Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
4167/18.3T8AVR.P1.S1
Nº Convencional: 1.ª SECÇÃO
Relator: FÁTIMA GOMES
Descritores: RESPONSABILIDADE BANCÁRIA
INTERMEDIAÇÃO FINANCEIRA
DEVER DE INFORMAÇÃO
VIOLAÇÃO
PRESUNÇÃO DE CULPA
ILICITUDE
DANO
NEXO DE CAUSALIDADE
ÓNUS DA PROVA
APLICAÇÃO FINANCEIRA
VALORES MOBILIÁRIOS
INSTITUIÇÃO BANCÁRIA
UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Data do Acordão: 11/08/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Sumário :
Vindo provado que o A. subscreveu obrigações subordinadas SLB apenas porque: o gerente do banco réu da agência lhe disse que tinha uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo, com o capital garantido pelo BPN e com rentabilidade assegurada; apesar de o autor não ser pessoa que frequentava a agência, o dito funcionário do banco réu apercebeu-se que ele não possuía qualificações ou formação técnica que lhe permitisse conhecer os diversos produtos financeiros e avaliar, por isso, os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem devidamente; o gerente do banco réu não informou o autor dequeos €50.000,00 iam ser investidos em Obrigações Subordinadas SLN 2006, sociedade com identidade distinta do banco réu, qual a ligação direta entre o banco e essa sociedade e o que distinguia obrigações subordinadas das não subordinadas; o autor atuou convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura e com as características de um depósito a prazo e que o Banco era garante do retorno do capital e do pagamento dos juros; se se tivesse apercebido de estar a dar ordem de compra de obrigações SLN Subordinadas 2006 e que o capital não era garantido pelo banco réu, não o autorizaria; as Obrigações Subordinadas SLN 2006 eram, à data da subscrição, produto de risco, há ilicitude na prestação da informação relativa ao produto financeiro, culpa e dano, sendo o Banco responsável civilmente, nos termos do Ac. de UJ nº1479/16.4T8LRA.C2.S1-A.
Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça



I. Relatório


1. AA intentou a presente acção com processo comum de declaração contra o Banco BIC Português, S.A., pedindo:

a) A condenação deste a pagar ao A. o capital e juros vencidos e garantidos que, à data da propositura da acção, perfazem a quantia de €57.000,00, acrescida de juros vincendos desde a citação e até efectivo e integral pagamento; ou, assim não se entendendo:

b) Que seja declarado nulo qualquer eventual contrato de adesão que a ré invoque para ter aplicado os €50.000,00 que o autor entregou ao àquela, em obrigações subordinadas SLN 2006;

c) Que seja declarado ineficaz em relação ao autor a aplicação que a ré tenha feito desses montantes;

d) A condenação da ré a restituir ao autor €57.000,00 que ainda não recebeu dos montantes que entregou à ré e de juros vencidos à taxa contratada, acrescidos de juros legais vincendos, desde a citação e até efectivo e integral pagamento;

e) E, sempre, a condenação da ré apagar ao autor a quantia de €3.000,00, a título de dano não patrimonial.

A fundamentar aqueles pedidos, alega, para o efeito, que era cliente da ré, na sua agência da ..., onde era titular da conta à ordem nº ...01, através da qual movimentava parte dos dinheiros, realizava pagamentos e efectuava poupanças.

A 20/04/2006, o gerente da agência da ... réu disse ao autor que tinha uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo, com o capital garantido pelo BPN e com rentabilidade assegurada.

O dito funcionário do banco réu sabia que o autor tinha perfil conservador no que respeitava ao investimento do seu dinheiro, que, até essa data, sempre o aplicara em depósitos a prazo, e que o autor não tinha conhecimentos para distinguir os diversos produtos financeiros e avaliar, por isso, os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem devidamente.

O dinheiro do autor – €50.000,00 –veio a ser colocado em obrigações SLN 2006 sem que o autor soubesse em concreto o que era, desconhecendo, inclusivamente que a SLN era uma empresa. O autor actuou convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura e com as características de um depósito a prazo, com risco exclusivamente do banco quanto ao capital e juros.

O autor recebeu os juros da aplicação até Novembro de 2015 e, a partir daí, não recebeu mais juros, nem recebeu o próprio capital.


2. O Banco BIC Português, S.A., na contestação que apresentou, excepcionou a prescrição prevista no artigo 324º, nº 2, do CVM, e impugnou a factualidade alegada pelo autor nos seguintes termos:

a) As obrigações SLN 2006 eram, à data da subscrição, um produto com risco muito reduzido em resultado de a sociedade emitente ter solidez financeira e ser a “mãe” do BPN, o qual era um dos principais ativos do seu património, não sendo previsível, então, que, em 2008, viria a acontecer uma nacionalização parcelar do grupo que veio a dividir o mesmo entre parte financeira e não financeira;

b) Em Abril de 2006, o autor foi informado de que: 1º – As obrigações eram emitidas pela sociedade que detinha o banco réu – a SLN –Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A.; 2º –o reembolso antecipado da emissão só seria possível por iniciativa da SLN, a partir do 5º ano, e sujeito a acordo prévio do Banco de Portugal; 3º –A única forma de o investidor liquidar este produto de forma unilateral seria a transmissão das suas obrigações a um terceiro interessado, mediante endosso, o que na altura era possível, comum e rápido, uma vez que os títulos tinham elevada procura, atenta a sua elevada rentabilidade;

c) O Banco réu actuou de acordo com o que os subscritores de facto quiseram e lhe expressaram, ou seja, subscrever aqueles €50.000,00 em Obrigações SLN 2006.


3. Na resposta, o autor defendeu dever ser julgada improcedente a excepção deduzida na contestação.


4. Foi proferido despachado saneador que relegou para a sentença o conhecimento da excepção de prescrição.


5. Procedeu-se à audiência de julgamento e, a final, proferida sentença, na qual a acção foi julgada parcialmente procedente e, em consequência, condenada a ré a pagar ao autor:

a) €50.000,00, acrescidos de juros remuneratórios à taxa anual de 1%, a partir de Novembro de 2015 e até integral pagamento;

b) €1.000,00, a título de danos não patrimoniais.


6. Inconformada, a ré recorreu para o Tribunal da Relação que veio a decidir: “Pelos fundamentos expostos, acordam os Juízes desta secção cível em julgar improcedente a apelação e, consequentemente confirmar a sentença recorrida.”


7. Deste acórdão veio interposto recurso de revista excepcional pela Ré, admitido por acórdão da formação de 20/20/2020.


8. Foi, entretanto, proferido o acórdão de Uniformização de Jurisprudência no âmbito do Processo nº 1479/16.4T8LRA.C2.S1-A, relativo à densificação do pressuposto da ilicitude por violação dos deveres de informação por parte de banco que actua como intermediário financeiro e sobre a questão da aferição do nexo de causalidade entre a conduta do intermediário financeiro e o dano sofrido pelos autores, estando o presente processo em condições de prosseguir.


9. Nas conclusões da revista diz-se (transcrição):

1) O recurso ora interposto é de revista excepcional, a admitir nos termos do disposto no art.º 672 nº 1 als. a) e b) do CPC.

2) Ambas as decisões das instâncias acabam por condenar o Banco-R. no pagamento de indemnização por violação do dever de informação enquanto intermediário financeiro.

3) O âmbito dos concretos deveres de informação a observar pelo intermediário financeiro tem sido objecto de vasta jurisprudência, com soluções e orientações bastante distintas, para não fizer completamente opostas.

4)Pontifica a este propósito as diferentes posições quanto à necessidade e grau de informação do risco de insolvência da entidade emitente bem como do risco de incumprimento da obrigação de reembolso, por oposição à menção de “capital garantido”.

5) Varia, igualmente, e diríamos de forma inaudita, a interpretação e consequências jurídicas do anúncio do produto de “capital garantido”, ali vendo algumas decisões uma verdadeira fiança ou assunção de dívida – como parece ser o caso da decisão recorrida, ao passo que outras veem na mesma exacta expressão apenas uma afirmação de segurança do investimento num contexto de pressuposta segurança por parte de todo o contexto social e financeiro no momento em que é feita a aplicação, ou por fim, quem veja – como é na realidade, uma mera característica da própria emissão, em que o valor de reembolso é necessariamente igual ao valor nominal do título.

6) Estes concretos temas e questões, além de relevantes na discussão da pura dogmática jurídica, são hoje, na ressaca da chamada “crise das dívidas”, uma das pedras de toque de todo o sistema financeiro, por um lado, e judicial por outro, em face do volume de contencioso pendente em todos os Tribunais perante o não reembolso de inúmeras emissões de vários instrumentos de dívida.

