousa Peixoto, publicado em www.dgsi.pt (Sumário): 

«9. A legalidade do despedimento colectivo terá de ser aferida segundo os critérios empresariais utilizados pelo empregador, sendo que ao tribunal não compete ajuizar da bondade desses critérios nem da bondade da medida adoptada.

10. Ao tribunal apenas compete verificar a veracidade dos motivos estruturais, tecnológicos ou conjunturais que foram invocados pelo empregador e a existência de um nexo causal entre esse motivos e o despedimento, por forma a que, segundo juízos de razoabilidade, se possa concluir que tais motivos eram idóneos a justificar o despedimento colectivo[4]

 (…)

A problemática enunciada acha-se abordada pelo Professor Júlio Gomes no seu manual “Direito do Trabalho – Relações Individuais de Trabalho”, I Volume, Coimbra Editora, 2007, páginas 991 e seguintes, nos moldes adiante transcritos:

«A evolução verificada em matéria de despedimento colectivo é, na nossa opinião, das mais preocupantes. E isto porque na doutrina e na jurisprudência nacionais se começa a impor um entendimento que praticamente esvazia a necessidade de fundamentação do despedimento colectivo, o qual é apresentado como um acto de gestão praticamente insindicável pelo tribunal ao ponto de converter em puro ritualismo, formal e inteiramente despido de sentido útil, tanto o processo de negociações que deveria preceder a eventual decisão de despedir, como a própria motivação desta.

Para o efeito, invocam-se razões que respeitam à competência e à legitimidade dos juízes.

 Por um lado, destaca-se que estes não são gestores ou economistas, faltando-lhes, por conseguinte, a competência ou habilidade técnicas para ajuizar do fundamento da decisão de proceder a um despedimento colectivo.

 Mas a argumentação incide, sobretudo, na falta de legitimidade para proceder a um controlo quanto ao mérito da decisão: tal corresponderia a uma funcionalização da empresa privada, a uma violação da liberdade de iniciativa económica, a uma intromissão pelos tribunais numa área de competência exclusiva dos empresários, tão exclusiva como exclusivo é o risco que assumem.

Esta argumentação é, desde logo, praticamente impossível de conciliar, segundo cremos, com a exigência constitucional de justa causa (comprovada) para que haja despedimento: se a justa causa puder consistir numa decisão de gestão insindicável – por exemplo, na afirmação do empregador de que o des­pedimento colectivo é o meio necessário simplesmente para aumentar o lucro que a empresa já vem obtendo – não vislumbramos qualquer utilidade na exigência constitucional.

Desemboca-se, assim, num sistema verdadeiramente paradoxal em matéria de cessação de contrato de trabalho a que, a uma relativamente grande dificuldade de alegar e comprovar a justa causa disciplinar, se contrapõe uma justa causa "objectiva" extremamente lassa.

(…)

Parece-nos, pois, que o controlo judicial não pode deixar de incidir sobre a proporcionalidade entre a motivação apresentada e a decisão de proceder ao despedimento colectivo, a racionalidade desta decisão, às medidas alternativas apresentadas pelos representantes dos trabalhadores e à reacção do empregador face a essas medidas.

 Efectivamente, o que se espera não é uma consulta formal e "farisaica", em que a decisão efectiva já tenha sido tomada quando se procede a "consulta", mas um genuíno processo nego­cial que, embora não tenha que produzir um acordo, deve ser conduzido de boa-fé per ambas as partes.

A situação está, quanto a nós, muito longe da mera verificação por parte do Tribunal da existência ou não de um abuso de direito – figura que é sempre excepcional – mas corresponde antes a verificar se o empregador, aqui como no exercício de todos os seus poderes, agiu de acordo com a boa-fé.»[5]

Não podemos deixar de concordar com o Professor Júlio Gomes (…) quando reclama dos tribunais do trabalho uma atitude mais interveniente e proactiva no que concerne ao controlo e fiscalização dos motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos que fundam o despedimento colectivo, ao nexo de causalidade adequada e proporcional entre uma e outra realidade, bem como no que toca ao número dos trabalhadores a despedir, às categorias a abranger, ao período de tempo em que o mesmo decorrerá e aos critérios para a selecção daqueles trabalhadores.

