Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
11947/17.5T8LSB.L1.S1
Nº Convencional: 4.ª SECÇÃO
Relator: PAULA SÁ FERNANDES
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO
RETRIBUIÇÃO
ISENÇÃO DE HORÁRIO DE TRABALHO
CESSAÇÃO DE PAGAMENTOS
ASSÉDIO MORAL
MOBBING
Data do Acordão: 01/27/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA DO AUTOR. CONCEDIDA A REVISTA DA RÉ.
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO
Sumário :
1- Não resultou provado que a viatura automóvel atribuída ao Autor tivesse sido por ele utilizada para deslocações profissionais e para deslocações pessoais, em dias normais de trabalho, fora do horário de trabalho, férias, fins-de semana e feriados, suportando a Ré todas as despesas, em particular com o combustível através do cartão Galp Frota. Não é, assim, possível presumir-se a natureza retributiva desta prestação pois competia ao Autor provar que beneficiava da atribuição da viatura também para uso pessoal, sem restrições, e que o empregador pagava todas as despesas com ela relacionadas, designadamente o cartão Galp Frota.
2- Logo que cesse a situação que motivou a prestação de trabalho em regime de isenção de horário de trabalho, o empregador pode deixar de pagar a remuneração especial a que se obrigou.
3- Não resultaram da matéria de facto provada, factos suficientes que nos permitam caracterizar o comportamento das Rés como assédio moral, nos termos prescritos no artigo 29.º do Código do Trabalho. Com efeito, não resultou provado que as Rés tenham tido quaisquer condutas hostis, vexatórias ou humilhantes em relação ao Autor ou que, de alguma forma, possam ter posto em causa a sua dignidade, baseados, ou não, em algum fator de discriminação. Por outro lado, também, não se apuraram factos sobre a intenção das Rés, designadamente, que tenham agido movidas por um qualquer objetivo ilícito ou eticamente reprovável, com o propósito de discriminar ou sequer hostilizar o Autor.
Decisão Texto Integral:


Processo n.º 1194/17. 5T8LSB.L1. S1

Recurso de revista


Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça

I. Relatório

AA intentou a presente ação emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma do processo comum, contra:

Montepio Geral Associação Mutualista,

Caixa Económica Montepio Geral,

BB,

CC e

DD, pedindo a condenação solidária dos Réus a pagar-lhe a quantia de € 99.278,80, a título de créditos laborais indemnizatórios.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos:

«Pelo exposto, julgo a presente ação parcialmente procedente por parcialmente provada e em consequência:

a) Absolvo os 3.º R., 4.º R. e 5.ª R. do pedido;

b) Condeno a 1.ª e 2.ª R. a pagar ao A. a quantia de € 14.522,32 derivada da retirada da concessão do cartão de crédito (formação profissional) e de viagens deslocações;

c) Condeno a 1.ª e 2.ª R. a pagar ao A. a quantia de € 37.468,38 derivada da retirada da concessão do IHT;

d) Condeno a 1.ª e 2.ª R. a pagar ao A. a quantia de € 14.200,00 derivada da retirada da concessão do cartão de combustível; (…)»

O Autor e as  1.ª e 2.ª Rés, inconformados, apelaram para o Tribunal da Relação ….., que proferiu acórdão, com um voto vencido, em 11 de setembro de 2019, nos seguintes termos: «Por todo o exposto, nos termos dos artigos 87.º, n.º 1, do Código do Processo do Trabalho e 662.º e 663.º do Novo Código de Processo Civil, acorda-se, neste Tribunal da Relação ……, no seguinte: a) Em julgar parcialmente procedente o recurso de apelação interposto por AA no que respeita à impugnação da Decisão sobre a Matéria de Facto, por referência à retificação dos Pontos 17. e 19., alteração dos Ponto 5., 13., 14., 26., 43., 46. e 48., eliminação dos Pontos 28., 52. e 70. e das alíneas d), e) e g) e aditamento dos Pontos 2-A., 19-A., 40-A., 48-A., 48-B. e 51-A. e das alíneas ff) e gg); 

b) Em determinar, ao abrigo dos artigos 613.º, 614.º e 662.º, a alteração oficiosa do Ponto 10. e a retificação do Ponto 55. da Matéria de Facto dada como provada; 

c) Em julgar parcialmente procedente o recurso de Apelação interposto por MONTEPIO GERAL – ASSOCIAÇÃO MUTUALISTA e CAIXA ECONÓMICA MONTEPIO GERAL no que respeita a duas das três questões jurídicas no mesmo suscitadas (cartão GALP e IHT); 

d) Em julgar parcialmente procedente o recurso de apelação interposto por AA, nessa medida se alterando a sentença recorrida e se condenando as Rés MONTEPIO GERAL – ASSOCIAÇÃO MUTUALISTA e CAIXA ECONÓMICA MONTEPIO GERAL a pagar ao Autor, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais derivados do assédio moral de que o Autor foi vítima, a quantia de 30.000,00, tudo acrescido dos juros de mora legais desde a data do vencimento de cada uma das quantias parcelares até ao seu integral pagamento.

e) No mais se confirma a sentença recorrida [absolvição dos 3.º, 4.º e 5.º Réus e condenação da 1.ª e 2.ª Rés a pagar ao Autor a quantia de € 14.522,32 derivada da retirada da concessão do cartão de crédito (formação profissional) e de viagens deslocações – alíneas a) e b) da parte decisória da sentença recorrida].»

O voto de vencido é relativo às questões do assédio moral [considerou a Sra. Desembargadora que o subscreveu que o apurado comportamento das Rés não integra o disposto no art.º 29.º, do Código do Trabalho] e, bem assim, à indemnização por danos não patrimoniais arbitrada a esse propósito [e que, segundo o seu entendimento, sempre seria excessivo no quadro da própria ponderação do recorrente].

Autor e 1.ª e 2.ª Rés, inconformados, interpuseram recursos de revista.

O Autor, no seu recurso de revista, elaborou as seguintes conclusões:

Pedido de repetição das declarações de parte do Autor

Ponto V das alegações - da impugnação da matéria de facto

1. Dão-se aqui por reproduzidos, nomeadamente, os argumentos vazados nas primeiras três folhas do ponto V das alegações e na parte final do ponto VII das alegações, para fundamentar o pedido ao STJ para que, no uso dos seus poderes de sindicância da lei adjetiva, ordene o reenvio do processo à 1.ª Instância para que o A. preste declarações de parte,

a. quanto à questão da procuração/mandato que permitiu colocar em juízo processos no TAF, esclarecendo tudo o que houve a esclarecer a esse respeito;

b. quanto à matéria vazada nos pontos 38 e 39 da matéria assente que deve ser levada ao pormenor;

c.  que a matéria da alínea anterior seja colocada a entidade independente que dela tem conhecimento pessoal e presencial, ou seja, a EE, residente na Rua ……. - que era foi Diretor de Recursos Humanos dos RR. e lidou diretamente com os acordos de IHT, pessoa que sabe todas as matérias que a testemunha FF diz saber, anteriores a 2010).

2. Isto para além das observações feitas à forma e tom como a audição do A. ocorreu, de onde se têm que retirar as questões e estilo e de temperamento, mas não pode deixar de se pedir que o STJ avalie o princípio da isegoria, como um direito fulcral, sobretudo quando se trata de pessoas, face ao momento, a quem não é exigível a posse de estado em 100% do seu equilíbrio psicossomático.

Indeferimento da junção de documentos com alegações de recurso para o TR…..

3. Dão-se aqui por reproduzidos, nomeadamente, os argumentos vazados nas quatro folhas do ponto III das alegações e consequentemente, peticiona-se ao STJ que revogue a douta decisão, na parte em que não deferiu a junção dos documentos n.º l e 2 juntos com as alegações para o TR…., por constituírem, na prática "factos notórios" e públicos, mas que são úteis e imprescindíveis para a perceção da verdade dos factos; b.  ou se assim não se entender seja ordenado ao TR……, no uso dos poderes de sindicância da lei adjetiva pelo STJ, que promova a adição de um novo ponto nos factos assentes, como nas alegações se propõe e aqui se reproduz, no sentido de se perceber o que fizeram GG (…..) e HH (o "…." a quem foi cometida alguma parte executiva, a mais fulcral).

4. Com efeito, só assim se percebe o tríptico de pessoas físicas envolvidas em atos de assédio moral, a parte que cada uma aceitou fazer, contra o Autor, como se refere nas alegações (BB, CC e GG, todos administradores) assessorados pelo inefável personagem citado (que acumulava lugares de Direção como ninguém e lugar nos órgãos sociais e no comando das eleições para os órgãos sociais) com suculentos proveitos remuneratórios que nem um rei (factos que são notórios e são verificáveis - públicos - nos relatórios e contas dos 1º e 2º RR publicados no site das instituições ou na CMVM).

Nulidades, obscuridades, ambiguidades, contradições ou omissão de pronúncia apontadas à douta decisão da 1a instância

As deliberações do órgão colegial Conselho de Administração do MG-AM e da CEMG (primeiro e segundo réus) como único meio de prova documental da existência de decisões do órgão colegial sobre matéria que só a ele comete e não a qualquer administrador, grupo de administradores ou delegados.

5. Tendo o A. invocado a nulidade de falta de pronúncia quanto à matéria atrás referida, discorda o A. da decisão da sua improcedência, dando aqui por reproduzido o que se disse nesse requerimento e o que se refere no ponto IV (1) das alegações, pedindo-se ao STJ que na procedência do alegado e provada revogue o douto acórdão nesta parte e decida ou ordene às instâncias que decidam em conformidade com essa procedência.

6. No entanto, podendo essa invocação resolver-se e radicar em deficiente julgamento da matéria de facto, em alternativa ao douto julgamento de revista impetrado, caso assim se entenda, requer-se que, no uso dos poderes de revista em direito adjetivo, o Venerando STJ reenvie o processo às instâncias para que se adicionem os pontos 70 e 71 à matéria de facto assente, porque estão verificados os pressupostos legais, cujo efeito prático é o mesmo, conforme se propõe em sede destas alegações.

A apreciação do meio de prova que constitui o documento n 2 junto com a contestação, enquanto prova complementar da perseguição, com base em factos não verdadeiros, movida contra o Autor.

7. Tendo o A. invocado a nulidade de falta de pronúncia quanto à matéria atrás referida, discorda o A. da decisão da sua improcedência, dando aqui por reproduzido o que se disse nesse requerimento e o que se refere no ponto IV (2) das alegações, pedindo-se ao Venerando STJ que na procedência do alegado e provada revogue o douto acórdão nesta parte e decida ou ordene às instâncias que decidam em conformidade com essa procedência.

8. No entanto, podendo essa invocação resolver-se e radicar em deficiente julgamento da matéria de facto, em alternativa ao douto julgamento de revista impetrado, caso assim se entenda, requer-se que, no uso dos poderes de revista em direito adjetivo reenvie o processo às instâncias, por estarem verificados os pressupostos, para que adicionem o ponto 72 à matéria de facto assente, cujo efeito prático é o mesmo, conforme se propõe em sede destas alegações.

A distinção de trabalho dependente versus trabalho independente, face à necessidade de existir contrato escrito que englobe a prestação de trabalho como advogado e face à presunção do n.º 1 do artigo 1158º do CC (por força do 350º-l do CC)

 9. Tendo o A. invocado a nulidade de obscuridade e ambiguidade quanto à matéria atrás referida, discorda o A. da decisão da sua improcedência, dando aqui por reproduzido o que se disse nesse requerimento e o que se refere no ponto IV (3) das alegações, que aqui se reproduzem, pedindo-se ao STJ que na procedência do alegado e provada revogue o douto acórdão nesta parte e decida ou ordene às instâncias que decidam em conformidade com essa procedência.

10. No entanto, podendo essa invocação resolver-se e radicar em deficiente julgamento da matéria de facto, em alternativa ao douto julgamento de revista impetrado, caso assim se entenda, requer-se que, no uso dos poderes de revista em direito adjetivo, o Venerando STJ reenvie o processo às instâncias, por estarem verificados os pressupostos, para que alterem a redação do ponto 54 da matéria de facto assente, cujo efeito prático é o mesmo, conforme se propõe em sede destas alegações.

Obscuridade ou ambiguidade, contradição ou deficiência ou falta de pronúncia do douto acórdão do TR…… recorrido

11. O douto acórdão da TR……. radicou a decisão de improcedência das nulidades em vários fundamentos (o mais relevante é que poderia estar em causa era o julgamento da matéria de facto - o que não se discute, mas à cautela obrigou o recorrente a estruturar estas alegações nas duas perspetivas: ou erro de julgamento de direito ou erro de julgamento de matéria de facto). No entanto na parte que invoca questões novas, sem as elencar e delimitar padece da nulidade de obscuridade ou ambiguidade, nulidade que se invoca.

VI - Pontos da matéria de facto impugnados pelo Autor

PARTE F DO DOUTO ACÓRDÃO DO TR…….

F1do acórdão recorrido - Aditamento de facto novo

A matéria dos artigos 87 a 93º da PI.

12. O A. pediu ao TR…… que alterasse a matéria de facto, levando à base instrutória (BI) quanto à matéria dos artigos 87º a 93º da PI. Mas o TR….. entendeu que não tinha qualquer relevância. Dão-se aqui por reproduzidos os argumentos na parte VI - Fl destas alegações, razão pela qual se pede ao STJ que considere esta matéria de crucial relevância para demonstrar que não ocorreu qualquer deliberação do CA das 1ª e 2ª3 Rés, mas sim decisões individuais e concertadas dos Senhores BB, CC e GG e consequentemente no uso dos seus poderes de sindicância do direito adjetivo remeta os autos às instâncias para que adicione o ponto 1-A nos factos assentes conforme proposta nas alegações.

F15 do acórdão recorrido - Alteração dos Pontos 32, 38 e 39 da matéria assente.

Cartão GALP e isenção de horário de trabalho IHT).

Artigos 43º a 51º da PI. Pontos 32 a 40 da matéria de facto assente.

Retificação dos pontos 32, 38 e 39 dos factos assentes.

13. Dá-se aqui por reproduzido o referido em VI - F15 das alegações. O A. propôs a alteração da redação dos pontos 32, 38 e 39 da matéria assente, o que o TR…… não aceitou referindo que o A. faz uma leitura literal. No entanto essa alteração da literalidade é essencial para clarificar a matéria de facto e não deixar margem para dúvidas e aproximá-la da prova produzida. Impõe-se assim ao STJ que no uso dos seus poderes de sindicância do cumprimento do direito adjetivo, ordene às instâncias essa clarificação de redação, face à prova produzida, adotando a redação proposta ou similar.