Além disso,

7) O volume do contencioso exactamente com este objecto, com a definição e delimitação do dever de informação na comercialização de instrumentos financeiros em momento anterior a Dezembro de 2007, é hoje considerável e com um grande impacto na economia e na sociedade portuguesa em geral, até pela repetição de situações análogas em várias instituições bancárias, por corresponder a uma actividade corrente antes da chamada crise das dívidas.

8) Não podemos senão concluir pela admissibilidade do presente recurso de revista, nos citados termos do disposto no art.º 672.º n.º 1 als. a) e b) do Código de Processo Civil.

Acresce que...

9) Não havendo declaração negocial, bem ou mal emitida, não pode haver obrigação jurídica – seja ela qualquer for - de fonte contratual, pelo que não pode, em qualquer circunstância, entender-se que o Banco assumiu uma obrigação de reembolso ou que a afiançou!

10) Ao entender esta expressão como tendo valor negocial, o tribunal a quo violou o disposto no art.º 236 º do Código Civil.

11) A menção à expressão capital garantido não tem por si só a virtualidade de atribuir qualquer senso desaparecimento de todo o risco de qualquer tipo de aplicação... A este propósito, de resto, e quase esvaziando tudo o que pudéssemos alegar, é eloquente o parecer adiante junto do PROF. PINTO MONTEIRO, onde se chega a esta mesma conclusão!

12) A expressão capital garantido mais não é do que a descrição de uma característica técnica do produto – corresponde à garantia de que o valor de reembolso, no vencimento, é feito pelo valor nominal do título e correspondente ao respectivo valor de subscrição! Ou seja, o valor do capital investido é garantido!

13) Veja-se a este propósito o Plano de Formação Financeira em site do Conselho de Supervisores Portugueses – www.todoscontam.pt!

14) Vale isto por dizer que, ainda que se entenda que esta expressão mereceria uma densificação ou explicação aos clientes, a fim de evitar qualquer confusão, o certo é que, transmitindo uma característica técnica, não se poderá firmar que o banco, ou os seus colaboradores agiram com culpa, e muito menos grave!

15) insistimos no facto de esta menção, ainda que interpretada por um “leigo” apenas deveria permitir concluir pela segurança atribuída ao instrumento financeiro em causa! E não a qualquer tipo de garantia absoluta de cumprimento da entidade emitente.

16) E o certo é que as Obrigações eram então, como são ainda de uma forma geral, um produto conservador, com um risco normalmente reduzido, indexado à solidez financeira da sociedade emitente. Ao que acrescia, no caso concreto, e em abono desta sociedade emitente pertencer ao mesmo Grupo que o Banco Réu - mais, de ser a sua sociedade totalmente dominante!

17) Tanto mais que o risco de um DP no Banco seria, então, semelhante a uma tal subscrição de Obrigações SLN, porque sendo a SLN dona do Banco a 100%, o risco da SLN estava indexado ao risco do próprio Banco.

De resto,

18) O dever de informação quanto aos “riscos do tipo de instrumento financeiro” surge perfeitamente densificado quanto ao seu cumprimento, não deixando o legislador uma cláusula aberta que permita margem para dúvida quanto ao alcance do seu dever.

19) De facto, se é verdade que a informação tem que ser completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita (art. 7º CdVM), não é menos verdade que o cumprimento desse dever de transmissão da informação não se compadece com qualquer conceptologia idílica e de delimitação difusa quanto ao seu inadimplemento.

20) E desde logo, não se compadece com ideias simplistas como as de mera reprodução de prospectos dos produtos, principalmente antes da transposição da chamada DMIF, em que a complexidade técnica da documentação de cada instrumento financeiro era enorme. Até porque que defenda que deveria o intermediário financeiro transmitir a informação das primeiras páginas do prospecto não pode deixar de defender que a mesma diligência deveria ser obrigatória quanto ao restante conteúdo do mesmo documento!

21) A informação deve ser prestada não apenas de forma exaustiva, mas essencialmente de uma forma acessível, sendo que a mera reprodução do prospecto, como pretende a decisão recorrida, seria certamente tudo menos acessível.

22) A adequação da informação começa exactamente por afastar o cumprimento meramente formal do dito dever de informação, antes visando uma efectiva informação.

23) O CdVM estabelece objectiva e precisamente qual a informação que tem de ser prestada quanto a cada um dos contratos de intermediação financeira e até – em alguns casos –, quanto aos instrumentos financeiros objecto dessa intermediação.

24) E, quanto ao risco, há aqui que chamar à colação o art. 312º nº 1 alínea e) do CdVM, que obriga então o intermediário financeiro a informar o investidor sobre os “riscos especiais envolvidos nas operações a realizar”. Ora, tal redacção refere-se necessariamente ao negócio de intermediação financeira enquanto negócio de cobertura que, depois, proporcionará negócios de execução. E a verdade é que tal menção não pode nunca equivaler ao dever de informação sobre o instrumento financeiro em si (como, aliás, na redacção aplicável ao caso).

25) Neste sentido apontam não só o elemento histórico decorrente da redacção anterior da lei, como também o elemento sistemático já abordado, como até o seu próprio elemento literal.

26) Mas, o que é certo é que, o legislador não deixou nada ao acaso e logo no número seguinte, afirmou claramente o que se devia entender por risco do tipo do instrumento financeiro em causa.

27) Assim é que nas quatro alíneas do nº 2 do art. 312º-E obriga a que a descrição dos riscos do tipo do instrumento em causa incluam:

a.  a) Os riscos associados ao instrumento financeiro, incluindo uma explicação do impacto do efeito de alavancagem e do risco de perda da totalidade do investimento;

b. b) A volatilidade do preço do instrumento financeiro e as eventuais limitações existentes no mercado em que o mesmo é negociado;

c.  c) O facto de o investidor poder assumir, em resultado de operações sobre o instrumento financeiro, compromissos financeiros e outras obrigações adicionais, além do custo de aquisição do mesmo;

d. d) Quaisquer requisitos em matéria de margens ou obrigações análogas, aplicáveis aos instrumentos financeiros desse tipo.

28) São ESTES e APENAS ESTES os riscos do tipo do instrumento financeiro sobre os quais o Intermediário Financeiro tem que prestar informação!

29) A alusão que a lei faz quanto ao risco de perda da totalidade do investimento está afirmada em função das características do investimento. Trata-se, portanto, de um risco que tem que ser endógeno e próprio do instrumento financeiro e não motivado por qualquer factor extrínseco ao mesmo.

30) O investimento em Obrigações, não é sujeito a qualquer volatilidade, sendo o retorno do investimento certo no final do prazo, por reembolso do capital investido ao valor nominal do título (de “capital garantido”), acrescido da respectiva rentabilidade.

31) Logo, não há necessidade de que a advertência do risco de perda da totalidade do investimento seja feita, porque a mesma não é aplicável ao caso!

32) Recordemos que qualquer contrato, seja qual for a sua natureza, apenas um de dois destinos: o cumprimento ou incumprimento! Ou seja, é de uma ingenuidade atroz pensar-se que alguém toma a prestação de qualquer contrato como certa, e não apenas como mais ou menos segura!

33) Por isso, a informação acerca do risco da perda do investimento tem que ser dada em função dos riscos próprios do tipo de instrumento financeiro, o que deve ser feito SE E SÓ SE tais riscos de facto existirem!

34) Não se pode confundir a advertência sobre o risco de perda do investimento com a análise de qualquer qualidade e robustez (ou falta dela) do emitente do título!

35) Não cometeu o R. qualquer acto ilícito!

36) A decisão recorrida violou por errónea interpretação ou aplicação o disposto no art.º 312 do CdVM (na redacção aplicável), e os art.ºs 74 e 75 do RGCISF.

Termos em que se conclui pela procedência do presente recurso, e por via dele, pela revogação da decisão recorrida e sua substituição por outra que absolva o Réu do pedido, assim fazendo V. Exas. JUSTIÇA!


10. Foram apresentadas contra-alegações.


Cumpre analisar e decidir

II. Fundamentação

De Facto

11. Das instâncias vieram provados os seguintes factos:

1. O autor era cliente da ré, na sua agência da ..., onde era titular da conta à ordem nº ...01, através da qual movimentava parte dos dinheiros, realizava pagamentos e efetuava poupanças (A).

2. O autor subscreveu o documento de fls. 32, no qual solicita a subscrição de €50.000,00 de Obrigações SLN 2006 (B).

3. Este montante foi-lhe debitado na conta à ordem nº ...01 na agência da ré da ... (C).

4. O autor recebeu juros da aplicação referida em 2 dos factos provados até novembro de 2015, e a partir daí, não recebeu mais juros, nem recebeu o próprio capital (D).

5. Aquando da assinatura do documento de fls. 32 (20/04/2006), não foi entregue ou disponibilizada e explicada ao autor a nota informativa de fls. 33/65.