(…)

Logo, chegados aqui, temos de concordar com a recorrente quando classifica de precipitado, e insuficientemente sustentado, o saneador/sentença que julgou legítimos os fundamentos de índole material avançados pela Ré para o despedimento (colectivo) da Autora”.

(…).

2.4 – Ao assim ajuizado contrapõe a recorrente[6], basicamente, que – devendo o julgador decidir, no despacho saneador da acção de impugnação de despedimento colectivo, como a presente, se foram ou não cumpridas as formalidades legais desse despedimento e se procedem, ou não, os fundamentos invocados para o mesmo – o Juiz só poderá deixar de o fazer quando o processo ainda não contenha os elementos de facto suficientes e seguros para a prolação de uma decisão conscienciosa.

 A legalidade do despedimento, sustenta logo a seguir, terá de ser aferida segundo os critérios empresariais utilizados pelo empregador, não competindo ao Tribunal ajuizar da bondade desses critérios, nem da bondade da medida adoptada, sem excluir, contudo, a (…lícita) verificação jurisdicional da existência de um nexo de causalidade entre os motivos invocados pela entidade empregadora e o despedimento da trabalhadora, fundamentação esta que o questionado saneador/sentença traça com a requerida clareza e o devido assento no relatório técnico  –  enunciado constante nas conclusões 1.ª, 2.ª, 7.ª e 10.ª do respectivo alinhamento, com desenvolvimento nas demais.

Reconhecendo, sem embargo do já admitido, a existência de interpretações jurisprudenciais não coincidentes sobre o alcance dos citados n.ºs 2 e 3 do art. 160.º do C.P.T., a R./recorrente adianta, ainda assim, que, seja qual for a posição que se perfilhe quanto à melhor interpretação desses preceitos, o saneador-sentença não os afrontou, pelo que se disse, pois nele se consignou, (com base no relatório do técnico nomeado e na documentação reunida no processo, em que continham os elementos seguros para a prolação de decisão sobre as referias matérias), acharem-se validamente cumpridas as formalidades legais e procedentes os fundamentos invocados para o despedimento colectivo.

Assim,  pelo que se pode concluir, centra-se a dissensão apenas em saber se, no caso, o relatório técnico e a prova documental carreados para o processo antes/até à audiência preliminar contêm/constituem ou não a factualidade bastante e segura para a decisão, que se impõe conscienciosa, proferida no despacho saneador, nos termos do n.º 2 do art. 160.º do C.P.T.

2.5 – Vejamos então.

Dispõe-se neste segmento da norma que sendo proferido despacho saneador, este se destina também a decidir:

a) Se foram cumpridas as formalidades legais do despedimento colectivo;

b) Se procedem os fundamentos invocados para o despedimento colectivo.

E o n.º 3 do mesmo inciso preceitua que não pode ser relegada para momento posterior ao despacho saneador a decisão sobre as questões referidas nas alíneas a) e b) do número anterior, bem como quaisquer excepções que obstem ao respectivo conhecimento.

No que tange à hermenêutica desta regra adjectiva – e pese embora a sua literalidade – não podemos deixar de sufragar inteiramente o acerto e bondade da interpretação que dele se fez no Aresto revidendo.

O âmbito dos poderes no controlo judicial da validade do despedimento colectivo – sem embargo, logicamente, do respeito imposto pelos limites decorrentes das opções gestionárias do empresário/empregador –, prolonga-se, seguramente, para além da mera sindicabilidade do cumprimento dos respectivos procedimentos formais.

 Nesse controlo se contém, efectivamente, a verificação de uma relação de congruência  entre o despedimento e os fundamentos invocados[7] –  maxime  na averiguação do nexo de causalidade entre a motivação globalmente invocada na justificação do despedimento colectivo e o concreto despedimento de cada trabalhador, como é pacificamente entendido neste Supremo Tribunal[8]  – o que postula necessariamente a compreensão harmoniosa da citada regra com os demais princípios do direito adjectivo comum (v.g. o do contraditório e a função do despacho saneador quanto ao conhecimento do mérito, 'ut' art. 510.º, n.º 1, b), do CPC), não podendo a mesma deixar de ser entendida/interpretada, até pela sua própria inserção sistemática, nos termos em que o foi.