Adição de factos provados à BI que são cruciais ao julgamento da causa e supressão de um que está em dissonância

14. Os pontos 38 e 39 dos factos provados não podem considerar-se sem se considerar os factos que constam do documento n.º 3 junto com a contestação, que é o acordo de IHT, uma vez que, o que vale em primeira linha é o que está no acordo e não o que a lei diz sobre a IHT. Ou seja, o teor do documento deve integrar a BI.

15. Em face do exposto em VII - F15 das alegações que aqui se dão por reproduzidas, peticiona-se ao Venerando STJ que no uso dos seus poderes de sindicância do direito adjetivo, ordene às instâncias a adição de um ponto na matéria assente que reflita o teor do documento n.º 3 junto com a contestação e consequentemente ordene a supressão da alínea p) da matéria não provada, porque o teor do documento n9 3 o infirma, pelo menos quanto ao Autor.

F-17-Funções de técnico (com origem em contrato de trabalho subordinado) vs. funções de direção (diretor-adjunto ou subdiretor)

16. Dá-se aqui por reproduzido o alegado no VI - F-17 destas alegações. Nesta parte do douto acórdão (F-17) fazem-se afirmações que deixam o Autor perplexo e que se refutam, uma vez que não têm a ver com uma leitura atenta da matéria provada e alegada, não tem em consideração o que representa uma procuração forense vs. mandato (tributário ou judicial). Pode haver procuração com ou sem mandato e vice-versa.

17. E sobretudo afirmar que era o Autor que tinha de provar que o exercício do mandato em processos judiciais não estava comportado em contrato de trabalho subordinado, como se não tivessem sidos os RR. a sugerir ou alegar tal desiderato e como se o autor não tivesse, porque munido de procuração e mandato, a presunção da lei civil sobre a sua onerosidade, ou seja, fora da ideia de retribuição em trabalho subordinado.

18. Pelo que se requer ao STJ que se pronuncie sobre esta questão em abstrato, uma vez que foi expressa no acórdão recorrido, sem base legal, contratual ou probatória que seja suficiente.

F-21 -A caracterização da expressão "acompanhamento de processos de contencioso fiscal" vs. "continuou a exercer funções técnicas"

19. Dá-se aqui por reproduzido o alegado no ponto VI - F-21 das alegações. O Autor pediu a alteração do ponto 54 da matéria assente. Neste aspeto o Autor ficou atordoado pelo que se escreve no douto acórdão recorrido, desde logo pela contradição do que se refere a alínea v) dos factos não provados com o que é referido 53 dos factos provados.

20. E a contradição entre o ponto 54 com o ponto 10 e 53 é material e objetiva como se aduz nas alegações e aqui se reproduz.

21. Mas o pior é a forma como o douto acórdão se expressa quanto ao testemunho da II: "contraditório", "pouco claro" sem se afirmar um único ponto de contradição em concreto, um único ponto de falta de clareza em concreto, o que é desconcertante.

22. E depois afirma-se que existia "apoio logístico" sem que se diga o que é que essa generalidade se traduzia em termos materiais.

23. E afirma-se "outros depoimentos testemunhais" que atestam que o A. exercia o mandato forense enquanto trabalhador dependente. E não se cita um só e em que contexto.

24. O ponto 54. da matéria assente deverá respeitar o que os próprios RR reconhecem: que era EM REPRESENTAÇÃO, ou seja, se eram atos em Tribunal que se exige ser advogado, era representação forense e não mera representação, procuração passada a um diretor-adjunto.

25. Também para esclarecer este aspeto se peticiona que se ordene às instâncias, se necessário, que oiçam novamente em declarações de parte o Autor.

26. Pelo que, se peticiona ao STJ que no uso dos seus poderes de sindicância do direito adjetivo, ordene às instâncias a alteração da redação do ponto 54 da matéria assente, e suprima a alínea v) dos factos não provados, conforme o proposto, de forma a que não existam contradições e reflitam a prova produzida.

F-22 - Discriminação no "programa reforma ativa"

A prova documental

27. Dão-se aqui por reproduzidos os argumentos expendidos em VI- F-22 das alegações. O Autor peticionou ao TR…. que se suprimisse o ponto 59. da matéria assente. Para isso alegou o que consta de folhas 68 a 81 das alegações de recurso para a douta Relação ……, que aqui se dão por reproduzidas. Peticionou-se ainda a supressão da alínea dd) dos factos não provados. O TR…… negou essa alteração, mas tal decisão não está conforme o respeito pela lei adjetiva.

28. Os pontos 57 e 58 da matéria assente não refletem corretamente o documento n.º 7 junto com a PI e com o documento n. º 19 junto em anexo à resposta à exceção - Plano de Pensões das lª e 2ª Rés, o qual esclarece o que se diz no documento n. º 7 junto com a PI.

29. Por outro lado, a alínea dd) dos factos não provados contém uma expressão valorativa "incentivo financeiro" (sem se definir o que isto é) que até não corresponde à verdade, como se prova nas alegações e aqui se dá por reproduzido.

30. Quanto à prova produzida nos autos, mormente documental, pede-se ao STJ que no uso dos seus poderes de sindicância do cumprimento da lei adjetiva que ordene às instâncias que reflita na BI o que consta da prova documental não contestada, alterando a redação do ponto 57 em conformidade com o documento n 27 junto com a PI, adicionando um ponto 57A por forma a refletir o documento n.º 19 junto com as respostas às exceções e reformule o ponto 58 por forma a refletir a parte não comportada nos outros números anteriores.

Quanto ao depoimento de FF, subordinado dos RR salvo da 5ª Ré - eliminação do ponto 59 da matéria assente

31. Dá-se aqui por reproduzido o que se refere em VI - F-22 das alegações quanto a este item. O douto acórdão recorrido estriba-se do depoimento desta testemunha.

32. Não se nota no douto aresto a consideração de que a testemunha era e é (1) trabalhador dependente dos lº e 2º RR; (2) subordinado de BB e CC aqui réus (3) foram eles que o nomearam para o cargo (3) facto notório e público: um diretor de serviços como ele ganha o salário bruto com diuturnidades de cerca de 4 000,00 euros mês, mais IHT de duas horas o que dá 1 200,00 mensais mais, tem subsídio de função que pode ir a 100% do vencimento que é pensionável o que dá 4 000,00 euros mês; tem carro topo de gama mercedes, tem cartão gasóleo superior a plafond 200,00 euros mês e cartão de crédito para despesas de representação. Factos que - o do nível remuneratório de um diretor de serviços dos bancos é público e notório - não podem deixar de se ter em conta, sabendo que, tinha muito a perder se não "defendesse" quem tanto lhe dá a ganhar.

33. No seu depoimento disse uma coisa e o seu contrário. E tentou dar uma versão de algo que não se provou - decisão do CA - que nunca viu. Já a testemunha JJ não respondeu da forma que FF respondeu. E só podia falar do que podia, dado existir uma cláusula de silêncio em quem recebeu os valores de Vi porá cada ano de trabalho, com o limite de 60 000,00 euros.

34. Pelo que se pede ao STJ que use os seus poderes de sindicância do direito adjetivo e ordene às instâncias a supressão do ponto 59 da matéria assente até porque nenhuma deliberação do CA foi apresentada, nem a testemunha a viu, única forma que poderia servir de base à alteração do que consta do documento n.º 27 em anexo à PI.

Clarificação da alínea dd) da matéria de facto não provada.

Transformação em ponto 59 dos factos provados. Documento nº 6 em anexo à contestação

35. Dá-se por reproduzido o alegado em VI - F22 das alegações no segmento acima referido. De facto, no artigo 81.º da PI de facto fala-se em "incentivo financeiro", e no documento n 6 junto com a contestação, FF "adjetivou" o valor de 9 357,00 euros como sendo "incentivo financeiro".

36. Mas não pode deixar de se fazer uma análise cuidada dos factos contidos no processo e do que é notório em qualquer cessação de contrato de trabalho, ou seja, o que são factos evidentes, notórios, quem nem devem ser alegados. No caso haverá que perceber que o valor de 9 357,00 não é incentivo, mas sim desincentivo, mesmo em termos nominais.

37. Como ficou provado a cessação do contrato por acordo com base no "programa reforma ativa" implicava uma remissão abdicativa de qualquer outro valor (mesmo os relativos à caducidade do trabalho por reforma) e implicava a aceitação de uma cláusula de confidencialidade.

38. Basta ter-se em conta que quando ocorre cessação por caducidade do contrato de trabalho por reforma, há sempre férias a vencer no dia 1 do ano seguinte e o subsídio de férias. Há o subsídio de Natal do ano da cessação. Logo aqui, num salário de 3 000,00 mês brutos equivaleria ao valor proposto por FF.

39. Acresce a diferença do valor da reforma para o salário no ativo e o facto de, sendo a reforma feita mais tarde, mais desconto a entidade patronal faz para a SS e mais aumenta o direito à reforma e o seu valor.

40. Em face do tudo o exposto pede-se ao STJ que use os seus poderes de sindicância do direito adjetivo e ordene às instâncias a substituição do ponto 59 da matéria assente por outro que, suprimida a alínea dd) da matéria de facto não provada, retire a expressão conclusiva "incentivo financeiro", considere que existia remissão abdicativa e uma cláusula de confidencialidade, factos com relevo para a correta composição do litígio, adotando-se a redação proposta nestas alegações.

41. Junta-se em anexo um resumo das alterações na BI que, por força da prova clara e inequívoca constante dos autos, por via dos poderes-deveres que lhe são conferidos pela lei processual, mormente o artigo 662º-l-2 do CPC, se requer ao STJ que ordene seja levada a efeito, no uso dos seus poderes de revista quanto à correta aplicação da lei adjetiva - DOCUMENTO Nº 1
VII - Julgamento de direito. Aplicação da lei aos factos que estão provados segundo o douto acórdão e face às propostas de alteração formuladas pelo Autor.

VII-1 - Ponto R do acórdão do TR……. - plafond do cartão Galp frota

42. Dá-se aqui por reproduzida a argumentação vertida no ponto Vll-l das alegações, a qual, na sua procedência, implica a revogação do douto acórdão do TR……., mantendo a decisão da 1.ª instância. Com efeito,

43. A decisão de retirar o plafond do cartão Galp frota não consta ter tido respaldo em decisão do Conselho de Administração do 1.º e 2.º RR. nem tal se configura alegado.

44. A retirada do dito plafond nem foi objeto de qualquer comunicação, pelo que o cancelamento foi feito à surdida, sem uma comunicação, um telefonema, uma palavra que fosse.

45. Os RR. não ilidiram a presunção de que esse valor correspondia a remuneração - artigo 258º-3-4 do CT.

46. Mesmo que assim não fosse tendo o Autor suscitado na ação o pagamento por entender que era remuneração, competia aos RR. provar que não correspondia nos termos do n9 2 do artigo 342º do CC, o que não fizeram. Nem alegaram.

47. Por outro lado, tendo o Autor alegado nos artigos 89º e 91º da PI que a gestão dos recursos humanos das lª e 2ª Rés comete ao Conselho de Administração (CA), que não pode delegar essa competência, não provaram as Rés a existência da deliberação do CA, provada por ata, onde conste a decisão de retirar ou cancelar ao Autor o plafond de 200,00 euros mediante cartão Galp Frota.

48. Pelo que nunca poderá entender-se provada esta factualidade (de que há uma deliberação do CA, quando não há nem foi invocada a existência) sem ser através da ata do respetivo CA.

49. Daí que se imponha que o Venerando STJ no uso dos seus poderes de verificação do cumprimento da lei adjetiva (artigo 662-l-2 do CPC) que ordene ao TR…… a adição do ponto IA da matéria assente com a redação proposta no ponto VI Fl destas alegações e os pontos 70 e 71 da matéria de facto assente com a redação proposta, como já se referiu, porquanto se mostram cumpridos os pressupostos de alteração oficiosa da decisão da matéria de facto pelo TR…… e trata-se de factos provados e alegados (artigos 87º, 89º, 90º e 91º da PI).

50. Deve, pois, revogar-se o douto acórdão recorrido, nesta parte, e manter-se o decidido em lº instância.

VII-2- Isenção de Horário de Trabalho - Ponto T4 do acórdão do TR…..

51. Dá-se aqui por reproduzido o referido no ponto VII-2 das alegações de onde se extrai que fundamenta a sua decisão de revogar o decido na 1.ª instância no documento n.º 3 junto com a contestação que é o acordo sobre a IHT que vigorava com o Autor.

52. A este respeito o Autor aqui pediu ao STJ que ordene às instâncias a retificação dos pontos 38 e 39 da BI e adicione o um ponto como 39A.

53. No entanto, do teor do documento n.º 6 em anexo à contestação na­de retirar-se conclusão contrária à tirada no douto acórdão recorrido, uma vez que quando se expressou no acordo como considerando que "O trabalhador tem a categoria profissional de DIRECTOR ADJUNTO, exercendo as funções no n/estabelecimento GABINETE .........." e depois se acrescenta "no âmbito das funções exercidas, esclarece-se que é o trabalhador que, a nível de Direção..." está-se a fazer uma correspondência entre a categoria e as funções, ou seja, está-se a afirmar que é "diretor-adjunto" e por essas funções em termos gerais, lhe é conferida a IHT.

54. Ou seja, por outras palavras o que se contratou, não foi que a IHT era devida (1) se e enquanto o autor exercesse em concreto funções de chefia ou direção (2) mas sim que era devida mesmo que o diretor-adjunto, o Autor, não exercesse em concreto quaisquer funções de chefia ou direção, pela razão de que a leitura do declarado, para um qualquer declaratário não pode ser outra que não seja, em termos práticos, concluir, por força deste contrato, que foi em função da nomeação como "diretor-adjunto" a quem comete as funções em abstrato que esta categoria exerce em termos de ACTV (de direção), que a IHT foi contratada.

55. Esta leitura do que se acha escrito no contrato, é única consentânea com o facto de, como refere o douto aresto recorrido "importa também atender ao facto de o G… (GABINETE ..........) ter sido extinto no ano de 2008 e de o Autor, até 2010, ter exercido funções de ……e ……. (Ponto 14) e de ter mantido durante esse período de cerca de dois anos a referida IHT'. Ou seja, mesmo depois de deixar de chefiar o G….. (de exercer funções em concreto de chefia e direção) continuou a receber a IHT.

56. Acresce que não foi provado pelas RR., nem alegado, que a denúncia ocorreu "... por protocolo ou carta registada".

57. O que se refere nos pontos 38 e 39 dos factos assentes, cuja retificação de redação foi feita atrás, não equivalem à denúncia por "protocolo" ou "carta registada".