6. Quando, a 20 de abril de 2006, o autor pretendeu fazer uma aplicação remunerada de algum capital, o gerente do banco réu da agência da ... disse-lhe que tinha uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo, com o capital garantido pelo BPN e com rentabilidade assegurada.

7. Apesar de o autor não ser pessoa que frequentava a agência, o dito funcionário do banco réu apercebeu-se que ele não possuía qualificações ou formação técnica que lhe permitisse conhecer os diversos produtos financeiros e avaliar, por isso, os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem devidamente.

8. O gerente do banco réu não informou o autor de que os €50.000,00 iam ser investidos em Obrigações Subordinadas SLN 2006, sociedade com identidade distinta do banco réu, qual a ligação direta entre o banco e essa sociedade e o que distinguia obrigações subordinadas das não subordinadas.

9. O autor atuou convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura e com as caraterísticas de um depósito a prazo e que o Banco era garante do retorno do capital e do pagamento dos juros.

10. Se se tivesse apercebido de estar a dar ordem de compra de obrigações SLN Subordinadas 2006 e que o capital não era garantido pelo banco réu, não o autorizaria.

11. As Obrigações Subordinadas SLN 2006 eram, à data da subscrição, produto de risco.

12. Quando o banco réu o informou de que a responsabilidade pelo pagamento do capital investido era da SLN, entidade distinta do banco, o autor ficou alarmado.

13. O autor não foi informado pelo gerente da ré, o que eram Obrigações Subordinadas SLN 2006.

14. Nunca nenhum contrato foi lido ou explicado ao autor, nem lhe foi entregue cópia que contivesse cláusulas sobre Obrigações Subordinadas SLN 2006, nem que contivesse prazos de resolução unilateral pelo autor.

15. A rentabilidade dos títulos SLN 2006 era de 4,5% no 1º semestre; Euribor a 6 meses + 1,15% nos 9 cupões seguintes; Euribor a 6 meses + 1,50% nos restantes semestres.

16. O autor foi recebendo em casa, desde a data da operação, um extrato periódico, onde lhe apareciam essas Obrigações como integrando a sua carteira de títulos.

12. Das instâncias vieram não provados os seguintes factos:

a) O funcionário do Banco sabia que o autor tinha perfil conservador no que respeitava ao investimento do seu dinheiro e que, até essa data, sempre o aplicara em depósitos a prazo;

b) Qual o grau de risco das Obrigações Subordinadas SLN 2006;

c) O gerente da ré tinha conhecimento desse risco;

d) O autor passou a viver num permanente estado de ansiedade e preocupação, com receio de não reaver o seu dinheiro, tristeza, e com dificuldades financeiras;

e) O autor pensava que SLN era uma denominação de conta a prazo que a ré utilizava para a individualizar;

f) Nunca conheceu o autor qualquer documento demonstrativo de que possuía obrigações SLN, não lhe tendo sido entregue documento correspondente;

g) Os juros acordados foram de 4,55 ao ano, ilíquidos; h) as obrigações SLN 2006 eram, à data da subscrição, um produto com risco muito reduzido em resultado de a sociedade emitente ter solidez financeira e ser a “mãe” do BPN, o qual era um dos principais ativos do seu património;

i) Não era previsível, então, que, em 2008, viria a acontecer uma nacionalização parcelar do grupo que veio a dividir o mesmo entre parte financeira e não financeira;

j) Nem o gerente do banco réu que atendeu o autor ou qualquer outro funcionário da agência transmitiu ao autor ou a qualquer cliente que o próprio Banco garantia o pagamento do capital e dos juros do produto SLN 2006;

k) Antes lhe apresentou o produto como sendo a obrigação de entrega do capital e dos juros da exclusiva responsabilidade da entidade emitente e não do Banco, entidade colocadora das obrigações;

l) No mês seguinte ao da operação, o autor recebeu, por correio, em casa, um aviso de débito correspondente à subscrição efetuada;

m) O autor sempre foi pessoa informada, consciente, cuidadosa e preocupada com o investimento do seu património;

n) Em abril de 2006, o autor foi informado de que: 1º – As obrigações eram emitidas pela sociedade que detinha o banco réu – a SLN –Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A.; 2º –o reembolso antecipado da emissão só seria possível por iniciativa da SLN, a partir do 5º ano, e sujeito a acordo prévio do Banco de Portugal; 3º –a única forma de o investidor liquidar este produto de forma unilateral seria a transmissão das obrigações a terceiro interessado;

o) Os títulos SLN 2006 eram de grande procura, dada a sua rentabilidade.

De Direito

13. O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões do Recurso, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso e devendo limitar-se a conhecer das questões e não das razões ou fundamentos que àquelas subjazam, conforme previsto no direito adjetivo civil - arts. 635º n.º 4 e 639º n.º 1, ex vi, art.º 679º, todos do Código de Processo Civil.

Das conclusões do recurso resultam estarem em causa os pressupostos do dever de indemnizar – ilicitude, culpa, nexo de causalidade.

14. Como diz o recorrente, o acórdão recorrido decidiu condenar o Banco-Recorrente no pagamento quantia de €50.000,00, acrescidos de juros remuneratórios à taxa anual de 1%, a partir de Novembro de 2015 e até integral pagamento e de  €1.000,00, a título de danos não patrimoniais, o que veio justificado com a responsabilidade civil do Banco-R., nomeadamente a título de intermediário financeiro, e concretamente por violação dos deveres de informação a que estaria adstrito nessa qualidade perante os Autores.

Contestando a decisão, o recorrido entende que acórdão da Relação violou e fez errada aplicação interpretação do disposto nos arts. art.º 312 do CdVM (na redacção aplicável), e os art.ºs 74 e 75 do RGCISF.


14.1. A) Quanto aos requisitos dessa responsabilidade civil, diz o recorrente que não houve ilicitude, porque não houve violação do dever de informar, em particular, no que se reporta ao risco associado à subscrição das obrigações subordinadas, pois na sua visão a única informação que era devida foi prestada e reportava-se ao cumprimento da obrigação de reembolso pelo emitente do respectivo produto financeiro.

Não haveria outros riscos associados que o intermediário financeiro devesse ter prestado, em especial:

a) não sendo um instrumento sujeito a negociação em mercado regulamentado, não estaria sujeito à volatilidade dos mercados ou a diferenças de cotação resultantes do valor das diferentes ordens para aquisição e venda dos títulos;

b) não havia qualquer tipo de risco de liquidez, porquanto a procura superava em muito a oferta destes produtos, à data;

c) à data já haveria outras duas emissões do próprio Banco, e em todas elas a procura superou, por muito a oferta – o que se manteve sempre mesmo depois do período de subscrição no chamado mercado de balcão.

Apenas haveria um risco equivalente ao de um DP, porque:

i) A SLN era titular de 100% do capital social do Banco-R., exercendo, por isso o domínio total sobre este.

ii) Ora, o risco associado ao reembolso das Obrigações correspondia, então ao risco de solvabilidade da SLN.

iii) E sendo esta totalmente dominante do Banco-R., então este risco de solvência, corresponderia, grosso modo, ao risco de solvabilidade do próprio Banco!

iv)a segurança da subscrição de Obrigações emitidas pela SLN seria correspondente à segurança de um Depósito a Prazo no BPN

v) o risco BPN ou risco SLN, da perspetiva da insolvência era também equivalente!


No seu entender a menção à referência de “o produto ter capital garantido” estava também correcta e sem que pudesse ser assacada à Ré qualquer violação do dever de informar, informação errónea ou omissa, porquanto:

a) A menção à expressão capital garantido não tem por si só a virtualidade de atribuir qualquer desaparecimento de todo o risco de qualquer tipo de aplicação

b) A expressão capital garantido mais não é do que a descrição de uma característica técnica do produto – corresponde à garantia de que o valor de reembolso, no vencimento, é feito pelo valor nominal do título e correspondente ao respetivo valor de subscrição! Ou seja, o valor do capital investido é garantido!

c) daqui não resulta, de todo, qualquer tipo de equivalência a uma garantia de reembolso do capital!


14.2. B) Quanto aos requisitos dessa responsabilidade civil, diz o recorrente que não houve culpa

Apesar de se defender nos termos expostos, procurando excluir a ilicitude na prestação da informação, a recorrente parece assumir que poderia ter esclarecido melhor o cliente do sentido de “capital garantido”, quando diz:

Vale isto por dizer que, ainda que se entenda que esta expressão mereceria uma densificação ou explicação aos clientes, a fim de evitar qualquer confusão, o certo é que, transmitindo uma característica técnica, não se poderá afirmar que o banco, ou os seus colaboradores agiram com culpa, e muito menos grave!


Embora a recorrente assuma a possível falta de clareza – como se disse – da mesma não retira como consequência a violação culposa dos seus deveres com efeitos na responsabilização civil, afirmando que a actuação do banco e dos seus funcionários não teria sido culposa – “O Banco limitou-se a informar esta característica do produto, não sendo suas obrigações assegurar-se de que o cliente compreendeu a afirmação!”