(Este é, desde há muito, o pacífico entendimento deste Supremo Tribunal, proclamado v.g. no Acórdão de 8.10.1997, in CJ/S.T.J., Ano V, Tomo III, pg. 269, sobre a homóloga previsão do n.º 2 do art. 156.º-F do C.P.T., então vigente, em cujos termos tal comando não impõe ao julgador uma obrigação inelutável de decidir, logo no saneador, os pontos naquela referidos, só havendo que deles conhecer, nessa peça e momento processuais, se já se dispuser nos Autos de elementos de facto seguros para a prolação de uma decisão conscienciosa.

Veja-se, a propósito, a expressiva nota inserta, ao tempo,  na (4.ª) edição do ‘Código de Processo do Trabalho’, de L.P. Moitinho de Almeida, Coimbra Editora, 1997, pg. 235, acerca da concentração na assessoria técnica (então prevista no art. 156.º-C e ora no art. 157.º) da produção de prova que habilitará o Juiz a decidir, …ideia do Governo aí considerada como peregrina e altamente absurda, além de contrária à lei).

Em suma:

Não se impondo, por isso, à outrance, que o Tribunal seja impelido a conhecer imediatamente, mesmo sem elementos de facto suficientes e seguros, concretamente do ponto referido na alínea b) do n.º 2 do art. 160.º do C.P.T. – …como se deixou aflorado na alusão ao enquadramento sistemático da norma, o art. 161.º seguinte prevê que a hipótese de o processo ter de prosseguir –  resta averiguar, por ser isso que se questiona, se a ponderação ajuizada, feita neste contexto, foi ou não acertada.

Dela discordando, sustenta a recorrente que o despacho saneador-‑sentença se encontra devidamente fundamentado, de facto e de direito, sobre a existência  e veracidade dos motivos objectivos invocados pela empregadora para fundamentar o despedimento colectivo …e traça, com clareza, o nexo de causalidade entre esses motivos e o despedimento da trabalhadora, sendo que o conhecimento da questão relevada quanto à pretensa finalidade de criar uma vaga para outra trabalhadora fica prejudicado.

Assim – aduz, fechando o seu raciocínio – o dito despacho não encerra nenhuma precipitação do julgador, antes se acha suficientemente sustentado, o mesmo não acontecendo com o Acórdão que se impugna, que incorreu em erro de julgamento ao interpretar erradamente os arts. 158.º/1 e 659.º/3 do C.P.C. e ainda o art. 160.º, n.º 2, b), do C.P.T.

Tudo visto e ponderado, diremos, com o devido respeito, que não tem razão.

Com efeito:

A A. invocou no petitório, além do mais, que foi substituída na secção em que trabalhava por uma outra trabalhadora que está actualmente a desempenhar as funções antes por si desempenhadas, alegando, a propósito, que a figura do despedimento colectivo não foi criada para, ao seu abrigo, se proceder à substituição dos trabalhadores de uma secção, não foi prevista, em suma, para legitimar despedimentos de determinados trabalhadores, ainda que as suas funções de mantenham na empresa.

Identificando as funções que desempenhou entre 2003 e a data do despedimento – e invocando a ‘nota informativa’ da R. em cujos termos, sempre que seja validado mais do que um candidato para a mesma função, realizar-se-á um ‘assessment’ – a A. sustentou que não foi convocada para qualquer ‘assessment’, o que a levou a concluir que, para as suas funções, não havia sobreposição de funções entre a ‘CC’ e a ‘LL’.

Donde, em remate da sua tese, a inclusão da A. no despedimento colectivo teve como único objectivo criar uma vaga para outra trabalhadora, a MM.

