Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
801/10.1JDLSB-G.S1
Nº Convencional: 5.ª SECÇÃO
Relator: ANTÓNIO GAMA
Descritores: HABEAS CORPUS
CUMPRIMENTO DE PENA
PENA DE PRISÃO
TRÂNSITO EM JULGADO
PRESCRIÇÃO
INDEFERIMENTO
Data do Acordão: 10/20/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: HABEAS CORPUS
Decisão: IMPROCEDÊNCIA / NÃO DECRETAMENTO.
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO.
Sumário :
A norma da al. a) do n.º 1 do art. 222.º do CPP não tem em vista a incompetência funcional, apenas havendo incompetência se a entidade que efetuou ou ordenou a prisão não tem o estatuto requerido para ordenar a prisão, ou seja, não tem o estatuto de juiz, com competência em matéria criminal”, razão pelo qual a questão da competência para a emissão de mandados de detenção destinados ao início da execução da pena de prisão aplicada por decisão transitada em julgado, se do tribunal da condenação, se do TEP”, não se subsume na dita alínea, tratando-se de vicissitude processual que extravasa o âmbito do habeas corpus.
Decisão Texto Integral:

Processo nº 801/10.1JDLSB.S1

Habeas Corpus

Acordam, em audiência, no Supremo Tribunal de Justiça
I
1. AA, «nos termos e para efeitos do preceituado, no art. 31.º da Constituição da República Portuguesa e art. 222°, n.º 1 e 2, al. a) e b) do CPP» apresentou pedido de Habeas Corpus nos seguintes termos (transcrição):
«1. O Arguido foi condenado nos presentes autos, por Acórdão, numa pena de 6 (seis)anos de prisão efetiva, pela prática de crimes de burla qualificada, falsificação ou contrafação de documentos e aproveitamento de obra contrafeita, por factos respeitantes aos longínquos anos de 2009 e 2010,
2. Tendo sido determinada a sua detenção, à ordem dos presentes autos no passado dia 03-10-2022, por douto Despacho deste Digno Tribunal, de passagem de mandados de desligamento e ligamento ao Proc. 2099/18.... (DIAP – ... Secção de ...), no qual o aqui Arguido/Requerente, se encontrava submetido à medida de coação de obrigação de permanência na habitação. Ora, sucede que,
3. Desde logo, estar-se-á perante uma incompetência de carater material, por parte da entidade que ordenou o cumprimento da pena pelo qual o Arguido foi condenado,
4. Pois que, foi o douto Juízo Central Criminal ... – Juiz ... (Proc. 801/10.1JDLSB), que proferiu o Acórdão Condenatório, em sede da 1.ª instância, que determinou a emissão dos competentes mandados, tendo em vista a condução do aqui Arguido, desde a habitação até ao Estabelecimento Prisional competente.
5. Ora, e nessa senda, estaremos perante um conflito negativo de competências, pois, e salvo o devido respeito por opinião diversa, estamos perante uma ilegalidade verificável, em que, há uma ação por parte do Tribunal de “julgamento”, em momento processual que inadequado.
6. Isto porque, conforme o disposto nos arts. 470.º, n.º 1 e 477.º, n.º 1 do C. P. Penal, em remissão para o disposto no art. 138.º, n.ºs 2 e 4, al. t) do Código de Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade (doravante CEPMPL), e ainda art. 31.º da CRP, há um conflito de competência material, de cariz negativo, entre as competências do Tribunal de “julgamento” e o Tribunal de Execução das Penas (doravante TEP).
7. Nesse sentido, uma parte da doutrina entende que, a emissão dos sobreditos mandados de detenção e condução recaem sobre a esfera de competência do Tribunal da “condenação”, e outra que recai sobre o TEP.
8. Contudo, e salvo o devido respeito por opinião diversa, mui humildemente entende o aqui Arguido/Requerente que a presente competência pertence à esfera jurídica do TEP,
9. Pois que, com a entrada em vigor da Lei n.º 115/2009, de 12 de setembro, que aprovou o CEPMPL, veio de forma inequívoca, esclarecer que a competência material para a emissão de mandados de desligamento/ligamento, é competência do TEP, e não do Tribunal da “condenação”, ou de um outro qualquer Tribunal.
10. Veja-se, o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 08-10-2014, proferido no Proc. 630/10.2PBFIG-C.C1, disponível em www.dgsi.pt – «Com a entrada em vigor da Lei n.º 115/2009, de 12-09-2009, que criou o CEPMPL (Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade), a competência, material, para a emissão de mandados de desligamento/ligamento de condenado, pertence ao TEP (Tribunal da Execução das Penas), e não ao tribunal da condenação.»
11. Deste modo, a lei atribui exclusivamente ao Tribunal de Execução das penas a competência para acompanhar e fiscalizar a execução de medidas privativas da liberdade – cfr. nºs 2 e 4, al. t) do art. 138.º do CEPMPL,
12. Devendo, nos termos do art. 477.º, n.º 1 do C.P. Penal, ser observado tal prazo, o que ainda consultados os autos eletronicamente, não se verificou.
13. Consequentemente, a intervenção do Tribunal da Condenação cessa com o trânsito em julgado da Sentença/Acórdão que decretou a aplicação de uma pena privativa da liberdade.
14. Assim, a lei ao atribuir ao TEP a exclusiva competência para quaisquer atos relacionados com medidas privativas da liberdade, mandados de detenção ou libertação, sempre seria o TEP competente, in casu, o TEP ..., a quem caberia a emissão dos mandados de desligamento e ligamento, aqui em apreciação, e que resultaram na detenção, e subsequente “ordem de prisão”, ilegal e de incompetência absoluta, no âmbito material, do aqui Arguido.
