Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
170/11.2TVPRT.P2.S1
Nº Convencional: 2.ª SECÇÃO
Relator: MARIA DA GRAÇA TRIGO
Descritores: INTERMEDIAÇÃO FINANCEIRA
INTERMEDIÁRIO FINANCEIRO
DEVERES
MANDATO
VALORES MOBILIÁRIOS
REGIME APLICÁVEL
ATO DE FUNCIONÁRIO
DOLO
NEXO DE CAUSALIDADE
FACTO ILÍCITO
DANO
Data do Acordão: 10/12/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Sumário :
I. De acordo com a factualidade provada, para além da relação de clientela bancária existente entre a autora e o banco réu, o segundo encontrava-se mandatado para realizar alguns investimentos financeiros por conta da primeira; não sendo esta relação enquadrável em qualquer dos contratos de intermediação financeira tipificados, entende-se serem-lhe aplicáveis as regras gerais de tais contratos previstas no CVM, assim como, subsidiariamente, o regime dos arts. 1157.º e segs. do CC.

II. O respeito pelo interesse do cliente mandante, tal como configurado pelo próprio, constitui o eixo em torno do qual se desenvolvem todos os deveres do intermediário financeiro, pelo que, tendo ficado provado que o funcionário do banco réu, mediante conduta imputável à esfera jurídica deste último, actuou intencional e conscientemente em desrespeito por aquele que sabia ser a vontade da cliente autora fica cabalmente demonstrada a violação dos princípios normativos consagrados no citado art. 304.º, n.ºs 1 e 3, do CVM.

III. Quanto à prova do nexo de causalidade entre o facto ilícito e o dano encontra-se cabalmente feita ao dar-se como provado que o funcionário do banco tinha conhecimento de que se a autora soubesse que a aplicação proposta tinha risco superior ao de um depósito a prazo ou dos fundos que possuía, recusaria tal aplicação.

Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça


I - Relatório

1. AA instaurou a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra BPN – Banco Português de Negócios, S.A., BPN – SGPS, S.A., SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A., PLEIADE – Investimentos e Participações, SGPS, S.A., e CNE – Cimentos Nacionais e Estrangeiros, S.A., alegando, no essencial, o seguinte: que, por conselho de BB, funcionário do BPN, que já antes conhecia por ter sido funcionário de outro banco de que os seus pais eram clientes, aceitou abrir contas à ordem no referido Banco, para onde transferiu parte do seu dinheiro, passando, desde então, o referido funcionário a deslocar-se a casa dos pais da A., onde esta residia, para recolher assinaturas, levantar dinheiro para depósito e dar conta dos investimentos feitos. Dada a confiança que nele depositavam os pais da A. e os anos de relação bancária que tiveram, por intermédio do mesmo funcionário, neste e noutro banco, a mesma A., tal como tinham feito os seus pais, investiu algumas das suas poupanças num fundo imobiliário que o referido funcionário recomendou e que sempre se revelou rentável e seguro, até que, em 2008, sem que a A. o tivesse ordenado ou disso sabido antecipadamente, o dito funcionário resgatou a maior parte das unidades de participação que a A. tinha no fundo imobiliário e comprou papel comercial da CNE no valor de €150.000,00 em nome daquela. Alega que só posteriormente o referido funcionário lhe comunicou tais operações dizendo tratar-se de um produto novo do BPN, sem qualquer risco no reembolso do capital e no pagamento dos juros, que se venceria em 22.02.2009. Após as notícias da nacionalização do Banco BPN, a A., tal como os seus pais, questionou o funcionário em causa sobre o risco de não reembolso do capital investido, tendo todos sido tranquilizados que estava garantido pelo banco o pagamento do capital e dos juros como se de um depósito a prazo se tratasse. Alega que, aquando do vencimento, em 22.02.2009, o Banco nada lhe creditou, até 26 de Fevereiro e 4 de Maio desse ano, em que, respectivamente, pagou €3.413,36 e €3.408,00, nada mais tendo sido pago até hoje.

Alega ainda que é investidora não qualificada, que não foi devidamente informada sobre os produtos subscritos pelo Banco, que este sempre soube que preferia investimentos seguros do tipo de depósitos a prazo e que o investimento feito foi de risco e sem o seu prévio aconselhamento e até autorização. Invoca as relações de domínio/grupo entre as várias RR. para justificar a sua demanda conjunta e o prévio conhecimento, por parte de todas, do risco inerente ao papel comercial CNE, dada a situação desta empresa do grupo que apenas internamente era conhecida.

Peticiona o pagamento dos valores que lhe deviam ter sido creditados em 22.02.2009 acrescidos de juros vencidos, no total de €163.654,26.

Devidamente citadas, todas as RR. contestaram, impugnando os factos alegados pela A..

2. Por força de sucessivas declarações de insolvência das RR., SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A., PLEIADE – Investimentos e Participações, SGPS, S.A., e CNE – Cimentos Nacionais e Estrangeiros, S.A., e da desistência do pedido quanto à R. BPN SGPS, S.A., os autos prosseguiram para julgamento apenas contra o Banco BIC Português, S.A., sucessor do BPN, S.A., o qual se defendeu, alegando, em suma, que a A. não era uma investidora leiga, que a sua relação (tal como a dos seus pais) com o funcionário bancário que adquiriu em seu nome papel comercial CNE era de amizade, sendo esta proximidade que justificava que fosse ele a decidir as melhores aplicações para o dinheiro que a A. depositara no banco, respeitando o seu perfil de investidora, tendo autorização desta para proceder às compras/operações que tivesse por boas sem a consultar previamente.

Acrescentou que, à data da aquisição do papel comercial CNE, este era um investimento seguro, nada fazendo prever o não reembolso do capital que decorreu de circunstância superveniente e imprevisível, a saber, a forma de nacionalização do Banco. Finalmente, alegou que o Banco R., através do dito funcionário, transmitiu à A. todas as informações relevantes sobre o produto em causa.

3. Foi proferida sentença com a seguinte decisão:

«Nestes termos julga-se a acção parcialmente provada e parcialmente procedente e, em consequência:

1 – Condeno o Réu a pagar aa Autora a quantia de 150 000 € a que acrescem juros vencido[s] e vincendos, à taxa legal, desde 17-02-2011 e até efectivo e integral pagamento.

2 – Absolvo o Réu do demais pedido.».

4. Inconformado com a decisão, o R. BIC, S.A. interpôs recurso para o Tribunal da Relação do Porto, pedindo a alteração da decisão relativa à matéria de facto e a reapreciação da decisão de direito.

Veio a ser proferido acórdão que julgou o recurso improcedente, confirmando a decisão recorrida.

5. Novamente inconformado, veio o R. BIC, S.A. interpor recurso de revista, por via excepcional, para o Supremo Tribunal de Justiça, o qual foi admitido por acórdão da Formação prevista no n.º 3 do art. 672.º do Código de Processo Civil.

6. Por despacho do relator de 15.03.2021 foi exarado o seguinte:

«A revista tem por objeto questões que têm a ver com a jurisprudência que virá a ser fixada no âmbito do processo de uniformização de jurisprudência nº 1479/16.4T8LRA.C2.S1-A – onde, na sequência de mudança de Relator, se aguarda a designação de data para a continuação do respetivo Plenário.

Assim, há todo o interesse em que se aguarde pela jurisprudência que ali vier a ser fixada.

Nestes termos, e ao abrigo do disposto nos artigos 296º, nº 1. al. c) e 272º, nº 1 do CPC, determino a suspensão da instância até que seja proferido acórdão uniformizador naquele processo.».

7. Entretanto, tendo o processo sido redistribuído à presente relatora, por jubilação do primitivo relator, em 13.04.2021, foi proferido despacho a manter a suspensão da instância.

8. Posteriormente, no Processo n.º 1479/16.4T8LRA.C2.S1-A, foi proferido Acórdão de Uniformização de Jurisprudência, transitado em julgado em 19.09.2022, e publicado no Diário da República, Iª Série, de 03.11.2022, pelo qual se uniformizou jurisprudência nos seguintes termos:

«1. No âmbito da responsabilidade civil pré-contratual ou contratual do intermediário financeiro, nos termos dos artigos 7.º, nº 1, 312º nº 1, alínea a), e 314º do Código dos Valores Mobiliários, na redação anterior à introduzida pelo Decreto-Lei n.º 357-A/2007, de 31 de outubro, e 342.º, nº 1, do Código Civil, incumbe ao investidor, mesmo quando seja não qualificado, o ónus de provar a violação pelo intermediário financeiro dos deveres de informação que a este são legalmente impostos e o nexo de causalidade entre a violação do dever de informação e o dano.

2. Se o Banco, intermediário financeiro – que sugeriu a subscrição de obrigações subordinadas pelo prazo de maturidade de 10 anos a um cliente que não tinha conhecimentos para avaliar o risco daquele produto financeiro nem pretendia aplicar o seu dinheiro em “produtos de risco” – informou apenas o cliente, relativamente ao risco do produto, que o “reembolso do capital era garantido (porquanto não era produto de risco”), sem outras explicações, nomeadamente, o que eram obrigações subordinadas, não cumpre o dever de informação aludido no artigo 7.º, n.º1, do CVM.

3. O nexo de causalidade deve ser determinado com base na falta ou inexatidão, imputável ao intermediário financeiro, da informação necessária para a decisão de investir.

4. Para estabelecer o nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação, por parte do intermediário financeiro, e o dano decorrente da decisão de investir, incumbe ao investidor provar que a prestação da informação devida o levaria a não tomar a decisão de investir.».

9. Em 05.12.2022, foi proferido despacho da relatora, no qual, para o que ora importa, se exarou o seguinte:

«2. Como resulta do n.º 1 do respectivo n.º 1, a decisão uniformizadora supra transcrita reporta-se ao regime do Código dos Valores Mobiliários, na redacção anterior à introduzida pelo Decreto-Lei n.º 357-A/2007, de 31 de Outubro.

Ora, nos presentes autos, a subscrição do produto financeiro teve lugar no ano 2008, em data posterior, portanto, à data da entrada em vigor (1 de Novembro de 2007) da reforma do Código dos Valores Mobiliários realizada pelo referido Decreto-Lei n.º 357-A/2007, de 31 de Outubro, conforme previsto no art. 21.º deste diploma legal. Razão pela qual o AUJ proferido no Processo n.º 1479/16.4T8LRA.C2.S1-A não permite, por si só, resolver plenamente as questões objecto do recurso de revista dos presentes autos.

Verificando-se que se encontra pendente recurso para uniformização de jurisprudência a ser proferido no Processo n.º 6295/16.0T8LSB.L1.S1-A, no qual os produtos financeiros em causa foram, em parte, subscritos após ter entrado em vigor a referida reforma do Código de Valores Mobiliários, a apreciação do objecto do presente recurso de revista está dependente da decisão que o Pleno das Secções Cíveis do Supremo Tribunal de Justiça vier a proferir no recurso extraordinário para uniformização de jurisprudência admitido em tal Processo.

3. Pelo exposto, ao abrigo do disposto no art. 272.º, nº 1, do Código de Processo Civil, mantém-se a suspensão da instância até que o recurso para uniformização de jurisprudência admitido nos autos do Processo n.º 6295/16.0T8LSB.L1.S1-A seja julgado.».

10. Entretanto, no Processo n.º 6295/16.0T8LSB.L1.S1-A, veio a ser proferido Acórdão do Pleno das Secções Cíveis deste Supremo Tribunal, que transitou em julgado em 01.06.2023, pelo qual se decidiu:

«Termos em que, confirmando o teor da decisão singular do Juiz Conselheiro relator proferida em 2 de janeiro de 2023, decidem em conferência, ao abrigo do disposto no artigo 277.º alínea e) do Código de Processo Civil, por impossibilidade e/ou inutilidade superveniente da lide recursória, julgar extinta a instância e ordenar o oportuno arquivamento dos autos».