58. Com efeito, como se alegou na resposta às exceções o termo "protocolo", é definido na parte final do 1 do artigo 1432º/2 do CC (recibo assinado pelo destinatário na presença deste e do portador do protocolo), resultando, como acima se referiu, que não tendo a comunicação sido assinada, nem lida (e até perdida) pelo Autor, não se cumpriu o requisito "ad substantiam" da comunicação válida ao A., resultando, mesmo que a deliberação do CA que retirou a IHT fosse legal e legítima (provada por ata do CA) nunca foi validamente comunicada.

59. Acrescente-se que o Autor não referiu que abriu a missiva enviada (uma carta fechada dentro de um envelope castanho de formato A4 com buracos para se ver o interior) ou que a ]eu ou que tenha assinado a sua receção. Por isso não se verificou a comunicação válida da cessação, até porque não tinha os seus papéis organizados, estando tudo a monte, na altura em que foi compulsivamente despejado para a Sala do Edifício ……...

60. Acresce que o termo usado pelos RR "Missiva", (origem do francês missive/de lettre, é uma carta envelopada. Foi o que ocorreu, veio uma carta fechada, dentro de um envelope castanho A4 (aquilo que se chamava de correio interno) com buracos permitindo ver o interior.

61. Mas o A. nunca abriu sequer o envelope exterior, muitos menos o envelope branco fechado no interior.

62. E isso ocorreu com mais de duas centenas de outros envelopes de correio interno. A situação do A. na altura era de absoluto descontrolo.

63. Sendo que nas anotações manuscritas no documento nº 4 em anexo à contestação, nunca o funcionário do DRH afirma que deu nota do conteúdo da missiva, nem nunca o Autor lhe afirmou que sabia ou leu o conteúdo da missiva (o que estava na carta fechada dentro de um envelope de serviço castanho de tamanho A4 com buracos que podiam permitir o que vinha no seu conteúdo).

64. O Autor não abria nunca o que lhe era dirigido, quer no G....., quer depois de 2008 quando estava no Secretariado-Geral (até 2010). Isso era feito pelo apoio administrativo.

65. Na altura, como resulta do alegado pelo A. tinha todos os seus arquivos e papéis (todo os do G..... de mais de 10 anos e dos dois anos seguintes) em caixas de mudança, em número superior a 40.

66. O A., em inícios de 2010, data em que foi despejado para uma Sala no Edifício …, recebia por dia dezenas de comunicações em suporte de papel: DR I, II e II Série, Ciência e Técnica Fiscal, Boletim do Contribuinte, Informador Fiscal e número enorme de comunicações internas diversas.

67. Essas comunicações foram empilhadas sem que o A. as abrisse, dado lhe terem sido retiradas quaisquer funções e não ter apoio administrativo (que antes tinha no G..... e no Secretariado-Geral de onde foi corrido pelo dito HH).

68. O Autor está disponível a prestar declarações de parte, como requereu, sobre este e outros temas já referidos e desde já indica EE, residente na Rua ….., um ex-Diretor de Recursos Humanos dos RR. (a requisitar pela instância caso processo aí baixe) pessoa que sabe todas as matérias que FF diz saber, anteriores a 2010) e que presenciou (porque estava num gabinete ao lado) os factos narrados nas conclusões 66 e 67 supra.

69. Acresce ainda que, tendo o Autor alegado nos artigos 89º e 91º da PI que a gestão dos recursos humanos das lª e 2ª Rés comete ao Conselho de Administração (CA), que não pode delegar essa competência, não provaram as Rés a existência da deliberação do CA, provada por ata, onde conste a decisão de retirar ao Autor a IHT. Pelo que nunca poderá entender-se provada esta factualidade (de que há uma deliberação do CA, quando até as Rés admitem a sua inexistência) sem ser através da ata do respetivo CA, resultando violado o nº 1 do artigo 364º do CC, ao admitir-se outro meio de prova que não o documental.

70. Daí que se imponha que o Venerando STJ no uso dos seus poderes de verificação do cumprimento da lei adjetiva (artigo 662º-l-2 do CPC) decida pelo reenvio do processo ao TR….. para que se promova a adição de: o ponto IA da matéria assente com a redação proposta no ponto VI Fl destas alegações; os pontos 70 e 71 da matéria de facto assente com a redação proposta nas páginas 9 e 10 destas alegações; porquanto se mostram cumpridos os pressupostos de alteração oficiosa da decisão da matéria de facto pelo TR….. e trata-se de factos provados e alegados (artigos 87º, 89º, 90º e 91º da PI).

71. Por último, configura-se que a forma como o acordo de IHT foi firmada, pelas razões acima expostas impõem um juízo contrário ao referido no douto acórdão recorrido: "não é possível estabelecer a referida conexão contratual, permanente, essencial, indissolúvel (sem o acordo do trabalhador) entre uma realidade e outra (categoria e IHT), de maneira a encarar a denúncia em causa como ilegal", uma vez que ela existe e resulta logo do texto do acordo, que claramente não faz depender a IHT do exercício em concreto de funções diretivas, mas apenas do facto do Autor ter a categoria de diretor-adjunto mesmo sem esse exercício em concreto de funções diretivas.

72. Pelo que se impõe que seja revogada a douta decisão na parte em que absolveu os RR. do pedido quanto à IHT, mantendo a decisão da 1ª instância, o que se requer.

VII-3- Programa reforma activa - Ponto X do acórdão do TR…..

(Consigna-se que o recurso quanto a este segmento decisório resulta do facto evidente da fundamentação do douto aresto da lª Instância e o douto acórdão do TR… terem fundamentações completamente diversas para concluírem pela improcedência)

73. Dá-se aqui por reproduzido o alegado no ponto VII-3 das alegações salientando-se a parte em que se pediu alteração quanto à matéria de facto (ponto F-22 destas conclusões).

74. Não pode considerar-se como o considerou o acórdão recorrido que ao Autor foi feita uma proposta no âmbito do programa reforma ativa, com incentivo financeiro e este a recusou, uma vez como acima se demonstrou, a proposta foi um embuste que não correspondia sequer às diferenças salariais para se manter no ativo até à reforma e aos valores que se recebem pela caducidade do contrato por reforma, uma vez que o valor oferecido era com remissão abdicativa de quaisquer outros valores.

75. Não pode concordar-se com o douto acórdão recorrido quando refere "inexistem elementos objetivos e factuais que, por confronto com os demais reformados das Rés que viram cessar os seus contratos de trabalho por caducidade, ao abrigo de tal Programa da «Reforma Ativa», nos permitam extrair ou, pelo menos, presumir, com segurança e nitidez", porquanto

a. O Autor provou o teor completo e absoluto do que o Conselho de Administração aprovou e publicou quanto ao que era o Programa Reforma Ativa - Documento n9 26 que está erradamente refletido no ponto 57 dos factos assentes. E porque está erradamente refletido se propõe a remessa ao TR…… para adotar uma redação conforme ao documento conforme se propõe;

b. O Autor juntou o documento nº 19 em anexo à resposta às exceções mediante o qual é possível integrar a expressão usada "condições para aposentação (antiguidade e/ou idade)". Ou seja, o Autor provou que ele próprio era elegível para o programa;

c. Os próprios RR. e as testemunhas esclareceram que a todos os trabalhadores abrangidos foi pago J4 mês por cada ano de antiguidade, com o limite de 60 000,00 euros;

d. O Autor provou que 140 trabalhadores saíram ao abrigo do programa - documento nº 29 em anexo à PI;

e. Provou-se que os 140 trabalhadores que saíram tiveram que aceitar uma cláusula de remissão abdicativa e uma cláusula de confidencialidade - depoimento de JJ e LL.

f. O Autor provou, pelo testemunho de JJ, que ela não conhecia ninguém a quem não tivesse sido pago o incentivo financeiro pelo valor de 1/2 do salário por cada ano de antiguidade, com o limite de 60 000,00 euros.

76. Ao contrário os RR:

a. Estando o Programa Reforma Ativa publicado numa OS para todos os trabalhadores e sendo uma decisão do Conselho de Administração, os RR. não juntaram uma outra decisão escrita subsequente que alterasse ou modificasse a que consta em Ordem de Serviço.

b. Apenas a testemunha FF (o que escreveu "incentivo financeiro" bem sabendo que não era) fala de que existia essa deliberação do CA, com uma exceção para quem fazia 65 anos em 2016. Esta testemunha disse e desdisse, mostrando não ser credível e demonstrou um saber muito seletivo.

c. FF era subordinado de BB e de CC (réus);

d. FF acaba por dizer que nunca viu a deliberação do CA com a exceção dos 65 anos em 2016.

e. FF não sabia ao certo a quem se aplicou a exceção dos 65 anos em 2016. Nem sabia quando o Programa iniciou.

f. FF não indicou um único nome ou indicou uma única pessoa dos que estavam na lista de 140 que o Autor juntou a quem tenha sido a aplicada exceção dos 65 anos a fazer em 2016.

77. O Autor o que fez foi provar "os factos constitutivos do direito" (nº 1 do artigo 342º do CC)   receber o que todos receberam no programa reforma ativa.

78. Os RR. tinham que fazer prova cabal dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito que o Autor invocou (nº 2 do artigo 342º do CC), mas não a fizeram, uma vez que que o depoimento de FF, sendo pessoa subordinada aos RR, pela forma atabalhoada, de dizer e desdizer, seletiva e confusa, não pode considerar-se prova cabal de que a exceção invocada: a tal regra diferente para quem fazia 65 anos em 2016, existiu com base em decisão do Conselho de Administração, que FF disse que não a viu.

79. Acresce que, mesmo que se considerasse a prova testemunhal de FF isenta e credível, tal como se alegou no artigo 91º da PI, não foi feita, pela forma estatutária dos 1ª e 2ª RR. a prova da deliberação com a aludida exceção (nº 1 do artigo 47º dos estatutos do MG-AM e artigo 45º dos estatutos da CEMG (disponíveis em www.montepio.pt), redações que os RR não impugnaram.

80. O Autor provou o teor da deliberação do CA da 2.ª R. por documento escrito que os RR. não impugnaram, o qual se tem que admitir que reflete a deliberação constante em ata, mas os RR. não provaram a exceção à deliberação do CA da 2.ª Ré, nem pela forma estatutária, nem por escrito, podendo e devendo fazê-lo.

81. Estamos, pois, perante factos que só por documentos escritos (atas ou similares) podem provar-se, pelo que nos termos do artigo 364º do CC não pode julgar-se provado ou demonstrado que tenha ocorrido qualquer exceção à regra do decidido pelo CA da 2ª Ré constante do documento 26 em anexo à PI.

82. Mesmo que ao Autor competisse provar, pela negativa, que não existia qualquer exceção à regra constante do documento n9 6 em anexo à PI, por via a cláusula de confidencialidade, ocorreu a inversão do ónus da prova, uma vez que a sua aposição nos acordos celebrados com os contemplados, deve considerar-se caber na previsão do nº 2 do artigo 344º do CC, porquanto a 2ª Ré, ao colocar essa cláusula pretendeu como se configura óbvio afastar a hipótese de alguém depor em Tribunal sobre esse facto, conseguindo que o único que foi afastado - o Autor - não dispusesse de meios para provar que pessoas que fizeram 65 anos em 2016 não foram excluídas do regime geral e único do programa.

83.Foram violadas com o douto acórdão recorrido, nomeadamente: artigo 47º-1 e artigo 45º dos Estatutos do MG e CEMG vigentes na altura; artigos 12º e 258º-3-4 do CT; artigos 412-1 e 662º-l-2, ambos do CPC; e artigos 342º-1-2, 344º-2, 350º-1 e 1158º-1, todos do Código Civil.

No recurso interposto pelas 1.ª e 2.ª Rés foram elaboradas as seguintes conclusões:

1.As Recorrentes não podem conformar-se com o douto Acórdão recorrido que, salvo o devido respeito, nesta parte merece censura.

2. Relida a matéria de facto provada, na vertente que doutamente lhe foi dada pelo Tribunal da Relação, não podem as Recorrentes conformar-se com a condenação de que foram objeto.

3. A factualidade provada não assume contornos que se possam qualificar como desadequados e que, pela sua intensidade, continuidade e efeitos, pudessem constituir a prática de assédio moral emocional/psicológico, na classificação de JÚLIO GOMES (citação supra), dirigido à obtenção de um efeito psicológico na vítima, desejado pelo assediante (animus nocendi).

4. O caso do Recorrido é um verdadeiro case study do que não é um caso de assédio moral.

5. A apreciação feita pela douta sentença da 1.ª Instância, que acima se enfatiza, é concordante com o voto de vencido da Exma. Senhora Desembargadora MM que, muito bem, sublinha as contradições entre as alegações do Recorrido, no que respeita às datas em que diz ter sido vítima de assédio, e as consideradas no douto Acórdão recorrido, pois aquele situa tal alegação no momento em que 2010 e a não atribuição de funções diretivas reporta-se a 2008.

6. O Recorrido não tinha categoria profissional de “Diretor”, mas de “Diretor-Adjunto” cabendo a esta categoria apenas colaborar na elaboração de decisões.

7.O Recorrido manteve sempre, ao contrário do que alegou, o exercício de funções, as quais eram compatíveis com a sua categoria profissional e que se consubstanciaram no acompanhamento de processos de natureza fiscal e funções de consultadoria e assessoria fiscal, tendo-lhe sempre atribuído funções (facto 54) e não o tendo incluído no conjunto de trabalhadores que deixaram de exercer funções e aguardavam colocação (factos 48-A e 55).

8. As mudanças de gabinete e de localização, assim como a cessação do pagamento de algumas prestações não constituíram quaisquer atos discriminatórios pois ocorreram com a generalidade dos trabalhadores (factos 42, 48, 51 e 54) o que, como bem se salienta no voto de vencido, os descaracteriza enquanto comportamento assediante.

9. Ao contrário do que foi o entendimento do douto Acórdão recorrido, não se verificou qualquer conduta dos Recorrentes que pudesse ser qualificada como assediante.

10. Como bem se nota no voto de vencido, o montante arbitrado, se algum montante fosse devido – não concedendo - mostra-se excessivo no quadro da ponderação do próprio Recorrido pois este alega um quadro mais gravoso do que aquele que resulta dos factos provados (na leitura, que não se acompanha) que lhe dá o douto Acórdão recorrido.

11. Neste particular, atente-se na factualidade que foi alegada pelo Recorrido, mas que não se provou e que consta dos pontos g) a m) e o) a dd) dos factos não provados.

12. A intensidade que o Recorrido pôs na sua alegação a propósito do alegado assédio moral, não se comprovou nos autos.

13. Ainda que alguma indemnização houvesse que ser arbitrada ao Recorrido, a que lhe foi fixada pelo Acórdão recorrido mostra-se excessiva no quadro da ponderação do próprio Recorrido.