OUTROSSIM, COM A DEVIDA VÉNIA, AINDA QUE ASSIM NÃO SE ENTENDA,
15. Sempre importará, referir que, foi interposto Recurso pelo Arguido, onde é suscitada uma causa de extinção da responsabilidade criminal, por efeito da prescrição do procedimento criminal,
16. Facto que, naturalmente, sempre impedirá que se possa considerar que qualquer a condenação sofrida pelo Arguido, nos presentes autos, tenha já transitado em julgado, e bem assim, possa o mesmo ser sujeito ao cumprimento de pena de prisão, como agora sucede,
17. Pois que, e ainda que o efeito de tal Recurso seja meramente devolutivo, não é menos verdade que, a nossa lei constitucional, consagra princípios fundamentais, no que respeita aos princípios da segurança jurídica inerente ao Estado de Direito (artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa), da mínima restrição dos direitos, liberdades e garantias (artigo 18.º n.º2 da Constituição da República Portuguesa) e da dignidade humana do condenado (artigos 1.º e 30.º n.º5 da Constituição da República Portuguesa),
18. Onde, sempre será de concluir que, não seja reconhecida, no caso concreto, a exequibilidade de uma decisão condenatória ainda que já transitada, em relação a uma pena de prisão, enquanto se puder verificar uma condição resolutiva do trânsito em julgado, pela eventual procedência da prescrição invocada à liberdade de circulação e de convivência social,
19. O que in casu sucede, e que, por razões de economia processual se remete para as demais motivações e conclusões do Recurso suprarreferido, já que, por observância e efeito da prescrição, encontramo-nos sobre uma questão de especial importância, que obsta à exequibilidade da decisão condenatória.
20. Pois, e claro está, o interesse constitucional subjacente ao caso julgado tem, necessariamente, de se conjugar com princípios e valores constitucionais de natureza diversa, mormente, por um lado, o direito à liberdade do arguido e, por outro, à pretensão punitiva do Estado, e atender às várias soluções plausíveis de direito,
21 Pelo que, a prescrição do procedimento criminal de dois dos crimes –falsificação ou contrafação de documento e aproveitamento de obra contrafeita ou usurpada – em apreço, deverá ser previamente debatida e considerada, pois é de conhecimento oficioso,
22 Até porque, à data da apresentação em juízo, a decisão condenatória não se encontrava ainda, e de forma sólida, transitada em julgado,
23. Pois, o próprio e eventual trânsito em julgado de uma decisão, não pressupõe que a mesma seja em absoluto imutável,
24. Onde, e nas palavras do Egrégio Supremo Tribunal de Justiça, «(…) a figura do trânsito em julgado, com cariz provisório, resolúvel, instável, nomeadamente por uso condenável do processo na fase de recurso [o que não se verifica neste caso concreto], sendo ainda manifestações dessa provisoriedade as causas legais de revogação do perdão declarado em leis da amnistia, da suspensão da execução da pena, a aplicabilidade da lei mais favorável em caso de sucessão de leis penais, a extensão dos efeitos do recurso ao comparticipante, não recorrente, desde que aquele se não funde em razões meramente pessoais, etc...» – vide, Acórdão de 11/08/2006, proferido no âmbito do Proc. n.º 06P3077, e disponível em www.dgsi.pt.
25. Assim, consideramos, que jamais se poderá afirmar que estamos na “fase” do cumprimento da pena, pois, enquanto a decisão da prescrição do procedimento criminal dos crimes em apreço não estiver definitivamente decidida, nunca poderia ter sido o Arguido conduzido para o cumprimento de uma pena de prisão efetiva,
26. Pelo que, deverá V. Exa. declarar a ilegalidade da prisão aplicada ao Arguido, e em consequência, ordenar a sua imediata libertação, nos termos do art. 31.º, n.º 3 da CRP e dos arts. 222º e 223.º, n.º 4, al. d) do C.P. Penal, ainda que entenda sujeitar o mesmo, à medida de coação de obrigação de permanência na habitação em que se encontrava anteriormente, até findar a apreciação da questão suscitada.
Nestes termos e nos melhores de Direito, sempre deverá ser deferida a requerida providência de habeas corpus, declarando-se ilegal a prisão do Arguido, por verificação de uma incompetência absoluta e de âmbito material, quanto à competência para a prática de atos relacionados com medidas privativas da liberdade, mandados de detenção e/ou libertação, por violação dos arts. 470.º, n.º 1 e 477.º, n.º 1 do C.P. Penal e art. 138.º, n.ºs 2 e 4, al. t) do CEPMPL; e ainda que assim não se entenda, deverá ser declarada a prisão aplicada, pelo facto de a decisão condenatória não se encontrar transitada em julgado, por efeitos da prescrição do procedimento criminal, o que obsta à exequibilidade e cumprimento de pena (arts. 1.º, 2.º, 18.º, n.º 2 e 30.º, n.º 5 da CRP), sempre devendo V. Exa., ordenar a imediata libertação do Arguido, ainda que sujeita à medida de coação de obrigação de permanência na habitação.
REQUER-SE a V. Exa., seja a presente providência, depois de admitida, instruída com os elementos processuais tidos por necessários, designadamente, cópia do acórdão condenatório proferido nos autos a fls…; do Recurso interposto pelo Arguido sobre a verificação de prescrição do procedimento criminal com a Ref.ª ...04, do despacho de admissão do Recurso Ref.ª ...87; e, bem assim, dos mandados de detenção Refs.ª ...58 e ...95, de fls… dos autos, e de condução com a Ref.ª ...07, de fls… dos autos.