14.3. C) Quanto aos requisitos dessa responsabilidade civil, diz o recorrente que não ficou demonstrada a existência de nexo de causalidade entre a falta de informação e dano.


15. A posição do Tribunal recorrido foi a seguinte:

Omissão do dever de informação pelo BPN, aquando da subscrição das Obrigações Subordinadas SLN 2006 pelo autor, dos potenciais riscos que este corria ao subscrevê-las.

Os bancos têm uma especial obrigação de informação nas relações com os clientes particulares que, na grande maioria dos casos são pouco informados.

Podem ser intermediários financeiros nos termos do artigo 293º, nº 1, alínea a), do CVM, mas, neste caso, têm de prestar todas as informações necessárias para o cliente tomar uma decisão esclarecida e fundamentada. cfr. artigos 312º, 312º-A e 312º-B do CVM. O legislador teve «a preocupação de fazer assentar cada vez mais a atuação das instituições de crédito e outras empresas financeiras em princípios de ética profissional e regras que protejam de forma eficaz a posição do consumidor de serviços financeiros». Preâmbulo do RGICSF Em face da competência profissional do banco, diz Menezes Leitão que «a simples prestação de informações envolve uma garantia de exatidão da informação prestada». Informação Bancária e Responsabilidade, pág. 236.

O dever de informação no âmbito da relação bancária que, normalmente é duradoura, é tanto mais exigente quanto menos informado for o cliente. Resultou provado que, a 20 de abril de 2006, o gerente da agência da ... do BPN disse ao autor que tinha uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo, com o capital garantido por aquele banco e com rentabilidade assegurada; o dito funcionário do BPN apercebeu-se de que o autor não possuía qualificações ou formação técnica que lhe permitisse conhecer os diversos produtos financeiros e avaliar, por isso, os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem devidamente; o gerente do BPN não informou o autor dequeos €50.000,00iamser investidos em Obrigações Subordinadas SLN 2006, sociedade com identidade distinta daquele, qual a ligação direta entre o banco e essa sociedade e o que distinguia obrigações subordinadas das não subordinadas; o autor atuou convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura e com as características de um depósito a prazo e que o banco era garante do retorno do capital e do pagamento dos juros; se se tivesse apercebido de estar a dar ordem de compra de obrigações SLN Subordinadas 2006 e que o capital não era garantido pelo banco, não o autorizaria; as Obrigações Subordinadas SLN 2006 eram, à data da subscrição, produto de risco; o autor não foi informado pelo gerente do banco, o que eram Obrigações Subordinadas SLN 2006; nunca nenhum contrato foi lido ou explicado ao autor, nem lhe foi entregue cópia que contivesse cláusulas sobre Obrigações Subordinadas SLN 2006, nem que contivesse prazos de resolução unilateral pelo autor. Quer tudo isto dizer que o autor só subscreveu a Obrigação Subordinada SLN 2006, por ter sido convencido a fazê-lo pelo gerente da agência do BPN da ..., que não lhe revelou o verdadeiro sentido e alcance do ato que praticava: não estava a investir o seu dinheiro numa aplicação em tudo igual a um depósito a prazo, com o capital garantido pelo BPN e com rentabilidade assegurada, mas num produto que não tinha, como não teve, garantia de retorno da totalidade ou, sequer, de parte dos €50.000,00investidos.

O que o funcionário da agência do BPN da ... quis foi vender as Obrigações SLN 2006, em violação dos deveres de neutralidade e lealdade que o artigo 74º do RGICSF impõe aos bancos. Em matéria de perfeição da declaração negocial e da formação dos contratos, o artigo 227º, nº 1, do C.C., estabelece: Quem negoceia com outrem para conclusão de um contrato deve, tanto nos preliminares como na formação dele, proceder segundo as regras da boa-fé, sob pena de responder pelos danos que culposamente causar à outra parte.

Existem determinados deveres dos contratantes,   relativos ao mútuo comportamento ao longo das negociações, deveres que, no seu conjunto, definem uma relação pré-negocial ou pré-contratual.

A culpa in contrahendo «funciona quando a violação dos deveres de proteção, de informação e de lealdade conduz à frustração da confiança criada na contraparte pela atividade anterior do violador ou quando essa mesma violação retire às negociações o seu sentido substancial profundo de busca de um consenso na formação de um contrato válido, apto a prosseguir o escopo que, em termos de normalidade, as partes lhe atribuem». Menezes Cordeiro, Da Boa-Fé no Direito Civil, págs. 583 e 584.

O declarante tem de originar conscientemente o processo que determina «a formação no espírito do declaratário duma confiança legítima na seriedade da declaração recebida e na sua idoneidade para refletir as verdadeiras intenções de quem as emitiu». Ferrer Correia, Erro e Interpretação na Teoria do Negócio Jurídico, pág. 53.

Ao agir como o descrito na matéria de facto provada, o funcionário em causa violou os deveres de neutralidade, lealdade e informação e constituiu-se em responsabilidade pré-negocial nos termos do citado artigo 227º, nº 1, do C.C., perante o cliente, ora autor. Estando em causa um funcionário que prestou informação inadequada, nos termos do artigo 800º, nº 1, do C.C., o banco responde pela conduta daquele como se tivesse sido ele a praticar essa conduta. Existe, portanto, responsabilidade da ré pela informação que o funcionário bancário prestou, levando o autor a investir o seu dinheiro nas Obrigações Subordinadas SLN 2006, que não tinham capital garantido pelo BPN. O facto de ter sido transmitida ao autor a informação de que o BPN era o garante do capital investido, não pode deixar de ser compreendido, pelo declaratário normal, como uma garantia efetiva de pagamento do mesmo.

É isto que se refere no acórdão do STJ, de 10-04-2018, que, «adotando o padrão do declaratário normal cliente bancário – artigo 236º, nº1, do C.C. – dado à segurança do seu aforro e, menos ou nada, ao risco de investimento, obter do banco, em que depositava confiança, a informação que a obrigação tinha retorno garantido pelo próprio banco, sendo que até proporcionava remuneração superior, seria entendida tal declaração como informação que, em relação ao crucial aspeto de retorno, incutia a confiança na ausência de risco como se fosse um depósito bancário». No mesmo sentido, os acórdãos do STJ, de 17.3.2016 e de 10.1.2013, in www.dgsi.pt.

16. Da leitura da decisão recorrida resulta, em dúvida, que o Tribunal considerou:

- Demonstrada a ilicitude na falta da prestação da informação devida ao concreto cliente em causa, em face do seu próprio perfil e conhecimentos em matérias de investimentos na área em causa, com ponderação da sua profissão habitual e especificidade do produto em causa – obrigações subordinadas

E de outras passagens do acórdão decorre ainda:

- Demonstrada a culpa do Réu, por presunção, não ilidida;

- Demonstrado o nexo de causalidade entre a falta da prestação da informação devida e o dano invocado.


17. As questões relativas ao âmbito do dever de informação reportadas a casos similares ao dos presentes autos, presunção de culpa e nexo de causalidade, foram objecto de recente acórdão de Uniformização de Jurisprudência pelo STJ, tendo-se fixado a seguinte orientação jurisprudencial:

1. No âmbito da responsabilidade civil pré-contratual ou contratual do intermediário financeiro, nos termos dos artigos 7.º, n.º 1, 312.º n.º 1, alínea a), e 314.º do Código dos Valores Mobiliários, na redação anterior à introduzida pelo Decreto-Lei n.º 357-A/2007, de 31 de outubro, e 342.º, n.º 1, do Código Civil, incumbe ao investidor, mesmo quando seja não qualificado, o ónus de provar a violação pelo intermediário financeiro dos deveres de informação que a este são legalmente impostos e o nexo de causalidade entre a violação do dever de informação e o dano.

2. Se o Banco, intermediário financeiro – que sugeriu a subscrição de obrigações subordinadas pelo prazo de maturidade de 10 anos a um cliente que não tinha conhecimentos para avaliar o risco daquele produto financeiro nem pretendia aplicar o seu dinheiro em “produtos de risco” – informou apenas o cliente, relativamente ao risco do produto, que o “reembolso do capital era garantido (porquanto não era produto de risco”), sem outras explicações, nomeadamente, o que eram obrigações subordinadas, não cumpre o dever de informação aludido no artigo 7.º, n.º1, do CVM.

3. O nexo de causalidade deve ser determinado com base na falta ou inexatidão, imputável ao intermediário financeiro, da informação necessária para a decisão de investir.

4. Para estabelecer o nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação, por parte do intermediário financeiro, e o dano decorrente da decisão de investir, incumbe ao investidor provar que a prestação da informação devida o levaria a não tomar a decisão de investir. 