14. A fixar-se alguma indemnização – não concedendo – a mesma deveria fixar-se, por equidade, em valor substancialmente inferior ao peticionado, apontando-se, na presença dos factos respeitantes ao sofrimento do Recorrido, para montante não superior a 2.000,00 €.

15. O douto Acórdão recorrido deve, pois, nesta parte, ser revogado e substituído por decisão que absolva as Recorrentes do pedido de pagamento de qualquer indemnização por danos não patrimoniais ao Recorrido ou, assim não se entendendo conceder! – sem– deverá fixar-se valor indemnizatório em montante não superior a 2.000,00 €.

16. Ao decidir como decidiu, o douto Acórdão recorrido violou o disposto no artigo 29.º do Código do Trabalho e no artigo 342.º, n.º 1 do Código Civil.

As partes contra-alegaram, pedindo a improcedência do recurso de revista interposto pela contraparte.

Neste Tribunal, a Exma. Procuradora‑Geral Adjunta emitiu parecer, concluindo pela parcial procedência do recurso do Autor e pela total improcedência do recurso das Rés.

Notificado o parecer às partes, apenas as Rés tomaram posição, concluindo como nas respetivas alegações e contra-alegações.

II. Fundamentação

Tal como resulta das conclusões dos recursos interpostos que delimitam o seu objeto, as questões suscitadas são as seguintes:

Recurso do Autor
1.  Reenvio dos autos à 1.ª instância para que o Autor preste declarações de parte;
2.  Admissão da junção de documentos com as alegações do recurso de apelação;
3.  Nulidades da sentença e do acórdão recorrido, por obscuridade, ambiguidade, contradições ou omissão de pronúncia;
4.  Impugnação da matéria de facto;
5.  Direito do Autor ao plafond do cartão Galp Frota;
6.  Direito do Autor ao subsídio de Isenção do Horário de Trabalho
7.  Direito do Autor ao programa “reforma ativa”.

Recurso das Rés
1.        Da inexistência de assédio moral;
2.         Caso se conclua pela existência de assédio, apreciar se o montante da indemnização fixada (€ 30.000,00) é excessivo.

Fundamentos de facto

As instâncias consideraram provados os seguintes factos:

1. O Autor foi admitido, em 1974, como trabalhador dependente, empregado bancário, pelo MONTEPIO GERAL - ASSOCIAÇÃO MUTUALISTA e pela então CAIXA ECONÓMICA DE … anexa ao MONTEPIO GERAL, atual CAIXA ECONÓMICA MONTEPIO GERAL mediante concurso público;

2. Em 1986 foi criado o Gabinete dos .......... constituído inicialmente por duas pessoas de entre as quais o Autor, e posteriormente além do Autor por cerca de quatro a cinco pessoas, um contabilista, dois administrativos e em determinado momento, concretamente não apurado, uma jurista, do qual o Autor era o responsável;

2-A. – Esse Gabinete de .......... foi criado pela Ordem de Serviço n.º …., de 23/12/1986, tendo a mesma lhe definido igualmente as suas competências próprias em toda a fiscalidade do MG-AM e CEMG, conforme Documento n.º 1 que se mostra junto a fls. 33 e 34 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido. (aditado pela Relação)

3. O Gabinete detinha alguma autonomia, sendo que o Autor reportava as decisões que tomava no gabinete a um diretor, ao conselho de administração e ao secretário-geral;

4. As funções exercidas pelo Autor foram idênticas de 1986 a 2002, com o mesmo conteúdo funcional, podendo ter havido um acréscimo de responsabilidade em virtude de um acréscimo de matérias com que lidavam;

5. O Autor chefiou e foi o responsável pelo G…. desde a sua criação no ano de 1986 até 2008, data da sua extinção. (alterado pela Relação)

6. No âmbito das suas competências o Autor teve intervenção decisiva na obtenção da isenção de todos os impostos parcelares em vigor em data anterior à Reforma Fiscal de 1989, quanto ao MG-AM, que então não estavam atribuídos por falta de ação da instituição e ainda as da CEMG (que ao nível dos impostos parcelares abolidos beneficiavam de isenções pessoais);

7. Com a Reforma Fiscal de 1989, a CEMG anexa ao MG-AM, perdeu todas as isenções fiscais, mas o Autor, por sua iniciativa, encetou o processo de declaração como Pessoa Coletiva de Utilidade Pública (PCUP) da instituição bancária, com o objetivo de obter a isenção de todos os impostos de que estas entidades beneficiavam e obter ainda um registo na Conservatória do Registo Comercial – 3.ª Secção – da instituição, que não existia, conseguindo maior transparência, perante terceiros, que assim poderiam ter acesso a elementos que de outra forma não estavam patentes a um registo público;

8. E a sua intervenção possibilitou a obtenção da declaração da CEMG como PCUP;

9. E tal permitiu a obtenção de algumas isenções fiscais a favor da 2.ª Ré;

10. Ao Autor foi atribuída a categoria profissional de Subdiretor e Diretor-adjunto da 2.ª Ré em, respetivamente, 7/8/1998 e em 1/1/2002, cfr. fls. 142 v.º, e atribuída a Isenção de Horário de Trabalho, em 29/05/2001, que foi depois renovada em 14/11/2002 e ainda objeto de acordo em 21/8/2006, cfr., respetivamente, fls. 46 verso, 47 e 168 e 169 dos autos; (alterado pela Relação).

11. Em junho de 2016 o Autor reformou-se;

12. O Gabinete .......... foi extinto em 2008;

13. Nessa sequência o Autor foi colocado em 25.08.2008 no Secretariado Geral. (alterado pela Relação)

14. As funções de consultadoria e assessoria fiscal que o Autor exercia para o MG-AM no quadro do Gabinete .......... – G…, continuaram posteriormente a ser desenvolvidas até terem sido contratualizadas, em data indeterminada do ano de 2010, com uma sociedade de advogados a que pertence o Dr. NN, tendo as competências do Gabinete .........., com a sua extinção, transitado, no quadro da CEMG, para a Contabilidade, vindo a ser criado posteriormente um Departamento Fiscal, que integrou algum do pessoal do extinto G…., que não o Autor, e que foi da responsabilidade de uma pessoa provinda da KPMG, com o cargo de Diretora-Adjunta (Dr.ª OO). (alterado pela Relação)

15. Em fevereiro de 2010, o Autor foi mudado de instalações para uma sala no edifício ….., sito na Rua ……;

16. Antes desse momento sempre o Autor dispôs de um gabinete de trabalho individual;

17. O facto verificado em 15. supra derivou de HH, secretário-geral, ter perdido a confiança no Autor por lhe terem sido relatados factos alegadamente praticados pelo Autor e que punham em causa tal confiança, os quais nunca se apuraram se foram praticados; (retificado pela Relação).

18. Em virtude da perda da confiança HH pediu que o Autor fosse transferido para outro local de modo a não trabalharem juntos;

19. Decisão que foi tomada pelo administrador do pelouro, ora 4.º Réu e comunicada ao Autor verbalmente e por escrito. (retificado pela Relação)

19-A. A «Assessoria», onde o Autor foi colocado em 5/2/2010, designava um órgão subordinado ao Conselho de Administração dos 1.º e 2.º Réus, sem uma definição formal e institucional das respetivas competências. (aditado pela Relação)

20. Os arquivos, dossiers e livros do Autor ocupavam cerca de 40 caixas de transporte, e foram levadas para a sala em causa;

21. A atribuição ao Autor de cartão de acesso ao local de trabalho demorou tempo concretamente não apurado, levando a que por vezes o Autor tivesse de esperar para entrar ou sair até que alguém o fizesse igualmente;

22. A atribuição ao Autor de mobiliário para colocar os seus pertences demorou tempo concretamente não apurado;

23. O Autor ficou na sala mencionada sozinho, rodeado de três secretárias vazias;

24. Aquando da mudança de instalações, é normal que seja necessário um período até que todas as operacionalidades estejam a funcional em pleno, quer informáticas, quer administrativas ou de suporte, o que sucedeu com o Autor e outros trabalhadores que mudaram de instalações;

25. Em 2010, 2013, 2014 e 2015, o Autor efetuou pedidos de marcação de férias, e pedidos de alteração das mesmas, por meio de plataforma eletrónica disponível na 1.ª Ré, pedido que era encaminhado para o 3.º Réu, administrador do pelouro, que nunca as aprovou nem recusou;

26. O 3.º Réu entendia que os quadros diretivos/técnicos que dependiam de si saberiam quando poderiam ir ou não de férias, cabendo essa gestão aos próprios nunca aprovando, nem desaprovando, as férias dos diretores ou diretores adjuntos que com ele trabalhavam, facto que nunca foi do conhecimento do Autor; (alterado pela Relação)

27. Um pedido de alteração de férias do Autor de junho de 2015 veio a ser aprovado por uma técnica de recursos humanos;

28. Eliminado pela Relação

29. No início de cada ano é efetuada pela entidade empregadora a avaliação de desempenho dos funcionários relativa ao ano anterior, a qual assume importância, além de outros motivos, para atribuição do prémio anual, e atribuição ou renovação de benefício de mérito concedidos;

30. O Autor não foi chamado ao processo de avaliação profissional nos anos de 2009, 2011, 2012, 2013, 2014 e 2015, não obstante ter solicitado que a avaliação fosse efetuada;

31. Muitos diretores e diretores adjuntos não foram objeto de avaliação formal, mas eram todos, incluindo o Autor avaliados informalmente no PASC, reunião anual de administradores onde era decidida e analisada a carreira de cada um deles e a atribuição, manutenção ou retirada de benefícios a cada um em função dessa avaliação feita;

32. No dia 7 de maio de 2010, a 5.ª Ré comunica ao Autor a decisão tomada pelo conselho de administração da 1.ª Ré de cessar a utilização da viatura de serviço que estava afeta ao Autor;

33. É o conselho de administração que decide, caso a caso, atribuir, manter ou cessar a atribuição de viaturas aos seus funcionários, e manter, cessar ou atribuir a verba de IHT aos mesmos;

34. Ao Autor foi facultada a possibilidade de aquisição da viatura, o que este fez;

35. O veículo automóvel era atribuído pela 1.ª Ré em função das necessidades de serviço de cada colaborador, analisada casuisticamente, e não em função da categoria;

36. O Autor careceu de viatura automóvel para assegurar as suas deslocações em serviço às instituições fiscais e tributárias enquanto esteve no G…., tendo-lhe sido atribuída em 1997/1998;

37. Ainda em maio de 2010, foi cancelado o cartão GALP, para abastecimento de combustível, com o «plafond» mensal de € 200,00, sem que o Autor tivesse sido previamente informado disso;

38. Em 25 de maio de 2010, a 5.ª Ré comunicou ao Autor a decisão do conselho de administração de o Autor deixar de beneficiar do regime de isenção de horário de trabalho;

39. A referida missiva derivou de o Autor ter sido previamente informado da decisão do conselho de administração tomada em abril de 2010 quanto a tal retirada de benefício, ter sido informado ainda telefonicamente, duas vezes, no início de maio da necessidade de devolver a declaração devidamente preenchida atestando tal facto e não o ter feito por ter alegado ter perdido tal declaração;

40. O valor de IHT atribuído mensalmente ao Autor cifrava-se em € 543,22;

40-A – O Autor, nos anos de 2010 a 2015, auferiu os seguintes montantes anuais ilíquidos a título de remuneração constantes do seguinte quadro: (aditado pela Relação)

201020112012201320142015
€ 61 228,46€ 50 496,00€ 47 790,31€ 47 984,62€ 48 108,38€ 40 752,02

41. Em 06.07.2010 o Autor foi transferido da Sala ….. do …... andar do Edifício ….. para o ….. andar do Edifício …… integrado na Direção …..desde 1/7/2010, num espaço demarcado por biombos;

42. Todos os demais advogados da 1.ª Ré encontravam-se nesse espaço, demarcado por biombos por ausência de espaço para gabinetes próprios para cada um;

43. E em 16/9/2010 foi colocado no Departamento……. (alterado pela Relação)

44. E mudado em outubro de 2011, colocado na Direção……., mudando para o …... piso do mesmo prédio, num espaço demarcado por dois biombos ficando dependente de uma diretora adjunta mais nova do que o Autor;

45. Em maio de 2012 o Autor voltou para o …. piso do mesmo prédio, junto à biblioteca;

46. Em dezembro de 2012 mudou novamente agora para um gabinete, permanecendo no …... piso. (alterado pela Relação)

47. Em março de 2013 o Autor foi colocado no …... andar, cave alta do mesmo edifício;

48. Em maio de 2013 o Autor voltou a ser transferido para a Rua …… ficando numa sala com 120 metros, sem janelas nem portas, junto a uma pequena claraboia, espaço que constituía uma espécie de mezzanine, rodeado de 4 biombos, tendo estado a maior parte do tempo sozinho e durante o restante período de tempo que não se conseguiu determinar, acompanhado por um outro diretor adjunto. (alterado pela Relação).

48-A - O 4.º Réu telefonou ao Diretor da D……, PP dizendo-lhe para arranjar espaço físico para o Autor no referido edifício, mas que o mesmo não integraria tal Direção.  (aditado pela Relação).

48-B. Em 19 de novembro de 2015 o Autor foi novamente transferido do edifício da Rua …… para o edifício da Rua ……. – …...º piso. (aditado pela Relação)

49. No ….. piso da Rua …… encontrava-se a direção e no ….. piso onde estavam os advogados não havia espaço para todos;

50. A mudança de departamento em outubro de 2011 derivou de o Autor e HH não estarem de boas relações, sendo este o diretor da assessoria jurídica, pelo que foi decidido mudar o Autor de departamento;

51. As instalações que foram sendo disponibilizadas ao Autor eram instalações em espaços idênticos aos de outros colegas advogados/juristas;

51-A. - O Autor foi colocado em novembro de 2015 na Direção de Contencioso. (aditado pela Relação).