2. Foi prestada a informação de acordo com o disposto no art. 223.º/1, CPP, nos seguintes termos (transcrição):
«Por acórdão proferido nos presentes autos, transitado em julgado no pretérito dia 12.05.2022, foi o arguido AA condenado, para além do mais, na pena (única) de 6 (seis) anos de prisão;
- Por requerimento datado de 08.06.2022, veio o arguido/condenado requerer que seja “…declarado extinto, por prescrição, o procedimento criminal relativamente aos crimes de falsificação ou contrafação de documento e de aproveitamento de obra contrafeita ou usurpada”, bem como, e em consequência dessa decisão, a realização “de novo cúmulo jurídico das restantes penas parcelares (aplicadas aos crimes de burla qualificada), o que determinará que seja proferido novo acórdão, fixando uma nova pena única e onde terá de se ponderar, além do mais, a possibilidade de suspensão desta nova pena” (cfr. Fls. 4144 a 4146);
- Por despacho datado de 17.06.2022, e com os fundamentos aí aduzidos, foi indeferido o requerido pelo arguido/condenado, tendo ainda sido determinada a emissão de mandados de detenção e condução do arguido ao estabelecimento prisional, para cumprimento da aludida pena (cfr. fls. 4149 a 4150);
- Não se conformando com o aí decidido, foi interposto recurso pelo arguido/condenado, com os fundamentos constantes do requerimento de fls. 4153 a 4169;
- Por despacho datado de 07.07.2022, foi admitido o mencionado recurso, a subir imediatamente, em separado e com efeito meramente devolutivo (cfr. fls. 4174), tendo o respectivo apenso sido remetido ao Venerando Tribunal da Relação de Lisboa no pretérito dia 07.09.2022 (cfr. apenso F);
- Na sequência da informação prestada pelo DIAP ... Secção de ..., dando conta de que o arguido/condenado se encontrava sujeito à medida de coacção de obrigação de permanência na habitação, no âmbito do inquérito n.º 2099/18.... (ref.ª citius n.ºs. ... e ...23), foi proferido despacho, solicitando o ligamento do mesmo aos presentes autos (cfr. fls. 4180 e 4181);
- Em execução do mandado emitido pelo JIC, do Juízo de Instrução Criminal ... (J...), no âmbito do referido inquérito, foi o arguido/condenado “ligado” aos presentes autos no passado dia 06.10.2022 (cfr. fls. 4185 verso);
- Por despacho datado de 13.10.2022, foi homologada a liquidação da pena efectuada pelo Ministério Público, com os marcos constantes de fls. 4189 (cfr. 4190).
Pelo exposto, é nosso entendimento de que não existem nos autos quaisquer factos que permitam concluir por uma situação de detenção ou prisão ilegal do arguido, na sequência da condenação sofrida, não se vislumbrando qualquer incompetência do Tribunal, nem qualquer outra circunstância impeditiva da imediata execução da pena de prisão aplicada.
3. Convocada a secção criminal e notificados o MP e o defensor, realizou-se a audiência (arts. 11.º/4/c, 223.º/2/ 3, e 435.º, CPP).
II
1. Questão a decidir: a legalidade da manutenção da detenção do requerente.
2. O circunstancialismo factual relevante para o julgamento resulta da petição de habeas corpus, da informação e da certidão que o acompanha e é o seguinte:
2.1. Por acórdão transitado em julgado no dia 12.05.2022 (após recursos para o TRL e TC que lhe negaram provimento), o arguido AA foi condenado na pena (única) de 6 (seis) anos de prisão;
2.2. Por requerimento de 08.06.2022, o condenado requereu que seja “…declarado extinto, por prescrição, o procedimento criminal relativamente aos crimes de falsificação ou contrafação de documento e de aproveitamento de obra contrafeita ou usurpada”, bem como, e em consequência dessa decisão, a realização “de novo cúmulo jurídico das restantes penas parcelares (aplicadas aos crimes de burla qualificada), o que determinará que seja proferido novo acórdão, fixando uma nova pena única e onde terá de se ponderar, além do mais, a possibilidade de suspensão desta nova pena” (cfr. Fls. 4144 a 4146);
2.3. Por despacho de 17.06.2022, foi indeferido o requerido pelo condenado, foi determinada a emissão de mandados de detenção e condução do arguido ao estabelecimento prisional, para cumprimento da aludida pena (cfr. fls. 4149 a 4150);
2.4. Inconformado com o decidido no despacho de 17.06.2022, o condenado interpôs recurso;
2.5. Por despacho datado de 07.07.2022, foi admitido o mencionado recurso, a subir imediatamente, em separado e com efeito meramente devolutivo (cfr. fls. 4174), tendo o apenso sido remetido ao Tribunal da Relação de Lisboa no dia 07.09.2022 (cfr. apenso F);
2.6. O condenado iniciou o cumprimento da pena de prisão no dia 06.10.2022. O meio da pena será a 06/10/2025; Os dois terços da pena a 06/10/2026; Os cinco sextos da pena a 06/10/2027; O termo da pena ocorrerá a 06/10/2028.