11. Declarada cessada a suspensão da instância, cumpre apreciar e decidir o recurso de revista, tendo em conta as conclusões recursórias formuladas pelo R. Recorrente:

«1. O douto acórdão recorrido ignorou de todo a matéria factual que havia sido objecto de confissão judicial por parte da autora, dando-a como não provada.

2. Tal matéria foi inclusivamente levada à acta da audiência de discussão e julgamento, através de “assentada” ditada pela Mma Juíza de primeira instância.

3. Existe clara e manifesta omissão, no âmbito da decisão relativa à matéria de facto, ao teor do depoimento prestado nos autos pela autora, e que motivou que fosse lavrada “assentada” do teor seguinte:

“A autora admitiu que dentro dos parâmetros antes verbalmente estabelecidos com o funcionário BB, ou seja, que só deveria investir quando tal investimento assegurasse quer o capital, quer os juros, e era indiferente que o referido BB falasse consigo antes ou depois da aplicação.

4. Tal matéria não pode deixar de ser dada como provada, e de enquadrar toda a demais matéria factual que respeite aos moldes como se desenvolveu o tipo de relacionamento entre a autora e o banco apelante.

5. Já que se trata de matéria que foi objecto de confissão judicial em depoimento de parte prestado na audiência de discussão e julgamento, e como tal tem força probatória plena.

6. Tal consequência é resultado de norma do art. 356º nº 2 do CCivil, sendo assim norma de direito probatório material, cuja violação pode e dever ser objecto de recurso de revista.

7. O banco aqui recorrente descreveu detalhadamente as razões da sua discordância relativa à decisão sobre a matéria de facto proferida em primeira instância, citando concretamente a factualidade que, em sua opinião, deveria ter sido decidida em sentido diferente, transcrevendo as partes relevantes dos vários depoimentos prestados, e salientando as razões do seu entendimento sobre a existência de erro de julgamento sobre a matéria de facto.

8. Sobre os pontos concretos da divergência do recorrente relativamente à decisão da matéria de facto, nenhuma apreciação crítica, comentário ou juízo é formulado sobre os argumentos fáticos e probatórios invocados na alegação do recurso de apelação.

9. O tribunal recorrido não procede à análise dos depoimentos transcritos e que suportam a pretensão do banco de ver alterada a decisão relativa à matéria de facto, sendo totalmente omisso sobre as razões pelas quais decidiu implicitamente não lhes conferir qualquer credibilidade

10. Tal verifica-se relativamente aos factos dados por provados nos nºs 32, 33, 34, 37, 38, 51, 53, 65, 69, 71, 77, 78, 79 e 80, sendo certo que essa falta de fundamentação integra, indiscutivelmente, nulidade processual com a consequência da anulação do repectivo julgamento.

11. O douto acórdão recorrido ignorou de todo o alegado pelo banco recorrente quanto à matéria dada por provada no nº 92, sugerindo mesmo uma diferente redacção para tal item da decisão sobre a matéria de facto.

12. Também aqui o douto acórdão recorrido não se pronunciou de todo sobre tal matéria, o que integra uma outra nulidade processual com consequências no julgamento realizado, que deverá ser anulado.

13. Tomando em consideração as alterações à matéria de facto por que o banco recorrente pugnou, a relação entre a autora e o banco recorrente, por via do seu funcionário BB, deverá ser encarada e enquadrada como de gestão discricionária de carteira.

14. Figura esta perfeitamente compatível com a definição de um perfil conservador para a autora, e dando como certa a delegação de poder ao referido funcionário, e a autonomia que ele disfrutava na actuação por conta e no interesse dela.

15. E se assim não se entender, sempre deverá ter-se a relação entre a autora e o dito funcionário do banco apelante como configurando um contrato de mandato, através do qual os autores concederam poderes ao funcionário em causa para actuar, gerir e rentabilizar as suas poupanças.

16. Sempre condicionado tal mandato ao respeito por critérios e princípios préviamente definidos pela autora, assentes fundamentalmente numa desejada melhor rentabilidade, e com garantias de segurança das respectivas aplicações.

17. Tanto assim era que, ao longo dos anos, o dito funcionário sempre selecionava as aplicações a fazer e os produtos a adquirir ou a alienar, e sem que se sentisse obrigado a obter prévia autorização da parte da mandante sua cliente.

18. Não estava, assim, o banco recorrente, através do seu funcionário, obrigado a dar previamente informações relativas aos produtos financeiros que adquiria para a autora, e designadamente ao Papel Comercial CNE que adquiriu em Fevereiro 2008.

19. Estava, sim, obrigado a respeitar e observar nessas aquisições aquilo que sabia ser, como investidor não qualificado, o perfil conservador da autora, que privilegiava produtos de boa rentabilidade e com segurança.

20. A autora recebia regularmente extractos da parte do banco, e dos quais constava expressamente o Papel Comercial CNE a partir do momento em que foi adquirido para a sua carteira.

21. A autora nada disse ou sequer questionou o banco recorrente sobre aquele produto financeiro ao longo de todo o ano de 2008, até à nacionalização do então BPN em Novembro de 2008.

22. E nessa altura, à imagem de praticamente todos os clientes do banco, as suas dúvidas não eram exclusivas deste produto aqui em causa, mas sim de todas as poupanças que ali detinha.

23. A autora, como mandante, ao nada dizer ao banco seu mandatário sobre o produto aqui em causa, ratificou a operação da sua aquisição, nos termos do disposto no art. 240º do CComercial e art. 1163º do CCivil.

24. Para o caso, que por mera hipótese se admite, de ser entendido que a relação entre o banco recorrente e a autora se deverá qualificar como de intermediação financeira, para recepção, transmissão e execução de ordens por conta do investidor, não estava então o banco recorrente obrigado a dar qualquer informação específica sobre qualquer risco inerente ao produto Papel Comercial.

25. Já que tal produto não tinha senão os riscos inerentes a uma característica do dito produto, e designadamente a garantia do reembolso do capital ao investidor, para além da rentabilidade anunciada.

26. Garantia essa que era da exclusiva responsabilidade da entidade emitente.

27. No que toca à informação relativa aos instrumentos financeiros, o intermediário financeiro – aqui o banco recorrente – estava obrigado apenas a informar a autora sobre os riscos associados ao tipo de instrumento financeiro em causa, e não já o risco associado à entidade dele emitente (art. 312-E nº 1 do CVM).

28. E não estava seguramente obrigado a informar a autora sobre a situação económica e financeira dessa entidade emitente e, logicamente, do maior ou menor risco de ela vir a insolver.

29. Esse não é um risco inerente ao produto financeiro em causa, mas sim, e tão só, um risco geral e comum a todo o tráfico jurídico-mercantil, para o qual não há em nenhuma actividade o dever de alertar o consumidor.

30. Em Fevereiro de 2008, data em que o funcionário do banco recorrente adquiriu para a autora o Papel Comercial CNE aqui em causa, este produto não tinha qualquer risco a ele associado, e era tido como um produto seguro.

31. E tal situação não perde validade nem deixa de ser verdadeira pelo facto de, um ano depois, a entidade emitente se ver na impossibilidade de liquidar o capital investido, e vir a ser declarada insolvente.

32. O banco recorrente não incumpriu o contrato de intermediação financeira que possa ter celebrado com a autora, nem violou qualquer dever de informação que por via de tal contrato lhe devesse ter prestado.

33. E ainda que tivesse incumprido tal contrato, esse incumprimento não seria, por si só, suficiente para que a autora pudesse reclamar do banco qualquer indemnização, já que sempre faltaria saber da existência do nexo de causalidade entre o facto e o dano invocado.

34. Ou seja, seria necessário ainda que a autora tivesse alegado e logrado provar que, caso “a informação em falta” tivesse sido prestada, ela não teria querido adquirir o produto que está aqui em causa.

35. Como requisito indispensável à existência de um direito de indemnização derivado da responsabilidade civil, era sobre a autora que recaía o ónus de alegação e prova desse nexo de causalidade.

36. E caso estivesse em falta com o dever de prestar informação à autora, e essa omissão fosse por si só relevante à existência do direito dela autora a ser indemnizada, a verdade é que existia no relacionamento entre o banco e a autora uma prática, assente na confiança que tinham no funcionário do banco, e que o dispensava de préviamente informar e obter autorização para as operações que em nome e por conta da autora sempre fizera.

41. Pretender agora, que se sabe que a entidade emitente não está em condições de liquidar o capital investido no dito Papel Comercial CNE, obter esse pagamento invocando uma omissão que era uma prática habitual na relação existente, será seguramente um comportamento que configura abuso de direito na modalidade de verine contra factum proprium

42. A douta sentença recorrida violou, por errada interpretação e aplicação, as disposições legais dos arts. 356º nº 2, 1157º, 1161º al. a), 1163º, 563º, 342 nº 1 e 334º, todos do CCivil, 231º, 233º e 240º do CComercial, 312º nº 1 al. e), 312-E nºs1 e 2 al. a) do CVM, e ainda 607º nº 4, por remissão do art.663º nº 2, e 647º nº 3 in fine, todos do CPC.».

Termina pedindo que o recurso seja julgado procedente, revogando-se o acórdão recorrido.

12. A Recorrida contra-alegou, pugnando, sem formular conclusões, pela manutenção da decisão do acórdão recorrido.

II – Objecto do recurso

Tendo em conta o disposto no n.º 4 do art. 635.º do Código de Processo Civil, o objecto do recurso delimita-se pelas respectivas conclusões, sem prejuízo da apreciação das questões de conhecimento oficioso.

Assim, o presente recurso tem como objecto as seguintes questões:

• Erro da decisão de facto do acórdão recorrido ao não dar como existente a confissão judicial da A.;

• Desrespeito pelo dever de fundamentação na apreciação da impugnação dos factos 32, 33, 34, 37, 38, 51, 53, 65, 69, 71, 77, 78, 79 e 80:

• Desrespeito pelo dever de apreciar a impugnação do facto 92;

• Com as alterações da matéria de facto propugnadas, erro de direito ao não qualificar o contrato dos autos gestão discricionária de carteira ou como contrato de mandato; devendo, consequentemente, reconhecer-se que o banco réu não estava obrigado a dar informações prévias à A. sobre os produtos financeiros, tendo a mesma A. ratificado tacitamente todos os investimentos;

• Subsidiariamente, para o caso de se manter a qualificação como contrato de intermediação financeira, falta de prova dos pressupostos da responsabilidade civil do intermediário financeiro: ilicitude por violação dos deveres de informação e nexo de causalidade entre o facto ilícito e o dano;

• Subsidiariamente, e dada a prática reiterada existente entre as partes de dispensar informações prévias à realização dos investimentos: abuso do direito ao vir a A. invocar a violação do dever de informação.

III – Fundamentação de facto

Factos dados como provados:

A. A Ré BPN – Banco Português de Negócios, SA encontra-se inscrita na Conservatória do Registo Comercial sob o nº de matrícula ... ... .93 desde 31-05-1993, tendo por objecto o “exercício de actividades consentidas por lei aos bancos”.

B. Em 31-05-1993 foi inscrita na Conservatória do Registo Comercial a nomeação de CC como presidente do Conselho de administração da Ré BPN – Banco Português de Negócios, SA.

C. Em 07-04-2008 foi inscrita na Conservatória do Registo Comercial a renúncia de CC ao cargo de Presidente do Conselho de administração da Ré BPN – Banco Português de Negócios, SA.

D. Em 07-12-2012 foi inscrita na Conservatória do Registo Comercial a fusão da Ré BPN – Banco Português de Negócios, SA na modalidade de transferência global do património, com o Banco BIC Português, SA.

E. Até 12 de Novembro de 2008, a totalidade das acções representativas do capital social da Ré BPN – Banco Português de Negócios, SA era propriedade da BPN – SGPS – SA.

F. A Ré “BPN SGPS, SA” encontra-se inscrita na Conservatória do Registo Comercial sob o nº de matrícula 50468769 desde 18-11-1999, tendo por objecto o “as actividades legalmente consentidas às sociedades gestoras de participações, nomeadamente a gestão de participações sociais noutras sociedades como forma indirecta do exercício do exercício de actividades económicas e a prestação de serviços técnicos de administração e gestão à sociedades suas participadas”.