18. Essa orientação foi definida no âmbito de confronto entre um acórdão recorrido e um acórdão fundamento considerados como contraditórios e, na sequência da uniformização, a solução uniformizadora foi aplicada ao acórdão recorrido – tendo resultado em confirmação do acórdão recorrido por não estar demonstrada a causalidade, enquanto pressuposto indispensável à procedência do pedido indemnizatório.

Nesse processo do acórdão recorrido os factos relevantes eram os seguintes:

a) Provados:

1º - Os autores foram clientes do réu (à data BPN - Banco Português de Negócios), na sua agência de ..., com a conta à ordem n° ...01, onde movimentavam parte do seu dinheiro, realizavam pagamentos e efectuavam poupanças.

2° - Em 10.4.2006, o autor subscreveu, junto dessa agência, seis "obrigações SLN 2006", cada uma no valor de € 50.000,00.

3º - Aquando do referido em 2º, o autor assinou o boletim de subscrição respectivo, o que fez de forma deliberada e consciente.

4º - Desse documento, assinado também por funcionário do Banco, na parte respeitante ao seu recebimento, referente a "SLN 2006 Boletim de Subscrição", datado de 10.4.2006, consta o seguinte:

«Natureza da Emissão

Emissão até 1.000 obrigações subordinadas, ao portador e sob a escritural com o valor nominal de € 50.000,00 cada uma, oferecidas directamente ao público, ao preço unitário igual ao valor nominal.» (...)

«Prazo e reembolso

O prazo de emissão é de dez anos, sendo o reembolso do capital efectuado em 09 de Maio de 2016. O reembolso antecipado da emissão só é possível por iniciativa da SLN -Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, SA, a partir do 5º ano, e sujeito a acordo prévio do Banco de Portugal.

Remuneração Juros pagos semestral e postecipadamente, às seguintes taxas:

Cupões Taxa anual nominal bruta

1º semestres

4,5%*

9 cupões seguintes Euribor a 6 meses + 1,15 %

Restantes 10 semestres

Euribor a 6 meses + 1,50 %

*Taxa anual efectiva líquida: 3,632 %

5º - As Obrigações SLN 2006 foram emitidas pela SLN, SGPS, SA, que era, à data, titular de 100% do capital social do Banco réu (então BPN), participação que deteve de forma permanente até Nov/2008, altura em que foi legislada a nacionalização de todas as acções integradoras do capital social daquele.

6º - A circunstância de a emitente do produto referido em 2º ser a empresa que detinha o BPN, sendo este, necessariamente, um garante da solvibilidade daquela, por ser o principal activo do seu património, aliada às características específicas das obrigações - que são, tendencialmente, um produto conservador, com um risco normalmente reduzido, indexado à solidez financeira da sociedade emitente - levavam a que o mencionado produto financeiro fosse, à data da sua emissão, considerado seguro, com um risco semelhante ao risco de um depósito a prazo no próprio Banco.

7º - As orientações e comunicações internas existentes no BPN e que este transmitia aos seus comerciais nos respectivos balcões consistiam em afirmar a segurança da aplicação financeira em causa, a sua solidez, a boa rentabilidade e assegurar que tinha um risco semelhante ao de um depósito a prazo junto do próprio Banco. Para tanto, era argumentado que a SLN Valor era a maior accionista da SLN SGPS, sendo que esta detinha 100 % do BPN, pelo que não era vista qualquer diferença entre o risco BPN e o risco daquelas aplicações SLN.

8º - A ré pretendia, à data, que os seus funcionários tivessem especial empenho na colocação destes produtos e passassem a ideia de que aos mesmos não estavam associados quaisquer riscos quanto ao reembolso do capital e juros.

9º - Foi transmitida ao autor, por funcionário da ré que lhe sugeriu esse produto, a informação de que o reembolso do capital aplicado era garantido (porquanto não era produto de risco), que tinha uma rentabilidade assegurada, com juros semestrais e que poderia dispor do capital investido quando assim o entendesse, bastando avisar a agência com a antecedência de alguns dias e foram-lhe apresentadas as condições do produto, concretamente, a sua remuneração, vantajosa relativamente aos depósitos a prazo, o seu prazo, de 10 anos, as condições de reembolso e de obtenção de liquidez ao longo do prazo de 10 anos, que seria possível obter, a qualquer momento, num prazo de alguns dias, por via de endosso.

10º - À data, era extremamente fácil e rápido conseguir a transmissão das obrigações por via do endosso, porquanto a procura superava inúmeras vezes a oferta.

11º - O autor subscreveu as mencionadas obrigações no convencimento de que o dinheiro tinha sido investido numa aplicação segura (no sentido de ser de baixo risco), cujo reembolso do capital era garantido e que lhe seriam pagos os juros.

12º - O autor não pretendia aplicar o seu dinheiro em produtos de risco, como era do conhecimento dos funcionários da ré que com ele contactavam, sendo por eles perceptível que não possuía qualificação específica ou formação técnica que lhe permitisse, à data, conhecer cabalmente os diversos tipos de produtos financeiros e avaliar, por isso, com toda a precisão, os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem devidamente e que, por isso, tinha um perfil conservador no que respeitava ao investimento do seu dinheiro (mais precisamente, sendo seu hábito investir em produtos de baixo risco e rentabilidade assegurada).

13º - Os autores fizeram, por intermédio da ré ou junto desta, outros investimentos em aplicações financeiras, ainda que de baixo risco, designadamente, em fundos de investimento.

14º - Os autores têm estado impedidos de usar o dinheiro aplicado nas obrigações referidas em 2º.

O acórdão da Relação aditou os seguintes factos:

15º - Os autores não sabiam o que são obrigações.

16º - O Banco réu não explicou aos autores o que eram obrigações.

17º - Os autores não possuíam conhecimentos e nem experiência suficientes para compreenderem o tipo de investimento que fizeram, e ninguém lho explicou correctamente.

18º - Ninguém explicou aos autores que BPN e SLN eram duas entidades distintas e que investir em SLN era diferente de aplicar dinheiro no BPN.

19º - O BPN garantia o pagamento destas obrigações da SLN.

20º - Foram pagos os juros vencidos até Nov/2015, ficando por pagar os restantes juros até à maturidade (vencidos em Maio/2016).

b) não provados

a) Que a gerente do Banco réu da agência de ... tenha dito ao autor, em Abril/2006, que tinha uma aplicação que correspondia exactamente a – no sentido de ser, verdadeiramente – um depósito a prazo e com capital garantido pelo BPN.

b) Que o autor, ao subscrever as referidas obrigações SLN 2006, não soubesse em concreto “o que era, desconhecendo inclusivamente que a SLN era uma empresa”, estando convencido de estar a aplicar o seu dinheiro num depósito a prazo.

e) Que, se o autor tivesse percebido que poderia estar a dar ordem de compra de obrigações SLN 2006, cujo capital não era garantido pelo BPN, após explicação do mencionado em 1.6., não tivesse consentido e autorizado tal compra.

f) Que os autores nem soubessem que existia a SLN, pensando que era uma mera denominação de conta a prazo, que era uma mera denominação de conta a prazo, que o banco réu utilizava.

g) Que os autores desconhecessem e nem pudessem conhecer que o seu dinheiro tinha sido aplicado em aplicações com características diferentes de um depósito a prazo.

j) Quais as consequências advindas para os autores do facto de não poderem utilizar o dinheiro investido nas mencionadas obrigações.


19. Na aplicação da solução uniformizadora ao caso concreto, na perspectiva da ilicitude, o tribunal disse:

Dos factos provados resulta que:

- Os Autores foram clientes do BPN, na sua agência de ..., com a conta à ordem n.º...01, onde movimentam parte do seu dinheiro, realizavam pagamentos e efetuavam poupanças.

- Em 10/04/2006, o Autor subscreveu, junto dessa agência, seis “obrigações SLN 2006”, cada uma no valor de €50 000,00, tendo assinado o boletim de subscrição respetivo, o que fez de forma deliberada e consciente.

- O Autor veio a subscrever seis obrigações subordinadas SLN, no valor de €50 000,00 cada, tendo o Banco agido na sua qualidade de intermediário financeiro;

- As Obrigações SLN 2000 foram emitidas pela SLN, SGPS, S.A., que era, à data, titular de 100% do capital social do “Banco réu (então BPN)”, participação que deteve de forma permanente até Nov/2008, altura em que foi legislada a nacionalização de todas as ações integradoras do capital social daquele.

Deste modo, não só releva o perfil do cliente e o tipo de contratação que com ele foi estabelecida mas também o facto de o Banco BPN ter um claro interesse no resultado da operação de comercialização das obrigações emitidas pela SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A..