*
3. O habeas corpus é um meio, procedimento, de afirmação e garantia do direito à liberdade (arts. 27.º e 31.º, CRP), uma providência expedita e excecional – a decidir no prazo de oito dias em audiência contraditória, art. 31.º/3, CRP – para fazer cessar privações da liberdade ilegais, isto é, não fundadas na lei, sendo a ilegalidade da prisão verificável a partir dos factos documentados no processo.
4. Enquanto nas palavras do legislador do Decreto-lei n.º 35 043, de 20 de outubro de 1945, «o habeas corpus é um remédio excepcional para proteger a liberdade individual nos casos em que não haja qualquer outro meio legal de fazer cessar a ofensa ilegítima dessa liberdade», hoje, e mais nitidamente após as alterações de 2007, com o acrescento do n.º 2 ao art. 219.º, CPP, o instituto não deixou de ser um remédio excecional, mas coexiste com os meios judiciais comuns, nomeadamente com o recurso.
5. Quanto ao pedido de habeas corpus por prisão ilegal, na parte aqui relevante, dispõe o art. 222.º CPP:
«1 - A qualquer pessoa que se encontrar ilegalmente presa o Supremo Tribunal de Justiça concede, sob petição, a providência de habeas corpus.
2 - A petição é formulada pelo preso (…) e deve fundar-se em ilegalidade da prisão proveniente de:
(…)