G. Em 10-03-2003 foi inscrita na Conservatória do Registo Comercial a nomeação de CC como presidente do Conselho de administração da Ré BPN – Banco Português de Negócios, SA.

H. Em 20-06-2008 foi inscrita na Conservatória do Registo Comercial a renúncia de CC ao cargo de Presidente do Conselho de administração da Ré BPN – Banco Português de Negócios, SA.

I. A totalidade do capital social da Ré “BPN SGPS, SA” pertence, desde a sua constituição, à 3ª Ré “SLN – Sociedade Lusa de Negócios, Sgps, SA”.

J. A totalidade do capital social da Ré Plêiade – Investimentos e Participações, SGPS, SA pertence, desde a sua constituição, à 3ª Ré “SLN – Sociedade Lusa de Negócios, Sgps, SA”.

K. A SLN, Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, SA encontra-se matriculada na Conservatória do Registo Comercial como tendo por objecto a “gestão de participações sociais noutras sociedades como forma indirecta do exercício da actividade económica”.

L. Em ...-02-2008 CC renunciou ao cargo de Presidente do Conselho de administração da Ré SLN, Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, SA.

M. A CNE – Cimentos Nacionais e Estrangeiros, SA encontra-se inscrita na Conservatória do Registo Comercial sob o número de matrícula 50380374, desde 13-07-1997, tendo por objecto “Importação, produção, comercialização e distribuição de cimento e seus derivados.

N. Em 17-05-2002 foi inscrita a “aquisição de acções tendente ao domínio total” da “CNE” passando a constar a identificação da Partinvest, SGPS, SA como “Sociedade Dominante” na respectiva certidão de registo comercial.

O. Por contrato escrito datado de 12-05-2003 e cujo teor é o de fls. 142 e 143 a Partinvest, SGPS, SA declarou, entre o mais ali constante e aqui se dá por reproduzido, vender à Plêiade, - Investimentos e Participações, SGPS, SA, 5 000 000 de acções com o valor nominal de 1 € cada, representativas da totalidade do capital social da CNE -Cimentos Nacionais e Estrangeiros, SA.

P. A CNE – Cimentos Nacionais e Estrangeiros, SA, foi declarada insolvente por sentença datada de 15.09.2010, já transitada em julgado.

Q. A Autora nasceu em ....10.1978 e é filha de DD e EE.

R. A Autora celebrou com a Ré BPN, Banco Português de Negócios, SA, um contrato de abertura de conta, em Janeiro de 2003.

S. A Ré BPN, Banco Português de Negócios, SA, creditou: na conta de depósitos à ordem da Autora, em 26 de Fevereiro e em 04 de Maio de 2009, 3 413, 36 € e 3 408 €, respectivamente.

T. A sociedade CNE aqui 5ª ré tinha como fiscal único uma sociedade de revisores oficiais de contas, denominada C..., SROF, Lda

U. Correu termos na 2ª Vara Cível do Tribunal de ..., uma acção ordinária com o nº 1400/08.3..., em que foram Autores FF e mulher e Rés a SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SA e Plêiade – Investimentos e Participações, SGPS SA., onde aqueles pediram o reconhecimento da propriedade e posse de 25% do capital social da CNE, Cimentos Nacionais e Estrangeiros, SA acção essa julgada improcedente por sentença de 28-02-2011 já transitada em julgado.

V. A relação existente entre o funcionário do BPN – Banco Português de Negócios, SA – BB – e os Autores era uma relação de grande amizade e confiança pessoal.

W. O BPN, Banco Português de Negócios geria um fundo de investimentos imobiliários de nome Imonegócios.

X. As aplicações em papel comercial T....... e em Unidades de Participação da Imonegócios ofereciam uma rentabilidade aos autores mais elevada daquela que era oferecido por um normal depósito a prazo.

Y. Os Autores sempre privilegiaram a segurança das suas aplicações aplicações financeiras.

Z. O funcionário do BPN – Banco Português de Negócios, SA, BB, era conhecedor dessa preferência dos autores.

AA. Em 29-09-2010 o BPN – Banco Português de Negócios, SA ainda anunciava na informação que disponibilizava sobre o fundo Imonegócios que “neste fundo tudo é imóvel, menos o investimento” e que ele se apresenta como uma interessante alternativa de investimento, adequada aos investidores que privilegiam aplicações de menor risco.

BB. Da Nota Informativa relativa ao produto papel comercial CNE, junta a fls. 129 a 141, cujo teor se dá aqui por reproduzido, constava expressamente que a responsabilidade pelo seu teor era assumida pelo Conselho de Administração da própria CNE – Cimentos Nacionais e Estrangeiros, SA, como entidade emitente

CC. Ali era dito que a Instituição Agente e Instituição Registadora do Programa da referida operação era o Banco Efisa, SA, que estava assim autorizado a proceder à sua divulgação e ainda que o Banco Efisa, SA não tinha preparado, analisado ou confirmado a informação prestada pela entidade emitente, pelo que a dita Nota Informativa “não implicava qualquer responsabilidade, compromisso ou garantia do próprio Banco Efisa quanto à suficiência, veracidade, objectividade e actualidade do conteúdo da informação prestada pela entidade emitente” e que, por tal motivo, “qualquer avaliação ou juízo de valor quanto à oportunidade e validade do investimento no PROGRAMA dependeria exclusivamente do critério do investidor.”

DD. As contas da 5ª Ré achavam-se legalmente certificadas e as contas consolidadas de todo o Grupo SLN existiam e tinham sido aprovadas pelos órgãos próprios e sujeitas à supervisão do Banco de Portugal.

Resultantes da instrução da causa

1. A Autora sempre viveu com os seus pais e irmão e viveu na dependência daqueles até 2003.

2. A Autora mulher é licenciada em medicina dentária desde 2002.

3. Em 2003 montou consultório em casa dos seus pais e começou a trabalhar.

4.A Autora era titular de contas bancárias à ordem na Caixa Geral de Depósitos e no Banco Totta & Açores até começar a trabalhar.

5. Onde o seu pai lhe depositava um valor mensal para as suas despesas e outras quantias que iam sendo oferecidas à Autora.

6. Pelo facto da mãe da Autora ter exercido actividade profissional durante poucos anos e ter ficado invisual o seu agregado familiar viveu sempre abaixo das suas possibilidades económicas, curando de aforrar quantia que lhes permitisse fazer face a uma qualquer fatalidade, designadamente pela falta ou limitação de ganho que pudesse sobrevir ao Autor.

7. A Autora foi educada no sentido de gastar com moderação e privilegiar o aforro, sendo incentivada pelos seus pais a ter uma poupança para obviar a alguma fatalidade ou necessidade futura.

8. Pelo que, à semelhança dos seus pais, privilegiou aplicar as suas poupanças em depósitos em bancos ou em produtos que lhes diziam ser equivalentes.

9. Até meados de 2002, os pais da Autora tinham a maior parte das suas poupanças depositadas no Banco Internacional de Crédito, SA, na Agência da ....

10. Durante grande parte do período em que os Autores foram clientes desse banco e agência eram dois funcionários, um de nome BB e outro GG, que tratavam dos assuntos que diziam respeito à sua conta bancária.

11. Porquanto os pais da Autora não tinham conhecimentos, experiência ou aptidão para esse tipo de actividades económicas bancárias.

12. Há cerca de 8 anos (por referência à data da petição inicial), o referido BB passou a prestar o seu trabalho para o BPN- Banco Português de Negócios, SA, numa agência sita na cidade ....

13. Passado algum tempo, o BB solicitou aos pais da Autora que transferissem os seus dinheiros, as suas poupanças, para o Banco e agência onde trabalhava, convidando-os a nele abrirem conta e enfatizando os méritos e a seriedade da instituição de crédito a que passara a servir - a 1ª Ré.

14. Solicitação em que os mesmos anuíram, porquanto conheciam o BB e o tinham por pessoa de confiança, assim como nada tinham ou sabiam em desabono do BPN – Banco Português de Negócios, SA.

15. Foi nessa circunstância que, em data situada no ano de 2003, os pais da Autora se tornaram clientes da 1ª Ré com ela celebrando contratos de abertura de conta.

16. Nessas mesmas circunstâncias e por causa delas também a Autora celebrou o contrato referido em R.

17. No âmbito do contrato referidos em R) e em sua execução, o BPN – Banco Português de Negócios, SA, atribuiu à Autora o número de cliente 14289357 e abriu uma conta à ordem e de títulos em seu nome com o número 14289357.10.001, bem como, depois, e sucessivamente, contas de depósitos a prazo com o mesmo número de cliente seguido do número 20 e de três outros algarismos por ordem sequencial das contas abertas.

18. A assinatura de toda a documentação necessária para essa abertura das contas – fichas de assinaturas, entre outras – e a assinatura de toda a documentação necessária para movimentação das contas posteriormente - requisição de cheques, entrega de módulo de cheques, depósito de valores – foi sempre efectuada na residência da Autora.

19. Era o referido BB, empregado do BPN – Banco Português de Negócios, SA que se deslocava à residência da Autora para colher deles as assinaturas nos documentos que dizia que necessitava para os movimentos pretendidos efectuar.

20. E para ir buscar o dinheiro e os cheques que aquela queria depositar nas suas contas bancárias, enviando-lhes depois os documentos comprovativos pelo correio.

21. Tal prática - deslocação à residência da Autora para tratar dos assuntos bancários - foi implementada pelo referido BB e por sua própria e livre iniciativa, por cortesia.

22. A Autora, até ao ano de 2009, nunca tinha entrado em qualquer agência do banco 1º Réu, e não sabia sequer em que agência ou departamento concreto é que o referido BB trabalhava, sabendo apenas que se localizava na cidade ....

23. Nos extractos das contas que Autora tinha em seu nome constava o nome de outros funcionários diversos do referido BB como gestores das suas contas que, até 2009, aquela não conhecia.

24. E que jamais a tinham contactado ou sido por ela contactados.

25. A única pessoa que em nome do BPN – Banco Português de Negócios, SA, a contactou até 2009 e a única pessoa que contactava quando algo pretendia daquele Réu era o funcionário deste, BB.

26. Que era quem geria as suas contas acima identificadas e todos os valores lá depositados ou subscritos.

27. O que era sabido pelo BPN – Banco Português de Negócios, SA que para tanto o tinha designado e encarregado no seu próprio interesse.

28. Em 10 de Janeiro de 2003 a Autora efectuou depósitos na conta à ordem referida em R).

29. A partir daí começou a depositar na mesma o dinheiro que ganhava com o exercício da sua profissão.

30. O que fazia com regularidade mensal ou bimensal.

31. Entre Abril e Agosto de 2003 a Autora depositou novas quantias em depósitos a prazo no Banco BPN.

32. Seguindo a proposta, conselho e recomendação do BPN – Banco Português de Negócios, SA, através do referido funcionário BB, o pai da Autora aplicou em 4/06/2003 cerca de € 40.000,00 num fundo imobiliário BPN – Banco Português de Negócios, SA, chamado Fundo de Investimento BPN Imonegócios, subscrevendo 7.050 unidades de participação.

33. Tendo sido informada que tal produto era oferecido pelo BPN – Banco Português de Negócios, SA para montantes elevados, equivalente a um depósito a prazo com capital e juro líquido garantido.

34. Seguindo a proposta, conselho e recomendação do BPN – Banco Português de Negócios, SA, através do referido funcionário BB, a Autora aplicou em 01-08-2003 o valor dos três depósitos a prazo referidos em 31 num referido fundo imobiliário BPN – Banco Português de Negócios, SA, subscrevendo unidades de participação.

35. Entre Setembro de 2003 e Abril de 2004, o Banco BPN, através do BB foi recomendando à Autora como aplicar as suas poupanças.

36. Seguindo essas recomendações, a Autora constituiu depósitos a prazo no banco Réu.

37. O referido BB propôs, aconselhou e recomendou à Autora que os resgatasse antecipadamente em Abril de 2004 para subscrever mais unidades de participação do Fundo BPN Imonegócios.