Encontra-se, também, provado que:

- “foi transmitida ao autor, por funcionário da ré que lhe sugeriu esse produto, a informação de que o reembolso do capital aplicado era garantido (porquanto não era produto de risco), que tinha uma rentabilidade assegurada, com juros semestrais e que poderia dispor do capital investido quando o entendesse, bastando avisar a agência com a antecedência de alguns dias e foram-lhe apresentadas as condições do produto, concretamente, a sua remuneração, vantajosa relativamente aos depósitos a prazo, o seu prazo, de 10 anos, as condições de reembolso e de obtenção de liquidez ao longo do prazo de 10 anos, que seria possível obter, a qualquer momento, num prazo de alguns dias, por via do endosso.” (facto provado e atrás indicado sob o ponto 7.).

-Tendo o Autor subscrito as mencionadas obrigações no convencimento de que o dinheiro tinha sido investido numa aplicação segura (no sentido de ser de baixo risco), cujo reembolso do capital era garantido e que lhe seriam pagos os juros.

- O Autor não pretendia aplicar o seu dinheiro em produtos de risco, como era do conhecimento dos funcionários da Ré que com ele contactaram.

- O Autor não possuía qualificação específica ou formação técnica que lhe permitisse, à data, conhecer cabalmente os diversos tipos de produtos financeiros e avaliar, por isso, com toda a precisão, os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem devidamente, o que era do conhecimento do Banco.

- Os Autores não sabiam o que são obrigações e o Banco não explicou aos Autores o que eram obrigações, bem como, ninguém explicou aos Autores que BPN e SLN eram duas entidades distintas e que investir em SLN era diferente de aplicar dinheiro no BPN.

Ora, destes factos provados, à luz do direito aplicável, resulta que o Banco prestou ao Autor uma informação, no mínimo, incompleta, incompleta, inexata e obscura, não tendo atendido à qualidade de investidor dos Autores e aos seus conhecimentos.

7.2. A informação foi incompleta porque não foi explicada ao Autor a característica da subordinação das obrigações, bem como não foi explicada a relação de dependência do Banco perante o emitente das obrigações.

 Também não foram explicadas “as condições de reembolso…, que seria possível obter, a qualquer momento, num prazo de alguns dias, por via do endosso”, isto é, nada foi dito em que consistia o endosso, apesar de se encontrar provado que “à data, era extramente fácil e rápido conseguir a transmissão das obrigações por via do endosso, porquanto a procura superava inúmeras vezes a oferta”.

A informação incompleta e inexata porque o reembolso do capital aplicado não era garantido.

Ao contrário da informação do Banco, porquanto se tratava de um empréstimo obrigacionista em que, em caso de falência ou liquidação do emitente, o reembolso das obrigações fica subordinado ao prévio reembolso de todos os demais credores não subordinados da emitente: “apenas se pode pagar sobre o património do emitente depois de satisfeitos todos os credores comuns” (Paulo Câmara, Manual de Direito dos Valores Mobiliários, 2.ª edição, p.137).

A informação foi obscura, porque nos termos em que foi dada, não permitia ao cliente (investidor) entender as especificidades do instrumento financeiro que adquiria: Os Autores não sabiam o que são obrigações e o Banco não explicou o que eram obrigações, nem explicou que BPN e SLN eram duas entidades distintas e que investir em SLN era diferente de aplicar dinheiro no BPN.

Assim, as informações incorretamente prestadas ao Autor assumiam um cariz objetivo – pois o que relevava para os Autores, para além da rentabilidade, era saber se o reembolso do capital investido estava assegurado – constituem informações que não estavam dependentes de quaisquer variantes analíticas ou evolução da conjuntura económico-financeira, decorrendo das próprias características do produto.

Como já se deixou dito, o intermediário financeiro deve prestar “todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada” (artigo 312.º, n.º 1, do CVM). Além disso, a extensão e a profundidade da informação devem ser tanto maiores quanto menor for o grau de conhecimentos e experiência do cliente (artigo 312.º, n.º 2, do CVM), o que significa que a “intensidade do dever de informação varia em função do tipo contratual e do perfil do cliente” (Acórdão STJ, de 11/10/2018), devendo o grau de conhecimentos e experiência reportar-se ao produto financeiro em causa. Por outro lado, não se deve ignorar que nas relações com os clientes “os intermediários devem observar os ditames da boa-fé, de acordo com os elevados padrões de diligência, lealdade e transparência” (artigo 304.º, n.º 2, do CVM).

7.3. Para resolver a situação suscitada no Acórdão recorrido é premente ir mais longe na análise do caso concreto, nomeadamente considerando os factos alegados e a situação fáctica com que o Tribunal tem de decidir.

Do ponto de vista da alegação dos Autores, estes alegaram:

- que o gerente dessa agência disse ao Autor que tinha uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo, com capital garantido pelo BPN e rentabilidade assegurada.

Analisando.

A ser prestada esta informação, estaríamos em presença de uma informação falsa, porquanto, no caso das obrigações subordinadas não existe a garantia dos depósitos bancários a prazo, isto é, se o Autor constituísse um depósito a prazo no mesmo valor, em caso de falência do Banco, o Autor teria o reembolso de €25 000,00, garantido legalmente (artigos 164.º e 166.º, nº 1, do Decreto - Lei  n.º 298/92 de 31.12, na redação do Decreto - Lei n.º 252/2003 de 17/10 - cf. Ac. STJ, de 23.3.2021, processo n.º 1209/19.9T8STR.E1.S1, consultável em www.dgsi.pt); pelo contrário, em caso de insolvência da entidade emitente das obrigações, o que sucedeu, o Autor não tem garantia legal de reaver qualquer montante aplicado no produto (podendo, contudo, a final da liquidação, ser reembolsado).

Contudo, apesar da alegação dos Autores, esse facto não ficou provado no Acórdão recorrido.

Do ponto de vista da alegação dos Autores, estes também disseram:

- que foi dito pelo Banco ao Autor que o reembolso do capital era garantido pelo BPN, o que se traduziria numa informação falsa.

Analisando, também nesta parte os Autores não lograram fazer a prova do que alegaram.

- Estas alegações dos Autores e o resultado fáctico será reanalisado novamente, em sede de análise da causalidade -

Ponto de síntese:

Considerando-se, assim, que os factos provados permitem configurar a violação do dever de informação que impendia sobre o Banco, conclui-se pela existência da ilicitude, primeiro dos pressupostos da responsabilidade civil imputada ao Banco.”


20. Na aplicação da solução uniformizadora ao caso concreto, na perspectiva da culpa, o tribunal disse:

Por outro lado, verifica-se a existência do dano e o Banco não demonstrou que não agiu com culpa, como se referiu esta presume-se nos termos do disposto no n.º1 do artigo 799.º, n.º1, do Código Civil (sendo que estes pressupostos da responsabilidade civil não estavam colocados em crise no Acórdão recorrido).”


21. Na aplicação da solução uniformizadora ao caso concreto, na perspectiva do nexo de causalidade, o tribunal disse:

“7.5. Importa agora verificar se está preenchido o requisito da existência, no Acórdão recorrido, do nexo de causalidade entre o facto ilícito – a prestação de informação incompleta, falsa e obscura – e o dano (a perda do capital investido na aquisição das obrigações).

7.5.1. Como se referiu anteriormente, a prova da verificação do nexo de causalidade entre o facto ilícito e o dano compete ao Autor, nos termos do disposto no n.º1 do artigo 342.º do Código Civil, encontrando-se afastada a presunção de causalidade, no caso presente.

Apesar de ocorrer a violação do dever de informação (ilicitude) e de a culpa se presumir (artigo 304.º n.º 2, do CVM – na redação em vigor aquando da ocorrência dos factos), a obrigação de indemnizar não prescinde, pois, do preenchimento dos demais pressupostos – o dano e nexo de causalidade –, o que significa que, no caso vertente, haveriam de estar provados factos que permitissem estabelecer uma cadeia factual, que incluísse o ato ilícito que o desencadeou (isto é, a falta de informação sobre o produto subscrito) e que, naturalística e juridicamente, conduzisse ao dano (artigo 563.º do Código Civil), sendo que era sobre os Autores que recaía o ónus dessa prova (artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil) –  (cf. Ac. STJ, de 30/04/2019 (processo n.º 2632/16. 6T8LRA.L1.S1).

Com efeito, dispõe o artigo 563.° do Código Civil que a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão.