52. Eliminado pela Relação.

53. Não lhe foram atribuídas desde a extinção do G..... quaisquer funções de direção;

54. Tinha o Autor a seu cargo o acompanhamento de processos de natureza fiscais;

55. No espaço mencionado em 49. dos factos provados funcionava a D…… (Direção……), direção que recebia pessoas que tinham deixado de exercer funções e a aguardar colocação, mas o Autor nunca esteve colocado nessa direção; (retificado pela Relação)

56. O Autor chegou a participar em reuniões de quadros, reuniões de direção em que alguns diretores adjuntos participavam, tendo em determinado momento concretamente não apurado deixado de participar;

57. Em fevereiro de 2016 o Conselho de Administração da CEMG aprovou o “programa reforma ativa” com um incentivo financeiro, igual para todos os trabalhadores nas mesmas situações, que veio a aplicar a todos os trabalhadores nela abrangidos se cifrava em ½ vencimento mensal por cada ano de antiguidade;

58. O programa tinha uma limitação do montante máximo de € 60.000,00;

59. E no caso dos trabalhadores que tivessem 64 anos, como sucedia com o Autor, o montante era fixado em 50% do custo no ativo nesse ano, estimado até à idade de 65 anos;

60. O Autor foi chamado aos recursos humanos e foi proposta a reforma nos termos indicados no artigo anterior, ao que este recusou;

61. Em fevereiro de 2010, o 3.º Réu BB era o administrador do pelouro do Autor, o 4.º Réu CC era o administrador do pelouro dos recursos humanos e a 5.ª Ré DD era a diretora dos recursos humanos;

62. O Autor beneficiou de um cartão de crédito/formação e as viagens/deslocações desde data concretamente não apurada, mas que existia já em 2010 até 2014, valores, pagáveis em fevereiro de cada ano e em abril de cada ano, no valor de 3 435,19 euros e de 3 825,97 euros, respetivamente;

63. Em 2015 e 2016 não procedeu a tais pagamentos;

64. Desde a data mencionada em 62 e 63 a 1.ª e 2.ª Rés cessaram tais pagamentos a todos os trabalhadores em virtude da sua situação financeira, ninguém os tendo recebido em 2015 e 2016;

65. Sempre foi pago ao Autor o valor mensal de € 58,81 como comparticipação das 1.ª e 2.ª Rés para o pagamento das quotas da ordem dos advogados;

66. E deixou de proceder a tal pagamento em julho de 2016;

67. Todos os factos descritos, e em consequência da extinção do G....., causaram sofrimento no Autor e deixaram o Autor em stress contínuo, sofrendo profundamente, com uma incomodidade constante;

68. E o Autor tornou-se uma pessoa mais irrascível;

69. Passou a estar dependente de soporíferos para dormir ou descansar;

70. Eliminado pela Relação

Fundamentos de direito

 Recurso do Autor

1ª questão - Reenvio dos autos à 1ª instância para que o Autor preste declarações de parte.

Nas conclusões n.ºs 1 e 2, o Autor requereu a este Tribunal que ordene o reenvio dos autos à 1.ª instância para ele prestar de novo declarações de parte, pedido que havia formulado na apelação, mas que não mereceu acolhimento pelo Tribunal da Relação.

Esta pretensão do Autor prende-se com a repetição das declarações de parte, o que nos remete para o disposto no n.º 2, alínea a) do art. 662.º, do CPC, que estatui: «A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente: a) Ordenar a renovação da produção da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento; (…)» Este normativo consagra, assim, a  possibilidade de renovação da produção de certos meios de prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade de algum depoente ou sobre o sentido do depoimento que não possam ser ultrapassados por outras vias. No entanto, o seu n º4 estabelece que: «Das decisões da Relação previstas nos n.ºs 1 e 2 não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.»

Na situação dos autos, a Relação entendeu ser de indeferir a pretendida repetição das declarações de parte do Autor e fê-lo em moldes que não são sindicáveis por este Tribunal, atento o referido n.º 4 do art.º 662.º do CPC.

Nessa medida, indefere-se, neste ponto, o recurso interposto pelo Autor.

2ª questão - Admissão de documentos com as alegações do recurso de apelação.

Na conclusão n.º 3/a), o Autor pretende que este Tribunal revogue o acórdão recorrido na parte em que não admitiu a junção de documentos com a apelação.  

Efetivamente, o Autor apresentou um total de seis documentos conjuntamente com as suas alegações de recurso de apelação. Justificou essa apresentação alegando ter a decisão recorrida lavrado em erros de apreciação que impõem ao Autor o dever de juntar alguns documentos cuja junção se mostra necessária para ajudar o TR….. a integrar os factos no tempo, modo e circunstâncias.

O Tribunal da Relação indeferiu a requerida junção que considerou tardia e extemporânea.

Apreciando

O art.º 423 do CPC, sobre o momento da apresentação de documentos, estipula:

«1 - Os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes.
2 - Se não forem juntos com o articulado respetivo, os documentos podem ser apresentados até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, mas a parte é condenada em multa, exceto se provar que os não pôde oferecer com o articulado.
3 - Após o limite temporal previsto no número anterior, só são admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior.»
O art.º 651, n.º 1 do mesmo código dispõe que: «As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o art.º 425 ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido em 1ª instância». Por sua vez, dispõe o art.º 425.º, que «Depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tinha sido possível até aquele momento».
Resulta, assim, dos referidos dispositivos que os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa devem ser apresentados com os articulados ou, no máximo, até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final. Após este limite só são admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de alguma ocorrência posterior.
No caso, como bem se refere no acórdão recorrido, atento o seu teor, natureza e data de emissão, os documentos juntos com o recurso de apelação poderiam ter sido apresentados durante a tramitação da ação e até ao encerramento da discussão da causa, não tendo o Autor invocado qualquer obstáculo ou impedimento relativamente a tal junção em momento anterior ao da apresentação das suas alegações de recurso. Por outro lado, não se trata de documentos que se destinem à prova de factos posteriores ao encerramento da discussão de 1ª instância ou que só se tenham tornado necessários em virtude do julgamento proferido na 1ª instância, na justa medida em que a decisão da 1.ª instância não se baseou em meio probatório inesperadamente junto por iniciativa do tribunal ou em preceito jurídico com cuja aplicação as partes justificadamente não tivessem contado.
Nestes termos, decidiu bem o Tribunal da Relação ao indeferir a junção dos documentos com fundamento na sua extemporaneidade, na medida em que a sua apresentação não se reconduz a nenhuma das situações excecionais admitidas no referido regime, previsto nos artigos 423.º e 651.º do Código de Processo Civil.

Improcede, assim, também neste ponto, a revista do Autor.

3ª questãoNulidades da sentença e do acórdão recorrido, por obscuridade, ambiguidade, contradições ou omissão de pronúncia.

Nas conclusões n.ºs 5 a 10, o Autor insurge-se contra o acórdão recorrido na parte que julgou improcedentes as nulidades da sentença invocadas na apelação, com fundamento em obscuridade, ambiguidade, contradições ou omissão de pronúncia.

Nos termos do art. 615.º, n.º 1 al. d) do CPC (norma aplicável à 2ª instância como decorre do art.º 666, n.º 1 do mesmo diploma), é nula a sentença quando: «O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento».

Na situação dos autos, a Relação decidiu julgar improcedentes as nulidades da sentença invocadas pelo Autor e analisada a sentença da 1.ª instância constata-se que nenhuma das apontadas nulidades se verificam, dado que todas as questões suscitadas pelas partes foram apreciadas, conhecidas e fundamentadas de forma clara, lógica e coerente, independentemente do acerto da decisão que aqui não releva. Com efeito, não basta uma qualquer divergência relativamente à matéria de facto dada como provada ou não provada e/ou em relação à solução jurídica adotada, pois tal divergência pode consubstanciar um mero erro de julgamento sem a gravidade de uma nulidade da sentença.

Concordamos, assim, com o acórdão recorrido quando refere que a decisão da 1.ª instância «(…) mostra-se clara e inequivocamente sustentada de facto e de direito e, lógica e cronologicamente, construída no sentido da conclusão jurídica final a que chegou (…)» não ocorrendo tão pouco uma situação de «(…) falta de apreciação e julgamento das questões que são levantadas nos autos pelas partes.

O Tribunal da Relação conheceu ainda as invocadas nulidades do acórdão recorrido, julgando-as improcedentes, por acórdão proferido, posteriormente, em 4 de dezembro de 2019 que não conheceu qualquer impugnação. 

Improcede, também este ponto do recurso de revista do Autor.

4ª questão- Impugnação da matéria de facto

Nas conclusões n. º 12 a 41, o recorrente pretende ver alterada a matéria de facto, designadamente, nos seguintes termos:

- Aditamento de factos com a matéria dos artigos 87.º a 93.º da petição inicial;

- Alteração dos Pontos 32, 38 e 39 da matéria assente.

- Adição de um ponto na matéria assente que reflita o teor do documento n 3 junto com a contestação (acordo de IHT) e consequentemente ordene a supressão da alínea p) da matéria não provada;

- Alteração do ponto 54 da matéria assente e supressão da alínea v) dos factos não provados;

- Supressão do ponto 59 da matéria assente e da alínea dd) dos factos não provados.

- Alteração da redação do ponto 57 em conformidade com o documento n.º 27 junto com a petição inicial, e adição de um ponto 57A por forma a refletir o documento n.º 19 junto com as respostas às exceções e reformulação do ponto 58.

- Substituição do ponto 59 da matéria assente por outro que, suprimida a alínea dd) da matéria de facto não provada, retire a expressão conclusiva "incentivo financeiro", considere que existia remissão abdicativa e uma cláusula de confidencialidade;

Também nas conclusões n.ºs 3/b, 6, 8 e 10, o recorrente pediu, a título subsidiário, o aditamento de «(…) um novo ponto nos factos assentes, como nas alegações se propõe e aqui se reproduz, no sentido de se perceber o que fizeram GG (……) e HH (o "….." a quem foi cometida alguma parte executiva, a mais fulcral).», assim como a alteração dos pontos 54, 70, 71 e 72 da matéria de facto assente.

Vejamos

Na sequência da impugnação da matéria de facto que o Autor deduziu na apelação, o Tribunal da Relação, julgando-a parcialmente procedente, decidiu retificar os pontos 17 e 19, alterar os pontos 5, 13, 14, 26, 43, 46 e 48, eliminar os pontos 28, 52 e 70 e as alíneas d), e) e g) e aditar os pontos 2-A, 19-A, 40-A, 48-A, 48-B e 51-A e as alíneas ff) e gg). Decidiu, ainda, ao abrigo dos artigos 613.º, 614.º e 662.º do Código de Processo Civil, proceder à alteração oficiosa do ponto 10 e à retificação do ponto 55 da matéria de facto dada como provada. 

Resulta do acórdão recorrido que o Tribunal da Relação agiu no quadro dos poderes de reapreciação da prova fixada pela 1.ª instância, decorrentes do disposto no artigo 662.º do CPC. Todavia, conforme resulta do n.º 4 do mesmo artigo, a decisão do Tribunal da Relação, quando tenha por objeto meios de prova sujeitos ao princípio da livre apreciação da prova não é suscetível de recurso de revista para o Supremo Tribunal de justiça. Com efeito, em sede de revista, a intervenção deste Tribunal, no âmbito do apuramento da matéria de facto, é residual pois destina-se a apreciar a observância das regras de direito material probatório, nos termos do art. 674.º, n.º 3, em conjugação com o n. º 2 do art. 682.º do CPC, ou a mandar ampliar a decisão sobre a matéria de facto, nos termos do n.º 3 do último preceito.

A decisão do Tribunal da Relação quanto à matéria de facto não pode, assim, ser alterada pelo Supremo Tribunal de Justiça, salvo nas situações excecionadas, em caso de erro sobre regras de direito probatório material, ou quando seja insuficiente e deva ser ampliada em ordem a constituir base suficiente para a decisão de direito.

No caso, verifica-se que o Tribunal da Relação procedeu à análise do mérito da impugnação à matéria de facto deduzida na apelação, reapreciando os meios de prova produzidos junto da 1.ª instância e fundamentando as alterações que entendeu introduzir no elenco dos factos fixados pela 1.ª instância, em cumprimento do disposto no art.º 607.º, n.º 4, do CPC, em moldes não sindicáveis por este Tribunal. Com efeito, a reapreciação da matéria de facto fixada pela Relação mostra-se suportada em prova de livre apreciação e posta em crise apenas no âmbito da perceção e formulação do respetivo juízo de facto, pelo que, não estando em causa a violação do direito probatório material – tão pouco o recorrente o invoca - deve prevalecer a apreciação e modificação da matéria de facto efetuada pelo Tribunal da Relação.

Improcede a apreciação das alterações à matéria de facto pretendidas pelo Autor.

5ª questão - Direito do Autor ao plafond do cartão Galp Frota

Nas conclusões n.ºs 42 a 50, o Recorrente pretende a revogação do decidido na parte relativa ao plafond do cartão Galp frota.

No acórdão recorrido foi decidido não ter resultado provado que a atribuição do cartão Galp implicasse classificar a sua atribuição com natureza retributiva, com a inerente proibição da sua retirada e inevitável condenação das rés nas remunerações vencidas e vincendas ao autor  

Apreciando

Provou-se, com relevo para esta matéria a seguinte factualidade:

32. No dia 7 de maio de 2010, a 5.ª Ré comunica ao Autor a decisão tomada pelo conselho de administração da 1.ª Ré de cessar a utilização da viatura de serviço que estava afeta ao Autor;

33. É o conselho de administração que decide, caso a caso, atribuir, manter ou cessar a atribuição de viaturas aos seus funcionários, e manter, cessar ou atribuir a verba de IHT aos mesmos;

34. Ao Autor foi facultada a possibilidade de aquisição da viatura, o que este fez;

35. O veículo automóvel era atribuído pela 1.ª Ré em função das necessidades de serviço de cada colaborador, analisada casuisticamente, e não em função da categoria;

36. O Autor careceu de viatura automóvel para assegurar as suas deslocações em serviço às instituições fiscais e tributárias enquanto esteve no G....., tendo-lhe sido atribuída em 1997/1998;

37. Ainda em maio de 2010, foi cancelado o cartão GALP, para abastecimento de combustível, com o «plafond» mensal de € 200,00, sem que o Autor tivesse sido previamente informado disso;

Decorre desta factualidade que em 1997/1998, foi atribuída ao Autor uma viatura automóvel para assegurar as suas deslocações em serviço às instituições fiscais e tributárias enquanto esteve no G….. e que, em maio de 2010, foi-lhe cancelado o cartão GALP, para abastecimento de combustível, com o «plafond» mensal de € 200,00, sem que o Autor tivesse sido previamente informado disso.