38. Proposta e recomendação que a Autora seguiu tendo subscrito títulos no valor de 8 996, 17 € para o que usou o valor dos depósitos a prazo resgatados e mais algum dinheiro que tinha depositado à ordem.

39. E, a partir de então, o 1º Réu, sempre através do seu funcionário BB, foi propondo, aconselhando e recomendando à Autora que dirigisse as suas poupanças fundamentalmente para esse fundo imobiliário do 1º Réu, motivo pelo qual a Autora subscreveu títulos de participação daquele, nas seguintes datas e com os seguintes valores:

a. em 3/5/2004 de €7.997,89; b. em 10/5/2004 de € 2.995,53, c. em 2/6/2004 de € 2.997,39, d. em 19/7/2004 de €2.994,07, e. em 29/7/2004 de € 2.996,84, f. em 13/9/2004 de € 3.696,80,

g. em 12/10/2004 de € 4. 792,88, h. em 9/11/2004 de € 3.002,90, i. em 22/2/2005 de € 7.994,71, j. em 21/3/2005 de € 3.997,36, k. em 6/5/2005 de € 3.994,95, l. em 1/6/2005 de €3.996,99, m. em 17/6/2005 de € 3.996,99, n. em 13/7/2005 de € 4.609,11, o. em 1/8/2005 de € 3.103, 60, p. em 16/9/2005 € 4.997,32, q. em 17/10/2005 de € 6.997,28, r. em 14/11/2005 de € 2.994,20; s. em 6/12/2005 de € 2.999,91; t. em 3/1/2006 de €b2.9991,10; u. em 6/2/2006 de € 2.994,12; v. em 8/3/2006 de € 2.997,06 w. em 21/4/2006 de € 4.938,73, x. em 6/7/2006 de € 4.998,63 y. em 28/7/2006 de € 2.998,72 z. em 6/9/2006 de € 2.995,65; aa. em 10/10/2006 de € 2.498,55; bb. em 10/11/2006 de € 3.996,13; cc. em 15/12/2006 de € 4.994,33; dd. em 16/1/2007 de € 3.995,23; ee. em 12/2/2007 de € 3.999,28; ff. em 28/3/2007 de € 4.997,26; gg. em 25/5/2007 de € 7.999,26 e, hh. em 12/7/2007 de € 3.997,02.

40. Sendo esse o destino das poupanças da Autora efectuadas no banco 1º Réu de Maio de 2004 até Janeiro de 2008 porquanto durante esse período e para além das subscrições acima identificadas a Autora, sempre por proposta, aconselhamento e até recomendação do 1º Réu, através do seu funcionário BB, apenas constituiu quatro depósitos a prazo em 5/9/2007, 7/11/2007, 13/12/2007 e 4/1/2008 de, respectivamente, € 8.000,00, € 8.000,00, €4.000,00 e € 4.000,00.

41. Fruto das subscrições daquele fundo imobiliário do banco 1º Réu, e descontados dois ou três resgates efectuados durante aqueles anos por necessidades pontuais de dinheiro na conta à ordem, a Autora, em final de Janeiro de 2008, possuía aplicado no Banco 1º Réu cerca de € 200.00,00, sendo € 24.000,00 nos referidos 4 depósitos a prazo e o restante no fundo imobiliário do 1º Réu supra identificado.

42. Poupança essa que a Autora tinha por segura quer quanto ao capital quer quanto aos juros, porquanto nem tinha outro interesse que não fosse aplicar os aforros que ia constituindo em produtos que lhe assegurasse o reembolso do capital e a fruição de um juro certo, ainda que pequeno.

43. A Autora limitava-se a movimentar aquela sua conta de depósitos à ordem fundamentalmente para através dela aplicar as poupanças e receber os juros, capitalizando-os, sempre a fazer crescer a sua poupança.

44. Pois vivia com parcimónia e em casa dos pais e, para além dos depósitos que efectuava utilizava essa conta para pagar a quota da associação profissional a que pertence e para efectuar em média 4 ou 5 pagamentos por cheque e todos de montantes pequenos que globalmente em média mensal não ultrapassavam os € 1.000,00.

45. O que o Banco 1º Réu, quer através do seu funcionário BB quer através de qualquer outro que tomasse conhecimento da conta da Autora e seus movimentos, sabia e não podia deixar de saber.

46. Sem que a Autora lhe desse ordem, o Banco 1º Réu resolveu no dia 6/2/2008 resgatar a maior parte das unidades de participação que ela tinha no sobredito fundo imobiliário, pelo que nesse mesmo dia foi creditada na conta D/O da Autora a quantia de € 151.789,41.

47. Creditado aquele montante na conta bancária da Autora no dia 13/2/2008 o Banco 1º Réu constituiu, por contrapartida do débito dessa conta, um depósito a prazo no valor de € 150.000,00 por 9 dias, também sem ordem e sem o conhecimento da Autora.

48. Vencido que foi aquele depósito a prazo de € 150.000,00 no dia 22 de Fevereiro de 2008 - e resgatado que entretanto também foram, igualmente sem ordem ou conhecimento da autora, mais algumas unidades de participação do referido fundo imobiliário em 15/2/2008 no valor de € 4.140,53 - e creditado que foi o capital e os juros, o 1º Réu comprou em nome da Autora € 150.000,00 de papel comercial da CNE, assim tendo debitado, e por esse valor, a conta de depósitos à ordem da Autora, compra e débito que ocorreram sem que a Autora os tivesse ordenado ou sequer conhecido.

49. O Banco 1º Réu através do seu funcionário BB, só posteriormente fez saber à Autora das operações que havia efectuado na sua conta.

50 Informando-a que o tinha feito no interesse da Autora.

51. Dizendo-lhe tratar-se de um produto novo do BPN para investimento, com garantia de reembolso do capital aplicado e do pagamento de juros.

52. Bem como lhe disse que o valor do capital e dos juros lhe seria pago no dia 22 de Fevereiro de 2009.

53. Mais lhe referiu aquele funcionário do Réu, BB, que este tipo de produto estava a ser propiciadas por instruções dos seus superiores hierárquicos, por lhes garantir uma rendibilidade melhoradas e sem risco.

54. Nenhuma outra informação foi dada à Autora sobre o que era esse produto, nem sequer lhe foi dito que era papel comercial, do que a Autora nunca tinha ouvido falar, nem sabia que existia nem lhe foi explicado o que era o papel comercial e também não lhe foi entregue ou facultado qualquer documento que o identificasse ou explicitasse - brochura, nota informativa ou outro.

55. A Autora jamais havia comprado ou possuído qualquer papel comercial - como valor mobiliário.

56. A Autora era então leiga em transacções bancárias e aplicações e investimentos em bolsa e em valores mobiliários, não sabendo, nem percebendo quer os conceitos, quer os pormenores concretos, gerais ou especiais, em que se desenvolvem essas actividades económicas e bancárias.

57. A Autora continuou mesmo após esse resgate e compra de papel comercial, a depositar os dinheiros que lograva aforrar, aplicando-os por proposta, conselho e até recomendação do 1º Ré, através daquele funcionário BB, em depósitos a prazo que continuou a constituir ao mesmo ritmo mensal ou bimensal, a saber:

a) em 29/2/08 de € 14.000,00, b) em 19/3/08 de € 6.000,00, c) em 7/5/08 de € 6.000,00, d) em 20/6/08 de € 7.000,00,

e) em 3/7/08 de € 13.500,00- este fruto do resgate de unidades de participação do fundo imobiliário de € 13.573,09 em 3/7/08

f) em 10/7/08 de € 3.500,00,

g) em 22/7/08 de € 4.000,00- este fruto do resgate de unidades de participação do fundo imobiliário no valor de € 4.149,66 em 14/7/08

h) em 4/9/08 de € 83.000,00- este fruto de diversos depósitos a prazo vencidos nesse dia no montante total de € 78.000,00e de 5.000,00 que entretanto a Autora tinha depositado em conta i) em 1/10/08 de € 7.000,00, j) em 8/11/08 de € 7.000,00 e,

k) em 30/12/2008 de € 6.000,00.

58. Em Novembro de 2008, quando veio a público a notícia da nacionalização do BPN o pai da Autora, na presença da Autora interrogou o referido BB acerca das consequências desse facto ao nível do risco de (não) reembolso dos valores depositados e investidos por si e pela sua mulher a conselho e recomendação dele.

59. Tendo-o ele tranquilizado e alegando que a nacionalização constituía até maior garantia de reembolso.

60. Só então é que o referido funcionário referiu que essas aplicações eram papel comercial.

61. Mas sem lhes explicar o que é que isso era ou em que consistia.

62. No dia 22 de Fevereiro de 2009, vencida que foi a obrigação de reembolso dos € 150.000,00, bem como dos juros devidos, o BPN, Banco Português de Negócios, SA não creditou qualquer quantia nas contas de depósitos à ordem da Autora.

63. Questionado pelo pai da Autora, o referido funcionário BB transmitiu, então, que estava suspensa a liquidação dos juros e do capital, o que era um facto consumado.

64. A informação interna do Banco e a consciência que o funcionário BB tinha quando efectuou as operações era a de que o papel comercial CNE era um produto seguro

65 - E que o BPN garantia o reembolso do capital e juros.

66. Ao longo dos então cinco anos de relação bancária com o BPN, Banco Português de Negócios, SA, a Autora sempre revelara ser pessoa de perfil conservador que não investia em acções, nem em outros valores mobiliários que envolvessem risco potencial de perda dos capitais investidos.

67. E nem sequer dos juros ou remunerações anunciadas.

68. Bem como se revelara como pessoa que no referido Banco tinham depositado o aforro do início da sua vida profissional.

69. O referido BB sabia que os conselhos e recomendações que prestava à Autora na qualidade de funcionário do Banco se destinavam à tomada pela mesma de uma decisão definitiva de consolidar o investimento até então efectuado.

70. Bem como sabia que ela não iriam, como não foi, proceder a quaisquer outras diligências de averiguação acerca da anunciada segurança do retorno, quer do capital a investir, quer da sua remuneração.

71. O referido BB tinha conhecimento de que se a Autora soubesse que a aplicação proposta tinha risco superior ao de um depósito a prazo ou dos fundos que possuía, recusaria tal aplicação.

72. Bem como tinha consciência de que para a Autora os fundos que possuíam eram de risco idêntico ao dos depósitos a prazo.

73. O papel comercial da CNE tinha risco superior quer ao dos depósitos a prazo que a Autora constituíra no Banco 1º Réu.

74. O referido BB sabia que a Autora não tinha lido, nem por qualquer outra forma ou meio tinha tomado conhecimento do conteúdo de qualquer nota informativa da emissão elaborada pela CNE.

75. O referido BB ao adquirir e ao aconselhar a Autora a adquirir tal papel comercial estava a cumprir ordens recebidas dos seus superiores hierárquicos no sentido angariar clientes para adquirirem tal produto.

76. Antes da aquisição do papel comercial CNE em nome da Autora o referido BB nunca solicitou a esta que lhe prestasse qualquer informação relativa aos seus conhecimentos e experiência em matéria de investimento no que respeitasse ao tipo de instrumento financeiro proposto, que lhe permitisse avaliar se a Autora compreendia os riscos envolvidos.

77. E nunca o referido funcionário do BPN, Banco Português de Negócios, SA alertou a Autora para a circunstância de existir relação de domínio total existente entre a SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SA como entidade dominante do BPN, Banco Português de Negócios, SA e da CNE – Cimentos Nacionais e Estrangeiros.

78. Nem lhe disse que tal relação podia levar ou permitir que se duvidasse sobre se o BPN, Banco Português de Negócios, SA estaria a privilegiar os interesses da CNE na obtenção dos fundos subjacentes à emissão de papel comercial em causa, em detrimento dos interesses dos autores na aplicação segura e com menor risco dos seus capitais.

79. Nunca o funcionário da 1ª Ré disse à Autora que, pelo facto de o valor nominal unitário da emissão ser igual a € 50 000,00, esta não era sequer havida como oferta pública, antes como oferta particular.