Conforme é orientação do STJ tem-se entendido que a causalidade tem uma vertente de facto e outra de direito: na sua vertente naturalística (de facto) averigua-se se o processo sequencial foi ou não facto desencadeador ou gerador do dano (…), sendo que, nessa perspectiva, o juízo de causalidade se insere no plano puramente factual insindicável pelo Supremo Tribunal de Justiça, nos termos e com as ressalvas dos artigos 682.º, n.º 1 e 674.º, n.º 3 do Código de Processo Civil; só depois de assente esse nexo naturalístico (relação causa-efeito) pode o Supremo Tribunal de Justiça verificar da existência de nexo de causalidade que se prende com a interpretação e aplicação do artigo 563.º do Código Civil (cf. Ac. STJ, de 13/03/2008 (processo nº 08A369) e Ac. STJ, de 11/01/2011 (processo n.º 2226/07-7TJVNF.P1.S1). Dito de outro modo: “para além de fáctica ou naturalisticamente se ter de apurar se uma determinada actuação (acção ou omissão) provocou o dano (cf. Acórdão deste Supremo Tribunal, de 7 de julho de 2010, processo n.º 1399/06.0TVPRT.P1.S1), cumpre ainda averiguar, tendo em conta as regras da experiência, se era ou não provável que da acção ou omissão resultasse o prejuízo sofrido, ou seja, se aquela não realização é causa adequada do prejuízo verificado. É necessário que, em concreto, a acção (ou omissão) tenha sido condição do dano; e que, em abstracto, dele seja causa adequada (Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, I, 10ª ed., Coimbra, 2000, p. 900)” (cf. Ac. STJ, de 24/4/2013, processo nº 3379/05.4TBVCT.G1.S1).

Ou seja: o juízo de adequação normativa ínsito no artigo 563.º do Código Civil pressupõe a causalidade fáctica.

Daí que antes de indagar se a causa foi adequada à produção do dano, deve o intérprete verificar se a causa foi “conditio sine qua non” do referido dano. Não o tendo sido, falece logo a relação causal (Ac. STJ, de 22/10/2009, processo nº 409/09.4YFLSB).

7.5.2. atentemos nos factos provados e não provados.

No que respeita ao nexo de causalidade, os Autores alegaram:

- “… o que motivou a autorização, por parte do A. marido, foi o facto de lhe ter sido dito pelo gerente que o capital era garantido pelo Banco Réu, com juros semestrais e que poderia levantar o capital e respectivos juros quando assim o entendesse, bastando avisar a agência com a antecedência de três dias (artigo 6.º da petição inicial);

- se o A. marido tivesse percebido que poderia estar a dar ordem de compra de obrigações SLN 2006, produto de risco e que o capital não era garantido pelo BPN, não o autorizaria” (artigo 8.º da petição inicial);

- pelo que os AA. desconheciam e nem podiam conhecer, que tinham adquirido uma aplicação com características diferentes de um depósito a prazo, pois caso soubessem que se tratava de um produto de risco, não o teriam adquirido (artigo 17.º da petição inicial).

Todavia, os Autores não lograram provar qualquer destes factos; alguns foram expressamente dados como não provados (cf. alíneas a), e) e g) dos factos não provados).

Assim, não se verifica que qualquer facto dado como provado tenha operado, no plano meramente factual, como conditio sine qua non do dano, maxime, que as deficiências da informação do BPN tenham funcionado como condição desencadeadora do prejuízo do não reembolso do capital.

Para que tais deficiências pudessem funcionar como condição do dito prejuízo, seria necessário provar que, caso tivesse sido recebida informação completa, clara e objetiva (como a que atrás se caracterizou), o Autor não teria subscrito as obrigações.

Falece, assim, a relação de causalidade adequada entre a ilicitude por violação dos deveres de informação e o dano de não reembolso do capital.

Deste modo, embora com fundamentos não coincidentes, o recurso não pode proceder.”


21. Da Fixação de jurisprudência e sua aplicação ao concreto processo que a despoletou resulta sem sombra de dúvidas que o âmbito do dever de informação e sua violação comporta uma vertente subjectiva, em função do perfil do cliente com quem o banco contratou o produto financeiro. Tratando-se de pessoa com pouca literacia e experiência em investimentos típicos deste mercado financeiro a informação a prestar pelo banco teria de ser superior à que é necessária para um cliente com conhecimentos e experiência relevante. Sendo pessoa menos experiente ou que depositasse confiança significativa em informação – menos precisa ou até errónea – que fosse decisiva para a opção de investimento, poder-se-ia admitir existir ilicitude na prestação da informação contratualmente devida.

Por isso, no caso do RUJ, se deu destaque, entre outros, ao facto de o cliente ser pouco experiente e informado, como resultava do facto provado “12º - O autor não pretendia aplicar o seu dinheiro em produtos de risco, como era do conhecimento dos funcionários da ré que com ele contactavam, sendo por eles perceptível que não possuía qualificação específica ou formação técnica que lhe permitisse, à data, conhecer cabalmente os diversos tipos de produtos financeiros e avaliar, por isso, com toda a precisão, os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem devidamente e que, por isso, tinha um perfil conservador no que respeitava ao investimento do seu dinheiro (mais precisamente, sendo seu hábito investir em produtos de baixo risco e rentabilidade assegurada).


22. A situação no presente recurso não é substancialmente diversa:

A) Quanto ao perfil do cliente:

i) no presente processo está provado que:

7. Apesar de o autor não ser pessoa que frequentava a agência, o dito funcionário do banco réu apercebeu-se que ele não possuía qualificações ou formação técnica que lhe permitisse conhecer os diversos produtos financeiros e avaliar, por isso, os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem devidamente.

9. O autor atuou convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura e com as caraterísticas de um depósito a prazo e que o Banco era garante do retorno do capital e do pagamento dos juros.

10. Se se tivesse apercebido de estar a dar ordem de compra de obrigações SLN Subordinadas 2006 e que o capital não era garantido pelo banco réu, não o autorizaria.

13. O autor não foi informado pelo gerente da ré, o que eram Obrigações Subordinadas SLN 2006.

2. O autor subscreveu o documento de fls. 32, no qual solicita a subscrição de €50.000,00 de Obrigações SLN 2006 (B).

3. Este montante foi-lhe debitado na conta à ordem nº ...01 na agência da ré da ... (C).

4. O autor recebeu juros da aplicação referida em 2 dos factos provados até novembro de 2015, e a partir daí, não recebeu mais juros, nem recebeu o próprio capital (D).

5. Aquando da assinatura do documento de fls. 32 (20/04/2006), não foi entregue ou disponibilizada e explicada ao autor a nota informativa de fls. 33/65.

6. Quando, a 20 de abril de 2006, o autor pretendeu fazer uma aplicação remunerada de algum capital, o gerente do banco réu da agência da ... disse-lhe que tinha uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo, com o capital garantido pelo BPN e com rentabilidade assegurada.

14. Nunca nenhum contrato foi lido ou explicado ao autor, nem lhe foi entregue cópia que contivesse cláusulas sobre Obrigações Subordinadas SLN 2006, nem que contivesse prazos de resolução unilateral pelo autor.

ii) No processo do RUJ está provado que ((17º) Os autores não possuíam conhecimentos e nem experiência suficientes para compreenderem o tipo de investimento que fizeram, e ninguém lho explicou correctamente.; (12º) - O autor não pretendia aplicar o seu dinheiro em produtos de risco, como era do conhecimento dos funcionários da ré que com ele contactavam, sendo por eles perceptível que não possuía qualificação específica ou formação técnica que lhe permitisse, à data, conhecer cabalmente os diversos tipos de produtos financeiros e avaliar, por isso, com toda a precisão, os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem devidamente e que, por isso, tinha um perfil conservador no que respeitava ao investimento do seu dinheiro (mais precisamente, sendo seu hábito investir em produtos de baixo risco e rentabilidade assegurada).


22. Existem assim pontos comuns nos factos em confronto do processo do RUJ e no presente como:

B) informação sobre o que eram obrigações/conhecimento do significado “obrigações e obrigações subordinadas” (e não papel comercial, como consta nos factos não provados):

i) no presente processo está provado que:

7. Apesar de o autor não ser pessoa que frequentava a agência, o dito funcionário do banco réu apercebeu-se que ele não possuía qualificações ou formação técnica que lhe permitisse conhecer os diversos produtos financeiros e avaliar, por isso, os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem devidamente.

9. O autor atuou convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura e com as caraterísticas de um depósito a prazo e que o Banco era garante do retorno do capital e do pagamento dos juros.

10. Se se tivesse apercebido de estar a dar ordem de compra de obrigações SLN Subordinadas 2006 e que o capital não era garantido pelo banco réu, não o autorizaria.

iii) No processo do RUJ está provado que (15º) Os autores não sabiam o que são obrigações; (16º ) O Banco réu não explicou aos autores o que eram obrigações;


23. Partindo da ideia de que só ao nível do caso concreto, com base na factualidade provada, se poderá concluir se um intermediário financeiro forneceu toda a informação que lhe era possível e exigível fornecer, face ao perfil do cliente e às suas necessidades informacionais, justificando-se que em certos casos respeitantes ao cumprimento dos deveres de informação, em contratos de intermediação financeira, se conclua pela não responsabilização do intermediário e noutros casos se conclua de modo diverso vejamos a situação do presente processo.