No saneador-sentença – fls. 144/ss. – depois de se consignar caber decidir, nessa fase processual, se foram cumpridas as formalidades legais do despedimento colectivo e se procedem os fundamentos invocados para o mesmo, nos termos do n.º 2 do art. 160.º do C.P.T. – concluiu-se que foram cumpridas as exigências de forma aludidas no art. 419.º do Código do Trabalho.

E, no concernente aos fundamentos do despedimento colectivo, reportando-se ao relatório elaborado em conformidade com o art. 158.º do C.P.T., concluiu-se, sem  mais, pela sua licitude, nestes termos (sic, a fls. 150):

“Em suma, aderindo integralmente ao parecer do perito, é manifesto que, subjacente ao despedimento colectivo ocorrido, estiveram motivos estruturais, traduzidos no sobredimensionamento da estrutura de pessoal da FF + LL, ‘face aos objectivos de rentabilidade que lhe são exigidos e face à estratégia de mudança decorrente da recente aquisição’, o que tornou exigível uma ‘maior eficiência e maximização dos recursos existentes, por forma a que o Grupo possa manter a sua posição no mercado’, o que determinou a dispensa de trabalhadores quando as suas funções se extinguiram (no caso da A.), ou se tornaram redundantes, com o que se preenche a alínea a) do art. 397.º do Código do Trabalho.

Da mesma forma se preenche a alínea b) do mesmo artigo, atenta a reestruturação da organização produtiva da R.

Assim, estamos perante um despedimento colectivo lícito.”

E dissemos sem mais, porque o reporte directo ao relatório técnico – parecer pericial elaborado pelo assessor nomeado, que mais não é do que isso mesmo – se era bastante, no que se concede, para a aferição do cumprimento das formalidades procedimentais do despedimento,[9] não fez sequer alusão técnica aos argumentos contrapostos pela A. às razões aduzidas pela R./empregadora para determinar a sua inclusão no despedimento colectivo, limitando-se a acolher e plasmar as razões, indicações e conclusões que enformaram a tese do empregador, posição impugnativa da A. que a decisão, por isso, logicamente também ignorou.

E essa opção só pode justificar-se, como somos em crer, pela assumida compreensão literal do disposto no n.º 3 do art. 160.º do C.P.T., na perspectiva acima dilucidada.

Daí a implementação do despacho saneador, em conformidade, com a prossecução dos Autos – como expressamente se consignou na peça, a fls. 151, e se vê confirmado na elaborada Base Instrutória –  apenas para apuramento  das quantias em dívida à A., em virtude do despedimento colectivo ocorrido.

Dessa decisão recorreu a A., alegando, em suma, que: fundamentou o pedido de declaração da ilicitude do seu despedimento colectivo no facto de ser despedida para que o seu posto de trabalho fosse ocupado por uma trabalhadora proveniente de um outro departamento e de uma outra empresa do grupo, a FF …, SA; a sua inclusão no despedimento colectivo não se deveu à diminuição de trabalhadores no departamento onde desempenhava funções, mas sim ao desígnio de criar uma vaga para a trabalhadora MM, que, repita-se, era proveniente de um outro departamento  de uma outra empresa do grupo; para o Centro de Serviços Partilhados da Área Financeira onde a recorrente exercia as suas funções foram contratados novos trabalhadores através do recurso a empresa de trabalho temporário; por fim, em Janeiro de 2009, a trabalhadora  NN, contratada a termo, passou a efectiva e desempenha funções no Centro de Serviços Partilhados da Área Financeira, onde a recorrente desempenhava funções.

E – remata – a sentença recorrida não se pronunciou sobre nenhum destes factos, que são precisamente aqueles em que a recorrente fundamenta o seu pedido de declaração de ilicitude do despedimento colectivo, limitando-se a aderir ‘integralmente ao parecer do perito’…que não se pronuncia sobre os factos alegados pela recorrente para motivar o referido pedido de declaração da ilicitude do despedimento colectivo.