80. Nem lhe disse que tal a sujeitava a riscos acrescidos devido a menores exigências de informação aos investidores.

81. O referido funcionário do BPN, Banco Português de Negócios, SA nunca disse à Autora que a contabilidade da CNE deveria evidenciar que a mesma tinha perdido mais de metade do seu capital social, já no final do ano de 2007.

82. A CNE – Cimentos Nacionais e Estrangeiros, SA mantinha – no final do ano de 2007 – inscrito na sua contabilidade um saldo a receber proveniente de anos anteriores, no montante aproximado de 10,7 milhões de euros.

83. O referido BB nunca deu conhecimento à Autora de que a CNE tinha uma unidade industrial de moagem que havia entrado em funcionamento no início do ano de 2007 cujos custos de construção constavam inscritos na contabilidade na rubrica das imobilizações em curso.

84. Nem lhes disse que tais custos deveriam ter sido transferidos para a rubrica do imobilizado firme dando lugar, assim a amortizações no valor mínimo de 5, 5 milhões de euros.

85. Bem como lhes disse que caso assim se tivesse procedido o capital próprio da CNE inscrito na sua contabilidade relativa ao ano de 2007 ficaria diminuído em 16,2 milhões de euros.

86. O referido funcionário do BPN, Banco Português de Negócios, SA não deu conhecimento à Autora que a Plêiade, Investimentos e Participações, SA, por força da diminuição de 16,2 milhões de euros do capital próprio da teria de proceder a redução de igual valor nos seus capitais próprios, o que levava à sua redução para € 5 098 275,84, quando o seu capital social era de €20.000.000,00.

87. O referido funcionário do BPN, Banco Português de Negócios, SA nunca comunicou à Autora, que referida Plêiade tinha, no final do ano de 2007, mais de € 16 milhões de euros de prejuízos acumulados.

88. O BB nunca disse à Autora que o BPN, Banco Português de Negócios, SA não assumiria o compromisso de a reembolsar integralmente caso CNE o não fizesse.

89. A Autora passou a ser cliente do BPN, Banco Português de Negócios, SA por força da relação pessoal e de confiança que os seus pais tinham com o referido BB.

90. A Autora sempre manifestou ao dito BB que pretendia para as suas poupanças a melhor rentabilidade possível,

91 Bem como que privilegiava também a segurança das aplicações que o referido funcionário entendesse aconselhar.

92. O referido funcionário actuava, até à compra do papel comercial CNE, como representante do BPN, Banco Português de Negócios, SA junto da Autora pelo respeito do que sabia ser o perfil de investidora da mesma.

93. Procurando aplicações tidas por seguras e com taxas de rentabilidade que fossem além das que normalmente eram inerentes aos simples depósitos a prazo.

94. O BPN, Banco Português de Negócios, SA, a propósito do lançamento do produto – papel comercial CNE – CIMENTOS NACIONAIS E ESTRANGEIROS, SA – apoiou e ajudou na sua colocação no mercado e designadamente junto dos seus clientes, aproveitando o Grupo SLN a existência de uma rede significativa de balcões e a relação de proximidade que tal rede permitia com os respectivos clientes.

95. A Autora, após a aquisição do produto – papel comercial CNE -, em Fevereiro de 2008, foi recebendo, como sempre recebia, os extractos mensais integrados e combinados da parte do BPN, Banco Português de Negócios, SA, e neles vinha explicitada a aplicação em papel comercial CNE.

96. A Autora foi informada, em momento posterior à subscrição do produto em causa, que o BB havia investido o montante de 150 000 € papel comercial CNE.

97. Tendo sido informada da natureza do produto em causa, da sua taxa de rentabilidade, e que se tratavam de “valores mobiliários” com um valor unitário de € 50.000,00

98. Tratava-se da 10ª Emissão de Papel Comercial CNE – Cimentos Nacionais e Estrangeiros, SA.

99. As emissões anteriores haviam sido objecto do correspondente reembolso, e a grande maioria dos clientes subscritores haviam optado pela sua renovação.

100. Nunca a Autora manifestou ao BPN, Banco Português de Negócios, SA ou ao dito BB que desejava alienar as unidades de papel comercial CNE que tinham subscrito.

101. À data em que o BB subscreveu papel comercial CNE em nome da Autora era de todo imprevisto e imprevisível que a entidade emitente do referido produto deixasse de ter qualquer ligação com o BPN, Banco

Factos dados como não provados:

a) A liquidez da aplicação referida em 35 foi garantida ao pai da Autora mediante um aviso prévio de cinco dias.

b) Quando o BB aconselhou e recomendou à Autora o investimento na aquisição de papel comercial da CNE que já tinha adquirido, apresentou-o como sendo adequado ao tipo de cliente que ela era.

c) Quando – em Fevereiro de 2008 e posteriormente –, comunicou à Autora a aquisição - que já havia efectuado -, de papel comercial e em nome dela adquiriu 150.000,00 daquele papel, o próprio funcionário BB ignorava o conteúdo de qualquer nota informativa da emissão elaborada pela CNE.

d) Bem sabia o BB que, caso tivesse revelado à Autora o referido em 81 e 82 esta recusaria a aquisição do papel comercial CNE sem o compromisso da garantia do Banco.

e) Só após o referido em 63 o BB revelou que o papel comercial titulado pela Autora estava relacionado com uma empresa de cimentos do grupo do Banco, a CNE

f) E prontificou-se logo a declarar onde fosse preciso, inclusive no tribunal, que o papel comercial que para a Autora e seus pais tinha comprado era um produto seguro e que o BPN, Banco Português de Negócios, SA garantia o capital e os juros.

g) As contas da CNE ao nível do activo e dos capitais próprios estavam sobrevalorizadas em igual montante, em 31 de Dezembro de 2007.

h) O que era do conhecimento das Rés BPN, Banco Português de Negócios, SA, BPS, SGPs e SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SA

i) O referido funcionário do BPN, Banco Português de Negócios, SA sabia que caso tudo ou parte disso tivesse revelado à Autora, esta recusaria a aquisição dos instrumentos financeiros propostos.

j) Os superiores hierárquicos do funcionário BB haviam-no autorizado a omitir a de que era pretensão do Banco transferir o maior número possível de depósitos a prazo ou outras aplicações financeiras que tivessem o Banco como devedor principal ou em que o Banco fosse responsável pela sua gestão para outras que o não tivessem, tendo-o mesmo exortado a afirmar o contrário

k) Em Fevereiro de 2008 tais administradores conheciam o risco previsível que de que CNE não iria restituir em Fevereiro de 2009 o capital e os juros correspondentes ao papel comercial emitido- 11ª emissão

l) Pelo menos no período de 31 de Dezembro de 2007 a 22 de Fevereiro de 2008, era o CC quem, acompanhado do seu filho que o acompanhava nos conselhos de administração da 1ª e 2ª rés, determinava o agir das sociedades do denominado Grupo BPN e a todas elas dava instruções vinculantes.

m) Para além de exercer profissionalmente a medicina, a Autora acompanhava de muito perto os negócios do seu pai e de uma empresa familiar que tinha por objecto a indústria cerâmica.

n) Onde este tinha responsabilidades de facto, na respectiva gerência.

o) A Autora é pessoa com conhecimentos superiores ao normal dos clientes bancários e das pessoas que investem normalmente em aplicações e produtos financeiros.

p) Aquando da realização das operações descritas em 57 a Autora ainda desconhecia o referido em 49.

q) Os administradores do BPN, Banco Português de Negócios, SA do BPN, SGPS e da SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, SA e a Plêiade, em Fevereiro de 2008, sabiam ser para todas elas preferível que a Autora adquirisse directamente em nome próprio e em substituição de um depósito a prazo e das partic Imonegócios, o papel comercial emitido pela CNE do que ser o próprio BPN, Banco Português de Negócios, SA a fazê-lo directamente com os dinheiros da Autora nela colocados em depósito.

r) Dado que esta segunda hipótese tinha repercussão negativa sobre os ratios de solvabilidade escrutinados pelo Banco de Portugal.

s) Foi na execução de uma estratégia de grupo no seio da SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, SA, definida pelos órgãos sociais dessa sociedade, que foi decidida a emissão de papel comercial a emitir pela sociedade CNE no montante de € 10.000.000,00.

t) Bem como foi na execução da mesma estratégia que foram definidas as condições de tal emissão, designadamente o valor nominal de todo o Programa, a modalidade da representação do papel comercial, a incumbência da sua organização, montagem, agência e registo, prazo do dito Programa e preço da respectiva subscrição.

u) Ao BPN, Banco Português de Negócios, SA foi solicitado e ordenado pela SLN que ajudasse o Banco EFISA na colocação desse produto, aproveitando a sua rede de balcões.

v) Assim beneficiando das sinergias daí decorrentes e da poupança decorrente da desnecessidade de recurso a entidades bancárias estranhas ao denominado Grupo SLN.

w) O referido BB sempre contactou a Autora, na sua relação e na relação de amizade com os pais desta.

x) Não cabia nas funções deste, como director bancário de zona, o contacto directo com os clientes na gestão corrente e diária de tal relação.

y) A Autora sempre deu “carta branca” ao funcionário BB para optar pelas aplicações que tivesse por mais adequadas a obter a melhor rentabilidade.

z) O referido BB sempre agiu com o conhecimento e tácita aprovação da Autora.

aa) O BB informou a Autora que estava em preparação o lançamento de um produto financeiro por empresa do mesmo grupo a que o Banco pertencia e que a sua segurança e garantia advinha de pertencer a esse grupo.

bb) O dito BB identificou então à Autora a entidade emitente de tal produto como sendo uma empresa industrial da área dos cimentos e que a rentabilidade de tal produto era a correspondente a uma taxa de juro de 5,622% ao ano.

cc) Aquilo que transmitiu à Autora correspondia à verdade.

dd) A contabilidade da CNE deveria evidenciar que a mesma tinha perdido mais de metade do seu capital social, já no final do ano de 2007.

ee) Os custos referidos em 116 deveriam ter sido transferidos para a rubrica do imobilizado firme dando lugar, assim, a amortizações no valor mínimo de 5, 5 milhões de euros.

ff) Caso assim se tivesse procedido o capital próprio da CNE inscrito na sua contabilidade relativa ao ano de 2007 ficaria diminuído em 16,2 milhões de euros.

gg) A Plêiade, Investimentos e Participações, SA, por força da diminuição de 16,2 milhões de euros do capital próprio da teria de proceder a redução de igual valor nos seus capitais próprios, o que levava à sua redução para € 5 098 275,84, quando o seu capital social era de € 20.000.000,00.

hh) A Plêiade tinha, no final do ano de 2007, mais de € 16 milhões de euros de prejuízos acumulados.

ii) Após a aquisição de papel comercial CNE em nome da Autora o BB esclareceu o pai desta que:

- a dita emissão ocorreria a 22.02.2008;

- a data do seu vencimento seria no final do ano contado desde aquela data;

- a remuneração respectiva seria Euribor a 12 meses + 1,25% ao ano;

- os montantes: o mínimo de € 50.000,00 e em múltiplos de € 50.000,00; e

- que se tratavam de valores mobiliários registados, nominativos e com representação escritural.