Ora, da análise dos factos provados nos presentes autos, nomeadamente dos acabados de indicar resulta que foi prestado ao Autor informação não completa e adequada aos seus conhecimentos e perfil – também aferido pela sua relação de clientela com o banco e pelo seu perfil de cliente bancário e à confiança depositada na informação recebida - que lhe permitisse decidir com inteiro conhecimento de causa que tipo de investimento estava a realizar.


Por estes motivos, pode equiparar-se a situação informativa destes à situação de outros que têm obtido dos tribunais uma posição de defesa da sua frágil posição informativa reflectida em decisões de investimento, tudo apontando no sentido de estarmos perante alguém que decidiu enveredar por um investimento que comportava algum risco sem ter sido esclarecido completamente do risco em causa.

Nas indicadas condições de facto constantes dos presentes autos estão reunidas as condições para se entender que houve falta/incompletude de informação, e que por isso tenha havido ilicitude na actuação do intermediário financeiro, apta a conduzir a possível dever de indemnizar.

É, por isso de confirmar o entendimento sufragado no acórdão recorrido quanto à ilicitude.

Quanto à culpa, disse o tribunal, no acórdão recorrido:

“Existem determinados deveres dos contratantes, relativos ao mútuo comportamento ao longo das negociações, deveres que, no seu conjunto, definem uma relação pré-negocial ou pré-contratual.

A culpa in contrahendo «funciona quando a violação dos deveres de proteção, de informação e de lealdade conduz à frustração da confiança criada na contraparte pela atividade anterior do violador ou quando essa mesma violação retire às negociações o seu sentido substancial profundo de busca de um consenso na formação de um contrato válido, apto a prosseguir o escopo que, em termos de normalidade, as partes lhe atribuem». Menezes Cordeiro, Da Boa-Fé no Direito Civil, págs. 583 e 584.

O declarante tem de originar conscientemente o processo que determina «a formação no espírito do declaratário duma confiança legítima na seriedade da declaração recebida e na sua idoneidade para refletir as verdadeiras intenções de quem as emitiu». Ferrer Correia, Erro e Interpretação na Teoria do Negócio Jurídico, pág. 53.

Ao agir como o descrito na matéria de facto provada, o funcionário em causa violou os deveres de neutralidade, lealdade e informação e constituiu-se em responsabilidade pré-negocial nos termos do citado artigo 227º, nº 1, do C.C., perante o cliente, ora autor. Estando em causa um funcionário que prestou informação inadequada, nos termos do artigo 800º, nº 1, do C.C., o banco responde pela conduta daquele como se tivesse sido ele a praticar essa conduta. Existe, portanto, responsabilidade da ré pela informação que o funcionário bancário prestou, levando o autor a investir o seu dinheiro nas Obrigações Subordinadas SLN 2006, que não tinham capital garantido pelo BPN. O facto de ter sido transmitida ao autor a informação de que o BPN era o garante do capital investido, não pode deixar de ser compreendido, pelo declaratário normal, como uma garantia efetiva de pagamento do mesmo.

É isto que se refere no acórdão do STJ, de 10-04-2018, que, «adotando o padrão do declaratário normal cliente bancário – artigo 236º, nº1, do C.C. – dado à segurança do seu aforro e, menos ou nada, ao risco de investimento, obter do banco, em que depositava confiança, a informação que a obrigação tinha retorno garantido pelo próprio banco, sendo que até proporcionava remuneração superior, seria entendida tal declaração como informação que, em relação ao crucial aspeto de retorno, incutia a confiança na ausência de risco como se fosse um depósito bancário». No mesmo sentido, os acórdãos do STJ, de 17.3.2016 e de 10.1.2013, in www.dgsi.pt.

Neste ponto do recurso, embora o recorrente entenda ter sido violada a lei, à luz da jurisprudência uniformizada já indicada, a decisão adoptada está correcta e deve ser confirmada, pelos fundamentos nela indicados.

Quanto ao nexo de causalidade, disse o tribunal, no acórdão recorrido:

“O dever de informação no âmbito da relação bancária que, normalmente é duradoura, é tanto mais exigente quanto menos informado for o cliente. Resultou provado que, a 20 de abril de 2006, o gerente da agência da ... do BPN disse ao autor que tinha uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo, com o capital garantido por aquele banco e com rentabilidade assegurada; o dito funcionário do BPN apercebeu-se de que o autor não possuía qualificações ou formação técnica que lhe permitisse conhecer os diversos produtos financeiros e avaliar, por isso, os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem devidamente; o gerente do BPN não informou o autor de que os €50.000,00iamser investidos em Obrigações Subordinadas SLN 2006, sociedade com identidade distinta daquele, qual a ligação direta entre o banco e essa sociedade e o que distinguia obrigações subordinadas das não subordinadas; o autor atuou convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura e com as características de um depósito a prazo e que o banco era garante do retorno do capital e do pagamento dos juros; se se tivesse apercebido de estar a dar ordem de compra de obrigações SLN Subordinadas 2006 e que o capital não era garantido pelo banco, não o autorizaria; as Obrigações Subordinadas SLN 2006 eram, à data da subscrição, produto de risco; o autor não foi informado pelo gerente do banco, o que eram Obrigações Subordinadas SLN 2006; nunca nenhum contrato foi lido ou explicado ao autor, nem lhe foi entregue cópia que contivesse cláusulas sobre Obrigações Subordinadas SLN 2006, nem que contivesse prazos de resolução unilateral pelo autor. Quer tudo isto dizer que o autor só subscreveu a Obrigação Subordinada SLN 2006, por ter sido convencido a fazê-lo pelo gerente da agência do BPN da ..., que não lhe revelou o verdadeiro sentido e alcance do ato que praticava: não estava a investir o seu dinheiro numa aplicação em tudo igual a um depósito a prazo, com o capital garantido pelo BPN e com rentabilidade assegurada, mas num produto que não tinha, como não teve, garantia de retorno da totalidade ou, sequer, de parte dos €50.000,00investidos.”

Neste ponto do recurso, embora o recorrente entenda ter sido violada a lei, à luz da jurisprudência uniformizada já indicada, a decisão adoptada está correcta e deve ser confirmada, pelos fundamentos indicados, que encontram respaldo integral nos factos provados:

1. O autor era cliente da ré, na sua agência da ..., onde era titular da conta à ordem nº ...01, através da qual movimentava parte dos dinheiros, realizava pagamentos e efetuava poupanças (A).

2. O autor subscreveu o documento de fls. 32, no qual solicita a subscrição de €50.000,00 de Obrigações SLN 2006 (B).

5. Aquando da assinatura do documento de fls. 32 (20/04/2006), não foi entregue ou disponibilizada e explicada ao autor a nota informativa de fls. 33/65.

6. Quando, a 20 de abril de 2006, o autor pretendeu fazer uma aplicação remunerada de algum capital, o gerente do banco réu da agência da ... disse-lhe que tinha uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo, com o capital garantido pelo BPN e com rentabilidade assegurada.

7. Apesar de o autor não ser pessoa que frequentava a agência, o dito funcionário do banco réu apercebeu-se que ele não possuía qualificações ou formação técnica que lhe permitisse conhecer os diversos produtos financeiros e avaliar, por isso, os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem devidamente.

8. O gerente do banco réu não informou o autor dequeos €50.000,00 iam ser investidos em Obrigações Subordinadas SLN 2006, sociedade com identidade distinta do banco réu, qual a ligação direta entre o banco e essa sociedade e o que distinguia obrigações subordinadas das não subordinadas.

9. O autor atuou convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura e com as caraterísticas de um depósito a prazo e que o Banco era garante do retorno do capital e do pagamento dos juros.

10. Se se tivesse apercebido de estar a dar ordem de compra de obrigações SLN Subordinadas 2006 e que o capital não era garantido pelo banco réu, não o autorizaria.

11. As Obrigações Subordinadas SLN 2006 eram, à data da subscrição, produto de risco.

12. Quando o banco réu o informou de que a responsabilidade pelo pagamento do capital investido era da SLN, entidade distinta do banco, o autor ficou alarmado.

13. O autor não foi informado pelo gerente da ré, o que eram Obrigações Subordinadas SLN 2006.

14. Nunca nenhum contrato foi lido ou explicado ao autor, nem lhe foi entregue cópia que contivesse cláusulas sobre Obrigações Subordinadas SLN 2006, nem que contivesse prazos de resolução unilateral pelo autor.


III. Decisão

Pelos fundamentos indicados:

É negada a revista, confirmando-se o acórdão recorrido

As custas são a cargo do Réu, recorrente, que ficou vencido.


Lisboa, 8 de Novembro de 2022


Fátima Gomes (Relatora)

Maria João Vaz Tomé

António Magalhães