No seguimento do antedito – em que, relembre-se, se considerou que o Tribunal do Trabalho  de Lisboa não estava obrigado a decidir, de imediato, como fez, as matérias discriminadas nas duas alíneas do n.º 2 do art. 160.º do C.P.T. – o Acórdão sub judicio enfrentou analiticamente esta temática, vinda de enunciar, como sendo uma segunda questão, sustentando que o mencionado relatório do único perito nomeado, a que aderiu integralmente e nele se exclusivamente se respalda a sentença proferida, …«não só peca por ser pouco aprofundado, como se “cola”, em demasia e acriticamente, à fundamentação avançada pela Apelada para a cessação do contrato de trabalho da recorrente, vindo o saneador/sentença a padecer, por tabela e indirectamente, dessas mesmas características, ao aderir ao teor, do qual reproduz grandes excertos, bem como às conclusões de tal parecer técnico.»

E prossegue:

«Importa fazer notar que a A., em rigor, não questiona que os procedimentos formais legalmente previstos (não) tenham sido respeitados, nem que a fusão entre as duas empresas impôs a dispensa de trabalhadores, por excedentários dentro das novas estrutura e organização da BB, colocando antes em causa que, relativamente a ela, tenham sido efectivamente aplicados os critérios previamente definidos, com vista à selecção dos trabalhadores que seriam objecto do dito despedimento colectivo, sugerindo mesmo que a cessação do seu vínculo laboral teve como único desiderato o de criar uma vaga para uma outra trabalhadora, de nome MM, que seria proveniente do departamento de planeamento e controlo da FF - …, S.A. e que teria ficado sem lugar no mesmo, na sequência da dita fusão.»

   Isto tudo para concluir, a final – …depois de assentar, com apoio na convocada/identificada doutrina e Jurisprudência, que o controlo judicial do despedimento colectivo implica também a verificação da idoneidade da motivação invocada para, em termos de razoabilidade, determinar a extinção dos concretos postos de trabalho, ou seja, a análise do nexo de causalidade adequada entre a motivação invocada e o despedimento colectivo, número de trabalhadores a despedir, categorias a abranger, critérios para a selecção daqueles trabalhadores a incluir no despedimento –, que (transcrevemos):

  …«Logo, aqui chegados, temos de concordar com a recorrente  quando classifica de precipitado e insuficientemente sustentado o saneador/sentença que julgou legítimos os fundamentos de índole material avançados pela Ré para o despedimento (colectivo) da Autora.

Sendo assim, revoga-se tal saneador/sentença na parte em que considerou procedentes os fundamentos invocados para o despedimento colectivo, devendo ser elaborados artigos da Base Instrutória que abarquem a matéria alegada pela trabalhadora a esse propósito e relativamente à qual não haja acordo entre as partes, devendo os demais (o art. 36.º da Petição Inicial, designadamente, por força do artigo 1.º da contestação) ser levados à matéria de Facto Assente…

Logo, o recurso de Apelação da Autora tem de ser julgado procedente, com a revogação do saneador/sentença na parte respeitante à procedência dos ‘fundamentos invocados para o despedimento colectivo’ e a substituição pela fixação da matéria assente e pela elaboração da base instrutória nos moldes acima determinados.»

O Acórdão revidendo, apreciando o despacho saneador/sentença, nas sobreditas circunstâncias, conheceu do mérito da causa – art. 721.º, n.º 1, referido à alínea h) do n.º 2 do art. 691.º, ambos do C.P.C. – sendo apenas a deliberação atinente que vem posta em crise.

Fê-lo em termos que, revistos, como antedito, se sufragam inteiramente, soçobrando consequentemente as razões que enformam as correspondentes asserções conclusivas que rematam a motivação recursória.

                                                           __

                                                           III –

                                                   DECISÃO

Pelos fundamentos expostos, acorda-se em negar a Revista e confirmar a deliberação impugnada.

Custas pela recorrente.

                                                           ***

Anexa-se sumário.

(Art. 713.º/7 do C.P.C.)