- bem como do referido em CC.

jj) No balcão respectivo havia exemplares da Nota Informativa relativa a este produto, junta a fls. 129 a 141.

kk) Porque não dispunha de uma rede de balcões como o BPN, Banco Português de Negócios, SA, o Banco Efisa, SA solicitou a colaboração deste para efeitos da colocação deste produto financeiro junto dos seus clientes.

ll) Existindo nos balcões do BPN, Banco Português de Negócios, SA vários exemplares da nota informativa junta a fls. 129 a 141.

mm) Toda a informação constante da nota informativa existente nos balcões do BPN, Banco Português de Negócios, SA relativa à operação, foi transmitida aos Autores pelo dito BB.

nn) Bem como lhes foi transmitido que a entidade emitente era uma empresa pertencente ao mesmo grupo do próprio banco.

oo) O BPN, Banco Português de Negócios, SA dispunha, no seio do denominado Grupo SLN, de uma empresa de corretagem especialmente vocacionada para actuar na área da intermediação, que era a F......

pp) No caso do produto CNE, foi o Banco Efisa quem, em exclusividade, se incumbiu da prestação dos serviços de assistência técnica, económica e financeira.

qq) Em Fevereiro de 2008, a CNE não tinha activos que lhe permitisse pagar a todos os seus credores e aos titulares de papel comercial nessa data subscrito por inteiro.

rr) O BPN, Banco Português de Negócios, SA sabia disso.

ss) A Autora apresentou várias reclamações junto do BPN, Banco Português de Negócios, SA após o momento referido em 63.

IV – Fundamentação de direito

1. Recordemos as questões objecto do presente recurso:

• Erro da decisão de facto do acórdão recorrido ao não dar como existente a confissão judicial da A.;

• Desrespeito pelo dever de fundamentação na apreciação da impugnação dos factos 32, 33, 34, 37, 38, 51, 53, 65, 69, 71, 77, 78, 79 e 80:

• Desrespeito pelo dever de apreciar a impugnação do facto 92;

• Com as alterações da matéria de facto propugnadas, erro de direito ao não qualificar o contrato dos autos gestão discricionária de carteira ou como contrato de mandato; devendo, consequentemente, reconhecer-se que o banco réu não estava obrigado a dar informações prévias à A. sobre os produtos financeiros, tendo a mesma A. ratificado tacitamente todos os investimentos;

• Subsidiariamente, para o caso de se manter a qualificação como contrato de intermediação financeira, falta de prova dos pressupostos da responsabilidade civil do intermediário financeiro: ilicitude por violação dos deveres de informação e nexo de causalidade entre o facto ilícito e o dano;

• Subsidiariamente, e dada a prática reiterada existente entre as partes de dispensar informações prévias à realização dos investimentos: abuso do direito ao vir a A. invocar a violação do dever de informação.

2. Consideremos, em primeiro lugar, as questões relativas à decisão de facto.

2.1. Invoca o Recorrente a existência de erro da matéria de facto ao não o acórdão recorrido dado como existente a confissão judicial da A..

A alegada violação de norma que fixa a força de determinado meio de prova corresponde a uma das situações em que, excepcionalmente, pode o Supremo Tribunal de Justiça sindicar a decisão relativa à matéria de facto (cfr. art. 674.º, n.º 3, segunda parte, do CPC).

Vejamos pois.

Em sede de recurso de apelação formulou o R. a seguinte conclusão:

«1. Existe clara e manifesta omissão, no âmbito da decisão relativa à matéria de facto, ao teor do depoimento prestado nos autos pela autora, e que motivou que fosse lavrada “assentada” do teor seguinte:

“A autora admitiu que dentro dos parâmetros antes verbalmente estabelecidos com o funcionário BB, ou seja, que só deveria investir quando tal investimento assegurasse quer o capital, quer os juros, e era indiferente que o referido BB falasse consigo antes ou depois da aplicação.”».

Tal questão foi apreciada pelo acórdão recorrido da seguinte forma:

«Por último, e que constitui o primeiro ponto da impugnação. Pretende a autora que se dê como provado: “A autora admitiu que dentro dos parâmetros antes verbalmente estabelecidos com o funcionário BB, ou seja, que só deveria investir quando tal investimento assegurasse quer o capital, quer os juros, e era indiferente que o referido BB falasse consigo antes ou depois da aplicação”.

Também entendemos que a seguinte matéria não deve constar da decisão de provado. Dentro da análise global do seu depoimento tal não se infere, ou sequer resulta do mesmo. Não deve, pois, este ponto ser atendido.».

Ora, compulsada a Acta da Audiência de Discussão em Julgamento de 18 de Janeiro de 2018, verifica-se que, diversamente do que entendeu o tribunal a quo, dela consta efectivamente a referida assentada nos termos em que foi enunciada.

Dada a força probatória plena, contra o confitente, da confissão extrajudicial (cfr. art. 358.º, n.º 1, do Código Civil), a pretensão do Recorrente é, nesta parte, procedente, devendo dar-se como provado o seguinte facto:

«A autora admitiu que dentro dos parâmetros antes verbalmente estabelecidos com o funcionário BB, ou seja, que só deveria investir quando tal investimento assegurasse quer o capital, quer os juros, e era indiferente que o referido BB falasse consigo antes ou depois da aplicação».

2.2. Invoca também o Recorrente que o acórdão recorrido desrespeitou o dever de fundamentação ao apreciar a impugnação dos factos 32, 33, 34, 37, 38, 51, 53, 65, 69, 71, 77, 78, 79 e 80.

Vejamos.

Compulsada a apelação do R. verifica-se que, efectivamente (cfr. conclusões 3) a 13)), tais factos foram por este impugnados.

O acórdão recorrido apreciou a impugnação nos seguintes termos:

«Pretende a apelante que:

“Existe contradição que diz ser manifesta, manifesta entre a matéria dada por provada no nº 81, 84 e 85 da decisão recorrida, por um lado, e a constante da als. dd), ee) e ff) dos Factos Não Provados - devem por isso os factos nºs 81, 84, e 85 ser decididos como não provados;

No que respeita à matéria constante dos nºs 71, 33, 51, 53, 65 e 69, nºs 77, 78, 79 e 80, já que também sobre ela nenhuma prova foi produzida devem igualmente merecer a decisão de não provado, dada a ausência de prova no entender do apelante;

Já quanto à factualidade descrita sob os nºs 32, 34, 37, 38 e 39, deverá passar a ter a redacção seguinte:

“32. Com data de 04.06.2003, o autor marido, através do referido funcionário BB, aplicou cerca de € 40.000,00 num fundo imobiliário BPN -Banco Português de Negócios, SA, chamado Fundo de Investimento BPN Imonegócios, subscrevendo 7.050 unidades e participação;

34. Com data de 01.08.2003, a autora aplicou o valor dos depósitos referidos em 28 e 31 num referido fundo imobiliário BPN – Banco Português de Negócios, SA, subscrevendo unidades de participação.

35. Através do funcionário BB, o autor marido aplicou em 19.01.2005 € 11.466,77 no fundo imobiliário referido em 29., subscrevendo 1.880 unidades de participação.

37. Em Abril de 2004 a autora resgatou depósitos a prazo de que era titular para subscrever mais unidades de participação do Fundo BPN Imonegócios .

38. A autora veio a subscrever mais unidades de participação no montante de € 8.996,17.”

A matéria dos nºs 72 e 73 deverá ter-se como não escrita por ser conclusiva. Se assim se não entender deve ser dada como não provada.”

Analisamos toda a prova produzida nos autos e os concretos pontos impugnados e concluímos, que o apelante /impugnante não tem razão, como vamos expor:

Não existe qualquer contradição, e claro, muito menos manifesta, entre a matéria constante dos nºs 81, 84 e 85, e a constante da als. dd), ee) e ff) dos factos não provados. Os factos provados, 81, 84 e 85, respeitam a uma não comunicação da apelante à autora- “O Banco NPN nunca disse á autora…”, e os restantes factos a mesma coisa. Não são os factos constantes das referidas alíneas e dados como não provados. A matéria de facto é diferente. Aqueles factos devem manter-se como provados porque resultou da prova que não foram comunicados à apelante.

Igualmente deve improceder a pretensão da apelante ao pretender a decisão de não provados sobre os factos nºs 71, 33, 51, 53, 65 e 69, nºs 77, 78, 79 e 80.

O Banco sabia, e tinha a obrigação de saber que os produtos que “vendeu”, papel comercial da CNE, comportavam risco superior ao depósito a prazo, até pelas características dos mesmos, deve, por isso, [manter-se] o nº 71. Todavia informou a autora (através do seu pai) que o produto era seguro equivalente a depósito a prazo, deve manter-se o nº 33.

O funcionário do Banco, a testemunha BB, amigo dos autores tinha conhecimento das características do papel comercial, que não era depósito a prazo nem podia ter as características deste e convenceu os autores a tomarem a sua decisão. Informando mesmo que o Banco após a nacionalização ainda era mais seguro. Os nºs 51, 53, 65 e 69 da matéria de facto não foram, por isso incorrectamente julgados.

Igualmente os nºs 77, 78, 79 e 80 foram bem julgados com a decisão de provado. Na realidade nunca o referido BB prestou qualquer informação sobre a proveniência do papel comercial, nem as relações existentes entre o BPN e a SLN – esta como entidade dominante entre o Banco Português de Negócios e a Cimentos Nacionais e Estrangeiros.

Também os números 32, 34, 35, 37 e 38 não devem ser alterados nos termos propostos.

A comercialização do papel comercial em causa foi sempre realizado segundo as instruções e recomendações do Banco através do seu funcionário.

Por último também não deve ser alterada a decisão aos factos nºs 72 e 73, que deve manter-se. A tomada de consciência do funcionário da apelante, BB, de que para a autora, os fundos que possuíam era de risco idêntico aos depósitos a prazo nos termos descritos no artigo 72º, é matéria de facto, objecto de prova. E essa prova foi feita de forma positiva. A autora estava convencida que o papel comercial era idêntico ao depósito a prazo, isto é, tinha a mesma segurança e garantia.».

Perante a fundamentação transcrita não se verifica a invocada nulidade processual por falta de fundamentação.

Compreende-se que o R., ora Recorrente, não se conforme com a decisão de não alteração dos pontos de facto por si impugnados em sede de apelação, alegando, designadamente, não ter sido tida em conta toda a argumentação por si aduzida em sede de apelação. Porém, estando o Tribunal da Relação obrigado a reapreciar os pontos de factos impugnados, mas não a atender a todos e cada um dos argumentos invocados, não se pode concluir pela existência de qualquer irregularidade na dita apreciação.

Improcede assim a pretensão do Recorrente nesta parte.

2.3. Passemos a apreciar o invocado desrespeito pelo dever de apreciar a impugnação do facto 92.

O ponto 92 dos factos dados como provados tem o seguinte teor:

«O referido funcionário actuava, até à compra do papel comercial CNE, como representante do BPN, Banco Português de Negócios, SA junto da Autora pelo respeito do que sabia ser o perfil de investidora da mesma.».

Tal facto foi assim impugnado no recurso de apelação do R. Banco

«E no que respeita agora à factualidade dada como provada no nº 92, por tudo o que ficou dito acima, e do teor das transcrições feitas nesta alegação, nenhuma razão existe para que seja limitado até à compra do papel comercial CNE a qualidade em que o dito BB actuou sempre no respeito do que sabia ser o perfil de investidora da autora.

A única diferença existente entre a aquisição deste produto para a autora e a aquisição doutros produtos ocorrida antes dessa é que, no que toca ao papel comercial CNE, o capital nele investido, por razões que se prenderam não com o produto em si, mas com a entidade dele emitente e a sua envolvência no seio de todo o grupo SLN, não foi reembolsado.

Mas isso ocorreu num momento posterior à sua comercialização e era a essa data de todo imprevisto e imprevisível que viesse a acontecer (vide nº 101 da decisão ora em causa).

Por tal motivo, este nº 92 deverá ter a redacção seguinte: “O referido funcionário actuava como representante do BPN – Banco Português de Negócios, SA junto da Autora, pelo respeito do que sabia ser o perfil de investidora da mesma.”».

Constata-se, assim, que o R. apelante pugnava pela eliminação do segmento «até à compra do papel comercial CNE» do ponto 92, de modo a dar-se como provado que, sempre e sem excepção, a actuação do funcionário representante do Banco réu respeitara o perfil de investidora da A..