Em 1997/1998, vigorava o artigo 82.º, da LCT, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 49408, nos termos do qual «Só se considera retribuição aquilo a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito como contrapartida do seu trabalho» (n.º 1), nela se incluindo «a remuneração de base e todas as outras prestações regulares e periódicas feitas, direta ou indiretamente, em dinheiro ou em espécie» (n.º 2), sendo certo que «até prova em contrário, presume-se constituir retribuição toda e qualquer prestação da entidade patronal ao trabalhador» (n.º 3). O mesmo dispõe o artigo 249.º, do Código do Trabalho de 2003, aprovado pela Lei 99/2003, de 27.08, ao determinar que «só se considera retribuição aquilo a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito como contrapartida do seu trabalho» (n.º 1), que «na contrapartida do trabalho inclui-se a retribuição base e todas as prestações regulares e periódicas feitas, direta ou indiretamente, em dinheiro ou em espécie» (n.º 2), que «até prova em contrário, presume-se constituir retribuição toda e qualquer prestação do empregador ao trabalhador» (n.º 3) e que « a qualificação de certa prestação como retribuição, nos termos dos n.ºs 1 e 2, determina a aplicação dos regimes de garantia e de tutela dos créditos retributivos previstos neste Código» (n.º 4).

Em igual sentido, o artigo 258.º, do Código do Trabalho de 2009, aprovado pela Lei 7/2009, de 12.02, estipula que se considera retribuição «a prestação a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito em contrapartida do seu trabalho» (n.º 1), que «a retribuição compreende a retribuição base e outras prestações regulares e periódicas feitas, direta ou indiretamente, em dinheiro ou em espécie» (n.º 2), que «se presume constituir retribuição toda e qualquer prestação do empregador ao trabalhador» (n.º 3) e que « à prestação qualificada como retribuição é aplicável o correspondente regime de garantias previsto neste Código» (n.º 4).

Quanto à garantia da irredutibilidade da retribuição, estipula o artigo 21º, n.º 1, alínea c), da LCT, que é proibido à entidade empregadora diminuir a retribuição, salvo nos casos previstos na lei, nas portarias de regulamentação de trabalho e nas convenções coletivas ou quando, precedendo autorização do “Instituto Nacional do Trabalho e Previdência (Posteriormente a 1974, a referência passou a ser o “Ministério do Trabalho”)”, houvesse acordo do trabalhador. Por seu lado, tanto o artigo 122.º, alínea d), do Código do Trabalho de 2003 como o artigo 129.º, n.º 1, alínea d), do Código do Trabalho de 2009, dispõem que é proibido ao empregador diminuir a retribuição, salvo nos casos previstos no Código e nos instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho.

Existe jurisprudência consolidada, na secção social deste Tribunal, no sentido de que a atribuição de veículo automóvel ao trabalhador, com despesas de manutenção a cargo do empregador, para o serviço e para o seu uso particular, constitui, ou não, retribuição conforme se prove que o empregador ficou vinculado a efetuar essa prestação ou que a referida atribuição configura um ato de mera tolerância.

Assim, a atribuição do direito, ao trabalhador, de utilização do veículo na sua vida particular, incluindo fins de semana, feriados e férias e ao suportar todos os encargos, designadamente com a sua manutenção, seguro, portagens e combustível, torna, segundo a jurisprudência deste Tribunal, essa prestação com carácter de obrigatoriedade. E sendo uma prestação em espécie, com carácter regular e periódico e com valor patrimonial, assume a natureza de retribuição. Neste sentido, a título exemplificativo, decidiu este Tribunal no acórdão de 30-04-2014, no processo n.º 714/11.00TTPRT.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt:

1) Tendo-se provado que o empregador distribuiu ao trabalhador um veículo ligeiro de passageiros para seu uso exclusivo, ficando todos os encargos, manutenção, seguros, portagens e combustível a cargo daquela e que o trabalhador utilizava a viatura para uso exclusivo, nas deslocações da residência para o local de trabalho, nos fins de semana e férias, para efeitos pessoais, a mencionada atribuição de veículo automóvel assume natureza retributiva, estando o empregador vinculado a efetuar, com caracter de obrigatoriedade, essa prestação.

2) Tratando-se de uma prestação em espécie com caracter regular e periódico e um evidente valor patrimonial, que assume natureza de retribuição, beneficia, por isso, da garantia de irredutibilidade, prevista nos artigos 21.º, n.º 1, alínea c), da LCT, 122.º, alínea d), do Código do Trabalho de 2003 e 129.º, alínea d), do Código do Trabalho de 2009.

3) Presumindo-se constituir retribuição toda e qualquer prestação do empregador ao trabalhador, competia ao empregador provar que o uso de veículo automóvel atribuído ao trabalhador se tratava de mera liberalidade ou de um ato de mera tolerância, ónus que não se mostra cumprido.

Relativamente ao ónus da prova, a lei consagrou um regime favorável ao trabalhador, porquanto os artigos 82.º, n.º 3, da LCT, 249.º, n.º 3, do Código do Trabalho de 2003, e 258.º, n.º 3, do Código do Trabalho de 2009, determinam que se presume, até prova em contrário, constituir retribuição toda e qualquer prestação da entidade empregadora ao trabalhador. Ao trabalhador basta, assim, provar a perceção das prestações pecuniárias ou em espécie, não tendo de provar que as mesmas são contrapartida do trabalho. Tratando-se de uma presunção “juris tantum”, compete ao empregador, nos termos do artigo 350.º, n.º 2, do Código Civil, provar que as prestações pecuniárias percebidas pelo trabalhador não revestem natureza de retribuição.

No caso, importa saber se a atribuição do cartão Galp Frota ao Autor assumiu, ou não, natureza retributiva, com a inerente proibição da sua retirada.

Da factualidade provada, não resulta que a viatura automóvel atribuída ao Autor tivesse sido por ele utilizada para deslocações profissionais e para deslocações pessoais, em dias normais de trabalho, fora do horário de trabalho, férias, fins-de semana e feriados, suportando a Ré todas as despesas, em particular com o combustível através do cartão Galp Frota. Não é, assim, possível presumir-se a natureza retributiva desta prestação, nos termos dos referidos artigos 82.º, n.º 3, da LCT, 249.º, n.º 3, do Código do Trabalho de 2003, e 258.º, n.º 3, do Código do Trabalho de 2009, sendo certo que competia ao Autor alegar e provar que beneficiava da atribuição da viatura também para uso pessoal, sem restrições, e que o empregador pagava todas as despesas com ela relacionadas, designadamente o cartão Galp Frota.

Nada há que censurar ao decidido no acórdão recorrido, neste ponto, sendo de manter a decisão recorrida e julgar improcedente o recurso também quanto a questão.

6ª questão - Direito do Autor ao subsídio de isenção do horário de trabalho

Nas conclusões n.ºs 51 a 72, o Autor pretende a revogação do acórdão recorrido na parte em que absolveu as Rés do pedido quanto à isenção do horário de trabalho, devendo manter-se a decisão da 1ª instância.

Defende o Autor que «(…) o que se contratou, não foi que a IHT era devida (1) se e enquanto o autor exercesse em concreto funções de chefia ou direção (2) mas sim que era devida mesmo que o diretor-adjunto, o Autor, não exercesse em concreto quaisquer funções de chefia ou direção, pela razão de que a leitura do declarado, para um qualquer declaratário não pode ser outra que não seja, em termos práticos, concluir, por força deste contrato, que foi em função da nomeação como "diretor-adjunto" a quem comete as funções em abstrato que esta categoria exerce em termos de ACTV (de direção), que a IHT foi contratada».

No acórdão recorrido foi decidido julgar procedente esta terceira vertente do recurso de Apelação das Rés, com a inerente revogação da sentença nessa parte - pagamento de IHT ao Autor e absolvição das demandadas quanto ao correspondente pedido.

Apreciando

Provou-se, com relevo, a seguinte factualidade:

2. Em 1986 foi criado o Gabinete ......... constituído inicialmente por duas pessoas de entre as quais o Autor, e posteriormente além do Autor por cerca de quatro a cinco pessoas, um contabilista, dois administrativos e em determinado momento, concretamente não apurado, uma jurista, do qual o Autor era o responsável;

3. O Gabinete detinha alguma autonomia, sendo que o Autor reportava as decisões que tomava no gabinete a um diretor, ao conselho de administração e ao secretário-geral;

5. O Autor chefiou e foi o responsável pelo Gabinete .......... desde a sua criação no ano de 1986 até 2008, data da sua extinção.

10. Ao Autor foi atribuída a categoria profissional de Subdiretor e Diretor-adjunto da 2.ª Ré em, respetivamente, 7/8/1998 e em 1/1/2002, cfr. fls. 142 v.º, e atribuída a Isenção de Horário de Trabalho, em 29/05/2001, que foi depois renovada em 14/11/2002 e ainda objeto de acordo em 21/8/2006, cf., respetivamente, fls. 46 verso, 47 e 168 e 169 dos autos;

12. O Gabinete .......... foi extinto em 2008;

13. Nessa sequência o Autor foi colocado em 25.08.2008 no Secretariado Geral.

14. As funções de consultadoria e assessoria fiscal que o Autor exercia para o MG-AM no quadro do Gabinete .......... – G…., continuaram posteriormente a ser desenvolvidas até terem sido contratualizadas, em data indeterminada do ano de 2010, com uma sociedade de advogados a que pertence o Dr. NN, tendo as competências do Gabinete .........., com a sua extinção, transitado, no quadro da CEMG, para a Contabilidade, vindo a ser criado posteriormente um Departamento Fiscal, que integrou algum do pessoal do extinto G…., que não o Autor, e que foi da responsabilidade de uma pessoa provinda da K….., com o cargo de Diretora-Adjunta (Dr.ª OO).

33. É o conselho de administração que decide, caso a caso, atribuir, manter ou cessar a atribuição de viaturas aos seus funcionários, e manter, cessar ou atribuir a verba de IHT aos mesmos;

38. Em 25 de maio de 2010, a 5.ª Ré comunicou ao Autor a decisão do conselho de administração de o Autor deixar de beneficiar do regime de isenção de horário de trabalho;

39. A referida missiva derivou de o Autor ter sido previamente informado da decisão do conselho de administração tomada em Abril de 2010 quanto a tal retirada de benefício, ter sido informado ainda telefonicamente, duas vezes, no início de maio da necessidade de devolver a declaração devidamente preenchida atestando tal facto e não o ter feito por ter alegado ter perdido tal declaração;

40. O valor de IHT atribuído mensalmente ao Autor cifrava-se em € 543,22;

53. Não lhe foram atribuídas desde a extinção do G..... quaisquer funções de direção;

Decorre da matéria de facto referida que, pelo menos, desde o ano de 2001, o Autor beneficiou do regime da isenção de horário de trabalho, sendo que, em 2006, celebrou a esse propósito um acordo escrito com a 2.ª Ré (transcrito no acórdão recorrido), acordo esse que veio a ser denunciado no ano de 2010 pela Ré.

Assim, e embora o início da prestação de trabalho e do referido pagamento tenham ocorrido na vigência da LCT, os factos em causa ocorreram também no domínio do Código do Trabalho de 2003 e, particularmente, no âmbito do Código do Trabalho de 2009, o qual se encontrava em vigor aquando da comunicação de tal cessação.

No entanto, os referidos Códigos de 2003 e 2009 não introduziram alterações significativas quanto ao conceito de retribuição e ao princípio da irredutibilidade da mesma, como decorre dos respetivos artigos 122.º, al. d) e 249.º do Código do Trabalho de 2003 e artigos 258.º e 129.º, n.º 1, al. d) do Código do Trabalho de 2009.

De referir ainda que, no período em causa, vigorou o Acordo Coletivo de Trabalho (ACT) para o setor bancário publicado nos BTE: 31/90, 30/91, 31/92, 32/93, 42/94, 17/95, 41/95, 2/96, 5/96, 15/97, 21/98, 24/98, 24/99, 25/2000, 24/2001, 26/2002, 3/2009 [com texto consolidado], 39/2010, 3/2011 e 8/2012. E o ACT para o setor bancário estabelecia na respetiva cl. ª 54.ª, números 4 e 5, o seguinte:

«4. O regime de isenção de horário de trabalho cessará nos termos acordados ou, se o acordo for omisso, mediante denúncia de qualquer das partes feita com a antecedência mínima de um mês.

5. Se a denúncia for da iniciativa da instituição, é devido o pagamento da retribuição adicional até três meses depois de a mesma ter sido comunicada ao trabalhador.»

Por outro lado, prevê-se na cláusula segunda do acordo de isenção de horário de trabalho celebrado entre as partes que «as funções que estão cometidas ao trabalhador não se compadecem com a regra da previsibilidade da duração e distribuição do tempo de trabalho diário, nem com o limite máximo do período normal de trabalho vigente no sector bancário», referindo-se também na cláusula quarta que o referido acordo «(...) vigorará até que uma das partes o denuncie», sendo que «a denúncia terá de ser comunicada por protocolo ou carta registada».

A secção social deste Tribunal já teve oportunidade de se pronunciar sobre o princípio da irredutibilidade da retribuição sempre que esteja em causa a remuneração especial por isenção do horário de trabalho, tendo vindo a entender, designadamente, que logo que cesse a situação que motivou a prestação de trabalho em regime de isenção de horário de trabalho o empregador pode deixar de pagar a remuneração especial a que se obrigou. Com efeito, no acórdão proferido em 19-01-2011, no processo n.º 557/06.2TTPRT.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt, referiu-se: «Embora de natureza retributiva, a remuneração especial por isenção do horário de trabalho não se encontra submetida ao princípio da irredutibilidade da retribuição, pelo que só será devida enquanto perdurar a situação em que assenta o seu fundamento, podendo a entidade patronal suprimi-la quando cesse a situação específica que esteve na base da sua atribuição».

No acórdão de 4-05-2011, proferido no processo n.º1907/07.0TTLSB.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt, entendeu-se que: «O princípio da irredutibilidade da retribuição não incide sobre a globalidade da retribuição, mas apenas sobre a retribuição estrita, ficando afastadas as parcelas correspondentes a maior esforço ou penosidade do trabalho, a situações de desempenho específicas ou a maior trabalho. A irredutibilidade salarial não impede, assim, a diminuição ou a extinção de certas prestações complementares, o que pode verificar-se na exata medida em que os condicionalismos externos que conduziram à sua atribuição se modifiquem ou sejam suprimidos».

Finalmente, no acórdão de 24-02-2015, no processo n.º 178/12.0TTCDL.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt, também se deixou expresso que: «O princípio da irredutibilidade da retribuição consagrado no art.º 129.º, n.º 1, alínea d), do Código do Trabalho/2009, não é impeditivo da supressão de certas atribuições patrimoniais conexas com condições específicas do modo de prestação de trabalho, e quando essas condições específicas deixem de existir. Por isso, tendo sido revogado o acordo de isenção de horário de trabalho, e tendo este deixado de trabalhar na situação de isento, cessa o pagamento do respetivo subsídio que a empregadora vinha pagando ao trabalhador».