Lisboa, 8 de Maio de 2013

Fernandes da Silva (Relator)

Gonçalves Rocha

António Leones Dantas

____________________________

  
[1] O artigo 156.º-F do Código do Processo do Trabalho de 1981 tinha a seguinte redação:


Artigo 156.º-F

Despacho Saneador


1 – Juntos o relatório e documentos a que se referem os artigos anteriores, ou frustrada a tentativa de conciliação que tenha tido lugar, é proferido, dentro de 20 dias, despacho saneador para os fins seguintes:

a) Conhecer das exceções que podem conduzir à absolvição da instância, assim como das nulidades do processo;

b) Decidir se procede alguma exceção peremptória;

c) Decidir se foram cumpridas as formalidades legais do despedimento coletivo;

e) Conhecer diretamente do pedido, sempre que o processo contenha já os elementos necessários, designadamente em resultado das decisões referidas nas alíneas c) e d).

d) Decidir se procedem os fundamentos invocados para o despedimento coletivo.

2 – Não pode ser relegada para momento posterior a decisão sobre as questões referidas nas alíneas c) e d) do número anterior.

3 - Não pode igualmente ser relegado para momento posterior o conhecimento das exceções que obstem a que o tribunal decida sobre as questões a que se referem as alíneas c) e d) do número 1.

4 – Na apreciação dos factos deve o juiz respeitar os critérios de gestão da empresa.

[2] Em rigor, a Autora questiona mesmo a legitimidade da sua inclusão em tal despedimento coletivo, face à não sobreposição das funções pela mesma exercidas com outras de qualquer trabalhador da LL e à sua não sujeição aos “assessment” para os quais foram convocados os demais empregados que viram também cessar os seus contratos de trabalho.   
[3] Segundo o Professor Júlio Gomes, obra e local adiante citados, existem também divergências ao nível da doutrina estrangeira, conforme resulta das notas de rodapé que complementam o seu texto acerca desta matéria.  
[4] O Professor Júlio Gomes, obra citada, páginas 991 e 992, Nota (2382) refere um outro Aresto do Supremo Tribunal de Justiça que acolhe a mesma perspetiva, tecendo acerca dele os seguintes comentários críticos: «Cfr, por exemplo, recentemente, o Acórdão do STJ de 2 de Novembro de 2005, in ADSTA n.° 532, 2006, págs. 735 e segs. No sumário desse Acórdão pode ler-se que "o des­pedimento coletivo é, basicamente, uma decisão de gestão", que "traduzindo-se a decisão judi­cial numa intervenção na gestão da empresa (com relevo no próprio dimensionamento desta já que se trata de um despedimento que abrange uma pluralidade do trabalhadores) só se justifi­cará um juízo de improcedência se a conduta da empresa for abusiva, simulada ou de ma fé, ou seja se o juiz constar que a motivação invocada para o despedimento é manifestamente inaceitável e suscetível de indiciar um intuito fraudulento da entidade patronal". Afirma-se, inclusive, que "nada impede (...) que se proceda a um despedimento coletivo justificado no âmbito de uma empresa forte e competitiva, desde que tal medida de gestão encontre fundamentação suficiente que se integra nos motivos legalmente enunciados" e que "não é, pois, necessário que a situação económico-financeira, pela sua gravidade e consequências, torne indispensável o despedimento coletivo". O Tribunal admite ainda um controlo do nexo de causalidade entre os motivos aduzidos pelo empregador e o despedimento, mas é fácil compreender que tal controlo se reduz a muito pouco, já que os motivos apresentados podem simplesmente consistir num desejo de um maior lucro por parte do empregador. Trata-se de reconhecer a validade daquilo a que BERNARDO DA GAMA LOBO XAVIER designou de despedimento eficiente. Mas o que nos surpreende é que o tribunal (e a doutrina dominante) nunca atenda a que a liberdade de iniciativa e a proprie­dade privada têm que concorrer com outros direitos fundamentais (como o direito ao emprego) e que o juízo de proporcionalidade necessário para conciliar em concreto a colisão entre este tipo de direitos fundamentais dificilmente se pode bastar com alegações de mera eficiência. A posi­ção do Supremo Tribunal de Justiça nesta matéria põe, também, em causa a própria unidade e coerência do sistema jurídico: que sentido faz apresentar o despedimento disciplinar como última ratio quando o despedimento coletivo não exige qualquer situação de crise e se basta com o desejo de maior lucro do empregador? Se nos é permitida a imagem, que sentido faz, na realidade, rodear o abate de uma árvore das maiores cautelas, se for extremamente fácil incendiar toda a floresta? Repare-se que também nós entendemos que não é preciso esperar que a empresa se situe em situação de crise declarada, mas parece-nos ser necessário que a medida seja adequada e proporcionada tendo em vista o escopo de manter ou aumentar a competitividade da empresa. E, mesmo quanto à invocação de que o empregador agiu em abuso de direito refira-se que o Acórdão subscreveu o entendimento de BERNARDO DA GAMA LOBO XAVIER, em Parecer junto aos autos, de que "atos de má gestão e a existência em outros sectores de trabalhadores dispensáveis não inquinam de abuso de direito um despedimento coletivo quando em absoluto independentes das motivações apresentadas. A invocação do abuso do direito relativa aos despedimentos coletivos tem de reportar-se a esses mesmos despedimentos e não permite a apreciação de condutas gestionárias da empresa que lhe sejam alheias" (cit. apud ADSTA n.º 532, pág. 754). Como se vê, deixa de importar o que se passa em toda a empresa, ou na sua gestão global, para interessar ape­nas o que se passa no segmento selecionado pelo próprio empregador com a motivação que apresenta... Exatamente o oposto do que se passa noutros ordenamentos como o francês ou até no direito comunitário em que se tende cada vez mais a não comtemplar apenas aquela empresa, mas a unidade económica e social por exemplo do grupo de empresas em que ela se insere.»