Ora, e ainda que a impugnação deste ponto da matéria de facto não tenha sido expressamente apreciada, certo é que, como ficou patente na resolução da questão anterior (cfr. ponto IV, 2.2. do presente acórdão), o tribunal a quo, ao apreciar a ampla impugnação dos demais pontos da matéria de facto, considerou – sem margem para dúvidas – que, ao investir em papel comercial CNE, não actuou o dito funcionário em conformidade com aquele que sabia ser o perfil de investidora da mesma A.. A este propósito, convoca-se, de novo, a fundamentação do acórdão recorrido, na parte relevante:

«Igualmente deve improceder a pretensão da apelante ao pretender a decisão de não provados sobre os factos nºs 71, 33, 51, 53, 65 e 69, nºs 77, 78, 79 e 80.

O Banco sabia, e tinha a obrigação de saber que os produtos que “vendeu”, papel comercial da CNE, comportavam risco superior ao depósito a prazo, até pelas características dos mesmos, deve, por isso, [manter-se] o nº 71. Todavia informou a autora (através do seu pai) que o produto era seguro equivalente a depósito a prazo, deve manter-se o nº 33.

O funcionário do Banco, a testemunha BB, amigo dos autores tinha conhecimento das características do papel comercial, que não era depósito a prazo nem podia ter as características deste e convenceu os autores a tomarem a sua decisão. Informando mesmo que o Banco após a nacionalização ainda era mais seguro. Os nºs 51, 53, 65 e 69 da matéria de facto não foram, por isso incorrectamente julgados.

Igualmente os nºs 77, 78, 79 e 80 foram bem julgados com a decisão de provado. Na realidade nunca o referido BB prestou qualquer informação sobre a proveniência do papel comercial, nem as relações existentes entre o BPN e a SLN – esta como entidade dominante entre o Banco Português de Negócios e a Cimentos Nacionais e Estrangeiros.

Também os números 32, 34, 35, 37 e 38 não devem ser alterados nos termos propostos.

A comercialização do papel comercial em causa foi sempre realizado segundo as instruções e recomendações do Banco através do seu funcionário.

Por último também não deve ser alterada a decisão aos factos nºs 72 e 73, que deve manter-se. A tomada de consciência do funcionário da apelante, BB, de que para a autora, os fundos que possuíam era de risco idêntico aos depósitos a prazo nos termos descritos no artigo 72º, é matéria de facto, objecto de prova. E essa prova foi feita de forma positiva. A autora estava convencida que o papel comercial era idêntico ao depósito a prazo, isto é, tinha a mesma segurança e garantia.». [negritos nossos]

Perante esta apreciação do tribunal a quo, dúvidas não subsistem de que o mesmo entendeu estar provado que, ao tomar a decisão de investir os fundos da A. em papel comercial CNE, o funcionário representante do Banco réu desrespeitou o perfil de investidor da A., razão pela qual se mostra prejudicada a necessidade de determinar a expressa reapreciação do ponto 92 da matéria de facto.

3. Passando a apreciar as questões relativas à decisão de direito, consideremos a questão do invocado erro de qualificação do contrato dos autos.

Alega o Recorrente que, com as alterações da matéria de facto propugnadas, entre os diversos contratos de intermediação financeira, o contrato dos autos deve ser qualificado como contrato de gestão discricionária de carteira, ou, em alternativa, como contrato de mandato. Em consequência desta requalificação, deve reconhecer-se que o Banco réu não estava obrigado a dar informações prévias à A. sobre os produtos financeiros, reconhecendo-se ainda que a mesma A. ratificou tacitamente todos os investimentos realizados.

O Recorrente faz depender a requalificação do contrato da alteração da matéria de facto nos termos por si enunciados no presente recurso.

Ora, ainda que, maioritariamente, as questões recursórias relativas à decisão de facto tenham sido decididas em sentido desfavorável ao Recorrente (cfr. supra, pontos IV, 2.2. e 2.3. do presente acórdão), não pode deixar de se reconhecer a relevância da questão que foi decidida favoravelmente, a existência de confissão da A..

Vejamos mais detalhadamente.

As instâncias deram como provados os seguintes factos que se afiguram relevantes para a qualificação da relação contratual existente entre a A. e o Banco réu:

46. Sem que a Autora lhe desse ordem, o Banco 1º Réu resolveu no dia 6/2/2008 resgatar a maior parte das unidades de participação que ela tinha no sobredito fundo imobiliário, pelo que nesse mesmo dia foi creditada na conta D/O da Autora a quantia de € 151.789,41.

47. Creditado aquele montante na conta bancária da Autora no dia 13/2/2008 o Banco 1º Réu constituiu, por contrapartida do débito dessa conta, um depósito a prazo no valor de € 150.000,00 por 9 dias, também sem ordem e sem o conhecimento da Autora.

48. Vencido que foi aquele depósito a prazo de € 150.000,00 no dia 22 de Fevereiro de 2008 - e resgatado que entretanto também foram, igualmente sem ordem ou conhecimento da autora, mais algumas unidades de participação do referido fundo imobiliário em 15/2/2008 no valor de € 4.140,53 - e creditado que foi o capital e os juros, o 1º Réu comprou em nome da Autora € 150.000,00 de papel comercial da CNE, assim tendo debitado, e por esse valor, a conta de depósitos à ordem da Autora, compra e débito que ocorreram sem que a Autora os tivesse ordenado ou sequer conhecido.

49. O Banco 1º Réu através do seu funcionário BB, só posteriormente fez saber à Autora das operações que havia efectuado na sua conta.

50 Informando-a que o tinha feito no interesse da Autora.

51. Dizendo-lhe tratar-se de um produto novo do BPN para investimento, com garantia de reembolso do capital aplicado e do pagamento de juros.

52. Bem como lhe disse que o valor do capital e dos juros lhe seria pago no dia 22 de Fevereiro de 2009.

53. Mais lhe referiu aquele funcionário do Réu, BB, que este tipo de produto estava a ser propiciadas [rectius: propiciado] por instruções dos seus superiores hierárquicos, por lhes garantir uma rendibilidade melhoradas e sem risco.

54. Nenhuma outra informação foi dada à Autora sobre o que era esse produto, nem sequer lhe foi dito que era papel comercial, do que a Autora nunca tinha ouvido falar, nem sabia que existia nem lhe foi explicado o que era o papel comercial e também não lhe foi entregue ou facultado qualquer documento que o identificasse ou explicitasse - brochura, nota informativa ou outro.

55. A Autora jamais havia comprado ou possuído qualquer papel comercial - como valor mobiliário.

56. A Autora era então leiga em transacções bancárias e aplicações e investimentos em bolsa e em valores mobiliários, não sabendo, nem percebendo quer os conceitos, quer os pormenores concretos, gerais ou especiais, em que se desenvolvem essas actividades económicas e bancárias.

58. Em Novembro de 2008, quando veio a público a notícia da nacionalização do BPN o pai da Autora, na presença da Autora interrogou o referido BB acerca das consequências desse facto ao nível do risco de (não) reembolso dos valores depositados e investidos por si e pela sua mulher a conselho e recomendação dele.

59. Tendo-o ele tranquilizado e alegando que a nacionalização constituía até maior garantia de reembolso.

60. Só então é que o referido funcionário referiu que essas aplicações eram papel comercial.

61. Mas sem lhes explicar o que é que isso era ou em que consistia.

69. O referido BB sabia que os conselhos e recomendações que prestava à Autora na qualidade de funcionário do Banco se destinavam à tomada pela mesma de uma decisão definitiva de consolidar o investimento até então efectuado.

70. Bem como sabia que ela não iria[m], como não foi, proceder a quaisquer outras diligências de averiguação acerca da anunciada segurança do retorno, quer do capital a investir, quer da sua remuneração.

71. O referido BB tinha conhecimento de que se a Autora soubesse que a aplicação proposta tinha risco superior ao de um depósito a prazo ou dos fundos que possuía, recusaria tal aplicação.

72. Bem como tinha consciência de que para a Autora os fundos que possuíam eram de risco idêntico ao dos depósitos a prazo.

73. O papel comercial da CNE tinha risco superior quer ao dos depósitos a prazo que a Autora constituíra no Banco 1º Réu.

74. O referido BB sabia que a Autora não tinha lido, nem por qualquer outra forma ou meio tinha tomado conhecimento do conteúdo de qualquer nota informativa da emissão elaborada pela CNE.

A esta factualidade foi aditado (cfr. supra ponto IV, 2.1.) o seguinte ponto de facto:

- A autora admitiu que dentro dos parâmetros antes verbalmente estabelecidos com o funcionário BB, ou seja, que só deveria investir quando tal investimento assegurasse quer o capital, quer os juros, e era indiferente que o referido BB falasse consigo antes ou depois da aplicação.

Importa apurar se, com este aditamento, a factualidade dada como provada leva a que, como pretende o Recorrente, se deve qualificar o contrato dos autos como sendo um contrato de gestão de carteiras.

Relativamente à caracterização deste tipo contratual, pronunciou-se este Supremo Tribunal, no acórdão de 25.10.2018 (proc. n.º 2089/11.8TVLSB.L1), disponível em www.dgsi.pt, da seguinte forma:

«[D]e harmonia com o disposto no art. 289º, nº 1 do CVM, são atividades de intermediação financeira, entre outros, os serviços de investimento em valores mobiliários [al. a)], os quais compreendem, nos termos do art. 290º, nº 1, do mesmo código, além de outros, a receção, transmissão e a execução de ordens por conta de outrem [als. a) e b)] e a gestão de carteiras por conta de outrem [al. c)].

Por sua vez, a regulamentação da atividade das sociedades gestoras de patrimónios, consta, ainda hoje, do DL nº 163/94[4], de 4 de junho, com as alterações introduzidas pelo DL nº 17/97 [5: Que alterou a redação da alínea c) do artigo 6º do DL nº 163/94], de 21 de janeiro, e pelo DL nº 99/98 [6: Que revogou o artigo 8º do DL nº 163/94], de 21 de abril, de cujo art. 6º decorre que a gestão de carteiras envolve as «seguintes operações por conta de conta alheia:

a) Subscrição, aquisição ou alienação de quaisquer valores mobiliários, unidades de participação em fundos de investimento, certificados de depósito, bilhetes do Tesouro e títulos de dívida de curto prazo, em moeda nacional ou estrangeira;

b) Aquisição, oneração ou alienação de direitos reais sobre imóveis, metais preciosos e mercadorias transacionadas em bolsas de valores;

c) Celebração de contratos de opções, futuros ou de outros instrumentos financeiros derivados, bem como a utilização de instrumentos do mercado monetário e cambial».

Assim, à luz deste quadro legal, a gestão de carteiras é considerada uma atividade de intermediação financeira que tem por objeto a prestação de serviços e atividades de investimento em instrumentos financeiros por conta de outrem.

Significa isto, no dizer de Menezes Leitão [7: “O Contrato de Gestão de Carteiras”, acessível in “https://blook.pt/publications/publication/e237bd4d1f2f/, págs 2 e 6], que, nesta «situação o intermediário financeiro age no interesse e por conta dos seus clientes, pelo que é na esfera jurídica destes que se irão repercutir as consequências positivas e negativas das operações de subscrição ou transacção de valores mobiliários», sendo, por isso, um contrato de mandato, tal como decorre do disposto no art. 1º, nº 3 [8: O qual estabelece que « a gestão de carteiras é exercida com base em mandato escrito, celebrado entre as sociedades gestoras e os respectivos clientes, que deverá especificar as condições, os limites e o grau de discricionariedade dos actos na mesma compreendidos»] do DL nº 163/94, de 4 de junho e constitui entendimento unânime na doutrina [9: Cfr. entre outros, Carlos Ferreira de Almeida , in, “ As transacções de conta alheia no âmbito da intermediação no mercado de valores mobiliários”, in, AAVV, Direito dos Valores Mobiliários, Lisboa, FDL/Lex, 1997, pág. 295; Ana Afonso, “O contrato de gestão de carteira. Deveres e responsabilidade do intermediário financeiro”, in, Maria de Fátima Ribeiro (org.), Jornadas, Sociedades Abertas, Valores Mobiliários e Intermediação Financeira”, Coimbra, Almedina, 2007, pág. 57; Orlando Vogler Guiné, “ Do contrato de gestão de carteiras e do exercício do direito de voto: OPA obrigatória, comunicação de participação qualificada e imputação”, Coimbra, Coimbra Editora, 2008, págs. 151-181; Maria Vaz de Mascarenhas, in, “O contrato de gestão de carteiras: Natureza, conteúdo e deveres. Anotação a Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça”, in, Caderno do Mercado de Valores Mobiliários, nº13 (Abril 2002), pág. 122 e Paulo Câmara, in, Manual, pág. 430].