Na situação dos autos, como bem se refere o acórdão recorrido, não decorre da matéria de facto provada que a atribuição da isenção de horário de trabalho fosse inerente à sua qualidade de Diretor-Adjunto. Na verdade, em 1997 não foi logo atribuída ao Autor a isenção de horário de trabalho, quando ele foi promovido a Subdiretor e já desenvolvia funções de chefia no seio do Gabinete ........... Por outro lado, também não foi retirada ao Autor a isenção de horário de trabalho entre 2008 e 2010, não obstante a extinção do Gabinete  .......... em 2008 e o não exercício de competências diretivas ou dirigentes desde então (Ponto 53).

Outrossim, considerando o disposto no ACT e no acordo de isenção de horário de trabalho celebrado entre as partes, a prestação de trabalho em regime de isenção de horário de trabalho poderia ser unilateralmente denunciada por cada uma das partes, nomeadamente pela Ré, sem que se ali se exigisse a explanação dos pressupostos da sua retirada. A referida cl. ª 54.ª, nos nºs 4 e 5, do ACT em vigor à data da denúncia, tal como também já o previa a cl. 54.ª do ACT na sua redação original, constante do BTE 31/90, prevê que o regime de isenção de horário de trabalho possa ser denunciado unilateralmente pelo empregador nos termos nela previstos. Essa circunstância, aliada ao facto de o Autor há muito ter deixado de desenvolver funções de chefia, não acarreta, em nosso entender, a ilicitude da cessação do regime de isenção de horário de trabalho operada pela empregadora e o consequente não pagamento da remuneração especial acordada para o efeito.

O Autor alega ainda que a comunicação da denúncia não ocorreu por protocolo ou carta registada, o que implica a sua invalidade por se tratar de formalidade ad substantiam. No entanto, da matéria de facto resultou apurado que essa comunicação foi efetuada por escrito e até pessoalmente, tendo o Autor sido advertido da necessidade de devolver devidamente assinada a declaração de retirada deste benefício  (pontos 38 e 39), pelo que se tem por validamente comunicada a denúncia, sendo certo que, ao contrário do que defende o Autor, não estamos perante uma formalidade ad substantiam mas ad probationem, ou seja, apenas para prova do ato de notificação (art.º 364.º, n.º 2, do Código Civil) e que no caso dos autos ocorreu.

Improcede também neste ponto, o recurso de revista do Autor.

7ª questão - Direito do Autor ao programa “reforma ativa”

Nas conclusões n.ºs 73 a 82, o Autor insurge-se contra o acórdão recorrido na parte em que não lhe foi reconhecido o direito peticionado a propósito do programa “reforma ativa”. Pretende o Autor ver reconhecido que foi elegível para o programa “reforma ativa” e a condenação da Ré CEMG a atribuir-lhe a compensação que atribuiu aos 140 trabalhadores que se reformaram ao abrigo daquele programa, por alegada violação do princípio da igualdade.

Em sede de contra-alegações, a Ré suscita a questão de existir aqui uma situação de dupla conforme entre as decisões das instâncias, nos termos do disposto no art.º 671.º, n.º 3, do Código de Processo Civil.

Vejamos então

No caso, a sentença da 1ª instância e o acórdão recorrido foram concordantes na decisão na medida em que consideraram, por fundamentos idênticos, que a pretensão do Autor não tinha base factual e, sem ter sido adotada fundamentação essencialmente diferente pela Relação, convergiram quanto à solução de direito no sentido de que não se provou qualquer tratamento discriminatório por parte da Ré nesta matéria e que foi o Autor quem recusou o incentivo financeiro proposto ao abrigo do programa reforma ativa -  reforma antecipada para  trabalhadores que tivessem 64 anos – sendo que o Autor se reformou aos 65 anos, nos termos gerais.

Ora, atento ao disposto no n. º 3 do art. 671.º do CPC, não é admissível recurso de revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1ª instância.

Deste modo, existindo nesta matéria uma situação de dupla conforme entre as decisões das instâncias improcede o seu conhecimento por este Tribunal, pelo que improcede igualmente esta questão.

         

Face a todo o exposto, improcede o recurso de revista interposto pelo Autor. 

Recurso das Rés

1ª questão - Existência, ou não de assédio moral

Nas conclusões n.ºs 1 a 9 da revista interposta pelas as Rés, estas defendem que não se verificou qualquer conduta da sua parte para com o Autor que pudesse ser qualificada de «Assédio Moral», ao contrário do que se concluiu no acórdão recorrido, devendo manter-se o decidido pela 1.ª Instância.

Resultou provado, com relevo, nesta matéria a seguinte factualidade:

1. O Autor foi admitido, em 1974, como trabalhador dependente, empregado bancário, pelo MONTEPIO GERAL - ASSOCIAÇÃO MUTUALISTA e pela então CAIXA ECONÓMICA DE … anexa ao MONTEPIO GERAL, atual CAIXA ECONÓMICA MONTEPIO GERAL mediante concurso público;

2. Em 1986 foi criado o Gabinete .......... constituído inicialmente por duas pessoas de entre as quais o Autor, e posteriormente além do Autor por cerca de quatro a cinco pessoas, um contabilista, dois administrativos e em determinado momento, concretamente não apurado, uma jurista, do qual o Autor era o responsável;

3. O Gabinete detinha alguma autonomia, sendo que o Autor reportava as decisões que tomava no gabinete a um diretor, ao conselho de administração e ao secretário-geral;

4. As funções exercidas pelo Autor foram idênticas de 1986 a 2002, com o mesmo conteúdo funcional, podendo ter havido um acréscimo de responsabilidade em virtude de um acréscimo de matérias com que lidavam;

5. O Autor chefiou e foi o responsável pelo G….. desde a sua criação no ano de 1986 até 2008, data da sua extinção.

10. Ao Autor foi atribuída a categoria profissional de Subdiretor e Diretor-adjunto da 2.ª Ré em, respetivamente, 7/8/1998 e em 1/1/2002, cf. fls. 142 v.º, e atribuída a Isenção de Horário de Trabalho, em 29/05/2001, que foi depois renovada em 14/11/2002 e ainda objeto de acordo em 21/8/2006, cfr., respetivamente, fls. 46 verso, 47 e 168 e 169 dos autos;

11. Em junho de 2016 o Autor reformou-se;

12. O Gabinete .......... foi extinto em 2008;

13. Nessa sequência o Autor foi colocado em 25.08.2008 no Secretariado Geral.

14. As funções de consultadoria e assessoria fiscal que o Autor exercia para o MG-AM no quadro do Gabinete .......... – G…, continuaram posteriormente a ser desenvolvidas até terem sido contratualizadas, em data indeterminada do ano de 2010, com uma sociedade de advogados a que pertence o Dr. NN, tendo as competências do Gabinete ........., com a sua extinção, transitado, no quadro da CEMG, para a Contabilidade, vindo a ser criado posteriormente um Departamento Fiscal, que integrou algum do pessoal do extinto G....., que não o Autor, e que foi da responsabilidade de uma pessoa provinda da K…., com o cargo de Diretora-Adjunta (Dr.ª OO).

15. Em fevereiro de 2010, o Autor foi mudado de instalações para uma sala no edifício ........, sito na Rua …., sala ……;

16. Antes desse momento sempre o Autor dispôs de um gabinete de trabalho individual;

17. O facto verificado em 15. supra derivou de HH, secretário-geral, ter perdido a confiança no Autor por lhe terem sido relatados factos alegadamente praticados pelo Autor e que punham em causa tal confiança, os quais nunca se apuraram se foram praticados;

18. Em virtude da perda da confiança HH pediu que o Autor fosse transferido para outro local de modo a não trabalharem juntos;

19. Decisão que foi tomada pelo administrador do pelouro, ora 4.º Réu e comunicada ao Autor verbalmente e por escrito.

19-A. A «Assessoria», onde o Autor foi colocado em 5/2/2010, designava um órgão subordinado ao Conselho de Administração dos 1.º e 2.º Réus, sem uma definição formal e institucional das respetivas competências.

20. Os arquivos, dossiers e livros do Autor ocupavam cerca de 40 caixas de transporte, e foram levadas para a sala em causa;

21. A atribuição ao Autor de cartão de acesso ao local de trabalho demorou tempo concretamente não apurado, levando a que por vezes o Autor tivesse de esperar para entrar ou sair até que alguém o fizesse igualmente;

22. A atribuição ao Autor de mobiliário para colocar os seus pertences demorou tempo concretamente não apurado;

23. O Autor ficou na sala mencionada sozinho, rodeado de três secretárias vazias;

24. Aquando da mudança de instalações, é normal que seja necessário um período até que todas as operacionalidades estejam a funcional em pleno, quer informáticas, quer administrativas ou de suporte, o que sucedeu com o Autor e outros trabalhadores que mudaram de instalações;

25. Em 2010, 2013, 2014 e 2015, o Autor efetuou pedidos de marcação de férias, e pedidos de alteração das mesmas, por meio de plataforma eletrónica disponível na 1.ª Ré, pedido que era encaminhado para o 3.º Réu, administrador do pelouro, que nunca as aprovou nem recusou;

26. O 3.º Réu entendia que os quadros diretivos/técnicos que dependiam de si saberiam quando poderiam ir ou não de férias, cabendo essa gestão aos próprios nunca aprovando, nem desaprovando, as férias dos diretores ou diretores adjuntos que com ele trabalhavam, facto que nunca foi do conhecimento do Autor;

27. Um pedido de alteração de férias do Autor de junho de 2015 veio a ser aprovado por uma técnica de recursos humanos;

29. No início de cada ano é efetuada pela entidade empregadora a avaliação de desempenho dos funcionários relativa ao ano anterior, a qual assume importância, além de outros motivos, para atribuição do prémio anual, e atribuição ou renovação de benefício de mérito concedidos;

30. O Autor não foi chamado ao processo de avaliação profissional nos anos de 2009, 2011, 2012, 2013, 2014 e 2015, não obstante ter solicitado que a avaliação fosse efetuada;

31. Muitos diretores e diretores adjuntos não foram objeto de avaliação formal mas eram todos, incluindo o Autor avaliados informalmente no PASC, reunião anual de administradores onde era decidida e analisada a carreira de cada um deles e a atribuição, manutenção ou retirada de benefícios a cada um em função dessa avaliação feita;

32. No dia 7 de maio de 2010, a 5.ª Ré comunica ao Autor a decisão tomada pelo conselho de administração da 1.ª Ré de cessar a utilização da viatura de serviço que estava afeta ao Autor;

33. É o conselho de administração que decide, caso a caso, atribuir, manter ou cessar a atribuição de viaturas aos seus funcionários, e manter, cessar ou atribuir a verba de IHT aos mesmos;

34. Ao Autor foi facultada a possibilidade de aquisição da viatura, o que este fez;

35. O veículo automóvel era atribuído pela 1.ª Ré em função das necessidades de serviço de cada colaborador, analisada casuisticamente, e não em função da categoria;

37. Ainda em maio de 2010, foi cancelado o cartão GALP, para abastecimento de combustível, com o «plafond» mensal de € 200,00, sem que o Autor tivesse sido previamente informado disso;

38. Em 25 de maio de 2010, a 5.ª Ré comunicou ao Autor a decisão do conselho de administração de o Autor deixar de beneficiar do regime de isenção de horário de trabalho;

39. A referida missiva derivou de o Autor ter sido previamente informado da decisão do conselho de administração tomada em abril de 2010 quanto a tal retirada de benefício, ter sido informado ainda telefonicamente, duas vezes, no início de maio da necessidade de devolver a declaração devidamente preenchida atestando tal facto e não o ter feito por ter alegado ter perdido tal declaração;

41. Em 06.07.2010 o Autor foi transferido da Sala ….. do …. andar do Edifício ........ para o ….. andar do edifício ……. integrado na Direção …… desde 1/7/2010, num espaço demarcado por biombos;

42. Todos os demais advogados da 1.ª Ré encontravam-se nesse espaço, demarcado por biombos por ausência de espaço para gabinetes próprios para cada um;

43. E em 16/9/2010 foi colocado no Departamento……..

44. E mudado em outubro de 2011, colocado na Direção……., mudando para o ……. piso do mesmo prédio, num espaço demarcado por dois biombos ficando dependente de uma diretora adjunta mais nova do que o Autor;

45. Em maio de 2012 o Autor voltou para o ….. piso do mesmo prédio, junto à biblioteca;

46. Em dezembro de 2012 mudou novamente agora para um gabinete, permanecendo no ….. piso.

47. Em março de 2013 o Autor foi colocado no …... andar, cave alta do mesmo edifício;

48. Em maio de 2013 o Autor voltou a ser transferido para a Rua …… ficando numa sala com 120 metros, sem janelas nem portas, junto a uma pequena claraboia, espaço que constituía uma espécie de mezzanine, rodeado de 4 biombos, tendo estado a maior parte do tempo sozinho e durante o restante período de tempo que não se conseguiu determinar, acompanhado por um outro diretor adjunto.

48-A - O 4.º Réu telefonou ao Diretor da D….., PP dizendo-lhe para arranjar espaço físico para o Autor no referido edifício, mas que o mesmo não integraria tal Direção. 

48-B. Em 19 de novembro de 2015 o Autor foi novamente transferido do edifício da Rua …. para o edifício da Rua …. – ……. piso.

49. No ….. piso da Rua …….. encontrava-se a direção e no quarto piso onde estavam os advogados não havia espaço para todos;

50. A mudança de departamento em outubro de 2011 derivou de o Autor e HH não estarem de boas relações, sendo este o diretor da assessoria jurídica, pelo que foi decidido mudar o Autor de departamento;

51. As instalações que foram sendo disponibilizadas ao Autor eram instalações em espaços idênticos aos de outros colegas advogados/juristas;

51-A. - O Autor foi colocado em novembro de 2015 na Direção…...

53. Não lhe foram atribuídas desde a extinção do G.….. quaisquer funções de direção;

54. Tinha o Autor a seu cargo o acompanhamento de processos de natureza fiscais;

55. No espaço mencionado em 49. dos factos provados funcionava a D…. (Direção……), direção que recebia pessoas que tinham deixado de exercer funções e a aguardar colocação, mas o Autor nunca esteve colocado nessa direção;

56. O Autor chegou a participar em reuniões de quadros, reuniões de direção em que alguns diretores adjuntos participavam, tendo em determinado momento concretamente não apurado deixado de participar;

62. O Autor beneficiou de um cartão de crédito/formação e as viagens/deslocações desde data concretamente não apurada, mas que existia já em 2010 até 2014, valores, pagáveis em fevereiro de cada ano e em abril de cada ano, no valor de 3 435,19 euros e de 3 825,97 euros, respetivamente;

63. Em 2015 e 2016 não procedeu a tais pagamentos;

64. Desde a data mencionada em 62 e 63 a 1.ª e 2.ª Rés cessaram tais pagamentos a todos os trabalhadores em virtude da sua situação financeira, ninguém os tendo recebido em 2015 e 2016;

65. Sempre foi pago ao Autor o valor mensal de € 58,81 como comparticipação das 1.ª e 2.ª Rés para o pagamento das quotas da ordem dos advogados;

66. E deixou de proceder a tal pagamento em julho de 2016;

67. Todos os factos descritos, e em consequência da extinção do G….., causaram sofrimento no Autor e deixaram o Autor em stress contínuo, sofrendo profundamente, com uma incomodidade constante.