 
[5] Em sentido pelo menos diverso, António Monteiro Fernandes, em “Direito do Trabalho”, 13.ª Edição, Janeiro de 2006, Almedina, páginas 602 e 603: «A concretização de um despedimento coletivo implica, legalmente, a observância de uma certa tramitação, cuja importância se reflecte no facto de a ruptura dos contratos de trabalho poder ser neutralizada com base em mera deficiência processual.
A natureza dos fundamentos da decisão de romper os contratos torna-os de muito difícil julgamento pelos tribunais: tratar-se-ia de pré-­decisões de gestão, de ponderações de natureza técnica ou económica, relacionáveis, estas mesmas, com factores subjectivos como as «expectativas», as «previsões» e as «tendências» percepcionadas pelos empresários e gestores. Por isso se constata que o despedimento colectivo é sobretudo vulnerável a formas de controlo político e social: a contestação sindical, a reacção da Administração. E daí, porventura, que ele seja um expediente utilizado com muito pouca frequência. Quando as entidades em­pregadoras pretendem reduzir o pessoal das empresas, recorrem preferen­cialmente à revogação dos contratos por mútuo acordo, processo que exclui todo o risco de fricção política e também, em princípio, de contestação judicial.
Tudo isto aponta para que a discussão judicial sobre um despe­dimento colectivo tenda a incidir, quase invariavelmente, sobre aspectos formais, processuais, isto é, sobre eventuais deficiências do procedimento seguido, face a tramitação legalmente imposta.» 

[6] - Vamos acompanhar, neste trecho, as proposições de síntese formuladas pela recorrente, a final.
[7] - Vide, na doutrina, inter alia, Pedro Furtado Martins, ‘Cessação do Contrato de Trabalho’, 3.ª Edição, 2012, Principia Editora, pg. 304-6, onde se cita Jurisprudência relevante produzida em conformidade.
[8] - Vide, por todos, o Acórdão de 13.1.2010, Proc. n.º 15275/09.1T2SNT.S1, desta 4.ª Secção, consultável no site da dgsi.pt.
[9] - Convindo ter presente, mesmo neste conspecto, que o procedimento de despedimento colectivo é um processo complexo de comunicações, consultas, pareceres, etc., que exige um formalismo rigoroso, revestido de um cariz substancial, em que a forma faz também parte da essência do modo de despedir.