Mas, tal como sublinha este mesmo autor, para haver lugar a esta atuação do intermediário financeiro é necessário que se verifique um negócio antecedente, normalmente designado por negócio de cobertura, que serve de base à subscrição ou transação de valores mobiliários, sendo estas operações consideradas como um negócio de execução da relação de cobertura.

Estes negócios de cobertura são, na expressão do Código dos Valores Mobiliários, os contratos de intermediação financeira, que têm a sua regulamentação nos artigos 321º a 343º e que incluem as ordens referidas nos artigos 325º a 331 e os contratos de gestão de carteira de títulos regulados nos artigos 332º a 336º [10: E, após a revisão operada pelo DL nº 357-A, de 31 de outubro, nos artigos 335º e 336º].

E todos eles têm subjacente uma relação de clientela que, no caso da ordens tem que existir previamente para que a ordem [11: Caraterizada por ser um negócio jurídico unilateral] se torne vinculativa para o intermediário (cfr. art. 326º, nº 3 do CVM), mas que pode ser instituída contratualmente, como sucede com os contratos de gestão de carteira [ cfr. art. 322º, nº 3, al. a), da CVM] e de registo e depósitos de valores mobiliários [ cfr. al. b) do nº 3 do citado art. 322º ], ou resultar tacitamente instituída pela aceitação reiterada de ordens daquele investidor por parte do intermediário financeiro [ cfr. al. c) do mesmo art. 322º].

Quer isto dizer, como refere Menezes Leitão [12: In, “Direito dos Valores Mobiliários”, Vol. II, Coimbra Editora, pág. 2000, págs. 129 e segs. e “O Contrato de Gestão de Carteiras”, acessível in “https://blook.pt/publications/pubçication/e237bd4d1f2f/, pág 3], que a relação de clientela assume uma função enquadrante e integradora das ordens emitidas, pelo que pode ser considerada como um contrato quadro, ou seja, como um contrato celebrado para regular o conteúdo de futuros negócios, cuja celebração não corresponde, porém, a uma obrigação assumida pelas partes.

O contrato de gestão de carteiras constitui, assim, um contrato-quadro em relação às operações de [por] conta alheia, através do qual o intermediário se obriga, nos termos do art. 332º da CVM, a praticar todos os atos tendentes à valorização da carteira e a exercer os direitos inerentes aos instrumentos financeiros que integram a carteira.

Segundo Maria Vaz de Mascarenhas [13: In, “O contrato de gestão de carteiras: Natureza, conteúdo e deveres. Anotação a Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça”, in, Caderno do Mercado de Valores Mobiliários, nº13 (Abril 2002), pág. 121], o contrato de gestão de carteiras pode abranger as seguintes atividades:

i) Tomada de decisões de investimento em instrumentos financeiros;

ii) Administração, registo e depósito de valores;

iii) Receção de depósitos e outros fundos reembolsáveis para fazer face às necessidades de tesouraria decorrentes das decisões de investimento;

iv) Concessão de crédito, quando tal seja necessário e considerado conveniente para fazer face às necessidades de tesouraria decorrentes das decisões de investimento.

Assim, olhando para este contrato sob a perspetiva das obrigações assumidas pelo intermediário financeiro, a que o citado art. 332º confere especial destaque, podemos afirmar que a principal obrigação resultante do contrato de gestão de carteiras é a de realizar, por conta e no interesse do investidor e mediante retribuição deste, todos os atos necessários com vista à valorização da carteira e, secundariamente, exercer os direitos inerentes aos valores mobiliários e instrumentos financeiros que integram essa mesma carteira.

Daí acolher-se a definição que Menezes Leitão [14:“O Contrato de Gestão de Carteiras”, acessível in “https://blook.pt/publications/publication/e237bd4d1f2f/, pág 1] dá ao contrato de gestão de carteiras no sentido em que o mesmo «consiste num contrato celebrado entre um intermediário financeiro e um investidor, nos termos do qual aquele se obriga, por conta e no interesse deste, a administrar um conjunto de instrumentos financeiros, em ordem a obter a maior rentabilização possível» .[negritos nossos]

Tendo presente os elementos caracterizadores do contrato de gestão de carteiras, não pode senão concluir-se que os mesmos não se encontram reunidos no caso sub judice. Com efeito, não obstante existir uma relação de clientela entre a A. e o Banco réu, não existe qualquer acordo (o contrato-quadro) - que teria de ser celebrado por escrito (cfr. art. 321.º, n.º 1, do Código de Valores Mobiliários, na redacção vigente à data dos factos, quem esta parte, se mantém na redacção actual) - quanto à prestação pelo segundo dos serviços típicos que integram a gestão de carteiras.

Aquilo que revelam os factos provados 46 a 56, acima reproduzidos, juntamente com o facto aditado pela confissão da A., é que, para além da relação de clientela bancária existente entre a A. o Banco réu, o segundo se encontrava mandatado para realizar alguns investimentos financeiros por conta da primeira. Não sendo esta relação enquadrável em qualquer dos contratos de intermediação financeira tipificados, entende-se serem-lhe aplicáveis as regras gerais de tais contratos previstas no Código dos Valores Mobiliários, assim como, subsidiariamente, o regime dos arts. 1157.º e segs. do Código Civil.

3.1. Certo é que, tendo ficado provado, mediante confissão, «que dentro dos parâmetros antes verbalmente estabelecidos com o funcionário BB, ou seja, que só deveria investir quando tal investimento assegurasse quer o capital, quer os juros, e era indiferente [para a A.] que o referido BB falasse consigo antes ou depois da aplicação», assiste razão ao Recorrente ao invocar que não se encontrava obrigado a prestar à A. informações prévias aos actos de investimento. Isso, porém, não o dispensava de respeitar os princípios gerais a que se encontram adstritos os intermediários financeiros, entre os quais avultam os seguintes (previsto no art. 304.º do CVM, na redacção vigente à data dos factos dos autos):

«1 - Os intermediários financeiros devem orientar a sua actividade no sentido da protecção dos legítimos interesses dos seus clientes e da eficiência do mercado.

(...)

3 - Na medida do necessário para o cumprimento dos seus deveres na prestação do serviço, o intermediário financeiro deve informar-se junto do cliente sobre os seus conhecimentos e experiência no que respeita ao tipo específico de instrumento financeiro ou serviço oferecido ou procurado, bem como, se aplicável, sobre a situação financeira e os objectivos de investimento do cliente.

(...).».

Ora, entre outros factos, ficou provado que:

71. O referido BB [funcionário do Banco réu] tinha conhecimento de que se a Autora soubesse que a aplicação proposta tinha risco superior ao de um depósito a prazo ou dos fundos que possuía, recusaria tal aplicação.

72. Bem como tinha consciência de que para a Autora os fundos que possuíam eram de risco idêntico ao dos depósitos a prazo.

Estes factos permitem, sem margem para dúvidas, qualificar como ilícita a conduta do funcionário do Banco réu, imputável à esfera jurídica deste último. O respeito pelo interesse do cliente mandante, tal como configurado pelo próprio, constitui o eixo em torno do qual se desenvolvem todos os deveres do intermediário financeiro. Tendo ficado provado que o funcionário do Banco réu, mediante conduta imputável à esfera jurídica deste último, actuou intencional e conscientemente em desrespeito por aquele que sabia ser a vontade da cliente A., fica cabalmente demonstrada a violação dos princípios normativos consagrados no citado art. 304.º, n.ºs 1 e 3, do CVM.

Contrariamente ao invocado pelo Recorrente, não pode, no caso dos autos, valor como aprovação dos actos realizados em desrespeito de tais princípios, o silêncio da A. após a realização de tais actos. É que a aplicação do regime previsto no art. 1163.º do Código Civil («Comunicada a execução ou inexecução do mandato, o silêncio do mandante por tempo superior àquele em que teria de pronunciar-se, segundo os usos ou, na falta destes, de acordo com a natureza do assunto, vale como aprovação da conduta do mandatário, ainda que este haja excedido os limites do mandato ou desrespeitado as instruções do mandante, salvo acordo em contrário.») pressupõe que o mandante tenha tomado conhecimento da natureza e contornos dos actos praticados pela mandatário que excedam os limites do mandato. Ora, no caso dos autos, ficou provado um conjunto de factos («56. A Autora era então leiga em transacções bancárias e aplicações e investimentos em bolsa e em valores mobiliários, não sabendo, nem percebendo quer os conceitos, quer os pormenores concretos, gerais ou especiais, em que se desenvolvem essas actividades económicas e bancárias. 58. Em Novembro de 2008, quando veio a público a notícia da nacionalização do BPN o pai da Autora, na presença da Autora interrogou o referido BB acerca das consequências desse facto ao nível do risco de (não) reembolso dos valores depositados e investidos por si e pela sua mulher a conselho e recomendação dele. 59. Tendo-o ele tranquilizado e alegando que a nacionalização constituía até maior garantia de reembolso. 60. Só então é que o referido funcionário referiu que essas aplicações eram papel comercial. 61. Mas sem lhes explicar o que é que isso era ou em que consistia. 69. O referido BB sabia que os conselhos e recomendações que prestava à Autora na qualidade de funcionário do Banco se destinavam à tomada pela mesma de uma decisão definitiva de consolidar o investimento até então efectuado. 70. Bem como sabia que ela não iria[m], como não foi, proceder a quaisquer outras diligências de averiguação acerca da anunciada segurança do retorno, quer do capital a investir, quer da sua remuneração. 73. O papel comercial da CNE tinha risco superior quer ao dos depósitos a prazo que a Autora constituíra no Banco 1º Réu. 74. O referido BB sabia que a Autora não tinha lido, nem por qualquer outra forma ou meio tinha tomado conhecimento do conteúdo de qualquer nota informativa da emissão elaborada pela CNE.») dos quais se extrai, sem margem para dúvidas, não apenas que, após a realização do investimento em papel comercial CNE, a A. se manteve na ignorância acerca da natureza e nível de risco de tal produto financeiro, como que o funcionário do Banco réu foi o principal responsável pela manutenção dessa ignorância, ao não ter, quando questionado, prestado esclarecimentos à A. (e seus pais) sobre o produto em causa.

Conclui-se, assim, embora com fundamento distinto daquele que foi considerado pelas instâncias, pelo preenchimento do pressuposto da ilicitude.

3.2. Quanto à prova do nexo de causalidade entre o facto ilícito e o dano encontra-se cabalmente feita ao dar-se como provado que o funcionário do Banco «tinha conhecimento de que se a Autora soubesse que a aplicação proposta tinha risco superior ao de um depósito a prazo ou dos fundos que possuía, recusaria tal aplicação».

4. Fica assim prejudicada a apreciação do invocado abuso de direito da A. pelo facto de, atendendo à prática reiterada existente entre as partes de dispensar informações prévias à realização dos investimentos, vir invocar a violação do dever de informação.

Com efeito, a requalificação contratual a que se procedeu fez com que se entendesse que a ilicitude da conduta do Banco réu não resulta da violação dos deveres de informação prévia da A. mas sim da violação do dever de respeitar o interesse da mandante, tal como configurada pelo própria.

5. Não tendo sido suscitadas questões quanto aos demais pressupostos da responsabilidade civil do Banco réu, designadamente quanto ao cálculo do dano, nada mais há a apreciar.

V – Decisão

Pelo exposto, e ainda que com fundamento não inteiramente coincidente, julga-se improcedente o recurso, confirmando-se a decisão do acórdão recorrido.

Custas pelo Recorrente.


Lisboa, 12 de Outubro de 2023


Maria da Graça Trigo (relatora)

Catarina Serra

João Cura Mariano