a) Ter sido efectuada ou ordenada por entidade incompetente;

b) Ser motivada por facto pelo qual a lei a não permite;».

6. A liberdade é a regra, pelo que ninguém pode ser total ou parcialmente privado da liberdade, a não ser em consequência de sentença judicial condenatória pela prática de ato punido por lei com pena de prisão. Foi o que ocorreu no caso realçando-se que tal decisão, depois de esgotados os recursos admissíveis transitou em julgado e tem força executiva (art. 467.º/1, CPP). Está assim o condenado no início do cumprimento de pena aplicada pelo tribunal competente.

7. Sustenta o requerente que se está perante uma «incompetência de carater material», que há «um conflito de competência material, de cariz negativo, entre as competências do tribunal de julgamento e o TEP…». Abreviando razões, há alguma confusão, por parte do requerente, pois no caso não há conflito de competência algum, menos ainda negativo… e o acórdão citado pelo recorrente, não é de uma situação simétrica à dos autos, e, no tema que trata, representa(va) uma corrente minoritária no TRC, entretanto, ultrapassada (cf. acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra de 11.10.2017; 18.10.2017; 29.11.2017 e 21.02.2018, disponíveis em www.dgsi.pt).

8. De qualquer modo, como é jurisprudência deste tribunal, a “norma da al. a) do n.º 1 do art. 222.º do CPP não tem em vista a incompetência funcional, apenas havendo incompetência se a entidade que efetuou ou ordenou a prisão não tem o estatuto requerido para ordenar a prisão, ou seja, não tem o estatuto de juiz, com competência em matéria criminal”, razão pelo qual a “questão da competência para a emissão de mandados de detenção destinados ao início da execução da pena de prisão aplicada por decisão transitada em julgado, se do tribunal da condenação, se do TEP”, não se subsume na dita alínea, tratando-se de vicissitude processual que extravasa o âmbito do habeas corpus, (ac. STJ, 06.02.2019, www.dgsi.pt e Tiago Caiado Milheiro, CJCPP, Tomo III, § 24 do comentário ao art. 222.º).

9. Assim, não é ilegal a prisão do condenado, porque ordenada pelo juiz competente, para cumprimento de pena de prisão exequível, porque transitada em julgado e aplicada pelo tribunal competente.

10. O incidente desencadeado pelo condenado após o transito em julgado, concretamente o recurso do despacho que decidiu que não se verificava a prescrição do procedimento criminal por si invocada, após o transito em julgado da última decisão do TC, não tem o condão, porque admitido com efeito meramente devolutivo, de obstar à execução da pena de prisão. Transitada em julgado a decisão, está fechada a porta da prescrição do procedimento criminal, abrindo-se outra porta, num outro patamar, da prescrição da pena de prisão aplicada, prazo que ainda não transcorreu. Em conclusão não se escoou o tempo de prisão aplicada, nem prescreveu a pena de prisão aplicada, pelo que não há obstáculo a que se continue a execução da pena de prisão, correta e justamente ordenada.

Decisão
Indefere-se a providência de habeas corpus por absoluta falta de fundamento legal.
Custas pelo requerente, com taxa de justiça que se fixa em cinco UC – n.º 9 do artigo 8.º do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III a ele anexa.

Supremo Tribunal de Justiça, 20.10.2022.

António Gama (Relator)
João Guerra
Orlando Gonçalves
Eduardo Loureiro (Presidente)