Vejamos então

No capítulo I do Código do Trabalho, na subsecção dos direitos de personalidade o artigo 15.º estipula que: «O empregador, incluindo as pessoas singulares que o representam, e o trabalhador gozam do direito à respetiva integridade física e moral.»;   Na subsecção da igualdade e não discriminação, no artigo 29.º n.º 2,  é definido  juridicamente o assédio moral: «Entende-se por assédio o comportamento indesejado, nomeadamente o baseado em fator de discriminação, praticado aquando do acesso ao emprego ou no próprio emprego, trabalho ou formação profissional, com o objetivo ou o efeito de perturbar ou constranger a pessoa, afetar a sua dignidade, ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradado, humilhante ou desestabilizador.»

Resulta da referida definição, longa e abrangente, que com os atos de assédio, o empregador pretende causar ao trabalhador, que não cometeu qualquer infração, um ambiente de trabalho penoso e insuportável com o objetivo de o perturbar ou constranger, afetando a sua dignidade, que ou de lhe criar um ambiente de tal modo intimidativo, humilhante ou desestabilizador que o leve a apesentar a sua demissão ou até mesmo a abandonar o seu posto de trabalho.

Como bem explica Júlio Gomes [em Direito do Trabalho, volume I – Relações Individuais de Trabalho, Coimbra Editora, 2007, páginas 428 a 442] «O mobbing ou assédio moral ou, ainda, como por vezes se designa, terrorismo psicológico, parece caracterizar-se por três facetas: a prática de determinados comportamentos, a sua duração e as consequências destes. Quanto aos comportamentos em causa, para LEYMANN, tratar-se-ia de qualquer comportamento hostil. Para HIRIGOYEN, por seu turno, tratava-se de qualquer conduta abusiva manifestada por palavras (designadamente graçolas), gestos ou escritos, silêncios sistemáticos e muitos outros comportamentos humilhantes ou vexatórios. Daí a referência a uma polimorfia do assédio e, por vezes, a dificuldade em distingui-lo dos conflitos normais em qualquer relação de trabalho. Como veremos, tais comportamentos são, frequentemente, ilícitos mesmo quando isoladamente considerados, mas sucede frequentemente que a sua ilicitude só se compreende, ou só se compreende na sua plena dimensão, atendendo ao seu carácter repetitivo. E esta é a segunda faceta que tradicionalmente se aponta no mobbing: o seu carácter repetitivo. (…) A terceira nota característica do assédio, pelo menos para um sector da doutrina, consiste nas consequências deste designadamente sobre a saúde física e psíquica da vítima e sobre o seu emprego. O assédio pode produzir um amplo leque de efeitos negativos sobre a vítima que é lesada na sua dignidade e personalidade, mas que pode também ser objeto de um processo de exclusão profissional, destruindo-se a sua carreira e mesmo acabando por pôr-se em causa o seu emprego, quer porque a vítima de assédio acaba por ser despedida sem genuína justa causa, quer porque o assédio a conduz a ela própria, fazer cessar o contrato de trabalho. Mas a vítima sofre tipicamente outros danos de natureza pessoal, dando mostras de ansiedade e entrando frequentemente em situações de depressão, ocorrendo nos casos mais extremos, suicídios ou tentativas de suicídio. Frequentemente, também, o assédio conduz a vítima a uma acentuada perda de autoestima. Os sintomas do assédio, as consequências deste na personalidade da vítima com as consequentes mudanças comportamentais por parte da vítima levam frequentemente a que a própria vítima se transforme em bode expiatório e seja designada como responsável pela situação. A pessoa perseguida e angustiada passará a ser frequentemente menos produtiva, mostrará uma maior propensão para cometer erros, dará mostras de maior absentismo – tudo circunstâncias que poderão ser utilizadas contra ela em eventuais procedimentos disciplinares. Em certos casos, aliás, o assédio não terá nascido espontaneamente; com efeito, algumas empresas parecem lançar mão de um assédio estratégico, mais ou menos generalizado.»

A jurisprudência da secção social deste Tribunal tem igualmente vindo a refletir sobre esta temática e a afirmar, designadamente, que:

«1. Não é toda e qualquer violação dos deveres da entidade empregadora em relação ao trabalhador que pode ser considerada assédio moral, exigindo-se que se verifique um objetivo final ilícito ou, no mínimo, eticamente reprovável, para que se tenha o mesmo por verificado.» e que «2. Mesmo que se possa retirar do artigo 29º do Código do Trabalho que o legislador parece prescindir do elemento intencional para a existência de assédio moral, exige-se que ocorram comportamentos da empresa que intensa e inequivocamente infrinjam os valores protegidos pela norma – respeito pela integridade psíquica e moral do trabalhador.» [acórdão de 09-05-2018, processo n.º 532/11.5TTSTR.E1. S1, disponível em www.dgsi.pt].

Assim como: «1. O assédio moral implica comportamentos real e manifestamente humilhantes, vexatórios e atentatórios da dignidade do trabalhador, aos quais estão em regra associados mais dois elementos: certa duração; e determinadas consequências.» e que «2. De acordo com o disposto no art. 29.º, n.º 1, do CT e, no assédio não tem de estar presente o “objetivo” de afetar a vítima, bastando que este resultado seja “efeito” do comportamento adotado pelo “assediante”», pois «3. Apesar de o legislador ter (deste modo) prescindido de um elemento volitivo dirigido às consequências imediatas de determinado comportamento, o assédio moral, em qualquer das suas modalidades, tem em regra associado um objetivo final ilícito ou, no mínimo, eticamente reprovável.» [acórdão de 03-12-2014, recurso n.º 712/12.6TTPRT.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt].

Mas também que: «(…) uma vez que a esfera de proteção da norma se circunscreve, como vimos, a comportamentos que intensa e inequivocamente infrinjam os valores protegidos, não pode deixar de notar-se que é dificilmente configurável a existência de (verdadeiras) situações de assédio moral que - no plano da vontade do agente - não imponham concluir que ele, pelo menos, representou as consequências imediatas da sua conduta, conformando-se com elas. Por outro lado, para referir que a circunstância de o legislador ter prescindido de um elemento volitivo dirigido às consequências imediatas de determinado comportamento não obsta à afirmação de que o assédio moral, em qualquer das suas modalidades, tem em regra associado um objetivo final “ilícito ou, no mínimo, eticamente reprovável” (v.g. a discriminação, a marginalização/estigmatização ou neutralização do trabalhador, atingir a sua autoestima ou, no tocante ao assédio estratégico objetivos específicos supra expostos)» [acórdão de 21-04-2016, recurso n. 299/14.5T8VLG.P1. S1, disponível em www.dgsi.pt].

Importa analisar se, no caso, as condutas das Rés são suscetíveis de integrar a referida figura do assédio moral.

Desde já, adiantamos que o defendido pela sentença proferida na 1.ª instância merece a nossa concordância, bem como o voto de vencido que faz parte integrante do acórdão recorrido, pelas seguintes razões:

O acórdão recorrido concluiu no sentido de o Autor ter experienciado uma situação de assédio moral, fundamentando-a num esvaziamento relativo de funções próprias de um diretor-adjunto, com a sua sucessiva colocação em diversos gabinetes ou espaços abertos, em que, por vezes, ficava sozinho e/ou isolado e integração em departamentos ou direções onde a sua categoria profissional de Diretor-Adjunto não tinha qualquer relevância e significado material, assim como na ausência de avaliação do Autor nos anos de 2009 e 2011 a 2015, não obstante o mesmo a ter requerido, na questão da marcação de férias a que aludem os pontos 25 a 27 e, bem assim, na retirada ao Autor, no ano de 2010, da viatura automóvel, do cartão de combustível e da Isenção do Horário de Trabalho, tendo também, em 2015 e 2016, as Rés lhe deixado de pagar o montante único anual correspondente ao cartão de crédito/formação e às viagens/despesas de deslocação.

Sucede, porém, como decorre da matéria de facto, que o Autor não tinha a categoria profissional de “Diretor”, mas sim a de “Diretor-Adjunto”, funções que cessaram em 2008 com a extinção do Gabinete ......... (pontos 5 e 53) e não em 2010, ano em que o Autor faz situar o comportamento assediante da Ré. Ademais, resulta do quadro factual traçado pelas instâncias que o Autor manteve a seu cargo o acompanhamento de processos de natureza fiscais (ponto 54) e nunca esteve sem funções ou a aguardar colocação (ponto 55).

No que diz respeito às apuradas mudanças de gabinete e de instalações, não decorre da factualidade demonstrada uma qualquer conduta discriminatória ou lesiva dos direitos ou da dignidade do Autor, tanto mais que não foi caso único e as instalações que lhe foram sendo disponibilizadas eram instalações em espaços idênticos aos de outros colegas advogados/juristas (ponto 51).

Em relação à retirada ao Autor da viatura automóvel, do cartão de combustível, da Isenção do Horário de Trabalho, do montante único anual correspondente ao cartão de crédito/formação e às viagens/despesas de deslocação, não resultou provado que se tenham tratado de atos discriminatórios em relação aos demais trabalhadores, que também viram ser-lhes retirados tais benefícios em virtude da situação financeira das Rés  (pontos 42, 48, 51, 54, 62, 63, 64) o que, como bem se salienta no voto de vencido, os descaracteriza enquanto comportamento assediante.

A propósito da questão relativa à não aprovação das férias (ponto 25) provou-se que essa era a atitude do administrador do pelouro que entendia que os quadros diretivos/técnicos que dependiam de si saberiam quando poderiam ir ou não de férias, cabendo essa gestão aos próprios nunca aprovando, nem desaprovando, as férias dos diretores ou diretores adjuntos que com ele trabalhavam (ponto 26). Cabia, assim, ao Autor a gestão das suas férias não sendo ele o único a quem tal sucedida, pelo que também neste ponto não se provou uma qualquer situação de discriminação.

Por outro lado, provou-se que no início de cada ano era efetuada a avaliação de desempenho dos funcionários relativa ao ano anterior, a qual assumia importância, além de outros motivos, para atribuição do prémio anual, e atribuição ou renovação de benefício de mérito concedidos (ponto 29), não tendo o Autor sido chamado ao processo de avaliação profissional nos anos de 2009, 2011, 2012, 2013, 2014 e 2015, não obstante ter solicitado que a avaliação fosse efetuada (ponto 30). Certo é que se apurou que muitos diretores e diretores- adjuntos não foram objeto de avaliação formal mas eram todos, incluindo o Autor avaliados informalmente no PASC, reunião anual de administradores onde era decidida e analisada a carreira de cada um deles e a atribuição, manutenção ou retirada de benefícios a cada um em função dessa avaliação feita (ponto 31), razão pela qual também não se pode concluir, destes factos, a adoção, pelas Rés, de um qualquer comportamento assediante em relação ao Autor.

Finalmente, provou-se que o Autor chegou a participar em reuniões de quadros, reuniões de direção em que alguns diretores adjuntos participavam, tendo em determinado momento, concretamente não apurado, deixado de participar (ponto 56). No entanto, por si só, este facto não poderá relevar para caracterizar uma situação de assédio, na medida em que se desconhecem as circunstâncias de tempo em que se verificaram, assim como os motivos que o justificaram, nada tendo resultado provado a este propósito, sendo certo que o ónus de  prova, do momento em que se verificou essa não participação, como facto constitutivo do assédio, incumbe o autor – artigo 342.º, nº 1 do Código Civil.   

Tudo ponderado, considera-se, ao contrário do que foi o entendimento do acórdão recorrido, que não resultaram apurados factos suficientes ou bastantes, como se analisou nos anteriores parágrafos, que permitam caracterizar o comportamento das Rés como assédio moral nos termos prescritos no artigo 29.º do Código do Trabalho, dispositivo que acima se analisou. Com efeito, não resulta dos factos provados que as Rés tenham tido quaisquer condutas hostis, vexatórias ou humilhantes em relação ao Autor ou que de alguma forma tenham tido comportamentos que possam ter posto em causa a sua dignidade, baseados, ou não, em algum fator de discriminação, ou como se refere no acórdão deste Tribunal de 09.05.2018, acima citado, que tenham infringido os valores protegidos pela norma – respeito pela integridade psíquica e moral do trabalhador.

Por outro lado, também não se apuraram factos sobre as intenções das Rés, designadamente, que tenham agido movidas por um qualquer objetivo ilícito ou eticamente reprovável, com o propósito de discriminar ou sequer hostilizar o Autor.

Deste modo, concluímos que a factualidade assente é insuscetível de configurar uma situação de mobbing, impondo-se assim a revogação do acórdão recorrido no que concerne à qualificação do comportamento das Rés como de assédio moral em relação ao Autor e à indemnização arbitrada a título de danos não patrimoniais por força daquele comportamento.

2ª questão - Da indemnização fixada a título de danos não patrimoniais

Nas conclusões n.ºs 10 a 15, as Rés defendem que ainda que alguma indemnização houvesse que ser arbitrada ao Recorrido, a que lhe foi fixada pelo Acórdão recorrido mostra-se excessiva no quadro da ponderação do próprio Recorrido.

Trata-se de uma questão que ficou prejudicada face decisão supra, relativamente à inexistência de um comportamento assediante por parte da Ré.

III. Decisão

Face ao exposto, acorda-se em negar a revista interposta pelo Autor.

Em conceder provimento ao recurso de revista interposto pela Ré, com a revogação do acórdão recorrido no segmento atinente à qualificação como assediante do comportamento da Ré e à indemnização arbitrada a título de danos não patrimoniais, repristinando-se, nesta parte, a sentença proferida na primeira instância.

Custas pelo Autor.

Lisboa, 27 de Janeiro de 2020

Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 15.º-A do Decreto-lei n.º 10-A/2020, de 13 de março (aditado pelo art. 3º do Decreto-Lei n.º 20/2020 de 01 de maio), consigna-se que o presente acórdão obteve voto de conformidade dos Exmos. Juízes Conselheiros Adjuntos, José Feteira e Júlio Vieira Gomes, sendo assinado apenas pela relatora.

                                   

Paula Sá Fernandes (Relatora)